ESETec - tommyreforcopositivo

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Psicoterapia A nalítica
Funcional
Criando Relações T erap êuticas
Intensas e Curativas
Robert J. Kohlenberg
Mavis Tsai
ESETec
www.facebook.com/groups/livrosparadownload
www.slideshare.net/jsfernandes/documents
Psicoterapia: Analítica
Funcional
Criando Relações Terapêuticas
Intensas e Curativas
Robert J. Kohlenberg
Universidade de Washington
Seattle, Washington
Mavis Tsai
Psicóloga Clínica
Seattle, Washington
T ra d u ç ã o
O r g a n iz a d o r a
Rachel Rodrigues Kerbauy
'
Traduzido por
Fátima Comte
M ali D elitti
Maria Zilah da Silva Brandão
Priscila R, Oerdylt
Rachel Rodrigues Kerbauy
Regina Christina Wielenska
Roberto A . Banaco
Roosevelt Starling
R eim pressão
ESETe©
Editores Associados
Santo André, 2006
K ohlenberg R obert I. (1 9 9 !)
Psicoterapia Analítica Funcional: Criando Relações Terapêuticas Intensas e
Curativas / Robert J. K ohlenberg e M avis Tsai.
Inclui referências bibliográficas e índice remissivo
IS B N 8 5 -8 8 3 0 3 -0 2 -7
1. Terapia C omportamental, 2.Psicoterapeuta e paciente. I. Tsai. M avis. II. Titulo
[DNLM : 1. Comportamento. 2, Relações terapeuta-paciente. 3. Terapia psicanalítica.
238 págs.
W M. 460 . 6 IC79f]
R C 489.B 4K 65 2001
616.89’ 14 2 -cc2 0
91-21357
CIP.
Versão em Língua Portuguesa
Editora: Teresa Cristina Cume Grassi
Revisora: Irene Forlivesi
Título do original (inglês)
Functional Analytic Psychotherapy
Creating Intense and Curative Therapeutic Relationships
Copyright© 1991 Plenum Press, New York
A Division of Plenum Publishing Corporation
233 Spring Street, New York, N.Y. 1033
Direitos exclusivos para Língua Portuguesa
Copyright ©2001 ESETec Editores Associados
ESETec
Editores Associados
A solicitação de exemplares poderá ser feita à ESETec
( 11) 4990 56 8 3 /4 4 3 8 68 66
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[email protected]
A o s n o sso s p ais
J a c k e B ess K o h len b erg
E d w in e E m ily Tsai,
cu jo a m o r constante, apoio e orgulho
fo ra m o su sten tácu lo de n o ssas lutas e
realizações.
Edição de Língua Portuguesa
N ós nos sentim os profundam ente honrados pela tenacidade dem onstrada por
nossos colegas brasileiros na produção da edição em português do livro Functional
A nalytic Psychotherapy (FAP). Por muito tempo o Brasil tem se destacado na
aplicação da análise do com portam ento aos problem as clínicos, e este livro
p o sic io n a a FA P d entro desse gênero. N ossos colegas b rasileiro s estão
em penhados em várias pesquisas instigantes e no desenvolvim ento da FAP, e
nós tem os um a dívida de gratidão para com eles, pelo trabalho que tiveram na
tradução desse livro. Robert Kohlenberg m antém relações de amizade com quase
todos os que contribuíram para esta tradução e guarda lembranças agradáveis
de m om entos em que estiveram juntos.
Traduzir um livro de psicoterapia analítica funcional (FAP) é um a tarefa
difícil, devido às sutilezas dos conceitos teóricos e à sensibilidade para temas
culturais que se faz necessária. Os tradutores m antiveram contato conosco e
temos a certeza de que eles fizeram um trabalho muito bom. N ós gostaríamos de
agradecer, po r seu trabalho, às seguintes pessoas: Irene Forlivesi pelo prefácio,
R oosevelt Starlingpelo Capítulo 1, Regina C. W ielenskapelo Capítulo 2, M aly
D elitti pelo Capítulo 3, Roberto Alves B anaco pelo Capítulo 4, Fátim a Conte
viii
Prefácio
pelo Capítulo 5, Priscila D erdyk pelo Capítulo 6 , M aria Zilah Brandão pelo
Capítulo 7, e Rachel Rodrigues K erbauy pelo Capítulo 8 .
Em especial, desejamos expressar nossa profunda gratidão a Rachel
Rodrigues Kerbauy, p o rter iniciado e coordenado este árduo empreendimento. O
trabalho de todos neste livro nos ajuda a alimentar o sonho de que um público cada
vez maior de terapeutas e de clientes pode ser inspirado e enriquecido pela FAP.
R. J. K.
e
M. T.
Prefácio
Este livro nasceu da experiência acum ulada ao longo de m uitos anos, tratando
e pensando a respeito de nossos clientes. N ós encaram os este trabalho como
um m anual de tratam ento que contem orientações para a criação de relações
terapêuticas que sejam profundas, intensas, significativas e benéficas. Este livro
não é um a coleção de técnicas, m esm o tendo a inclusão de várias delas. Mais do
que isto, nós descrevem os um referencial teórico que pretende servir de guia
para a atividade do terapeuta. Em bora a teoria da qual fazem os uso seja
particularm ente m uito adequada para a nossa proposta, nós perdemos a maioria
do nosso público no m om ento em que m encionam os seu nome. D esta forma, os
próprios alicerces com os quais contam os, podem prejudicar o nosso desejo de
com partilhar a estim ulação intelectual e os nossos insights clínicos.
É difícil para os clínicos adotarem novas técnicas que leram em um
livro. Eles não estão particularm ente propensos a serem receptivos quando estas
técnicas estão baseadas num a teoria que provoca um a forte reação negativa.
Entretanto, esta teoria é amplamente mal-interpretada e mal-compreendida; como
conseqüência, o primeiro capítulo fornece explicações sobre os principais tópicos
do behaviorism o radical, abordando alguns desses mal-entendidos (talvez você
Prefácio
não tenha notado, mas nós omitimos o nome da teoria). No Capítulo 1, nós
tam bém mostramos como o behaviorism o radical conduz o foco da atenção
para a relação terapeuta-cliente.
Pretendia-se que este livro fosse lido m ais ou m enos na seqüência, mas
isto não é obrigatório. Cada capítulo é praticamente independente do outro,
porque muitos dos conceitos menos conhecidos são retomados, mesmo que eles
já tenham sido apresentados num capítulo anterior. Os temas de conteúdo mais
teórico e abstrato estão contidos nos três prim eiros capítulos, e nos capítulos
seguintes a ênfase m aior é dada à aplicação clínica. Para alguns leitores, iniciar
a leitura por estes capítulos mais clínicos poderia avivar o interesse em examinar
os capítulos teóricos anteriores.. N ós esperamos que, ao percorrer os capítulos e
observar novas formas de aplicação dos conceitos, ocorra um efeito cumulativo
e os conceitos se tornem mais compreensíveis.
N o segundo capítulo, nós evidenciamos os princípios de como fazer
psicoterapia analítica funcional (FAP). Em bora forneçamos cinco princípios,
somente o prim eiro é realm ente necessário, e esperamos que seja este a ser
guardado na m em ória: “prestar atenção aos com portam entos clinicamente
relevantes”; é nisto que se concentra este livro.
Talvez o terceiro capítulo venha a ser o m ais difícil. É a prim eira vez
que são apresentados alguns dos conceitos do com portam ento verbal. Também
é explicado um sistema que analisa o que o cliente diz. Uma ‘saída de emergência’
é oferecida aos leitores que não querem perder tempo no aprendizado do sistema,
ao contrário, querem dirigir-se diretam ente para as principais conclusões.
As emoções e o afeto são fundamentais no processo terapêutico. Contudo,
nós seguimos por um caminho ligeiram ente diferente daquele da m aioria dos
outros sistemas terapêuticos. Concluím os que, por um lado, os sentimentos não
causam os problem as de um cliente nem são os responsáveis pela mudança
terapêutica. M as, por outro lado, a terapia não funciona se os sentimentos não
ocorrem. Este e outros paradoxos são explicados no Capítulo 4, no qual se
espera que a nossa discussão sobre a expressão dos sentim entos traga um a luz
adicional a este tópico polêmico.
Todas as pessoas pensam e têm cognições. Além disso, as cognições
têm um papel prim ordial na terapia. N o Capítulo 5, nós expom os de um a nova
form a a visão do behaviorism o radical sobre estes fenômenos, resultando em
um a abordagem que, acreditamos, será útil aos psicoterapeutas, inclusive aos
terapeutas cognitivos.
P refácio
xi
N este livro, a aplicação da teoria behaviorista se estendeu para além
dos seus dom ínios costumeiros. Esta extensão ocorre em seu m aior grau no
Capítulo 6 , n o qual abordam-se os problemas do sei f. um tópico esporadicamente
discu tid o n o s círculos behavioristas. N ós apresentam os o s e lf como um a
experiência altam ente pessoal que se m anifesta de diversas maneiras, .algumas
m ais ad a p ta tiv a s do que outras, B orderíine, e transtorno narcisista e de
personalidade m últipla estão incluídos entre as formas m al-adaptativas que
colocam os em discussão, N ós explicam os os problem as do s e lf com o sendo o
resultado de várias condições externas que acontecem durante o desenvolvimento,
tanto norm al quanto patológico, na infância.
N o C apítulo 7, nós desafiamos a afirm ação de que a focalização da
FAP na relação terapêutica nada m ais é do que a psicanálise com nova leitura.
São exam inados os conceitos psicanalíticos de transferência e aliança terapêutica
e o m odelo relacional da terapia de relações objetais. Argumenta-se sobre a
questão da FAP ocupar um espaço único entre as terapias psicodinâm icas e
com portam entais atuais.
Dependendo de qual seja o interesse dos leitores, alguns podem considerar
que nós deixam os a melhor parte para o final. Nosso último capítulo se aprofunda
nas precauções éticas, no processo de supervisão, nos problem as inerentes à
m etodologia tradicional de pesquisa e suas im plicações para a pesquisa da FAP,
e em com o os princípios da FAP podem ser ampliados para que consigam
abranger problem as do m undo exterior à terapia.
É necessário fazer uma referência à terminologia comportamental usada
neste livro. A linguagem comportamental pode proporcionar novos insights sobre
os fenôm enos clínicos e transm ite o que pretendem os dizer a respeito de como a
terapia p ode ajudar e do porquê dos problem as dos clientes. Entretanto, esta
term inologia não foi desenvolvida no ambiente psicoterapêutico, sendo, por isso,
pouco eficiente para comunicai' os fenôm enos que lá ocorrem. N ós procuramos
p erm an ecer entre a linguagem dos behavioristas radicais e aquela usada pela
m aio ria dos clínicos. A lgum as vezes a pendência foi maior para um dos lados,
m as nós ten tam os obter o m elhor da riqueza que cada um a delas contem.
E ste livro surgiu de um capítulo que constou no livro “Psychotherapists
in C linicai P ractice" (1987), editado por N eil Jacobson. N ós somos gratos a
N eil p o r nos ter encorajado a dar o prim eiro passo. N o nosso livro, a aplicação
clínica foi facilitada por meio do uso de transcrições de casos e da ênfase dada
ao com portam ento verbal do cliente. O capítulo que trata do s e lf evoluiu de um
artigo escrito originalm ente por R obert Kohlenberg e M arsha Linehan.
xii
Prefácio
Bob Kohlenberg gostaria de reconhecer a importância que teve sua
filha Barbara na gênese deste livro, pois ela foi a responsável pelo ‘retom o à
v id a ’ de um b e h a v io rista ra d ic a l e x tin to . S eu filh o A ndy c o n trib u iu
significativam ente com perspectivas éticas, ao m esm o tempo em que seu filho
Paul o lem brava da im portância de se ter um a m ente investigativa, bom hum or
e comprom isso. Seu irmão D avid esteve sem pre presente para escutar, fato
que foi essencial para a elaboração deste livro. M avis, querida co-autora,
enriqueceu a vida dele com seu am or e intelecto ilimitados, os quais forneceram
a linha-m estra que é o âihago da FAP.
M avis Tsai reverencia a lem brança de N ed Wagner, seu prim eiro
orientador de pós-graduação. Foi de inestim ável valor o entusiasmo que ele
dem onstrou por suas idéias e textos quando ela era ainda um a “caloura” na pósgraduação. N o curto período de dois anos, N ed infundiu nela um universo de
confiança, curiosidade e compaixão. Seus outros dois orientadores, Stanley Sue
e Shirley Feldman-Summers, tam bém desem penharam papel essencial em seu
desenvolvimento como psicóloga. Também foram mentores Laura Brown, James
Colem an e Ron Smith. Bob, co-autor e seu parceiro na vida, inundou-lhe a vida
com seu profundo amor, mente fértil e presença m arcante, dando-lhe razão e
alegria de viver.
