1 O MÉTODO CIENTÍFICO DE MARX: UMA ABORDAGEM ONTOLÓGICA Heline Caroline Eloi Moura UFAL [email protected] Kamilla Karinne de Oliveira Almeida UFAL [email protected] INTRODUÇÃO O estudo que ora se apresenta objetiva explicitar algumas reflexões acerca do método de Marx a partir de uma abordagem ontológica. Buscou-se analisar as questões essenciais que envolvem o conhecimento e o método científicos a partir da perspectiva marxiana, algo que pressupõe uma análise ontológica da realidade social. Para esta discussão recorremos à pesquisa bibliográfica de cunho marxiano, que analisam a temática em questão, bem como recorremos a uma das obras do próprio Marx. O método de Marx é uma questão que se apresenta de modo diferente do método científico moderno. Visto de forma equivocada ou até mesmo desqualificada, a discussão do método de Marx, a partir de uma abordagem ontológica, é imprescindível, uma vez que, de acordo com Tonet (2013), os fundamentos metodológicos elaborados por Marx são aqueles que melhor permitem a compreensão da realidade social. Destacaremos neste estudo uma das dimensões da atividade humana: o conhecimento científico, e posteriormente, realizaremos uma discussão sobre a questão do método de Marx. 1. 2. A PROBLEMÁTICA DO CONHECIMENTO A natureza da dimensão cognitiva tem como ponto de partida o ato que funda o ser social, ou seja, o trabalho. Marx ao tomar como referência o trabalho possibilitou entender GT MARXISMO, CONCEPÇÃO E MÉTODO. ANAIS do VII ENCONTRO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO E MARXISMO Belém, Universidade Federal do Pará, Maio de 2016. ISBN 978-85-7395-161-5 2 as categorias que o integram, incluindo a dimensão cognitiva, como algo que faz parte do ser social e que se desdobra ao longo do processo histórico, independente das formas de sociabilidades que se desenvolveram ou venham a se desenvolver (TONET, 2013). O conhecimento científico enquanto dimensão da atividade humana tem uma função específica para reprodução do ser social. Para Tonet (2013), a finalidade essencial do conhecimento científico é reproduzir a realidade1, como ela é em si mesma, do modo mais fiel possível. Marx ressalta que no processo de conhecimento é o objeto que organiza o sujeito e que isso ocorre porque se deve respeitar a natureza e a lógica, que são resultado de um processo histórico-social, própria do objeto. Para tal, Netto (2011) destaca que este conhecimento se desenvolve de forma independente dos desejos, das aspirações e das representações do pesquisador. Tonet (2013) aponta que o objetivo do conhecimento não é capturar todos os elementos que integram o objeto, mas apenas aqueles que são necessários para atingir o objetivo almejado. Deste modo, conhecimento e execução prática vão se determinando de forma processual. Além disso, tanto na esfera do conhecimento da realidade social e natural, existem obstáculos, a superação destes implicará no esforço rigoroso, vigilância epistemológica, e, sobretudo, a intervenção de pontos de vista oriundos das classes sociais, que é algo admitido na perspectiva marxiana. O autor identifica que o ponto de vista de classe, mesmo não sendo admitido conscientemente ou até mesmo sendo rejeitado, intervém no processo de conhecimento, pois não pode haver neutralidade axiológica numa sociedade perpassada pelo antagonismo das classes sociais. Todavia, segundo Tonet (2013), o fato de assumir a perspectiva da classe trabalhadora, não é garantia de que o pensador alcance a reprodução teórica de forma integral. O marxismo, não afirma está de posse da verdade. Apenas afirma que os fundamentos metodológicos elaborados por Marx são aqueles que melhor permitem a compreensão da realidade social. Desta forma, o autor se contrapõe as afirmações de cunho subjetivistas que defendem que a perspectiva ontológica tem um caráter dogmático. 3. A QUESTÃO DO MÉTODO Posto todas essas questões anteriores, como então o sujeito deve proceder para 1 Marx assinala categoricamente que a razão humana pode apreender a realidade em sua integralidade. O autor resolve esta problemática ao superar a dicotomia entre subjetividade e objetividade e expõe que é possível conhecer a aparência e a essência, uma vez que a realidade não tem apenas a aparência; tem a essência, que é o que confere unidade e permanência – mesmo que relativas – a enorme diversidade e heterogeneidade ao constante fluir daquilo que aparece como imediato. Assim, fica claro que o conhecimento em Marx difere do positivismo, neokantismo, neopositivismo e da pós-modernidade que rejeitam a noção de essência (TONET, 2013). GT MARXISMO, CONCEPÇÃO E MÉTODO. ANAIS do VII ENCONTRO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO E MARXISMO Belém, Universidade Federal do Pará, Maio de 2016. ISBN 978-85-7395-161-5 3 traduzir teoricamente a realidade? Tonet (2013) sinaliza que esse questionamento não deve ser feito a subjetividade, mas a realidade objetiva, pois será a realidade objetiva (o objeto), no seu modo próprio de ser que indicará os caminhos e procedimentos metodológicos a serem seguidos. De acordo com Tonet (2013, p 112), “A prioridade do objeto (o real) sobre o sujeito (o ideal) impõe que para conhecê-lo, este último