dificuldades diagnósticas na espondilodiscite

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Artigo Original/Original Article/Artículo Original
DIFICULDADES DIAGNÓSTICAS NA ESPONDILODISCITE BACTERIANA
DIAGNOSTIC DIFFICULTIES IN BACTERIAL SPONDYLODISCITIS
DIFICULTADES DE DIAGNÓSTICO EN ESPONDILODISCITIS BACTERIANA
Vinicius Orso¹, Afrane Serdeira1, Marcus Ziegler1, Erasmo Zardo2
RESUMO
Objetivo: Analisar os aspectos relacionados com as dificuldades diagnósticas de pacientes portadores de espondilodiscite bacteriana.
Métodos: Estudo observacional transversal com coleta retrospectiva de dados no período de março de 2004 a janeiro de 2014. Foram
analisados 21 pacientes com diagnóstico de espondilodiscite bacteriana. Resultados: O sexo feminino foi o mais acometido, assim
como indivíduos mais velhos. A dor na região comprometida foi o sintoma inicial em 52% dos pacientes, sendo que 45,5% dos pacientes
apresentavam lombalgia, os pacientes com discite dorsal tiveram como queixa principal dorsalgia, e os com discite toracolombar apresentaram dor nessa região, sendo que apenas um paciente apresentou discite sacroilíaca. O tempo médio entre o início dos sintomas e
o tratamento foi de cinco meses. O segmento lombar foi o mais acometido com 11 casos (52%), seguido pelo toracolombar 24%, pelo
dorsal com 19% dos casos e um caso no segmento sacroilíaco. Apenas sete pacientes apresentaram febre. A dor no nível comprometido
foi, coincidentemente, o sintoma mais comum. Conclusões: O diagnóstico precoce da espondilodiscite bacteriana continua sendo um
desafio devido à inespecificidade de sinais e sintomas referidos pelo paciente e à grande variabilidade dos resultados laboratoriais e de
imagem. A base para o diagnóstico precoce continua sendo a suspeita clínica no momento do atendimento inicial.
Descritores: Discite; Coluna vertebral; Disco intervertebral; Infecção.
ABSTRACT
Objective: To analyze aspects related to the diagnostic difficulty in patients with bacterial spondylodiscitis. Methods: Cross-sectional observational
study with retrospective data collected in the period from March 2004 to January 2014.Twenty-one patients diagnosed with bacterial spondylodiscitis were analyzed. Results: Women were the most affected, as well as older individuals. Pain in the affected region was the initial symptom in
52% of patients, and 45.5% of the patients had low back pain, and those with dorsal discitis had back pain as the main complaint; the patients
with thoracolumbar discitis had pain in that region, and only one patient had sacroiliac discitis. The average time between onset of symptoms and
treatment was five months. The lumbar segment was the most affected with 11 cases (52%), followed by thoracolumbar in 24%, dorsal in 19% of
cases and a case in the sacroiliac segment. Only seven patients had fever. Pain in the affected level was coincidentally the most common symptom.
Conclusions: Early diagnosis of bacterial spondylodiscitis remains a challenge due to the nonspecific signs and symptoms reported by the patient
and the wide variability of laboratory results and imaging. The basis for early diagnosis remains the clinical suspicion at the time of initial treatment.
Keywords: Discitis; Spine; Intervertebral disc; Infection.
RESUMEN
Objetivo: Analizar los aspectos relacionados con las dificultades de diagnóstico en pacientes con espondilodiscitis bacteriana. Métodos: Estudio
observacional transversal con datos retrospectivos recopilados en el período comprendido entre marzo de 2004 y enero de 2014. Se analizaron
21 pacientes diagnosticados de espondilodiscitis bacteriana. Resultados: Las mujeres fueron las más afectadas, así como las personas de mayor
edad. Dolor en la región afectada fue el síntoma inicial en el 52% de los pacientes, el 45,5% de los pacientes tenían dolor lumbar, los pacientes con
discitis dorsal tenían dolor dorsal como la principal queja y las con discitis toracolumbar tenían dolor en esa zona, y sólo un paciente tuvo discitis
sacroilíaca. El tiempo promedio entre el inicio de los síntomas y el tratamiento fue de cinco meses. El segmento lumbar fue lo más afectado, con
11 casos (52%), seguido por el 24% toracolumbar, dorsal con 19% de los casos y un caso en el segmento sacroilíaco. Sólo siete pacientes tenían
fiebre. El dolor en el nivel afectado fue, por coincidencia, el síntoma más común. Conclusiones: El diagnóstico temprano de espondilodiscitis
bacteriana sigue siendo un desafío debido a los signos y síntomas inespecíficos reportados por el paciente y la amplia variabilidad de los resultados de laboratorio y de imágenes. La base para el diagnóstico precoz sigue siendo la sospecha clínica en el momento del tratamiento inicial.
