Capítulo 1 - Introdução A Física estuda, teórica e experimentalmente, todos os fenômenos da Natureza. A Física gera novas tecnologias que, em geral, trazem enormes benefícios para a humanidade. O clichê do cientista louco não tem comprovação no mundo real. “ O que a Natureza tem de mais incompreensível é o fato de ser compreensível”, A. Einstein A Física se relaciona com várias outras ciências: Matemática – A ferramenta fundamental. Todas as teorias e modelos da Física pensam a Natureza em termos matemáticos. Química – Ciência irmã. Biologia – A partir do século XX, físicos aprendem Biologia e biólogos aprendem Física. Medicina – Utilização de técnicas como raios-x, radioterapia, etc. O Método Científico: 1. Observação e Experimentação Os resultados experimentais são os juízes supremos de qualquer teoria científica. O filósofo alemão Hegel pensava de maneira completamente oposta. Dizem que , numa aula, Hegel afirmou que só poderiam existir 7 planetas. Um aluno interveio afirmando que isso contradizia os fatos, ao que Hegel respondeu: “ Tanto pior para os fatos!” 2. Abstração e Indução Numa primeira análise, abstrair fatores não essenciais. Por exemplo, nosso planeta tem formato esférico, achatado nos polos , com enorme variação de densidade. Mas numa análise sobre sua rotação podemos supô-lo uma esfera rígida. Já no âmbito do sistema solar, podemos considerá-lo um ponto ou partícula. Depois da abstração e observação , pode-se utilizar a indução de leis fenomenológicas como, por exemplo, as Leis de Kepler. 3. Leis e Teorias Físicas Devem ser comparadas com os resultados experimentais e devem fazer previsões. A Lei da gravitação universal de Newton só foi formulada graças às observações do astrônomo Tycho Brahe e à indução das Leis de Kepler. Previu, por exemplo, a existência do planeta Netuno, descoberto em 1846 por Adams e Leverrier. 4. Domínio de Validade Em geral, as leis da Física tem domínios de validade: a mecânica clássica vale para o mundo macroscópico e pode ser relativística ou não relativística, a mecânica quântica estende a mecânica clássica para o mundo microscópico, a teoria da relatividade geral de Einstein estende para campos gravitacionais fortes (como nos buracos negros) a teoria da gravitação de Newton. A ciência é um processo sedimentar. 1 Ordens de Grandeza e Algarismos Significativos O astrônomo Arthur Eddington afirmava (sem nenhum argumento plausível) que o número de elétrons do universo era precisamente igual a 15.747.724.136.275.002.577.605.653.961.181.555.468.044.717.914.527.116.709.366.231.425.076.185.631.031.296 Usando a notação exponencial : 2 x 136 x 2256 Qual a ordem de grandeza do número de segundos em um ano? (notação: ≈ aproximadamente e ~ da ordem de ) 1 ano ~ 30 x 12 = 3,6 x 106 dias 1 dia = 24 x 60 x 60 ~ 8,6 x 104 s logo, 1 ano ~ 3 x 107 s Qual a ordem de grandeza, em metros, de um ano-luz? Velocidade da luz ~ 300.000 km/s = 3 x 105 km/s 1 ano-luz ~ 3 x 105 km/s x 3 x 107 s = 9 x 1012 km = 9 x 1015 m O número de algarismo significativos se determina usando-se a base decimal; -4 0,0001 = 1 x 10 um algarismo significativo: 1 -1 0,1000 = 1,000 x 10 quatro algarismos significativos: 1000 -4 0,4321= 4321 x 10 quatro algarismos significativos: 4321 Portanto, em Física, o número de algarismos significativos está ligado à precisão na determinação de uma grandeza. Expressamos também o erro na medida dessa grandeza: 1,9 ± 0,1 ; 3,02 ± 0,07 2 Devemos expressar o resultado de operações aritméticas sempre com