Filtragem do ruído “speckle” em componentes de intensidade de imagens SAR polarimétricas Coutinho A.D.S. , Ling L.L. DECOM FEEC Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) [email protected] , [email protected] Resumo – Este artigo tem como objetivo mostrar a filtragem do ruído “speckle” de imagens de sensoriamento SAR polarimétricas em áreas homogêneas empregando um filtro de média espectral. Para tanto serão brevemente abordados alguns conceitos freqüentemente adotados para definir tais imagens, como matrizes de retroespalhamento, e matrizes de coerência polarimétrica. Além disso o modelo de ruído multiplicativo empregado para descrever os componentes polarimétricos isoladamente, será discutido. Palavras-chave: sensoriamento remoto, imagens SAR polarimétricas, “speckle”, ruído multiplicativo. 1. Introdução O sensoriamento Remoto nos dias de hoje tem uma vasta gama de sensores orbitais e aerotransportados à disposição dos usuários e neste conjunto estão sendo usados cada vez mais os radares de abertura sintética ou SAR. O SAR é um sensor ativo, ou seja, é captado um sinal que é uma resposta a um sinal previamente enviado pela plataforma que contém o sensor. Procedimento contrário ao caso de um sensor passivo, em que o sinal captado corresponde apenas ao que é refletido na superfície terrestre oriundo da luz solar. O radar é concebido para trabalhar na faixa das microondas do espectro eletromagnético (EM), o que garante vantagens como ser “invisível” a nuvens, fumaça ou neblina, que prejudicam a visibilidade e conseqüentemente a capacidade de extrair informações em um sensor remoto que trabalha na faixa do EM visível [2,4]. Um componente importante em estudo de radares é obtido quando se considera a polarimetria das ondas eletromagnéticas, tendo em vista que uma onda eletromagnética pode ser analisada sob diferentes tipos de polarização. Para maiores detalhes sobre o processo de polarização eletromagnética, ver ref. [2]. Na seção 2, serão vistos alguns conceitos básicos utilizados no presente trabalho, e na seção 3 será descrito o ruído “speckle”, característico de imagens SAR, bem como o procedimento para a sua filtragem. Finalmente, na seção 4 será descrito um teste de filtragem em uma imagem SAR. 2. Formas de descrever o processo de espalhamento eletromagnético em imagens SAR polarimétricas Nesta seção são descritos alguns dos parâmetros comumente empregados para retratar os dados obtidos em uma imagem SAR polarimétrica, e que são úteis para o entendimento do processo de ruído “speckle”. 2.1. Matriz de retroespalhamento e vetor alvo de espalhamento Considerando o caso particular de uma onda plana monocromática, o campo elétrico pode ser representado em uma base ortogonal ûrI , ûθI , ûφI ( ( correspondente ao sinal incidente, e ûrR , ûθR , ûφR ) ) correspondente ao sinal refletido. Os vetores unitários ûrI e ûrR são apontados no sentido da propagação da onda, enquanto os demais são componentes perpendiculares que definem o vetor campo elétrico ou vetor de Jones. Este pode ser definido em termos dos sinais incidentes e refletidos em um determinado ponto da superfície como na Eq. 1. EφR SφSφI R = Eθ SθSφI SφSθ I EφI (1) SθSθ I E I θ Para o caso monoestático, onde a antena receptora é a mesma que transmitiu o sinal, e onde a convenção adotada para descrever o processo de espalhamento é chamada de “alinhamento retroespalhado”, ou BSA, os vetores ûrI e ûrR são opostos, e a matriz S da Eq 1. é denominada matriz complexa de retroespalhamento S . Tal matriz tem coeficientes complexos, e sendo descrita em termos de uma base horizontal-vertical correspondente aos componentes de ondas polarizadas verticalmente e horizontalmente é dada conforme a Eq. 2. S S (ûH ,ûV ) = HH SVH S HV (2) SVV Para o caso de meio de propagação recíproca (caso monoestático aqui considerado), a matriz de retroespalhamento é simétrica, e os termos da diagonal secundária (que fornece a potência de retorno no canal denominado “polarizado cruzado”), são iguais. Os termos da diagonal principal fornecem a potência de retorno no canal “copolarizado”. Uma forma de se representar a matriz de retroespalhamento é através do vetor alvo de espalhamento k . Este vetor é obtido pela Eq. 3: k = 1 Tr ( SΨ ) (3) 2 Onde Tr é o operador traço de uma matriz, e Ψ é um conjunto de matrizes 2x2 complexas