Descriptores: Discitis; Columna vertebral; Disco intervertebral; Infección.
INTRODUÇÃO
As patologias infecciosas da coluna vertebral são condições de
elevada morbidade, e se o diagnóstico é tardio podem apresentar um elevado número de complicações. A discite infecciosa ou
séptica é a infecção do disco intervertebral, e frequentemente há,
pela própria fisiopatogenia, comprometimento dos corpos vertebrais contíguos, ocasionando a osteomielite, também denominada
de doença infecciosa da coluna vertebral ou espondilodiscite.¹ A
patologia infecciosa da coluna vertebral representa um desafio ao
médico, quanto ao seu diagnóstico, e consequentemente para o
tratamento. Trata-se de patologia que cursa com dores difusas,
vagas, oligossintomáticas, geralmente sem febre ou indícios de
infecção, dificultando o diagnóstico e elevando o número de comorbidades, bem como as complicações.1,2
Na maioria das vezes, a espondilodiscite é diagnosticada em fa-
1. Serviço de Ortopedia e Traumatologia – SOT da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, RS, Brasil.
2. Disciplina de Ortopedia e Traumatologia na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, PUCRS-HSL, Porto Alegre,RS, Brasil.
O trabalho foi realizado no Serviço de Ortopedia e Traumatologia – SOT da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, RS, Brasil.
Correspondência: Avenida Ipiranga 6690, sala 208, Centro Clínico PUC, Porto Alegre, RS, Brasil. 90619900. [email protected]
http://dx.doi.org/10.1590/S1808-185120151404132593
Coluna/Columna. 2015;14(4):299-303
Recebido em 17/12/2014, aceito em 01/08/2015.
300
ses avançadas devido à inespecificidade dos sinais e sintomas.1-3 A
investigação complementar com exames laboratoriais é, paradoxalmente, de pouco valor, com exceção do Volume de Sedimentação
Globular (VSG) e Proteína C Reativa (PCR) que podem sinalizar a
presença desse quadro infeccioso. Entre os exames de imagem,
a ressonância nuclear magnética (RNM) é a mais sensível para detecção precoce. O estudo radiográfico e mesmo a tomografia computadorizada não costumam revelar o diagnóstico nas primeiras
semanas de evolução da doença. O diagnóstico precoce apurado
e a instituição precoce da terapêutica são fatores decisivos ao desfecho favorável para afastar a intervenção cirúrgica e sequelas.3,4
A incidência de espondilodiscite infecciosa tem sido crescente,
o que pode ser reflexo do aumento da população idosa imunocomprometida e do aumento de procedimentos invasivos da
coluna vertebral. Na área gineco-urológica, o retorno venoso da
pelve e retroperitônio, através do plexo venoso de Batson5 que é
avalvular e faz comunicação com o retorno venoso da coluna vertebral, propicia a disseminação de germes. A maior acessibilidade
à RNM da coluna, que é o método diagnóstico mais sensível para
este tipo de afecção, também tem colaborado para o aumento do
diagnóstico 6. Os principais patógenos envolvidos são: Staphylococcus aureus, identificado em mais de 50% dos casos, e também
bacilos entéricos Gram negativos, Candida spp, Pseudomonas
aeruginosa, Streptococus Grupos B e G, e Mycobacterium tuberculosis, esse último com elevada prevalência em nosso meio.7
O objetivo desse trabalho foi analisar os fatores que dificultam
o diagnóstico da espondilodiscite bacteriana.
MATERIAL E MÉTODOS
Foi realizado um estudo observacional transversal com coleta
retrospectiva de dados no período de março de 2004 a janeiro
de 2014. Seguiram-se as normas e determinações do Comitê de
Ética da instituição. Realizou-se coleta de dados em prontuários
médicos de nossa instituição e dados armazenados em arquivos
computadorizados com auxílio do gerenciador de patologias da
Sociedade Brasileira de Coluna (SBC). Os dados e as informações
de identificação dos pacientes estão protegidos através de um
termo de confidencialidade.
Quanto às alterações do exame físico neuro-ortopédico, foram valorizados os seguintes aspectos: dor à dígito-pressão das
apófises espinhosas, postura antálgica (cifótica ou escoliótica),
cifose focal e gibosidade assim como exame neurológico alterado
e alterações de marcha.
