nc1 TM ANO 03 - Nº12 Setembro/2012 SINAPSES & SINOPSES Eficácia e tolerabilidade da rivastigmina transdérmica no tratamento da doença de Alzheimer na prática diária Dr. José Luiz de Sá Cavalcanti – CRM-RJ 52-10.447-8 Balas de prata no controle de doenças terríveis: a questão da malária, da esquizofrenia e de suas drogas (cloroquina e neurolépticos) Dr. Paulo Silva Belmonte de Abreu – CRM-RS 8.929 O tratamento da depressão na doença de Parkinson Dr. Renato Puppi Munhoz – CRM-PR 15.036 Principais transtornos do sono na doença de Parkinson Eficácia e tolerabilidade da rivastigmina transdérmica no tratamento da doença de Alzheimer na prática diária Dr. José Luiz de Sá Cavalcanti – CRM-RJ 52-10.447-8 Membro Titular Emérito da Academia Brasileira de Neurologia. Diretor do Instituto de Neurologia Deolindo Couto da UFRJ. Os inibidores da acetilcolinesterase (IAChEs) estão há mais de uma década aprovados para o tratamento sintomático da Doença de Alzheimer (DA) em suas fases leve, moderada e moderada-grave, com base na hipótese de que o déficit colinérgico relaciona-se a declínio cognitivo e a distúrbios de comportamento que ocorrem na doença.1 O desafio inicial da terapia com os IAChEs de primeira geração, como na tacrina, era relativo a seus efeitos tóxicos e efeitos adversos com as drogas de segunda geração, especialmente sobre a função gastrointestinal, a qual dificultava a utilização dessas drogas, especialmente via oral. Alguns ensaios clínicos mostravam que doses maiores tinham mais eficácia terapêutica,2 exigindo dos pesquisadores e da indústria farmacêutica estratégias que permitissem a utilização de doses maiores em uma terapêutica individualizada, sem efeitos adversos que comprometessem sua utilização. Sinapses & Sinopses é uma iniciativa da Phoenix Comunicação Integrada, com o objetivo de atualizar os temas propostos em cada edição. Conselho científico: Dra. Ana Gabriela Hounie, Dr. João Senger, Dra. Maristela Costa Cespedes. Material de distribuição exclusiva à classe médica. O anúncio veiculado nesta edição é de exclusiva responsabilidade do anunciante. O conteúdo deste material é de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es) e não reflete, necessariamente, o posicionamento da Novartis, que apenas patrocina sua divulgação exclusivamente à classe médica. 2012 © Novartis Biociências S.A. Proibida a reprodução total ou parcial sem a autorização do titular. 2 – S I N A P S E S & S I NOPSES TM Alzheimer Eis a questão principal: atingir a maior dose com segurança, eficácia e poucos efeitos adversos, de modo a permitir aderência ao tratamento e menor carga sobre o cuidador. A introdução, em 2007,3 da liberação contínua e controlada de rivastigmina por meio de um adesivo transdérmico, o patch de Exelon®, com suas doses diversificadas, tem mostrado benefícios evidentes em vários ensaios, com poucos efeitos adversos e preferência entre os cuidadores,4,5 por sua facilidade de aplicação e controle, favorecendo a aderência ao tratamento. A aplicação do adesivo transdérmico elimina a primeira passagem no tubo digestivo, diminuindo expressivamente manifestações, como náuseas e vômitos. Muitas vezes, a descontinuidade terapêutica era devida a esses efeitos adversos. A eficácia do patch de Exelon® tem sido demonstrada em aspectos tão diferentes quanto a melhora sobre as atividades da vida diária6 e a cognição.7 Artigo recente, publicado na Neuropsychiatric Disease and Treatment, por Seibert et al,8 procurou avaliar em um cenário real de pacientes ambulatoriais se o patch de Exelon® mostrava menos descontinuidade de tratamento devido a efeitos adversos gastrointestinais e com eficácia, se comparado aos anticolinesterásicos orais. O ensaio realizado na Alemanha envolveu 1.113 pacientes, em 257 centros, sendo 614 mulheres e 499 homens, com idade média de 76,5 anos, por quatro meses. Em 58% dos pacientes, a DA estava sendo tratada pela primeira vez, enquanto, nos demais 42%, a terapêutica com anticolinesterásico foi mudada para