as transformações na sociedade dos ponta

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Anais Semana de Geografia. Volume 1, Número 1. Ponta Grossa: UEPG, 2015. ISSN 2317-9759
AS TRANSFORMAÇÕES NA SOCIEDADE DOS PONTA-GROSSENSE
NO FINAL DO SÉCULO XIX E INÍCIO DO SÉCULO XX
HOLOWATE, Isaias
Resumo
O ideais progressistas foram importados pela sociedade brasileira, na segunda metade do
século XIX provocando diversas transformações culturais e legitimando modificações que
ocorreram nesse período. No âmbito local, nessa mesma época, a cidade de Ponta Grossa se
converteu, de uma economia, pautada no tropeirismo e embasada no regime mais tipicamente
escravocrata do Paraná, para uma economia que, no início do século XX, dava sinais de
modernização com a chegada da ferrovia e a industrialização. As mudanças econômicas e
políticas da sociedade ponta-grossense, foram influenciadas pelas transformações culturais
que ocorriam nessa sociedade, com as modificações na cosmovisão de alguns grupos da
sociedade – principalmente a classe média urbana - motivados pela apropriação de ideais
progressistas. Partindo dos pressupostos defendidos pelos pensadores da História das
Representações, buscamos levantar a forma com que grupos sociais retrataram essas
mudanças na sociedade ponta-grossense.
Palavras-chave: Cultura. Ponta Grossa. Sociedade.
Introdução
Neste trabalho, investigamos as tranformações ocorridas na sociedade ponta-grossense
da segunda metade do século XIX e início do século XX, em decorrência da crise do
tropeirismo e da ascensão de uma burguesia industrial multiativa, que se tornou hegemônica,
no final dos século, defendendo ideais progressistas e um modelo cultural científico. Essas
transformações, estão intimamente ligadas às mudanças que ocorriam em escala global, com
a ascensão dos ideais científicos e positivistas, as transformações surgidas a partir da
revolução industrial, e as atividades neocolonialistas na Africa e Ásia.
A cidade de Ponta Grossa surge como um local de passagem das tropas de mulas,
durante o período do tropeirismo, o qual se mantém como a principal atividade econômica da
região até meados do século XIX. A cidade se desmembra da legislatura de Castro no ano de
1855, tornando-se um Município independente. No decorrer da segunda metade do século
XIX, Ponta Grossa, passa de uma sociedade escravagista, onde a divisão entre brancos
proprietários e não-brancos escravos era bastante distinta, para uma sociedade onde as
relações sociais se tornam mais heterogêneas em decorrência da chegada dos imigrantes, e no
início do século XX, com a industrialização, apropriação dos ideais positivistas por algumas
camadas da população e instalação da ferrovia.
Pressupostos teórico-metodológicos
Para nossa investigação, utilizamo-nos da bibiografia disponível sobre o tema e das
tabelas sobre a situação da sociedade paranaense - e ponta-grossense - nos relatórios do
governador Zacarias de Góes e Vasconcelos, presente no livro Semeando iras rumo ao
progresso, de Magnus Pereira e dados do registro civil ponta-grossense entre 1890 e 1920,
presente na obra A população de Ponta Grossa a partir dos registro civil. - 1889 -1920, de
Elisabete Alves Pinto.
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Partimos do pressuposto da História das representações, do historiador Roger Chartier
para afirmarmos a impossibilidade da pesquisa histórica como a busca por uma verdade
objetiva mas, que a investigação deve ser pautada na procura pela veracidade histórica.
Pensamos as representações como ressignificações do real realizadas pelo indivíduo, a partir
das experiências dele na coletividade. Portanto, as nossas fontes, são representações
produzida em um determinado tempo e espaço histórico.
Chartier compreende as representações como significações com uma historicidade
própria, produzidas em uma determinada cultura, em um determinado espaço social e cultural,
e que dependem do espaço/tempo ao qual são produzidas.
As estruturas do mundo social não são um dado objectivo, tal como o não são as
categorias intelectuais e psicológicas: todas elas são historicamente produzidas pelas
práticas articuladas (políticas, sociais, discursivas) que constrõem as suas figuras.
São estas demarcações, e os esquemas que as modelam, que constituem o objecto de
uma história cultural levada a repensar completamente a relacão tradicionalmente
postulada entre o social, identificado com um real bem real, existindo por si próprio,
e as representacões, supostas como reflectindo-o ou dele se desviando.