Foram analisados todos os prontuários médicos de pacientes
portadores de espondilodiscite no período de março de 2004 a
janeiro de 2014. Como critério de inclusão, foram considerados
todos os pacientes com diagnóstico de espondilodiscite bacteriana e dados completos no referido período. Considerou-se
como critério de exclusão do presente estudo todos pacientes
sem documentação completa e diagnóstico confirmado de espondilodiscite de etiologias fúngica e tuberculosa (TBC).
Também foram excluídos do estudo pacientes com contato
prévio com TBC, mantoux elevado e anatomo-patológico sugestivo de tuberculose.
Os dados coletados levaram em consideração o tempo de
evolução dos sintomas, sendo considerada a unidade de tempo
em meses. Também foram coletados dados referentes à localização principal e secundária da dor, presença de sinais sistêmicos
(emagrecimento, calafrios, astenia, inapetência, febre, sudorese
noturna e dificuldade para marcha), alteração do exame físico,
seguimento vertebral comprometido (dorsal, lombar, transição
toracolombar e sacroilíacas).
Também foram considerados dados referentes a comprovação
do diagnóstico bacteriológico obtido através de punção biópsia
com agulha, hemocultura ou cultura de secreção pós-operatória.
Outros dados relativos a manifestações hematológicas também
foram coletados (hemograma, VSG e PCR). Foram analisados os
exames de imagem aos quais o paciente foi submetido e identifi-
cado qual ou quais os que, primariamente, sugeriram o diagnóstico (radiografia, tomografia computadorizada, RNM e cintilografia).
Análise estatística
Os dados foram analisados no SPSS versão 18. Os dados
quantitativos foram descritos por suas médias e desvio padrão e
os dados qualitativos por suas frequências. A diferença de idade
entre os gêneros foi analisada pelo teste de ANOVA. A diferença
do tempo de evolução dos sintomas entre os sexos foi analisada
pelo teste de Mann-Whitney. A presença de diferença na distribuição do nível de acometimento da espondilodiscite entre os
diferentes gêneros foi analisada pelo teste de Gamma.
RESULTADOS
Foram revisados 66 prontuários médicos de pacientes com espondilodiscite de etiologias variadas. Vinte e um pacientes preencheram
os critérios de inclusão, sendo diagnosticados com espondilodiscite
bacteriana com documentação completa.
As características do grupo estudado estão descritas na Tabela 1.
O tempo médio de evolução dos sintomas até o momento do diagnóstico foi de cinco meses, não havendo diferença estatística no tempo
de evolução dos sintomas entre os sexos (p=0,75). A idade média
dos pacientes foi de 48±25,3 anos (média±desvio padrão), também
não sendo encontrada diferença estatística de idade entre os gêneros.
O sexo masculino com 52,8± 27,9 anos e o sexo feminino 40±26
anos (p=0,295). A distribuição da população estudada foi igualitária:
52% dos pacientes eram do sexo feminino e 48% do sexo masculino.
Com relação ao segmento da coluna vertebral acometido, a
lombar foi o segmento mais comum com 52% dos casos, seguido
pela toracolombar 24%, dorsal 19% e apenas um paciente com
acometimento sacroilíaco 5%. Houve diferença estatística da distribuição em relação ao nível acometido entre os sexos, sendo que
nas mulheres houve uma maior preponderância do segmento toracolombar e nos homens do segmento dorsal (p≤0,001). (Tabela 2)
A Tabela 3 apresenta as características clínicas dos pacientes
com espondilodiscite bacteriana do estudo.
No que tange à sintomatologia, a queixa mais comum foi dor
lombar em 11 dos 21 pacientes (52%), seguido por dor irradiada
para flancos e glúteos (33%). Cinco pacientes apresentaram dor em
região abdominal e baixo-ventre (24%), sendo que quatro pacientes
(19%) apresentaram dor na pelve posterior; apenas um paciente
Tabela 1. Características dos pacientes com espondilodiscite bacteriana.
Característica
(n=21)
Idade, anos
Média±DP
48,3±25,3
(Mínimo a máximo)
(1,7 a 83,0)
Sexo feminino, nº (%)
11 (52)
Tempo de evolução, meses
5 (1 a 16)
Segmento comprometido
Dorsal
4 (19)
Toracolombar
5 (24)
Lombar
11 (52)
Sacroilíaco
1 (5)
Os dados são apresentados como contagens (percentuais) ou especificados de modo diferente.
