logística 12 Logística: Uma breve introdução Joana Dias D e que falamos quando falamos de logística? Não existe uma única definição possível, podendo optar‑se por definir este conceito de forma mais ou me‑ nos abrangente. Neste capítulo irá tentar introduzir-se este tema tão vasto, com a identificação das principais áreas que compõem a logística, tentando mostrar até que ponto é que a logística faz parte do nosso dia-a-dia sem que nos apercebamos disso. Na realidade, na maior parte das vezes, só nos damos conta dos processos lo‑ gísticos quando há uma rutura de stock do produto que queríamos adquirir, ou uma encomenda que tínhamos feito não chega na hora marcada. Não se pretende tratar de forma exaustiva os assuntos abordados, nem tal seria possível neste número limitado de páginas, mas antes lançar sementes para que os leitores possam, recorrendo depois a outras fontes, aprofundar os assuntos aqui tratados. 293 1Introdução O que é a logística? Uma simples pesquisa na internet usando a expressão What is logistics resulta em mais de 180.000.000 resultados! Um dos resultados que aparece nos primeiros lugares é apresentado na Figura 1. Aqui podemos ver um con‑ junto de diferentes definições, podendo destacar-se aquela que tem como fonte o Council of Supply Chain Management Professionals (anteriormente conhecido como Council of Logistics Management): A logística é o processo de planear, implementar e controlar, adequada e eficientemente, o fluxo e armazenamento de bens, serviços e informação relacionada, do ponto de origem ao ponto de consumo, de acordo com as necessidades dos consumidores. Tendo em conta esta definição, vemos que existe uma relação umbilical entre logística e cadeia de aprovisionamento. A cadeia de aprovisionamento corresponde a todas as atividades relacionadas com os fluxos e transformação de bens e serviços desde o início da sua produção até ao consumidor final, e também todos os fluxos de informação as‑ sociados (Figura 2). A logística está intimamente relacionada com a gestão desta cadeia de aprovisionamento. No entanto, muitas vezes, estes conceitos são percecionados com algum nível de confusão. Afinal logística é igual a cadeia de aprovisionamento? Figura 1 – O que é a logística? 294 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística A definição de logística dada, por exemplo, pelo Council of Supply Chain Management Professionals, aponta desde logo para uma visão que considera tudo o que vai da origem até ao consumidor. Uma das fontes da possível confusão entre conceitos deve-se ao facto de a mesma palavra, logística, ser usada quer para identificar um de‑ partamento dentro da empresa, quer para este conceito mais geral que implica a gestão de todos os fluxos na cadeia de aprovisionamento. Lambert e Cooper (2000) comparam esta aparente confusão com algo semelhante ao que acontece com a palavra marketing: entre marketing como conceito e marketing como área funcional da empresa. Figura 2 – Exemplo de uma simples cadeia de aprovisionamento. Mesmo considerando a pluralidade de definições existentes para logística, to‑ das elas têm algo em comum: a logística contribui para conseguirmos ter o produto certo, no sítio certo, no tempo certo. Na realidade, a logística é responsável pela criação de utilidade: utilidade de tempo (no tempo certo) e utilidade de local (no sítio certo). A logística deve ser entendida como tendo uma natureza sistémica e holística. Ela atra‑ vessa todas as áreas da organização e deve ser entendida como estratégica, visto estar intimamente ligada a outras atividades da empresa (Ballou, 2003; Chopra e Meindl, 2012; Simchi-Levi et al, 1999). A ligação ao marketing é imediata: pretende‑se servir o cliente o melhor possível, fidelizando-o, e contribuindo para o aumento das vendas. Isso só é conseguido com um serviço ao cliente de elevada qualidade, que necessita de uma cadeia logística funcional. A ligação à produção é também imediata: para termos o produto certo, nas quantidades desejadas, necessitamos de saber quanto e quando produzir, e fazer uma adequada gestão de existências. Logística: Uma breve introdução 295 Se nos for perguntado a que situações do nosso dia-a-dia é que associamos a palavra logística, a resposta mais rápida terá, porventura, a ver com empresas de entregas de encomendas ou grandes superfícies comerciais. Mas, na realidade, a logística está presente em muitas das atividades que realizamos ao longo do dia: quando vamos fazer compras, quando precisamos de atestar o depósito do car‑ ro, quando andamos de transportes públicos. Ao colocarmos uma moeda numa máquina de venda automática porque queremos disfrutar de uma bebida fresca, quantas vezes pensamos ou nos damos conta de todos os processos existentes que garantiram que fosse possível termos aquela bebida disponível, na altura em que dela necessitávamos e no sítio certo? Ou quando vamos adquirir umas simples cal‑ ças de ganga. Será que temos noção de toda a cadeia de aprovisionamento que está por trás deste simples produto? Segundo Mansour Javidan (2010), chegam a existir 9 países diferentes envolvidos no processo, correspondendo a diferentes sistemas políticos, culturais e institucionais (Figura 3). Figura 3 – Locais por onde passa a cadeia de aprovisionamento globalizada de umas calças de ganga. Fonte do mapa: ©OpenStreetMap contributors). 