CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BELO HORIZONTE DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E GERÊNCIAIS. UMA ANÁLISE DE POLÍTICA ECONÔMICA COMPARADA: BRASIL E CHINA Maria Fernanda Mássimo Faria Belo Horizonte 2007 Maria Fernanda Mássimo Faria UMA ANÁLISE DE POLÍTICA ECONÔMICA COMPARADA: BRASIL E CHINA Dissertação apresentada à disciplina de Monografia II em Relações Internacionais do UNI-BH, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Relações Internacionais Orientador: Alexandre César Cunha Leite Belo Horizonte, 2007. 2 Centro Universitário de Belo Horizonte Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Gerenciais Relações Internacionais Dissertação intitulada “Uma Análise de Política Econômica Comparada: Brasil e China”, de autoria de Maria Fernanda Mássimo Faria, aprovada pela banca examinadora constituída pelos seguintes professores: __________________________________________________ Prof.Alexandre César Cunha Leite – UNI- BH– Orientador ________________________________________________ Profa. Sylvia Marques- UNI-BH ___________________________________________________________ Prof. Leonardo César Souza Ramos- UNI-BH _____________________________________ Prof. Leonardo César Souza Ramos Coordenador do curso de Relações Internacionais UNI-BH Belo Horizonte, 10 de agosto de 2007 3 RESUMO Nas últimas décadas, o papel do Estado como interventor econômico foi colocado em questão, uma vez que as políticas neoliberais passaram a ser defendidas, principalmente por países desenvolvidos. Através de uma análise de política econômica comparada entre China e Brasil, utilizado como sustentação princípios de teorias intervencionistas, esse trabalho defende que a participação estatal ainda continua sendo um fator decisivo para o crescimento econômico de um país. Palavras- chaves: Intervenção estatal, China, Brasil, inserção internacional. ABSTRACT In the last decades, the State’s part as interventor in economy was doubted, once the neo liberals politics were defended, especially by developed countries. Through an political economic analysis, comparing China and Brazil, using as support the principles of interventionists theories, this paperwork defends that the state’s participation still remains as an important aspect for the economic growth of a country. Key words: State’s intervention, China, Brazil 4 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 8 Capítulo 1: Estado da Arte 12 1.1- Estado e Mercado 12 1.2- Teoria Intervencionista de List 14 1.3- Teoria Keynesiana 18 1.4- A Teoria Desenvolvimentista de Chang 20 1.5 - Globalização 27 Capítulo 2: China 31 2.1- Antecedentes 31 2.2- Inserção Internacional 33 2.2.1-Fluxos Financeiros 33 2.2.1.1- Capital especulativo 33 2.2.1.2- Investimento Estrangeiro Direto 35 2.2.2-Abertura Comercial 38 2.2.3-Participação Estatal 42 Capítulo 3: Brasil 48 3.1- Antecedentes 48 3.2- Inserção Internacional 50 3.2.1-Fluxos Financeiros 50 3.2.1.1- Capital especulativo 50 3.2.1.2- Investimento Estrangeiro Direto 53 3.2.2-Abertura Comercial 56 3.2.3-Participação Estatal 58 Capítulo 4: Comparação entre Brasil e China 63 5 CONCLUSÕES 71 BIBLIOGRAFIA 73 ANEXOS 82 6 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1: Transações Correntes 64 Gráfico 2: Investimento Direto Estrangeiro(IDE) 66 Gráfico 3: Conta de Capital 67 Gráfico 4: PIB Preço Corrente 69 Gráfico 5: Exportações 82 Gráfico 6: Importações 82 Gráfico 7: Balanço Comercial 82 Gráfico 8: Balanço Comercial Brasil 83 Gráfico 9: Balanço Comercial China 83 Gráfico 10: Estoques de IDE 83 7 INTRODUÇÃO Com o fenômeno da globalização “(...) processos que promovem a interconexação internacional, aumentando os fluxos de comércio, investimento e comunicação entre as nações” (Hirst & Thompson, 2002:247), o papel do Estado como interventor econômico está sendo colocado em questão, uma vez que a liberalização e a desregulamentação estão sendo cada vez mais defendidas, principalmente por países desenvolvidos. Apesar de tais correntes de pensamento estarem ganhando força, o Estado ainda permanece como fator decisivo para o desenvolvimento econômico de um país. O presente trabalho faz uma análise de política econômica comparada, no contexto da globalização . Para isso, é utilizado o caso da China, a partir de 1980, quando esta adotou reformas econômicas pró-capitalista, conhecidas como “Política de Portas Abertas”(Vieira, 2006), mantendo, entretanto, um Estado interventor e centralizador. Além do caso brasileiro, a partir principalmente dos anos 90, quando houve a adoção de políticas neoliberais. Dentro do caso estudado, percebe-se que enquanto China cresce a ritmo acelerado, o Brasil possui um índice de crescimento inferior à média mundial. A China utilizou forma efetiva as forças que impulsionam o fenômeno da Globalização, como exemplo o Investimento Estrangeiro Direto (IED), sem que o Estado deixasse de interferir na atividade econômica, enquanto o Brasil optou por uma intervenção estatal mínima, não atingindo o resultado esperado. Com base nessa reflexão sobre o crescimento da China e dificuldade do Brasil se colocar no mesmo patamar surge o seguinte questionamento: 8 O crescimento econômico e conseqüentemente, uma maior visibilidade no cenário internacional globalizado atingindo pela China deu-se através de políticas de intervenção estatal e por esse motivo, o mesmo desempenho não foi alcançado pelo Brasil? O objetivo central desse trabalho é investigar o papel estatal na inserção econômica de China e Brasil no cenário internacional e como esta refletiu no crescimento destes. Para isso, faz-se necessário: • Apresentar as teorias de Ha-Joon Chang, Keynes e Friedrich List de intervenção estatal; • Discutir o processo de Globalização Econômica ; • Caracterizar as estratégias de inserção do Brasil, com destaque para o papel do Estado; • Caracterizar as estratégias de inserção da China, com destaque para o papel do Estado; • Proceder à comparação entre os Estados supracitados; Paraa realização desse estudo, primeiramente, é feita uma revisão bibliográfica da Economia Política Internacional de um importante tópico de estudos, a saber: o crescimento econômico comparado, que trabalhem com a teoria de intervenção estatal, principalmente List (1986), Keynes(1984) e Chang (2002). Será revisto também materiais que tratem da globalização. Logo após são analisados artigos publicados na revista de Economia Política, boletins da Unicamp e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e da American Economic Association referentes aos casos a serem abordados, Brasil e China, além da utilização de dados atuais, obtidos no Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco 9 Mundial, IPEA e Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento (Unctad). O primeiro capítulo desse trabalho, faz uma evolução histórica das políticas desenvolvimentistas ao longo dos séculos e posteriormente apresenta teorias de desenvolvimento econômico ligadas à vertente nacionalista, Friedrich List, Ha-Joon Chang e John Maynard Keynes. O estudo da teoria de List pauta-se na intervenção estatal, com políticas de proteção das forças produtivas nacionais. Na teoria Keynesiana será visto o princípio da demanda efetiva e as implicações desta para a participação Estatal, enquanto a de Chang analisará através de uma perspectiva histórica, os caminhos trilhados pelos países ricos para alcançar o desenvolvimento .No espaço temporal estudado, a Globalização se faz presente, sendo dessa forma necessário à compreensão desse fenômeno e a relevância das economias nacionais nesse sistema. Este assunto é abordado ainda no primeiro capítulo. Nos próximos capítulos são trabalhados os casos específicos de China e Brasil, destacando as estratégias de inserção no cenário internacional. Sendo exposto como se deu à política de abertura comercial desses países, dando ênfase em possíveis mudanças nas tributações cobradas aos importados e incentivos às exportações, além de ser analisado os fluxos de capital presentes nessas economias, qual a origem destes (curto prazo ou IED). Será averiguado se existe algum tipo de controle do governo sobre os capitais de curto prazo ou incentivo, com políticas de juros altos e a participação do IED no desenvolvimento econômico. Por fim, são discutidas questões relativas ao papel do Estado na Política Industrial desses países, sua participação em inovações tecnológicas e na criação de infra-estrutura. 10 Após essa exposição é possível proceder, no capítulo seis, uma comparação entre os países que foram estudados, para isso serão utilizados dados referentes aos anos analisados. Esse exame se pauta na estratégia de inserção internacional, semelhanças e diferenças. A participação do Estado e suas políticas terão grande importância nesse capítulo para se chegar às conclusões finais. 11 Capítulo 1: Estado da Arte 1.1-Estado e Mercado “Na origem da economia política já se encontrava o problema do desenvolvimento e a questão do papel específico do Estado e do mercado nesse processo complexo” (BOYER, 1999:1). A economia política tem sua origem vinculada ao pensamento mercantilista. Este surge com a consolidação dos primeiros Estados modernos e defende a idéia que a riqueza das nações depende do fluxo externo de metais preciosos, buscando o superávit do balanço comercial, através da expansão das exportações e compressão das importações, sendo fundamental o protecionismo da atividade econômica para viabilizar essa acumulação. A moeda era considerada o principal elemento de riqueza. (Souza, 1999). Em 1776, Adam Smith, em seu livro “A riqueza da nação: investigação sobre sua natureza e suas causas”, revolucionou a economia política ao propor a idéia de que os objetivos econômicos seriam alcançados de forma natural pela interação dos indivíduos em um sistema de livre mercado. Essa idéia transformou-se na grande justificativa para o desenvolvimento do novo sistema econômico da época. Sob essa perspectiva, a função do Estado não seria a de promover o progresso econômico, mas de garantir as regras necessárias para o bom funcionamento do sistema econômico de mercado (Medeiros, 2001; Fiori, 1999a). De David Hume1 a Karl Marx2, os autores3 clássicos atacaram sistematicamente as políticas e os sistemas mercantilistas e acreditavam na necessidade ou na inevitabilidade 1 David Hume (1711-1776) foi um filósofo e historiador escocês, e juntamente com Adam Smith uma das figuras mais importantes do chamado iluminismo escocês (Hunt, 1989). 2 A própria “crítica da economia política” de Marx manteve-se fiel ao antimercantilismo de sua época. Sua teoria do Capital foi ainda mais radical no processo analítico de “despolitização” do sistema econômico e na dinâmica do capitalismo (Fiori,1999). 12 do desaparecimento do Estado territoriais, com uma expansão dos mercados e desenvolvimento das forças produtivas do capitalismo industrial que promoveria a universalização da riqueza capitalista (Fiori, 1999b). “O viés político-ideológico imposto pela luta econômico pelo liberalismo contra o sistema mercantil impediu os economistas políticos ingleses de reconhecerem o que tem de verdade na política mercantilista e acabou enviesando, de forma definitiva, todo o pensamento clássico” (FIORI, 1999 a:49). No século XX, com o fracasso econômico liberal nos anos 20 e 30, surgem pesquisas de um novo quadro teórico, que defende a intervenção estatal na economia, no qual John Maynard Keynes4 faz parte. Neste contexto emerge , nos anos 50 , a concepção de um Estado desenvolvimentista5, tendo o setor público à iniciativa das decisões estratégicas referentes às questões econômicas (Fiori, 1999b; Boyer, 1999). “Nos anos 60 e 70, os governos que seguem esta orientação beneficiam-se de uma forte legitimidade, dado que o forte crescimento permite em geral resolver as tensões suscitadas pela mudança das estruturas industriais e pelos equilíbrios sociais decorrentes do desenvolvimento.” (BOYER, 1999: 11). Nos anos 80 a intervenção do Estado começa a ser questionada, principalmente em países periféricos, uma vez que a desaceleração do crescimento, a instabilidade do sistema internacional e os desequilíbrios, fizeram com que surgisse uma estratégia alternativa, de cunho liberal. Dessa forma, foram adotados estímulos ao mercado, com a abertura do capital financeiro e produtivo e intensa transação comercial. As relações do Estado e economia sofrem modificações consideráveis. As crises a partir da metade de 90 nos países que adotaram estratégias liberais mostram mais uma vez que Estado e mercado são dimensões inseparáveis, retomando 3 Frederich List (Seção 1.2), em 1841, foi em contramão de Smith e Marx, trouxe de volta o debate mercantilista sobre a natureza intrínseca do Estado e mercado no desenvolvimento econômico (Fiori, 1999b). 4 Ver seção 1.3 5 O conceito de Estado desenvolvimentista é fundamentado pelas teorias estruturalistas de Prebisch (1949). 13 assim a importância de políticas nacionalistas no desenvolvimento dos países, propostas por List no século XIX (Fiori, 1999a; Boyer, 1999). 1.2- Teoria Intervencionista de List Friedrich List, em 1841, em direção contrária ao clima ideológico de sua época, trouxe de volta o debate entre poder político e riqueza dos Estados, e a importância desta relação interna a cada um dos Estados nacionais, na competição dentro do sistema interestatal responsável pela gestão política do capitalismo (Fiori, 1999b). Segundo ele, era necessária a criação de um parque industrial estável e uma infraestrutura básica, ligada principalmente ao transporte. Uma intervenção do setor público faz-se necessária na proteção das indústrias nascentes contra a concorrência das nações mais avançadas. A teoria de List é fundamentada principalmente numa forte crítica ao pensamento liberalista, analisando os efeitos perversos da proposta liberal para as economias mais atrasadas. Vale ressaltar que todas suas discussões são fundamentadas em fatos históricos, com a análise do desenvolvimento das principais nações européias e dos Estados Unidos6. List em seu livro “O Sistema Nacional de Economia Política” define o termo Economia Política como sendo a política a qual cada Estado deve obedecer a fim de progredir em suas condições econômicas. Constitui assim, “tarefa da Economia Política realizar o desenvolvimento da nação e prepará-la para ser admitida na sociedade 6 Percebe-se ainda, que o pensamento de List foi utilizado para a criação de políticas econômicas formuladas pelos textos da CEPAL- a criação da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL), aconteceu logo após a Segunda Guerra Mundial-, de Prebich, Furtado e outros teóricos que tentaram aplicar as idéias de List diretamente para as condições dos paises da Ásia, África e América Latina. (BUARQUE, 1986). 