DP: desvio-padrão.
Tabela 2. Nível de acometimento na coluna vertebral em relação ao gênero.
Gênero
Sacroilíaca
Lombar
Toracolombar
Dorsal
Feminino
1
8
2
0
Masculino
0
3
3
4
Total
1
11
5
4
Teste Gamma (p≤0,001)
Coluna/Columna. 2015;14(4):299-303
DIFICULDADES DIAGNÓSTICAS NA ESPONDILODISCITE BACTERIANA
com dor em membros inferiores (5%) e um paciente (5%) com dor
em região dorsal.
Em relação aos sinais sistêmicos, 48% apresentaram emagrecimento e astenia associada, nove pacientes (43%) apresentaram calafrios, sendo 33% com manifestações de febre (37,8º) e dificuldade de
marcha. Cinco pacientes (24%) apresentaram inapetência e apenas
três pacientes (14%) demonstraram sudorese noturna isolada.
No que tange às alterações do exame físico, a manifestação clínica predominante foi dor à dígito-pressão das apófises espinhosas,
presentes em 15 pacientes (71%), postura antálgica em nove
pacientes (43%), seguida por alteração da marcha, presente em cinco
pacientes (24%) e exame neurológico alterado, bem como cifose focal
em quatro pacientes (19%) respectivamente. Estas alterações foram
constatadas pelo cirurgião sênior que elaborou a hipótese diagnóstica
no seu primeiro atendimento na evolução da doença. (Tabela 4)
Analisando o subgrupo de pacientes que apresentaram comprometimento infeccioso lombar (n=11) apenas 5 (45%) referiram
como queixa principal a lombalgia. (Tabela 5)
No subgrupo de pacientes com comprometimento em coluna
dorsal (n=4) apenas um paciente (25%) localizou sua queixa principal
nessa região, ao passo que no subgrupo de pacientes comprometidos em região de transição tóraco-lombar (=5) apenas dois pacientes
(40%) localizaram sua queixa principal de dor nessa região. (Tabela 6)
O primeiro exame por imagem realizado foi o estudo radiográfico em 4 pacientes (19%). A tomografia computadorizada em
cinco pacientes (24%), a RNM em oito pacientes (38%) e a cintilografia óssea foi primeiro exame que sugeriu o diagnóstico em 4
pacientes (19%). Quatro pacientes submeteram-se à investigação
radiográfica previamente, mas essa não possibilitou alcançarmos
o diagnóstico ou sugeri-lo, o que foi possibilitado tardiamente com
auxílio dos outros métodos acima descritos. (Tabela 7)
Em relação à comprovação do agente etiológico essa foi obtida
em 15 pacientes (71%). Desse percentual, 12 pacientes através de
Tabela 3. Características clínicas dos pacientes com espondilodiscite
bacteriana.
Característica
(n=21)
Dor
nº (%)
Lombar
11 (52)
Flancos
7 (33)
Glúteos
7 (33)
Costal
5 (24)
Abdominal
5 (24)
Baixo ventre
5 (24)
Torácica anterior
4 (19)
Pelve posterior
4 (19)
Dorsal
1 (5)
Membros inferiores
1 (5)
Sinais sistêmicos
Emagrecimento
10 (48)
Astenia
10 (48)
Calafrios
9 (43)
Febre
7 (33)
Dificuldade de marcha
7 (33)
Inapetência
5 (24)
Sudorese noturna
3 (14)
Os dados são apresentados como contagens (percentuais) ou especificados de modo diferente.
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Tabela 4. Características do exame físico.
Característica
(n=21)
Exame Físico
nº (%)
Dor à dígito- pressão das apófises espinhosas
15 (71)
Postura antálgica cifótica-escoliótica
9 (43)
Cifose focal- gibosidade
4 (19)
Exame neurológico alterado
4 (19)
Alteração marcha
5 (24)
Os dados são apresentados como contagens(percentuais) ou especificados de modo diferente.
Tabela 5. Queixa principal e secundária quanto a localização da dor em
relação ao nível da coluna comprometido.
Discitelombar
(n=11)
Queixa principal
nº (%)
Lombalgia
5 (45)
Queixa secundária
Dor em flanco
3(27)
Dor em outras regiões*
3(27)
*abdômen, baixo- ventre, glúteos e pélvica posterior.
Tabela 6. Queixa principal e secundária quanto a localização da dor em
relação ao nível da coluna comprometido.