296 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística O algodão é colhido nos Estados Unidos da América, e é enviado para a China onde é processado e as impurezas são retiradas. O algodão é depois enviado para a Malásia onde é transformado em fio. O fio vai para a Tailândia, onde é feito o tecido, que é depois enviado para Singapura para o corte, e enviado para a Indonésia onde as calças são cozidas. As etiquetas chegam da Índia, os fechos de correr de Hong Kong, os botões e rebites de Taiwan, os bordados de Singapura. O produto já “montado” vai regressar a Singapura para controlo de qualidade, e é também aqui que as etiquetas das diferentes marcas são colocadas, definindo o seu preço final de venda. São depois distribuídas pela Europa ou pela América do Norte, por exemplo. O conceito de logística aparece ligado às primeiras formas de comércio orga‑ nizado, tendo tido importantes desenvolvimentos no campo militar: o abastecimento de exércitos deslocados é fundamental para a estratégia militar. Só em meados do século XX, se desenvolveu a logística empresarial, que no início foi uma cópia ou adaptação das técnicas já utilizadas e testadas em contexto militar (Costa et al, 2010). Adaptando-se a novos hábitos de consumo, e novas preocupações socioeconómicas, vemos nos dias de hoje aparecerem novos conceitos como sejam o de logística reversa e logística verde. Na realidade, a cadeia de aprovisionamento deixou de ter apenas um sentido, dos produtores para os consumidores finais (Figura 4). É preciso defi‑ nir o que fazer quando os produtos chegam ao seu fim de vida, tendo em conta as atuais preocupações ambientais e os conhecidos 4Rs: Recuperar, Reutilizar, Reciclar, Reduzir. Figura 4 – Logística Reversa. Logística: Uma breve introdução 297 A logística verde (green logistics) considera as preocupações que cada vez mais as empresas manifestam ter em relação ao impacto ambiental e social das suas ativi‑ dades. Aparece assim o conceito de logística sustentável, em que não apenas a maxi‑ mização do lucro (ou a minimização do custo) é o objetivo a atingir, mas outros pila‑ res aparecem. Do ponto de vista ambiental, a preocupação com os níveis de emissão de CO2, a tentativa de diminuição do consumo de água ou energia, o cuidado com o tratamento de resíduos. Do ponto de vista social, a preocupação com o bem‑estar dos seus próprios trabalhadores, garantindo condições de trabalho dignas, e com a sociedade em que a empresa se insere (Figura 5 e Figura 6). Figura 5 – Logística Verde. 298 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística Figura 6 – A Levi’s estudou o ciclo de vida de um par de jeans 501, como parte de uma investigação em como tornar os processos sustentáveis (Binkley, 2010). Nos nossos dias, os custos associados com as atividades logísticas têm um sig‑ nificativo impacto nas economias nacionais. Veja-se, por exemplo, o valor destes cus‑ tos como uma percentagem do produto nacional bruto de alguns países (Figura 7). Logística: Uma breve introdução 299 Figura 7 – Custos logísticos como percentagem do produto interno bruto (Boston Logistics Group, 2005). Atravessando a logística todas as atividades da organização, é possível definir três áreas como sendo as que formam o seu núcleo: a gestão de existências, o trans‑ porte de mercadorias e a localização de instalações (Costa et al, 2010). Nas secções 3 a 4 abordar-se-ão, de forma introdutória, estas três áreas. Na próxima secção intro‑ duz-se o conceito de serviço ao cliente, que é afinal, o conceito que norteia todas as decisões tomadas ao longo da cadeia. 2O serviço ao cliente O conceito de serviço ao cliente está intimamente relacionado com os dois tipos de utilidade criados pela logística: utilidade de tempo e de local. Ora, o serviço ao cliente permite medir até que ponto é que os processos logísticos estão a contri‑ buir para o fornecimento de utilidade de tempo e de local: estamos a ser capazes de colocar o produto certo, no momento certo, na quantidade desejada de acordo com as preferências do cliente? Cada vez mais aqueles que têm contato com o cliente final controlam a cadeia de aprovisionamento (Lambert e Cooper, 2000). A qualidade do serviço ao cliente é percebida por todas as organizações como sendo imprescindível, não só para a captação de novos clientes mas também para a manutenção dos clientes atuais (que representam muitas vezes a maior parte do volu‑ me de negócios, sendo que é normalmente mais dispendioso captar um novo cliente 300 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística do que manter um cliente habitual). Nos dias de hoje, as questões relacionadas com a qualidade do serviço ao cliente são ainda alavancadas pelo poder que os clientes têm de dar a conhecer a sua opinião acerca de um dado produto ou serviço. Os clientes fazem muitas vezes uso das redes sociais para expressarem as suas opiniões, haven‑ do mesmo plataformas eletrónicas específicas para esse fim (tome-se como exemplo o TripAdvisor, que recebe comentários de clientes acerca de hotéis, restaurantes ou atrações turísticas). Há, por isso, quem defenda que o serviço ao cliente é o novo marketing (Mickiewicz, 2011). O serviço ao cliente deve ser encarado como uma atividade a ser gerida, e que faz parte da filosofia de toda a organização. É curioso notarmos que, muitas vezes, os funcionários que se encontram no nível mais baixo na hierarquia organizacional da empresa (e, normalmente, os que recebem os salários mais baixos) são aqueles que têm o contacto direto com o cliente, e que podem fazer a diferença. Existem muitas definições diferentes para o conceito de serviço ao cliente, mas a ideia de base em todas elas coloca o cliente no centro, e tenta que todos os proces‑ sos que contribuem para a satisfação do cliente corram com a rapidez e fiabilidade esperados. O produto ou serviço é também uma peça fundamental, sendo que pode ser caracterizado por uma parte tangível (peso, volume, cor, forma, …) mas também uma parte intangível (suporte após a venda, reputação da marca,…). Nada deve ser descurado: nem o processo antes da aquisição (em que se deve ter o cuidado de in‑ formar o cliente da política de serviço, ser realista no que diz respeito