transforme o concreto real em concreto pensado (ideal)”. Vemos que essa abordagem se contrapõe ao método científico moderno, uma vez que o conhecimento é direcionado a reprodução da sociedade como ela é em si mesma. Neste sentido, o método não se configura como uma forma que é aplicável em uma diversidade de objeto, mas algo que é indicado pelo próprio objeto de investigação. A ontologia marxiana aponta que a realidade é uma articulação entre singularidade, particularidade, e universalidade; deste modo todo objeto é ao mesmo tempo singular, particular e universal. Para Tonet (2013), esta articulação é o que nos possibilita e nos orienta o caminho a ser seguido, nos apontando quais outras conexões e elementos estão postos no objeto. Partindo ainda dessa perspectiva, Marx aponta que a própria emergência do ser social implica desde o seu ato mais inicial, a presença do conhecimento. Assim, nenhum objeto é uma pura singularidade e nem é algo absolutamente desconhecido; pelo contrário, o conhecimento é acumulativo, pois o objeto é também processo histórico e social (TONET, 2013). Estes aspectos orientarão a descoberta dos elementos e conexões que levam à investigação do desconhecido. Além disso, “Totalidade, historicidade e práxis são, pois, categorias fundamentais na configuração dos caminhos para a efetuação do conhecimento” (TONET, 2013, p. 114). É importante salientar que essas determinações ontológicas não são fixas, são expressões históricas e sociais moventes e movidas. A categoria de totalidade é algo essencial no processo de conhecimento, pois consiste num conjunto de partes articuladas entre si, com uma determinada ordem e hierarquia podendo ter sentido diferente dependendo da totalidade da qual estiver inserido. A importância dessa categoria é identificada na medida em que, para obter o conhecimento sobre determinado objeto de estudo, é preciso tomá-lo em sua totalidade apreendendo as conexões que os articulam. Para isso, partindo do pensamento de Lukács, Tonet (2013) afirma que não há como fugir do ponto de partida, ele aponta que devemos fazer um percurso que nos leve do imediato, através do mediato, até o resultado final, que é uma síntese de vários elementos e uma articulação entre essência e aparência. Tonet (2013) aponta que o instrumento mais apropriado para realização de todo esse processo é a abstração2, pois, além de ser um fator importante para a superação da aparência 2 Para Tonet (2013, p. 121), “Do ponto de vista lógico, abstrair é separar, isolar determinada parte de um conjunto no qual ela está inserida. Através do processo de abstração são capturadas as diferenças, mas também o que há de comum entre determinadas coisas e o modo como elas se articulam”. GT MARXISMO, CONCEPÇÃO E MÉTODO. ANAIS do VII ENCONTRO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO E MARXISMO Belém, Universidade Federal do Pará, Maio de 2016. ISBN 978-85-7395-161-5 4 e a captura da essência, conforme afirma Marx, a realidade social não pode ser submetida a experimentações como ocorre com os estudos da realidade natural. No que concerne à hora de suspender a caminhada em direção ao conhecimento, Tonet (2013) afirma que isso deve acontecer quando se alcançar a identidade do objeto, a sua natureza específica, e, portanto, sua diferença em relação a todos os outros objetos, isto é, quando a identidade do objeto for estabelecida. Todavia, é importante salientar que isto não representa uma garantia absoluta, pois jamais haverá uma identidade total entre sujeito e objeto. Ressaltamos a relevância da compreensão desse estudo no processo de investigação da realidade, defendido por Tonet (2013) como o método mais avançado em termos de horizonte cognitivo. Consideramos esses elementos fundamentais para o processo de conhecimento, pois consiste em meios que norteiam tal processo analisando fielmente as determinações que se põe na realidade, ultrapassando a mera aparência e chegando à essência do objeto de investigação. CONCLUSÃO A problemática do conhecimento e a questão do método científico de Marx, analisados a partir de perspectiva marxiana, permite superar a ideia muito difundida de que o método científico construído a partir da modernidade é o único e verdadeiro conhecimento científico. Levando em consideração os elementos destacados no decorrer desse estudo, é possível fundamentar a afirmação de que Marx lançou os fundamentos de uma concepção nova de mundo “e de que, com isto, também fundou uma concepção profundamente nova de produzir conhecimento científico e de articulação filosofia e ciência” (TONET, 2013, p. 128). Portanto, o método de Marx é algo imprescindível para aqueles que buscam desvelar um determinado objeto de forma fiel. REFERÊNCIAS TONET, Ivo. Método Científico: uma abordagem ontológica. São Paulo: Instituto Lucáks, 2013. NETTO, José Paulo. Introdução ao Estudo do método de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2011. MARX. Contribuição à Crítica da Economia Política. São Paulo: Expressão Popular, 2008. GT MARXISMO, CONCEPÇÃO E MÉTODO. ANAIS do VII ENCONTRO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO E MARXISMO Belém, Universidade Federal do Pará, Maio de 2016. ISBN 978-85-7395-161-5