Edição n°1211/1212: Prolegômenos da grande explosão

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Núcleo de Educação Popular 13 de Maio - São Paulo, SP
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CRÍTICA SEMANAL DA ECONOMIA
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EDIÇÃO Nº 1211/1212– Ano 28; 3ª e 4ª Semanas Outubro 2014.
Prolegômenos da grande explosão
. JOSÉ MARTINS.
A longa marcha da acumulação de capital na China, iniciada timidamente em 1949 e
acelerada com velocidade máxima a partir de 1980, é bruscamente interrompida
pelas necessidades particulares dos capitalistas norte-americanos e pela sua
correspondente política militarista na área asiática.
Depois de todas nossas investigações anteriores, podemos concluir que a queda da produção e
da produtividade do trabalho na manufatura chinesa é resultado de corrosiva superprodução de
capital e correspondente queda da taxa geral de lucro. E esta última se manifesta como
acentuada queda dos preços de produção da indústria. A queda da taxa geral de lucro se
manifesta na economia chinesa, como de resto em todas as modernas economias do século
XXI, como incurável processo deflacionário. Veja no gráfico abaixo essa variação básica dos
preços ocorrida recentemente na maior indústria de montagem do universo.
Fonte: National Bureau of Statistics of China 21-10-2014
Desde 2012, os preços de produção variam negativamente na China. Em Agosto 2014, o
Índice do Preço de Produção (PPI em inglês) das manufaturas chinesas caiu 0.2 por cento
frente ao mês anterior e 1.2 por cento sobre o mês de Agosto/2013. Entre Janeiro/Agosto 2014,
o PPI caiu 1.6 por cento em média. Como nos casos do Japão e da Alemanha, essa continua
deflação dos preços industriais sinaliza também perigosa estagnação da produção e valorização
do capital na China. De acordo com a experiência histórica a deflação é etapa necessária para a
depressão econômica. Porém, não suficiente, como demonstra o caso japonês, que já vive
processo similar de deflação há mais de quinze anos. Similar mas não igual. Há que se
observar importantes diferenças do que se passa no Japão e na China. A deflação em uma
economia dominante, como a japonesa, só se realizará em depressão aberta se ocorrer no
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mercado mundial uma simultânea crise econômica geral, catastrófica. Mas o mesmo processo
deflacionário em uma economia dominada (como a chinesa) pode se realizar em depressão
mesmo no caso de uma crise periódica global apenas parcial. Como ocorrido na Argentina,
entre 2000 e 2003. Tratava-se, porém, de uma economia sem grande peso no comércio
internacional e sua depressão não passou da fronteira nacional. No caso da China, economia
com papel central no comércio e nas cadeias globais de montagem industrial, o impacto da
depressão no restante da economia mundial seria determinante para empurrar as grandes
economias para a crise geral. Voltaremos mais abaixo a considerar essa possibilidade.
Nota bene: no embalo do desenvolvimento desigual e combinado do mercado mundial, essas
diferentes vulnerabilidades internacionais entre economias dominantes e dominadas decorrem
de mecanismos anticíclicos que só se encontram disponíveis nas economias dominantes. Os
mecanismos anticíclicos presentes no centro do sistema faltam na periferia. Por exemplo, o
poderosa arma de uma moeda forte (plenamente conversível no mercado cambial mundial),
como o yen japonês, comparado a uma moeda fraca (absolutamente inconversível) como o
yuan chinês, a rúpia indiana, o rublo russo, o real brasileiro, e outras inutilidades.
SUPERPRODUÇÃO OU SUPERACUMULAÇÃO? – Os problemas da esfera da produção
sempre se manifestam como problemas da esfera da circulação propriamente dita. Essa
sequência dos fenômenos constitui lei geral. A atual superprodução de capital na China– e as
decorrentes quedas da taxa de lucro e dos preços industriais – se manifesta então como
superacumulação do capital e queda da taxa de acumulação na economia. A deflação dos
preços industriais deprime o nível de reprodução e, portanto, da propriedade privada
especificamente capitalista, materializada dinamicamente como capacidade de produção do
capital. Essa dinâmica transparece na realidade imediata chinesa pela rápida queda da taxa
bruta de investimentos em capital fixo, como ilustra o gráfico abaixo:
Fonte: National Bureau of Statistics of China 21-10-2014
Nos primeiros três trimestres de 2014 (janeiro-setembro), os investimentos em capital fixo
cresceram 16.1%. Isto representa desaceleração de 1.2 pontos percentuais frente ao registrado
na primeira metade do ano (janeiro-junho), e de 4.1 pontos percentuais frente a igual período
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do ano anterior (janeiro-setembro 2013). A desaceleração dos investimentos na economia
chinesa é acompanhada por uma desaceleração ainda maior dos investimentos externos diretos
(FDI, na sigla em inglês). Os capitalistas de outros países diminuem significativamente seus
investimentos no país. Segundo relatório divulgado pelo Ministério do Comércio da China, o
FDI voltou a cair pesadamente no mês de Julho de 2014, enquanto os investimentos do país no
exterior (ODI, na sigla em inglês) aumentaram velozmente. Nos próximos anos, os ODI
chineses devem ultrapassar os FDI. Quer dizer, será registrado um déficit nos fluxos de
investimentos diretos externos no país. Importante mudança estrutural: de uma economia
conhecida como grande receptora de FDI, agora a China já se tornou a terceira maior
fornecedora mundial de ODI.
