A ORIGEM - Um Panorama em Gênesis - Parte 2: QUEDA | 11 de Janeiro de 2015 | João Costa INTRODUÇÃO - Gn 2.4-9 "Esta é a história das origens dos céus e da terra, no tempo em que foram criados: Quando o Senhor Deus fez a terra e os céus, ainda não tinha brotado nenhum arbusto no campo, e nenhuma planta havia germinado, porque o Senhor Deus ainda não tinha feito chover sobre a terra, e também não havia homem para cultivar o solo. Todavia brotava água da terra e irrigava toda a superfície do solo. Então o Senhor Deus formou o homem do pó da terra e soprou em suas narinas o fôlego de vida, e o homem se tornou um ser vivente. Ora, o Senhor Deus tinha plantado um jardim no Éden, para os lados do leste; e ali colocou o homem que formara. O Senhor Deus fez nascer então do solo todo tipo de árvores agradáveis aos olhos e boas para alimento. E no meio do jardim estavam a árvore da vida e a árvore do conhecimento do bem e do mal." Prosseguimos a narrativa da criação da luz, do firmamento, da terra seca e vegetação, dos astros, dos peixes e aves e, finalmente, dos animais terrestres e da humanidade. Nesse cenário vemos a harmonia de três princípios que fundamentaram a existência da humanidade e sua interação com o mundo criado: o casamento, o trabalho e o descanso. Esse cenário de existência e "deleite" (do hebraico, eden) tem como figura de tensão central as duas árvores. O comentarista Derek Kidner descreve: "Em sua condição de coisa proibida, (a árvore do conhecimento do bem e do mal) apresentava a alternativa ao discipulado: ser produto de si mes mo, arrebatando o conhecimento, as satisfações e os valores provenientes do mundo criado, em desafio ao Criador {cf. 3:6). Ainda mais instrutivo é o resultado da experiência; (que veremos mais adiante). Em tudo isso, a árvore desempenha seu papel na oportunidade que dá, e não nas qualidades que possui; como uma porta cujo letreiro anuncia apenas o que há do outro lado dela." É aqui que vemos a tragédia se configurar. Quando Genêsis foi escrito, o mundo já havia sido despedaçado pelo pecado. Quer tenha sido escrito à época de Moisés ou muito depois, diariamente as pessoas experimentavam o que é sofrer nas mãos de outros e retirbuiíam com a mesma moeda. Embora criado em perfeição, Gênesis nos relata como o mundo veio a ser o lugar mau que é. A) A Transgressão - Gn 3.1-13 Ora, a serpente era o mais astuto de todos os animais selvagens que o Senhor Deus tinha feito. E ela perguntou à mulher: "Foi isto mesmo que Deus disse: ‘Não comam de nenhum fruto das árvores do jardim’? "Respondeu a mulher à serpente: "Podemos comer do fruto das árvores do jardim, mas Deus disse: ‘Não comam do fruto da árvore que está no meio do jardim, nem toquem nele; do contrário vocês morrerão’ "Disse a serpente à mulher: "Certamente não morrerão! Deus sabe que, no dia em que dele comerem, seus olhos se abrirão, e vocês serão como Deus, conhecedores do bem e do mal". Quando a mulher viu que a árvore parecia agradável ao paladar, era atraente aos olhos e, além disso, desejável para dela se obter discernimento, tomou do seu fruto, comeu-o e o deu a seu marido, que comeu também. Os olhos dos dois se abriram, e perceberam que estavam nus; então juntaram folhas de figueira para cobrir-se. Ouvindo o homem e sua mulher os passos do Senhor Deus que andava pelo jardim quando soprava a brisa do dia, esconderam-se da presença do Senhor Deus entre as árvores do jardim. Mas o Senhor Deus chamou o homem, perguntando: "Onde está você? " E ele respondeu: "Ouvi teus passos no jardim e fiquei com medo, porque estava nu; por isso me escondi". E Deus perguntou: "Quem lhe disse que você estava nu? Você comeu do fruto da árvore da qual lhe proibi comer? " Disse o homem: "Foi a mulher que me deste por companheira que me deu do fruto da árvore, e eu comi". O Senhor Deus perguntou então à mulher: "Que foi que você fez? " Respondeu a mulher: "A serpente me enganou, e eu comi". A harmonia inocente