Formação de profissionais de saúde frente à exigência da bioética Formation des professionnels de santé face aux exigences de la bioéthique Sidney Reinaldo da Silva (UTP) Rita de Cássia Salgado (UTP) Resumo O texto relata uma pesquisa sobre a bioética na formação de profissionais da saúde que atuam em áreas da medicina integrativa. Investigou-se a dimensão axiológica da formação de terapeutas. A referência para a investigação foi o Plano Nacional das Práticas Integrativas e Complementares (PNPICs), que vigora no Brasil desde 2005, dando, desde então, novas diretrizes éticas e políticas para saúde pública no país. Discutiu-se, inicialmente, o teor de tais diretrizes e, posteriormente, é relatado o estudo de um curso de especialização em Medicina Tradicional Chinesa (MTC) e Acupuntura (ACP). Os dados coletados se referem à implantação da disciplina de Bioética num curso realizado em uma cidade do interior do Paraná com cerca de 314.681 habitantes, oferecido por uma instituição de ensino superior em parceria com um instituto especializado em medicina tradicional chinesa. A pesquisa procurou compreender como o curso foi organizado curricularmente e qual o espaço da bioética em sua grade de atividades. Os dados levantados foram analisados e discutidos a partir das exigências do PNPICs e dos princípios da bioética reconhecidos como fundamentais para a prática da medicina transdisciplinar. Como resultado da pesquisa, constatou-se que o curso ainda não apresenta uma proposta articulada com as exigências do PNPICs e, da mesma forma, não incorporou em sua prática formativa as diretrizes da bioética já indicadas no VI Congresso Mundial de Bioética realizado no Brasil, em 2002. Verificou-se também que a disciplina bioética é ministrada, sobretudo, como uma “mera” dimensão da pesquisa científica na área da saúde, sem levar em conta seus impactos na prática cotidiana da terapia. Contudo, constatou-se, entre os discentes, não obstante certa incompreensão de seus conceitos e exigências, a consciência da necessidade da bioética na prática terapêutica. Palavras-chave: formação de profissionais da saúde; bioética; PNPICs; MTC Résumé Cet article rend compte d‟une recherche sur la bioéthique dans la formation des professionnels de santé qui travaillent dans le champ de la médicine intégrative. On a recherché la dimension axiologique de la formation des thérapeutes. La référence de la recherche a été le Plan National des Pratiques Intégratives (PNPIC) qui est en vigueur au Brésil depuis le 17 juillet 2006, en donnant une nouvelle direction éthique et politique pour la santé publique dans ce pays. D‟abord, on discute la teneur de cette nouvelle direction. Après on rend compte de la situation des cours de spécialisation en Médicine Traditionnelle Chinoise (MTC) et Acupuncture (ACP) au Brésil. Les données empiriques se rapportent spécifiquement à l‟implantation de la “discipline” Bioéthique dans un cours universitaire en partenariat avec un institut spécialisé en Médicine Traditionnelle Chinoise, tenu dans une municipalité (environ 314.681 habitants) de l‟Etat du Paraná (Brésil). On a cherché à comprendre quelle est la place de la Bioéthique dans le curriculum du cours en question. Le cours a été analysé d‟après les exigences du PNPIC et les principes de la Bioéthique pour la pratique transdisciplinaire de la médicine. D‟après la recherche, on a constaté que le cours en question n‟a pas encore une proposition articulée avec les exigences du PNPIC et, de la même façon, il n‟a pas incorporé dans sa pratique formative les coordonnées du 899 VI Congrès Mondial de Bioéthique qui a eu lieu au Brésil en 2002. On a aussi constaté que la “discipline” bioéthique est enseignée surtout comme une exigence pour la recherche scientifique dans le champ de la santé, mais sans mettre en relief ses impacts sur la pratique thérapeutique quotidienne. Toutefois, on a constaté que les étudiants avaient besoin de la Bioéthique dans les pratiques thérapeutiques, malgré l‟incompréhension de son sens et de ses exigences. Mots-clés: formation des professionnelles de santé; bioéthique; PNPIC; médicine traditionnelle chinoise Da antiguidade até a Idade média, a ética caminha do princípio cósmico ao divino. Na idade Moderna, a ética, se delongando no princípio da liberdade autolegisladora, apresenta em comum a “consciência humana”, desde quando acolheu a lei natural e cósmica, acatou com fé a lei divina e passou a gerar a própria lei moral, até então no contexto da subjetividade. A ética na contemporaneidade passa aos paradigmas da objetividade, torna-se a ética da interatividade. Entre as mais divulgadas