(CHARTIER, 1990: 27)
Pensamos o real como algo momentâneo, que se esvai no exato momento, em um
acontecer constante. Os acontecimentos podem ser apropriados pela memória, que a partir das
apropriações do real, produzirá as representações da realidade. Essas representações são
subjetivas, ou seja, não são algo dado, determinado pela realidade. Partem do real, e são
influenciadas diretamente por ele, mas não são cópias do real.
Na representação “o real assume assim um novo sentido: aquilo que é real,
efetivamente, não é”. (CHARTIER, 1990: 62) Deixamos para trás a dualidade verdade/ficção,
para pensarmos a História das Representações do real através da relação signo - significado,
compreendendo como essa relação entre a realidade e as representações são produzidas a
partir do objeto real.
A economia Ponta-grossense em meados do século XIX
A economia ponta-grossense, era na metade do século XIX, tipicamente escravagista,
sendo que - de acordo com o historiador Magnus de Mello Pereira, que elaborou uma tabela
sobre a situação da sociedade paranaense com base no relatório do governador Zacarias de
Góes e Vasconcelos - Ponta Grossa possuía por volta de 1850, uma população de 3.033
habitantes, dos quais 1.889 eram considerados brancos e outros 1.144 eram compostos por
pessoas considerados pardos ou pretos. Das pessoas consideradas não brancas, 1.059 eram
escravos, o que significa que, 92,57% da população não-branca de Ponta Grossa era escrava.
Contudo, a partir da segunda metade do século XIX a economia da região dos Campos
Gerais entrou em um período de crise, em decorrência da queda do tropeirismo, e da
diminuição da quantidade de escravos vindos para a região, causado tanto pelo fim do tráfico
negreiro, quanto pela venda dos escravos para as regiões cafeicultoras paulistas.
A crise do tropeirismo provocou alterações significativas na sociedade que buscou,
durante a segunda metade do século XIX, soluções para a situação social e econômica da
região. Essas “soluções” são econtradas na figura do imigrante, que vem para a região dos
Campos Gerais, principalmente a partir da década de 1870.
A crise provocou também mudanças na estrutura econômica da região pois a
sociedade que se baseava anteriormente no tropeirismo, passou para uma transição para uma
economia mais diversificada, estruturada nas recém-criadas indústrias como a madeireira e
ervateira. (LEANDRO , 1995: 12)
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A imigração e as tranformações na sociedade ponta-grossense
Já no final do século XIX, a região de Ponta Grossa passou por um período de intensa
imigração que trouxe para a região pessoas de diversas nacionalidades possibilitando a
existência de uma multiplicidade cultural nessa região. A população ponta-grossense passou
entre final do século XIX e o início do século XX, de 4.774 habitantes de acordo com o
Censo de 1890, para 20.771 no Censo de 1920. (PINTO, 1980: 62) O aumento populacional
forneceu mão de obra barata e público consumidor para as crescentes fábricas e o florescente
comércio ponta-grossense.
As transformações econômicas ocorrem contiguamente ao fenômeno da urbanização
da cidade de Ponta Grossa, provocando uma modificação estrutural na sociedade, causado
inicialmente pela atuação cada vez maior de uma burguesia fazendeira no meio urbano. Nesse
período se estabelece uma distinção mais clara entre o rural e o meio citadino (PEREIRA,
1996), criando-se com a urbanização e a industrialização um sentimento de identidade
“urbana”. A atuação no sítio urbano, associado cada vez mais à riqueza e ao progresso, torna
cada vez mais diferenciável o meio rural da urbanidade Ponta-grossense.
A ascensão dos discursos científicos na sociedade ponta-grossense
Nessa época, muitos dos filhos de fazendeiros partiam em direção às capitais de São
Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco, onde realizavam seus cursos de bacharéis, e após
retornarem à região, assumiam postos de empregos públicos e cargos na política Pontagrossense (LEANDRO , 1995, P. 13). Essa “injeção” de ideias seria uma das responsáveis
pelo aparecimento das teorias cientificistas e discussões sobre as questões sociais por
intelectuais ponta-grossenses.
Nesse mesmo período os código de postura buscam regrar as práticas sociais da
população, através da ordenação dos espaços urbano e a busca pela estabelecimento de
normas de controle das ações dos indivíduos. (PEREIRA, 1996) Ao mesmo tempo, a ordenação
da população procurava criar identidade cultural de classe média em torno dos discursos
progressistas doutrinadores naquele momento, como a ideologia de ciência que se tornava
cada vez mais poderosa.
Os discursos baseados nas recentes descobertas centíficas tornavam-se cada vez mais
influentes no decorrer no do século XIX. As disciplinas científicas, como a medicina e o
direito se tornam dois dos mais influentes discursos, atuando inclusive na prática social, e
teriam papel decisivo na chamada cruzada eugenista.