do Éden foi, então, arruinada com a entrada do pecado. Os erros de Adão e Eva são típicos de todos os pecados, mas por serem os progenitores de toda a raça humana, seus atos tiveram gravíssimas consequências. A serpente, que na narrativa bíblica sabemos que é uma representação do diabo (Rm 16.20; Ap 12.9) articula a tentação exagerando a severidade da lei (Deus havia colocado somente uma árvore fora dos limites Gn 2.17: "mas não coma da árvore do conhecimento do bem e do mal, porque no dia em que dela comer, certamente você morrerá") despertando assim o legalismo de Eva (v.3) e questionando a boa vontade de Deus para com ela e Adão. O ato de comer do fruto daquela árvore era uma afirmação de autonomia moral. Ou seja, comendo do fruto, o casal está pressupondo saber mais que Deus. A palavra hebraica traduzida por "conhecimento" deixa implícita a idéia de experiência. A experiência do fruto estabelece uma separação de suas próprias percepções do decreto de Deus. Adão e Eva queriam dessa forma ser oniscientes (abrir os olhos) e onipotentes (ser como Deus). Vemos então o despertar do pecado na humanidade. O teólogo Louis Berkhof explica que o pecado em si consiste "não em duvidar da verdade, nem na pecaminosa negação dela, mas em contradizer essa verdade mesmo contra a convicção da própria mente, contra o esclarecimento da consciência e mesmo contra o veredito do coração." O mais dotado teólogo entre os pecadores, Paulo é definitvo em seu ensino: "Portanto, da mesma forma como o pecado entrou no mundo por um homem, e pelo pecado a morte, assim também a morte veio a todos os homens, porque todos pecaram; pois antes de ser dada a lei, o pecado já estava no mundo. Mas o pecado não é levado em conta quando não existe lei. Todavia, a morte reinou desde o tempo de Adão até o de Moisés, mesmo sobre aqueles que não cometeram pecado semelhante à transgressão de Adão, o qual era um tipo daquele que haveria de vir." Romanos 5.12-14 Ressaltando esse ensino, o professor Wayne Grudem afirma que "aqui Paulo salienta que desde o tempo de Adão até a época de Moisés, as pessoas não tinham as leis escritas de Deus. Embora seus pecados não fossem levados em conta eles ainda assim morriam. O fato de que morriam é absoluta prova de que Deus os considerava culpados com base no pecado de Adão." O triste relato nos mostra: 1) O pecado de Adão e Eva ao comerem o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal e a sedução da serpente; 2) O juízo de Deus recaindo sobre o casal, e de forma contundente sobre a serpente sinalizando o que chamamos de proto-Evangelho, a primeira boa nova da salvação, mesmo com toda desordem gerada pelo pecado (vv.14-15); 3) A graça sinalizada nas roupas preparadas para o casal (v.21) ,extensão da misericórdia naquilo que causou mais vulnerabilidade a eles: a vergonha e 4) A consequência da expulsão de Adão e Eva do Éden. B) A Descendência - Gn 4.17-26 "Caim teve relações com sua mulher, e ela engravidou e deu à luz Enoque. Depois Caim fundou uma cidade, à qual deu o nome do seu filho Enoque. A Enoque nasceu-lhe Irade, Irade gerou a Meujael, Meujael a Metusael, e Metusael a Lameque. Lameque tomou duas mulheres: uma chamava-se Ada e a outra, Zilá. Ada deu à luz Jabal, que foi o pai daqueles que moram em tendas e criam rebanhos. O nome do irmão dele era Jubal, que foi o pai de todos os que tocam harpa e flauta. Zilá também deu à luz um filho, Tubalcaim, que fabricava todo tipo de ferramentas de bronze e de ferro. Tubalcaim teve uma irmã chamada Naamá. Disse Lameque às suas mulheres: "Ada e Zilá, ouçam-me; mulheres de Lameque, escutem minhas palavras: Eu matei um homem porque me feriu, e um menino, porque me machucou. Se Caim é vingado sete vezes, Lameque o será setenta e sete". Novamente Adão teve relações com sua mulher, e ela deu à luz outro filho, a quem chamou Sete, dizendo: "Deus me concedeu um filho no lugar de Abel, visto que Caim o matou". Também a Sete nasceu um filho, a