CARACTERIZAÇÃO DA DOR OROFACIAL Adriana de Paula Novaes Delgado1, Juliana C. Passos1, Nayara Beatriz1, Thatiana Oliveira Correa1, Luís Eduardo Silva Soares1,2 1 Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), Faculdade de Ciências de Saúde, Curso de Odontologia, Av. Shishima Hifumi, 2911 CEP 12244-000 São José dos Campos, Brasil, [email protected]; [email protected]; [email protected], [email protected] 2 Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento (IP&D), Laboratório de Espectroscopia Vibracional Biomédica (LEVB), UNIVAP, Av. Shishima Hifumi, 2911 CEP 12244-000 São José dos Campos, Brasil, [email protected] Resumo- A dor orofacial é um problema que atinge grande parte da população. Muitos problemas estão relacionados à região da articulação têmporo-mandibular, como dores de cabeça e de ouvido, estalidos, dor facial, dentre outros. Compete ao cirurgião-dentista tratá-los, O objetivo desse artigo é realizar uma revisão de literatura sobre os tipos mais comuns de dor orofacial e ressaltar a importância da formulação de um plano de tratamento. Foram selecionados artigos referentes ao tema, encontrados em bases de dados. Algumas palavras-chave em português foram utilizadas, como por exemplo, “dor orofacial” e “disfunção temporomandibular” para a busca. Os sinais e sintomas de disfunção têmporo-mandibular são altamente prevalentes na população em geral. Os casos de dor facial que não se enquadrem nos diagnósticos de cefaléias primárias, ou mesmo os que se enquadrem, mas não respondem satisfatoriamente ao tratamento, e apresentem alguns dos fatores contribuintes etiológicos ou características clínicas descritas, devem ser investigados. Palavras-chave: Dor orofacial, Disfunção temporomandibular e oclusão. Área do Conhecimento: IV - Ciências da Saúde Introdução A dor orofacial é uma condição de dor associada aos tecidos da cabeça, face, pescoço e estruturas da cavidade oral. Incluem-se, entre outras, as dores de cabeça, dores com origem no sistema nervoso, dores psicogênicas (relacionadas com fatores psicológicos) e dores por doenças graves, como tumores e AIDS. O tratamento deve ser realizado por uma equipe de profissionais: dentistas, médicos, fisioterapeutas, psicólogos, pois essa condição deve ser abordada com uma visão do paciente como um todo, não se tratando apenas a dor no momento em que o indivíduo a está sentindo (CESA, 2008). Várias doenças podem estar relacionadas como fatores predisponentes, precipitantes e perpetuantes da dor orofacial, destacando-se a Síndrome de Ernest, pouco conhecida na literatura, que é caracterizada pela inflamação do ligamento estilo mandibular. Outro fator é a disfunção da ATM, que é uma anormalidade da articulação temporomandibular e/ou dos músculos responsáveis pela mastigação tendo origem multifatorial e se manifesta através de sintomatologia variada (geralmente, a DTM dá a sensação ao indivíduo acometido de que sua mandíbula está saltando para fora, fazendo um estalo e até travando por um instante), prevalecendo cefaléia, otalgia e dores orofaciais. (BRUNO, 2004). Na verdade, a disfunção da ATM é um subgrupo das dores orofaciais em que deve ser feito um minucioso exame clínico e questionário para se obter um correto diagnóstico, pois, muitas vezes, as disfunções da ATM podem ser confundidas com outras condições dolorosas, como dores de origem dentária e infecções bucais. As categorias, mais freqüentes de DTMs são: • Dor miogênica: a forma mais comum de DTM, que é a presença de desconforto ou dor nos músculos da mastigação, podendo às vezes atingir até músculos do pescoço e ombro. • Desarranjos internos da ATM: significa que existe um disco articular deslocado ou mal posicionado, ou mesmo lesão na articulação. Uma pessoa poderá apresentar estas duas condições ao mesmo tempo (CESA, 2008). A melhora ou remissão destas dores deve ser a prioridade no tratamento, sendo as terapias de suporte as primeiras modalidades terapêuticas a serem empregadas. O