JOGOS PEDAGÓGICOS DA REVISTA CIÊNCIA HOJE DAS

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Revista da SBEnBio - Número 7 - Outubro de 2014
V Enebio e II Erebio Regional 1
JOGOS PEDAGÓGICOS DA REVISTA CIÊNCIA HOJE DAS CRIANÇAS:
CONTRIBUIÇÕES PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS
Noemi Boer (Centro Universitário Franciscano –UNIFRA)
Lúcia Flávia Oliveira Rodrigues (Aluna do Curso de Pedagogia - UNIFRA)
RESUMO
Otrabalho refere-se a dois jogos pedagógicos publicados narevista Ciência Hoje das Crianças
(CHC), no ano de 2010. Na análise, de abordagem qualitativa, tem-se por objetivoexaminar
conteúdos e habilidades envolvidas nos jogos selecionados, identificar sua adequação e
possíveis contribuições para a aprendizagem em Ciências nos anos iniciais. Sublinha-se a
importância da educação lúdica para o desenvolvimento intelectual, moral e do senso de
solidariedade da criança, bem como para o desenvolvimento de habilidades motoras,aquisição
de novos conhecimentos e estímulo à leitura.Os jogos analisados permitem trabalhar
conteúdos procedimentais, atitudinais e conceituais voltados ao ensino de Ciências.
Palavras-chaves:Ludicidade. Aprendizagem em Ciências. Desenvolvimento infantil.
INTRODUÇÃO
Os jogos pedagógicos ganham espaço cada vez mais significativo, principalmente,em
atividades escolares. Têm o propósito de não ser apenas um simples divertimento e sim
estratégias, para que os alunos aprendam de forma agradável e construam conhecimentos
coletivamente. São recursos didáticosimportantes que geram prazer e ludicidade às crianças e
podem ser utilizados, pelo professor, com diferentes fins.
Etimologicamente, “a palavra jogo provém do vocábulo de origem latina iocus, que
significa brincadeira, graça, diversão, rapidez, passatempo” (MORENO , 2005, p. 16). Com
isso, o jogo é capaz de possibilitar um ambiente motivador e enriquecido, o que pode facilitar
a aprendizagem. Sendo fruto de várias interações sociais, envolve a estimulação mental e
física, permitindo desenvolver habilidades que o próprio ato de jogar exige. Como qualquer
atividade humana, “o jogo só se desenvolve e tem sentido no contexto das interações
simbólicas, da cultura” (KISHIMOTO, 1998, p.30). Esse autor descreve que jogar
proporcionabenefícios intelectuais, morais e físicos, por isso é um elemento importante no
desenvolvimento integral da criança.
Os jogos pedagógicos não se restringem aos materiais didáticos e atividades de sala de
aula. Podem ser encontrados em revistas, sites e, até mesmo, em lojas de brinquedos,
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disponíveis à compra. A revista CHC conta com este recurso. No site da revista, as crianças
têm acesso livre a diferentes atividades. Podem jogar sem estar necessariamente na presença
do professor. Isso permite que elas explorem e se esforcem para o entendimento do conteúdo
ali trabalhado, adquirindo, assim, novos conhecimentos e benefícios à sua formação. Por
outro lado, associar o jogo ao ensino de Ciências pode ser uma estratégia interessante para
elevar o nível de conhecimentos dos alunos, tendo em vista os resultados alcançadospor
estudantes brasileiros no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA).
Cabeesclarecer que este artigo é um recorte do Trabalho Final de Graduação (TFG)
orientado pela primeira autora, em que foram analisados diferentesjogos publicadosna revista
CHC, no período 2010 -2013. Para os propósitos desta publicação, selecionamos dois jogos
voltados ao ensino de Ciências. Assim, os objetivos específicos compreendem listar os
conteúdos e habilidades envolvidas nos jogos selecionados; identificar sua adequação à idade
e/ou ano das séries iniciais do ensino fundamental, bem como as possíveis contribuições para
a aprendizagem em Ciências.
