companheiras e companheiros brizolistas

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COMPANHEIRAS E COMPANHEIROS BRIZOLISTAS
Hoje, é um dia em que já não cabem propostas.
Estamos aqui para ratificar uma decisão já tomada pelo Partido desde o
final de 2006, quando aceitamos trocar nossas propostas e nosso ideário por
um ministério no governo recém-eleito e contra o qual vínhamos fazendo
oposição desde o tempo de Brizola. Nestes quase dez anos, a decisão de
continuar no governo foi mantida todos os dias. Atravessamos os escândalos
no governo, inclusive no nosso ministério, sem uma crítica, uma autocrítica,
nem ao menos uma análise sobre o que acontecia no País, no governo e em
nosso partido. Assistimos a timidez das políticas sem oferecer propostas mais
ousadas.
Ninguém pode negar avanços sociais e econômicos ao longo deste
período. Mas não deveríamos deixar passar os equívocos, por omissão e por
ação. Apesar de avanços no número de alunos no ensino superior fechamos
os olhos à falta de prioridade à educação de base; não podemos deixar de
elogiar programa como “mais médicos”, mas criticando o caos na saúde
pública; tínhamos obrigação de denunciar a corrupção; não podíamos nos
calar diante do desastre criado pelo aparelhamento de nossas estatais,
especialmente da Petrobrás, símbolo do progresso, do potencial e do engenho
brasileiro, criada por nosso maior líder que foi Getúlio Vargas; calamos diante
da violência nas ruas; assistimos passivamente, arrogantemente, as
manifestações do povo nas ruas.
Chegamos a 2014 com o partido entregue ao governo. O povo está nas
ruas e nós lutando por um quartinho no fundo do palácio.
Nem ao menos dedicamos um minuto para pensar por que o povo está
nas ruas, por que seu descontentamento e o que fazer para o Partido
reencontrar sua aliança com o povo e com a história.
Para ficar no governo de hoje, abandonamos a história.
Sobretudo, não estamos levando em conta o esgotamento do atual
modelo.
As bases do rumo que o Brasil segue desde 1994 estão esgotadas,
enferrujadas.
Por vinte anos baseamos nosso destino na busca do:
- crescimento econômico tradicional,
- do controle da inflação,
- da transferência assistencial de rendas para os mais pobres,
- da democracia parlamentar.
O crescimento tradicional se esgotou.
É irresponsabilidade histórica continuar insistindo no rumo de uma
economia baseada na exportação de bens primários e na produção de bens
industriais dos anos 50 e 70. Ainda mais, para manter o governo nem
tomando decisões muito arriscadas:
- gasta R$ 170 bilhões por ano de incentivos fiscais;
- aceita elevados déficits sistemáticos em conta corrente, além de déficit
na balança comercial, o que não acontecia desde 2000;
- comemora o perfil de nosso produto que nada tem da economia do
conhecimento que caracteriza o mundo de hoje;
- vê a economia se desindustrializando sem fortalecer um setor de
criação de economia do conhecimento;
- incentiva e induz uma economia baseada no aumento do consumo à
custa da necessária poupança para a construção do futuro;
- temos uma taxa de poupança interfira 13%, a menor taxa entre os
países representativos da economia mundial, provocando o pequeno
crescimento do nosso PIB e sacrificando o futuro;
- não consegue domar os juros, nem a inflação;
- temos uma das piores posições do mundo na classificação de
competitividade;
- comemora-se sermos o sétimo PIB, já fomos o 5º, sem perceber que
per capita estamos em 54ª posição e no Índice de Desenvolvimento Humano
em 85º lugar, nosso PIB pode ser grande, mas é velho e mal destribuído.
- nossos preços sobem em taxas que assustam a população, com medo
da carestia.
- o mercado de trabalho (bandeira historicamente ligada ao PDT): está
aquecido (com taxa de desocupação em 7,1%), mas a qualidade do emprego
está muito aquém do que o Brasil precisa.
Os postos de ocupação criados têm baixo salários, implicam em
altíssima rotatividade e estão em geral ligados a atividades no setor de serviços
(em geral com baixa produtividade). Além disso, há um número muito
elevado de pessoas que não procuram emprego: Estima-se que 62,6 milhões
de brasileiros estão fora da força de trabalho. São pessoas na idade de
trabalhar, mas que não estão ocupadas nem procurando emprego.
A base para a manutenção da estabilidade monetária se esgotou.