uso de medicação pode promover a diminuição ou eliminação das dores, sendo fundamental avaliar as características da dor, entre elas a origem, tempo de duração (aguda ou crônica) e intensidade (leve, moderada ou severa). Todo tratamento depende de um correto diagnóstico e é direcionado à causa. Pacientes com problemas de saúde ou que estejam em XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba 1 condições especiais (gestantes, crianças, idosos, pacientes com fobias de consultório, entre outros) exigem um tratamento odontológico diferenciado. Casos mais complexos exigem a avaliação conjunta com outras especialidades como Ortopedia, Neurologia, Otorrinolaringologia e Fisioterapia. O presente estudo tem por finalidade realizar uma revisão de literatura, sobre os tipos mais comuns de dor orofacial e ressaltar a importância da formulação de um plano de tratamento. Metodologia O material utilizado para a realização do presente trabalho foi obtido através pesquisa bibliográfica e buscas por artigos científicos nos bancos de dados, Medline, Google e Scielo. Foram selecionadas inicialmente as referências que continham as palavras “diagnóstico” e “tratamento da dor orofacial”, “disfunção temporomandibular” e “oclusão”. Revisão de literatura Dor Orofacial, como a dor em outra parte no corpo, é geralmente o resultado de dano de tecido e a ativação dos nociceptores, que transmitem um estímulo nocivo ao cérebro. Entretanto, devido à inervação rica da cabeça, da face e das estruturas orais, as entidades da dor orofacial são freqüentemente muito complexas e podem ser difíceis de diagnosticar, sendo comum a indicação de tratamento errôneo pela falta de conhecimento dos componentes envolvidos nesse quadro. Existem vários fatores relacionados com o desenvolvimento de dores faciais, como trauma, disfunções temporomandibulares, neuralgias, cefaléias, sinusites e dores miogênicas primárias. Nessas situações, o tratamento ortodoxo pode resultar em procedimentos muito invasivos, com perdas de elementos dentários saudáveis e outras intervenções cirúrgicas, alterando, dessa forma, as funções do sistema estomatognático e a qualidade de vida do paciente (OKESON, 1996). Do ponto de vista neural, as dores na boca, face e maxilar são das mais complexas. Existe uma variedade de dores numa área pequena. A dor de dente é a mais desconcertante de todas. Afeta o local e a enervação envolvida. A consciência da dor é sempre central, no cérebro. O problema é que a dor de dente "imita" outras dores na face. Por isso o diagnóstico deve ser diferenciado. (SIQUEIRA, 2008). A dor da neuralgia do trigêmeo causa muito sofrimento. O paciente sente como um choque na boca. Pode ser desencadeada por ações banais como engolir, escovar os dentes ou se maquiar. Ela ocorre na boca e se assemelha à dor de dente. Às vezes, os dentistas optam por tirar os dentes pensando que se trata de dor de dente. Isso serve de alerta para que os profissionais não removam os dentes quando não há certeza do diagnóstico (SIQUEIRA, 2008). A Síndrome da ardência bucal atinge principalmente mulheres em fase pré e pósmenopausa. A boca queima embora não haja lesões. As pessoas não acreditam que o paciente tenha alguma doença. A síndrome representa entre 1% e 6% do total de dores faciais e podem surgir em decorrência de câncer bucal, doenças sistêmicas, secura bucal. Pode haver dor neuropática, do nervo que irriga a língua. Já a dor facial atípica manifesta-se num número reduzido de pacientes. Pode surgir depois de alterações psiquiátricas importantes, como a depressão. Há casos de dor fantasma, geralmente ligada a nervos, dor na língua e câncer bucal. Quando o diagnóstico é precoce, é possível tratálos. A boca também é a região em que podem se manifestar as chamadas "dores manifestas", como casos de angina, problemas cervicais, cefaléias, sinusites. Em quadros sistêmicos, como artrite reumatóide juvenil e fibromialgia, parte dos pacientes têm muita dor na face (SIQUEIRA, 