REFERENCIAL TEÓRICO
Nos tópicosque compõemo referencial deste estudo, são apresentadas considerações
sobre o jogo, a ludicidade e a formação do juízo moral da criança. Na sequência,
considerações sobre oensino de Ciências e sobre a revista CHC.
Educadores e psicólogos defendem que brincar tem papel fundamental no
desenvolvimento infantil e que as experiências sensoriais advindas de jogos são a base do
desenvolvimento intelectual. Argumentam que, no jogo, as crianças exploram e exercitam sua
imaginação. São motivadas e, comisso,estimulam sua inteligência, procurando superar suas
dificuldades. Também, é importante que elas sejam estimuladas a aprender de maneira que o
lúdico deve ser visto e praticado de forma consciente, pois não é mera diversão ou
preenchimento de tempo. Assim, o jogo é um fator essencial na educação do indivíduo e na
sua preparação para a vida adulta (STUDART, 2005;ROSA 2008, VIGOTSKY, 2003).
Pelo senso comum, considera-se o jogo apenas como uma distração, mas
invariavelmente o jogo aparece em todas as fases da vida cultural dos povos e representa uma
peculiaridade natural da condição humana. O jogo não é inerente apenas ao ser humano, os
animais também brincam, por isso, este fato deve ter algum sentido biológico, afirma
Vigotsky (2003). Este autor explica que, para a criança,o jogo possui um sentido importante
quando correspondea sua idade, a seus interesses e quando inclui elementos que levam à
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elaboração de hábitos e habilidades. Vigotsky(2003) categoriza os jogos em três grupos.O
primeiro grupo de jogos é constituído pelas brincadeiras com diferentes objetos, por exemplo,
com chocalhos, lançar e recuperar objetos. Enquanto a criança se ocupa com isso, ela aprende
a ver,ouvir e segurar. O segundo grupo de jogos inclui esconder e escapar, entre outros, e
vincula-se à elaboração de habilidades de se deslocar no ambiente. Os jogos doterceiro grupo
sãodenominados jogos com regras. Surgem de regras puramente convencionais e das ações
ligadas a elas. Nesses jogos, as crianças organizamformas superiores do comportamento que
geralmente estão ligadas à resolução de problemas, exigem do jogador tensões, conjeturas,
sagacidade e criatividade (VIGOTSKY, 2003).
São exatamente os jogos com regras que interessam a este estudo e que estão voltados
à aprendizagem escolar. Desse modo, o equilíbrio entre a função lúdica e a função educativa
passa a ser o objetivo do jogo. A função educativa do jogo oportuniza ao aluno aprender
brincandoe, para o professor, o jogo é recurso didáticode que ele lança mão em diferentes
momentos. No contexto da sala de aula,aprender com o jogo pode envolvera produção do
saber e isso torna um ambiente rico de significados, principalmente para o aluno. Assim, os
jogos pedagógicos são recursos de aprendizagem de conteúdos escolares,instrumentos de
ensino e avaliação (ROSA, 2008).
Deldime (1999) explica que a criança, em idade escolar, não encontra no jogo apenas
uma compreensão física, descobre nisso uma satisfação moral. Essa satisfação é decorrente
das regras inerentes ao ato de jogar e os limites impostos por essas regras também geram
satisfações e preparam o indivíduo para viver em sociedade. A autoraexplica ainda queo jogo
ampliaas habilidades motoras de coordenação, a concentração e a socialização, mas asua
principal função é contribuir com a maturação psíquica do indivíduo.
Sobretudo após os dez anos, a criançatorna-se capaz de compreender os
inconvenientes dos jogos em grupo que podem restringir a sua liberdade. Com isso, ela
adquire o senso de solidariedade. Certos jogos se tornam símbolo de novas significações e
suporte à socialização. Neste processo, a formação do sujeitoestá relacionada à construção de
sua autonomia que, por sua vez, relaciona-se à construção do juízo moral (DELDIME, 1999).