a rivastigmina transdérmica, seja por perda da tolerabilidade (13,6%), seja por efetividade (26,9%) do IAChE em uso. boa, em 93,7% dos pacientes e pobre em 2,8%. Após os quatro meses, era ainda muito boa, ou boa, em 86,6% e pobre em 5,9%. Foram relatados 226 efeitos adversos em 130 pacientes, 26 dos quais mais sérios. Os efeitos adversos mais frequentes foram eritema e náusea. Mais da metade das lesões cutâneas ocorreu nas primeiras seis semanas de tratamento. Os autores referem que o ensaio corresponde aos achados do ensaio IDEAL em relação à melhora das medidas cognitivas, assim como a tolerabilidade. Os resultados desse ensaio assemelham-se a outros estudos abertos que demonstraram os benefícios de mudança de tratamento para a rivastigmina, especialmente quando outros IAChEs falharam em termos de eficácia e tolerabilidade.9 Os autores concluem que, na prática diária, a rivastigmina transdérmica é bem tolerada e eficaz, tanto nos pacientes virgens de tratamento quanto naqueles que mudaram para o patch, sugerindo que o patch de rivastigmina é uma boa opção quando os objetivos esperados com uma terapêutica não estão sendo alcançados. As opções de doses existentes no patch de Exelon® permitem uma estratégia terapêutica abrangente, mesmo em pacientes mais graves, como relatados por Farlow et al10 em pôster apresentado recentemente na Alzheimer´s Association International Conference, no Canadá, no último mês de julho. O trabalho de Seibert et al é importante, porque envolve um número expressivo de pacientes atendidos em um cenário real de ambulatorial em múltiplos centros de atendimento. Referências bibliográficas Além dos parâmetros cognitivos de eficácia, a tolerabilidade e a segurança do uso da droga foram avaliadas pelo monitoramento de efeitos adversos e pela avaliação global do médico para cada paciente. O estudo foi completado em 92,8% dos pacientes, sendo o tratamento com o patch descontinuado em 14,7% dos pacientes, 6% por efeitos adversos, perda da aderência em 3,1%, da eficácia em 1,8%, razões desconhecidas em 3,3% e outros motivos em 3% dos pacientes. Vinte e nove por cento dos pacientes receberam medicação adicional na primeira consulta, especialmente antipsicóticos, e, após os quatro meses da rivastigmina transdérmica, esse número decresceu para 25,8%, sendo 15,4% com antipsicóticos e 11% com antidepressivos. Após os quatro meses, os pacientes não mostraram deterioração em relação aos parâmetros específicos do ensaio. Após o primeiro mês de tratamento, a tolerabilidade foi muito boa, ou 1. Bartus R, Dean R, Beer B, Lippa AS. The colinergic hypothesis of geriatric memory disfunction. Science. 1982;217(4558):408-14. 2. Cummings J, Froelich L, Black S, Bakchine S, Bellelli G, Molinuevo JL, et al. Randomized, double-blind, parallelgroup, 48-week study for efficacy and safety of a higher-dose rivastigmine patch 15 vs 10cm2 in Alzheimer´s disease. Dement Geriatr Cogn Disord. 2012;33(15):341-53. 3. Winblad B, Grossberg G, Frölich L, Farlow M, Zechner S, Nagel J, et al. 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Professor Associado do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da UFRGS. Chefe do Serviço de Psiquiatria do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Coordenador do Programa de Esquizofrenia do HCPA. Sócio Honorário da Associação Gaúcha de Familiares de Esquizofrênicos (AAFAPE). As balas de prata, além de sua descrição original de método mais eficaz de matar lobisomens, bruxas e feiticeiras, também têm sido adotadas como metáfora para qualquer solução de extrema efetividade, em geral com uma expectativa de que algum desenvolvimento ou prática nova curará com facilidade um problema grave confundindo-se com o termo “bala mágica”, utilizado por Paul Ehrlich para a cura da sífilis no início do século 20.1 Misturadas ou em combinação, balas de prata e bala mágica converteram-se no sonho de todos os envolvidos em desenvolvimento, estudo e teste de novas drogas para tratamento de doenças