estão: a ética discursiva, que busca construir um princípio básico através do diálogo, onde os participantes do debate julgam a validade das normas éticas; a ética da reciprocidade, que é construída a partir da relação entre duas pessoas, eu e tu, na qual as duas existências se reconhecem como de igual valor moral e a norma se consolida na circularidade existencial dos hábitos e costumes; a ética da justiça, fundamentada nas estruturas sociais de uma sociedade bem ordenada, tendo como virtude a justiça, objetiva na construção consensual formular dois princípios, a saber, o da liberdade igual para todos e o segundo, da distribuição eqüitativa de bens ao cidadão; ainda a ética da utilidade, puramente objetiva, possui como princípio básico o utilitarismo, que pretende dirigir a produção das coisas úteis e o maior bem-estar possível para o maior número de pessoas. Num mundo de extraordinárias descobertas científicas no âmbito da saúde e da vida, com intensa diversificação tecnológica surge a necessidade de reflexão sobre as questões da Bioética, da proteção e futuro da vida humana, da formação transdisciplinar de profissionais de saúde que permeiam o cenário da qualidade de vida e os direitos humanos, considerada por Pegoraro (2006) como capítulo da ética. O pesquisador norte-americano, Van Rensselaer Potter, ao cunhar o neologismo bioethics, definiu Bioética como sendo a “ciência da sobrevivência humana” em sua obra pioneira, Bioética: a ponte para o futuro, de 1971, na qual, segundo Pessini (2008), alertou a humanidade sobre a necessidade de unir-se em torno do cuidado e defesa da vida, numa perspectiva que vai além do âmbito exclusivamente humano. No cerne de sua proposta habitava a criação de uma disciplina capaz de interação dinâmica entre a espécie humana e o meio ambiente. Segundo Sanches (2004), após a Segunda Guerra Mundial, surge a tomada de consciência pela necessidade em acompanhar com critério o complexo campo e avanço de desenvolvimento tecnológico, embora somente na década de 1970 é que de fato, nasce a Bioética entre cientistas, médicos e pesquisadores preocupados com o rumo e os critérios que vinham sendo adotados diante dos avanços biotecnológicos. A bioética se afirma como uma disciplina, contudo, destaca-se que ela “se forma no debate entre as diferentes áreas do conhecimento humano, toda vez que estiver em jogo a vida, e, no caso, a vida em seus elementos biológicos constitutivos, em sua própria materialidade”. Assim, quando se fala de disciplina para se referir a bioética, desde o início não significa falar da construção de um conhecimento ou prática isolada. (SANCHES, 2004, p.14) Para responder a extensa e desafiadora questão: o que envolve a Bioética? busca-se a evolução da própria definição através de uma das obras de maior relevância neste aspecto, a Encyclopedia of bioethics, publicada nos USA em 1978, onde se encontra na primeira edição que “bioética é entendida como sendo „o estudo 900 sistemático da conduta humana no âmbito das ciências da vida e da saúde, enquanto essa conduta é examinada à luz de valores e princípios morais [...]‟ (PESSINI, 2008, p.29) Na segunda edição, tendo ainda como editor-chefe Warren Thomas Reich, este novo campo do saber humano, a Bioética, é compreendida como “o estudo sistemático das dimensões morais – incluindo visão, decisão, conduta e normas morais – das ciências da vida e da saúde, utilizando uma variedade de metodologias éticas num contexto interdisciplinar”. Nota-se que após uma pequena trajetória, agora em 1995, as dimensões do conceito denotam a constante evolução sociocultural refletindo na área pública e científica, com inúmeros temas, desde a relação profissional-paciente; bioética e ciências sociais; cuidados em saúde; fertilidade de reprodução humana; pesquisa biomédica e comportamental; história da ética médica, saúde mental e questões comportamentais; sexualidade e gênero; ética da população entre outros de cunho nacionais e internacionais. A terceira versão da Enciclopédia, a cargo do editor-chefe Stephen Garrard Post, publicada em 2003, continua a ampliar os tópicos das anteriores enfatizando “o exame moral interdisciplinar e ético das dimensões da conduta humana nas áreas das ciências da vida e da saúde” mantendo a definição de Bioética. Porém inclui ampla gama de assuntos, uma série de artigos que retratam as pesquisas científicas da época e uma reflexão sobre a questão da ética dos negócios na área dos cuidados da saúde, a ética organizacional e administrativa, as políticas de saúde dos USA e o lucro e comercialização nos cuidados da saúde. (PESSINI, 2008, p.31) A Bioética