Os colegas de clínica Carla Bradshaw , B arbara Johnstone, K aren
Liridner, Vickie Sears, Ellen Sherwood, e A lejandra Suarez leram um a parte ou
todo o manuscrito em suas diferentes etapas de execução e forneceram importante
feedback.
Temos uma dívida especial com A nne Uemura, amiga e com panheira
m uito próxima, que passou incontáveis horas revisando cada palavra de nosso
manuscrito e nos ofereceu críticas detalhadas e construtivas.
W illard Day foi uma grande inspiração. Seu trabalho dem onstrou que a
interpretação é um a atividade essencial do behaviorista radical. Seu encanto
pelas novas idéias tomou-se um refugio no qual elas poderiam crescer e prosperar.
Steve H ayes estabeleceu as bases para a aplicação dos princípios
behavioristas radicais na psicoterapia de adultos. Stanley Messer, o primeiro
estudioso com orientação psicodinâm ica que levou a sério nosso trabalho, nos
deu um feedback crítico valioso.
A próxima geração de terapeutas FAP - M ichael Addis, James Cordova,
Daria Broberg, Victoria Follette, Allan Fruzzeti, Enrico Ganaulti, Kelly Koemer,
M a rty S tern , Ju lian S om ers, P a u la T ru ax , e Je n n ife r W altz - n o sso s
Prefácio
xiii
agradecim entos pela generosidade demonstrada enquanto as idéias começavam
a surgir e um sistem a estava se desenvolvendo.
A gradecem os aos nossos clientes que dividiram conosco suas mais
profundas dores e alegrias. C ada um de nossos clientes contribuiu para a nossa
perspicácia clínica e m odelou quem somos como terapeutas. Para proteger a
individualidade dos clientes que estão descritos nas histórias de casos, foram
alterados todos os nom es e outras inform ações que poderiam identificá-los.
O falecim ento de B. F. Skinner representa um a grande perda para todos
aqueles que o adm iraram . A essência de seu trabalho de um a vida toda consistia
na esperança de que pudéssem os m elhorar nossas vidas e o m undo no qual
vivemos. Foi com base neste legado que nós escrevemos este livro, e lamentamos
que ele não teve a oportunidade de lê-lo e testem unhar m ais um dos inúmeros
efeitos que seu trabalho teve sobre as pessoas.
R.J.K.
M.T.
Sumário
C apítulo 1
I n t r o d u ç ã o ...........................................................................................................
Princípios Filosóficos do Behaviorism o R a d ic a l............................................
A natureza contextual do conhecimento e da realidade...........................
U m a visão não-mentalista do comportamento: o enfoque nas variáveis
am bientais que controlam o com portam ento.....................................
O interesse está centrado no com portam ento verbal controlado por
eventos diretam ente o b se rv a d o s........................................................
1
3
3
5
6
8
Suportes Teóricos da FAP ................................................................................
R eforçam ento..............................................................................................
Especificação de comportamento clinicam ente relevante...................
Preparando a g en eralização.......................................................................
9
15
17
C apítulo 2
A plicação C lín ica d a P sic o te ra p ia A n alítica F u n c io n a l...........................
19
Problemas do cliente e comportamentos clinicamente relevantes..................
CRB 1: Problem as do cliente que ocorrem na s e ssã o ..........................
CRB2: Progressos do cliente que ocorrem na sessão...........................
C RB 3: Interpretações do comportamento segundo o cliente.................
A valiação inicial ......y ............................................................................ .
19
20
21
25
26
Técnica Terapêutica: A s Cinco R e g r a s .........................................................
R egra 1: Prestar atenção aos C R B s ..........................................................
R egra 2 : Evocar C R B s ..........................................................................
27
27
30
xvi
Sumário
Regra 3: R eforçar C R B 2s........................................................................
Regra 4: Observe os efeitos potencialm ente reforçadores do compor­
tamento do terapeuta em relação aos CRBs do cliente.......................
Regra 5: Forneça interpretações de variáveis que afetam o compor­
tamento do cliente.................................................................................
32
40
Exem plo de Caso Clínico ...............................................................................
47
Capítulo 3
S uplem entação: A um en tan do a cap acid ad e do te ra p e u ta p a ra
id en tificar com portam entos clinicam ente relev an tes ..........................
51
Classificação de Comportamento V erb al.......................................................
O Sistema da FAP de Classificação das Respostas do C liente..............
Classificação e Observação de Comportamento Clinicamente Relevante
Exemplos de Classificação de Respostas do C lie n te ..........................
51
54
65
67
Situações Terapêuticas que Freqüentem ente Evocam Comportamentos
Clinicam ente Relevantes ..................................................................................
69
Capítulo 4
O Papel de Em oções e L em branças na M u d an ça do C om portam ento..,,
75
Em oções ...............................................................................................................
Aprendendo os Significados dos Sentim entos.....................................
Sentimentos como Causas de C om portam ento....................................
Expressando se n tim e n to s........................................................................
Evitando sentimentos ...............................................................................
Grau de contato com variáveis de c o n tro le ...........................................
75
78
80
82
84
85
Lem branças .........................................................................................................
89
Implicações C lín ic a s ..........................................................................................
Ofereça um a Racional Comportamental para Entrar em Contato com
S e n tim en to s...........................................................................................
Aumente o Controle Privado de S entim en to s.....................................
A um ente a Expressão de Sentim entos pelo T erap eu ta.......................
M elhore o Contato do Cliente com Variáveis de C o n tro le .................
92
41
93
94
96
97
Cjiso Ilustrativo .................................................................................................. 103
Sumário
Capítulo 5
Cogmições e C r e n ç a s ......................................................................................... 107
Terapia C o g n itiv a................................................................................................. 108
Problemas com a terapia cognitiva e o paradigm a^45C ....................109
Formulação R evisada da Terapia C o g n itiv a ....................................
111
A Revisão FAP do A —> B -> C ......................................................................
Comportamento M odelado por C ontingências.......................................
Tatos e Mandos: Dois Tipos de Comportamento V erbal........................
Comportamento Governado Por R e g ra s ...............................................
Estr uturas Cognitivas e Comportamento Modelado por Contingências
114
114
115
122
125
Implicações Clínicas da Visão da FAP Sobre as C ren ças..............................
Focalizando o pensam ento aqui e agora ...............................................
Levando em consideração o papel variável que os pensamentos podem
e x e r c e r .....................................................................................................
Ofereça explicações relevantes sobre os problemas do clie n te ..........
U se com cuidado a m anipulação cognitiva d ire ta ...............................
126
127
128
132
133
Ilustração de Caso .............................................................................................
^
Capítulo 6
O s e lf ...................................................................................................................
137
Definições Com uns do S e l f................................................................................. 138
Uma Formulação Behaviorista do S e l f .............................................................
C onceitos Básicos .....................................................................................
A emergência do “Eu” como um a pequena unidade funcional...............
Q ualidades do “E u” .................................................................................
13 9
141
14 5
153
Desenvolvim ento M al-adaptativo da Experiência do S e lf............................. 156
Distúrbios m enos graves de S e l f ........................................................... 156
Distúrbios graves do self.......................................................................... 162
Implicações C lín icas........ ................................................................................... 173
Reforçando a fala na ausência de dicas externas específicas............... i 74
Com binar tarefas terapêuticas com 0 nível de controle interno no
repertório do cliente............................................................................. 176
Sum ário
x v iii
Reforçando tantas declarações “eu X’' do cliente quanto possível
182
Capítulo 7
P sicoterapia Analítica Funcional : U m a poníe entre a Psicanálise
e a T erap ia C o m p o rta m e n ta l....................................................................... . 187
A FAP em Contraste com Enfoques Psicodinâm icos....................................
T ra n sfe rê n cia ..............................................................................................
A Aliança T erap êjitica.............................................................................
Relações Objetais .....................................................................................
188
188
196
199
FAP em Contraste com Terapias Atuais do C om portam ento.......................... 202
FAP: Um Raro Nicho entre a Psicanálise e a Terapia Comportamental ..... 205
Capítulo §
Reflexões sobre ética, supervisão, pesquisa e tem as cultu rais................ 209
Temas É tic o s .......................................................................................................
Proceda cuid adosam ente.........................................................................
Evite Exploração Sexual................................ .........................................
Esteja Alerta para Interromper Tratamentos In eficien tes.............
Atente para Valores Opressivos e Preconceituosos.............................
Evite Tirania Em ocional...........................................................................
209
210
211
212
212
213
Supervisão da FAP ........................................................................................... 215
Pesquisa e A v aliação .......................................................................................... 217
Falhas dos M odelos Convencionais de P esq u isa................................... 218
M étodos Alternativos de Coleta de Dados que Influenciam a Prática
C lín ic a ..................................................................................................... 220
Problemas Culturais Decorrentes da Perda de Comunicação .................... 225
C o n c lu s ã o ............................................................................................................. 228
R e fe rê n c ia s .......................................................................................................... 229
ín d ic e ............................................................................................ .......................... 235
1
Introdução
Q uando penso naqueles pacientes que eu vi experim entarem um a grande m udança, eu sei
q u e o fogo estav a na relação te ra p ê u tic a ... H avia luta e m edo, proxim idade, am or e
terror- H avia intim idade e afronta, apreensão e vergonha... era uma jornada significativa,
m ais para o paciente que vinha buscar ajuda mas, de fato, para am bos os participantes
Era um processo que percorria todo o desenrolar da terapia e deixava a am bos, paciente
e terap eu ta, alterad o s pela e x p e r i ê n c i a . A relação terap êutica está no próprio centro
da psicoterapia e é o veículo através do qual a m udança terapêutica acontece (G reben,
1981, p. 4 5 3 -4 5 4 )
Independente da sua orientação teórica, a m aioria dos clínicos experientes teve
clientes m em oráveis, cujas m udanças excederam em muito, e de maneira m ar­
cante, os objetivos form ais da terapia. Para estes clientes, a descrição de Greben
parece capturar um aspecto importante do que foi o processo terapêutico, mesmo
que o tratam ento tenha sido baseado num a teoria bastante diferente da sua
perspectiva psicodinâm ica. Entretanto, o que falta nos escritos de Greben, bem
com o na m aioria dos sistem as terapêuticos que enfocam a relação entre o
terapeuta e o cliente, é um sistema conceituai coerente, com construtos teóricos
bem definidos que conduzam , passo a passo, à form ulação de orientações
precisas para a terapia.
D escreverem os um tratamento que tem um referencial conceituai claro
e preciso e, ainda assim, parece produzir o que Greben descreve. Chamamos
nosso tratam ento de psicoterapia analítica fu n cio n a l (FAP) e talvez possa
causar u m a certa surpresa o fato dele derivar de um a análise funcional
skinneriana do am biente psicoterapêutico típico. Seus fundam entos estão na
obra de B. F. Skinner (por ex., 194.5, 19.53, 1957, 1974). N a seção seguinte,
iretnos rever os princípios filosóficos mais importantes do behaviorismo radical.
1
2
Prefácio
M uito em bora a FAP seja um tipo de terapia comportamental, ela é
bastante diferente das terapias comportamentais tradicionais, tais como o treina­
mento em habilidades sociais, reestruturação cognitiva, dessensibilização e terapia
sexual. A o contrário daquelas, as técnicas utilizadas pela FAP são concordantes
com as expectativas dos clientes, que buscam uma experiência terapêutica
pro-funda, tocante, intensa. A lém disso, ela também se ajusta muito bem a
c lie n te s que n ão o b tiv e ra m u m a m e lh o ra ad eq u ad a co m as te ra p ia s
comportamentais convencionais e àqueles que têm dificuldades em estabelecer
relações de intimidade e/ou têm problem as interpessoais difusos, pervasivos,
tais como os que recpbem diagnósticos tipificados pelos do Eixo II do DSMIII-R (American Psychiatric Association, 1987). Para manejar estes problemas
enraizados, a FAP conduz o terapeuta a um a relação genuína, envolvente,
sensível e cuidadosa com seu cliente, e, ao mesmo tempo, apropria-se com
vantagens das definições claras, lógicas e precisas do behaviorismo radical.
Infelizmente, o behaviorismo radical tem sido largamente incompreendido
e rejeitado. Quando perguntam os aos nossos colegas o que lhes vinha à mente
frente ao termo behaviorismo radical, suas respostas incluíram: (1) “Eu penso
nas caixas de Sldnner. Sinto um a rejeição visceral. Eu acho que ele é simplista
e que nega a realidade de um psiquism o intem o, rico e complexo, que interage
com a realidade externa. P aia mim, o behaviorismo sempre m e pareceu muito
arrogante, ao reduzir o incrível mistério de existir, de ser, “ao que pode ser
observado” e (2) “Você já ouviu aquela dos dois behavioristas radicais que fazi­
am amor apaixonadamente? Depois, um perguntou para o outro: Foi bom para
você! Como foi para m im ?” . Estas reações - que o behaviorism o radical é
simplis-ta, que reduz ações significativas somente ao que pode ser obseivado e
que re-quer consenso público - são representativas dos mal-entendidos que a
m aioria dos clínicos mantêm. Essas distorções são devidas, em parte, à natureza
cripto-gráfica das obras de Skinner, o que lhe dificulta ser interpretado
corretam ente, e tam bém devido ao fato de que o behaviorism o radical é
freqüentemente confun-dido com o behaviorismo metodológico ou convencional,
que é bem m ais conhecido. Em contraste com o behaviorism o radical, o
behaviorism o m etodo-lógico exige consenso público para as suas observações.