às expectativas geradas), passando pelo processo de aquisição propriamente dito (garantir que não há rutura de existências, disponibilizar informação acerca do estado da encomenda, ter particular atenção a encomendas especiais), e pelo processo de suporte após a compra (tratamento de reclamações e devoluções, substituição de produtos, garan‑ tias, etc). Em relação ao serviço ao cliente, são as questões relacionadas com a gestão do ciclo de encomenda que podem ser mais facilmente controláveis e geridas através dos processos logísticos. O ciclo de encomenda engloba tudo o que acontece desde o momento em que o cliente expressa o desejo de adquirir um determinado produto ou serviço, até ao momento em que essa aquisição ocorre. Um dos fatores que é mais importante controlar é o tempo do ciclo de encomenda, diretamente influenciado pelas decisões tomadas relativamente à política de gestão de existências e à política de transportes. Relativamente à gestão de existências, sabe-se que o tempo do ciclo de encomendas é influenciado pela existência ou não do produto em stock, seguindo Logística: Uma breve introdução 301 por isso uma distribuição bimodal (Figura 8). Se o produto existe em stock, então temos normalmente tempos mais curtos e com menor variabilidade. Figura 8 – Distribuição bimodal do tempo de encomenda, dependendo do produto existir ou não em stock. Em relação ao transporte, é preciso ter em conta o tempo de transporte, a probabilidade de os produtos chegarem danificados ou haver situações inesperadas como más condições atmosféricas ou greves que atrasem a chegada da encomenda. O que é decisivo é o estabelecimento de uma estratégia de serviço ao cliente, que deve ter em conta vários fatores: quais as características dos nossos clientes e dos produtos ou serviços que disponibilizamos (usando, por exemplo, uma análise ABC); quais os compromissos que queremos aceitar entre a qualidade de serviço ao cliente e os custos associados (uma maior qualidade de serviço pode implicar maiores custos); quais as métricas a serem utilizadas na medição do cumprimento dos objetivos traçados. A análise ABC tenta distinguir os produtos que mais contribuem para o vo‑ lume de negócios da empresa, e a regra empírica que é muitas vezes verificada é que cerca de 20% dos nossos produtos são responsáveis por 80% do nosso volume de negócios. Estes são os produtos que têm de sofrer um controlo mais apertado. Uma situação semelhante se pode verificar em relação aos clientes: uma pequena percen‑ tagem dos nossos clientes é responsável pela maior parte do volume de vendas, e por isso devemos ter cuidado especial na satisfação das suas encomendas. Esta análise pode ainda cruzar produtos e clientes, permitindo verificar quais os pares a que de‑ vemos estar mais atentos (produto tipo A adquirido por cliente tipo A, por exemplo). 302 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística Figura 9 – Exemplo de análise ABC (fonte: wikipédia http://en.wikipedia.org/wiki/File:ABC_class.jpg). Em relação aos compromissos entre a qualidade de serviço e custos, a organi‑ zação deve definir com clareza quais os seus objetivos e restrições nesta matéria: não se pode garantir a melhor qualidade de serviço a qualquer preço, e o que muitas vezes se verifica é que a partir de determinados níveis, o aumento marginal de qualidade acarreta um aumento de ordem exponencial do custo. Apesar de não ser possível encontrar métricas capazes de medir o desempe‑ nho do serviço ao cliente em todas as suas dimensões, é crucial construir alguns padrões quantitativos de desempenho. Podemos aqui referir a citação por muitos atribuída a Einstein: Not everything that counts can be counted, not everything that can be counted counts! Algumas métricas comummente utilizadas consideram o tempo máximo, mé‑ dio e mínimo de tratamento de uma encomenda, a percentagem de encomendas tra‑ tadas dentro do prazo, o número de reclamações no serviço pós-venda, o número de unidades do produto em rutura. É ainda crucial definir planos de contingência: nenhuma organização, nenhum processo, funcionará a 100% durante 100% do tempo. Se até há poucos anos atrás se falava apenas de serviço ao cliente, hoje esse conceito está a evoluir para o de customer experience: pretende-se cada vez mais agra‑ dar ao cliente, aprofundar a sua ligação com a organização a todo o tempo, fornecer serviços personalizados e ir de encontro às preferências dos clientes. Logística: Uma breve introdução 303 Os já generalizados sistemas de CRM (Customer Relationship Management) dão agora lugar a sistemas com capacidade de análise de grandes quantidades de da‑ dos (Big Data Analytics). As organizações tentam não só fornecer utilidade de tempo e de local, mas pretendem antecipar as necessidades dos seus clientes (apresentando‑ -lhes produtos que foram do agrado de outros clientes com características semelhan‑ tes), levar a cabo campanhas de marketing personalizadas (como o envio de cupões de desconto tendo em conta o padrão de compra do cliente), perceber se eles estão prestes a optar por um concorrente por forma a proporcionarem soluções feitas à medida (um novo tarifário mais vantajoso para acesso a rede móvel), interagirem com o cliente em todos os vetores da sua vida (redes sociais, aplicações móveis, pla‑ taformas online). Figura 10 – Customer Experience. 