passou pela fase do individualismo, às questões de identidade pública, no início do século XXI. Após transcorrer pela expansão e consolidação nos anos 1980 e início de 1990, seguida pela fase de revisão crítica a partir de então, se encontra atualmente na etapa de ampliação conceitual, conforme relata Garrafa (2004). Bioética na América Latina e no Brasil A necessidade de adaptação dos conceitos da bioética principialista aos costumes e cultura regionais, considerando o contexto histórico e social de nossa população, levou a América Latina a buscar uma identidade própria, que vai além de uma disciplina acadêmica limitada ao campo dos cuidados de saúde. A bioética conquista “uma fisionomia global, como movimento político e de questionamento do tecido social”, voltada aos “princípios de solidariedade e de justiça” que se tornam centrais no pensamento bioético latino-americano. (PESSINI, 2008, p.40) Em 2003 surge o projeto de elaboração de um Dicionário latino-americano de bioética, nascido de uma proposta apresentada à fundação da Rede Latino-Americana e do Caribe de Bioética da UNESCO. Esta obra recebeu a coordenação do filósofo e bioeticista argentino Juan Carlos Tealdi, que após quatro anos de intenso trabalho, o publicou no início de 2008 através da Universidade Nacional da Colômbia. O objetivo primordial do Dicionário, segundo Tealdi, na fala de Pessini (2008), é “pensar a bioética a partir das disciplinas e visões mais diversas, como um campo de encontro de uma reflexão crítica e normativa em relação à vida e ao viver na América Latina”. Convém ressaltar que apesar do enfoque e contextualização latinoamericana da bioética, o respeito e relativismo do universalismo ético foram mantidos, até mesmo como “uma dinâmica plural para a tarefa dialética de reflexão e crítica em bioética” (PESSINI, 2008, p.42) No Dicionário colaboraram autores provenientes de diversas formações, o que contribuiu para o enriquecimento da discussão e prática da bioética. Dos 184 trabalhos compilados, incide a participação de 28 autores brasileiros. A grande maioria se origina das três linhas tradicionais da bioética: a medicina e as ciências da saúde, o direito e as ciências jurídicas e a filosofia e o pensamento crítico. O VI Congresso Mundial de Bioética, realizado em Brasília (DF) no final de 2002, tendo o apoio da Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), com o tema “Bioética, poder e injustiça”, presidido por Volnei Garrafa, trouxe à tona as questões da bioética voltadas ao público e coletivo, transpondo as políticas e decisões do campo 901 individual ao coletivo, enfatizando diferentes dilemas morais, entre eles: “autonomia versus justiça/eqüidade, benefícios individuais versus benefícios coletivos, individualismo versus solidariedade”. (PESSINI, 2008, p.23) Garrafa (2008) uma das fortes vozes sobre bioética brasileira coloca que “há relação direta entre o processo da Reforma Sanitária Brasileira e o perfil da bioética que vem sendo desenvolvida no país”, sendo que “o Brasil demorou mais de 20 anos para incorporar formalmente a bioética como um campo de estudos” e adaptar as propostas mundiais à realidade brasileira foi tardia, se efetivando a partir de 1990. (PORTO e GARRAFA, 2008, p.2) Na globalização do século XXI a questão de saúde, segundo Garrafa (2004), deixou de ser sinônimo de cidadania, libertação de pessoas e povos se tornando objeto de consumo disponível aos indivíduos em condições financeiras de adquiri-la. Decorrente deste contexto surge outra questão: como a bioética pode contribuir na discussão de prioridades e distribuição justa e equitativa da saúde pública no país? Por conta do revisar o conceito de saúde no Brasil, nos deparamos com a trilogia Estado-saúde-educação. A conscientização da responsabilidade bioética também se torna possível a partir da reorganização institucional saúde-educação, com a implantação efetiva da “disciplina” de bioética, em cursos de formação de nível superior e especialização, voltada a realidade sanitária do país considerando o contexto sócio cultural e as políticas públicas de saúde vigentes. O desconhecimento da bioética e tais implicações mantêm as entidades de classe da área de saúde descompromissadas com a saúde pública e a interdisciplinaridade profissional, tornando a bioética individualista e elitizada. A saúde no Brasil e o PNPICs A partir de 1985, com a realização da VIII Conferência Nacional de Saúde, os princípios e diretrizes da Reforma Sanitária foram sistematizados. Após a promulgação da Constituição de 1988, com o início do SUS, passou a vigorar o estabelecimento de diretrizes com gestão única