graves. Além da sífilis, a malária, a esquizofrenia e a doença maníaco-depressiva são consideradas as quatro doenças mais incapacitantes da humanidade.2 Apesar de aparentemente tão diferentes, essas quatro doenças assemelham-se na presença da psicose, no período agudo, e na apresentação de prejuízo cognitivo, na evolução. Além disso, essas doenças estão entrelaçadas em seu histórico de tratamento.2-4 O primeiro tratamento da neurossífilis foi feito por meio da indução de malária, e esforços posteriores de sintetizar o quinino, extraído da casca da planta denominada Cinchona, original dos Andes, levaram à síntese de diferentes corantes, antibióticos e anti-histamínicos que se revelaram novas “balas de prata”. Esse foi o caso de azul de metileno, o qual, além de permitir a identificação e o combate do Plasmodium dentro da hemácia, abriu uma classe nova de drogas, as fenotiazinas, que, em experiências buscando um agente antimalárico, levaram aos anti-histamínicos, incluindo a prometazina e a clorpromazina, esta revolucionando o tratamento da psicose e servindo como a primeira “bala de prata” da psiquiatria, logo após a cloroquina tomar o papel de “bala 4 – S I N A P S E S & S I NOPSES TM de prata” no tratamento da malária. Assim como a cloroquina, que veio possibilitar o controle da malária, que ainda hoje leva a cerca de 3 mil óbitos por dia e cerca de 3 milhões de óbitos ao ano no mundo, com prejuízo estimado em bilhões de dólares no ano, sua descoberta possibilitou uma redução apreciável da morbidade e de, certa forma, possibilitou o progresso da Europa. Evolução semelhante ocorreu no tratamento da esquizofrenia, após o advento dos neurolépticos, também sintetizados a partir de pesquisas primitivas com azul de metileno, e que possibilitou o esvaziamento de hospitais psiquiátricos graças à ação antipsicótica desse composto. Entretanto 40 anos depois da síntese do primeiro composto antipsicótico, a esquizofrenia segue um desafio, especialmente devido à ocorrência de formas resistentes (refratariedade) e de prejuízos cognitivos, ansiosos e depressivos associados. Ao longo desse tempo, diferentes compostos foram sintetizados, sendo que um único composto apresenta, de forma inequívoca, superioridade nos casos resistentes (clozapina), sendo os demais equivalentes em ação antipsicótica,5 apesar de diferir em relação a outras dimensões de sintomas (cognitiva e afetiva). Assim, o que se observou foi a diversificação em mais de uma “bala da prata” para atacar formas resistentes (clozapina), risco de suicídio (clozapina), agitação e catatonia (haloperidol e lorazepam) e quadros comórbidos de depressão (pouca evidência de vantagem de subtipos ou de antidepressivos associados, alguns estudos com quetiapina). Já no que toca a prejuízo cognitivo, as metanálises não mostram uma vantagem clara, mas alguns estudos recentes apontam para algumas evidências de vantagem de quetiapina e olanzapina.6 Esse estudo mostrou, em 12 meses, mudança neurocognitiva pequena a moderada Esquizofrenia com olanzapina (z = 0,69), seguida por quetiapina (z = 0,64), risperidona (z = 0,51), aripiprazol (z = 0,46), clozapina (z = 0,43) e clorpromazina (z = 0,33). Entretanto mostrou que olanzapina e quetiapina foram superiores no escore composto e na velocidade de processamento. Adicionalmente, algumas diretrizes baseadas em evidência já apontam para esboços desse “mapa da mina de prata”, como do IPAP e do PORT.7 Outros dois estudos recentes demonstraram superioridade da quetiapina no subgrupo de pacientes com depressão basal,8,9 e outro mostrou superioridade neurocognitiva da quetiapina e ziprasidona sobre olanzapina,10 apesar de outro estudo não mostrar diferenças significativas.11 Tomados em conjunto, os estudos disponíveis sobre a valia da “bala de prata” apontam para uma grande semelhança de efeitos gerais,7,12 com pequena superioridade da quetiapina em alguns subgrupos (deprimidos no primeiro episódio de esquizofrenia, portadores de prejuízo cognitivo leve a moderado, pacientes mais sensíveis a efeitos extrapiramidais e metabólicos que os demais.13 Dessa forma, a quetiapina é um armamento interessante, com algumas vantagens, e que necessita de mais estudos adicionais “face a face” com drogas ativas, durante médio e longo prazos, para melhor definição de suas vantagens relativas, que hoje apontam para status de “bala de prata” para aspectos cognitivos e depressivos da doença terrível que é a esquizofrenia. 