Estudando somente o que pode ser publicam ente observado, o behaviorismo
metodológico exclui o estudo direto da consciência, dos sentimentos e dos
pensamentos. Já bem cedo Sldnner (1945) diferenciava a sua abordagem do
resto da psicologia, declarando que a sua “dor de dentes é simplesmente tão
física quanto a m inha m áquina de escrever” (p. 294) e rejeitava o pré-requisito
do consenso público. Para ser m ais precisa, a anedota acima, contada pelos
nossos colegas, deveria com eçar assim : “Você já ouviu aquela dos dóis
behavioristas m etodológicos... ?” .
Introdução
3
P R I N C Í P I O S F I L O S Ó F I C O S D O B E H A V IO R IS M G R A D IC A L
Quando alguém diz “radical” , é com um vir à mente a im agem de um
extrem ista de olhos esbugalhados. O que geralmente não se sabe é que a palavra
radical vem do latim radix, significando raiz. “O verdadeiro radical* é aquele
que tenta chegar à raiz das coisas, que não se distrai pelo superficial, vendo
floresta no lugar de árvores. É bom ser radical. Q ualquer pessoa que pense com
profundidade será um deles” (Peclc, 1987, p. 25). A ssim é que o behaviorism o
radical é um a teoria rica e profunda, que procura chegar às raízes do com por­
tam ento humano. Lapsos verbais, o inconsciente, poesia, espiritualidade e m etá­
fora, são exemplos dos temas que têm sido discutidos pelo behaviorismo radical.
Sentim entos e outras experiências privadas são tam bém considerados e “a
estimulação originada no corpo desempenha importante papel no comportamento”
(Skirmer, 1974, p. 241). M uito em bora seja difícil condensar os vários volumes
da obra de Skinner num breve resumo do behaviorism o radical, o texto que se
segue é um a tentativa de descrever os seus princípios filosóficos básicos.
A n a tu re z a con tex tu ai do conhecim ento e d a re a lid a d e
Skinner rejeita a idéia de que, conhecendo-se algo sobre um a coisa, a
expressão deste nosso conhecim ento consista num a declaração sobre o quê
aquele objeto do conhecimento é; a idéia de que esta coisa possa ter, de alguma
foim a, um a identidade perm anente, como um ente real da natureza. Podemos
atribuir' o status de “coisa” a eventos principalmente porque estamos habituados
a falar sobre o m undo como sendo composto de objetos, que sentimos possuir
em um a constância ou estabilidade próprias. N a verdade, a m eta original da
ciência, qual seja a descoberta de verdades objetivas, tem se mostrado cada
vez m ais inalcançável. N o seu núcleo, ciência é ou o com portam ento dos
cientistas, ou os artefatos dessas atividades, e o com portam ento científico, por
sua vez, é presum idarnente controlado pelo m esm o tipo de variáveis que
governam quaisquer outros aspectos do com portam ento hum ano complexo.
D esta forma, os cientistas são, em si mesm os, não m ais do que organism os que
se com portam e as obser-vações que produzem não podem ser separadas dos
interesses e atividades do observador.
E sta posição antiontológica de Skinner é sim ilar ao ponto de vista
construtivista ou kantiano (Efran, Lulcens & Lukens, 1988). N o século XV III o
filósofo Im manuel Kant, um dos pilares da tradição intelectual ocidental, propôs
4
C apítulo 1
que o conhecimento é a invenção de um organismo ativo, interagindo com um
ambiente, Em contraste. John Locke, fundador do empirismo britânico, via o
conhecimento como o resultado do mundo externo im prim ir uma cópia dele
mesmo numa mente inicialmente “em branco”. Decorre daí que Locke considera
as imagens mentais como sendo basicamente “representações” ou “descobertas”
de algo fora do organismo, enquanto Kant assevera que as imagens mentais
são inteiramente criações ou “invenções” do organismo, originadas como um
subproduto do seu percurso através da vida. Os construtivistas reconhecem o
papel ativo que elas desempenham na criação de um a visão do mundo e na
interpretação das suas, observações em termos daquela visão.
Traduzindo essas posições em termos de prática clínica, uma empreitada
objetivista, como a psicanálise clássica, é construída em torno da crença de que
a verdade objetiva pode ser descoberta e, quando adequadamente revelada,
conduziria a uma saúde mental melhorada. Por outro lado, a crença constrativista
é que uma boa intervenção gera as suas próprias verdades. Terapeutas objetivistas
querem saber o que realmente aconteceu 110 passado. Terapeutas construtivistas
estão mais interessados na “história”, como um a chave para a narrativa que
está se desdobrando e que dará aos eventos contemporâneos 0 seu significado.
Ou seja, a história e o meio ambiente imediato daquele que percebe, influenciam
a percepção da experiência original e da sua recordação. As lembranças reais e
os seus significados podem, assim, m anter pouca semelhança com os eventos e
os seus significados no passado. Muito em bora um a verdade objetiva sobre 0
passado possa ser impossível de ser descoberta, 0 próprio processo de rememorar
e descobrir significados é considerado como sendo um a intervenção que levará
à melhora do cliente. Por exemplo, se um a cliente relata um sonho sobre incesto
e em seguida põe em dúvida a sua veracidade, a ênfase não estaria em se o
incesto ocorreu ou não, mas sim, preferencialmente, nas verdades inerentes ao
sonho, nas condições que ela experimentou em sua vida que poderiam conduzir
a tal sonho. Assim, se for efetiva em termos de benefício terapêutico ou de
progressos na terapia, a intervenção terapêutica que envolve a recuperação de
mem órias do passado gera as suas próprias verdades.
N a tradição construtivista, 0 behaviorismo radical enfatiza 0 contexto e
o significado. Tire algo do seu contexto e ele perderá 0 seu significado. Ponha
este algo em um novo contexto e ele significará outra coisa. Esta é uma das
razões pelas quais H ayes (1987) prefere o term o contextualism o para 0
behaviorismo radical. Problemas, m entais ou de qualquer outra natureza, não
existem isoladamente. Eles são imputações de significado que se formam dentro
Introdução
5
de uma determ inada tradição e têm significado somente dentro desta tradição.
A té m esm o experiências que as pessoas consideram puram ente físicas são, na
verdade, m odeladas pela linguagem e pelas experiências prévias. A dor, por
exem plo, não é simplesmente o disparo de term inações nervosas; é em parte
sensação, em parte ideação tem erosa: um revestim ento de interpretações
envolvendo sensações (Efran eta l., 1988).
M as no m ais das v e z e s, e ain d a q u e a p o siç ão c o n tex tu alista
(construtivista) possa ser intelectualm ente atrativa, é difícil trazer estas idéias
para a nossa prática de vida em geral e é particularm ente difícil trazê-las para
as práticas terapêuticas. É dizer que psicoterapeutas (behavioristas radicais
incluídos) podem aceitar o contextualismo em nível intelectual mas não fazem o
m esm o em nível emocional. Como colocado p o r Furm an e A hola (1988):
Q uando discutimos filosofia com os nossos colegas, talvez possam os concordar prontamente
em que não existe uma única maneira de ver as coisas. M as quando isso toca as nossas próprias
crenças sobre clientes específicos, tendem os a nos apegar com tenacidade às nossas próprias
verdades. Esquecem o-nos de que idéias são fabricadas pelos observadores e, finalmente,
convencem os a nós mesm os de que, de algum modo, elas nos oferecem um diagrama da
realidade... P o r que pensam os que sabem os quando, na verdade, sim plesm ente imaginamos,
construímos, pensamos ou acreditamos? (p. 30).
U m a visão n ão -m en talista do c o m p o rta m e n to : o enfoque nas variáveis
am b ien tais que controlam o co m p o rtam en to
O b e h a v io rism o ra d ic a l ex p lica a ação h u m an a em term os de
com portam ento ao invés de entidades ou objetos dentro do cérebro. Assim, ao
invés de “m em ória” e “pensamento”, a análise baseia-se em “lembrando” e “pen­
sando” . O com portam ento de introduzir um a m oeda num a m áquina automática
de venda de doces é visto como com portam ento, e não como um mero sinal que
indica a presença de alguma entidade fora do com portamento em si mesmo, tais
com o im pulso, desejo, expectativa, atitude ou um a desorganização das funções
egóicas. U m a explicação adequada estaria centrada não em entidades mentais,
mas naquelas variáveis que afetam o com portamento, tal como o número de ho­
ras sem alimentar-se. No m entalism o, processos psicológicos internos, como
“força de vontade” e “medo do fracasso”, adquirem poderes homunculares para
causar a ocorrência de outros eventos, esses m ais comportamentais. Explicações
do com portam ento serão incompletas se não envolverem a busca, tão retroativa
6
Capítulo 1
quanto possível, de antecedentes observáveis do com portam ento presentes no
meio-ambiente. M uitas das “explicações” psicológicas m ais difundidas pouco
mais fazem do que especificar algum processo intem o como sendo a causa de
um aspecto particular do comportamento. N este caso, é um questionamento
inteiramente razoável pedirmos explicações sobre o quê faz esse processo intemo
agir como ele age.
É importante notar que Skinner faz objeções a coisas que sejam mentais,
não a coisas que sejam privadas. Entretanto, aos eventos privados Skinner não
atribui qualquer outro status distintivo que não seja o da sua privacidade. Eles
provêm do mesm o m aterial dos com portam entos públicos e estão sujeitos aos
mesmos estímulos discriminativos e reforçadores que afetam todos os compor­
tamentos. Assim sendo, na visão de Skinner a resposta privada de um cliente
pode ter tanto (ou tão pouco) efeito causal no seu com portam ento subseqüente
como poderia ter um a resposta pública.
A ssim é que, ao procurar explicações para o com portam ento, os
behavioristas radicais percebem a si mesmos como estando, essencialmente,
engajados num a busca por “variáveis de controle”. Eventos são considerados
como variáveis de controle quando eles são percebidos como estando, de alguma
forma, relacionados ao comportamento. O com portamento verbal que descreve
um a relação entre um comportamento e variáveis de controle é chamado de
declaração de uma relação funcional e a tentativa sistem ática de descrever
relações funcionais é cham ada de análise fu n cional do comportamento.
O interesse está cen trad o no co m p o rtam en to v erb al co ntrolado p o r eventos
d iretam en te observados
Todo comportamento verbal, não importa quão privado pareça ser o
seu conteúdo, tem as suas origens no am biente. E m bora os fenôm enos
relacionados ao funcionam ento verbal humano possam variar do mais intima­
mente pessoal ao mais publicamente social, toda linguagem que faça sentido
tem a sua forma eficaz m odelada pela ação da comunidade verbal. Desta forma,
quando um a falante diz que ela vê um a imagem dentro da sua mente, o que está
sendo dito precisa ter-lhe sido ensinado, na sua infância, por outros que não po­
deriam ver dentro da sua mente. Assim, para o processo de ensino os “professores”
precisariam , necessariamente, dispor de eventos diretam ente observáveis (ver
Capítulos 4 e 6 ).
Introdução
7
Que fatores estão envolvidos em levar 0 falante a falar 0 que ele ou ela
faz? Conhecer de maneira completa 0 que leva a pessoa a falar alguma coisa é
entender o significado do que foi dito no seu sentido mais profundo (Day, 1969).
Por exem plo, para entender o que um a pessoa quer dizer quando ela fala que
acabou de ter um a experiência de estai' fora do corpo, procuraríam os por suas
causas. Prim eiram ente, desejaríamos saber sobre a estimulação que foi experi­
m entada no corpo. A seguir, gostaríamos de saber porque um estado corporal
particular foi experim entado como fora do corpo. Desta forma, procuraríamos
causas ambientais na história passada daquela pessoa, incluindo as circunstâncias
que ela encontrou enquanto crescia e que resultaram nela falar “corpo”, “fora
do”, “acabo de ter” e “Eu” (uma descrição de algumas experiências que resultam
em “E u” está apresentada no Capítulo 6). Tão logo saibamos de todos estes
fatores, entenderemos profundamente 0 significado do que ela quis dizer.