Discite dorsal
(n=4)
Queixa principal
nº (%)
Dorsalgia
1(25)
Queixa secundária
Dor costal
1(25)
Dor torácica anterior
1(25)
Discite toracolombar
(n=5)
Queixa principal
Dor em flancos
2(40)
Queixa secundária
Lombalgia
2(40)
Dor em outras localizações
1(20)
Tabela 7. Primeiro exame que possibilitou o diagnóstico, nº (%).
RNM
8 (38)
CT
5 (24)
Radiografia
4 (19)
Cintilografia
4 (19)
RNM: Ressonância Nuclear Magnética;CT: Tomografia Computadorizada.
punção biópsia com agulha e três por meio de hemoculturas seriadas.
A punção biópsia com cultura foi realizada em 19 pacientes, dos quais
12 (63%) foram positivas. A hemocultura foi realizada em treze pacientes, dos quais três possibilitaram a identificação do agente bacteriano,
sendo esses os mesmos que apresentaram hipertermia. (Tabela 8)
Dez pacientes (48%) apresentaram leucocitose moderada
(9000 leucócitos totais), sendo que os demais não apresentaram
alterações. A análise laboratorial, avaliando os marcadores de
atividade inflamatória dos 21 pacientes, 20 (95%) apresentaram
302
PCR alterado e 21(100%) com alteração do VSG. A média do VSG
foi de 68,5mm/h variando de 5 a 120mm/h e a média do PCR foi
de 5,1mg/dl variando entre 1,5 e 7,2mg/dl. (Tabela 9)
DISCUSSÃO
Nesse estudo, confirmamos que as lesões infecciosas da coluna vertebral não produzem um grande número de sinais e sintomas
clínicos característicos, evoluindo, em geral, com poucos sintomas
que indiquem o diagnóstico, sendo dor inespecífica a queixa predominante, o que condiz com achados de outros autores.8-12
No trabalho dos presentes autores, a queixa principal de dor
coincidiu com a localização do nível comprometido apenas em
cinco (45%) dos pacientes com comprometimento infeccioso lombar, um paciente (25%) da coluna dorsal e apenas dois (40%)
localizaram suas queixas principais em coluna tóraco-lombar.
Conforme Skaf et al.,3 Citak et al.4 e Zarghooni et al.¹ a suspeita
clínica é a base para o diagnóstico da espondilodiscite bacteriana,
mais que a apresentação clínica, uma vez que o paciente frequentemente é assintomático e o exame físico geralmente é pobre. Estudos demonstram que cerca de 50% dos pacientes já apresentam
sintomas cerca de 3 meses antes da definição diagnóstica, e a
apresentação mais comum é a dor (90%),13 geralmente exacerbada pelo movimento e que pode irradiar para abdômen, quadril,
perna, genitália e períneo; febre não é frequente, mas em algumas
séries esteve presente em até 52% dos casos.3,4 Estes aspectos
estão em concordância com nossos achados e descritos como
queixas principal e secundária nas Tabelas 5 e 6.
A investigação complementar também é inespecífica, o hemograma, na maioria das vezes, não demonstra nenhuma alteração
como leucocitose importante ou desvio à esquerda. Raramente
observa-se uma leucocitose maior que 12000 leucócitos totais. Os
exames de VSG e PCR apesar de inespecíficos, paradoxalmente
acabam sendo os mais valiosos ao sinalizar a possibilidade de
quadro infeccioso. O VSG frequentemente apresenta-se com valores muito elevados acima de 40mm/h, esses aspectos também
foram concordantes com nossos resultados, onde observamos
alterações importantes do VSG e PCR.
As hemoculturas também devem ser solicitadas, e estão positivas em cerca de 50% dos pacientes, situação em que se torna relevante para a escolha adequada do tratamento.3,13 Nossa pesquisa evidenciou que no subgrupo de pacientes que apresentavam
hipertermia (33%), três pacientes tiveram hemocultura positiva.
A investigação complementar por exames laboratoriais e de
imagem é fundamental, sendo a ressonância magnética o método
de imagem mais sensível para identificar as patologias infecciosas
Tabela 8. Comprovação do diagnóstico etiológico.
Nº Pacientes
Técnica
Positividade (%)
19
Punção biópsia
12*(63)
13
Hemocultura
3**(23)
* Um paciente cultura de material trans-operatório. ** Pacientes que apresentaram febre.
CONCLUSÃO
Tabela 9. Exames laboratoriais alterados.