304 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística 3A gestão de existências O que são existências? Sendo o “produto” peça essencial na garantia de uma adequada qualidade de serviço ao cliente, a gestão de existências apresenta-se como um dos processos lo‑ gísticos mais crucial, pois determina a capacidade de ter o produto certo no tempo certo, limitando a probabilidade de existirem ruturas. Quando falamos de existências, estamos na realidade a falar de tudo aquilo que é processado, transportado, manuseado em qualquer ponto da cadeia de aprovisio‑ namento. As existências constituem um importante investimento para a maior parte das organizações. Há quem defenda que não se devem constituir stocks de produtos: para além de constituírem elevados investimentos, muitas vezes servem para mascarar inefi‑ ciências em alguns pontos da cadeia de aprovisionamento, e fazem com que não se incentive a visão e a gestão global da cadeia. Para além disso, acarretam riscos: os produtos podem ficar obsoletos, podem deteriorar-se, perder parte do seu valor. A verdade é que as existências permitem, de uma forma geral, melhorar a qua‑ lidade do serviço ao cliente: torna-se possível lidar com imprevistos como greves, de‑ sastres naturais, atrasos nas entregas, sendo possível atenuar os efeitos das variabili‑ dades impossíveis de controlar. Por outro lado, é também possível aproveitar algumas economias de escala, aceder a descontos de quantidade, ou antecipar um possível aumento do preço de aquisição futuro. O ideal será atingir o equilíbrio, evitando ru‑ turas por um lado, mas por outro evitar ter níveis de stock demasiadamente elevados. A filosofia just-in-time é o exemplo máximo da opção de prescindir da cons‑ trução de stocks: o produto deve estar disponível apenas e no exato momento em que é necessário. A filosofia just-in-time deve ser entendido no contexto mais abrangente do lean management. São várias as organizações que põem em prática esta filosofia (por exemplo a Toyota, conhecida por ter desenvolvido o sistema Kanban). Uma das desvantagens desta opção é poder deixar os elementos a jusante na cadeia de apro‑ visionamento suscetíveis a alterações abrutas no fornecimento, ou obrigarem os ele‑ mentos a montante da cadeia de aprovisionamento a terem níveis de existências mais elevados do que seria necessário, para poderem cumprir todos os requisitos de tempo de entrega a tender para zero. Logística: Uma breve introdução 305 3.1 Uma possível classificação Os problemas de gestão de existências podem ser classificados de diferentes formas, consoante se considere a natureza da procura, a filosofia de gestão, o grau de agregação dos produtos, a existência ou não de um planeamento que considere simultaneamente vários níveis da cadeia de aprovisionamento. Considerando a natureza da procura, interessa perceber se a procura apresenta um padrão mais ou menos constante, apresenta um comportamento sazonal (com picos de procura em determinadas alturas – como acontece, por exemplo, com o consumo de gelados na altura do verão), ou se não é possível encontrar qualquer tipo de padrão (procura errática). Em relação à filosofia de gestão, é usual distinguir-se duas diferentes aborda‑ gens: a abordagem baseada na origem (ou push) e a abordagem baseada no destino (ou pull). No primeiro caso, a movimentação das existências é desencadeada na ori‑ gem, que antecipa os pedidos dos seus destinatários (Figura 11). É normalmente ne‑ cessário recorrer a previsões de procura de longo prazo, e é possível tirar mais partido de economias de escala. Apresenta como principal desvantagem o facto de ser mais difícil e lenta a reação a alterações no mercado. Na abordagem baseada na origem, a movimentação das existências é desencadeada pelo destino, através da colocação de encomendas, por exemplo (Figura 12). Apresenta como principal vantagem a maior proximidade com o consumidor final, sendo mais fácil a adaptação a alterações nos padrões de consumo. No entanto, diminui a possibilidade de tirar partido de econo‑ mias de escala (Figura 13). 306 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística Figura 11 – Abordagem baseada na origem. Figura 12 – Estratégia Push versus Estratégia Pull. Figura 13 – Abordagem baseada no destino. Logística: Uma breve introdução 307 Em algumas situações é possível ter “o melhor dos dois mundos”, optando por uma abordagem em colaboração. Imagine-se, por exemplo, uma loja de informática que adquire os vários componentes que compõem um computador e depois faz sua montagem. Pode optar por uma abordagem Push no que diz respeito à gestão de exis‑ tências dos componentes, e por uma abordagem Pull no que concerne à montagem do produto final. A marca Havaianas, por exemplo, permite que os seus clientes personalizem as Havaianas que pretendem adquirir, quer nas suas lojas, quer através de plataformas online: a sola, a tira, os pins podem ser escolhidas a partir de um conjunto vasto de opções (Figura 14). Isto torna possível que se opte por uma gestão Push no que diz respeito a estes componentes, sem no entanto sofrer as desvantagens da demora na reação às alterações de mercado. Torna a gestão de existências mais simples, e acres‑ centa valor por permitir criar um produto totalmente personalizado. Figura 14 – Exemplo da criação de um par de Havaianas personalizado (adaptado de http://us.havaianas.com/front/custom-flip-flops/). Relativamente ao nível de agregação de produtos, poderemos optar por abor‑ dagens bottom-up, em que se controla com precisão cada produto individualmente, ou podemos optar por abordagens top-down, considerando alargados grupos de pro‑ dutos. A escolha entre abordagens depende de vários fatores, como por exemplo, o fornecedor a que são adquiridos, os padrões de procura, serem produtos substitutos ou complementares entre si. 308 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística Hoje em dia, com a generalização do uso de tecnologias de informação, para além das existências que se encontram em armazém e têm realmente uma existência “física”, podemos também considerar a existência de stocks virtuais: existências que poderão não estar fisicamente no nosso armazém, mas às quais podemos aceder