14 universal” (List, 1986:124). A corrente liberal de sua época acredita que esse tipo de intervenção estatal deve ser substituído por uma economia Cosmopolítica7. Um país necessita para prosperar que a atividade manufatureira seja desenvolvida em todos os setores, da forma mais perfeita possível e a produção agrícola tem que ser suficiente para fornecer aos setores manufatureiros a maior parte de insumos e matéria prima que eles necessitam para a produção, essas duas atividades conjuntas são de fundamental importância para a prosperidade econômica de um Estado (List, 1986). O interesse do indivíduo deve estar subordinado a nação, o Estado tem por função impor restrições à atividade privada, tendo o dever de colocar certas normas ao comércio, orientando, ainda, o individuo sobre como empregar suas forças produtivas e seu capital. A história demonstra que essa intervenção Estatal é de fundamental importância para o desenvolvimento econômico. Segundo List (1986), as nações passam por alguns estágios de desenvolvimento: barbárie inicial, estágio pastoril, estágio agrícola, agromanufatureiro e estágio agromanufatureiro-comercial. A história da industrialização, principalmente no caso da Inglaterra, comprova que só se pode chegar ao quinto estágio de desenvolvimento, isso é uma atividade manufatureira perfeitamente desenvolvida, com um bom sistema de transporte, com uma importante marinha mercante, com ferrovias e um comércio exterior em larga escala, aquele país que tem grande intervenção do poder do Estado. Em relação o sistema protecionista, percebe-se que as taxas cobradas nos produtos importados devem aumentar gradualmente de acordo com o desenvolvimento da nação. Assim, nos Estados que se encontram nos primeiros estágios de desenvolvimento as 7 Adam Smith define o conceito de Economia Cosmopolítica como sendo a liberdade absoluta do comércio no mundo inteiro (List, 1986). 15 tarifações devem ser moderadas, por necessitarem de mercadorias manufaturadas estrangeiras e ainda não possuírem nenhum tipo de indústria nascente a ser protegida. O país que deve adotar maiores taxas protecionistas é aquele que começou seu processo de industrialização recentemente, chamada de indústrias nascentes, evitando assim que a concorrência estrangeira mais desenvolvida, através de um livre comércio domine o mercado interno desse país. A história inglesa citada por List (1986) é um bom exemplo de como a teoria da indústria nascente é eficaz. “Tendo atingido certo grau de desenvolvimento por meio do livre-comércio, os grandes monarcas perceberam que não se podia obter um alto grau de civilização, poder e riqueza sem uma combinação de manufatura, comércio e agricultura. Deu-se conta de que a recente indústria nacional não teria chance de sucesso em livre concorrência com as estrangeiras, estabelecida havia muito tempo... Portanto, mediante um sistema de restrições, privilégios e incentivos, tratam de transplantar para o solo nacional, a riqueza, o talento e o espírito empreendedor dos estrangeiros.” (LIST, 1886:39, apud CHANG, 2004:15). Nos países que já existe um alto grau de desenvolvimento, não é necessário que todos os setores da indústria sejam protegidos igualmente, apenas os setores mais importantes requerem tarifas especiais. São considerados setores estratégicos os que exigem alto capital para implementação e administração, muito maquinário, mão-de-obra com habilidade profissional e conhecimento, são considerados artigos de primeira necessidade, possuindo grande importância para autonomia nacional (ex. manufaturas de algodão, lã etc.) Se esses fatores forem protegidos, todos os outros setores conseguiram desenvolver-se e poderão ter um grau de proteção menor. Como dito anteriormente um país para se desenvolver de forma plena precisa ter as duas atividades, industrial e agrícola, trabalhando em conjunto. O comércio entre as nações também se faz necessário nesse processo, porém este deve agir de acordo com o interesse da nação (List, 1986). 16 O livre-comércio só é benéfico para países com um grau de desenvolvimento semelhante. Quando esse acontece entre uma nação agrícola com seu mercado interno manufatureiro totalmente aberto e um país que já atingiu a supremacia industrial, existe segundo List (1986) uma tendência a uma maior importação de produtos manufatureiros em detrimento a exportação de produtos agrícolas. Isso faz com que os termos de troca8 dos países menos desenvolvidos sejam deteriorados. O exemplo do comércio entre Rússia e América do Norte para comprova essa teoria. Por fim, List (1986) afirma que os preceitos liberais são defendidos pelas potências européias, principalmente pela Inglaterra, para que assim outras nações não adotem medidas protecionistas para defesa de suas indústrias nascentes e atinjam o mesmo grau de desenvolvimento dessas potências. “Quando alguém conseguiu atingir o ponto máximo de grandeza, é muito comum recorrer ele a um artifício astuto: atirar para longe a escada que lhe permitiu subir, para que outros não a usem para subir atrás dele. É nisso que reside o segredo da doutrina cosmopolítica de Smith.” (LIST, 1986:249). Embora a teoria intervencionista de List (1986) tenha sido formulada há quase dois séculos atrás, esta pode ser transportada para a realidade atual, tendo uma grande utilidade para os países em desenvolvimento, propondo uma política industrial induzida pelo Estado como forma de superar o atraso, com a criação de economias integradas no espaço doméstico e uma maior participação Estatal na promoção de infra-estrutura básica, como transporte, criando assim economias auto-sustentáveis. Estas embora realizem intercâmbios financeiros e comerciais, não são totalmente dependentes do setor externo para alcançar o desenvolvimento, utilizando assim apenas os fatores que sejam benéficos para o interesse da nação e restringindo os demais, assim como propõe List: 8 A taxa à qual as exportações são trocadas pelas importações; é dado pelo índice de preços das exportações (ou o valor médio unitário destas) e o índice de preços das importações (ou o seu valor unitário médio) 17 “O comércio deve ser regulado de acordo com os interesses da agricultura e das manufaturas (nação), e não vice-versa” (LIST, 1984: 175). 1.2-Teoria Keynesiana Keynes (1984), defensor de um controle governamental na economia, escreve sua principal obra a “Teoria Geral do emprego e do juro e da moeda” (1936), na qual são analisados diversos temas como as determinantes para o nível de emprego e renda,os conceitos de moeda e taxas de juros, o fenômeno do ciclo econômico e o que determina a taxa de juros e investimento (Keynes, 1984), em um período histórico, no qual a teoria econômica predominante era a corrente liberal. Esta tinha como suposto a “lei de Say” 9, segundo a qual, “O processo de produção capitalista é também um processo de geração de rendas (lucro, salário, aluguéis) e, por isso, a oferta cria a própria demanda” (BRUM, 1998:111). Esta teoria, não admitia a possibilidade do desemprego involuntário no sistema econômico. Porém a realidade dos fatos contrariava essa proposição. Desde inicio de 1920, o desemprego inglês persistia com taxas altas e alastrava-se por outros países europeus. O mesmo acontecia nos Estados Unidos após a crise de 29, no qual a porcentagem de desemprego assumia proporções alarmantes (Brum, 1998) Nesse contexto de recessão e desemprego, Keynes (1984) argumenta que a taxa de utilização produtiva declinava rapidamente nas épocas de depressão e junto a isso, o número de trabalhadores empregados também diminuíam. A teoria Keynesiana estava voltada para as realidades óbvias e claras da depressão, de maneira esclarecedora e coerente (Keynes, 1985; Hunt, 1989), na qual sua maior preocupação era atingir as causas do 9 Say se considerava discípulo de Adam Smith, em sua obra “Um tratado de Economia Política” disse estar simplesmente sistematizando as idéias de Smith e corrigindo alguns pequenos erros por ele cometidos (Hunt, 1989). 18 desemprego, sendo necessário entender os fatores que levavam a isso. O nível de emprego é determinado pela produção que por sua vez depende da demanda efetiva, esta é criada pela renda10 (Brum, 1998; Hunt, 1984). Assim, “O princípio da demanda efetiva é o oposto da Lei de Say. Poderíamos chamálo antilei de Say. Afirma ele o primado do consumo e investimento (demanda) sobre a produção (oferta). Em outras palavras, quem determina o volume da produção e, portanto o volume do emprego é a demanda efetiva que não é apenas a demanda efetivamente realizada, mas ainda o que se espera é o gasto em consumo mais o que em investimento” (BRUM, 1998:115). É importante perceber que a demanda pode ser maior ou menor que a capacidade produtiva. Não existindo nenhum mecanismo capaz de ajustar o mercado automaticamente no nível de pleno emprego, como defendiam os liberais. Existe uma combinação ótima de consumo e investimento que leva a demanda a se igualar à oferta no pleno emprego, porém esta é uma das inúmeras combinações possíveis (Brum, 1998). Keynes (1984) acredita que em períodos de depressão principalmente, o governo pode influenciar diretamente o nível de emprego, por meio da política fiscal (gastos públicos, tributação e empréstimos), da política monetária (emissão ou controle de moeda, fixação da taxa de juros) e da política cambial. Com auxilio dessas políticas o governo age também sobre as expectativas dos agentes econômicos, influenciando direta e indiretamente, o nível de investimento. Assim, cabe ao Estado segundo Keynes, a função de regular a economia, procurando suavizar as flutuações econômicas e complementar a iniciativa privada no que tange a realizações de investimento, evitando a estagnação no logo prazo (Souza, 1999). 10 Y= C+I, onde Y é renda, C é consumo agregado e I é igual a investimento agregado. O resíduo do montante consumido, ex-ante será o volume de poupança agregada da economia = S. 19 1.3- A Teoria Desenvolvimentista de Chang Ha-Joon Chang em seu livro “Chutando a Escada: A estratégia do desenvolvimento em perspectiva histórica”, contrariando a visão ortodoxia do capitalismo, argumenta utilizando elementos e informações históricas que as políticas e instituições liberais não foram efetivamente adotadas pelos países centrais quando estes estavam em processo de desenvolvimento. Chang (2004) utiliza a mesma metodologia abordada por Friedrich List. De acordo com o descrito no tópico anterior, List pode ser considerado o pai da indústria nascente, defendendo a idéia que os países mais atrasados não conseguem desenvolver indústrias sem a intervenção Estatal, principalmente por meio de tarifas protecionistas. Através de uma busca de modelos históricos, cria-se um embasamento teórica que consegue explicar problemas contemporâneos, levando em consideração as alterações políticas e institucionais dos países e do sistema internacional. Tal abordagem é chamada de “concreta e indutiva” (Chang, 2004:18). Através dessa metodologia, com a análise dos fatos históricos, foi possível perceber que os Estados Unidos, assim como a Inglaterra, obtiveram o desenvolvimento econômico através de medidas protecionistas. E só após alcançarem essa supremacia, esses países começam a defender políticas e instituições liberais. Segundo Chang (2004), essa é uma maneira de “chutar a escada”, isso é, tentar esconder a verdadeiro segredo do sucesso, idéia igualmente defendida por List (1986). Vale ressaltar, que durante a análise histórica dos países, percebe-se a utilização de vários instrumentos voltados para a política de promoção industrial, dentre as quais se destacam além das barreiras tarifárias, as concessões de monopólios em setores estratégicos, o pagamento de subsídios aos produtos a serem exportados, investimento na 20 infra-estrutura, na educação e tecnologia, além da criação de instituições com o objetivo de estimular a cooperação pública privado. Como dito anteriormente, a Inglaterra, considerada por muitos uma nação que adotou uma estratégia desenvolvimento voltada exclusivamente para prática liberalista, adotou medidas protecionistas como elevadas tarifas alfandegárias para produtos manufatureiros importados, durante todo o século XVIII, mesmo quando já na metade desse período sua superioridade tecnológica era visível diante os outros países europeus. Essa atitude inglesa durou até o século XIX, quando sua supremacia econômica já era inquestionável, sendo praticada uma política de livre-comércio. Esse liberalismo adotado de forma isolado, já que as grandes potências persistiam com o protecionismo, fez com que os ingleses perdessem sua liderança industrial e tecnológica no século seguinte para os americanos (Medeiros & Serrano, 1999). Os Estados Unidos, segundo Chang (2004), assim como a Inglaterra, adotaram a partir de 1816, políticas de proteção à indústria nascente. Durante mais de um século essas tarifas de proteção são mantidas, sendo consideradas uma das mais altas do mundo. Além disso, o governo criou uma infra-estrutura econômica para dar suporte ao crescimento econômico e investiu em atividades de pesquisa e desenvolvimento. Os americanos só foram adotar o livre-comércio após a Segunda Grande Guerra, quando eles já eram a maior potência capitalista mundial, e essa posição liberalista traria benefícios não só econômicos como ideológicos também. Ironicamente, as duas potências, França e Alemanha, que são comumente apontadas como altamente intervencionistas, são as que adotaram menores taxas de proteção tarifárias. No caso alemão, percebe-se que mesmo com pouca política de tarifação aos 21 produtos importados, a visão liberalista não foi adotada, sendo a intervenção direta do Estado a estratégia chave para o desenvolvimento (Chang, 2004). Já no século XIX, há um financiamento estatal das rodovias e uma reforma educacional, que além de construção de novas escolas e universidades, procurou avanços na ciência e tecnologia. Mesmo com o desenvolvimento da iniciativa privada, o Estado não deixou de participar da economia, apenas alterou seu papel de controle para algo mais voltado para orientação. A idéia de uma França intervencionista só é real no período pré-revolução quando esta adota uma variação do mercantilismo, o colbertismo. Os governos posteriores à revolução, principalmente após a queda de Napoleão estabeleceram-se um regime de caráter liberalista, que durou até a Segunda Guerra Mundial, sendo considerado esse o motivo da estagnação industrial francesa. Só após a adoção de uma estratégia intervencionista, já em meados do século XX, obtêm-se a modernização desse país, reforçando mais uma vez o argumento da indústria nascente de List (Chang, 2004). Alguns países só foram alcançar o desenvolvimento econômico e uma visibilidade no cenário internacional tardiamente, como o Japão. Apenas após a revolução Menji11 em 1868 que acontece uma modernização japonesa. A estratégia adotada foi muito semelhante à alemã, o Estado passando a desenvolver um papel decisivo no desenvolvimento do país. O Estado foi responsável pela criação de fábricas em diversos setores, que posteriormente foram vendidas a iniciativa privada, criando-se parcerias públicos-privados. Além disso, foi criado um projeto para desenvolvimento da infra-estrutura, sendo construída uma grande rede ferroviária japonesa (Chang, 2004). 11 A ordem política feudal entra em colapso e o Japão se torna um Estado-nação. 