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Treatment of depression in first episode of schizophrenia: results from EUFEST. Eur Neuropsychopharmacol. 2012 May 22. [Epub ahead of print]. NC1 – 5 O tratamento da depressão na doença de Parkinson Dr. Renato Puppi Munhoz – CRM-PR 15.036 Médico Neurologista. Coordenador Médico da Associação Paranaense de Portadores de Parkinsonismo (APPP) – Curitiba, PR. Introdução Apesar de a Doença de Parkinson (DP) ter seu diagnóstico baseado em presença de sinais e sintomas motores clássicos, os sintomas não motores são os principais indicadores de má qualidade de vida e perda funcional no decorrer da doença. Entre esses sintomas não motores, a depressão tem um impacto especialmente importante, desde as fases iniciais da doença, ocorrendo em cerca de 40% dos pacientes em estudos transversais e mais de 70% em estudos longitudinais. O diagnóstico da depressão na DP pode ser complexo, um vez que alguns dos sinais da própria doença podem mimetizá-la. Além disso, existem particularidades quanto à presença e à intensidade de alguns sintomas em relação aos da depressão na população geral: na DP, a depressão tende a manifestar-se com componentes maiores de ansiedade, pessimismo, falta de esperança, retração social, introversão e pensamentos autodepreciativos, havendo, por outro lado, menos sentimento de culpa, ideação de morte e suicídio (quadro 1).1-3 A depressão na DP é, provavelmente, multifatorial, envolvendo um substrato neurobiológico, porém diversas evidências de um componente reativo relacionado à convivência com uma doença crônica neurodegenerativa e com suas complicações e limitações. Por exemplo, o estudo de Richards et al mostrou que a frequência de depressão é relativamente alta na fase inicial da DP, quando o paciente recebe o diagnóstico, diminuindo quando inicia o tratamento, refletindo a clássica “fase de lua de mel”, e aumentando novamente com a progressão dos sintomas em fases mais avançadas. Além disso, a depressão na DP tem relação direta com a gravidade de seus sintomas motores e pode oscilar 6 – S I N A P S E S & S I NOPSES TM Quadro 1 – Diferenças da depressão em pacientes com DP em relação à população geral Mais comum na depressão da DP Apatia Disforia Irritabilidade Ansiedade Flutuações de humor no decorrer do dia Pessimismo Desesperança Retração social Introversão Pensamentos autodepreciativos Menos comum na depressão da DP Culpa Autopunição Ideação de morte Suicídio junto às flutuações motoras refletindo o efeito farmacológico da levodopa. As bases biológicas da depressão também têm um fundamento patológico, relacionado com a presença de marcadores de degeneração próprios da DP em estruturas serotoninérgicas e noradrenérgicas, como os núcleos da rafe e estruturas límbicas.4-6 O tratamento da depressão na DP Mesmo com o evidente impacto da depressão na DP, o hábito de prescrição da maior parte dos especialistas está mais relacionado com a conveniência e o temor de efeitos colaterais que com a evidência de eficácia incluindo, quase sempre, o uso de Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRSs). Ape- Depressão sar de seu perfil ser classicamente considerado menos favorável do ponto de vista de ocorrência de efeitos adversos, os Antidepressivos Tricíclicos (ATs) são a segunda classe mais prescrita, seguidos pela trazodona, venlafaxina, bupropiona e mirtazapina, mesmo diante da falta de provas convincentes de um efeito adequado nessa população específica. Na verdade, se forem tomadas condutas baseadas em critérios