facilmente e delas temos conhecimento através dos sistemas de gestão informática. Considere-se, por exemplo, uma rede de lojas de vestuário. O stock de cada uma das lojas pode ser considerado como o stock que todas têm na globalidade, uma vez que o sistema infor‑ mático permitirá saber o nível de existências de cada produto em cada uma das lojas, e dessa forma aumentar a probabilidade de satisfazer a procura do cliente. Os custos e o nível de serviço Uma das métricas mais importantes utilizadas na gestão de existências, com relação direta ao serviço ao cliente, é o nível de serviço. O nível de serviço pode ser definido como a probabilidade de sermos capazes de satisfazer uma encomenda atra‑ vés do stock atual existente. A definição de uma política de serviço ao cliente deve preocupar-se em estabelecer objetivos para este nível de serviço, tendo em conta o compromisso existente entre, por um lado, maximizar o mais possível a qualidade de serviço, mas por outro minimizar os custos associados às existências. Os custos associados às existências costumam ser de três ordens diferentes: custos de aquisição, incluindo os custos associados ao processamento da encomenda, recebimento e manuseamento do material; custos de manutenção, incluindo todos os custos de armazenamento, custo de oportunidade de capital, seguros; e custos de rutura, considerando os custos de vendas perdidas, de gestão de encomendas ainda não satisfeitas, e mesmo custos indiretos que se prendem com as consequências para a imagem e reputação da organização (estes últimos de muito difícil quantificação). Quando falamos de gestão de existências, pretendemos determinar quando e quanto encomendar de cada produto, garantindo um determinado nível de serviço e minimizando os custos totais. Relativamente ao quanto, devemos ter em conta que os custos de aquisição e rutura, por exemplo, diminuem se em cada encomenda encomendarmos uma maior quantidade. Por outro lado, o aumento da quantidade encomendada irá aumentar o volume médio de existências, pelo que os custos de manutenção irão aumentar. Ora, o que nos interessa será descobrir a quantidade que minimiza o custo total, tal como é ilustrado na Figura 15. A esta quantidade dá-se o nome de lote económico. Logística: Uma breve introdução 309 Figura 15 – Relação entre os custos associados às existências e a quantidade encomendada. Em relação ao quando encomendar, terão de ser tidos em conta vários fatores, nomeadamente o comportamento da procura, as relações contratuais com os forne‑ cedores (podemos, por exemplo, ter de fazer encomendas apenas uma vez por mês, num determinado dia específico), quanto tempo de espera é expectável entre o pe‑ dido de encomenda e a sua entrega, e o facto de termos optado por uma abordagem bottom-up ou top-down. Políticas de gestão de encomendas Costumam distinguir-se duas principais políticas de gestão de encomendas: o modelo de revisão contínua (ou ponto fixo de encomenda) e o modelo de revisão periódica. Na primeira abordagem, define-se um ponto de encomenda para cada pro‑ duto. Este ponto de encomenda é determinado tendo em conta quer o nível de serviço desejado, quer o comportamento da procura e o tempo de espera entre o pedido da encomenda e a sua chegada (tendo em conta, por exemplo, as incerte‑ zas associadas a estes fatores). A quantidade existente em stock é continuamente controlada, e quando atinge o ponto de encomenda é feita uma nova encomenda (em que a quantidade a encomendar é igual ao lote económico). Na abordagem de revisão contínua temos, então, que a quantidade a encomendar é sempre a mesma, 310 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística mas o tempo entre encomendas pode variar, dependendo do comportamento da procura (Figura 16). Se há algumas décadas atrás fazer-se o controlo contínuo da quantidade existente de um determinado produto poderia ser praticamente impos‑ sível, nos dias de hoje, e graças ao uso de sistemas informáticos de gestão, podemos ter acesso fácil a esta informação. É mesmo muito comum que estes sistemas de gestão permitam definir qual o ponto de encomenda desejado para cada produto, para que sejamos avisados pelo sistema sempre que houver necessidade de efetuar uma encomenda. Figura 16 – Modelo de revisão contínua. A quantidade Q representa o lote económico (a quantidade a encomendar cada vez que se faz uma encomenda). A encomenda é efetuada quando o nível de existências atinge o ponto de encomenda. No modelo de revisão periódica, estabelece-se à partida um determinado in‑ tervalo constante entre encomendas. Este intervalo entre encomendas pode ser im‑ posto, devido a relações contratuais com os fornecedores, por exemplo, ou pode ser decidido pela própria organização. Neste caso, deve tentar-se calcular o período entre encomendas ótimo, o que normalmente é feito tendo em conta a procura anual espe‑ rada e o valor do lote económico. A quantidade a encomendar é a diferença entre a quantidade que existe em stock no momento em que se faz a encomenda, e um valor máximo que é determinado tendo também em conta o comportamento da procura, o tempo de espera e o nível de serviço desejado (Figura 17). Esta abordagem apre‑ senta vantagens claras em situações em que desejamos fazer a encomenda de vários Logística: Uma breve introdução 311 produtos simultaneamente. Apresenta como principal desvantagem o facto de levar a níveis médios de existências maiores. Figura 17 – Modelo de revisão periódica. As quantidades Q representam a quantidade a encomendar em cada período. LT representa o tempo de espera entre o momento em que se faz a encomenda e esta é recebida. A incerteza Um dos fatores mais importantes e que leva a um aumento no nível de exis‑ tências prende-se com a incerteza que na maior parte das vezes