22 As instituições tiveram um papel central no desenvolvimento japonês, estas foram importadas das grandes potências e adaptadas a realidade do Estado Meiji para melhor atender o desenvolvimento industrial, surgindo assim uma “verdadeira colcha de retalhos institucionais” (Chang, 2004:89). E apenas no início do século XX foram criadas tarifas de proteção industrial, e em meados desse século, o Japão já era considerado uma grande potência. Nesse período, outros países alcançaram taxas de crescimento expressivas como a Coréia do Sul e Taiwan, através de estratégias de catch up12 semelhantes à japonesa, sendo que as políticas comerciais, tecnológicas e de industrialização foram mais sofisticada e precisa que dos países Europeus e Estados Unidos. Um ponto importante para esse crescimento foi à regulamentação de controle de investimento e fixação de preços, criandose uma espécie de política de cartel. O Estado teve papel importante na promoção da educação, com o objetivo de tornar a mão de obra mais especializada, além de conceder subsídios às atividades de pesquisa e desenvolvimento. Embora a importância da proteção tarifária e de outros instrumentos de caráter protecionistas sejam evidentes na analise histórica, poucos estudiosos reconhecem seu valor, argumentando-se que a proteção comercial era inferior a existente hoje. Porém, percebe-se que a diferença produtiva atualmente entre os países centrais e em desenvolvimento é muito maior do que nos séculos passados, não podendo assim, ser consideradas excessivas as taxas cobradas por aqueles países que ainda procuram o desenvolvimento, pois esta é a única maneira de tornar seus produtos competitivos em relação aos dos países já desenvolvidos (Chang, 2004). 12 Catch up é uma expressão da língua inglesa que significa alcançar. 23 Recentemente, a importância das instituições no desenvolvimento das nações passou a ser defendidos pelos países centrais, assim, segundo estes, além da adoção de políticas liberais os Estados periféricos necessitam da criação de instituições já existentes nos países centrais para alcançar o desenvolvimento (Chang, 2004). Segundo Medeiros (2001), o processo de desenvolvimento econômico é o resultado de uma evolução institucional capaz de ampliar a eficiência dos mercados e reduzir os custos de transação. “A instituições possuem uma maior influência sobre o desempenho dos Estados, uma vez que as políticas são apenas um mecanismo de transmissão por meio do qual o arcabouço institucional de um país tenta atingir seus objetivos econômicos” (NUNNEMKAMP, 2003:22). Assim, as instituições têm ocupado o centro dos debates sobre políticas de desenvolvimento nos últimos dez anos, principalmente após a crise asiática, interpretada como conseqüência de uma estrutura institucional deficiente, existindo hoje estudiosos que acreditam que todos os países necessitam da adoção de “boas instituições”13 para obter o sucesso econômico . Chang (2004) enfatiza a dificuldade de copiar modelos institucionais, sendo inviável impor padrões comuns a países com situações diferentes em virtude da especificidade cultural. É necessário, assim como no caso das políticas, aprender com a história. Os países em desenvolvimento devem apreender com a experiência daqueles que já implementaram um arcabouço institucional, sem ter de pagar o custo do desenvolvimento de novas instituições. As instituições recomendadas por países desenvolvidas muitas vezes não foram fundamentais para o desenvolvimento econômico. A democracia é vista como indispensável para o desenvolvimento de uma nação, porém a experiência histórica mostra 13 Boa instituição significa copiar os modelos institucionais americanos (Chang, 2004). 24 que um dos elementos dessa instituição, o sufrágio universal, quando foi instituído ficou restrito a uma minoria, sendo que apenas após a segunda Guerra Mundial que as mulheres deixaram de ser excluídas. Assim essa instituição é muito mais aceita nos paises em desenvolvimento hoje do que era quando as grandes potências se encontravam no mesmo estágio (Chang, 2004). O discurso da “boa governança”14 considera fundamental o direito a propriedade, sendo um grande incentivo a investimento estrangeiro. Percebe-se, no entanto, que a violação dessa instituição contribui para o desenvolvimento de alguns paises, como a reforma agrária realizada no Japão após a Segunda Guerra Mundial. As instituições financeiras são as consideradas de maior importância para o desenvolvimento econômico. Um bom sistema de regulamentação do setor bancário se tornou fundamental para os países em desenvolvimento. Entretanto percebe-se que a criação dessa instituição nos países centrais foi tardia e aconteceu de forma lenta, desigual e de forma altamente inadequada.O Banco Central é outra instituição financeira considerada fundamental para o desenvolvimento do capitalismo. Apesar deles terem sido fundados no estágio inicial do desenvolvimento dos países Europeus, apenas no século XX receberam a obtenção do monopólio da emissão monetária. Percebe-se assim que a necessidade de um Banco Central não é tão vital para o desenvolvimento de um país (Chang, 2004). Em outros exemplos como o sistema de proteção social, legislação trabalhista e tributação de renda, as instituições foram introduzidas tardiamente ou permanecem sem efetividade por várias décadas e a aquelas que a falta de recurso para administração e controle contribui para que permanecesse sem aplicação mesmo após a adoção. 14 Boa Governança significa copiar o modo de governar dos países centrais, existindo uma superioridade dos modelos democráticos (Chang, 2004, Medeiros, 2001). 25 Segundo Chang (2004), as pressões feitas atualmente para que os países em desenvolvimento adotem “instituições padrões mundiais” imediatamente ou ainda nessa década, sob pena de punição, são sem fundamento, já que a adoção de certas instituições pelos países centrais demorou séculos e esse processo sofreu constantes retrocessos. Na realidade, várias instituições surgem como resultado e não como causa do desenvolvimento econômico, não deixando clara, quais são necessárias para os atuais países em desenvolvimento. É importante entender que a criação de um arcabouço institucional é demorada e é necessário associar esse processo as políticas certas, para obter-se os resultados desejados. É interessante observar que países que possuem altas taxas de crescimento, China e Índia, são censurados pelos países centrais pela má qualidade de suas instituições e políticas. Implementar novas instituições costuma levar tempo, como já foi dito anteriormente, limitando a capacidade do Estado reagir a mudanças, sendo muitas vezes mais benéfico à adoção de políticas, por serem mais ágil. O sucesso desta depende por sua vez, da capacidade do Estado de implementá-la. Chang (2004) argumenta que é necessário conhecer a história de desenvolvimento das potências atuais, removendo qualquer tipo de mito histórico presente, deixando teorias abstratas de lado e permitindo que os próprios Estados em desenvolvimento façam suas próprias escolhas informadas quanto à política e instituição. A contribuição de Chang para a análise do desenvolvimento econômico dos países é de fundamental importância, pois ele trabalha com fenômenos mais recentes como a globalização e as instituições, sem que o Estado, em suas análises, deixe de ter papel decisivo na promoção do desenvolvimento e de políticas industriais , contrariando as correntes ortodoxas que acreditam na supremacia do livre mercado. Nesse contexto uma 26 exposição sobre o processo de globalização e as modificações que este acarreta no sistema econômico mundial se faz necessário para uma melhor compreensão do atual papel dos Estados em suas economias nos casos a serem estudado. 1.4- Globalização Com o colapso do regime socialista, e com a consolidação do capitalismo entre os Estados o processo de globalização ficou mais evidente e dominante nos debates acadêmicos. E com isso, o papel do Estado na economia passou a ser questionado mais uma vez. Adotando uma abordagem cética, Hirst & Thompson (2002) concentram suas análises na economia internacional, pois sem a existência de uma “globalização econômica” outras conseqüências nos domínios culturais, políticos e sociais não seriam sustentáveis. Eles destacam os fluxos de comércio internacional como uma das evidências de interdependência na economia mundial e considera os fluxos de capital, especialmente na forma de investimento direto estrangeiro (IDE), como uma outra importante evidência da internacionalização da atividade econômica. A Globalização é confundida com essa internacionalização, isso é uma interconexão crescente produzida pelo comércio e investimentos na qual as entidades principais continuam a ser as economias nacionais, produzindo uma interdependência “estratégica” entre os Estados. “Assim, embora em uma economia como essa haja uma série ampla e crescente de interações econômicas internacionais (mercados financeiros e comércio de produtos manufaturados, por exemplo), estas tendem a funcionar como oportunidades ou restrições para atores econômicos nacionalmente localizados e seus reguladores públicos” (HIRST& THOMPSON, 2002:26). 27 Em um sistema globalizado, deveria existir uma nova estrutura econômica15 , no qual o sistema econômico internacional torna-se autônomo, com os mercados e a produção de tornando realmente globais. Assim, as políticas internas, sejam públicas ou privadas, são influenciadas constantemente por determinantes internacionais, “o nível nacional é permeado e transformado pelo internacional” (Hirst & Thompson, 2002:35), surgindo assim uma conseqüência problemática da economia globalizada ligada a governabilidade. Seria muito difícil regular os mercados globais nascentes, com padrões efetivos e integrados de políticas públicas nacionais e internacionais. Essa interdependência entre os Estados acabaria por beneficiar apenas as nações mais avançadas por estarem sobre influência das forças de mercado incontroláveis, reforçando a tese desse trabalho que é preciso uma participação estatal eficiente para países periférico alcançarem o desenvolvimento e estes não precisariam aceitar de forma passiva essas forças de mercado em escala global. “O que temos hoje é uma economia internacional e não uma economia global. Não há fundamento para as alegações de que teria surgido, nos últimos 20 ou 30 anos, uma economia global, fortemente integrada, na qual os Estados nacionais estariam se tornando obsoletos e impotente” (BATISTA JR, 1998:137). Hirst & Thompson (2002) mostram que o processo de internacionalização se desenvolveu de modo cíclico e desigual já a partir dos séculos XVI e XVII com as primeiras grandes companhias de comércio e com os fluxos migratórios voluntários. A mudança ocorrida no sistema internacional a partir do final dos anos 70, na qual é freqüentemente interpretada como Globalização, esteve condicionada em um crescimento do volume de investimento direto estrangeiro (IDE). Anteriormente o fator dominante que 15 Diferentemente do que acontece em uma economia inter-nacional (modelo de economia no processo de internacionalização) cujas mudanças são apenas conjunturais voltadas para um maior comércio e investimentos internacionais dentro de um conjunto já existente de relações econômicas. 28 guiou a economia mundial foi o comércio. Porém, esses fluxos de investimentos externos estavam concentrados em simplesmente três atores assim a abordagem chamada de regionalismo trilateral seria mais adequada para descrever o sistema econômico internacional na década de 1990, do que a Globalização. Os países da tríade (EUA, Japão e União Européia) são responsáveis por aproximadamente três quartos de toda atividade econômica mundial. Isso significa que 85% da população mundial estão excluídas dos benefícios eventualmente gerados pelo processo de “globalização” econômica (Hirst & Thompson 2002). Além disso, apesar de possuírem um discurso liberal em favor da abertura da economia, os EUA, Japão e a União Européia são fechados em termos de interdependência e integração de investimentos. Em relação às atividades de corporações mundiais, as empresas transnacionais, estas são muito poucas, existindo um número muito superior de multinacionais bem-sucedidas que continuam operar com nítidas bases nacionais como centro de suas atividades econômicas (Hirst & Thompson, 2002). “A grande maioria das empresas permanece marcada por sua origem nacional. Corporações verdadeiramente transnacionais são raras, especialmente nas economias de maior porte, que contam com amplos mercados internos. Não há dúvida de que nas últimas décadas as empresas dos países desenvolvidos, e mesmo de alguns países em desenvolvimento, ampliaram as suas atividades no exterior e passaram a desenvolver uma parte das suas atividades fora de seu país de origem. Mas isso não significa que as firmas perderam as suas referências e vínculos nacionais. A grande maioria delas mantém o grosso dos seus ativos, vendas e empregos na sua base nacional. As atividades geradoras de maior valor adicionado e funções estratégicas, como pesquisa e desenvolvimento, tendem a se realizar no país de origem das empresas” (BATISTA JR, 1998:181). Percebe-se que apesar da expansão das transações internacionais, especialmente no setor financeiro, de um progresso na área de informática e comunicação, de uma maior facilidade de transporte que tem favorecido a integração dos mercados internos e 29 internacionais, os mercados nacionais continuam preponderantes se forem analisados algumas variáveis econômicas como, por exemplo, a demanda interna de um país que absorve a maior parte de bens, serviços e empregos nacionais (Batista Jr, 2002) e que não existe de fato uma economia global, uma vez os países menos desenvolvidos, e até mesmo os novos países industrializados, constituem uma parte muito pequena da economia internacional e as bases nacionais ainda são mantidas, inclusive por empresas privadas. Os “teóricos extremados da globalização” (Hirst & Thompson, 2002:286) sustentam que apenas o mercado livre e as empresas transnacionais possuem importância na economia mundial, e que estes não podem estar sujeitas às regras estabelecidas pelo poder público. Porém, o que se percebe é que apesar de altos níveis de comércio e de investimento internacional, participação de multinacionais16, os Estados e formas de regulação internacional, criadas e sustentadas pelos próprios Estados ainda possuem um papel fundamental para prover a governabilidade17. As políticas nacionais continuam essenciais para preservar as forças da base econômica nacional e das empresas que comercializam a partir dela, principalmente para os países em desenvolvimento que necessitam se tornar mais competitivos, uma vez que as nações avançadas continuam a dominar o mercado mundial. Tendo em vista tais argumentos sobre a importância da participação estatal em políticas econômicas, os próximos capítulos abordarão como se deu a intervenção do Estado em duas economias distintas: China e Brasil, sendo possível ver a trajetória diferenciada dessas economias ao longo das últimas décadas. 