de eficácia, não existem motivos para que os ISRSs sejam mais usados que os ATs. Um estudo de 2008 demonstrou que, em comparação ao placebo, os ATs são os que têm a melhor eficácia, enquanto os ISRSs têm efeito semelhante ao inibidor da monoaminoxidase B, selegilina e pouco superior ao placebo. Outro estudo, o de Devos et al, demonstrou que tanto o AT desipramina quanto o ISRS citalopram apresentam eficácia superior ao placebo, com resposta discretamente mais robusta do AT.7-10 Na prática clínica, a nortriptilina é tipicamente preferida em relação a outros ATs, especialmente a amitriptilina, pelo perfil mais favorável de efeitos adversos. Essa preferência motivou a realização de um estudo comparando nortriptilina a paroxetina, controlado com placebo. Esse estudo foi publicado em 2009 demonstrando que paroxetina CR, na dose média diária de 30 mg, não foi superior ao placebo, enquanto a nortriptilina 50 mg, por dia, foi mais efetiva quando comparada a ambos (placebo e paroxetina).11 Os ATs são classificados em dimetilados (amitriptilina, imipramina e clomipramina) e monometilados (nortriptilina e desipramina). Os ATs dimetilados bloqueiam predominantemente a recaptação de serotonina, enquanto os monometilados bloqueiam mais fortemente a recaptação de noradrenalina, sem exercer efeitos significativos sobre a dopamina. Os ATs também têm efeitos bloqueadores de diversos receptores, incluindo os muscarínicos da acetilcolina, sendo que esse bloqueio é mais intenso entre os ATs dimetilados de primeira geração. Um estudo in vitro avaliando a potência anticolinérgica dos ATs encontrou a seguinte ordem entre os antidepressivos mais comumente usados: amitriptilina > doxepina > clomipramina > imipramina > desipramina > nortriptilina (quadro 2). A nortriptilina, o metabólito ativo da amitriptilina, é um ATs de segunda geração. Graças a seu perfil farmacológico e menor potência anticolinérgica, a nortriptilina produz menos Quadro 2 – Descrição esquemática do possível efeito antidepressivo dos agonistas dopaminérgicos Agonista dopaminérgico Receptores mesolímbicos D3 Efeito antidepressivo Efeito motor antiparkinsoniano efeitos muscarínicos (xerostomia, obstipação, visão turva, retenção urinária etc.) em relação a outros ATs, considerada, dessa forma, mais adequada em populações de risco, como idosos e em pacientes com comorbidades significativas. Adicionalmente, o efeito sedativo leve dos ATs pode ser conveniente por cooperar com o controle de quadros de agitação psicomotora e dificuldade inicial de sono, comuns nesses pacientes.12 Por outro lado, a eficácia não é obviamente o único ponto a ser considerado na escolha do tratamento antidepressivo na DP. A observação do perfil de efeitos colaterais dessas drogas é essencial, especialmente nos pacientes mais idosos. As recomendações da Academia Brasileira de Neurologia para o tratamento da DP leva todas essas variáveis em consideração, concluindo que tanto a nortriptilina quanto a desipramina reúnem evidências de eficácia, considerando, ainda, que, embora tenham um perfil mais favorável de efeitos colaterais, não existem evidências de eficácia dos ISRSs na depressão da DP. Em um contexto clínico, a Academia Brasileira de Neurologia enfatiza que, em razão da maior segurança da maioria dos clínicos com uso de ISRS, essa classe continua a ser considerada como de primeira linha.13 Conclusões Dessa forma, a depressão na DP, assim como no caso dos aspectos motores, deve ser tratada de forma individualizada tendo-se em mente a intensidade dos sintomas, presença de polifarmácia, comorbidades e complicações motoras, não motoras e as inerentes ao tratamento dopaminérgico. O uso de AT, especialmente a nortriptilina, pode ser considerado como a escolha inicial no tratamento da depressão na DP, corroborado por consensos de experts, incluindo os da Academia Brasileira de Neurologia, publicado em 2011. Referências bibliográficas 1. Schrag A. Quality of life and depression in Parkinson’s disease. J Neurol Sci. 2006;248(1-2):151-7. 