A observação direta é altamente valorizada como um método de reunir
dados relevantes. Entretanto, é im portante notar que o que é observado não
necessita ser público. Skinner tem um a posição crítica no que diz respeito à
filosofia da “verdade por consenso”, um a perspectiva freqüentem ente adotada
porbehavioristas convencionais os quais sustentam atese de que 0 conhecimento
científico necessita ser de natureza essencialmente pública. De fato, na maioria
das vezes é mais fácil considerar a observação como algo privado, porque somente
um a pessoa pode participar de um ato singular de observação. Mas o interesse
não está restrito somente aos eventos que, em princípio, são considerados como
sendo observáveis por um a outra pessoa. Os behavioristas radicais sentem-se
livres para observar ou m esmo responder às suas próprias reações a um a sonata
de Beethoven, assim como eles estão livres para observar a reação de qualquer
outra pessoa (Day, 1969). U m a vez que a observação do com portam ento tenha
ocorrido, os observadores são encorajados a falarem interpretativam ente sobre
0 que foi observado, reconhecendo que a interpretação particular que for feita
por eles será um a função da sua própria história pessoal. Simplesmente, eles
têm a esperança de que 0 quê eles vêem, venha a exercer uma crescente influência
no que eles dizem.
A influência ampliada do mundo naquilo que é dito é tam bém entendida
como um contato ampliado com 0 mundo. O contato é altamente desejável para
o cientista e pode ser visto como o núcleo da ciência. U m contato ampliado é
tam bém desejável para a m aioria dos clientes que com parecem à psicoterapia.
Por exem plo, clientes que não expressam em oções (ver Capítulo 4), podem
tam bém ser descritos como pessoas que estão evitando contato com situações
que eliciam em oções e por isso poderiam ter dificuldades em relações íntimas.
C apítulo 1
Os princípios filosóficos vistos acima - que o conhecimento é contextuai,
que o comportamento é compreendido de maneira não-mentalista e que mesmo o
comportamento verbal mais privado tem as suas origens no ambiente - fornecem a
linguagem e o conceito de natureza humana que pretendem tomai' clara a inte­
ração entre o comportamento de um indivíduo e o ambiente natural. Conceitos
behavioristas radicais têm sido usados tanto para explicar uma ampla gama de
práticas terapêuticas, como a psicanálise e a dessensibilização, como também para
explicar experiências humanas como o sentimento, a apreensão, o self e a raiva.
Uma outra aplicação dos conceitos sldnnerianos, denominada análise
experimental do comportamento, é um a abordagem mais estreita e que utiliza
analogias com procedimentos de condicionamento operante, desenvolvidos em
laboratórios, para solucionar problem as clínicos da vida cotidiana. Usamos o
termo ‘analogias’ porque existem diferenças significativas entre a aplicação clí­
nica e o trabalho de laboratório (com o discutiremos mais tarde), diferenças
essas que têm importantes im plicações para a psicoterapia. N a seção seguinte,
estaremos desenvolvendo os nossos argumentos sobre como os fundamentos da
análise experimental do com portam ento compõem o suporte teórico da FAP.
S U P O R T E S T E Ó R IC O S D A FA P
O interesse da análise experimental do comportamento está centrado no
reforçamento, na especificação dos com portamentos clinicamente relevantes e
na generalização (Reese, 1966; Kazdin, 1975; Lutzker & M artin, 1981). Estes
procedimentos têm se m ostrado extrem am ente poderosos no tratamento de
pacientes institucionais, estudantes em sala de aula e crianças m uito jovens ou
severamente perturbadas, populações para as quais o terapeuta pode exercer
um grande controle sobre o arranjo am biental cotidiano. Com as exceções de
Hayes (1987) e Kohlenberg e Tsai (1987), o behaviorismo radical e a análise
experimental do com portam ento têm sido negligenciadas como um a fonte de
procedimentos para o tratamento de adultos em consultórios psicológicos. Esta
desatenção ao behaviorism o radical com o fonte de idéias para a psicoterapia de
adultos é -um tanto m isteriosa para nós. Conforme já fizemos notar, a teoria é
extensiva e engloba muitos dos conceitos relevantes para o psicoterapeuta. Além
disso, esta concepção teórica tem estado disponível já há um bom tempo. Muitas
In tro d u ção
9
das idéias relevantes para a psicoterapia foram publicadas nos anos 50 (Skinner,
195.3, 1957). H á tam bém m uitos profissionais, analistas experim entais do
com portam ento, que estão familiarizados com estes princípios teóricos e que
estão igualm ente interessados no trabalho clínico. É bem possível que o próprio
sucesso da análise experim ental do comportamento em ambientes controlados
(por ex,, hospitais, escolas) tenha im pedido a sua aplicação ao am biente
psicoíerápico, bem menos controlado. O que estamos sugerindo é que os analistas
experimentais do com portam ento foram tão bem sucedidos com um a aplicação
lim itada da teoria que não exam inaram as implicações bem m ais extensas do
behaviorism o radical, relevantes para a psicoterapia de adultos.
U m obstáculo adicional às aplicações do behaviorismo radical vem das
d ific u ld a d e s na tra n sp o siç ã o dos m éto d o s da an álise e x p erim en tal do
com portam ento para a situação psicoterapêutica. Como algumas das restrições
que a situação de tratam ento em consultório de pacientes adultos estabelece
para esta transposição, temos: o contato terapeuta/cliente lim itado a um a ou
mais horas de terapia por semana, o fato do terapeuta não ter acesso ao compor­
tamento do cliente fora do atendimento e a falta de controle sobre as contingências
fora da sessão. A FAP tem a sua base na investigação de como o reforçamento,
a especificação de com portam entos clinicam ente relevantes e a generalização
podem ser obtidos dentro das limitações de um a situação típica de tratamento
em consultório.
R eforçam ento
A m odelagem direta e o fortalecimento de repertórios comportamentais
mais adaptativos através do reforçamento são centrais no tratam ento analíticocomportamental. Usamos o termo reforçamento no seu sentido técnico, genérico,
referindo-se a todas as conseqüências ou contingências que afetam (aumentam
ou dim inuem ) a força do comportamento. A definição de reforçam ento é fun­
cional, ou seja, algo pode ser definido com o um reforçador se, depois da sua
apresentação, há o efeito de aumentar ou dim inuir a força do comportamento
que o precedeu.
Para alguns leitores esta definição pode ser insatisfatória, de vez que
ela não identifica reforçadores específicos com o sorvete, sexo ou confeitos de
chocolate. O reforçam ento não pode ser definido desta form a porque ele é um
processo: um objeto funciona como um reforçador som ente no contexto de um
10
Capítulo 1
dado processo e não pode ser identificado independentemente dele. A inda que
um sorvete possa reforçar o comportamento de um a pessoa, poderá não ter
qualquer efeito sobre o com portam ento de uma outra e, portanto, não seria um
reforçador para o comportamento. Além disso, o reforçamento pode atuar sobre
algo que não gostamos. Por exemplo, um dentista que esteja presente no horário
combinado para o nosso atendimento, reforça nosso comportamento de marcar
horários para outros atendimentos, mesmo que o tratamento dentário seja, em si
m esmo, um a experiência desagradável.
Mais ainda: é importante notar que o reforçamento não é um processo
consciente. M uito 'do nosso comportamento foi modelado por processos de
reforçamento antes mesmo que aprendêssemos a falar. Quando o reforçamento
ocorre, ocorre tam bém um a m udança física no nosso cérebro, da qual não nos
damos conta. Ainda que possam os experimentar um a sensação de prazer ou
uma inclinação para agir desta ou daquela maneira, nós não percebemos o
fortalecimento do nosso comportamento. Por exemplo, se um moço diz “Amo
você” para a sua nam orada e ela sorri calorosamente e diz “E u tam bém amo
você”, ele poderá sentir um a sensação de prazer em seu coipo e pensar “Isto é
maravilhoso!”. Mas, neste exato mom ento, o prazer independe do processo de
fortalecimento. O pensamento “isto é maravilhoso!” foi o resultado da sensação
de prazer, no sentido de que ele estava descrevendo os seus sentimentos para ele
mesmo. Seu comportamento foi fortalecido e também ocorreram aqueles senti­
mentos e pensamentos prazeirosos. D e maneira alguma a consciência dos pensa­
mentos e sentimentos que acompanharam o processo de reforçamento são neces­
sários para que o comportamento seja fortalecido.
D esd e o in íc io d o s te m p o s, so m e n te a q u e la s c ria tu ra s cujo
comportamento fosse fortalecido pelas suas conseqüências puderam adaptar-se
a um ambiente em constante m udança e assim sobreviverem. D esta forma, o
processo de reforçamento é o resultado da evolução. Conforme discutiremos
m ais adiante com maiores detalhes, é um processo comportamental básico que
conduz à consciência, ao pensamento, ao self e à essência da experiência humana.
O m om ento e o lugar do reforçam ento
Uma das características bem conhecidas do reforçam ento é que quanto
mais próximo das suas conseqüências (no tempo e no espaço) um comportamento
estiver, maiores serão os efeitos deste processo. Q ualquer um que já tenha
Introdução
11
dispensado pelotas de comida a um rato numa caixa de Skinner, pôde observar
os efeitos deletérios que o atraso do reforçador pode ter no comportamento do
animal. Todavia, o processo de modelagem é eficaz, se a pressão na barra e a
pelota de comida estiverem bem próximas um a da outra, no tempo. De maneira
semelhante, é fácil para o terapeuta reforçar, e assim fortalecer, as habilidades
de relaxamento do cliente enquanto elas ocorrem no consultório. Ou seja, quando
solicitado, o cliente prontam ente relaxará 110 consultório, porque o terapeuta
está presente e pode reforçar diretamente o comportamento. Por outro lado, é
amiúde um problem a fazer com que os clientes cumpram um program a de
relaxamento em casa, entre os atendimentos, pois o terapeuta só pode reforçar 0
com portam ento quando os clientes comparecem à consulta.
Para 0 paciente de consultório, isto im plica em que os efeitos do
tratam ento serão m ais significativos se os com portam entos-problem a e as
melhoras ocorrerem durante a sessão, onde estes estarão, no tempo e no espaço,
o m ais perto possível do reforçamento. Esta é a razão pela qual a FAP é um
tratamento para problemas cotidianos que também ocorrem durante 0 atendimento
terapêutico. Exem plos de tais problemas incluem as dificuldades nas relações
de intimidade, incluindo os medos do abandono, da rejeição e de ser “engolido”
na relação; dificuldades na expressão de sentimentos; afetos inapropriados,
hostilidade, hipersensibilidade a críticas, ansiedade social e comportamentos
obsessivos-compulsivos. As palavras acima não se referem a estados mentais
ou internos. São utilizadas aqui como termos descritivos de uso geral, para dar
ao leitor uma idéia da gam a de comportamentos observáveis do cliente que, sob
as condições apropriadas, podem ser evocados e modificados durante a terapia.
Um a outra característica importante da FAP - e que é de certa maneira
problem ática - é que m elhoras no comportamento do cliente que ocorrem no
consultório, deveriam ser reforçadas im ediatam ente. O reforçam ento de
com portam entos durante a sessão é problemático porque a própria tentativa de
aplicar 0 reforçam ento de m aneira im ediata e contingente pode tam bém ,
inadvertidamente, tom á-lo ineficaz e até mesmo contraproducente.
O problem a em aplicar 0 reforçamento durante o tratamento nasce da
imitação dos m étodos da análise experim ental do com portam ento. Com 0
propósito de atingir a m eta de reforçar a resposta o mais prontam ente possível,
os analistas experim entais do com portamento, quando clinicando, usaram
procedimentos análogos aos usados, em laboratório, em experimentos operantes
com anim ais. A queles clínicos adotaram a regra “D ê a pelota de comida
imediatamente após a resposta” e fizeram uma transposição literal para a situação
12
C apítulo 1
clínica: “Dê o confeito de chocolate im ediatam ente depois que a criança
perm anecer na cadeira por dois m inutos.”. Entretanto, o propósito dos expe­
rimentos de laboratório era o de estudar os parâmetros do reforçamento e não o
de beneficiar o sujeito ou obter uma generalização do comportamento para a
sua vida cotidiana.
Ferster (1967, 1972b,c) discutiu extensamente as implicações clínicas
da utilização do reforçamento arbitrário, tal como o empregado em montagens
de laboratório, contrastando-o com o tipo de reforçamento que ocorre no ambiente
natural. Antecipando os riscos do uso do reforçamento no tratamento de pacientes
de consultório, Ferster'avisava que muitas das recompensas utilizadas pelos
analistas experimentais do comportamento - alimento, objetos simbólicos e
elogios -p o d e ria m ser arbitrárias. Ele via isso como um sério problem a clínico
de vez que, comportamentos reforçados arbitrariamente somente ocorreriam
quando o controlador estivesse presente ou se o cliente estivesse interessado no
tipo específico de recompensa que estivesse sendo oferecida, Como exemplo de
um reforçamento arbitrário que foi distorcido, ele citava o caso de um autista
que apresentava mutismo eletivo e, tratado pela análise do comportamento, parava
de falar quando o alimento não estava presente.