e controle social, para cada Estado, que deveria se responsabilizar pela saúde do cidadão. A publicação da Política Nacional do SUS visava garantir a integralidade na atenção à saúde, onde foi possível identificar o aprofundamento do cuidado em saúde, tanto quanto a busca de acesso a serviços e exercício da cidadania. A resolução nº 287, de outubro de 1998, do Conselho nacional de Saúde (CNS), aponta “a importância da ação interdisciplinar no âmbito da saúde e o reconhecimento da imprescindibilidade das ações realizadas pelos diferentes profissionais de nível superior” o que foi considerado “um avanço no que tange à concepção de saúde e à integralidade da atenção”. Desta forma se torna possível “compreender que várias práticas complementares têm sido desenvolvidas na rede pública estadual e municipal de saúde de diferentes estados brasileiros, de forma desigual e descontinuada devido à ausência de diretrizes específicas”. (BRASIL, CNS/1998) Ao considerar o documento da Organização Mundial da Saúde, publicado em 2002 com o título Traditional Medicine Strategy 2002-2005, deu-se início a organização e implantação da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS (PNPIC-SUS), embora desde 1999, tenha sido introduzida no Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS a consulta médica em Homeopatia e em Acupuntura. Após a descentralização, o objetivo foi de atender a lógica de dispositivo de expansão e de inserção em diferentes municípios brasileiros, segundo informação do Caderno Saúde Pública de 2007: Em 1985 foi celebrado o primeiro ato de institucionalização da Homeopatia na rede pública de saúde e desta data até a publicação da PNPIC muitos atos foram registrados. No entanto, um marco nesse processo foi a produção do diagnóstico nacional da oferta de práticas complementares no SUS e a criação de grupos de trabalho multiinstitucionais, para tratar da 902 Homeopatia, Medicina Tradicional Chinesa-Acupuntura, Medicina Antroposófica e Plantas Medicinais e Fitoterapia. (Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 23 (12):3066-3069, dez, 2007) O Brasil ao adotar o compromisso do pluralismo, originário da Ciência Política, no início da Nova República, referenciado por Dória (2008), defende o princípio de que “cidadãos socialmente iguais, em direitos e deveres, podem ser diferentes, em percepções e necessidades”, fato que no campo da saúde ainda sofre grande resistência. Porém ao publicar a PNPIC-SUS, através da Portaria Nº 973, em maio de 2006 o Ministério da Saúde deu mais um passo para a expansão da pluralidade na saúde brasileira. (Cad. Saúde Pública, RJ, dez, 2007) A dimensão política da saúde e educação é determinada pela estrutura social e econômica que institui o sistema político educacional, assim como as condições de desenvolver o conhecimento necessário para o crescimento, produtividade e adaptação do indivíduo ao seu momento histórico. A perspectiva ética das políticas sociais reflete na atuação prática, nos deveres e responsabilidades do grupo profissional, o que leva ao questionamento, com o olhar voltado a formação de profissionais da área de saúde, como tem ocorrido a prática clínica de multiprofissionais, originários de formações diversas, no que concerne a atitude ética, posicionamento de sigilo e conduta adequada diante de informações peculiares e específicas sobre o estado emocional de cada paciente atendido no SUS? Para maior entendimento da práxis destas terapias, coloco a seguir a própria definição utilizada pelo PNPICs para cada especialidade, sendo que a Medicina Tradicional Chinesa, onde se enquadra a Acupuntura, a Fitoterapia e Termalismo, podem ser executadas por equipes de saúde com formação multidisciplinar: A Acupuntura é uma tecnologia de intervenção em saúde que aborda de modo integral e dinâmico o processo saúde-doença no ser humano, podendo ser usada isolada ou de forma integrada com outros recursos terapêuticos. (PNPIC-SUS /2006) Convém lembrar que nas profissões da área de saúde, cabe a cada conselho regional determinar leis e regulamentos, dentre eles o código de ética relativo às funções e atribuições, segundo sua formação acadêmica. Não existe uma prescrição ou questionamento “subjetivos de ação” a serem adotados por pessoas e profissionais de saúde com atuação holística, a partir de um princípio universal de valores, ministrados em curso de pós-graduação. Os termos aqui referenciados são originários da concepção de Kant (2004), sobre a lei moral: “Age de tal modo que a máxima da tua vontade possa sempre valer ao mesmo tempo como princípio de uma legislação universal” (KANT, 2004, 40) Bioética