está associada quer à procura, quer ao tempo de entrega das encomendas. Na realidade, para acautelar esta incerteza, tem muitas vezes de se considerar um stock de segurança. Este stock de segurança funciona como uma “almofada” que permite amortecer o choque devido a atrasos na entrega de mercadoria, ou procuras mais elevadas do que as expectáveis, sem deteriorar consideravelmente o nível de serviço. O stock de segurança depende, fundamentalmente, de dois fatores: do nível de incerteza (associado quer à procura quer ao tempo de espera) e do nível de serviço. Quanto mais elevados estes fatores, maior deverá ser o stock de segurança, e por isso maior o nível de existências (com 312 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística um consequente aumento nos custos associados). Também aqui se deve ser cauteloso na definição de qual o nível de serviço pretendido, pois a partir de determinados pa‑ tamares o nível de existências pode crescer exponencialmente com o nível de serviço (Figura 18). Figura 18 – Exemplo da relação existente entre o nível de serviço e o nível de existências. São conhecidos da literatura vários modelos matemáticos que permitem a de‑ terminação do stock de segurança, lote económico e ponto de encomenda no caso do modelo de revisão contínua, ou período entre encomendas e quantidade máxima a considerar no caso do modelo de revisão periódica. Estes modelos baseiam-se, nor‑ malmente, em alguns pressupostos, como sejam: a procura é perpétua e segue uma distribuição normal com uma dada média e desvio padrão conhecidos; não há limite na disponibilidade de capital; o tempo de espera segue uma distribuição normal com média e desvio padrão conhecido. Hoje em dia, é cada vez mais fácil ter acessos a dados que nos permitem a aplicação destes modelos, tendo em conta a generalizada utilização de sistemas de informação nas organizações. Em muitas situações, a aceitação dos pressupostos subjacentes aos modelos pode ser feita e os modelos diretamente aplicados. Em outros problemas que se revistam de particularidades que impeçam a aceitação dos pressupostos, outras ferramentas podem ser utilizadas, como por exemplo simulação de Monte Carlo. A simulação é uma técnica experimental. Permite-nos chegar a decisões relativa‑ Logística: Uma breve introdução 313 mente a quando e quanto encomendar através da execução de um conjunto bem definido de experiências computacionais, mesmo quando é necessário modelar sis‑ temas complexos. 4Os problemas de transporte O modo de transporte ideal seria instantâneo, gratuito, teria uma capacidade ilimitada e estaria sempre disponível. O espaço tornar-se-ia obsoleto. Este não é, obviamente, o caso. O espaço é uma restrição na construção de redes de transporte. O transporte parece ser uma atividade económica diferente de todas as outras. Ela negoceia espaço com tempo, logo dinheiro. Na maior parte das situações, necessitamos de transportar mercadorias entre os vários níveis da cadeia de aprovisionamento. Os problemas de transporte tornam‑ -se, dessa forma, cruciais para que os objetivos definidos, nomeadamente no que diz respeito à qualidade de serviço, sejam atingidos. Juntando a isto o facto de os custos de transporte poderem corresponder à maior parcela dos custos logísticos para gran‑ de parte das empresas, verificamos que os sistemas de transporte são críticos, não só a nível da organização mas a nível da economia dos países. Modos de transporte São cinco os modos de transporte normalmente identificados na literatura (Costa et al, 2010): modo rodoviário, modo ferroviário, modo hidroviário, modo aéreo, por pipeline. Na escolha do modo mais adequada a cada situação, vários fatores devem ser tidos em conta: o seu custo, a flexibilidade (quer em termos do tipo de produtos a transportar, quer em termos dos ponto de recolha e ponto de entrega e horários), o tempo de transporte e a sua variabilidade, o volume médio de perdas e danos associa‑ dos ao serviço de transporte. Hoje em dia, outro fator é cada vez mais tido em conta: o impacto ambiental do modo de transporte. O transporte rodoviário, ainda aquele mais utilizado na maior parte dos paí‑ ses, caracteriza-se por grande flexibilidade relativamente aos produtos a transportar, horários e locais de recolha e entrega. É, aliás, o único modo que permite um trans‑ porte ponto-a-ponto. 314 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística O modo ferroviário apresenta-se como muito competitivo quando se pretende transportar a longas distâncias e grandes quantidades. No entanto está, obviamente, limitado pela existência de linhas de caminho-de-ferro, e apenas permite o transpor‑ te de terminal a terminal. O modo hidroviário está dependente da existência de vias navegáveis, e tam‑ bém apenas permite o transporte de terminal a terminal. Existem normalmente im‑ portantes economias de escala quer com o aumento das distâncias quer com o au‑ mento da quantidade transportada. Os tempos médios de transporte são elevados, apesar de permitir uma enorme flexibilidade nos produtos a transportar. O serviço aéreo é um serviço terminal a terminal, caracterizado por um custo elevado mas baixos tempos de transporte. É normalmente utilizado no transporte de produtos de valor muito elevado, em que o tempo de entrega é crucial. O transporte por pipeline é efetuado utilizando redes de condutas previamente construídas para o transporte de produtos específicos, como gás ou petróleo. Como se pode verificar, a maior parte dos modos permite apenas o transporte terminal a terminal. Isto significa que para ser conseguida flexibilidade nos locais de recolha e entrega, há a necessidade de conjugar mais do que um modo de transporte. Considere-se, por exemplo, o transporte em modo rodoviário desde o ponto de reco‑ lha