Reforçamento Natural versus Arbitrário
Devido às deficiências do reforçam ento arbitrário, a FAP orienta-se
para prover reforçamento natural às m elhoras do cliente que ocorrem durante a
sessão. Nossas sugestões sobre como fazer isso se encontram no Capítulo 2. As
comparações abaixo ajudarão a destacar a diferença entre os dois tipos de
reforçamento. Reforçadores arbitrários e naturais diferem em quatro dimensões
básicas, como expomos a seguir:
1.
Quão ampla ou estreita é a classe de respostas? O reforçamento
arbitrário especifica um desempenho estreito enquanto o reforçamento natural é
contingente a uma ampla classe de respostas. Por exemplo, um professor que
esteja usando reforçamento arbitrário para ensinar um menino disléxico a ler,
está sujeito a estar sendo limitado e contraproducente em sua prática. Como é o
caso de qualquer pessoa usando reforçam ento arbitrário com propósitos
educacionais, este professor precisa decidir quais os comportamentos que serão
reforçados e quais os punidos. Ele decide punir o m enino por ler um a revista em
quadrinhos ao invés do livro texto. Este professor está mostrando um a das defi-
In tro d u ção
13
ciências do uso de reforçamento arbitrário, ou seja, ele está pedindo uma resposta
estreita - ler o livro-texto - e perdendo de vista a classe de respostas muito mais
ampla de ler, em geral. O reforçamento natural inerente à leitura (tais como os
proporcionados pelas informações, pelo divertimento) reforça uma ampla classe
de respostas, que inclui ler revistas em quadrinhos, resultados de corridas e
tantos outros. Assim, um dos riscos no uso de reforçamento arbitrário é que ele
pode inadvertidam ente interferir com o reforçam ento natural e com a aquisição
do comportamento-alvo.
2 . O com portam ento desejado existe no repertório da pessoal 0
reforçam ento natural inicia com um desempenho já existente no repertório da
pessoa, enquanto o reforçam ento arbitrário não leva em conta, no mesmo grau
do reforçam ento natural, o repertório de com portamentos existente na pessoa.
Tal é o caso quando um a mãe critica a primeira tentativa de sua filha em costurar
um a peça em curva e não leva em conta o seu nível de habilidade em costear. A
utilização da crítica como reforçamento arbitrário fez com que essa mãe falhasse
em ver que a sua filha estava se saindo bem para o nível das suas habilidades
atuais em costura. Por contraste, o reforçamento natural consistiria na apreciação,
po r essa mãe, de uma peça de costura utilizável que a filha conseguiu fazer em
sua prim eira tentativa, desconsiderando a sua aparência.
3. Quem proporciona o reforçam ento è o prim eiro beneficiado?
Reforçam ento arbitrário produz m udanças de comportamento na pessoa sendo
reforçada que somente beneficiam a pessoa que faz o reforçamento. Nenhum
beneficio precisa ser oferecido à pessoa subm etida ao reforçamento arbitrário.
N a verdade, pessoas são freqüentem ente prejudicadas pelo reforçamento
arbitrário. Adultos que abusam sexualmente de crianças usam reforçadores
arbitrários (ameaças, elogios, abuso físico) para obter aceitação. Muitas vezes
eles reivindicam benefícios para a criança dizendo “que ela quis isso” ou “ela
teve experiências de sexualidade e dessa form a foi beneficiada”. Este argumento
é ridículo; qualquer adulto que usa sexualm ente um a criança não o faz para
beneficiar a ela, a criança. N a verdade, o abuso sexual pode causar uma ampla
variedade de problemas e, especificamente, interfere com o reforçamento natural
do com portam ento sexual que ocorre em relações íntimas consensuais.
4. Para o comportamento que está sendo apresentado, o reforçador
oferecido é típico e com um ente presente no ambiente natural? Uma outra
m aneira de form ular esta m esm a pergunta é: “Para este comportamento em
particular, qual seria o reforçam ento m ais provável no ambiente natural?”.
Reforçadores naturais são partes m ais estáveis e fixas do ambiente natural do
14
Capítulo 1
que os reforçadores arbitrários. Este aspecto do reforçam ento é o m ais
facilmente perceptível, de vez que um observador não necessita da história dos
indivíduos envolvidos numa operação de reforçamento para que possa dizer
quão típico é o reforçam ento que está sendo utilizado. Por exemplo, a maioria
das pessoas concordaria que dar doces ao seu filho para que ele vista o casaco
é arbitrário, ao passo que lhe chamar a atenção por estar sem casaco é natural.
Pagar à sua filha para que pratique no piano é arbitrário ao passo que o fato
dela tocar simplesmente pela música criada é natural. De igual maneira, multar
o seu cliente em alguns centavos por não m anter contato visual é arbitrário,
enquanto que é natural deixar que a sua atenção flutue.
Em resumo, o reforçamento natural é diferente do reforçamento arbitrário
por fortalecer um a ampla classe de respostas, por ter em consideração o nível de
habilidade da pessoa, por beneficiar primariamente a pessoa sendo reforçada ao
invés da pessoa que proporciona o reforço e por ser típico e de ocorrência comum
no ambiente natural. Entretanto, a maior parte das conseqüências não se encaixa
perfeitamente nas categorias associadas tanto ao reforçamento arbitrário quanto
ao natural e, provavelm ente, apresentam dimensões de ambos os tipos.
Em bora nenhum a pesquisa tenha comparado diretamente os reforçamentos arbitrário e natural, dados que fundamentam a nossa posição provieram,
paradoxalm ente, de pesquisas orientadas cognitivãm ente e planejadas para
desacreditar a ênfase behaviorista no reforçamento. A pesquisa concernia aos
efeitos de recompensas externas sobre a motivação intrínseca (estes termos não
são com portam entais mas foram aqueles usados pelos investigadores nãóbehavioristas). Por exemplo, Deci (1971), num estudo típico deste tipo de
pesquisa, pagou a um grupo de sujeitos para encontrarem soluções corretas
para um quebra-cabeças e comparou este grupo a um outro, ao qual foi dado o
m esmo problem a, porém sem qualquer pagamento pelo encontro da solução.
Quando deixados sós por oito minutos, numa situação de “descanso”,'os sujeitos
pagos ocuparam menos tempo manipulando o quebra-cabeças do que os sujeitos
sem pagam ento. Após um a revisão da literatura sobre este tipo de pesquisa,
Levine e Fasnacht (1974) argum entaram que “recom pensas externas” são
arriscadas, por apresentarem pouco poder de permanência (isto é, um a resistência
reduzida à extinção) e interferem com a generalização, “solapando” assim o
próprio com portam ento que elas visavam fortalecer. O peracionalm ente,
“recompensas externas” e “motivação intrínseca” correspondem aos conceitos
de Ferster de reforçam ento arbitrário e natural. Assim, em bora os dados sobre
m otivação intrínseca tenham tido o intento original de dem onstrar deficiências
Introdução
15
na abordagem behaviorista, esses dados podem ser vistos, alternativamente,
como um exem plo no qual o reforçamento arbitrário mostrou efeitos negativos.
E specificação de co m p o rtam en to clinicam ente relevante
A lém do reforçamento, a análise do comportamento é caracterizada por
sua atenção à especificação dos comportamentos de interesse. O termo compor­
tamento clinicamente relevante (CRB) inclui tanto os comportamentos-problema
com o os com portam entos finais desejados. Discutiremos os dois componentes
da especificação de comportamentos clinicamente relevantes - a observação e a
definição comportamental - e examinaremos as implicações disso para a condu­
ção de terapias de pacientes em consultórios.
Obsei-vação
A obseivação é um pré-requisito necessário para a definição com por­
tamental dos CRBs (comportamentos clinicamente relevantes). Os behavioristas
assum em que, se os com portam entos podem ser observados, então eles podem
ser especificados e contados. Obviamente, o comportamento-problema do cliente
não pode ser observado a menos que ele ocorra na presença do terapeuta. Para
atender a este requisito, os analistas do comportamento têm (a) tratado clientes
que estão com seu movim ento restrito, tais como aqueles hospitalizados ou
internados em presídios, ou (b) tratado problem as graves e que se m anifestam
com alta freqüência, com o ecolalia em crianças autistas.
Ainda que seja conveniente usar problemas graves e ambientes restritos
para observar diretam ente o com portamento-problema, qualquer problem a que
possa ser diretamente obseivado é adequado para um a análise do comportamento.
O am biente psicoterapêutico do cliente de consultório atende a este requisito
caso o problem a cotidiano do cliente seja de tal natureza que tam bém ocorra
durante o atendimento. Um exemplo significativo, ainda que trivial, é o de alguém
que procura tratam ento por ter ficado “sem palavras” ao relatar ao seu médico
suas queixas e que realm ente fica “sem palavras” quando está relatando esse
seu problem a ao terapeuta. Fundam entada no pré-requisito da observação, um a
abordagem terapêutica analítico-comportamental para um paciente de consultório
16
C apítulo 1
enfoca aqueles problemas do mundo externo ao consultório que também ocorrem
durante a sessão.
Definindo comportamenialmente os CRBs
Tradicionalm ente, os analistas do com portam ento têm form ulado
descrições comportamentais de comportamentos-alvo que se refiram exclu­
sivamente a;comportámentos observáveis. Este requisito atende ao propósito de
obter-se confiabilidade, m edida por consenso entre os observadores. Os
observadores, os quais devem concordar se um problem a de comportamento
ocorreu ou não, habitualm ente incluem o terapeuta e pelo menos uma outra
pessoa. Entretanto e por conveniência, esta outra pessoa utilizada como obser­
vador costum a ser relativam ente inexperiente, tal com o um estudante de
graduação. Observadores inexperientes podem realizar o trabalho quando os
comportamentos de interesse são simples, tais como completar um problema de
matemática, a ocorrência de um tique facial ou o comportamento de roer unhas.
M as são eles mesmos um problema, quando os comportamentos são algo mais
complexos (por ex., ansiedade e discórdia conjugal). Quando os comportamentosproblem a são mais com plexos, é necessário um treinam ento, antes que os
observadores possam fazer o trabalho. P or outro lado, a quantidade de treina­
m ento que pode ser dada é limitada. Assim, o uso de observadores relativamente
ingênuos tem colocado um lim ite prático com relação à complexidade dos
comportamentos com os quais os analistas do comportamento têm trabalhado.
Por exemplo, estariam excluídos tratamentos que envolvessem comportamentos
finais que não existissem no repertório dos observadores, fato que não pode ser
rem ediado através do treinam ento do observador. Exem plos de tais compor­
tamentos do cliente incluem reações interpessoais mais sutis, como as relacionadas
às relações de intimidade e à aceitação de riscos interpessoais.
N a prática, é quase im possível obter-se a desejada objetividade com
base nas descrições comportamentais típicas que são formuladas para problemas
aplicados (H aw kins & D obes, 1977). N ão obstante, o consenso entre os
observadores é enormemente facilitado se o comportamento que está sendo
observado existe no repertório dos observadores. A inda que certas habilidades
(por ex., lances livres no basquete ou o desempenho físico de um ginasta) possam
ser observadas e avaliadas com confiabilidade por alguém que não possui essas
habilidades, geralmente é difícil obter-se confiabilidade na observação de compor­
Introdução
17
tam entos interpessoais complexos que inexistam no repertório do observador.
Conseqüentem ente, é mais fácil para os terapeutas perceberem e descreverem
comportamentos clinicamente relevantes se o comportamento final desejado fizer
parte do seu próprio repertório. Como exemplo, poderia ser difícil para um
terapeuta que não tenha estabelecido relações de intim idade em* sua vida,
discriminar, no cliente, a presença ou a ausência desses comportamentos.
Por estas razões e para os tipos mais sutis de problemas que a psicoterapia de clientes adultos apresenta, a observação direta e a definição comportamental do problem a e dos comportamentos finais desejados podem ser levadas a
cabo se (a) os com portam entos relacionados ao problem a ocorrem durante a
sessão e desta m aneira podem ser diretamente observados, e se (b) o terapeuta e
os observadores forem cuidadosamente selecionados de forma que eles mesmos
tenham , em seus repertórios, os comportamentos finais desejados para o cliente.
P re p a ra n d o a generalização
A terapia será ineficaz caso o cliente m elhore no am biente terapêutico
mas esses ganhos não se transfiram para a vida cotidiana. Por isso, a genera­
lização tem sido um a preocupação fundam ental para os analistas do compor­
tamento. A m elhor m aneira para preparar a generalização é conduzir a terapia
no mesm o am biente no qual o problema ocorre. Historicamente, os analistas do
comportamento têm conseguido este objetivo através do oferecimento de reforçam ento im ediato em instituições, salas de aula, na residência do cliente ou onde
m ais seja possível conduzir o tratamento no m esm o am biente onde o problem a
ocorreu.
Com o podem os m edir ou determinar se dois ambientes são similares?