o maior erro presente: (1,9 ± 0,1) + (3,02 ± 0,07) ≈ 1,9 ± 0,1 + 3,0 ± 0,1 = 4,9 ± 0,2 Onde fizemos os arredondamentos 3,02 ≈ 3,0 e 0,07 ≈ 0,1 (1,9 ± 0,1) x (3,02 ± 0,07) ≈ (1,9 ± 0,1) x (3,0 ± 0,1) = 5,7 ± 0,5 Onde fizemos os arredondamentos 0,1 x 3,0 = 0,30 ≈ 0,3 e 1,9 x 0,1 = 0,19 ≈ 0,2 Deve-se usar os algarismos significativos com bom senso. Por exemplo, não tem sentido eu dizer que peso 78, 23451 kg... antes ou depois do almoço?... Como as balanças comuns têm precisão de 100 g, o correto é escrever 78,2 ± 0,1 Medidas de Comprimento 1. Unidades Metro: Na Revolução Francesa, era igual a 10-7 da distância do Equador ao Polo Norte pelo meridiano que passa por Paris. Cem anos depois, o metro passou a ser o comprimento de uma barra situada no Ofício Internacional de Pesos e Medidas de Paris. Em 1960, foi adotado como medida o comprimento da luz alaranjada emitida pelo gás raro criptônio 86: 1 m = 1.650.763,73 λKr Em 1983, o metro passou a ser a distância percorrida pela luz no vácuo em 1/c segundos, onde c é a velocidade da luz c = 299.792.458 m/s Medindo Distâncias Pequenas: Microscópio ótico: luz visível: 0,4 a 0,7 μm (1 μm = 10-6 m = micrômetro) Microscópio Eletrônico Microscópio de Varredura por Tunelamento Microscópio de Força Atômica Medindo Distâncias Grandes: Triangulação: teodolito 3 O Raio da Terra RT Medido por Eratóstenes (sec. III A.C.) Ele encontrou RT = 6.247 km (hoje, raio médio de 6371 km , um erro < 2%) A Distância Terra-Lua DTL Hiparco de Nicéia (190-120 A.C.) baseou-se em uma idéia de Aristarco de Samos (320-250 A.C.) Na figura acima vemos um eclipse lunar. O ponto T3 da Lua ingressa na sombra terrestre e sai em T4. Hiparco cronometrou esse intervalo de tempo Ts (em minutos). Como ele sabia que o ciclo da Lua em sua órbita é de 29,5 dias = 42.480 minutos, ele pôde calcular o ângulo 2β que a sombra da Terra faz para um observador na Terra. Supondo velocidade constante e órbita circular, temos por uma simples regra de três: 360o __________ 29,5 dias 2β __________ Ts 2β ~ 1,3o 4 O ângulo 2α é o ângulo com que um observador da Terra vê o diâmetro aparente do Sol. A Lua e o Sol têm, praticamente, o mesmo diâmetro aparente com 2α ~ 0,5o Da figura, vemos que α+β=a+b O ângulo a pode se tomado igual a zero, devido à enorme distância Terra-Sol. Dessa maneira, determina-se o ângulo b. Da trigonometria, sabemos que DTL sen(b) = RT Como o raio da Terra já era conhecido desde Eratóstenes, Hiparco obteve a distância Terra-Lua: 385.079 km , nada mal ...pois o resultado atual é de 384.400 km . Observe que,deste resultado, segue imediatamente o raio da Lua RL A distância Terra-Sol foi estimada por Aristarco (veja exercício) Para medir distâncias maiores podemos usar o método da paralaxe estelar (veja figura abaixo). Esse método só pode ser utilizado até alguns poucos anos-luz Definimos 1 Unidade Astronômica como sendo a distância média da Terra ao Sol em sua órbita elíptica, i. e., 1 U.A.= 149.000.000 km d ~ 2 UA 5 Para distâncias ainda maiores, podemos usar a técnica da luminosidade. Qualquer objeto que emite luz tem uma luminosidade intrínseca. Para uma estrela essa luminosidade está relacionada à sua cor (espectro da estrela). Na Terra, medimos a luminosidade relativa de uma estrela. Como a intensidade luminosa decai com o quadrado da distância podemos estimar a distância de uma estrela. Nesta mesma linha, podemos utilizar as cefeidas que são estrelas com luminosidade variável, já que existe uma relação entre o período de pulsação da cefeida e sua luminosidade intrínseca. 