quem deu o nome de Enos. Nessa época começou-se a invocar o nome do Senhor." Lamentáveis desdobramentos do pecado surgem no primogênito de Adão e Eva. Caim, tomado de inveja e ódio, executa cruelmente seu irmão mais novo, Abel (vv. 3-8). A violência aparece no mundo e distancia mais o homem de Deus. Vários descendentes de Caim recebem o reconhecimento por importantes feitos. A performance é exaltada na construção da primeira cidade do mundo (v.17), na pecuária (20), na música (21) e na metalurgia (22). Porém todos esses avanços eram sinais claros da independência da humanidade manchada pelo pecado, e a descrição de Lameque é assustadora: escravo da paixão, casou-se com duas mulheres atraentes Ada (jóia) e Zilá (melodia) e também era assumidamente sanguinário e impiedoso. A bigamia e a brutal intolerância foram os valores relativos que começaram a nortear a nova sociedade surgindo. Em meio a esse caos emergente, Deus permite que Adão e Eva tenham um terceiro filho, Sete ("substituto"). E através desse homem, mesmo não sendo conhecido por grandes feitos, vemos surgir a manifestação da graça soberana de Deus, inspirando-o a ser aquele que começa invocar o nome de Deus. Sua linhagem passa a ser determinante para o surgimento de um povo adorador e dependente de Deus. CONCLUSÃO - Graça - De Adão a Noé - Gn 5.1-3;32 "Este é o registro da descendência de Adão: Quando Deus criou o homem, à semelhança de Deus o fez; homem e mulher os criou. Quando foram criados, ele os abençoou e os chamou Homem. Aos 130 anos, Adão gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem; e deu-lhe o nome de Sete." "Aos 500 anos, Noé tinha gerado Sem, Cam e Jafé." Vemos aqui o início da linhagem escolhida a partir de Adão, por meio da qual viria, derradeiramente, a geração eleita de Gênesis, pois veremos na sequência que é justamente a família de Noé que é poupada no grande dilúvio. A densa narrativa da queda mostra a tragédia da humanidade, que independente de Deus, construiu para si um caminho de bestialidade. O Evangelho é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, entre incontáveis razões, porque no mais catastrófico contexto, aponta a esperança. Ao longo deste relato dos primórdios da humanidade veremos a depravação total de homens e mulheres e a bondade incansável de Deus em desejar aliança com sua criação. Sidney Greidanus nos aconselha a "considerar todo o conselho de Deus, com todos seus ensinamentos, leis, profetas e visões à luz de Cristo." Que consigamos ler a história de nossos primeiros pais Adão e Eva, com a certeza de que mesmo como seus descendentes pecadores, a salvação nos é dada, graciosamente pelo Senhor Deus. "Entretanto, não há comparação entre a dádiva e a transgressão. Pois se muitos morreram por causa da transgressão de um só, muito mais a graça de Deus, isto é, a dádiva pela graça de um só homem, Jesus Cristo, transbordou para muitos! Não se pode comparar a dádiva de Deus com a conseqüência do pecado de um só homem: por um pecado veio o julgamento que trouxe condenação, mas a dádiva decorreu de muitas transgressões e trouxe justificação. Se pela transgressão de um só a morte reinou por meio dele, muito mais aqueles que recebem de Deus a imensa provisão da graça e a dádiva da justiça reinarão em vida por meio de um único homem, Jesus Cristo. Conseqüentemente, assim como uma só transgressão resultou na condenação de todos os homens, assim também um só ato de justiça resultou na justificação que traz vida a todos os homens. Logo, assim como por meio da desobediência de um só homem muitos foram feitos pecadores, assim também, por meio da obediência de um único homem muitos serão feitos justos. A lei foi introduzida para que a transgressão fosse ressaltada. Mas onde aumentou o pecado, transbordou a graça, a fim de que, assim como o pecado reinou na morte, também a graça reine pela justiça para conceder vida eterna, mediante Jesus Cristo, nosso Senhor." Romanos 5.15-21