U m a análise formal procura descrever e com parar os ambientes em termos das
suas características físicas. As limitações deste tipo de análise são encontradas
quando com param os dois ambientes que são diferentes em alguns aspectos,
m as sem elhantes em outros. Por exemplo, se você conduzir um tratamento para
déficits de atenção num a classe de educação especial, os comportamentos adqui­
ridos generalizar-se-iam para um a classe regular ou para o ambiente doméstico?
Para evitar este problema, a comparação pode ter p or base uma análise funcional.
Os ambientes são então com parados com base no comportamento que eles evo­
cam , ao invés das suas características físicas. Se eles evocarem o mesmo
comportamento, então são funcionalmente similares.
18
Capítulo 1
Em bora análises do com portam ento não sejam tradicionalm ente
conduzidas num ambiente de psicoterapia para adultos, elas poderiam ser, se o
ambiente terapêutico for funcionalmente similar ao ambiente cotidiano do cliente.
Uma similaridade funcional entre estes dois ambientes estará demonstrada se
comportamentos clinicam ente relevantes ocorrerem em ambos os ambientes.
Por exemplo, um hom em cujo problema apresentado é um a hostilidade que se
desenvolve em relações interpessoais próximas, dem onstrará que o ambiente
terapêutico é funcionalm ente similar ao seu cotidiano se ele desenvolver uma
hostilidade em relação ao terapeuta na medida em que uma relação mais próxima
venha a se estabelecer entre eles.
Neste capítulo, lançamos as bases para a psicoterapia analítica funcional,
descrevendo seus pressupostos teóricos e filosóficos. Como esquematizado no
prefácio, os Capítulos 2 e 3 são dedicados às técnicas de manejo clínico e a
estratégias para am pliar as percepções do terapeuta. A seguir, nos Capítulos 4
e 5, revemos os conceitos, o papel e a importância das recordações, das emoções
e da cognição para a m udança do comportamento. No Capítulo 6 , formulamos
um a teoria comportamental do desenvolvimento da noção do self e discutimos
suas implicações clínicas. N o Capítulo 7, comparamos e contrastamos a FAP
com a psicanálise e com outras terapias comportamentais e demonstramos que
a FAP aproveita-se dos m elhores atributos desses dois enfoques. Finalmente,
temas éticos e temas culturais, de supervisão e de pesquisa são examinados no
Capítulo 8 .
Aplicação Clínica da
Psicoterapia Analítica Funcional
i
A aplicação clínica da FAP será discutida em term os de certos tipos de
com portam ento do cliente e do terapeuta, os quais ocorrem ao longo da sessão
de terapia. Os com portam entos do cliente são seus problem as, progressos e
interpretações. Os com portam entos do terapeuta são m étodos terapêuticos, que
incluem evocar, notar, reforçar e interpretar o com portamento do cliente.
P R O B L E M A S D O C L IE N T E E C O M P O R T A M E N T O S
C L IN IC A M E N T E R E L E V A N T E S
Tudo que um terapeuta pode fazer para auxiliar os clientes ocorre durante
a sessão. Para o behaviorista radical, as ações do terapeuta afetam o cliente
através de três funções de estím ulo: 1) discrim inativa, 2) eliciadora e 3)
reforçadora. U m estímulo discrim inativo refere-se às circunstâncias externas
nas quais certos com portam entos foram reforçados e onde, conseqüentem ente,
tom am -se m ais prováveis de ocorrer. A m aior parte de nosso comportamento
está sob controle discriminativo e é usualmente conhecido como comportamento
v o lu n tá r io (c o m p o rta m e n to o p e ra n te ). U m c o m p o rta m e n to e lic ia d o
19
C apítulo 2
20
(comportamento respondente) é produzido de modo reflexo e é costumeiramente
denominado involuntário, A função reforçadora (discutida no Capítulo 1) referese às conseqüências que afetam o comportamento. Cada ação do terapeuta possui
um ou mais destes três efeitos. Por exemplo, uma ação do terapeuta poderia ser
perguntar ao cliente “O que você está sentindo agora?” O efeito discriminativo
afirma que “agora é apropriado você dizer como se sente.” A questão, entretanto,
poderia também ser aversiva para o cliente e, assim, puniria o comportamento
que precedeu a questão do terapeuta; esta é a função reforçadora. A função
eliciadora da pergunta poderia fazer o cliente enrubescer, suar e induzir outros
estados coiporais. Os motivos pelos quais o cliente reage destas formas à pergunta
sobre sentimentos encontram-se em sua história de vida.
Ao assumirmos que (1) o único modo do terapeuta ajudar o cliente é
por meio das funções reforçadoras, discrim inativas e eliciadoras das ações do
terapeuta, e que (2 ) estas funções de estímulo no decorrer da sessão exercerão
seus m aiores efeitos sobre o comportamento do cliente que ocorrer na própria
sessão, então a principal característica de um problem a que poderia ser alvo da
FAP é que ele ocorra durante a sessão. A lém disso, os progressos do cliente
tam bém deverão ocorrer durante a sessão e serem naturalmente reforçados pelos
reforçadores existentes na sessão. O mais importante é que os reforçadores sejam
as ações e reações do terapeuta em relação ao cliente.
Três comportamentos do cliente que podem ocorrer durante a sessão
são de particular relevância e são denom inados comportamentos clinicamente
relevantes (CRB).
C R B 1: P roblem as do cliente que o co rrem n a sessão
CRB ls referem -se aos problem as vigentes do cliente e cuja freqüência
deveria ser reduzida ao longo da terapia. Tipicamente, os C R B ls são esquivas
sob controle de estímulos aversivos. Tal com portam ento pode ser ilustrado por
casos clínicos reais, como os descritos abaixo:
1.
Uma cliente cujo problem a é não ter amigos e que afirma “não saber
conquistá-los” exibe comportamentos como: evitar contato visual, res­
ponder a perguntas falando excessivam ente, de um modo impreciso e
tangencial, tem um a “crise” atrás da outra e exige ser cuidada, fica
A plicação C línica da FAP
21
enfurecida se o terapeuta não Lhe fornece todas as respostas, e freqüen­
temente queixa-se de que o mundo não se importa com ela e lhe reservou
a pior parte.
2.
U m hom em cujo principal problema é evitar relacionamentos amorosos
sempre decide, antecipadamente, sobre o que vai falar na terapia, vigia
o relógio para encerrar a sessão pontualm ente, afirma que só poderá
ter sessões quinzenais em função de lim itações financeiras (embora
sua renda anual seja superior a trinta m il dólares), e cancela a sessão
subseqüente àquela em que fez um a im portante revelação a respeito
de si mesmo.
3.
U m hom em que se descreve com o “erem ita” diz que gostaria de
construir um a relação de intimidade, está há três anos em terapia e
continua periodicam ente a brincar com seu terapeuta afirm ando que
este só se interessa pelo dinheiro do cliente e secretam ente o rejeita.
4.
Uma m ulher cujo padrão é mergulhar em relacionamentos inatingíveis,
apaixona-se pelo terapeuta.
5.
U m a m ulher, que foi abandonada por pessoas que “se cansam ” dela,
inicia temas novos ao final da sessão, freqüentem ente am eaça se matar
e apareceu bêbada na casa do terapeuta no meio da noite.
6.
U m hom em , com ansiedade para falar, “congela” e não consegue se
com unicar com o terapeuta na sessão.
C R B 2: P ro g resso s do cliente q u e o c o rre m n a sessão
D urante os estágios iniciais do tratam ento, estes com portam entos não
são observados ou possuem um a baixa probabilidade de ocorrência nas ocasiões
em que ocorre um a instância real do problem a clínico, o CRB1. P or exemplo,
considere um cliente cujo problem a é se afastar e vivenciar sentimentos de baixa
auto-estim a quando “as pessoas não lhe dão atenção” durante conversas ou
outras situações sociais. Este cliente pode dem onstrar um padrão sim ilar de
com portam entos de afastam ento durante um a consulta na qual'o terapeuta não
presta atenção às suas palavras e interrom pe seu discurso antes que term ine de
falar. Prováveis C RB2s para esta situação incluem um repertório de com por­
tamento asseitivo que dirigiria o terapeuta de volta para o que o cliente estava
22
Capítulo 2
dizendo, ou a discriminação do crescente desinteresse do terapeuta pelo que
estava sendo dito até o momento em que, de fato, interrom peu o cliente.
O caso abaixo ilustra o desenvolvimento dos CRB2s de um a cliente.
Joanne, um a mulher brilhante e sensível, que buscou terapia em função de um a
ansiedade constante, insônia e recorrentes pesadelos de estupro. Em bora ela
suspeitasse ter sido abusada sexualmente pelo pai na infância, ela não guardava,
especificamente, lembranças de tal abuso. Ela melhorou gradualmente no decoirer
dos seis anos de terapia com o segundo autor. Alguns dos CRB2s fortalecidos
em diferentes momeiltos do tratamento foram:
1.Recordar-se e responder com emoção. Durante a infância, Joanne
viveu uma década de indizível terror, envolvendo dor física e emocional provocada
por quem supostamente deveria amá-la, o pai. Recordar e reagir emocionalmente
a estes eventos não foi reforçado. Ao invés disso, era funcional esquecer e reagir
de forma não-emocional, e ela evitou estímulos que poderiam evocar sentimentos
indesejáveis. Sua esquiva era pervasiva, e associada às experiências precoces
de não ser validada, passou a sentir-se desprovida de um senso de s e lf (ver
Capítulo 6). Joanne evitou reviver sentimentos como dor, terror, im potência e
furianão estabelecendo relacionam entos de intimidade. Ela não era aberta, não
confiava nos outros e não se m ostrava vulnerável. U m objetivo terapêutico foi
reduzir a esquiva generalizada e aum entar os CRB2s de lembrar-se e viver a dor
pelo ocoirido. Gradualmente, Joanne foi encorajada a aum entar seu contato
com as recordações vívidas de tortura física e emocional, um processo que foi
terrivelmente penoso.
2.Aprender a dizer o que deseja (ou seja, que suas necessidades são
importantes e merecem atenção). Como ocorre com quase todos os sobreviventes
de abuso sexual, Joanne foi reforçada por dar ao seu pai o que ele desejava, mas
fortemente punida por ter seu próprio desejo. Ela codificou este fato como não
tendo o direito de esperar algo dos outros e aprendeu que “desejar é ruim ” . Eu a
encorajei a desejar- e gradualmente estes CRB2s foram fortalecidos. Deste modo,
tentei reforçar qualquer pedido que eu pudesse, com referência a aspectos como
os téfnas a discutir, a duração e freqüência das sessões e reasseguram entos
verbais. A lém disso, foi explicado a Joanne que suas necessidades eram
importantes e que se eu ou outra pessoa não as preenchessem, ela não deveria se
Aplicação Clínica da FAP
23
considerar “m á” por tèr desejos, necessidades. U m incidente importante ocorreu
por volta do quarto m ês de terapia, quando m e ligou às 23:30 hs., durante um
episódio de flash b a ck. Joan n e estava em pânico e gritava. N a m edida em que
reconheci seu telefonem a com o um CRB2, perguntei-lhe se gostaria de ter um a
sessão naquele momento, o que ela aceitou de imediato. Mais tarde Joanne contoum e ter sido muito difícil aceitar a oferta, embora estivesse apavorada e precisasse,
de fato, estar com igo. Q uando respondi à sua necessidade, o “querer” foi
reforçado. Subseqüentem ente, Joanne aprendeu a me solicitar sessões extras e
conversas pelo telefone quando isto fosse necessário, e seu com portam ento de
expressar suas necessidades e desejos se generalizou para outros relacionamentos.
Com o aumento da força destes CRB2s, ocorreu mudança correspondente quanto
a sentir que “desejar” é aceitável e que suas necessidades são im portantes.
3. Confiar. Com o as reações de seu p ai eram erráticas e im previsíveis,
Joanne foi reforçada por antecipar e tom ar-se hipervigilante com relação a tal
com portam ento da parte de terceiros. Ela contou-m e que levou seis m eses até
que passasse a confiar que eu viria pontualm ente à sessão, conforme com binado
com ela. “E u tinha todos esses m edos - de que você me julgasse louca ou me
ferisse, de que m eus sentim entos lhe assustassem e o fizessem se afastar de
mim. M ais do que m e reconfortai', você me fez examinar o que eu estava sentindo
em relação a você. Eu dizia que não o faria e você me respondia que você
precisava confiar na sua experiência.” Então Joanne tom ou-se m enos vigilante
na busca de um a ação errática de m inha parte, o que, por sua vez, facilitou o
crescim ento de nossa relação. Eu tam bém foi capaz de m anter m inha palavra,
sendo coerente com m eus pontos de vista, e não agi de m aneira im previsível.