16 O que não evidência a existente de uma economia global, apenas uma maior internacionalização econômica. 17 Governabilidade é um conceito que não diz respeito apenas à atuação e funcionamento do governo, mas também se refere às relações entre Estado, mercado e sociedade. Nesse sentido, a governabilidade pode ser medida pela capacidade de um poder central para manter a ordem em situações normais de desordem e pela capacidade de uma comunidade para se adaptar a mudanças em suas condições de existência (Faucher, 1998). 30 Capítulo 2- China 2.1 - Antecedentes Em 1949, o partido comunista chinês, o PCC, liderado por Mao Tsetung, fundou a República Popular da China e realizou profundas transformações, modificando a estrutura econômica herdada do antigo regime, adotando um sistema de planejamento centralizado. Essa revolução é de fundamental importância para entender a trajetória chinesa nas últimas décadas. “A revolução varre do solo chinês as forças responsáveis pelo atraso, paralisia e pelas tendências desagregadores do país. São eliminados os restos das antigas burocracias civis e militares que sobreviveram à queda do império, os proprietários de terras parasitários que vivam de rendas e as camadas burguesas ligadas ao comércio exterior, criadas com a ocupação de regiões do país por potências estrangeiras.” (OLIVEIRA, 2005:4). Uma das primeiras medidas implementada pelo novo governo foi à reforma agrária, que coletivizou a produção agrícola, diminuindo drasticamente as atividades privadas no campo. Os preços dos produtos agrícolas eram controlados pelo governo e o excedente de produção não podia ser vendido livremente no mercado (Ruiz, 2006). No plano econômico industrial, o governo chinês instaurou uma política semelhante à utilizada pela União Soviética (URSS), adotando a estatização das empresas, controle centralizado e orientado por planos qüinqüenais. O primeiro plano qüinqüenal, em 1953, ganhou grande suporte da URSS. Vale ressaltar a importância do controle da agricultura pelo governo, no desenvolvimento estratégico da China, uma vez que era o excedente agrícola que financiava a atividade industrial (Chai; Kartick, 2006) Mao Tsetung, no entanto, desejava uma expansão econômica mais ousada, combinada com amplas reformas políticas, instaurou assim, um plano que foi denominado “Grande Salto à Frente” (1958-1961). Este tinha como objetivo a introdução de comunas no 31 campo, que seriam responsáveis por implementações de tarefas definidas pelo governo como a administração local, coleta de taxas, provisão de saúde e educação, atividade de serviço em sua área, além de uma construção industrial rural, estimulando assim o uso produtivo dos recursos locais não utilizados. É importante perceber que essa política residia numa busca pela auto-suficiência, devido ao extremo isolamento da China na política internacional, após o rompimento político com a União Soviética (Medeiros, 1999a; Chai; Kartick, 2006). O “grande salto” foi considerado uma política fracassada, uma vez que não conseguiu aumentar o rendimento agrícola e a política de industrialização teve um resultado insignificante, devido à péssima qualidade dos produtos fabricados. (Chai, Kartick, 2006). A China reorganiza seu sistema comunal, que cede espaço para o cultivo privado da terra e para os mercados locais, recuperando assim, os antigos níveis de produção agrícola e industrial. Porém, “ Em 1966, Mao inicia a Revolução Cultural, uma contra-ofensiva as ditas propostas capitalistas privatizantes. Essa reação política de Mao levou a reorganização da produção coletivizada e à recuperação de seu prestígio político. Com a restauração de seu poder político, Mao passa a perseguir e excluir membros do alto governo de fóruns decisórios do PCC, como Deng Xiaoping. Liu Shaoqi – então chefe de Estado - é aprisionado e morre em 1969 e, em 1971, Li Biao, o sucessor oficial de Mao, é morto em acidente aéreo depois de uma suposta tentativa de conspiração e fuga para a URSS. Para Mao, a Revolução Cultural representou uma retomada do seu poder político, mas que foi acompanhado de um fracasso no front econômico.” (RUIZ, 2006:8). Em 1975 é anunciada a reforma conhecida como “As 4 modernizações” (modernização da agricultura, indústria, tecnologia e forças armadas), contudo é somente com a morte de Mao em 1976, que estas são colocadas em práticas como políticas econômicas a serem adotadas pelo novo governo. Houve mudanças na estrutura econômica chinesa, porém foram mantidas algumas peculiaridades do antigo sistema, como a intervenção estatal direta em todos os setores econômicos, que permitiu a inserção 32 chinesa no sistema internacional nas décadas seguintes de uma maneira diferenciada (Medeiros, 1999a; Ruiz, 2006). 2.2- Inserção Externa 2.2.1-Fluxos Financeiros “Os mercados financeiros funcionam como se fossem um sistema nervoso central das economias modernas.” (GOTTWALD & SCHILTING, 2006:67). A liberalização financeira, com livre mobilidade de capitais, foi uma estratégia muita utilizada por países periféricos na década de 90, como forma de canalização de poupança externa para Estados com insuficiência de capital (Tavares, 1999). A experiência Chinesa nesse setor foi marcada por uma postura diferenciada com um controle Estatal extensivo e duradouro, através de restrições aos influxos de curto prazo e estímulos às inversões de longo prazo . 2.2.1.1- Capitais Especulativos A entrada de capital volátil na economia chinesa ficou mais evidente nos anos 90, com a abertura da Bolsa de Valores em Shenzhen e Xangai em 1991, apesar de indicar a entrada de instituições capitalistas numa economia nominalmente socialista, isso não representou a perda da autonomia do Estado Chinês no mercado econômico. Pelo contrário, representou o acesso de empresas estatais ao capital, havendo uma segmentação bem definida do mercado de ações em áreas abertas exclusivamente para estrangeiros e outras apenas para grupos nacionais, existindo uma forte politização do comércio de ações (Gottwald & Schilichting , 2006). 33 O governo Chinês a partir de então, estabeleceu regras bastante claras sobre os influxos de capitais, que são administrados por um complexo de órgãos de autorização e fiscalização, por exemplo, a Comissão de Desenvolvimento e Planejamento Estatal, o Banco do Povo da China, o Ministério do Comércio Exterior e da Cooperação Econômica, e a Comissão Chinesa de Regulamentação de Títulos Financeiros, que impõem limites em relação ao prazo de permanência dos investimentos ou de seus valores. Além desse controle administrativo, a resistência da China em liberalizar os capitais de curto prazo durante a década de 90 fica evidente quando analisadas outras variantes econômicas como na existência de uma taxa de “juros reprimida” em níveis abaixo dos juros internacionais, no câmbio depreciado e no crédito orientado por bancos públicos residentes (Bastos, Deos & Biancarelli, 2004). Devido a tais controles financeiros, a China apesar de não ter ficado totalmente imune à crise asiática de 9718, foi menos atingida, seu crescimento sofreu pouca retração e seu sistema financeiro foi pouco abalado. Isso pode ser creditado ao fato de sua conta financeira ser mais fechada e não ter em sua economia a presença de tantos ativos líquidos quanto seus vizinhos, devido ao controle expressivo na conta de capitais, sejam para aplicações de portfólio de não residente ou para transação financeiras de residentes (Bastos, Deos & Biancarelli 2004; & Gottwald & Schilichting , 2006). A China vem mantendo essas restrições aos fluxos financeiros de curto prazo ao longo dos anos, com pequenos movimentos lentos de flexibilização dessas restrições. Segundo Hu (2005), a medida mais expressa foi o lançamento do QFII (Qualified Foreing Institucional Investor) que concede aos estrangeiros o acesso às ações denominadas em 18 Crise financeira e cambial sofrida principalmente por países do leste asiático (Malásia, Tailândia, Indonésia, Filipinas e Coréia do Sul) que culminou com a desvalorização de suas respectivas moedas frente ao dólar e queda substancial nos preços de ativos nos seus mercados acionários. 34 moeda local, assim como títulos de dívida, privado e nacional, emitidos igualmente em yuan19. Porém tais investidores são selecionados por uma instituição, a CSRC (China Securities and Regulatory Commission) e necessitam manter o investimento por um tempo superior a um ano, além de respeitarem outras restrições colocadas eventualmente pelo governo. É importante ressaltar, que principalmente a partir de 2003 a China vem sofrendo com pressões, de organismos multilaterais e Estados nacionais desenvolvidos, para uma valorização de sua moeda, através de movimentos de especulações “a favor” do yuan, como forma de transpor o controle administrativo chinês imposto sobre o capital de curto prazo. Apesar de toda a pressão internacional, as mudanças no regime cambial, realizadas a partir de 2005, vêm acontecendo de forma bastante prudente, gradual e subordinada aos objetivos estratégicos de longo prazo do Estado com pequenas apreciações e reduzida volatilidade cambial. (Biancareli & Cunha, 2005) Assim, percebe-se que a China ao longo dos anos, possuiu um regime de controle de capitais, voltado para minimizar a dependência de capitais voláteis, protegendo seu mercado de instabilidades financeiras internacionais. 2.2.1.2-Investimento Direto Estrangeiro (IDE) A China na década de 1980 começou a figurar entre os países que mais atraem IDE no mundo, ocupando inclusive, nos anos 1990, o primeiro lugar no ranking dos países em desenvolvimento 20. 19 Moeda Chinesa UNCTAD, Investimento Direto Estrangeiro 1980-2003 20 Ver 35 O governo Chinês iniciou seu processo de abertura econômica em 1979, buscando uma modernização da economia e uma melhor inserção do sistema internacional. Para isso, foram realizadas reformas estruturais profundas, e nesse contexto o IDE foi considerado a melhor alternativa para se alcançar às metas estabelecidas. (Acioly, 2005). Segundo Lemoine (2000), o IDE que ingressasse no território chinês teria que alcançar três diferentes tarefas: aumentar a participação do país no comércio internacional, favorecer seu acesso às fontes de externas de capital e tecnologia e induzir novas formas administrativas nas empresas chinesas. A partir dessa reforma, o IDE, que antes era limitado às áreas de processamento de exportações, passou a ser também autorizados em outras áreas, porém com constantes intervenções estatais. Durante o período inicial dessa reforma (1979-1986) os investimentos concentravam-se em setores geológicos, na indústria manufatureira como têxtil e confecções de roupa que utiliza trabalho intensivo e em alguns setores de serviços, principalmente ligados a atividades imobiliárias. Já a partir de 86, o governo chinês alterou a “direção” dos IDE´s, como medida para mudar a estrutura setorial dos investimentos recebidos, passando estes a serem mais atuantes na indústria de transformação e para setores de export-oriented21 e de alta tecnologia (Acioly, 2005). Nos anos 1990, os IDE foram re-alocados para setores de capital-intensivo, com o objetivo de desenvolver as indústrias químicas, de máquinas e equipamentos de transporte, eletrônicos, comunicações, além de atividades no setor de serviços e estímulos ao surgimento de setores de tecnologia de ponta e centros de pesquisas e desenvolvimentos. Por fim, no começo do século XXI o governo, após a adesão da OMC, inicia uma fase de abertura da economia chinesa. (Acioly, 2005). 21 Setores voltados para a exportação (orientado para exportação). 36 Quanto ao modo de investimento externo na China, esse se deu primeiramente na forma de joint-venture17, as chamadas foreing invested enterprises (FIE´s). Esse formato começou a ser utilizada em 1979, quando foi autorizada juridicamente, estipulando que o capital estrangeiro não poderia exceder 25% da joint-ventures. A segunda forma de IDE foi por meio das Wholly Foreings Firms- empresas com participação estrangeira total- porém estas eram permitidas apenas em zonas especiais e tinham que obrigatoriamente exportar 50% de sua produção ou produzir produtos com alta tecnologia. É importante mencionar que essas restrições vêm sendo gradualmente amenizadas após a entrada da China na OMC. (Acioly, 2005) Um outro ponto importante a ser tratado é a localização espacial no território chinês do IDE recebido. Em 1980 foram criadas pelo governo chinês quatro zonas econômicas especiais (ZES), Shenzhen, Zhuhai, Xiamen e Shantou, situados em Guangdong e em Fujian. A ZES constitui um projeto pioneiro importante de liberalização econômica. A política de atração de investimento foi baseada em tratamentos preferências, como a redução de 15% no imposto de renda e grandes estímulos à entrada de empresas com projetos superiores há dez anos. Segundo Xiangdong (1996), a ZES foi criada, pois primeiramente era preciso testar políticas de “portas abertas” para depois adota-las em um espaço maior (Chunlai, 1997). Em 1984, foram anunciadas pelo governo, novas zonas especiais na região litorânea, sendo estabelecidas Zonas de Desenvolvimento Tecnológicos, as ETZD´s, com o objetivo de desenvolver o transporte, a energia e construções de portos, nessas zonas também eram oferecidas vantagens ao investidor. E ainda, em maio de 1985, foi criados os 17 Joint-venture ou empreendimento conjunto é uma associação de empresas, não definitiva e com fins lucrativos, para explorar determinado(s) negócio(s), sem que nenhuma delas perca sua personalidade jurídica. 37 chamados Triângulos de Desenvolvimento, na região do delta do rio de Yangzi, do rio da Pérola e do rio Minnan. Essas regiões também passaram a gozar de tratamento especial em relação ao IDE. Dessa forma foi criado não apenas um padrão setorial, mas regional na distribuição do IDE. E em meados dos anos 90, foram criados padrões regulatórios mais estruturados, dando condições e limites para empresas estrangeiras de sua entrada em setores/regiões da economia chinesa, através de uma política de incentivos a uma maior dispersão geográfica das inversões (Chunlai, 1997). Os IDE´s tiveram papel fundamental no desenvolvimento econômico chinês, porém desde início das reformas no final dos anos 70, existe uma forte presença estatal, com a criação de um ambiente macroeconômico favorável e controle desses fluxos financeiros em relação aos setores a serem investidos e sua distribuição regional. Mostrando assim que a inserção externa de um país e a entrada de fluxos financeiros no mesmo, pode acontecer de maneira planejada, orientada e executada pelo Estado, e não necessariamente com uma abertura total do mercado financeiros, possibilitando assim uma maior estabilidade econômica e uma menor vulnerabilidade externa . 