A partir do jogo de regras, Piaget (1994) analisa a consciência que a criança possui dos
jogos de que participa. Ele aborda a moralidade como um sistema de regras que está
relacionadoao juízo moral que passa de um estágio pré-moral ao estágio de moralidade
autônoma. Assim, no entendimento de Piaget, a moral não é apenas a interiorização de regras
e normas de conduta. Como não é inata no indivíduo, decorre das relações que ele estabelece
com o grupo social, explicam Coutinho e Moreira (1992).
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La Taille (1992) explica que, segundo Piaget, a evolução da prática e da consciência
de regras compreende três etapas:anomia, heteronomia e autonomia. O estágio da anomia
caracteriza-se pela ausência total de regrase a tendência, nessa fase, é de projetar no mundo
exterior os seus desejos e impulsos. As ordens e proibições são simplesmente obedecidas uma
vez que acriança de até aproximadamente seis anos não segue regras coletivas. No estágio da
moralidade heterônima, a criança tem a tendência de considerar os deveres e os valores como
existentes em si mesmos e externos à sua vontade. Portanto,na etapa heterônoma,ela atende a
normas estabelecidas por outrem, o que permite participar de jogos de regras coletivas, mas
ainda não assimilou o real sentido da existência de regras. “ [...] as crianças desta fase jogam
mais umas ao lado das outras do que realmente umas contra ou com as outras” (LA TAILLE,
1992, p. 50). O estágio da moralidade autônomaestá relacionado ao respeito consciente e
cooperativo à regra. Os deveres,as regras eas prescrições só serão cumpridas, nessa fase,
quando percebidas e avaliadas como necessárias e significativas a cada situação. Este autor
deixa claro que as características dessa etapa compreendem a concepção adulta de jogo.
Disso se conclui que,para tornar-se um individuo crítico, capaz de posicionar-se diante
de questões controversas e com diferentes pontos de vista, é necessário alcançar o estágio de
moralidade autônoma. Neste sentido, a sala de aula e a forma como o professor concebe a
relação ensino-aprendizagempodem favorecer tanto a construçãodo conhecimento como a
construção daautonomia do aluno. De acordo com Becker (2001), na medida em que o aluno
é estimulado a problematizar a sua ação, ele constrói seu conhecimento em duas dimensões
complementares: “[...] como conteúdo e como forma ou estrutura; como conteúdo ou como
condição prévia de assimilação de qualquer conteúdo” (p.26).
No que se refere ao ensino de Ciências, a curiosidade é o primeiro momento para a
discussão e exploração daquele conteúdo que o professor deseja trabalhar. Carvalho (2003)
declara que o ensino de Ciências não deve trabalhar com a apresentação e leis e teorias já
elaboradas. O caminho ideal seriaque os alunos construíssem o seu conhecimento desde o
início da escolaridade. É preciso deixar o aluno fazer e falar sobre ciências,defende a autora.
Consoante a esta compreensão, Selbach (2010) acrescenta que a“aprendizagem é processo
que começa com o confronto ente a realidade do que sabemos e algo novo que descobrimos”
(p. 48). Por esse motivo, as aulas de Ciências, nas séries iniciais do Ensino Fundamental,
devem contemplar atividades interessantes que permitem a exploração e sistematização de
conhecimentos compatíveis com o nível de desenvolvimento do aluno, argumenta a autora.
Com base nos autores precedentes, o ensino de Ciências está constituído por um corpo
de conteúdos que contém conceitos, procedimentos e atitudes selecionados a partir do corpo
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científico erudito. Na prática, identificam-sedificuldadesem organizar os conteúdos,
principalmente os atitudinais e procedimentais, tendo em vista que os currículos das Ciências
da Natureza estão organizados com referência aos blocos temáticos ecentrados na perspectiva
conceitual. A visibilidade dos conceitos, procedimentos e atitudes no ensino de Ciências
precisam estarnos currículos
escolares, para que as atividades possam potencializar as
condições de integrar oconhecimento de senso comum dos estudantes com os conceitos
científicos trabalhados pela escola (POZO; CRESPO, 2009; SELBACH, 2010). Desse modo,
os conteúdos conceituais são necessários para concretizar os conteúdos procedimentais e
esses dois grupos são imprescindíveis para concretizar atitudes.