2008). Em geral, estima-se que entre 6% e 8% da população sofra de dor orofacial crônica. Os casos de neuralgia do trigêmeo somam 4 a cada 100 mil. Entre 10% e 30% dos adolescentes relatam dor de dente nos últimos seis meses. Entre 100 mil pessoas, os casos de câncer bucal somam 20 mulheres e 80 homens (SIQUEIRA, 2008). A dor crônica benigna e mais prevalente em mulheres, sendo a única exceção, a dor referente ao câncer que e mais prevalente em homens. A incidência de disfunção mandibular é de quatro a oito vezes maior nas mulheres. A dor do bruxismo é sete vezes mais comum em mulheres 75% dos pacientes com bruxismo são mulheres (SIQUEIRA, 2008). A Síndrome de Ernest, componente da dor orofacial, é caracterizada pela inflamação do ligamento estilo mandibular. O exame radiográfico não é de grande ajuda no diagnóstico desta síndrome, porém alguns autores sugerem uma possível calcificação. Uma história adequada, a palpação da inserção do ligamento estilo mandibular e um bloqueio anestésico local da inserção ligamentosa afetada são de grande utilidade na confirmação diagnóstica. A etiologia da Síndrome de Ernest está comumente relacionada ao trauma mandibular, craniano ou facial (KOELBAEK, 1999; KEIDEL, 2001). Ressaltam-se ainda as osteotomias mandibulares onde se produz a distração e XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba 2 mobilidade, fatores que podem, também, inflamar o ligamento estilo mandibular (SATALOFF, 1983). Com relação ao diagnóstico, pode ser baseado numa anamnese adequada, palpação da inserção do ligamento estilo mandibular e bloqueio anestésico local na inserção do referido ligamento (ORTIZ et al., 2003; SHANKLAND, 1997). O exame radiográfico não é de grande auxílio, pois a patogenia da referida síndrome está mais relacionada apenas à inflamação do ligamento estilo mandibular e, não à sua calcificação (ORTIZ et al., 2003), apesar da possibilidade de calcificação ligamentar não ser totalmente descartada (DUPONT, 1998). A principal manifestação da Síndrome de Ernest é uma tendinite de inserção do ligamento estilo mandibular, (BROWN, 1996; OKESON, 1996). Os sintomas podem envolver, em ordem decrescente de ocorrência: dor na articulação temporomandibular (ATM) e na região temporal, dor na região auricular e mandibular, sensibilidade dos dentes posteriores, dor ocular e na região da orofaringe. Além do mais, dor nos ombros, também, pode estar relacionada (SHANKLAND, 1987). Também, Síndrome de Ernest como tendinite temporal e a neuralgia trigeminal atípica, pode ser confundida com a dor odontogênica (SHANKLAND, 1997). Para o tratamento da Síndrome de Ernest, a princípio, a conduta é não-cirúrgica, sendo mais utilizada a infiltração de uma associação de anestésico local e corticosteróides na área da inserção do ligamento estilo mandibular. Deve-se ainda orientar ao paciente manter uma dieta leve, além de realizar compressas de calor. Apesar do largo uso do laser e de sua eficácia terapêutica não há relatos na literatura científica que demonstrem o seu emprego no tratamento da Síndrome de Ernest. Durante o crescimento e desenvolvimento do ser humano, é a cabeça que determina a posição de corpo (MORAES et.al, 1991), as posições das ATM, língua e mandíbula, pescoço e cabeça, coluna vertebral, região inframandibular e passagem de ar estão interrelacionados, caracterizando um octógono de prioridade funcional. Disfunção têmporo-mandibular (DTM) é um termo coletivo usado para descrever uma série de problemas clínicos que envolvem os músculos da mastigação, as articulações têmporo-mandibulares e estruturas associadas, ou ambos.1 Freqüentemente se encontram em clínicas de cefaléias pacientes com dor facial persistente ou recorrente. Uma vez que se tenha eliminado a possibilidade de tais dores serem cefaléias primárias, problemas otológicos ou sinusais devese considerar a possibilidade de disfunção têmporo-mandibular particularmente se a dor acompanhar os movimentos mandibulares e houver