até ao terminal ferroviário, transporte por modo ferroviário, e depois novamente transporte rodoviário desde o terminal rodoviário de destino até ao local de entrega. A utilização de mais do que um modo de transporte é facilitada pela utilização de contentores padronizados, que eliminam a necessidade da manipulação direta dos produtos a transportar aquando da mudança de modos de transporte. Estamos perante um serviço de transporte multimodal sempre que são usa‑ dos dois ou mais modos de transporte. Quando a mercadoria é transportada numa mesma unidade de carregamento (por exemplo, contentor), sem obrigar ao manu‑ seamento da mercadoria, então podemos falar de serviço intermodal. O transporte combinado corresponde a um serviço multimodal em que o transporte rodoviário é reduzido ao mínimo possível. O problema de cross-docking pode ser definido como o processo de consoli‑ dação de várias cargas vindas de origens diferentes mas com o mesmo destino, por forma a que o manuseamento do material seja mínimo, e sem qualquer necessidade de armazenamento entre a descarga e a carga da mercadoria (Van Belle et al, 2012). Pretende-se não só diminuir os custos (por diminuição dos custos de armazena‑ mento, por exemplo), mas também contribuir para a melhoria do serviço ao cliente, Logística: Uma breve introdução 315 tornando as entregas mais rápidas, estando a mercadoria menos sujeita a perdas e danos. Organizações como a Toyota ou WalMart estão a implementar com sucesso esta estratégia. Problemas de transportes Existem um conjunto de modelos de problemas de transportes, muito estuda‑ dos na literatura, e que são usados por muitas empresas diariamente. Um dos problemas mais simples é o problema de transportes equilibrado. Neste problema considera-se que existe um conjunto de origens, cada uma com uma deter‑ minada oferta do produto a transportar, e existe um conjunto de destinos, cada um com uma determinada procura relativa ao produto a transportar (Figura 19 (a)). É conhecido o custo, por unidade transportada, de cada origem para cada destino. Pre‑ tende-se determinar qual a melhor maneira de efetuar o transporte. Assume-se que a oferta total é igual à procura total. Este problema pode ser modelado como um proble‑ ma de programação linear, e resolvido usando, por exemplo, o Microsoft Excel Solver. Várias adaptações podem ser feitas a este problema base considerando, por exemplo, o transporte de vários produtos, situações em que a procura total é dife‑ rente da oferta total (nomeadamente as situações em que a procura não pode ser satisfeita na totalidade) ou em que não é possível transportar de algumas origens para alguns destinos. Se o transporte implicar a passagem por diferentes níveis na cadeia de aprovi‑ sionamento, então estaremos na presença de um problema de transexpedição (Figura 19 (b)), sendo necessário definir qual o comportamento dos entrepostos (serviços que se encontram no caminho entre uma origem e um destino). Figura 19 (a) Problema de transportes (b) Problema de transexpedição. 316 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística Uma generalização deste problema, em que se consideram vários pontos numa rede de transportes (nodos) e todas as ligações existentes entre estes pontos (arcos), e em que todos os pontos podem servir como entrepostos (independentemente de serem também origens ou destinos) é conhecido como o problema do fluxo de custo mínimo. Neste problema, para além de custos unitários de transporte associados a cada arco que exista na rede, é ainda possível definir quantidades máximas a serem transportadas. E quantos de nós já recorremos a um GPS ou ao Google Maps para descobrir qual a maneira mais rápida, ou qual o caminho de menor distância, entre duas lo‑ calidades? Sempre que o fazemos estamos, na realidade, a resolver um problema de caminho mais curto, em que mais curto pode ser entendido como sendo, na realidade, o caminho de menor distância, mas também o mais rápido, ou o mais barato. Através da representação da infraestrutura rodoviária como uma rede, é possível resolver este problema de forma muito rápida, mesmo quando consideramos redes de grandes dimensões. Um dos problemas resolvidos diariamente por muitas empresas de entrega de mercadoria é o problema de criação de rotas ótimas. Imagine-se, por exemplo, uma empresa que tem um conjunto de encomendas para entregar a um conjunto de clien‑ tes. Ela dispõe de um determinado parque automóvel, e de um conjunto de motoris‑ tas, e pretende saber qual a melhor maneira de organizar a entrega das encomendas. Uma rota pode ser definida pelo conjunto de pontos que se visitam desde que se sai da origem até que se lá regressa, sendo que cada ponto pode apenas ser visitado uma vez (Figura 20). Logística: Uma breve introdução 317 Figura 20 – Exemplo do problema de rotas. Interessa descobrir as melhoras rotas, sendo que normalmente melhor repre‑ senta o menor custo, o menor tempo, ou a menor distância. O número de rotas a construir pode ser algo a determinar, ou definido anteci‑ padamente tendo, por exemplo, em conta a frota automóvel disponível na empresa. Este problema poderá ter um conjunto de restrições associadas que se prendem com a capacidade dos veículos a usar, e janelas temporais admissíveis para a visita aos clientes. O caso particular em que temos apenas um veículo e construímos apenas uma rota corresponde ao conhecido problema do caixeiro-viajante. As mais recentes preocupações ambientais fizeram surgir nos últimos anos novos problemas de transportes, com características por vezes diferentes dos proble‑ mas ditos “clássicos”. Dá-se como exemplo o problema do pooling ou do backhauling. O pooling diz respeito à organização dos transportes por parte dos fornecedores por forma a que possam partilhar camiões e diminuir dessa forma a capacidade não uti‑ lizada dos veículos, com implicações na chamada pegada ecológica. O backhauling diz respeito à possibilidade de aproveitar as viagens de regresso dos camiões, que em vez de regressarem vazios passam por fornecedores fazendo o reabastecimento. O grupo Carrefour, por exemplo, põe em prática estas novas práticas na gestão dos transportes. 