que são construídas como conjuntos de vetores ortogonais sobre o produto interno hermitiano [2]. Um conjunto muito utilizado para esta representação é o conjunto de matrizes base de rotação de Pauli, que fornecem a matriz de coerência polarimétrica T a ser discutida na próxima seção. Utilizando tais conjuntos, o vetor k é representado como na Eq. 4. S HH + SVV 1 S HH − SVV (4) k= 2 2 S HV 2.2. Matriz de polarimétrica T coerência Os espalhamentos das ondas eletromagnéticas na superfície terrestre não correspondem apenas a ondas completamente polarizadas, mas também a ondas parcialmente polarizadas que são geradas pela interação da radiação eletromagnética com alvos que variam no espaço e no tempo. Tal conceito é denominado de “alvos distribuídos” que são não determinísticos. Tal fato decorre de diversas situações: velocidade do vento provocando movimentos na superfície da água, bandos de pássaros voando, o radar que ao se movimentar recebe mais de um sinal correspondente a um mesmo ponto da superfície, etc. A matriz S previamente descrita corresponde a uma representação de um ponto em um determinado momento e é relativa ao espalhamento determinístico, obtido pela teoria de polarização eletromagnética. Para o caso de descrever o espalhamento não-determinístico ou aleatório, utiliza-se entre outros conceitos, a matriz de coerência polarimétrica, obtida pelo produto externo do vetor k descrito na Eq. 4. com seu complexo conjugado transposto em cada momento de medição e tirando-se a média espacial dos dados [1,2]. A matriz de coerência é dada pela Eq. 5: T= 2 S HH + SVV 1 ( S HH − SVV )( S HH + SVV ) * 2 2 S (S + S ) * HV HH VV ( S HH + SVV )( S HH − SVV ) * S HH − SVV 2 2 S HV ( S HH − SVV ) 2 ( S HH + SVV ) S HV * 2 ( S HH − SVV ) S HV * 2 4 S HV (5) Na Eq. 5, o símbolo * denota o complexo a média espacial dos conjugado, e componentes. 3. O ruído “speckle” Devido à interferência coerente que aparece em imagens SAR, provocadas por diversos espalhamentos elementares das ondas eletromagnéticas refletidas, ocorre um fenômeno ruidoso, que se manifesta nas intensidades dos pixels da imagem provocando variações com um padrão granular, que compromete a interpretação de uma imagem, bem como a efetividade na classificação de características da imagem. Tal fenômeno é conhecido como speckle. Tal ruído é um dos principais responsáveis por distorções radiométricas em imagens de radar. A minimização deste ruído é fundamental portanto para uma melhor extração de informações neste tipo de imagem [1,2]. 3.1. O processo de formação do “speckle” Dentro de um pixel, o sinal de retorno é composto por muitos espalhamentos elementares considerando-se a superfície como sendo áspera na escala do comprimento de onda do radar. A distância dos espalhadores elementares varia aleatoriamente, e as ondas recebidas são coerentes em freqüência, mas não em fase. Considerando cada espalhador elementar como uma ondeleta, caso haja interferência construtiva há um reforço no sinal de retorno, caso não estejam em fase, o sinal recebido será enfraquecido. Este comportamento variacional corresponde ao “speckle” [2]. A Eq. 6 mostra uma determinada célula de resolução como sendo um somatório de componentes elementares complexos. M ∑ (x i + jyi ) = x + jy (6) i =1 No lado esquerdo da Eq. 6, cada componente complexo corresponde ao i-ésimo espalhador e M é o número total de espalhadores. Tal equação induz a uma observação de que a análise da refletividade de apenas um único componente de intensidade total pode levar a interpretação errada da informação do terreno. Dois métodos são utilizados para minimizar os efeitos do speckle: o processamento multilook, e a filtragem [2,4]. Para entender o processamento multilook, deve ser considerado que existem dois componentes de resolução formadores de um pixel em uma imagem SAR: a resolução em azimute, e a resolução em range. No primeiro caso a resolução do pixel é contada na direção do vôo da plataforma e no segundo caso, perpendicular à direção de vôo. O processamento multilook consiste em dividir o espectro de freqüência azimutal em N segmentos e processálos independentemente, assumindo uma independência estatística, e fazendo uma média destes N segmentos, ou “looks”. Tal processamento reduz o desvio padrão do speckle por um fator igual a N [2,4]. Vale ressaltar que a média é tomada sobre os valores de amplitude ou intensidade das imagens, e não sobre seus componentes complexos, pois caso contrário o processo seria igual ao descrito pela Eq. 6 [2]. Desta forma, a filtragem deste ruído não pode ser feita nos componentes da matriz de retroespalhamento, pois são todos complexos. Para ser feita a filtragem devem ser considerados por exemplo, os elementos da diagonal principal da matriz de coerência T, cujos módulos correspondem a componentes de intensidade na imagem, conforme visto na Eq 5. 