na formação de profissionais Ao analisar as justificativas apresentadas na Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos de 2005, elaborada a partir de estudos e discussões internacionais entre renomados especialistas na área científica, ética e da saúde do mundo inteiro, pontuo que a saúde não depende somente das pesquisas científicas e tecnológicas, mas também de fatores psicossociais e culturais. Assim como a identidade de uma pessoa inclui dimensões biológicas, psicológicas, sociais, culturais e espirituais, a formação de profissionais de saúde que interagem neste contexto de pluralismo cultural deveria também possuir tal conotação. Mas o que se percebe são a carência de adequada formação bioética e de compromisso com o universo e as questões da qualidade de vida humana. O tema, foco central deste artigo, parte do pressuposto de dois objetivos delineados na Declaração de 2005, especificamente o III e V. Então considerados, a mola propulsora para a formação de recursos humanos, programas e projetos no âmbito de profissionais de saúde, que buscam além da graduação uma especialização 903 para atuar na área do “equilíbrio e potencialização da saúde” em Medicina Tradicional Chinesa (MTC) e Acupuntura (ACP), transcritos a seguir: III - promover o respeito pela dignidade humana e proteger os direitos humanos, assegurando o respeito pela vida dos seres humanos e pelas liberdades fundamentais, de forma consistente com a legislação internacional de direitos humanos; V - promover o diálogo multidisciplinar e pluralístico sobre questões bioéticas entre todos os interessados e na sociedade como um todo; (UNESCO, 2005) Até o momento do VI Congresso Mundial de Bioética, as questões éticas no Brasil estiveram voltadas aos profissionais de saúde de forma individual, numa visão unilateral e exclusiva a cada classe segundo seus próprios conselhos de ética. A interação transdisciplinar entre a equipe de saúde, a relação profissionalpaciente ou ainda a relação serviços de saúde-usuário caminhavam lentamente. A bioética que inicialmente refletia apenas a preocupação de médicos e suas equipes com o interagir com pacientes tornou-se mais abrangente. Na atualidade, Soares (2005) aponta que alguns estudiosos consideram a bioética como transdisciplinaridade, numa perspectiva de diálogo entre diferentes conhecimentos cuja fusão gera ações e reflexões de consenso moral e epistemológico além de sua abordagem primordial de formação. (SOARES, p. 12, in VIEIRA, 2005) Somente deste ponto de vista a bioética retoma o sentido amplo e veraz do conceito delineado por Potter, de “uma ponte para o futuro”. Beauchamp e Childress, com a obra Princípios da ética biomédica, tornaram conhecidos os quatro princípios: respeito pela autonomia, beneficência, não-maleficência e justiça, os quais levam a bioética ao campo do direito e das ciências jurídicas. O importante alerta feito por Soares (2005) sobre o diálogo transdisciplinar para efetuar uma ponte construtiva é o de que: “sem ignorar as subjetividades e sem se deixar levar pelo mito da neutralidade científica, no diálogo bioético o profissional deve demonstrar sintonia epistemológica e metodológica em relação à área que representa”, considerando que apesar dos riscos inerentes é o melhor a ser aplicado na bioética. (SOARES, 2005, p. 13) Os saberes, advindo de campos diversos, como no caso dos profissionais de saúde, especializados em MTC e ACP, devem comungar de uma discussão bioética voltados à unanimidade do respeito e dignidade do ser humano em defesa da vida com qualidade, responsabilidade e cidadania na saúde pública ou privada, individual ou coletiva, consciente de que isto é um direito do cidadão. A perspectiva bioética das políticas públicas de saúde e educação reflete na formação dos profissionais de saúde e sua atuação no mercado de trabalho, nos deveres e responsabilidades do grupo profissional. Desta forma se torna necessário pesquisar a compreensão da prática bioética em saúde, especificamente na especialização de MTC e ACP, onde convergem profissionais advindos de formações distintas, observando a contextualização da bioética transdisciplinar. Assim se justifica o estudo de caso sobre o tema: “formação de profissionais de saúde frente à exigência da bioética, nas escolas de especialização de MTC e ACP” e a implantação da disciplina de bioética. Estudo de caso e discussão dos dados Existem no Estado do Paraná cerca de vinte cursos reconhecidos pelo MEC que atuam muitas vezes em mais de uma cidade, através de sua rede de filiais. Devido a esta rede de atuação torna-se mais difícil delimitar o número de cursos e