Nos últimos anos houve um relaxamento nas âncoras que mantém a
estabilidade de preços. Os gastos públicos têm previsões muito preocupantes
para o futuro próximo. A âncora cambial se esgota, devido ao seu impacto
negativo sobre nossa competitividade internacional. Somos obrigados a elevar
taxas de juros. A lei de responsabilidade fiscal vem sendo desrespeitada.
A base das transferências assistenciais está se esgotando.
O programa de bolsas tem um papel fundamental na necessária
generosidade para enfrentar a pobreza extrema de milhões de nossos
compatriotas excluídos do essencial para a sobrevivência. Mas sem a garantia
de escola de qualidade ele virá um programa assistencial, não um programa
transformador social. O programa de transferência de renda completa vinte
anos desde seu início, com características educacionais, em um governo do PT
com a participação do PDT em Brasília; 15 anos desde sua expansão para
todo o Brasil. Graças ao governo Lula e Dilma a ampliação permitiu atender
praticamente todos que dela precisam. Sem esta ampliação o quadro da
pobreza teria continuado da forma assustadora e vergonha-se do passado. Mas
esta base social das últimas décadas demonstra esgotamento estrutural pela
incapacidade de oferecer uma porta de saída clara e eficiente que faça com que
nenhum brasileiro precise mais dela;
O governo não tem sido capaz, nem demonstra compromisso em
transformar os “beneficiários de bolsas” em “geradores de renda”.
Vale lembrar, que apesar de seu pequeno custo como proporção do
PIB, apenas 0,5%, hoje 76% da receita federal vão para gastos de
transferências de renda, no lugar de investimentos para gerar renda. E esta
proporção cresce de maneira que nos próximos dez anos o governo estará
completamente esgotado em suas finanças, se esta população não migrar da
necessidade de bolsa para a geração de renda.
Nossa democracia se mostra não apenas esgotada, mas viciada.
Esgotada pelos vícios da corrupção generalizada em todos os setores da
sociedade, muito especialmente no comportamento político:
- com regras eleitorais atreladas ao poder econômico e que dificultam
renovação;
- sem estratégia para o longo prazo e viciado no imediatismo;
- sem uma vida partidária, sem identidades ideológica e moral;
- totalmente pragmática e desprogramática;
- com tolerância à corrupção;
- sem uma convivência estável entre os três poderes.
Em consequência, uma democracia desacreditada e desmoralizada
como o povo demonstra nas ruas. Vivemos uma guerrilha organizada pelas
redes sociais, sem lideranças, sem programas, sem partidos; com
manifestações, que unem desiludidos e desesperados, capazes de inviabilizar o
bom funcionamento da sociedade e criando um caldeirão propício para
tentativas autoritárias, vindas de quem está no poder ou de quem faz
oposição; e sem prioridades comprometidas com a transformação social, que
deve ser a obrigação de todo partido progressista como o nosso, criado sob a
liderança de Brizola.
Companheiros e companheiras, nos últimos meses discute-se qual será
o legado a ser deixado pela Copa do Mundo. É cedo para saber se qualquer
dos legados prometidos serão cumpridos:
- se os estádios serão pagos pelo setor privado;
- se haverá melhoria substancial na mobilidade social e por que esta
melhoria precisava de uma Copa, uma vez que todos os recursos e decisões de
investimento são nacionais;
- se haverá uma elevação da renda que compõe os gastos.
Mas, desde já pode-se dizer que um legado da Copa foi a descoberta
pelo povo de que além da corrupção no comportamento dos políticos, há
também uma corrupção na definição das prioridades, optando-se por
investimentos para o presente dos ricos, sem compromissos com as
transformações estruturais, sociais, econômicas, culturais que o País precisa
para seu futuro e nossa população pobre precisa para ser incluída
definitivamente, estruturalmente, sem necessidade de transferência de renda.
O povo descobriu que nós, os políticos e nossos partidos não estamos
sintonizados com o espírito das ruas. Apesar disso, ruas não entraram em
nossas análises para a decisão que tomaremos nem na definição das
prioridades que deveríamos levar ao governo que nos propomos continuar
apoiando.
Repito, o poder está nas ruas e nós estamos buscando um quartinho no
palácio.
Esgotamento das bases do modelo de desenvolvimento e
funcionamento da sociedade e da economia está provocando uma
implosão.