2. Cummings JL, Masterman DL. Depression in patients with Parkinson’s disease. Int J Geriatr Psychiatry. 1999;14(9):711-8. 3. 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NC1 – 7 Principais transtornos do sono na doença de Parkinson Introdução A primeira descrição da paralisia agitante, em 1817, por James Parkinson, já fazia referência a um sono perturbado.1 movimentá-los, que piora no turno da noite. Sua prevalência na DP é bastante variável – de 1% a 50% – quando comparada ao grupo-controle – 0,5%. Quando presente, correlaciona-se com uma incapacidade maior da DP, além de déficit cognitivo mais acentuado.4 Fatores, como idade avançada ou alguma condição secundária, como deficiência de ferro, podem ter influência no aumento da prevalência da DP. Apesar de a SPI ser um transtorno caracterizado por deficiência dopaminérgica, as vias envolvidas não são as mesmas vias nigroestriatais da DP. Movimentos Periódicos dos Membros durante o Sono (MPMS): aparecem associados à SPI ou independentemente. Podem causar interrupção do sono na DP. Um estudo que utilizou tomografia computadorizada com emissão de fóton único (SPECT) e avaliação da ligação [(123)I] ß-CIT estriatal encontrou correlação entre a perda de células dopaminérgicas e o número de MPMS em um grupo de pacientes de DP.5 O gráfico 1 mostra em um exame de polissonografia, uma sequência de MPM seguida por despertares corticais. Gráfico 1 – Intervalo com despertares corticais relacionados a MPM Os Transtornos do Sono (TS) são uma das mais frequentes complicações não motoras da DP e chegam a afetar de 60% a 98% dos pacientes e aumentam com a evolução da doença.2 Os TS podem ser classificados como os que geram queixas diurnas, destacando-se a fadiga e a sonolência, e os que envolvem o sono noturno com despertares prolongados, os quais diminuem o tempo total de sono e o fragmentam, principalmente nos estágios N1 e N2 (sono leve). Essas manifestações podem ocorrer por persistência de sintomas motores noturnos, pelo uso de medicações ou pela coexistência de outros TS e/ou do humor. Manifestações noturnas Apneia do sono: cessação do fluxo respiratório, decorrente de falha do comando respiratório central ou de obstrução à passagem do ar na retrofaringe. As consequências são: diminuição do sono profundo, maior fragmentação do sono, dessaturação de oxigênio e sono não reparador. Constatou-se que de 20% a 50% dos pacientes com DP, submetidos a exames de polissonografia, têm apneia do sono três vezes mais frequente quando comparados com indivíduos saudáveis da mesma faixa etária.3 Síndrome das Pernas Inquietas (SPI): transtorno de movimento relacionado ao sono, caracterizado por um desconforto nos músculos inferiores (MMII) e incontrolável necessidade de 8 – S I N A P S E S & S I NOPSES TM Transtorno Comportamental do Sono REM (TCSR): caracteriza-se pela ocorrência de perda da atonia da musculatura esquelética, a qual ocorre normalmente durante o sono REM, associada à excessiva atividade motora durante os sonhos (vivência do sonho). Pode surgir como manifestação primária da DP e preceder, em até 13 anos, o início dos sintomas clínicos de parkinsonismo.6 Pacientes e parceiros referem ter sofrido equimoses, lacerações, fraturas e luxações resultantes das ocorrências. À falta de comportamentos anormais, denomina-se sono REM sem atonia. A polissonografia com vídeo é indispensável para o diagnóstico definitivo dos TCSRs.7 O gráfico 2 mostra o tônus muscular aumentado durante o sono R. Parkinson grave, tempo de doença, sonolência diurna e ocorrência de TS. O risco de alucinações é três vezes maior quando há TCSR. A desregulação do sono REM pode, também, ser um dos fatores primários na patogênese das alucinações induzidas por drogas dopaminérgicas.11,12 Gráfico 2 – Intervalo de sono R – ausência de atonia muscular Insônia: verificada em mais de 50% dos pacientes com DP. Apresenta-se não somente como dificuldade para iniciar o sono, mas também, e principalmente, como