4.A ceitar o amor. A pós três anos em terapia comigo (esteve em terapia
por cinco anos, antes de vir m e procurai), Joanne descreveu um problem a da
vida diária de relacionam ento interpessoal. D isse que, bem no fundo, sentia não
saber com o am ar ou com o ser amada. Eu lhe fiz m ais perguntas, buscando
descobrir exatam ente o que ela queria dizer, para elaborar o problem a em termos
com portam entais. Joanne tinha dificuldade para fazê-lo. Tentando saber se isto
ocorria na sessão, perguntei-lhe se conseguiria aceitar m eu am or no m om ento,
ela disse que não, que sentia-se fechada. Em bora fosse um processo privado,
cujas dim ensões fossem difíceis de descrever, julguei que um CRB1 estava
ocorrendo naquele momento.
24
C apítulo 2
T: C o m o é sentir-se fechada?
C: É co m o se m eu c o ração estivesse fechado.
T: Totalmente fechado?
C: T alv ez 5% aberto.
T: Gostaria que você tentasse abrir até 20% e aceitasse meu amor por você.
C: Está aberto uns 25%.
T: Ótimo! Você conseguiria uns 40%?
Este processo foi mantido, e Joanne relatou ser capaz de “abrir seu
coração” cada vez mais. Eis uma descrição do que ela sentiu durante aquela
sessão: “Tomei coragem para me abrir e deixar o amor entrar. Foi uma mudança
de foco em meu corpo e mente. Ainda que estivesse consciente do m eu medo,
terror e sofrimento causados pelas experiências com m eu pai, enfoquei o que
sentia em relação a você, no presente, em oposição aos meus medos. Deixei que
existissem duas verdades simultâneas: que m eu pai abusou de m im , e que você
era um a pessoa com quem eu podia m e sentir segura e amada. Continuei
afirm ando para m im m esm a que queria abrir espaço para receber o amor. Eu
m antenho a tensão nos meus músculos quando me fecho, principalm ente no
m eu peito, como se o m úsculo ficasse congelado. Então a sensação física de me
abrir é o relaxamento do músculo, respirar m ais profundam ente, deixar o ar
entrar em m eu corpo, sentir a respiração. E como a sensação da abertura de
um a lente em m eu coração.”
Não fica claro quais processos comportamentais estão envolvidos na
“ aceitação do am or” , mas a descrição que Joanne faz de sua experiência sugere
algum as possibilidades. N ossa interpretação é que não ser capaz de aceitar o
am or foi um comportamento específico, principalmente privado, o qual a manteve
distante e reduziu a aversividade de relacionar-se com o seu pai. Considerando
alguns aspectos de sua descrição, algumas destas respostas foram provavelmente
evocadas pelo abuso sexual. A despeito da aversividade, ela perm aneceu em
contato com seus sentimentos, e sua esquiva foi extinta, suas respostas físicas
m udaram , e surgiu, em paralelo, um sentimento de “aceitação do am or”.
A plicação C línica cia FAP
25
Esta sessão foi um im portante divisor de águas para Joanne, porque
aprendeu que possuía controle sobre “aceitar, ou não, o amor'.. Isto a auxiliou
no desenvolvimento de relacionamentos amorosos mais íntimos.
C R B 3: In te rp re ta ç õ e s do c o m p o rtam en to segundo o cíiente
O CRB.3 refere-se à fala dos clientes sobre seu próprio comportamento
e o que parece causá-lo, o que inclui “interpretações” e “dar razões” . O melhor
CRB3 envolve a observação e interpretação do próprio com portam ento e dos
estímulos reforçadores, discriminativos e eliciadores associados a ele. Descrever
conexões funcionais pode ajudar a obter reforçam ento na vida diária. M aiores
detalhes poderão ser obtidos no tópico Regra 5.
Os repertórios de CRB3 tam bém incluem descrições de equivalência
funcional que indica semelhanças entre o que ocorre na sessão e na vida diária.
Por exemplo, Esther, um a m ulher com cerca de quarenta anos, há quinze anos
pennanece sem qualquer contato íntimo de natureza sexual. Após seis anos em
FAP com o segundo autor, Esther se envolveu com um hom em que conheceu na
igreja. Seu CRB3 era: “A razão pela qual entrei em u m relacionam ento íntimo
é porque você esteve ao m eu lado. É um a m udança fenom enal. N ão fosse você,
eu não estaria lá. Com você encontrei o prim eiro lugar seguro, onde eu tinha
com o falai- sobre o que sentia, pude descobrir razões pelas quais seria desejável
eu tomar-me sexualizada. Por um certo período de tempo estive mais abertamente
atraída por você, e você aceitou meus sentimentos. Aprendi que seria m elhor eu
preservar m inha totalidade e sentir-me sexual, do que vestir um a armadura e
sentir-me vazia. E eu pude praticar a ser direta com você.” Este tipo de afirmação
pode ajudar a aum entar a probabilidade do cliente transferir seus ganhos na
terapia para a vida diária. Neste caso, o comportamento a ser transferido auxiliou
a aum entar o reforçam ento de estar se relacionando intimamente.
T erap eu tas, p o r vezes, co n fu n d em re p ertó rio s de CRB3 com o
comportamento ao qual eles se referem. Um a cliente afirmar que se afasta sempre
que se tom a dependente de um relacionam ento (CRB3) difere de realm ente se
distanciar durante um a sessão porque está se tom ando dependente do terapeuta
(CRB1). É lamentável que alguns terapeutas focalizem sua atenção sobre estes
repertórios que descrevem um com portam ento problem ático e não conseguem
observar a ocorrência dos com portam entos problem áticos (CRB1) ou dos
progressos (CRB2).
26
Capítulo 2
A valiação inicial
De início, os procedimentos de avaliação da FAP não diferem daqueles
rotineiram ente usados pelos terapeutas em sua prática clínica. O cliente é
solicitado a relatar seus problem as e outras condições de sua vida. Entrevistas,
auto-relatos, material gravado, questionários e registros são utilizados para definir
o problema, gerar hipóteses sobre variáveis de controle e m onitorar o progresso.
U m a vez que oiterapeuta já tenha alguma idéia sobre o problem a e suas
variáveis de controle, inicia-se a avaliação da eventual ocorrência destes
comportamentos na sessão. O terapeuta hipotetiza se um C R B 1 estaria ocorrendo
em um dado momento, ou apresenta um a situação supostamente capaz de evocai'
o CRB1, Estes procedimentos, hipotetizar e evocar, serão discutidos m ais à
frente.
A FAP centraliza sua avaliação em um a questão-chave, que o terapeuta
continuamente pergunta ao cliente durante o tratamento: “Isto está acontecendo
agora?”, “isto” referindo-se ao CRB1. Algum as variações possíveis: “Como
você se sente, agora, a seu próprio respeito?” , “Neste exato m om ento você está
se afastando?”, “O que acabou de acontecer se parece com o que fez você buscar
atendim ento?”, “A dificuldade que você teve de expressar os seus sentimentos
agora é a m esm a que você tem com sua m ãe?”, “O que você sente agora...é
semelhante à ansiedade de se expressar verbalmente que te fez buscar terapia?”
A FAP não possui procedim entos especiais para avaliai' a validade do
auto-relato do cliente em resposta a um a questão de avaliação. Por um lado, a
resposta baseia-se num evento que acabou de ocorrer, talvez dois segundos antes.
Portanto, pode ser menos sujeito às distorções que o tempo e a distância produzem
nos relatos de eventos que ocorreram no passado. Por outro lado, o CRB1
provavelm ente é acompanhado de respostas que interferem na auto-observação
e tam bém pode sofrer viéses pela exigência im plícita na pergunta do terapeuta.
A vantagem de avaliar o comportamento vigente, entretanto, é que o terapeuta
pode observar diretamente o comportamento que o cliente está descrevendo.
Isto perm ite avaliar a confiabilidade inter-observadores, contar e registrar
respostas e constitui-se num a oportunidade de estimar a correlação entre relatos
verbais e o comportamento ao qual ele se refere.
Aplicação Clínica da FAP
27
T É C N IC A T E R A P Ê U T IC A : AS C IN C O R E G R A S
D ado que a p sic o te ra p ia é um p ro cesso in teracional com plexo,
envolvendo com portam ento m ultidetenninado, nossas sugestões "de técnica
psicoterapêutica não pretendem ser completas ou excluir o uso de procedimentos
não descritos aqui. Pelo contrário, outros m étodos de terapia podem ser
com plem entados ou am pliados para auxiliarem terapeutas a obterem vantagem
de oportunidades que de outro m odo poderiam passar despercebidas. Por
exem plo, os m étodos da terapia cognitiva poderiam ser usados junto com a
FAP, pois esta oferece recursos terapêuticos para trabalhar com pensamentos
irracionais ou pressupostos errôneos (ver Capítulo 5).
N ossas técnicas são dispostas sob a form a de regras. Ao contrário do
significado am eaçador ou rígido que é associado ao uso comum do termo,
propom os que as regras sejam com preendidas segundo o conceito skinneriano
de com portamento verbal (Skinner, 1957, p. 339), depois elaborado por Zettle e
Hayes (1982). N este contexto, as regras da FAP são sugestões para o com por­
tamento do terapeuta, as quais resultam em efeitos reforçadores para o terapeuta.
É m ais um a questão de “experim ente, você vai gostar”, do que “é m elhor que
você faça assim ” .
A lém disso, as regras não oferecem aos terapeutas a orientação específica
para cobrir todo m om ento ou situação da sessão. Espera-se que os terapeutas
atuem de form a a depender de sua experiência e de outras teorias. N o início da
terapia, o tem po é geralmente gasto na coleta da história de vida e de descrições
dos problem as clínicos. Segue-se um a etapa exploratória com o cliente para
investigar com o poderia agir para melhorar sua situação. Em qualquer ponto
deste processo, a adoção de regras da FAP poderia m udar o foco do tratamento
para o CRB. O foco pode ser m om entâneo ou dom inar a cena. Deste modo,
nenhum procedim ento é excluído, m as, a qualquer mom ento, seguir regras da
FAP p o d eria cond u zir à identificação e u tilização de um a oportunidade
terapêutica.
R e g ra 1: P r e s ta r aten ção aos CKBs
Esta regra é o coração da FAP. N ossa principal hipótese é que seguir
esta regra m elhora o resultado da terapia. Portanto, quão m aior for a proficiência
do terapeuta em identificar CRBs, m elhores os resultados. Também hipotetiza-
28
C apítulo 2
se que seguir a Regra 1 conduzirá a uma crescente intensidade; ou seja, reações
emocionais mais fortes entre cliente e terapeuta durante a sessão.
Numa sessão de terapia, a conseqüência primária do comportamento
do cliente é a reação do terapeuta. Caso o terapeuta não proceda a uma observação
clara do comportamento do cliente, suas reações poderão ser inconsistentes ou
antiterapêuticas, o que comprom eteria o progresso. Em outras palavras, se o
terapeuta não estiver ciente dos comportamentos clinicamente relevantes do cliente
que ocorrerem durante a sessão, o reforçamento dos progressos no momento de
sua ocorrência será algo do tipo “pegar ou perder”. Ainda que estar consciente
e prestar atenção não garantam que melhoras sejam reforçadas e comportamentos
desfavoráveis sejam extintos ou punidos, isto aumenta a probabilidade de reações
apropriadas do terapeuta.
' O problema contraterapêutico gerado pela ausência de consciência é
fam iliar àqueles que trabalham com crianças com perturbações graves. O
p rim e iro a u to r r e c o rd a -s e q u ão d o lo ro so foi e n s in a r u m a c ria n ç a
institucionalizada a calçar suas próprias meias - ele nunca havia feito isto e até
que ele sistematicamente conseguisse calçá-las foi necessária um a hora de treino
diário, ao longo de várias semanas. Seus pais levaram o garoto para um a visita
à sua casa e observaram-no sair da cama e calçar as meias. Eu mal continha o
júbilo pelo progresso alcançado. Mas assim que ele calçou as meias, seus pais o
advertiram por calçar cada pé de um a cor diferente, im ediatamente arrancaram
um a delas e substituíram-na por outra de cor adequada. O cliente teve um ataque
de birra. Obviamente os pais não conseguiram perceber que calçar as m eias era
um CRB2, membro de um repertório cuja ausência, ou baixa probabilidade de
ocorrência, estava diretamente relacionada ao problema. Se os pais estivessem
presentes às entediantes semanas de treinamento, sua percepção teria mudado e,
provavelmente, seriam capazes de reforçar naturalm ente o comportamento de
calçar as meias. É pena que alguns psicoterapeutas, com freqüência, não estejam
atentos aos comportamentos clinicam ente relevantes que ocorrem na sessão e
tendem a reagir de um m odo não-terapêutico, como os pais da criança autista.