Sobre a revista Ciência Hoje das Crianças
A revista CHC foi criada em 1998, é editada e publicada pelo Instituto Ciência Hoje,
sendo uma revista brasileira que pode ser lida por crianças de todo mundo. Tem como
objetivos mostrar ao público infantil que a ciência faz parte da vida de cada um; estimular a
curiosidade e o entendimento, contando com o auxílio de ilustrações, experiências e jogos
pedagógicos que podem ser realizados pelas crianças. É instrumento fundamental em sala de
aula como fonte de pesquisa e de importância aos alunos na elaboração de tarefas e projetos
escolares. A publicação é adotada pelo Ministério da Educação (MEC) e distribuída para as
escolas, como material de apoio paradidático.
Gouvêa (2005) relata um estudo realizado por meio de entrevistas sobre práticas de
leitura com crianças que leem regulamente a CHC. O autor conclui que o ato de ler aproxima
o leitor do conhecimento científico. Os alunos, ao iniciarem seu contato com explicações
científicas, seja na escola sejapor outras fontes de informação, geram novos significados e
novos conhecimentos. Assim, conceitos científicos, apresentados às crianças, possibilitam o
contato com “a linguagem e o texto científico, que têm estruturas próprias, tornando
conhecidosvocabulário, processos, estruturas de pensamento, isto é, inserindo-as na cultura
científica” (GOUVÊA, 2005, p. 49).
Isso não quer dizer que tudo é compreendido, mas sim que cada criança tem seu tempo
e aprenderá o que for de acordo com seu desenvolvimento,e o que for apreendido estimulará
seu desenvolvimento. Nesse sentido, o contato com o conhecimento científico possibilita criar
concepções acerca da ciência. Conforme explica Gouvêa (2005),muitascrianças conhecem a
revista CHC por intermédio dos pais e professores, possibilitandoa troca de informações
acerca do que leem na revista. Mesmo que cada pessoa tenhaa sua técnica para ler a revista, o
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que realmente importa é a aprendizagem que cada um irá adquirir, conclui o autor. Assim
como outras revistas, a CHC se constitui em fonte de pesquisa e possibilita a aquisição de
conhecimentos por meio de atividades lúdicas. Crianças leitoras da revista têm acesso a bens
culturais, pois a mesma estimula e valoriza o hábito de ler. Portanto, um dos objetivos da
revista CHC é a divulgação científica destinada ao público infantil, possibilitando iniciá-lo
neste gênero de leitura.
METODOLOGIA
Para os propósitos deste estudo, foram analisados dois jogos pedagógicos publicados
na revista CHC. Na primeira fase da pesquisa, foi feito um estudo exploratório que
compreendeu apré-análise de 30exemplares publicados nos anos de 2010 - 2013. Entre esses,
foram selecionadas todas as revistas que continham jogos didáticos. Uma nova seleção foi
feita para escolher os jogos que melhor atendiam aos objetivos do estudo. Na segunda fase da
pesquisa,foi realizada a análise qualitativa procurando-se identificar os artifícios utilizados
pelos editores para chamar atenção do público infantil, como o tema do jogo, a linguagem, a
descrição das regras e a apresentação gráfica do jogo.
O corpus da pesquisa foi composto pelos jogosdenominadosEtnotrilha (Figura 1)e
Presas e Predadores(Figura 2). Na análise, de natureza qualitativa, teve-secomo referência os
seguintes aspectos: a) tema e áreas do conhecimento envolvidas; b) conteúdos abordados pelo
jogo; c) a linguagem: clareza das informações sobre as regras do jogo e a adequação do texto
ao público-alvo; d) apresentação geral do jogo, texto e ilustrações; e) habilidades intelectuais
envolvidas ; f) valores repassados de forma explícita ou subjacentes ao conteúdo do jogo,
como, por exemplo, cuidado com o meio ambiente; respeito aos animais, entre outros.
Procurou-se também identificar, nos jogos analisados,conteúdos procedimentais, atitudinais e
conceituais.