6 Sistemas de Coordenadas No plano: Coordenadas Cartesianas Coordenadas Polares Na superfície da Terra: latitude e longitude. Para se determinar a latitude λ, no hemisfério norte usa-se a estrela Polaris ou Estrela do Norte. Na figura λ = 90o - θ No hemisfério sul existe a Estrela do Sul, Sigma Octantis, cuja observação é mais difícil já que é bastante pálida. A determinação da longitude está relacionada ao fuso horário. 7 Medidas do Tempo Relógio é qualquer instrumento que permite marcar intervalos de tempos iguais. Esse intervalo de tempo igual ou período pode ser por exemplo, o tempo entre um amanhecer e outro, os batimentos cardíacos, etc. Os primeiros instrumentos utilizados como relógio foram : A Clepsidra – o relógio d´água no qual um filete de água escorre para um recipiente graduado. A Ampulheta – a mesma coisa só que com areia. O primeiro relógio de mola espiral foi idealizado pelo chaveiro alemão Peter Henlein por volta de 1500. Ele só marcava horas e não os minutos. Nos séculos seguintes, este relógio foi aperfeiçoado por Christian Huygens, Franz Anton Ketterer (o primeiro relógio cuco da Floresta Negra), etc. Em 1640, Galileu Galilei propõe o relógio pendular que é construído em 1657 por Salomon Coster . Em 1670 surge o ponteiro dos minutos e em 1765 o ponteiro dos segundos. Em 1904, Santos Dumont propõe a Louis François Cartier a construção de um relógio de pulso para homens com pulseira de couro (para as mulheres já existiam desde 1868). O primeiro relógio de quartzo surge em 1929 e, em 1948, o primeiro relógio atômico. Quando Portugal e Espanha celebraram o Tratado de Tordesilhas em 1493 , dividindo as terras a serem descobertas no planeta, não havia a menor chance desse Tratado ser tecnicamente obedecido. Senão, vejamos A Terra gira 360o em 24 horas, logo em 1 hora gira 15o e em 2 minutos gira 0,5o (≈ 56 km). Se um navegante transportasse a bordo do navio um relógio de mola da época, com um erro de 30s por dia, após 2 meses de viagem ele teria acumulado um erro 30 minutos ou cerca de 840 km !! Esses relógios tinham graves problemas de dilatação térmica. Grandes cientistas como Newton, Huygens e Leibnitz tentaram sem sucesso resolver o problema. Em 1714, o Parlamento inglês propôs a fortuna de £ 20.000 para quem conseguisse determinar a longitude com erro menor do que 0,5o . O prêmio foi recebido pelo carpinteiro inglês John Harrison que inventou, em 1761, o cronômetro marítimo que se desviou 1 min e 53,5 s em 5 meses de viagem, ou seja, precisão de 1 parte em 105 !! Um relógio atômico atual de Césio 133 tem precisão de 1s em 20 milhões de anos ou de 2 partes em 10 15 !! Até recentemente, definia-se o segundo como 1s = 1/ 86.400 do dia solar médio - dia solar médio é a média sobre um ano da duração do dia (do meio-dia ao meio-dia) Como o valor do dia solar médio varia de ano para ano (devido as marés) , a partir de 1967 adotou-se 1 s = 9.162.631.770 períodos da radiação emitida por átomos de Césio 133 8 Medidas de Tempo Curto No osciloscópio um feixe de elétrons oscila rapidamente no plano horizontal . Ao aplicarmos um campo elétrico nas placas verticais (ao trajeto dos elétrons) podemos medir tempos da ordem de 10-9 s Para tempos menores como no decaimento de partículas, da ordem 10-24 s, utilizamos técnicas indiretas de medidas em câmara de bolhas. Medidas de Tempos Longos Datação pelo decaimento radioativo A radioatividade foi descoberta por Henri Becquerel em 1896 ao deixar