2.2.2-Abertura comercial A crescente importância da China no comércio mundial foi alcançada, sem uma total liberalização das importações, mantendo alguns setores considerados estratégicos protegidos, através de um conjunto de restrições estimulando assim, a produção nacional. As exportações, apontadas por Medeiros (1999a) “como o componente da demanda efetiva que possuiu maior dinamismo nos últimos 15 anos” (MEDEIROS, 1999a:387), foram incentivadas com uma política cambial desvalorizada, além de uma estratégia estatal de promovê-las articuladas com o Investimento Direito Estrangeiro. A política econômica 38 praticada na China, dessa forma, induziu simultaneamente ao desenvolvimento do mercado interno e a promoção das exportações. “A abertura comercial chinesa foi uma estratégia e política de longo prazo, na qual a adesão aos mecanismos de mercado para regular parcelas crescentes do mundo da produção e distribuição da riqueza, é um instrumento do objetivo maior da modernização chinesa, e não um fim em si mesmo determinado pela adesão a uma pretensa (e definitiva) ordem liberal” (BIANCARELI & CUNHA 2005:12). Antes de 1978, a China possuía um comércio exterior totalmente fechada, sendo este controlado pelo Estado. As primeiras reformas econômicas ocorreram no final dos 70, o governo continuou a controlar 90% do comércio, e em apenas duas décadas a China se transformou em um grande exportador mundial. Isso, sem dúvida distingue totalmente a trajetória da abertura comercial chinesa de outros países em desenvolvimento (Medeiros, 1997). Os anos 80 na China foram marcados por um aumento nas importações, principalmente no setor de bens intermediários e de bens de capitais. Porém esse crescimento de produtos importados no mercado chinês se deu numa economia fortemente protegida com tarifas elevadas (43% nos anos 80 e 23% nos anos 90) e controle administrativo sobre essas importações (cerca de 20 % das importações estava, sujeitas a controle qualitativo). O empenho para se exportar veio da necessidade de criar divisas necessárias para a modernização tecnológica e crescimento industrial, porém no princípio a pauta de exportação abrangia apenas produtos primários como grãos e carvão, sendo assim difícil manter o balanço comercial favorável (Medeiros, 1999b). Em meados dos anos 80, as taxas de importação já haviam diminuído substancialmente, bens intermediários (aço), de consumo e alimentos passaram a ser ofertados por indústrias nacionais, configurando um processo de substituição de 39 importação. Concomitante a isso, houve uma expansão das exportações de indústria leve (têxtil), no final dessa década o balanço comercial chinês já era positivo (Medeiros, 1999c). Assim, percebe-se que “A política econômica chinesa praticada nos anos 80 induziu simultaneamente o desenvolvimento do mercado interno e a promoção de exportações” (MEDEIROS 1999c:10) Vale ressaltar que essas exportações foram incentivadas através das Zonas Especiais (ZE´s) 22 ,que recebiam grande influxo de investimento direto estrangeiro (IDE). As empresas localizadas nessas regiões, em troca de concessões como diminuição de impostos, eram obrigadas a exportar certa parcela de sua produção. Mesmo em zonas não-especiais, regiões que estavam subordinadas as políticas de comércio exterior chinês, sendo estas dirigidas para o desenvolvimento do mercado interno, as exportações cresceram sensivelmente (Medeiros, 1997). Esse crescimento das exportações contou com um outro fator de extrema importância, uma política cambial com o yuan desvalorizado, como um instrumento estratégico de longo prazo. Foi estabelecido um mercado dual de câmbio (Cunha & Biancarelli, 2005). Dessa forma, “O câmbio oficial, administrado como uma taxa flutuante e o mercado de swaps com acesso restrito às empresas das ZEE e tradings. Neste mercado a taxa de câmbio era ainda mais desvalorizada. Esta situação permaneceu até 1994 quando ocorreu a unificação da taxa de câmbio com significativa desvalorização do yuan e se estabeleceu um mercado interbancário de divisas em Shangai de forma a substituir os centros de swaps”. (MEDEIROS 1997:12) Nos anos 90, houve algumas mudanças em relação ao comércio exterior na China, com o estabelecimento de uma liberalização moderada, eliminando o planejamento compulsório das exportações, porém foram mantidas restrições as importações, apenas 22 Já explicadas anteriormente, na seção Fluxos Financeiros: IDE 40 reduzindo os controles quantitativos. E em 1996, o governo chinês fez alterações no sistema de câmbio também, este passou a ser atrelado ao dólar com a cotação RMB 8,27. Embora este seja considerado como o de flexibilidade administrativa com uma banda restrita, o que se percebe é uma taxa de câmbio fixa desvalorizada. (Vieira, 2006). A sustentação desta taxa se deu com a política de formação de reservas do banco central chinês. “A busca de uma taxa de câmbio nominal estável e favorável às exportações constitui um traço essencial das trajetórias bem sucedidas das industrializações do leste asiático a que a China procurou reproduzir.” (MEDEIROS 2006: 3) É importante ressaltar que essa política foi recentemente modificada, em 2005, sendo adotando um sistema de flutuação cambial, dentro de uma banda estreita. Podendo haver movimentos mais largos em relação a certas moedas, como o caso do dólar (Vieira, 2006). No começo desse século a ascensão da China se faz perceber no mundo inteiro. Os preços de mercadorias dependem da demanda da indústria chinesa, constituindo sua influência maior na Ásia, tornando-se o maior parceiro comercial da maioria dos países localizados nesse continente como o caso da Índia, no qual o comércio bilateral cresceu rapidamente, sendo avaliado inclusive um acordo de livre comércio entre os dois países, Além da Coréia do Sul, Japão e vários países da ASEAN19 (Loong, 2006). Em relação ao ASEAN, as exportações chinesas se baseiam principalmente em bens de consumo e de partes e componentes de bens de comunicação. A China hoje é o maior importador de produtos alimentícios e matérias primas, como cobre, petróleo e algodão, oriundos dessa região (Medeiros, 2006). É importante ressaltar que já existe um 19 Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), formada por Tailândia, Indonésia, Malásia, Singapura , as Filipinas, o Vietnã, Camboja , Myanmar, Laos e Brunei 41 projeto de implementação de uma área de livre comércio em 2013 com os países do ASEAN. A China hoje também participa de um organismo multilateral de comércio, a entrada chinesa na OMC ocorreu em 2001 (a China já havia tido seu pedido de entrada negado durante a Rodada do Uruguai quando se negou a fazer reformas substanciais em sua economia) embora o Estado chinês tenha sido uma das 23 partes no contrato original do GATT (Loong, 2006). Sua participação nesse organismo acarretará numa liberalização comercial, com redução das tarifas de importação. É importante perceber, no entanto, que tais modificações na economia chinesa aconteceram num momento em que a industrialização chinesa já se encontra consolidada, carecendo da economia global para atender suas necessidades de matérias primas e bens de capitais (He, 2003). “É claro que, acompanhando seu ingresso na OMC, A China criou leis correspondentes. Mas o governo chinês não tem pressa em aplicá-las não por incompetência, mas por cálculo. As empresas chinesas precisam atingir competitividade global num prazo mínimo. A maneira mais rápida de conseguir isso é com tecnologia e capital ocidentais. A aplicação retardada das leis de proteção intelectual cria a lacuna que permite recuperar o atraso sem perda de tempo ou dispêndio de capital. Com tais métodos, a China soube usar magistralmente o Ocidente para derrotá-lo.” (SANDSCHNEIDER 2006:15). 2.2.3-Participação Estatal Apesar das transformações estruturais ocorridas na China pós-80, com uma relativa abertura econômica, e tentativa de modernização em 4 áreas: agricultura, indústria, defesa, ciência e tecnologia, o Estado nunca deixou de agir de forma ativa na promoção de condicionantes essenciais para o desenvolvimento chinês. Assim, “O objetivo da reforma seria abrir espaços para a regulação pelo mercado e aumentar a autonomia das unidades econômicas sem, entretanto, abrir mão da propriedade estatal e de mecanismos de planejamento controlados pelos poderes públicos”. (OLIVEIRA 2005:5) 42 As reformas começaram pela agricultura. A partir de 1978 a terra permaneceu sob a propriedade do Estado, porém seu uso foi distribuído para cooperativas de famílias e indivíduos, assim a terra passou a ser cultivada pelo agricultor, a partir de concessões do poder publico. O produtor, no entanto, era obrigado a vender para o Estado uma certa quantia a um preço fixo. A produção restante poderia ser destinada ao consumo próprio ou à venda no mercado local com um preço superior aquele imposto pelo Estado, gerando assim um aumento da produção e produtividade agrícola. Junto a isso, o campo passou por um processo de mecanização e recebeu investimento em energia elétrica. Percebe-se assim, como a agricultura chinesa foi capaz de aumentar a oferta de matérias primas e alimentos, com um aumento da produtividade, elevando assim a renda das famílias e milhares de camponeses são retirados da linha da pobreza (Oliveira, 2005). Segundo Masiero (2006), um outro fator que contribui para modernização do campo, com sua industrialização foram as TVE´s (Township and Village Enterprises) 23 . Essas são consideradas empresas de propriedades dos governos das towns (aglomerações populacionais menores que uma cidade, mas maiores que uma vila) e comitês de villages (vilas), isso é, são pertencentes aos governos municipais. As TVE´s por contratos especiais entre grupos produtivos com as autoridades locais. Nos anos 80, essas corporações produziam e forneciam material de construção, ferramentas, serviços de transporte, alimentos processados e outros produtos industrializados. Assim, como nos cultivos agrícolas, existiam os “contratos de responsabilidade da produção agrícola”, no qual uma parte da produção era vendida ao 23 Expressão inglesa que significa “Empresas de vilas e comunidades" (EVC), Utiliza-se o nome de Township and Village Enterprise (TVE) por ser o mais freqüentemente encontrado na literatura especializada. 43 governo por um preço pré-determinado, enquanto os restantes dos produtos eram comercializados no mercado (Masiero, 2006). A TVE foi responsável pelo grande dinamismo criado na economia rural chinesa na década de 90, através do estabelecimento de fábricas de insumos agrícolas, iniciativas comerciais nessa área além de inúmeros negócios ligados à avicultura, suinocultura e piscicultura (Masiero, 2006). Além do mais, as TVE´s adquiriram uma progressiva liberdade de vender a produção em mercados livres. Estas também podiam se associar às empresas estrangeiras, porém tinham que seguir estreitas regras impostas pelos governos municipais, de compra e venda com o exterior. Para Oliveira (2005), a TVE são: “... política de apoio à industrialização do campo cujo sucesso pode ser constatado pelo fato de que a porcentagem do emprego agrícola é rapidamente decrescente em relação ao emprego total, embora o decréscimo da população rural na população total seja bem mais lento. Ou seja, a expansão das TVEs tem permitido que membros das famílias camponesas encontrem emprego na indústria sem abandonar o domicílio rural. E os bons resultados econômicos das TVEs servem ainda de importante ponto de apoio para as finanças das unidades sub-nacionais de governo.” (OLIVEIRA, 2005:7). Em relação à esfera industrial, apesar da redução do número de empresas estatais, o setor produtivo estatal (SPE) continua tendo seu papel estratégico na industrialização chinesa localizadas em setores de refino de petróleo, química, carvão e de máquinas e equipamentos. Os lucros dessas empresas vêm aumentando devido às modificações feitas pelo governo que optou por realizar a contabilidade dessas empresas separadamente do restante dos gastos do governo, assim os resultados não são confundidos com os orçamentos fiscais, gerando uma certa autonomia as empresas estais no que diz respeito ao lucro e investimento externo (Medeiros, 1997; Oliveira, 2005). A China a partir de 1980 adotou a estratégia de promover grandes empresas estatais e grupos industriais, assim as pequenas empresas são assumidas por unidades sub nacionais 44 da administração pública, ou por cooperativas de trabalhadores e algumas poucas por proprietários individuais, resultando numa diminuição do número de empresas estatais. Além do mais, nos últimos anos têm ocorrido fusões, aquisições, investimentos conjuntos, joint ventures entre empresas estatais. Dessa forma, são formados grandes grupos econômicos, capazes de atingir autonomia financeira e tecnologia. São criadas assim, empresas holding, com capacidades de realizar investimentos fora das fronteiras chinesas, concorrendo com as grandes multinacionais mundiais. (Medeiros, 1997) Ainda em relação à promoção da industrialização, o governo Chinês criou Zonas Especiais24 (ZE´s) que possuem uma quantidade maior de Investimentos Diretos Estrangeiros e são responsáveis por grande parcela da exportação chinesa (Chunlai, 1997). O Estado mostra ineficiência em relação ao transporte, sendo o interior da China interligado por um sistema bastante precário de ferrovias e rodoviário, existindo assim uma deficiência na integração do mercado interno limitado ao eixo norte-sul na costa leste do país (Medeiros,1997). Um ponto importante na política de modernização chinesa é a tecnologia. A partir dos anos 80 foi estabelecida uma nova política científica, com a criação da Comissão Estatal de Ciência e Técnicas, surgindo centros de pesquisas e laboratórios ligados às universidades (Souza, 2005). O IDE passou a ter papel fundamental nas transferências tecnológicas, sendo aprovada uma lei sobre Joint Ventures, que deu prioridade ao investimento em alta tecnologia, sempre que participasse um sócio chinês. Além do mais, das cinco zonas especiais, incentivadas pelas diretrizes do Investimento Direto Estrangeiro, 24 três se Já explicadas anteriormente, na seção Fluxos Financeiros: IDE 45 enquadram na definição de “novas tecnologias”. Em contraposição, projetos envolvendo simplesmente a importação de tecnologia estrangeira ,sem qualquer “real” transferências de tecnologia, sofrem algumas restrições. (Chunlai, 1997; Souza, 2005) As empresas integralmente chinesas sofrem de baixa capacidade de inovação, assim, para assegurar a China à capacidade de conduzir suas próprias pesquisas, deixando de depender da transferência de tecnologia, os estabelecimentos de centros de Pesquisas e Desenvolvimento (P&D) transformaram-se em prioridade para as autoridades nacionais. Multinacionais que estão dispostas a criar centros de P&D e transferir tecnologia de última geração para esse estabelecimento, estão ganhando a concorrência no território Chinês. (Shenkar, 2005; Souza, 2005) A China também fez modificações na sua Educação, investindo pesado na qualidade do ensino básico. Em 1986, o Ministério da Educação da China, implementou nove anos de ensino básico obrigatório e em período integral para todas as crianças chinesas, incentivadas pela isenção de qualquer tipo de pagamento de taxa e material escolar e por subsídios do governo às famílias mais carentes (Shenkar, 2005). No ensino superior, a anualidade cobrada aos alunos da universidade pública foi sendo instituída gradualmente a partir de 1989, evitando assim um impacto grande na população, junto a isso houve um aumento significativo no número de universidades no país (Shenkar, 2005). Percebe-se assim, desenvolvimento da China sempre teve pautado pela intervenção Estatal, mesmo após a adoção de reformas no final dos anos 70, que possui uma natureza gradual e incrementalista, sendo um movimento interativo de fatores políticos e econômicos. (Medeiros, 1999a). 