APRESENTAÇÃO E ANÁLISEDO JOGO ETNOTRILHA
Fragmentos do texto sínteseQuando crescer, vou ser... etnobotânico!
O etnobotânico é o profissional que mistura os princípios de botânica com os da
antropologia para entender como as pessoas se relacionam com as plantas. Ele pesquisa e
registra todos os usos de uma determinada cultura ou população por meio de um trabalho de
campo. Esse profissional precisa ter respeito às diferenças sabendo ouvir o que as pessoas
têm a dizer.
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Estudando as plantas usadas por uma comunidade, o etnobotânico mostra a todos que
elas são importantes e não podem ser destruídas. Porém, algumas vezes, é importante fazer
testes em laboratório para verificar se a planta tem realmente benefícios, como também
descobrir outros até então desconhecidos.O importante é gostar de lidar com plantas e
pessoas e respeitar o conhecimento de outras culturas! (MOUTINHO, 2010).
Apresentação do jogo
O jogo Etnotrilhaestá representado na Figura 01 e em sua apresentação consta: Que tal
viajar a uma aldeia indígena para fazer o trabalho de campo de um etnobotânico? A
aventura começa na universidade e termina na localidade escolhida pelo seu grupo de
pesquisa. Separe um dado, sementes diferentes para representar os integrantes do jogo e
coloque na bagagem sorte para tentar chegar primeiro ao final da trilha (CHC, 2010, p.26).
Análise do jogoEtnotrilha
A linguagem do jogoé clara, está adequada ao seu público-alvo que são as crianças. As
informações sobre as regras do jogo estão devidamente descritas e os termos utilizados são de
fácil compreensão. A apresentação compreende uma introdução sobre o assunto e as regras do
jogo. As letras são de tamanho que permite a leitura facilmente. As figuras estão de
acordocom o jogo o que contribui para o entendimento e visualização do conteúdo.
Considera-se que este jogo está adequado paraalunos a partir do 4º ano, sendo interessante
também a crianças maiores. O tema permite trabalhar conhecimentosrelativos ao ensino de
ciências, de meio ambiente,história e geografia.
Os principais conteúdos procedimentaisidentificados referem-se a: como fazer
anotações em caderneta ou gravador; usar luvas em procedimentos de campo; aprender como
se faz um colar de sementes;como entrar sozinho na mata para coletar amostras;quando se
pode aceitar um chá para dor de estômago, como fazer uma pergunta importante sobre o uso
de determinada planta e como interpretar rotas.Os conteúdos atitudinaisenvolvidos na
etnotrilha referem-se a valores como respeito aos mais velhos, à cultura indígena e aos
conhecimentos por eles transmitidos.Os conteúdos conceituais são identificados nas
informações sobreuma plantaque causa coceira (urticária), sementes do urucum e uma raiz
que os índios costumam comer.
Nos procedimentos envolvidos no jogo, identificam-seaspectos relativos à atitude
científica que envolve cuidados na coleta de amostras, bem como no registro de dados e
observações. Esses procedimentos são essenciais para entender como trabalhaum pesquisador
em uma atividade de campo, neste caso um etnobotânico.
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O conteúdo da casa 25 do jogo“Você aceitou um chá para curar uma dor de estômago
e ficou bom depressa”mostra que a utilização de plantas para fins medicinais faz parte do
conhecimento cotidiano das pessoas, obtido pela experiência e transmitido de geração a
geração. Na atualidade, muitos desses conhecimentos têm efeito comprovado pela ciência de
maneira que a cultura dos povos nativos é importante para o avanço da própria ciência. Este
aspecto está ilustradono texto da casa 14: “Você conseguiu convencer o pajé a lhe dar
algumasreceitas tradicionais das tribos”.
A casa 17,“Você aprendeu como fazer um colar com sementes de urucum”,
abordaoutra relação do homem com as plantas. Muitos adornos utilizados por indígenas são
confeccionados com sementes e fibras vegetais. Na contemporaneidade, materiais vegetais
agregam valor a diferentes produtos industrializadose isso pode ser explorado nas aulas de
Ciências. O conteúdo da casa 17 pode estimular também a curiosidade sobre outras utilidades
do urucum, como a extraçãode pigmentos e sua utilização.