limitação dos movimentos mandibulares. (BRUNO, 2008). As desordens temporomandibulares podem ser o fator etiológico das alterações posturais e vice versa. Comprova também que o fisioterapeuta pode intervir não só diretamente no tratamento das DTM’s, mas também indiretamente, através do trabalho de reeducação e reestruturação da postura. A importância das alterações da estrutura mandibular, ou mais especificamente, dos “distúrbios oclusais” como um fator etiológico na disfunção da articulação têmporo-mandibular (ATM) e/ ou muscular tem sido longamente debatida (MONGINI, 1998). Diversos estudos e teorias afirmam a existência de alterações posturais, distúrbios da oclusão e distúrbios Temporomandibulares associados, porém, os tratamentos conjunto destas desordens não são muito abordados na prática clínica. Cada um dos tipos de dor orofacial tem um tratamento diferente. Se for possível, deve-se descobrir e eliminar a causa. Além disso, podemse adotar medicamentos ou indicar cirurgias. Às vezes a causa não está no fato, mas na decorrência dele. Discussão Apesar do largo uso do laser e de sua eficácia terapêutica não há relatos na literatura científica que demonstrem o seu emprego no tratamento da Síndrome de Ernest. De acordo com a literatura científica pesquisada, conclui-se que é muito importante o conhecimento sobre a Síndrome de Ernest, especialmente pelos cirurgiões-dentistas, uma vez que o diagnóstico diferencial pode envolver várias condições álgicas orofaciais com quadro sintomatológico semelhante. Um diagnóstico correto é a chave para o sucesso do tratamento. Um fator que pode influenciar é o estado emocional do paciente. Deve-se compreender que os pacientes reagem de formas diferentes às diversas terapias, e assim, o profissional deve adequar o tratamento ao paciente, a fim de obter os melhores resultados possíveis. O profissional cirurgião-dentista deve estar atento que a terapia por uso de dispositivos interoclusais muitas vezes por si só, não é a forma mais eficaz para o tratamento das desordens. Uma equipe interdisciplinar, composta por psicólogos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos e médicos otorrinolaringologistas e neurologistas são extrema importância para terapêutica como um todo, não se esquecendo que etiologia das DTM e DOF é multifatorial. XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba 3 Conclusão 1. Os casos de dor facial que não se enquadrem nos diagnósticos de cefaléias primárias, ou mesmo os que se enquadrem, mas não respondem satisfatoriamente ao tratamento, e apresentem alguns dos fatores contribuintes etiológicos ou características clínicas descritas, devem ser investigados. 2. Os sinais e sintomas de disfunção têmporomandibular são altamente prevalentes na população em geral, embora o número de casos que realmente necessite de tratamento seja bem menor. Apresentam quadro clínico de dor leve à moderada, ruídos articulares e/ou restrição dos movimentos mandibulares. Referências - BROWN, C.R. Ernest syndrome: insertion tendinosis of the stylomandibular ligament. Pract. Period. Aesthet. Dent. V.8, n.8, p.762, 1996. - ORTIZ, G.P; ARISTEGUIETA, L.M; VILLAMIZAR, J.R. Síndrome de Ernest. Act. Otorrinol. & Cirur. Cabeza y Cuello. V.31, n.3, 2003. - SATALOFF, R.T.; PRICE, D.B. Mandibular osteotomy complicated by styloid pain. Oral Surg. Oral Med. Oral Pathol. V.56, n.1, p.25-28, 1983. - SHANKLAND, W.E. Common causes of nondental facial pain. Gen. Dent. V.45, n.3, p. 246-53; 263-4, 1997. - SHANKLAND, W. E. Ernest syndrome as a consequence of stylomandibular ligament injury: a report of 68 patients. J. Prosthet. Dent. V.57, n.4, p. 501-506, 1987. - SIQUEIRA J.T., Dentista, responsável pela equipe de dor orofacial do Centro de Dor do HC e membro da diretoria da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED), Revista época, 2008. - BRUNO, M.A.D. Migrâneas Cefaléias. V.7, n.1, p.14-18, 2004. - CESA, M. 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