46 A capacidade de atrair investimento direito, os volumosos superávits no balanço comercial e os avanços tecnológicos foram alcançados por meio de políticas nacionais executadas com um alto grau de autonomia, e em um ambiente macroeconômico estável (Oliveira, 2005). O Estado Chinês conseguiu criar uma economia integrada no espaço doméstico, com um amplo processo de industrialização, destacando as pequenas indústrias rurais e utilizou os intercâmbios financeiros e comerciais, empregando os fatores benéficos para a nação e restringindo os demais. Dessa forma, este país se inseriu de uma maneira diferenciada no contexto da Globalização. 47 Capítulo 3: Brasil 3.1- Antecedentes O processo de industrialização no Brasil começou a partir da 1 ª Guerra Mundial, com a tentativa de ruptura com o padrão de acumulação primário-exportador. Porém, foi a partir dos anos 50 que o Estado brasileiro desempenhou um papel mais relevante na estruturação do setor industrial brasileiro (Cano, 1999). Assim, nos primeiros anos década de 1950, no governo de Getúlio Vargas, foi iniciado um projeto nacional-desenvolvimentista de industrialização pesada com a criação da Siderúrgica Nacional, da Fábrica de motores, da Petrobrás e do BNDE, além das empresas de mineração, metalúrgica e de construção de rodoviárias e de hidroelétricas. Esse plano era constituído por um “forte núcleo industrial estatal” (Tavares, 1999). No ciclo expansivo1956-1960, sob o governo de Juscelino Kubitschek, o Brasil conseguiu atrair a entrada de investimento direto estrangeiro (IDE) em condições favoráveis, que foram utilizados em setores dinâmicos da economia como automobilística mecânica e material elétrico. Segundo, Coutinho (1999), esses investimentos contribuíram de forma decisiva para a modificação do perfil da indústria brasileira e para concretizar um importante salto na industrialização, viabilizado pelos investimentos públicos e estatais em infra-estrutura e em indústria de base. Durante os primeiros anos da década de 60, uma crise política brasileira paralisou a capacidade de direção do Estado e causou um desequilíbrio inflacionário, fazendo com que a ditadura militar empreendesse profundas reformas no período de 1964-1966, preparando o país para um novo padrão de financiamento capaz de financiar o longo ciclo posterior de crescimento que se estendeu por toda década seguinte (Coutinho, 1999, Suzigan, 1988). 48 No contexto dos anos 70, houve uma enorme expansão de créditos privados tanto ao setor público quanto privado brasileiro, devido o crescimento dos mercados internacionais do chamado “eurodólar” e uma maior presença de empresas transnacionais nos setores mais dinâmicos da indústria brasileira (Medeiros & Serrano, 2001). Para Coutinho (1999), “O Brasil conectou-se intensamente a esse novo mercado de crédito, através da contratação de empréstimos em grande escala, para sustentar o último ciclo de substituição de importação (II PND: insumos básicos, não-ferrosos, papelcelulose, bens de capital), sob o governo do presidente Geisel. Esta política de endividamento externo foi posteriormente atingida pela alta taxa de juros flutuantes externos pós 1979 e pela significativa deterioração dos termos de troca 1980-1983.” (COUTINHO, 1999:356). A partir dos anos 80, o processo de industrialização brasileira estagnou, devido à interrupção do fluxo de capital externo para o Brasil e com a perda da capacidade de poupança e investimento do Estado. Essa situação ocorreu após o segundo choque do petróleo e com a elevação dos juros internacionais, que acarretou uma deterioração da balança de pagamento brasileira, devido a um aumento considerável da divida externa. O estrangulamento externo se colocou como a maior restrição ao crescimento nessa década. Desde então, as preocupações governamentais das políticas macroeconômicas eram de curto prazo, não havendo nenhum projeto que tivesse como pauta a industrialização e inovações tecnológicas, com objetivo de tornar os produtos brasileiros mais competitivos no cenário internacional. A realização de saldos comerciais, através de produtos primários, para o serviço da dívida externa se tornou prioridade na economia brasileira (Suzigan, 1988). Se na década de 80 houve uma grande restrição de financiamento externo, tendo obrigado o Brasil transferir um grande fluxo de recursos para os credores, no início da década de 90 os países em desenvolvimento foram inundados por capitais externos. Porém antes dessa entrada de capital estrangeiro, o Brasil e os demais países da América Latina 49 tiveram que adotar políticas neoliberais em seus Estados com uma abertura comercial, diminuição da participação Estatal na economia e desregulamentação financeira, além de ter que concluir as renegociações das dívidas externas e debelar a inflação crônica, através de uma política de valorização cambial (Coutinho, 1999, Cano 1999). 3.2- Inserção Internacional 3.2.1- Fluxos Financeiros Os anos 90 foram marcados por uma intensificação dos movimentos internacionais decorrentes de um processo de integração financeira e de desregulamentação das economias. Os investidores estrangeiros, por sua vez, estavam em busca de oportunidades de ganhos em países considerados de maior risco, principalmente após a queda dos juros nos Estados Unidos no início da década. Nesse contexto, o governo brasileiro adotou uma série de medidas viabilizando uma ampliação do grau de abertura financeira da economia, possibilitando assim o retorno de capitais externos privados tão escassos na década de 80. (Prates, 2004). Segundo Tavares (1999), “A década de 90, inaugura-se sob a égide da globalização financeira dos chamados mercados emergentes, designação que coube aqueles países que coube aqueles países das periferias asiáticas e latino-americana que passaram a ser invadidos por uma onda de capital internacional especulativo, cuja única exigência inicial era a liberalização cambial e dos mercados financeiros privados, independente do modelo de desenvolvimento adotado por cada país.” (TAVARES, 1999:252). 3.2.1.1- Capitais Especulativos A liberalização financeira, uma das reformas neoliberais feitas na economia brasileira, iniciou-se no governo de Fernando Collor, mas ganhou maior ênfase em 1994, com o presidente Fernando Henrique Cardoso e o Plano Real que possibilitou uma estabilidade macroeconômica ao país. 50 Segundo Sicsú (2005), a abertura financeira externa da década de 1990 representa uma mudança em relação ao tratamento dado ao capital estrangeiro ao longo da história brasileira recente, pois até o final da década de 8025 vigorava uma legislação de controles sobre o movimento de capital considerada rígida. E com a liberalização financeira, o Brasil muda radicalmente sua atitude, no sentido não mais de restringir, mas de incentivar o capital estrangeiro a ingressar no país. Para haver um influxo maciço de capital especulativo no Brasil houve uma valorização da taxa de juros, uma vez que, “Com a mobilidade de capitais e de integração financeira entre os mercados, o diferencial de taxa de juros é o determinante básico dos movimentos de capitais, de tal forma que, quanto maior o retorno oferecido por um determinado país em relação aos demais, consideradas as expectativas relacionadas à taxa de câmbio, maior a atratividade para os fluxos de capitais ingressarem no mesmo, principalmente quando se trata de capitais de curto prazo, que visam a obtenção de ganhos de arbitragem.” (VERÍSSIMO & BRITO, 2005:5). Além da política de juro alto, o governo brasileiro cria mecanismos para facilitar o acesso de investidores estrangeiros ao mercado financeiro com mudanças importantes, devido à diminuição de barreiras26 até então existentes, facilitando o ingresso de capitais para investimentos de portfólio na Bolsa de Valores. Esses investimentos, em geral são voláteis e de curto prazo, já que a legislação não determina nenhum prazo mínimo de permanência no país. (Prates, 1999; Batista Jr, 2002). Assim, devido às políticas de incentivos para não-residentes investirem no Brasil, a partir de 1992, há um aumento da participação de capital especulativo na economia 25 O Decreto Lei n° 9025, de 1946, é o primeiro código que regula o ingresso do capital estrangeiro no Brasil, outro momento importante foi o da Lei n° 4131, de 1962, e da Lei n° 4390, de 1964. As mudanças mais foram introduzidas pela nova Constituição de 1988 e pela Lei n° 8383, de 1991. No entanto, toda essa legislação posterior manteve o espírito básico do DL n° 9025, de 1946. 26 Resolução n.º 1.289/87. permitia a entrada direta de investidores institucionais estrangeiros no mercado acionário doméstico (segmentos primário e secundário) e não estava sujeito a critérios de composição, capital mínimo inicial e período de permanência. 51 brasileiro, sendo que seu auge aconteceu no ano de 1995, quando atingiu o valor de 18, 8 milhões27. A crise do México em 1995, apesar de alertar os agentes financeiros sobre a possibilidade de “contágio” das demais economias latino americanas, não afetou o capital de curto prazo no Brasil, esse fato está relacionado com a implementação do Plano Real que deu uma maior credibilidade ao país no exterior. (Soihet, 2003) Foram criadas também facilidades para residentes no país realizarem investimento no exterior, através dos Fundos de Investimentos no Exterior, em títulos da dívida brasileira e a Carta Circular número 5(CC-5), na qual os bancos passaram a aceitar depósitos em moeda nacional e convertê-las em moeda estrangeira no exterior. Assim, as restrições em relação aos investimentos foram abolidas. Tais medidas permitem a fuga de capitais generalizados em períodos de turbulências financeiras. (Carneiro, 2000; Prates, 2004). As autoridades monetárias brasileiras a partir de 1996 perceberam que era preciso melhorar a qualidade do fluxo de capital no país, incentivando a entrada de Investimento Direto Estrangeiro (IDE) e restringindo as entradas de capital de curto prazo. Porém, com a crise asiática de 1997 e da Rússia em 1998, houve uma contração expressiva dos fluxos de capitais, mais do que o desejado, fazendo com que o Banco Central adotasse medidas liberalizantes para o retorno do capital, inclusive o de curto prazo. (Franco, 1998; Soihet, 2002) Em 2000, sob a liderança de Armínio Fraga Neto (presidente do Banco Central do Brasil) o processo de liberalização financeira, iniciada no governo de Fernando Collor de Mello, foi finalizado28, tornando o mercado financeiro brasileiro totalmente aberto à 27 Dados do IPEA. Resolução nº 2.689 de 26/01/2000: extinguiu as diferentes modalidades de aplicação mediante o mercado de câmbio comercial e instituiu uma nova modalidade de investimento no mercado financeiro, pela qual os investidores não residentes têm acesso às mesmas aplicações disponíveis aos investidores residentes 28 52 entrada dos investidores estrangeiros e com a manutenção dos juros altos. Essa atitude foi tomada como resposta à crise cambial vivenciada pelo Brasil em 1999, que com a desvalorização cambial gerou uma nova fuga de capitais. (Prates, 2004) No governo de Lula29, foi mantida as elevadas taxas de juros anuais como forma de atrair divisas de curto prazo e equilibrar as contas do balanço de pagamento, atendendo assim o interesse da esfera financeira. (Salama, 2005) No período iniciado na década de 90, o governo brasileiro esteve comprometido na inserção externa financeira, no qual dominam os capitais especulativos e voláteis, altamente de curto prazo. Para isso, o Brasil adotou políticas de liberalização nos seus mercados financeiros, porém esse ingresso pouco contribui para o crescimento econômico do país e sua saída abrupta costuma gerar crises financeiras. 3.2.1.2- Investimento Direto Estrangeiro (IDE) O Brasil, ao longo da sua história econômica, tem sido considerado um importante receptor de IDE dentre os países em desenvolvimento. Porém, os anos 80 foram marcados por uma baixa nesse investimento, devido principalmente às recessões que causaram uma queda na taxa de lucro nos setores produtivos brasileiros, desestimulando novos investimentos. A partir de 1990, existe uma mudança nessa situação, havendo uma recuperação e um aumento dos fluxos destinados ao Brasil (Prates, 2004). Vale ressaltar que assim como nos capitais especulativos, essa entrada de IDE aconteceu principalmente após 1994, com a adoção do plano Real, uma vez que a alta inflação brasileira era um dos últimos impedimentos do investidor estrangeiro no Brasil. (Prates, 2004) 29 O primeiro mandato do presidente Lula foi de 2002-2006 e atualmente ele cumpre seu segundo mandato 53 “O crescimento explosivo do investimento direto alimentava, em muitos analistas, expectativas otimistas no sentido de que atuaria como motor de uma nova fase de crescimento e como agente modernizador da estrutura empresarial brasileira. Esperava-se que o IDE atuasse como o componente mais estável de um novo padrão de financiamento de longo prazo, apoiado na atração de fluxos crescentes de poupança externa. Imaginava-se, também, que as empresas estrangeiras seriam protagonistas importantes na adoção de um novo estilo de crescimento com maior ênfase nas exportações, a partir de uma base produtiva mais especializada e com maior conteúdo tecnológico”. (LAPLAINE, SARTI, 2002:64) Segundo um estudo feito pela CEPAL (1998), alguns fatores contribuíram para esse reingresso de IDE ao território brasileiro como: a desregulamentação da economia, tanto no tratamento dos fluxos comerciais quanto de capital, realizados unilateralmente, as vantagens de localização ao oferecer um grande mercado interno, disponibilidade de um amplo parque industrial, com necessidades de modernização, a estabilização da economia a partir de 1994, recuperação do nível de demanda de bens de consumo e intermediários com a estabilização da economia, e por fim, o programa de privatizações. Em 1995 o primeiro Censo de Capital Estrangeiro realizado pelo Banco Central do Brasil, o BACEN, com objetivo de analisar o fluxo de Investimento Direto Estrangeiro no Brasil, mostrou que 77% do capital das empresas que responderam o questionamento, vinha de participação estrangeira. (Lacerda, 2003) Diferentemente dos capitais de curto prazo, a crise asiática de 1997 gerou impactos mais reduzidos na inversão produtiva no Brasil, principalmente porque essa modalidade de investimento está ligada a decisões de mais longo prazo, além do mais estão profundamente ligadas ao processo de privatização brasileiro (Laplane, Sarti, 1999). Esse fluxo crescente de IDE na economia brasileira, principalmente na sua metade da década de 90 , despertou o otimismo dos analistas que acreditavam que essa forma de financiamento externo era uma boa maneira de suprir a falta de poupança interna, sendo 54 considerada ao contrário do capital especulativo, uma fonte estável capaz de servir de apoio ao crescimento nacional.