O problema é altamente qualitativo. Tanto os capitalistas internos, quanto os externos,
cortam drasticamente os investimentos na indústria chinesa. Principalmente os externos.
Segundo as autoridades chinesas, o FDI na indústria de manufaturas caiu 14.26% no período
janeiro-julho 2014. Os principais investidores externos são Hong Kong, Taiwan, Singapura,
Coreia do Sul, Japão, Estados Unidos, Alemanha, França e Holanda. Somados, eles
participam com 93.9% do total do FDI na China. Entretanto, no mesmo período, os capitalistas
japoneses cortaram 45.4% dos seus investimentos na China. Os capitalistas dos Estados
Unidos e da União Europeia cortaram 17.4% e 17.5%, respectivamente.
EPÍLOGO – Os capitalistas estrangeiros cortam seus investimentos nas linhas chinesas de
montagem final das cadeias produtivas globais porque a taxa média de lucro no “chão de
fábrica do mundo” não acompanha mais a taxa geral de lucro reguladora do mercado mundial.
Essa imposição da totalidade da valorização do capital é determinante para todas as economias
envolvidas no comércio internacional. Em particular para as economias dominadas da periferia
do sistema, onde predomina a extração da mais-valia na forma absoluta. A China puxando a
fila. Com a taxa de lucro desfalecida, embora nominalmente (apenas nominalmente) mais
elevada que no centro do sistema, apaga-se o fogo da acumulação na periferia. Antes que o
mesmo ocorra nas economias centrais.
Torna irreversível, portanto, o movimento de fuga do capital investido na indústria
manufatureira chinesa – e em outros importantes setores domésticos, como a construção civil,
agricultura, comércio exterior, etc. Este movimento deve acelerar catastroficamente à medida
que se aproxima o encerramento de mais um período de expansão cíclica do mercado
mundial, monopolizado em grande medida pela economia norte-americana. Isso é
extremamente importante, pois a derrocada da China sinalizará aos Estados Unidos e às
demais potências econômicas mundiais a abertura do mais pesado período de desvalorização
do capital desde o final da 2ª Grande Guerra Mundial (1945).
Esse papel determinante da China na crise da economia global sempre existiu. Pelo
menos desde meados do século 19, quando as modernas crises econômicas especificamente
capitalistas já ditavam a régua e o compasso da superprodução e superacumulação do capital
mundial. A China, em menor medida a Índia, sempre condensou explosivamente todos os
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ingredientes característicos do desenvolvimento desigual e combinado no mercado capitalista
mundial, quer dizer, os infortúnios de uma economia periférica e dominada nas eras do
colonialismo (Inglaterra) e do imperialismo (EUA).
A Velha China foi sepultada pela Inglaterra no inicio do século XIX. A Nova China
esperou até o final dos anos 1970 para ser transformada pelos EUA no “chão de fábrica do
mundo”. Agora se fecha essa mais recente etapa da história moderna da China: a longa marcha
da acumulação de capital na China, iniciada timidamente em 1949 e acelerada a partir de 1980,
é interrompida pelas necessidades econômicas nacionais dos capitalistas norte-americanos e
pela sua correspondente política militarista na área asiática. Como será decidido o futuro da
China? Necessariamente condicionado, em primeiro lugar, às novas relações materiais criadas
nos últimos setenta anos no país e, simultaneamente, na área asiática e na totalidade da
economia mundial. E, dentro destas novas relações materiais, condicionado principalmente
pela radical metamorfose, com velocidade máxima, entre 1970 e 2014, de quase um bilhão de
camponeses no maior contingente de proletários do exército industrial de reserva globalizado.
Essa inaudita metamorfose mexeu com as peças do tabuleiro mundial da luta de classes. A
criação em tão pouco tempo histórico deste novo e gigantesco contingente de proletários
industriais é a maior e a mais revolucionária novidade na cena global desde os anos 1920. E
certamente jogará papel central no desenrolar da guerra civil chinesa e na possível vitória da
revolução proletária mundial – que terá possibilidades maiores de acontecer na esteira da
primeira crise econômica catastrófica desde a grande depressão mundial de 1930.
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