A noção de civilização se afirmaria, principalmente, no caráter desse progresso. É
um progresso, em seus diversos aspectos, à moda européia. A cidade vai surgindo
como uma urbe cosmopolita, onde o comércio, a estrada de ferro, o novo
arruamento, as construções, os habitantes (sérios, ordeiros, empreendedores) e seus
novos hábitos civilizados são elementos denotativos de uma “nova Ponta Grossa”.
(ZULIAN, 1998: 53)
A população burguesa recém ascendida ao poder ponta-grossense contava com muitos
personagens que defendiam os ideais positivistas de ordem e progresso. O progresso é
associado à ocupação do interior e ao desenvolvimento tecnológico da região. A chegada da
ferrovia e a criação do periódico Diário dos Campos representam nesse momento, uma
importante evolução da cidade rumo ao progresso.
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Contudo, o aumento populacional significou também um aumento de necessidades de
estruturas políticas e sociais capazes de atender às recentes demandas da população. A
estrutura municipal não tinha condições de arcar com o preço da urbanização, e
transformações na estrutura da urbana não acompanharam as mudanças sociais, acentuando os
problemas sociais no ambiente citadino e tornando as condições de vida difíceis para a
maioria da população mais pobre.
Com o aumento populacional houve um “inchamento” da cidade, provocando o
aumento das tensões sociais. As publicações do Diário dos Campos denunciam
constantemente o aumento da criminalidade na área urbana, e dos chamados venenos raciais,
como o jogo, a prostituição, o alcoolismo e a vagabundagem. Com uma estrutura sanitária
escassa, a cidade era também vítima constante de epidemias de tifo, sífilis, febre amarela. As
páginas do jornal constantemente reclamam ações das autoridades em relação as aos
problemas higiênicos.
Considerações Finais
As transformações na sociedade ponta-grossense, são influenciadas por mudanças que
ocorriam no mesmo período na sociedade brasileira, que passou por diversas transformações
polítticas, econômicas e sociais nessa época. A crise da escravidão e sua posterior extinção,
provocaram uma necessidade de modificação na estrutura econômica brasileira. A solução
encontrada foi a chegada de milhões de imigrantes para as regiões sul e sudeste na segunda
metade do século XIX e início do século XX. Ao mesmo tempo, as crises que o governo
Imperial sofre, notadamente a partir da década de 1870, conduzem à queda do regime e à
proclamação da República em 1889. Contudo, o novo regime surge, frágil, e nos seus
primeiros anos, os grupos que controlam a política e a economia da República, buscam, nos
discursos do positivismo, baseados no progresso e na ordem, ferramentas para a consolidação
da nova ordem social.
A ascensão dos ideais positivistas, do cientificismo e dos discursos médicos, são
imprescindiveis para a compreensão das mudanças e da estruturação da sociedade pontagrossense no início do século XX. A sociedade local, buscou, após a crise de meados do
´seculo XIX, se reconstruir como uma sociedade dinâmica , com uma burguesia diversificada,
e adepta às transformações na cosmovisão, de acordo com as mudanças na sociaedade local e
nacional.
Portanto, as tranformações ocorridas na segunda metade do século XIX, e a
urbanização que ocorre com a chegada dos imigrantes principalmente europeus provocam a
urbanização da cidade sem haver propriamente uma preocupação das autoridades com a
massa que imigrava para a região. A falta de estrutura pra atender a crescente população,
representou uma das maiores dificuldades para o crescimento daquele período, pois a cidade
não possuía uma estrutura sanitária, cultural e social adequada. O período imediatamente
posterior a isso, seria o de importação de ideais eugenistas e a produção de suas
representações na sociedade ponta-grossense, além da de disciplinariação da população e do
espaço, através de medidas que buscaram melhorar/controlar as práticas da população pontagrossense.
REFERÊNCIAS
CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. São Paulo:
Difel, 1990.
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LEANDRO. José Augusto. Palco e tela na modernização de Castro. Dissertação de
Mestrado. Curitiba, UFPR; 1995.
PEREIRA, Magnus Roberto de Mello. Semeando iras rumo ao progresso.Curitiba, UTFPR,
1996.
PINTO. Elisabete Alves. A população de Ponta grossa a partir dos registro civil. - 1889 1920. Curitba, 1980.
ZULIAN, R.W. A victoriosa rainha dos campos: Ponta Grossa na conjuntura republicana.
Revista de História Regional 3(2):37-76. Ponta Grossa, 1998.
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