( Laplaine, Sarti, 2002) Porém é importante ressaltar que o grande responsável por esse boom no IDE foi o processo de privatização das empresas estatais, que atingiu todos os setores, inclusive de serviços, e chegou a representar 25%30 das inversões direitas feitas no território brasileiro. Assim, o IDE nesse período foi bastante utilizado na “transferência” de ativos já existentes, isso é o controle deste passou da esfera pública para a iniciativa privada estrangeira, segundo Laplaine, Sarti (2002) nesses casos, não houve investimentos no sentido macroeconômico, assim o IDE não contribui de fato para o crescimento econômico do Brasil. Embora o setor de telecomunicações merece destaque na ampliação e modernização de sua infra-estrutura. (Laplaine & Sarti, 2002; Giambiagi, Pinheiro & Moreira, 2001). Contudo a partir de 2001, os fluxos de IDE começaram a diminuir no Brasil, devido à retração da liquidez internacional e a preferência dos países asiáticos, principalmente a China, em detrimento a América Latina para esse tipo de inversão. Juntamente a isso, um outro fator veio a contribuir com essa queda, o fim do ciclo de privatizações, que se completou em 2003. (Acioly, 2006) O investimento direto estrangeiro (IDE), à primeira vista, podia contribuir para reduzir a vulnerabilidade externa do país, ao gerar produtos de exportação e divisas para equilibrá-lo do Balanço de Pagamentos. No entanto, esse efeito positivo foi reduzido, pois uma parcela significativa dos mesmos se destinou à aquisição e fusão de empresas já constituídas e não à criação de novas industriais. Além disso, alguns desses investimentos se destinaram ao setor de serviços, que não gera mercadorias exportáveis e nem divisas para o país; mais ainda, muitos dos investimentos estrangeiros direcionados para a indústria 30 Dados no Banco Central do Brasil 55 de transformação concentraram-se na produção para o mercado interno (Laplaine, Sarti, 2002). 3.2.2- Abertura Comercial “As reformas comerciais e cambiais de caráter neoliberal, implementadas em toda América Latina, inclusive no Brasil na década de 90, consistiram em drásticas reduções tarifas e barreiras às importações (e às exportações), simplificações dos sistemas tarifários, liberalização e unificação de mercado de câmbio, com taxas fixas administradas ou com oscilação reduzida de ´bandas cambiais`.” (CANO, 1999:301). A política de importação brasileira sofreu grandes modificações a partir do final dos anos 80, quando se iniciou um processo de liberalização comercial. Em 1988 foram adotadas as primeiras medidas com a redução das alíquotas de importação e a retiradas de algumas proteções tarifárias a indústria local. No entanto, modificações mais profundas só ocorreram na década de 90, quando foi instituída uma nova Política Industrial e de Comércio Exterior, que extinguiu grande parte das barreiras não-tarifárias e definiu um cronograma de redução das tarifas de importação (Averbug, 1999). Em relação às exportações, estas se concentraram principalmente em commodities agrícolas, minerais ou industriais de baixo valor agregado e com pouca participação de setores na área de manufatura, especialmente de sofisticado conteúdo tecnológico, e de bens não-duráveis de consumo, o que cria uma situação desfavorável nos termos de troca do país. (Miranda, 2001; Coutinho, 1999). Com o lançamento do Plano Real, a abertura entrou em uma nova fase, com a adoção de uma política de valorização cambial, sendo além de uma alavanca para estimular as importações, uma política de combate à inflação, pois o barateamento dos produtos 56 importados pressionava para baixo os preços das mercadorias nacionais similares. Além da continua promoção da diminuição tarifária aos importados (Cano, 1999). O Plano Real também trouxe conseqüências para a exportação brasileira, os produtos nacionais perderam competitividade no mercado internacional em função dos preços de seus produtos, estagnando alguns setores de exportação no Brasil (CEPAL, 1998). “A valorização da taxa de câmbio real e a redução das tarifas levaram o extraordinário crescimento da importação e desaceleração nas exportações, em particular das industriais. Em conseqüência, o déficit das transações correntes passou de 3% das exportações em 1994, para 38% em 1995, mudança sem precedentes na história do pós-guerra.” (MEDEIROS & SERRANO, 2001:129). Devido ao grande déficit na balança comercial, no período de 1995-1998, houve um grande retrocesso no processo de liberalização comercial, com a elevação de tarifas de alguns bens de consumo e as reintrodução de dificuldades administrativas na importação (Franco & Baumann, 2005). Houve elevação das alíquotas de importação de automóveis, motocicletas, tratores, eletroeletrônicos de consumo, tênis, isso é, os itens responsáveis pelas taxas de crescimento das importações (Franco & Baumann, 2005). Segundo Averbug (1999) é importante ressaltar que alguns dos principais fatores que impulsionaram o comércio exterior brasileiro na década de 90 foram às iniciativas de integração regional, principalmente aquelas ligas ao Mercosul. O Mercosul, cuja tarifa externa comum passou a vigorar em 1995, significou uma perda de autonomia na condução da política tarifária. Para implementar as medidas tomadas a partir de 1995, o governo precisou incluir os produtos, no qual houve aumento de alíquota de importação, na Lista de Exceção Nacional do Mercosul, que foi posteriormente alterada por nova lista, com alíquotas válidas por um ano. 57 A partir de 1999, as contas externas brasileiras apresentaram significativas melhoras, devido principalmente, à desvalorização cambial e a adoção de um regime flexível. O déficit comercial que em 1998 foi de US$ 6, 6 bilhões de dólares passou para 1,2 bilhões31 e em 2001, a balança comercial voltou a apresentar superávits (IPEA Data). No governo Lula, as exportações aumentaram de maneira significativo, devido principalmente à desvalorização cambial, que além de estimular as exportação, fez com que houvesse uma redução nas importações. Também foi importante para o resultado da balança comercial a recuperação da Argentina, responsável por grande parte da exportação brasileira e a intensificação do comércio com a China. Percebe-se assim, que a década de 1990, ficou marcada por mudanças desfavoráveis no padrão de comércio internacional. A diminuição das tarifas de importação levou a um aumento de produtos estrangeiro em circulação no território brasileiro e esta situação foi intensificada após a adoção do plano Real. A valorização cambial dessa nova moeda contribui para uma perda de competitividade das exportações32 de manufaturas e uma maior dependência da exportação de produtos agrícolas. Segundo Gonçalves (2000), essa situação representou uma deterioração dos termos de trocas brasileiros e um “desmantelamento do aparelho produtivo nacional”. 3.2.3- Participação Estatal No receituário neoliberal a diminuição do tamanho do Estado e da sua ação na economia era de fundamental importância. Segundo Cano (1999), 31 Dados retirados do Banco Central do Brasil. Segundo Coutinho (1999), é importante assinalar que, embora não se possa atribuir à apreciação cambial a responsabilidade pela reduzida competitividade estrutural do sistema industrial, não há dúvidas de que ele não contribui para superá-la 32 58 “Nas reformas administrativas públicas as propostas têm como alvo o redimensionamento do Estado via privatizações, fim dos monopólios públicos, descentralização fiscal e de serviços, desregulamentações, desburocratização, transformações, fusão ou eliminação de órgãos públicos. O discurso por trás dessas medidas é o da procura de eficácia, passando para o mercado várias atribuições.” (CANO, 1999:302). A partir do governo de Fernando Collor, com a adoção de uma política econômica com um viés liberal, acreditava-se que a reestruturação do setor público seria uma condição necessária para a retomada do crescimento e da estabilidade econômica. Nesse contexto surgem as propostas de privatização de empresas estatais e concessão para exploração de serviços de infra-estrutura. Segundo o governo o objetivo dessas medidas seria aumentar a participação do setor privado em novos investimentos, principalmente em áreas que o Estado não atendia totalmente (Filho & Oliveira, 1996). Foi instaurado a Comissão Diretora do Programa Nacional de Desestatização (CDPND), com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no papel de gestor, a quem foi atribuída à contratação dos estudos necessários à implementação do processo de desestatização da economia brasileira. Vale ressaltar, que embora esse processo privatização tenha se iniciado no governo de José Sarney, em 1988, ele recebeu mais atenção a partir do governo Collor. Com efeito, entre o início de 1991 e 1994, foram vendidas ao setor privado 30 empresas estatais com atuação em segmentos básicos da indústria como: aço, petroquímico e fertilizante (Lyra, 1996). Com o governo de Fernando Henrique Cardoso, as privatizações foram intensificadas e empresas estatais importantes foram vendidas como a Vale do Rio Doce. Segundo Pinheiro (2002), esse impulso na desestatização das empresas foi ampliado devido a dois movimentos simultâneos: a decisão de acabar com monopólio público em alguns setores estratégicos e de infra-estrutura a decisão dos governos estaduais de desenvolverem 59 programas de privatizações próprios. Como reflexo dessa situação no final da década de 90 cerca 119 empresas estatais haviam sido privatizadas. Concomitante a esse processo de privatizações de empresas estatais, houve uma acentuada queda no investimento estatal na área de infra-estrutura brasileira, devido à incapacidade financeira do Estado. A solução foi aumentar a participação da iniciativa privada através da concessão de serviços públicos33. Vale ressaltar, que essa situação ao contrário da venda de ativos, não elimina o controle do Estado sobra a atividade, uma vez, que o governo passa a determinar as diretrizes e regras para o agente concessionário (Filho & Oliveira, 1996, Filho, Júnior & Pereira, 1999). Assim, foi criada a Lei das Concessões Brasileira que tinha como objetivo fixar as bases para delegação da prestação de serviços públicos, abrir possibilidade de participação do capital externo na prestação de serviços públicos no Brasil, criar licitações para prestação de serviços, possibilitando assim uma maior rotatividade entre os concessionários e por fim, eliminar os subsídios governamentais. Essa proposta tinha por meta alcançar os setores elétricos, transporte e telecomunicações. No período entre 1996/1999 cerca de 35% dos investimentos nessa área provinham da iniciativa privada (Filho & Oliveira, 1996, Filho, Júnior & Pereira,1999) . Cano (1999) alega que as privatizações foram feitas “por preço de ocasião”, não permitindo dessa forma que as dividas do Estado brasileiro fossem saldadas com esses recursos. Com um discurso semelhante, Biondi (1999) argumenta que sem o Estado na economia, esta década foi a que registrou o pior desempenho econômico do século XX. A 33 “O serviço público pode ser definido como toda atividade material exercida pelo poder público, direta ou indiretamente, mediante delegação, com a finalidade de satisfazer às necessidades coletivas sob o regime do direito público, caracterizado pela subordinação do interesse particular ao interesse coletivo.” (Filho & Oliveira 1996:19) 60 variação média do PIB foi pior que na década de 80. Portanto, a saída do Estado não levou a economia a um crescimento sustentado A partir de 2002, com o governo Lula, as privatizações foram interrompidas sem atingir algumas atingir a Petrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. Foi aprovado um projeto alternativo a desestatização das empresas, o chamado PPP (Parcerias Públicas-Privado). Em relação ao domínio tecnológico, a década de 90, foi marcada por uma política de corte nos gastos públicos em áreas cruciais para inovações como Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e educação. Além disso, a crença no neoliberalismo e nas forças do mercado por parte do governo levou o país à adoção de “não políticas” industriais e tecnológicas como política de desenvolvimento econômico (Coutinho, 2003). Segundo Villaschi (2005), apesar disso, houve tentativas de se criar fundos destinadas para Ciência e Tecnologia (C&T). A primeira ocorreu na Constituição de 1988, que permitiu que os governos estaduais comprometessem certos porcentuais de suas receitas para financiamento de C&T. Na década de 90 foi criado um acordo entre o governo federal e empresários para o financiamento de P&D em 13 áreas econômicas, além da criação de infra-estrutura de C&T nas universidades. Porém essas iniciativas não tiveram retornos práticos, como foi salientado por Villaschi (2005), uma vez que havendo a necessidade de controle orçamentário, as primeiras despesas a serem sacrificadas são a de menos apelo público. Na educação, a ausência de uma efetiva de política pública, com investimentos nessa área, foi conduzindo o Brasil a um desmantelamento da educação pública em todos os seus níveis, com uma intensificação da participação privada nessa área, principalmente em relação ao ensino superior (Cunha, 2003). 61 Villaschi (2005) mostra que apesar do aumento do número de alunos que freqüentam as escolas em todos os níveis (inclusive pós-graduação), seu desempenho qualitativo não apresenta padrões razoáveis. É importante observar que a maioria desses alunos está matriculada em escolas privada, uma vez que o Estado não provê uma educação pública superior capaz de atender a demanda nacional. A conseqüência dessa diminuição da participação estatal é um retrocesso em termos de capacitação e crescimento econômico. Segundo Coutinho (1999), setores fundamentais, inclusive aqueles ligado à infra-estrutura foram deliberados e oferecido à iniciativa estrangeira de forma enviesada, enfraquecendo a capacidade econômica do Estado Brasileiro e sua autonomia. Além do mais foi criada uma dependência do setor externo, que como foi mostrado ao longo da história econômica brasileira é insustentável. Fiori (1999b) acredita, no entanto, que apesar do Brasil encontrar-se em um processo de desmantelamento estatal, sem nenhuma política voltada para a industrialização, ainda existe uma possibilidade da retomada do caminho do crescimento, porém é necessário primeiramente superar a hegemonia das políticas neoliberais que bloquearam qualquer possibilidade de desenvolvimento brasileira e impulsionar a economia brasileira para o velho modelo desenvolvimentista com profunda participação do Estado. 