Na casa 27 “Ei! Você se esqueceu de fazer umas pergunta importante sobre o uso de
uma determinada planta [...]”, também se pode identificar o espírito investigativo que
permeia o jogo e que, para o ensino de Ciências, é fundamental. Perguntas que admitem
várias respostas podem estimular o pensamento criativo, o raciocínio e instigar a descoberta.
Os aspectos identificados no jogo etnotrilhase alinham com as contribuições de Pozo e
Crespo (2009) e Selbach (2010) uma vez que esses autores reforçam a ideia de integrar e
valorizar oconhecimento de senso comum. Os estudantes, por meio de atividades como jogos,
irão valorizar e assimilar processualmente os diferentes saberes. Este percurso didático
permitirá o acesso e a aprendizagem de conceitos científicos trabalhados pela escola de forma
lúdica.
A etnotrilha é um jogo que oferece desafios à criança e repassa informações
interessantes sobre plantas e sobre a vida cultural dos indígenas. “Para se preservar a
diversidade biológica, temos que preservar a diversidade cultural”,afirmaAlbuquerque apud
Moutinho (2010, p. 23). Considera-se que este jogo permite desenvolverhabilidades
intelectuais como pensamento, atenção, percepção e a linguagemexplicadas por Vigostky
(2005) como as principais funções psicológicas superiores.O ato de jogar proporciona
diferentes desafiosà criança com repercussão sobre seus conhecimentos sociais e
afetivos(FRIEDMANN,1996 ; RAMOS, 2005; SANTOMAURO, 2013). Portanto, pode-se
concluir que, ao jogar a etonotrilha, a criança pode ficar motivada a buscar informações
complementares sobre a relação que as pessoas estabelecem com as plantas, sobre a profissão
do etnobotânico, sobre a vida na floresta e demais recursos da natureza. Acredita-se,assim,que
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o jogo é um processo intermediário, isto é, serve como mediador na aprendizagem de novos
conhecimentos e também no desenvolvimento das potencialidades da criança.
Figura 1: Etnotrilha.
Figura 2: Presas e predadores.
Fonte: Revista CHC, 2010.Fonte: Revista CHC, 2010.
APRESENTAÇÃOE ANÁLISE DO JOGO PRESAS E PREDADORES
Fragmentos do texto-sínteseMar na Amazônia ?
A chamada Amazônia Azul- ou seja, o mar dos estados que compõem a Amazônia
ocupa uma área de cerca de 3,5 milhões de quilômetros quadrados, mais de um terço do
território brasileiro. Já se sabe que nas águas da Amazônia existe uma grande
biodiversidade, uma enorme riqueza de espécies animais e vegetais, ainda por ser estudada.
Quanto mais se estuda o mar da Amazônia, mais se tem certeza de que há muito a ser
descoberto. Um dos grupos que mais chamam a atenção por lá são o das baleias e dos
golfinhos, assim, a motivação de um grupo de pesquisa surgiu na região para tentarem
entender a biologia e o comportamento de botos, baleias e peixes-boi.
Atualmente se sabe que ocorrem pelo menos vinte espécies de mamíferos marinhos na
Amazônia. Mesmo sendo protegidos pela lei brasileira, os mamíferos marinhos da Amazônia
sofrem com ameaças vindas principalmente, de nós humanos. A alteração e contaminação
dos ambientes onde vivem também são problemas provocados pelos humanos. Para proteger
esses animais é preciso saber a importância que eles têm no meio ambiente, e isso se aprende
conhecendo melhor as espécies (RODRIGUES, et al., 2010).
Apresentação do jogo
Agora que você já conhecemuitos dos mamíferos aquáticos do litoral da Amazônia,
que tal tentar descobrir como eles de encaixam na cadeia alimentar? Será que você consegue
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completar os espaços vazios com os predadores e as presas certas? Para facilitar, você tem
duas dicas á sua disposição:
Dica 1:O cachalote e o boto-vermelho não têm a mesma dieta.