Hemograma
Leucocitose
10 (48)
Anemia
5 (24)
VSG mm/h
Mediana (mínimo a máximo)
68,5 (5 a 120)
PCR mg/dl
Mediana (mínimo a máximo)
da coluna vertebral. A punção por biópsia com agulha é o exame
mais importante para obtermos o diagnóstico de certeza, porém
com frequência o resultado é negativo em um valor percentual de
30 a 50% dos casos.2,14 Esses percentuais estão inferiores aos do
presente estudo, onde o autor sênior alcançou 63% de diagnóstico guiado por tomografia computadorizada ou radioscopia. A
anatomia patológica também tem um grande índice de fracasso,
e deve ser reservada aos casos onde há dúvida entre etiologia
séptica ou tuberculosa, ou ainda malignidades.2,3,9
Exame cultural coletado a partir da punção biópsia por agulha do
disco infectado é definitivo, mas os resultados podem ser negativos,
mesmo em condições ideais. Da mesma forma, todos os estudos
de imagem e laboratoriais podem ser inconclusivos, dependendo do
momento em que eles são feitos em relação ao início da infecção.
Na investigação por imagens, o estudo radiográfico também
é frequentemente normal, não mostrando alterações na fase aguda, aspectos esses concordantes com nossa pesquisa, onde
cinco pacientes (24% dos casos) apresentaram raio-X normal na
evolução da doença. Alterações radiográficas surgem de quatro
semanas a três meses após o início do quadro infeccioso.¹²
A ressonância magnética e a cintilografia são os exames que
sugerem o diagnóstico da espondilodiscite com maior precocidade, por isso são os mais importantes. A CT acrescenta achados
adicionais aos exames radiográficos revelando o grau de comprometimento dos corpos vertebrais.¹²
O diagnóstico definitivo de espondilodiscite está estabelecido
quando pacientes apresentam quadro clínico e exames de imagens típicos, e hemocultura ou a cultura focal obtida através da
punção biópsia positivas para patógenos.2 No presente trabalho,
seis pacientes (28%) receberam o diagnóstico de espondilodiscite bacteriana e foram tratados com antibióticoterapia baseado
no contexto da situação clínica, imagens e laboratório mesmo sem
comprovação etiológica. Todos apresentaram queda marcante
dos marcadores inflamatórios na quarta e sexta semanas, sendo
considerados assintomáticos e curados no sexto mês de evolução
do tratamento. Nenhum dos mesmos apresentavam alterações
sugestivas de doença de POTT.
Em algumas situações, tais como a evolução da doença, apesar da terapêutica instituída, o tratamento cirúrgico é indicado e o
material obtido deve ser encaminhado para estudo microbiológico
e anatomia patológica, como forma de aumentarmos a chance de
identificação do agente etiológico. No presente estudo, somente
o material coletado no trans-operatório possibilitou a identificação
do germe, uma vez que a punção e hemoculturas foram normais.
Conforme Howard et al.¹² os fatores predisponentes para infecção
devem ser pesquisados e valorizados na elaboração da hipótese
diagnóstica. Na presente série de pacientes estudados identificamos
antecedentes de diabetes melitos, infecção urinária de repetição,
terapia com corticosteroides, história de procedimentos cirúrgicos
prévios na área gineco-urológica, discectomia lombar, imunodeficiência e drogadição em 12 (57%) dos 21 casos estudados.
O diagnóstico precoce acurado e a instituição precoce da
terapêutica são fatores decisivos para o desfecho favorável e
para afastar a necessidade de intervenção cirúrgica e sequelas.8
5,1 (1,5 a 7,2)
Os dados são apresentados como contagens (percentuais) ou especificados de modo diferente. DP:
desvio-padrão, VSG: velocidade de sedimentação glomerular, PCR: proteína C reativa.
O diagnóstico precoce da espondilodiscite bacteriana continua
sendo um desafio devido a inespecificidade de sinais e sintomas
referidos pelo paciente. A base para o diagnóstico é a suspeita clínica
no momento do atendimento inicial. A espondilodiscite bacteriana
deve ser sempre suspeitada no diagnóstico diferencial de lombalgia,
febre de origem desconhecida e pacientes com sinais e sintomas
de comprometimento constitucional, principalmente quando acompanhada de alterações dos marcadores laboratoriais inflamatórios.
Todos os autores declaram não haver nenhum potencial conflito
de interesses referente a este artigo.
Coluna/Columna. 2015;14(4):299-303
DIFICULDADES DIAGNÓSTICAS NA ESPONDILODISCITE BACTERIANA
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