Departamento de Geografia A MARCHA DAS VADIAS NO RIO DE JANEIRO: O CORPO COMO TEXTO E TERRITÓRIO, NA PAISAGEM E EM REDE Alunos: Iata Anderson Silva Mendonça, Gabriela Franco Duarte e Valquiria Aciole da Silva Orientador: Leonardo Name Introdução O ano de 2011 ficou marcado por manifestações, movimentos sociais de protestos como há muito não se via. Essas manifestações tomaram as ruas, em muito com reivindicações globais e supostamente universais, mas também sem deixar de lado objetivos específicos e demandas peculiares de cada lugar. Destes movimentos, tem-se por objeto a chamada Slut Walk, que se replicou pelo globo após surgir no Canadá, em protesto à declaração de policial que relacionou o abuso sexual de mulheres às suas roupas supostamente provocantes. No Brasil, ela se chamou “Marcha das Vadias” e ocorreu em diversas cidades do país, inclusive no Rio de Janeiro. É inegável que, por um lado, eventos como a Marcha das Vadias estão vinculados diretamente com o avanço e a popularização das novas tecnologias de informação e comunicação, sobretudo a internet, a telefonia móvel e as redes sociais como o Facebook e o Twitter. Por outro, com a construção de perfis de relacionamentos em redes tecnossociais ou a produção, edição, estocagem e divulgação de fotos e vídeos, atividades a que são claramente direcionados investimentos emocionais, funcionando como locais para recuperação, processamento e reflexão de afetos (cf. Elliot e Urry, 2010). Nessas relações interpessoais “postar conteúdos” é ação que, para além de uma construção de “portifólios de sociabilidade” (Castells, 2003), estrutura valores que regulam essas relações e faz usuários/as comunicarem sobre si para a infinidade de outros/as usuários/os que, sendo ou não por nós sabido e permitido, acessam suas informações. Desse modo, as novas tecnologias nunca estão livres dos desejos e vontades, ansiedades e conflitos No caso dos homens das “vadias” e das mulheres cariocas eque dasasduas usam. marchas por elas já realizadas em 2011 e 2012, tem-se tanto como estratégia política quanto forma de mobilização e difusão espacial de seus conteúdos objetivos e subjetivos uma calculada e deliberada exposição do corpo nu feminino, que se converte ao mesmo tempo em texto e território, se insere na paisagem e se multiplica em rede. Corpo que é texto porque é nele que se escrevem as reivindicações e palavras de ordem contra a opressão e o abuso comandados pelas várias formas de machismo; é território porque é ali que se sabe se inscrever as marcas desse geo-histórico poder masculino e que se quer que a mulher tenha controle, como algo só seu; exibe-se na paisagem, porque é na deslumbrante orla de Copacabana, onde sempre há corpos femininos para deleite visual masculino, que as vadias resolveram marchar por duas vezes; e por fim, é na rede e em rede que as imagens e vídeos desses corpos nus e em movimento Pretende-seseassim, propagam. reinterpretar alguns dos conceitos-chave da Geografia (Cf. Castro et al., Orgs., 2001) à luz de eventos e contextos contemporâneos e tendo como base um discurso geográfico que por um lado leve em consideração a articulação entre dinâmicas globais e resistências com base no lugar; por outro, que dê relevo a questões de gênero, o que é bastante raro na geografia produzida no Brasil (Escobar, 1999; Silva, 2009). Objetivos Frente a esse quadro, tem-se por objetivo refletir preliminarmente sobre tais novos cenários de mobilização política e ocupação de espaços urbanos, em paralelo à Departamento de Geografia compreensão da multiplicidade e polissemia das tecnologias em permanente relação com o espaço geográfico. Parte-se da premissa que há hoje intricada relação entre as esferas da intimidade e da privacidade com outras, de exposição pública e evasão calculada de dados pessoais e produção de narrativas audiovisuais e microtextuais. Redes sociais e os perfis que seus usuários montam e remontam parecem ser, nesse contexto, instrumentos de uma construção identitária que em alguma medida é uma representação do privado para o deleite público. Pretende-se averiguar: • traçar o perfil do participante da marcha e/ou militante feminista; • as formas de uso das novas tecnologias da informação e comunicação para organização e estruturação da Marcha. • a construção e os processos e rebatimentos espaciais das suas biografias; • A importância da performance no espaço público, inclusive com o uso do corpo instrumento político de protesto; • As possibilidades políticas adensadas, ou não, da postagem de imagens de si (seu corpo, suas performances no espaço público etc.) em redes tecnossociais como o Facebook, por exemplo, em um evento como a Marcha das Vadias, sendo necessário se questionar: quais são as potencialidades e os problemas ligados a essa situação? Quais os avanços ou recuos políticos? Há ganhos e perdas emocionais? Metodologia A pesquisa já está em curso e se mobiliza a partir de revisão bibliográfica crítica, observação de campo, entrevistas de média duração e semiestruturadas e aplicação de questionários. O presente trabalho analisará o material produzido em entrevistas realizadas com as autodeclaradas lideranças e/ou organizadoras da Marcha de 2011, acompanhamento de reuniões e oficinas realizadas pelas mesmas, e os 104 questionários aplicados em participantes aleatórios da Marcha de 2012. Conclusões Referências 1 – CASTELLS, M. Comunidades virtuais ou sociedade em rede? In: A galáxia da Internet. Rio de Janeiro, Zahar, 2003, p. 98-113. 2 – CASTRO, I.E; GOMES, P.C.C; CORRÊA, R.L (Orgs.). Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. 3 – ELLIOT, A. e URRY, J. Mobile lives. London: Routledge, 2010. 4 – ESCOBAR, A. Género, redes y lugar: una ecología política de la cibercultura. In: El final del salvaje. Naturaleza, cultura Y política en la antropología contemporánea. Bogotá: Instituto Colombiano de An-tropología e Historia, 1999, p. 353-381. 5 – SILVA, J.M. Ausências e silêncios do discurso geográfico brasileiro: uma crítica feminista à geografia eurocêntrica. In: SILVA, J.M. (Org.). Geografias subversivas. Ponta Grossa: Todapalavra, 2009, p. 55-91;