62 Capitulo 4: Comparação entre China e Brasil Como visto ao longo desse trabalho, Brasil e China tiveram nas últimas décadas políticas econômicas voltadas para uma inserção no cenário internacional diferenciadas. O Estado Chinês optou por uma política controlada pelo Estado e dirigida para reduzir as fraquezas de sua economia. Vale lembrar que List em 1841, já ressaltava que o interesse do indivíduo devia estar subordinado a nação, isso é, o Estado teria que impor restrições as atividades privadas, tendo que colocar certas normas ao comércio, orientando, ainda o individuo sobre como empregar suas forças produtivas e seu capital nas atividades ligadas às industrias. Seguindo esses preceitos, os projetos de investimento e o comércio internacional realizado pela China, estiveram subordinados aos objetivos de crescimento econômico. Além disso, o governo deu amplo apoio ao processo de industrialização. Enquanto isso, o Brasil optou, principalmente a partir de 1990, por uma abertura econômica, acreditando que essa por si só traria o crescimento econômico, não adotando nenhum projeto de política industrial, contrariando dessa forma os preceitos nacionalistas que descrevem o processo de industrialização como devendo ser um dos principais objetivos econômicos em um país, uma vez que as indústrias possibilitam um maior dinamismo em toda a economia. Nesse contexto, a presente seção visa proceder a uma comparação entre Brasil e China, durante os anos de 1980-2005, em relação aos aspectos abordados anteriormente nesse trabalho. 63 Gráfico 1 Transações Correntes 60000 20000 China 0 Brasil 19 82 19 84 19 86 19 88 19 90 19 92 19 94 19 96 19 98 20 00 20 02 milhões de US$ 40000 -20000 -40000 Fonte: Unctad ano Examinado à política de inserção de China e Brasil através de resultados das transações correntes desses países percebe-se o contraste entre essas duas economias (Gráfico 1). O Estado brasileiro não conseguiu alcançar volumosos superávits ao longo das décadas, mesmo durante os anos oitenta, quando a moeda nacional foi desvalorizada como forma de incentivo às exportações brasileiras. A situação deficitária até o ano de 1988 pode ser creditada ao pagamento de juros da dívida pública aos credores internacionais e a pauta de exportação brasileira, basicamente commodities. Durante os anos de 1989/1994, as transações correntes tiveram alguns superávits, o maior deles aconteceu no ano de 1992 com um valor de US$ 6 milhões. A partir de 1994, com a adoção do plano real, e a valorização cambial por ele imposto, a situação das contas correntes voltaram a ser deficitárias, devido agora o excesso de produtos importados que circularam na economia brasileira, junto a isso durante esse período uma série de restrições a essas mercadorias foi retirada. Nessa década também foram vendidas várias empresas estatais à iniciativa privada estrangeira e a remessa de lucro dessas pressionou de forma 64 negativa as contas correntes brasileiras. O pior saldo ocorreu no ano de 1998, com um déficit de quase US$36 milhões. Em 2003, a conta corrente conseguiu um superávit de US$4 milhões. A economia chinesa por sua vez, conseguiu acumular superávits expressivos, principalmente após a segunda metade da década de 90. Nos primeiros anos de 80, as transações correntes chinesas também eram deficitárias, em especial em 1986, quando esse saldo foi de US$ 7 milhões. A causa desses déficits está ligada ao aumento das importações ligadas ao setor de bens de capital, necessárias para a criação de um parque industrial. A partir dos anos 90, com a instauração bem sucedida da estratégia de incentivos as exportações, junto a uma política de desvalorização do yuan, o Estado Chinês passou a acumular vultosos superávits em suas transações correntes, chegando ao saldo de US$ 48 milhões no ano de 2003. Vale ressaltar que no ano de 1993, as transações correntes foram deficitárias em US$ 11 milhões, devido ao aumento das importações nesse ano34. Percebese assim, que ao longo desses anos um diferencial importante chinês em relação ao Brasil são os saldos das transações correntes. Os constantes superávits na China tem estreita relação com a intervenção estatal, que proporcionou políticas favoráveis às exportações chinesas,além de criar restrições as importações nesse país. List em sua teoria mostra a importância de utilizar apenas os fatores externos que fossem benéficos para o desenvolvimento da nação. Assim, segundo ele, e como fez a China, o comércio deveria ser utilizado apenas quando este atendesse o interesse da nação. E este intercâmbio só deveria acontecer se o país tivesse possibilidade de exportar manufaturas, pois países agrícolas possuem seus termos de troca deteriorados (List, 1986). 34 Ver os gráficos de exportação, importação e balanço comercial chinesa em anexo. 65 Gráfico 2 Investimento Estrangeiro Direto 80000 70000 60000 50000 milhões de US $ 40000 30000 20000 China Brasil 10000 0 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003 ano Fonte: Unctad Em relação ao IDE (Gráfico 2), este esteve presente em ambas às economias, principalmente a partir da década de 90, porém com um volume muito superior na China. Na década de 80, os IDE não ultrapassaram o valor de US$ 3 milhões por ano no Brasil. A falta de investimento desse tipo estava diretamente relacionada com a situação econômica que o país enfrentava. A instabilidade macroeconômica, com altas taxas de inflação e a crise da divida pública vivenciada nessa década gerava um receio nas empresas estrangeiras de investirem na economia brasileira. Nos anos 90, o Brasil tornou-se um grande receptor de IDE, principalmente a partir de 1995, com a instauração do plano Real e a queda da inflação. O processo de privatização foi o principal responsável por esse ingresso de IDE no país. Dessa forma, este contribuiu pouco para o crescimento econômico brasileiro, uma vez que não houve investimento produtivo de fato, existindo apenas uma transferência de ativos da iniciativa pública para o a privada estrangeira. O ano de 1998 foi o mais expressivo em relação à entrada de IDE, chegando a US$ 32 milhões. É importante perceber que a crise asiática de 1997 não retraiu 66 essa forma de investimento, já que esta está relacionada a decisões de longo prazo. A partir do ano 2001, o volume de IDE sofreu uma diminuição, pois o ciclo de privatizações foi encerrado. Em 2003, este já era três vezes menor do que há cinco anos atrás. Nos anos 80, os IDE também não foram muito significativos na China, possuindo praticamente o mesmo volume que na economia brasileira. Porém, na década seguinte a China passou estar entre os principais países receptores de IDE no mundo. É importante ressaltar que ao contrário do Brasil, esses investimentos não estiveram associados a aquisições de empresas estrangeiras, sendo dessa forma revertido verdadeiramente em avanços produtivos (Accioly, 2005). Devido a uma política macroeconômica estável e incentivos do Estado chinês, o volume de IDE chegou a US$72 milhões e pode ser considerado como um dos responsáveis pelo crescimento da China nessas ultimas décadas. Gráfico 3 Conta de Capital 60000 20000 20 02 20 00 19 98 19 96 19 94 19 92 19 90 Brasil -40000 19 88 -20000 19 86 China 19 84 0 19 82 milhões de US$ 40000 -60000 -80000 Fonte:Unctad ano Ao contrário do que acontece com as transações correntes, o Brasil possui um melhor desempenho na Conta de Capital do que a China (Gráfico 3), mesmo com os 67 extraordinários investimentos diretos que esse país vem recebendo desde início da década de 90. O Brasil durante a década de 80 possui oscilações entre déficits e pequenos superávits. Isso acontece devido às restrições de financiamento externo. O ano de 1983 foi o de maior superávit durante a década, US$ 7 milhões. Na década de 90, com a inundação do Brasil com capital externo, em razão dos mecanismos criados para facilitar seu ingresso, a conta de capital apresenta superávits impressionantes. Vale ressaltar que a maior parte de capital é de curto prazo, expondo o Brasil às turbulências do sistema financeiro internacional. Em 1998, depois da crise dos asiáticos a conta de capital brasileira fechou em superávit de US$ 37 milhões. Com a crise cambial ocorrida em 1999, houve uma fuga de capital da economia brasileira e dois anos depois o superávit dessa conta já era de menos de US$8 milhões. Em 2003, esta possuía um saldo deficitário de mais de US$3 milhões. Percebe-se que o Brasil durante quase toda a década de 90, se tornou se tornou totalmente dependente do setor externo para alcançar o crescimento, não utilizando apenas os fatores que eram benéficos para o interesse da nação e restringindo os demais, acarretando graves conseqüências para sua economia List (1984) sugere que “O comércio35 deve ser regulado de acordo com os interesses da agricultura e das manufaturas (nação), e não vice-versa” (LIST, 1984: 175). A China ao contrário do Brasil, criou mecanismos de controlar o ingresso de capital de curto prazo em sua economia, para evitar instabilidades em sua economia Por tal motivo durante essas duas décadas, a China quase não possuiu saldos positivos em sua conta de capital. Entre 1992/1996 esta apresenta superávits de até US$ 21 milhões, como no ano de 1994, porém o fator responsável ao contrario do Brasil é o IDE. Percebe-se que a partir de 35 Transportando a teoria de List para a realidade atual, além do comércio, os intercâmbios financeiros também devem ser considerados nessa afirmação. 68 1999, a China começa a possuir volumosos déficits nessa conta. No ano de 2003, seu déficit é superior a US$6 milhões. Gráfico 4 PIB- Preço Corrente 1.200 1.000 800 Bilhões de US$ 600 Brasil 400 China 200 0 1980 1983 1986 1989 1992 1995 1998 Fonte: FMI ano Analisando o PIB do Brasil e da China, percebe-se que nos anos 80, os dois países possuíam taxas semelhantes (Gráfico 4). Em 1989/1990, ao PIB brasileiro superou o chinês em quase US$100 bilhões. Até o ano de 1995 o desempenho do PIB das duas economias é muito parecidos, ambos possuem o PIB próximo a US$700 milhões. Porém é interessante observar que os países desenvolvidos, como Japão e Alemanha, durante esse período possuem um PIB muito superior, ultrapassando o US$ 1 trilhão36. Porém, no ano de 1999, com a crise cambial brasileira, o PIB brasileiro ganhou drasticamente. Segundo Vilela (2006), a desvalorização cambial acabou se refletindo em elevadas taxas negativas de crescimento do PIB em moeda estrangeira. O PIB brasileiro não ultrapassou os US$ 550 milhões de dólares. Enquanto isso, a China no mesmo ano 36 Dados retirados do FMI 69 possuiu um PIB superior a US$1 trilhão, possuindo dessa forma o sexto maior PIB do mundo37. Em 2005, o a China passou a ser a quarta economia mundial, à frente da França e do Reino Unido . O sucesso da China em sua inserção no cenário mundial nos últimos anos, através de uma política econômica com forte participação do governo , leva a uma contestação das políticas neoliberais adotadas pelo Brasil, voltando-se para o modelo Chinês em busca de soluções baseado em moldes de uma atuante intervenção estatal. Vale ressaltar, que Chang (2004) em sua teoria alertou que os países centrais que pressionam os Estados subdesenvolvidos a adotarem uma série de “boas políticas” e “boas instituições”, através do consenso de Washington com medidas de caráter liberal, estão dificultando o acesso dos países pobres ao desenvolvimento. As potências sempre utilizaram políticas nacionalistas, com intervenções estatais e medidas protecionistas para alcançarem o status que elas ocupam hoje . 37 Dados retirados do FMI 70 CONCLUSÃO Embora a questão da interação entre Estado e mercado no crescimento econômico seja um tema que tenha obtido destaque nessas últimas décadas, a preocupação com este existe há muito tempo. Já no século XIX, List argumentou sobre a importância da relação entre poder e a riqueza no sucesso econômico interno de um país e na competição no sistema interestal. Keynes um século depois, retomou esse pensamento, explicitando a função do Estado de regulador da economia. E atualmente Chang defende a importância de políticas protecionistas no desenvolvimento das nações mais atrasadas. Percebe-se então, que nas últimas décadas, mesmo com os amplos fluxos financeiros e comerciais internacionais, a intervenção Estatal, ainda possui um papel de suma importância para o desenvolvimento econômico dos países. As políticas públicas continuam essenciais na criação das forças da base econômica nacional, principalmente para os países em desenvolvimento que necessitam se tornar mais competitivos, uma vez que as nações avançadas continuam a dominar o mercado mundial. E com adoção de políticas neoliberais esta situação não tende a mudar , como já foi comprovado nas últimas décadas. O crescimento chinês, sempre teve pautado pela intervenção Estatal, mesmo após a adoção de reformas no final dos anos 70. A capacidade de atrair investimento direito, os volumosos superávits no balanço comercial e os avanços tecnológicos foram alcançados por meio de políticas nacionais executadas com um alto grau de autonomia, e em um ambiente macroeconômico estável. O Estado Chinês conseguiu criar uma economia integrada no espaço doméstico, com um amplo processo de industrialização e utilizou os 71 intercâmbios financeiros e comerciais de forma benéfica para o desenvolvimento da nação. Dessa forma, este país se inseriu de uma maneira peculiar no cenário internacional. Ao contrario do exemplo da China, o Brasil optou por uma liberalização e desregulamentação econômica a partir da década de 90. Foram adotadas medidas para incentivar às importações, restringindo às exportações e com total abertura para o capital estrangeiro. O governo brasileiro ao longo desses anos esteve focado apenas em políticas macroeconômicas, não adotando nenhum projeto de desenvolvimento industrial. Analisando os dados econômicos (1980/2005) desses países, nota-se que o Brasil e a China iniciaram os anos 80, com um desempenho na economia muito parecido. Porém, a trajetória seguida por esses dois países durante, principalmente os anos 90, foi diferenciada, como já visto. Essa distinção entre as duas economias, acarretou resultados econômicos distintos, enquanto a China no inicio desse século já figura entre as nações de maior crescimento no cenário internacional, o Brasil sofreu retrocessos em termos de capacitação e crescimento econômico. Dessa forma, algumas lições podem ser retiradas do modelo de crescimento Chinês para o Estado brasileiro: uma economia nacional pode-se inserir no sistema internacional, sem que o Estado perca sua autonomia, incentivando elementos que trarão beneficio ao crescimento econômico como Investimento Direto Estrangeiro (IDE) e exportações, e restringindo aqueles que podem gerar algum tipo de turbulência nas economias, como os capitais de curto prazo. Além de ser de fundamental importância políticas industriais e inovações tecnológicas para a criação de uma economia competitividade no cenário internacional. 72 BIBLIOGRAFIA ACIOLY, Luciana. China: Uma inserção diferenciada. 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