alunos em formação. Dentre estes citados, em apenas tres se encontra a disciplina de Bioética. Especificamente no currículo do 904 curso pesquisado, os conteúdos ministrados não abordam o tema “Bioética”, mas sim “Ética” de forma geral. Tal fato, tão somente vem comprovar o despreparo de profissionais comprometidos com a área de Ética e Saúde que possam estar realizando “a ponte para o futuro”, originária da proposta de Potter datada de 1971. Além da análise da grade curricular nos cursos de Pós graduação de ACP/ MTC, outro objetivo deste estudo de caso consta da pesquisa de abordagem qualitativa, levantamento de dados sobre as características, necessidades, formação e compreensão da bioética por profissionais de saúde em formação, futuros atuantes na área do PNPICs. O local da pesquisa transcorreu numa classe do citado curso, de Universidade privada, ministrado por instituto especializado em MTC. O grupo composto por 10 voluntários, entre os quais fisioterapeutas, enfermeiros e fitoterapeutas, com idade entre 27 e 41 anos, todos trabalhando na área de saúde. A coleta de dados constou em primeira instância de questionário com questões abertas, seguido de escala de avaliação de Magill, sobre as questões anteriormente abordadas. Nas perguntas abertas, entre outros, foi abordado sobre “O que é Bioética”, “Quais as principais características em sua formação profissional?” e “Qual a importância da disciplina Bioética na formação transdisciplinar?”. Entre as questões a serem classificadas na escala de 0 a 10, constou: “A necessidade de levar em conta os interesses, valores e expectativas dos pacientes”, “A primazia de conhecimento do especialista em ACP na definição de técnicas de tratamento em relação às opiniões dos pacientes”. No grupo pesquisado, quanto à importância da disciplina de Bioética em curso de pós-graduação ACP/MTC, 60% apontaram como grau 10, o máximo de importância, 20% consideraram como muito importante e apenas 20% de média importância. Sobre a importância desta disciplina em curso de pós-graduação ACP/MTC neste grupo 80% apontaram como grau 10, o máximo de importância, 10% consideraram como muito importante e apenas 10% de média importância considerar a opinião dos pacientes. Porém este mesmo grupo colocou o índice de 50% com grau 10, o máximo de importância, para a primazia do especialista, e os outros 50% tem opinião com valores e teor diversos. Os dados apresentam que a necessidade de levar em conta os interesses, valores e expectativas dos pacientes com 80% em nota máxima, se contrapõe a que 50% destes consideraram a primazia de conhecimento do especialista em ACP sobre as opiniões dos pacientes. Tais levantamentos possibilitaram a elaboração de algumas considerações, que de modo algum podem ser denominadas finais, mas sim, o princípio de uma longa e próspera jornada merecedora de estudo e ampliação do tema abordado. Considerações Ao considerar a discrepância apresentada na questão sobre “a opinião e interesses dos pacientes contrapondose a primazia do terapeuta”, percebe-se a falta de coesão e clareza quanto aos conceitos da bioética, fato que vem comprovar o desconhecimento dos quatro princípios fundamentais da Bioética, mais especificamente quanto ao direito de autonomia. A necessidade de implantação da disciplina de Bioética, ministrada por profissionais preparados para tal, que possam levar o profissional transdisciplinar de saúde, a pensar a bioética a partir das disciplinas e visões mais diversas, como um campo de encontro de uma reflexão crítica e normativa em relação à qualidade de vida e direitos do paciente que se encontra sob sua orientação. Dar continuidade a pesquisa para melhor fundamentar a comprovação e estudo da Bioética entre os profissionais de Saúde no Brasil. Bibliografia de referência: BUB, M.B.C. Ética e prática profissional em saúde (-a09v14n1-) 905 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 23(12):3066-3069, dez, 2007 BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde (CNS) Resolução 287 de OUT/1998 http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/1998/Reso287.doc BRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS - PNPIC-SUS / Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. - Brasília: Ministério da Saúde, 2006. 92 p. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria Nº 971, De 3 De Maio De 2006. Aprova a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde. DÓRIA, P.R. Getúlio, FHC e Lula: Devoção Popular e a Santíssima Trindade. Curitiba:Juruá, 2008. 340p. GARRAFA, V. 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Sessão da Conferência Geral da UNESCO 906