318 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística Figura 21 – O exemplo do Carrefour na tentativa de diminuição das emissões de dióxido de carbono (http://www.carrefour.com/cdc/responsible-commerce/our-commitment-to-the-environment/reducinglogistics-impact/). 5Os problemas de localização Quando se pretende localizar uma nova loja, ou uma nova fábrica, são três os aspetos mais importantes a ter em conta: localização, localização, localização! Os problemas de localização dizem respeito às decisões a tomar relativamente ao número, ao local e à dimensão dos serviços a localizar, sendo que por serviço se deve entender qualquer equipamento pertencente à cadeia de aprovisionamento. São decisões que se caracterizam por implicarem, normalmente, grandes investimentos e serem difíceis de reverter. Os problemas de localização mais comuns no âmbito da cadeia de aprovisio‑ namento são os problemas de localização discreta: problemas em que são definidas a priori as potenciais localizações para os equipamentos. Trata-se, por isso, de resolver um problema combinatório: encontrar a melhor combinação de localizações, den‑ tro do conjunto de potenciais localizações, em que melhor poderá representar coisas tão diferentes como a minimização do custo ou a maximização da acessibilidade. É possível considerar restrições muito distintas, como sejam, restrições de capacidade, restrições orçamentais, restrições ao número máximo ou mínimo a abrir. Logística: Uma breve introdução 319 Em termos da cadeia de aprovisionamento, uma classe de problemas de par‑ ticular importância diz respeito aos problemas de localização hierárquicos, em que simultaneamente se tomam decisões relativamente a vários equipamentos, perten‑ centes a diferentes níveis da cadeia. 6Conclusão Neste capítulo tentou dar-se um panorama geral acerca do que pode ser en‑ globado no conceito de logística. Optou-se por destacar aquelas que se consideram ser as grandes áreas da logística: gestão de existências, problemas de transporte e problemas de localização. Aquilo que norteia as decisões a tomar na cadeia de apro‑ visionamento é a qualidade de serviço que se deseja garantir. Assim, e cada vez mais, o cliente encontra-se no centro do planeamento logístico. Muitas outras áreas da logística se poderiam ter considerado. Questões, por exemplo, relacionadas com o empacotamento que têm uma relação direta com os problemas de transporte (veja-se, por exemplo, a importância que uma empresa como o IKEA dá à questão das embalagens dos seus produtos), ou os problemas relacionados com o layout de armazéns, fábricas ou lojas. Para que muitos dos modelos aflorados possam ser utilizados, são necessá‑ rios dados. Hoje em dia, a obtenção de dados é cada vez mais fácil e barata, graças à proliferação, por exemplo, de sistemas de Customer Relationship Management. Pode, também, muitas vezes ser necessário fazer previsões associadas à procura futura, ou ao preço de matérias-primas. As dinâmicas sociais e as alterações no comportamento e preocupações do consumidor, juntamente com o avanço cada vez mais pronunciado das tecnologias de informação, fazem com que a estrutura das cadeias de aprovisionamento se vá adaptando a novas realidades. Terminamos este capítulo com uma possível visão da cadeia de aprovisionamento do futuro (The Global Commerce Initiative, 2008): to‑ dos os participantes na cadeia partilharão informação. Após a produção, os produtos serão enviados para armazéns colaborativos, partilhados por vários fornecedores. Também o transporte se fará de forma colaborativa a partir destes armazéns, dimi‑ nuindo o impacto ambiental. Aquilo que realmente faz a diferença é conseguir alcançar uma cadeia de apro‑ visionamento fiável, ágil e flexível. 320 Coletânea Luso-Brasileira iv – Gestão da Informação, Inovação e Logística Figura 22 – A cadeia de aprovisionamento do futuro (copyright Capgemini / The Consumer Goods Forum, reproduzido com autorização (The Global Commerce Initiative, 2008) Referências D. M. Lambert and M. C. Cooper, “Issues in Supply Chain Management,” Industrial Marketing Management, vol. 29, no. 1, pp. 65–83, Jan. 2000. R. H. Ballou, Business Logistics/Supply Chain Management. 2003. S. Chopra and P. Meindl, Supply Chain Management, Strategy, Planning and Operation. 2012. D. Simchi-Levi, P. Kaminsky, and E. Simchi-Levi, Designing and Managing the Supply Chain: Concepts, Strategies and Case Studies. 1999. M. Javidan, “Global supply chain for the blue jeans.”. J. P. Costa, J. Dias, and P. Godinho, Logistica. Imprensa da Universidade de Coimbra, 2010. C. Binkley, “How Green Is My Sneaker?,” 2010. [Online]. Available: http://online.wsj.com/article/SB1 0001424052748703724104575379621448311224.html#articleTabs_interactive=&articleTabs=article. [Accessed: 23-May-2013]. Boston Logistics Group, “International Transportation Comparisons,” 2005. M. Mickiewicz, “Why Customer Service Is The New Marketing,” Forbes (online), 2011. [Online]. Available: http://www.forbes.com/sites/theyec/2011/12/28/why-customer-service-is-the-newmarketing/. P. Merlin, Géographie des Transports, Que sais-je? Paris: Presses Universitaires de France, 1992. J. Van Belle, P. Valckenaers, and D. Cattrysse, “Cross-docking: State of the art,” Omega, vol. 40, no. 6, pp. 827–846, Dec. 2012. The Global Commerce Initiative, “2016 Future Supply Chain,” 2008. Logística: Uma breve introdução 321