chapas fotográficas junto a sais de urânio. O urânio decai exponencialmente em vários elementos até chegar ao chumbo, que é estável. Se N(t) é o número de átomos de urânio no instante t e N0 o seu número no instante t = 0 então onde α é constante e utilizamos a base dos logaritmos naturais ou neperianos do escocês John Napier (1550-1617). Quando o tempo é igual a meia-vida do material, i. e., t = T1/2 , o número de átomos será igual à metade do seu valor inicial. Logo e podemos escrever onde indicamos o logaritmo neperiano por ln e o da base dez por log 9 A meia- vida do urânio 238 é de aproximadamente 4,5 bilhões de anos . Como o número inicial de átomos é enorme (da ordem do número de Avogrado 1023, podemos com um detector de partículas emitidas por segundo, em poucos minutos medir a vida-média do material. A emissão de partículas por segundo (derivada) é igual a N(t)/ T1/2 . Datação Geológica pelo K40 O isótopo radioativo do potássio 40 tem meia-vida de cerca de 1,3 bilhões de anos. O K39 é estável. A abundância relativa é de 1 átomo de K40 para 8.400 átomos de K39 . A desintegração do K40 é da seguinte maneira: 88% da cálcio 40 (que reage quimicamente com outras substâncias do solo) e 12% de argônio 40 (que é gás inerte e fica preso no material). Se, em uma amostra de rocha, encontramos x gramas de potássio (40+39) e y gramas de argônio 40, qual a idade da amostra? O número de Avogrado NA é igual a 6,02 1023. O peso atômico do K39 é 39,10g e do A40 39,95g . Então o número de átomos de potássio e de argônio, no instante t atual, valem donde Como somente 12% dos átomos K40 se desintegraram em A40, o número total de átomos K40 que decaíram até o instante t será logo, a população inicial de K40 é e, finalmente, obtemos a idade t da rocha (desde a sua última solidificação) Nesta técnica de datação, devemos estar sempre atentos se os subprodutos do decaimento interagem ou se degradam ao longo do tempo. Interessante também , usar mais substância para a datação como o urânio 238 (T1/2 =4,5 bilhôes de anos) e o Rubídio 87 (T1/2 =50 bilhôes de anos). A idade da Terra ( e do sistema solar) pode ser datada usando os meteoros (4,7 bilhões de anos) e o solo lunar (4,6 bilhões de anos) 10 Datação com o Carbono Radioativo O isótopo radioativo do carbono C14 se forma, na nossa atmosfera, pelo bombardeamento do nitrogênio por raios cósmicos (partículas altamente energéticas vindas do espaço). Ele reage rapidamente com o oxigênio para formar o CO2 radioativo. Plantas utilizam esse CO2 radioativo para a fotossíntese e os animais se alimentam das plantas. Logo, todos os seres vivos, animais ou plantas estão constantemente renovando seu estoque de CO2 radioativo. Ao morrerem, o CO2 radioativo desintegra-se. A abundância é de 1 átomo de C14 para 7,8 1011 átomos de C12 (observe que temos que fazer a hipótese de que a abundância relativa se mantém inalterada por um largo espaço de tempo. Dessa forma, podemos datar plantar e animais até cerca de 20.000 anos atrás. Amostras de carvão da caverna de Lascaux datam de 15.500 ± 900 anos, os pergaminhos do Mar Morto de 1.917 ± 200 anos, etc. O Tempo Absoluto de Newton Em seu tratado “Os Princípios Matemáticos da Filosofia Natural” de 1687, Newton introduziu o conceito do “tempo absoluto” que, segundo êle, “... flui uniformemente, sem relação com nenhuma coisa externa...”. Hoje sabemos , através da Relatividade Especial de Einstein, que o tempo não é absoluto mas relativo e depende da velocidade do observador. 11 12