insônia de manutenção, com fragmentação do sono e despertar precoce. Pode estar associada a rigidez muscular, dificultando a mobilização durante o sono, sintomas de depressão ou efeitos colaterais de drogas, como a selegilina, e o ISRS, os quais devem ser evitados à noite.13 Fisiopatologia O TCSR está presente em um percentual de 25% a 50% dos pacientes da DP e, em uma proporção ainda maior, nas atrofias de múltiplos sistemas e na demência com corpos de Lewy se comparados a 0,5% da população geral. O TCSR é raro na doença de Alzheimer e na paralisia supranuclear progressiva, o que sugere ser um prenúncio de sinucleinopatia.8 A tabela 12 mostra a frequência dos TS nas doenças neurodegenerativas. Tabela 1 – TS nas doenças neurodegenerativas TCSR / REM s/ atonia DP Apneia do sono MPM ESE ++ ++ ++ +++ AMS +++ ++++ ++++ +++ DCL +++ +++ ++++ PSP ++ +/- ? + DA +/- ++ ? ++ Manifestações diurnas Sonolência Excessiva Diurna (SED): está presente em 15,5% dos pacientes de DP, se comparados a 4% dos pacientes com diabetes mellitus e a 1% do grupo-controle. Ocorre com maior intensidade na DP mais severa, com prejuízos cognitivos e demência.9 O grande diagnóstico diferencial faz-se com fadiga, que está presente em 59% dos pacientes com DP, e hipotensão pós-prandial também deve ser pensada.10 A prevalência de SED e TCSR aumenta progressivamente com a duração da doença, e foram associados a idade avançada, sexo masculino e doses elevadas de agentes dopaminérgicos, sendo o pramipexol, isoladamente, o que mais se associa à SED. Alucinações: ocorrem em 40% dos pacientes com DP e estão relacionadas a uso de drogas dopaminérgicas, déficit cognitivo Braak et al propuseram que a DP deve ter início na medula e bulbo olfatório, ascendendo e afetando os centros de modulação REM na ponte, os núcleos da rafe e o locus coeruleus e, posteriormente, a substância nigra. Portanto os TS precederiam os sintomas motores.14 Os núcleos pedúnculo-pontinos e retrorrubrais têm forte influência na atonia durante o sono REM e estão implicados na patogênese do TCSR.15 Em pacientes com TCSR primário (sem parkinsonismo), o SPECT demonstra perda do transportador de dopamina estriatal, o qual é intermediário entre os controles normais e os parâmetros indicativos de DP.16 Adicionalmente, há déficit olfativo, mudanças visuais e achados motores que são muito semelhantes àqueles encontrados na DP.17 Diagnóstico Um diagnóstico precoce conduz a tratamentos específicos, os quais podem consolidar o sono noturno e melhorar o alerta e o estado motor durante o dia. O diagnóstico dos TS deve incluir: pesquisa dos hábitos de sono, presença de sono interrompido noturno, SED, medicação em uso e seus efeitos colaterais. A escala de sonolência de Epworth é ferramenta útil para avaliar a sonolência. A polissonografia, na maioria dos casos, ajuda-nos, de modo objetivo, a documentar a arquitetura do sono e a diagnosticar seus transtornos intrínsecos. Uma maneira eficaz de avaliar tais pacientes é aplicar a Escala de Sono para Doença de Parkinson (ESDP), composta de 15 itens, cuja pontuação varia de 0 a 10, cada um deles, totalizando 150 pontos – o que significa um paciente livre de sintomas. A partir das respostas obtidas, é possível direcionar o tratamento.18,19 NC1 – 9 Escala de sono para Doença de Parkinson Como você classificaria o que segue baseado na sua experiência na última semana (coloque um x no local apropriado da linha) 1. A qualidade total de seu sono noturno é: Péssima |_____________________________________________________________________________________ | Excelente 2. Você tem dificuldade em pegar no sono a cada noite? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 3. Você tem dificuldade em permanecer dormindo? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 4. Você tem inquietude das pernas ou dos braços à tardinha ou à noite causando interrupção do sono? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 5. Você se remexe na cama? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 6. Você sofre de sonhos perturbadores à noite? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 7. Você sofre de alucinação perturbadora à noite (vendo ou ouvindo coisas que lhe dizem não existirem)? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 8. Você levanta a noite para urinar? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 9. Você tem incontinência urinária por que fica incapaz de se mover devido aos sintomas “off” (perda da ação dos remédios)? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 10. Você sente dormência ou formigamento nos seus braços ou pernas que lhe acordam à noite? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 11. Você tem cãibras musculares dolorosas enquanto dorme à noite? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 12. Você acorda cedo pela manhã numa posição dolorida de pernas e braços? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 13. Você tem tremor quando acorda? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 14. Você se sente cansado e sonolento após acordar de manhã? Sempre |_____________________________________________________________________________________ | Nunca 15. Você já adormeceu inesperadamente durante o dia? Frequentemente |_____________________________________________________________________________________ | Nunca Pacientes com pontuações baixas para as questões 10-13, por exemplo, que indicam sintomas motores noturnos, beneficiar-se-iam do aumento da dose de levodopa-entacapona ou do uso de levodopa de liberação controlada. Ao contrário, em pontuações baixas nas respostas 6 e 7, o que indica alucinações, o benefício ocorreria com a retirada dos agonistas dopaminérgicos ou com a instituição de antipsicóticos atípicos. Clonazepam e, em alguns casos, levodopa ou melatonina podem ser usados se houver suspeita de TCSR. Nos casos de noctúria, deve-se investigar, objetivamente, a apneia do sono e evitar diuréticos; em alguns casos, o início de agonistas dopaminérgicos está indica10 – S I N A P S E S & S INOPSES TM do. Pacientes com considerável dificuldade de movimentação na cama necessitam de ajuste das doses e dos horários dos agentes dopaminérgicos. Nos casos de sonolência acentuada, deve-se proibir a condução de automóveis e/ou a realização de qualquer outra atividade que exija certo grau de atenção, e qualquer medicação sedativa deve ser evitada. Nos casos diagnosticados, como narcolepsia-like, estimulantes do Sistema Nervoso Central (SNC), como a modafinila, podem ser muito úteis. Na SPI, com ou sem MPM, o tratamento de escolha são os agonistas dopaminérgicos. Pacientes com insônia Parkinson devem evitar uso crônico de benzodiozepínico (BDZ), pelo risco de quedas, fraturas, prejuízo cognitivo e tolerância. Os hipnóticos não BDZs e antidepressivos sedativos são as drogas de primeira escolha. Nos casos de insônia de manutenção, devemos pensar nas dificuldades motoras, na incapacidade de virar na cama e nas dores em geral. O fluxograma mostra estratégias para conduzir os principais TS nos pacientes com DP.20 Fluxograma – Estratégia sugerida para tratamento de pacientes com DP e sonolência20 Paciente sonolento – DP Revisão da medicação e da higiene do sono Identificar causa Noctúria +/- PH ESDP / ESE SPI Parassonia REM / NREM Acinesia Agentes dopaminérgicos Antipsicóticos atípicos Evitar Ldopa BOZ Agentes dopaminérgicos Evitar diurético Agonista dopaminérgico D1 / D2 ? Amitriptilina PSG Se persistir Sonolência Insônia MPM AOS 2º narcolepsia Agentes promotores de alertas Ex: modafinil, selegilina e anfetamina Dor Agentes dopaminérgicos opioides Manutenção: AD Inicial: hipnóticos Referências bibliográficas 1. Parkinson J. An essay on the shaking palsy. London: Whittingham and Rowland; 1817. 2. Comella CL. Sleep disorders in Parkinson’s disease: an overview. Mov Disord. 2007;22(Suppl 17):S367-73. 3. Maria B, Sophia S, Michalis M, Charalampos L, Andreas P, et al. 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