O futuro está implodindo no vergonho estado de nossas escolas,
mesmo depois de 12 anos de governo do PT e 8 de nossa participação nele.
As tentativas de erradicação do analfabetismo e as mudanças na educação de
base iniciadas em 2003, inclusive com o programa Escola Ideal para
implantação de horário integral pela federalização da educação de base, nos
moldes defendidos por Brizola e Darcy, foram interrompidas a partir de 2004.
A ideia de um programa de federalização entregue ao governo em Setembro
de 2011 nunca foi nem ao menos considerada. O resultado é o aumento no
número de analfabetos em 2013 em relação a 2012.
Tudo isso por fazer a opção e definir prioridade pela ampliação do
Ensino Superior. O governo Lula e Dilma com programas de cotas e o
PROUNI foram capazes de ampliar substancialmente o número de alunos no
ensino superior, e mudar o perfil social e racial destes alunos, mas este sucesso
se esgota ao esbarrar na fragilidade dos alunos que nele entram depois de um
ensino médio insuficiente.
O futuro do País está implodindo nos limites de nossa economia sem
poupança, sem capital conhecimento, com excesso de gastos públicos, com
dependência de incentivos fiscais, sem possibilidade de reduzir os juros.
O futuro do País está implodindo na necessidade de transferência de
renda sem as quais em vez de gerar renda nossa população se mantém na
assistência e cai de volta na fome e na miséria, cada vez que a inflação corrói o
valor da bolsa.
O futuro de nosso País está implodindo em uma democracia corrupta,
corruptora, viciada no imediatismo, sem partidos programáticos, sem políticos
atentos e comprometidos com o povo, uma democracia sob suspeição pelo
povo.
Está na hora do PDT recuperar os sonhos de sua Fundação, reler o que
dizia Brizola e os demais líderes históricos e apresentar um programa para o
futuro do Brasil. A proposta apresentada pelo PDT na campanha presidencial
de 2006, sob o titulo de “A Revolução pela Educação – Como Fazer!”,
poderia ser a base para uma revisão que permitisse ao partido ter um
programa para o futuro. O ideal seria que tivéssemos um candidato a
presidente, o que propus com a tranquilidade de quem há seis meses disse que
não aceitaria ser este candidato. Mas, se não escolhesse um candidato próprio,
que ao menos cumpríssemos nossa obrigação com o País e o nosso povo
entregando aos candidatos as nossas propostas alternativas transformadoras.
A análise destes tempos vai nos acusar de termos perdido o vigor
transformador que caracterizou nossa fundação e nossa política até
recentemente.
Ouvi a algumas semanas do presidente Lupi que é muito difícil sair de
um governo depois que entramos nele e nos acostumamos com cargos. Ele
falava mais em relação aos nossos problemas locais, onde os companheiros
não aceitam sair dos governos estaduais. Mas, se é difícil sair do governos,
muitas vezes é irresponsabilidade continuar neles, escolhendo o silêncio e o
apoio cego, humilhado, subordinado e alienado.
O povo está nas ruas, não é hora de silenciar para manter um quartinho
no palácio.
Perder a sintonia com o descontentamento das ruas, deixar de
apresentar, defender e lutar pelas reformas que o Brasil necessita, fiscal,
educacional, industrial, agrícola, política é ignorar os sonhos de Brizola;
manter-se na subserviência é não lembrar mais de Brizola; ser apenas um
puxadinho de partidos no poder em troca um ministério é romper com
Brizola. Como seus herdeiros, não temos este direito.
Sem a liderança do Lupi nos anos seguintes à morte do Brizola,
dificilmente o PDT teria sobrevivido, mas se continuar nosso rumo conforme
os últimos anos, o PDT não sobreviverá como uma entidade política para
fazer as reformas que o País precisa. Além de conservador, será um partido
apêndice. Não temos o direito de deixar que isso aconteça.
Mas, as decisões já estão tomadas para 2014, não adianta propor
qualquer rumo no lugar do atrelamento. Resta recuperar depois os erros do
presente. Olhar para 2018 e os quatro anos que temos até lá. Nos preparando
para enfrentar o esgotamento e propor um novo rumo para o País graças a
um novo rumo para nosso PDT.
Nunca foi tão importante quanto agora gritar bem alto “Viva Brizola” e
fazermos com que este grito seja coerente com nossas posições e lutas, não
apenas um grito vazio, sem sintonia com a realidade.
Viva Brizola, viva o PDT.
Cristovam Buarque.
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