Dica 2: A jubarte não come lula (CHC, 2010, p. 26).
Análise do jogo presas e predadores
O tema do jogo permite trabalhar conhecimentos de Ciências Naturais, mais
especificamente a cadeia alimentar que envolve peixes, mamíferos aquáticos, zooplâncton e
fitoplâncton. Neste jogo, a linguagem das informações-base juntamente como se procede
nojogo são claras, contendo dicas para que o jogador inicie, sendo de fácil compreensão.
A apresentação do jogo é direta, não deixando de ser eficaz. Remete o leitor ao texto
sobre o conteúdo do jogo. O tamanho das letras está adequado, bem como as cores, o que
permite uma boa visualização das informações. As figuras ilustrativas facilitam o
entendimento das regras do jogo. Em Presas e Predadores, não há ganhadores ou perdedores.
É um jogo que visa à descoberta pessoal ou em pequenos grupos.
Considerando-seque o conteúdo do jogo envolve conhecimentos sobre cadeias
alimentares, sua adequação é para crianças do 4º ano e 5º ano do Ensino Fundamental. O
professor poderá explorar o equilíbrio ambiental uma vez que, se um dos elos da cadeia
alimentar for extinto ou alterado, desequilibra todo o sistema. O texto síntese ressalta a
necessidade de preservação dos mamíferos aquáticos, juntamente com o ambiente em que
vivem e a importância deles para o meio.O jogo exige atenção, raciocínio e as habilidades
motoras de recortar e colar.
Os conteúdos conceituais incluem o estudoda cadeia alimentar, nicho, habitat, bioma e
biodiversidade.
Como
conteúdos
atitudinais,
contemplaconhecimentos
referentes
à
valorização do bioma ‘mar da amazônia’ e sua biodiversidade e, deste modo, a
conscientização ambiental. A respeito dos conteúdos procedimentais, o jogo por si só
mobiliza o estudante à busca do sucesso nas atividades. Deste modo, habilita o alunoa
exercitar o raciocínio rápido, a organização de informações e o momento preciso de utilizá-los
ou transpô-los a uma nova situação-problema.
Dessa forma, destaca-se também a possibilidade de aprender, por meio do jogo, de
modo autônomo, superando o estágio de heteronomia para atingir a concepção adulta de jogo,
conforme explica La Taille (1992) a partir da teoria piagetana.
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CONCLUSÕES
Analisar jogos pedagógicos publicados na revista Ciência Hoje das Crianças e sua
relação com os processos de ensino e aprendizagem em Ciências foi o propósito deste estudo.
A revisão da literatura e a análise dos jogos selecionados permitiram a elaboração das
considerações apresentadas a seguir.
Os autores consultados apontam a importância da educação lúdica para o
desenvolvimento intelectual, moral, senso de solidariedade e socialização da criança, bem
como o desenvolvimento de habilidades motoras e a aquisição denovos conhecimentos. Os
jogos infantis, sendo instrumentos pedagógicos, também possibilitam conhecer e diagnosticar
os atributos e atitudes dos alunos, portanto devem fazer parte de projetos escolares.
Um
dos
principais
objetivos
do
jogo
é
ensinar
conteúdose
as
descobertasproporcionadas no ato de jogar valorizam a curiosidade como um instrumento
válido de aprendizagem. Os alunos que conhecem e usufruem de diferentes jogos aprendem
conteúdos multidisciplinares, pois podem explorar diversos tópicos por meio de uma
ferramenta lúdica e estimulante. Além disso, o jogo pedagógico permite que o próprio aluno
atinja seu objetivo, sem precisar que o professor lhe mostre isto, favorecendo o
desenvolvimento de sua autonomia.
Portanto, é possível concluir que a revista CHC e os jogos analisados neste
estudocontribuem com o ensino de Ciências, quando utilizados com fins pedagógicos, tanto
em sala de aula como em outrosespaços de aprendizagem. Contribuem também com a
divulgação científica, fonte de informação e estímulo à leitura de crianças.
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