3.2. O ruído “speckle” modelado como um processo multiplicativo e a filtragem com um filtro de média Para o desenvolvimento de algoritmos de filtragem, descreve-se o ruído como um processo multiplicativo, conforme detalhado na Eq. 7 y = xv (7) Nesta equação, y representa a amplitude de uma imagem SAR, x corresponde a refletância livre de ruído, e v é o ruído, caracterizado por ter um valor esperado igual a 1 e desvio padrão σ v . Pode-se provar que a amplitude segue uma distribuição de Rayleigh e esse desvio padrão é dado por [2,3]: σv = Var ( y ) (8) y Da Eq. 8 pode-se verificar que o desvio padrão do “speckle” é proporcional ao desvio padrão da amplitude da imagem. Considerandose a intensidade, a Eq. 7 pode ser reescrita na forma descrita na Eq. 9: Y = xx*vv*=Xvv* (9) Onde X é considerado constante sobre regiões homogêneas, e Y segue uma FDP exponencial dada pela Eq. 10 −1 p (Y ) = X e − Y X (10) O princípio da filtragem do ruído “speckle” consiste em reduzir a variância de Y e assim melhorar a estimativa da sua média. Portanto pode-se utilizar a média amostral de uma série de N realizações empíricas de Y. É possível se provar que neste caso, a intensidade passará a seguir uma FDP qui-quadrado com 2N graus de liberdade [2,3]. O filtro de média aplica diretamente este princípio e computa a média amostral das intensidades nas vizinhanças dos pixels em uma janela deslizante de tamanho MxM em uma imagem, conforme mostrado na Eq. 11: Yi , j M 1 = 2 M M 2 M 2 ∑ ∑Y i + p, j + q M M p =− q=− 2 2 (11) Nesta equação os índices i e j são representativos da linha e coluna de cada pixel. O filtro de média tem como limitação o fato de provocar por exemplo o “borramento” de áreas de bordas em regiões hetereogêneas, se for empregado indiscriminadamente [2,3]. 4. Teste de filtragem e resultado sobre áreas homogêneas Para testar a teoria abordada realizou-se a filtragem sobre os componentes da diagonal principal de uma imagem SAR polarimétrica, utilizando-se para isto um filtro de média com janela de tamanho 5x5 pixels. O software empregado foi o POLSAR v 4.0, disponível gratuitamente na Internet no sítio http://earth.eo.esa.int/polsarpro/ . A imagem testada corresponde a uma cena do sensor SAR ESAR, na banda espectral L, próximo ao entorno de um aeroporto. A figura 1 mostra a área a qual foi aplicado o filtro, e as figuras 2 e 3 mostram respectivamente os histogramas das componentes de amplitude T11 das matrizes de coerência polarimétrica da imagem antes e depois de ser filtrada. Pode-se notar que a figura 2 mostra um histograma correspondente a uma distribuição exponencial, enquanto que a figura 3 mostra um histograma com a forma de uma distribuição qui-quadrado, e que tem um comportamento menos aleatório. Figura 2. Histograma da imagem não filtrada. Figura 3. Histograma da imagem filtrada. 5. Conclusões Figura 1. Área homogênea onde foi aplicado o filtro (polígono em branco). Foi possível verificar, que para uma imagem SAR, a filtragem do ruído “speckle” em áreas homogêneas permite minimizar o comportamento aleatório descrito. Deve-se entretanto empregar o filtro de média cuidadosamente, tendo em vista evitar a perda excessiva de resolução espacial na imagem a ser analisada, devido ao efeito mencionado na seção 3.2. Referências [1] Antônio Henrique Corrêa. Fundamentos da polarimetria e da Calibração SAR. http://www.dpi.inpe.br/cursos/ser41 0/Basic_SAR_Polarimetric_and_Calibr ation_Tutorial.pdf (acessado em 11/05/2014). [2] Jong Sen Lee e Eric Pottier. Polarimetric Radar Imaging: from basics to aplications. CRC Press, EUA, 2009. [3] POLSAR PRO – Lecture Notes. http://earth.eo.esa.int/polsarpro/t utorial.html (acessado em 02/07/2014). [4] SPRING Tutorial em RADAR http://www.dpi.inpe.br/spring/portu gues/tutorial/radar.html (acessado em 15/05/2014).