Como se afirmou antes, é mais provável que se reforce apropriadamente
o comportamento clinicamente relevante que ocorre na sessão se o terapeuta
observar atentamente o que se passa. Vamos exam inar o caso de Betty, em
tratamento com o prim eiro autor, com queixa de ansiedade para se expressar
verbalm ente, pânico, falta de assertividade perante figuras de autoridade,
especialmente do sexo m asculino (por exemplo, supervisores e executivos da
empresa onde trabalha). Durante a sessão, ela m e pediu que ligasse para seu
A plicação C línica da FAP
29
clínico e solicitasse, em seu nome, um a nova receita dos tranquilizantes que lhe
foram prescritos e estavam term inando. Acrescentou que tinha muito medo de
fazê-lo. Tive diversas, e fortes, reações negativas encobertas. Primeiro, não
gostei da idéia por geralm ente desencorajar a m edicação, em benefício dos
m étodos com portam entais. Segundo, pensei que renovar a receita estava sob
responsabilidade de Betty, não minha. Terceiro, imaginei que esta seria uma
chance para a cliente praticar, interagindo com seu m édico, o comportamento
assertivo. P or fim , considerei que telefonar para o m édico é um a tarefa
desagradável, que parecia um a interferência sobre m eu horário. Por outro lado,
em função da R egra 1, sabia que o pedido era, definitivam ente, um CRB2, um
com portam ento assertivo na sessão, dirigido a um a figura m asculina de
autoridade, o qual, até então, estava ausente no repertório de Betty. Estando
ciente disso, concordei em ligar para o médico e cum primentei-a pela expressão
direta ao m e fazer seu pedido.
A im p o rtân cia da R egra 1 não pode ser enfatizada em dem asia.
Teoricam ente, seguir a R egra 1 é tudo o que precisam os para o tratam ento ter
sucesso. Ou seja, um terapeuta habilidoso em observar a ocorrência, na sessão,
de instâncias do com portam ento clinicam ente relevante, tenderá a reagir,
naturalm ente, no sentido de reforçar, extingüir e punir o com portam ento em
questão, propiciando o desenvolvim ento de alternativas úteis para a vida diária.
A observação de repertórios como os especificados pela Regra 1 é prática
usual entre terapeutas psicodinâmicos e de ecléticos reconhecidos como bastante
competentes. Isto é esperado porque as ocorrências de CRB que são rotuladas
como transferência servem com o estím ulos discrim inativos importantes na
terapia de orientação psicodinâm ica. Além disso, seria esperado dos terapeutas
com vasta experiência, independente de sua orientação teórica, que m ostrassem
os tipos de com portam ento da R egra 1 em função do fato de que perceber o
CRB (m esm o sob a form a de estar atento a questões transferenciais) facilita o
progresso clínico, o que automaticamente reforça o comportamento do terapeuta
de seguir a R egra 1. Poder-se-ia esperar que este reforçam ento acontecesse sem
que o terapeuta estivesse consciente.
A creditam os que os efeitos da Regra 1 refletem-se nos resultados de um
estudo recente sobre os produtos das interpretações psicanalíticas (Marziali,
1984). N esta pesquisa, as interpretações feitas pelo terapeuta foram categorizadas
do seguinte modo: 1) Interpretações T: mencionavam o comportamento do cliente
que e sta v a o c o rre n d o n a sessão; 2) In te rp re ta çõ es DL: re feria m -se ao
com portam ento que ocorria fora da sessão, na vida diária; 3) Interpretações P:
30
Capítulo 2
referentes ao comportamento do cliente que ocorreu em seu passado. A melhora
do cliente se correlacionou com o núm ero de interpretações T. Na perspectiva
da FAP, a interpretação T significava que o terapeuta estava observando CRBs
(ou seja, emitindo o mesmo comportamento especificado pela Regra 1). Quanto
mais se prestar atenção no CRB, m aior o progresso do cliente. Ao nosso ver, as
melhoras decorreram das contingências fornecidas pelo terapeuta, que tendem a
ocorrer naturalmente, já que ele estava observando o processo. A interpretação,
por si só, poderia ter contribuído para a melhora, mas, segundo a FAP, seria
m enos importante do que a contingência do terapeuta reforçai’naturalm ente as
reações de melhora àpresentadas na sessão.
R e g ra 2 : E v o car C R B s
Em nossa opinião, um relacionam ento terapeuta-cliente ideal evoca
CRB1 e cria condições para o desenvolvim ento do CRB2. O grau em que isto é
alcançado depende, é claro, da natureza dos problemas de vida diária do cliente.
E possível que um terapeuta distante, afastado, no estilo “tela em branco” fosse
a pessoa certa para alguns clientes. U m a dada m edida de passividade poderia
oferecer ao cliente a chance de se desenvolver com independência (ver Capítulo
6 sobre o tratamento de problem as que afetam o “eu”). Em termos genéricos,
entretanto, a maioria dos clientes precisa aprender a desenvolver relações de
intimidade, o que significa que o relacionam ento terapêutico deveria evocar o
comportamento do cliente que evita o estabelecimento da intimidade (CRB1).
Se o cliente tiver habilidades de relacionam ento adequadas para interagir com
um terapeuta passivo e distante, quase nada aprenderia em termos de intimidade.
Por outro lado, um terapeuta ativo e caloroso poderia evocar os problemas do
cliente e abrir espaço para progressos. U m cliente que deseja estabelecer
relacionamentos de proximidade, mas que teme o envolvimento, pode claramente
se beneficiar com um terapeuta que expresse afetividade.
As descrições que clientes fazem sobre o que desejam em um a relação
terapêutica apontam a importância de um relacionamento capaz de evocar certos
comportamentos. Como certo cliente afirmou, “Terapia é construir um a relação
de amor. Se você conseguir superar seus bloqueios com um a certa pessoa,
conseguirá fazê-lo coin outras.” Outro cliente expressou sentimentos similares:
“Se m aus relacionam entos m e bagunçaram , então precisarei de bons relacio­
nam entos que ine ajudem a ficar curado. E esta foi um a boa relação.”
Aplicação Clínica da FAP
31
Peck (1978) opinou sobre o que tom a a psicoterapia efetiva e bem
sucedida:
É hum ano envolver-se e lutar. É desejo do terapeuta servir aos propósitos, de
estim ular o crescimento do cliente - vontade de sustentar-se pelas própria pernas,
de envolver-se realm ente num nível emocional de relacionamento; lutar, de fato,
com o paciente e consigo mesmo. E m suma, o ingrediente essencial de um a
terapia significativa e profunda é o amor. (p. 173)
G reben (1981), que citam os no inicio do livro, pensou de m odo similar
ao de Peclc:
Psicoterapia não é um conjunto de regras elaboradas sobre o que alguém não
deve fazer: regras sobre quando ou o que falar, sobre como tirar férias, lidar com
os momentos perdidos, etc. É algo m uito mais simples que isso. É o encontro de
trabalho entre duas pessoas, trabalho duro e honesto. Poderia afirm ar que é um a
jornada de amor. (p.455)
N ossa interpretação sobre os pontos de vista de Peck e G reben é que o
cliente aprende a se envolver num relacionam ento real. U m terapeuta que am a e
se envolve plenam ente com um cliente cria um ambiente terapêutico que evoca
C R B ls correspondentes.
A lém da postura geral assum ida pelo terapeuta, há outras formas do
am biente ser estruturado para evocar CRBs. Em bora não visem tal objetivo,
técnicas específicas usadas por vários psicoterapeutas podem ser efetivas por
evocarem o CRB. A lguns exem plos são: 1) Associação livre, que pode ser vista
com o a apresentação de um a tarefa não estruturada que impele à introspecção e
evoca o CRB correspondente (ver C apítulo 6); 2) Hipnose, que pode evocar o
CRB relacionado a renunciar ao controle; 3) Lições de casa: pode evocar CRBs
relacionados a contra-controle ou a obediência excessiva; 4) Exercícios de
imaginação: possibilitam evocar CRBs relacionados a estar sob restrição,
em ocionado ou em processo criativo. A reestruturação cognitiva, a técnica das
cadeiras vazias, relatar sonhos e a terapia do grito prim ai certam ente evocam
C R B ls apropriados para alguns clientes. O problem a com estas técnicas é que
o terapeuta que as utiliza pode estar tão sob controle de alter egos, de nossa
sabedoria interior, do conteúdo inconsciente ou da distorção cognitiva, que o
CRB não é identificado ou é visto com o m ero subproduto.
32
C apítulo 2
Outras abordagens incluem: 1) pedir que o cônjuge do clienle venha às
sessões, se o repertório relevante, em termos do problema de relacionamento do
cliente, somente emergir em sua presença (aconselhamento de casal); 2 ) iniciar
a sessão de uma cliente bulímica com a atividade de almoço, caso os CRBs só
ocorram após as refeições; 3) restringir, por um tempo, os comentários que
indicam que o cliente recebe a aceitação ou aprovação do terapeuta, caso o
CRB se refira às dificuldades de se relacionar com quem não é explícito em
term os de aprovação e aceitação.
O último exemplo levanta um problem a que pode ocorrer quando um
terapeuta deliberadam ente altera um aspecto de seu com portam ento para
aum entar as chances de obter o CRB. O terapeuta pode ir longe demais ao
dispor condições para evocar o CRB e sua credibilidade pode sofrer danos devido
à natureza de tal reforçamento arbitrário. Por exemplo; um terapeuta pode simular
raiva para evocar o CRB num cliente cujas dificuldades são provocadas por
pessoas que se enfurecem. Em bora a raiva possa resultar num a interação
terapêutica importante, o cliente pode vir a reconhecer que a raiva não era real.
M as sim um comportamento fingido pelo terapeuta, em benefício do cliente. No
fu tu ro , a expressão de raiva do terap eu ta poderia, justificadam ente, ser
interpretada como um estratagema, o que im pediria, é claro, a evocação do
CRB. A lém disso, o cliente poderá se tornar incapaz de confiar nas expressões
ou verbalizações afetivas do terapeuta. Tal efeito, é desnecessário afirmar,
lim itaria seriamente o progresso.
A situação descrita acim a precisa ser diferenciada de outra na qual o
problem a do cliente é a falta de confiança que interfere em relacionamentos im ­
portantes. Tal desconfiança não se origina de interações com o terapeuta, como
no exemplo citado, mas possui um a longa história e sua ocorrência na relação
terapêutica é coerente com sua história. E m tal caso, duvidar da sinceridade das
reações do terapeuta constitui-se num CRB e deveria ser foco de tratamento.
Seria particularmente lamentável se um terapeuta fortalecesse a falta de confiança
ao conduzir indevidamente um a tentativa de estabelecer condições provocadoras
do CRB. Um a salvaguarda seria o terapeuta explicar ao cliente as razões pelas
quais iria, a partir daquele mom ento, alterar o seu comportamento.
R e g ra 3: R e fo rç a r CRB2s
É difícil por a Regra 3 em prática. Os únicos reforçadores naturais dis­
poníveis, na sessão, para o cliente adulto, são as ações e reações interpessoais
A plicação C línica da FAP
33
entre cliente e terapeuta. Por um lado. o reforçador temporal e fisicamente
contíguo ao com portam ento-alvo é o agente prim ário de m udança na situação
terap êu tica. P or outro lado, os b ehavioristas, cientes da im portância do
reforçam ento, tendem a utilizar procedim entos arbitrários que comprometem a
eficácia da intervenção. Como Ferster (1972a) afirmou, “os reforçadores naturais
são, às vezes, intrigantes porque parecem reforçar tanto o com portam ento e,
ain d a assim , seus e fe ito s p arecem esv a n e c e r quan d o se te n ta u sá-lo s
deliberadam ente.” (p. 10.5).
H á abordagens diretas e indiretas para se prover reforçam ento natural.
A s abordagens diretas consistem no que um terapeuta pode fazer na hora em
que se requer um reforçador; entretanto, apresentam um m aior risco de pro­
duzirem reforçamento arbitrário. As abordagens indiretas propiciam a ocorrência
do reforçam ento natural por m eio da manipulação de outras variáveis, diferentes
do que se faz imediatamente após o comportamento, com risco m enor de parecer
arbitrário.
Abordagens Diretas
É evidente que o terapeuta que planeja dizer “muito bem “ ou demonstra
reações exageradas sem pre que o cliente solicita reforçam ento corre o risco de
ser arbitrário. E sta é, provavelm ente, a razão pela qual W achtel (1977) afirmou
que os com portam entais eram extremam ente exuberantes no uso de elogios, o
que “vulgariza” a relação. Tentativas deliberadas de recom pensar um cliente
adulto, guiadas pela regra “quando o cliente dem onstrar um progresso, faça um
gesto positivo ou faça um elogio”, conduziriam facilmente ao reforçam ento
arbitrário. Portanto, com o regra geral, é recom endável evitar procedim entos
que especifiquem de antemão a reação do terapeuta, o que parece ocorrer sempre
que ‘tiram os um reforçador da cartola’ sem relação algum a com a história
específica de relação terapeuta-cliente. Por exemplo, se fossemos imaginar algo,
com função reforçadora, para dizer a um cliente, viriam à nossa m ente frases
com o “m uito bem ” ou “que ótim o!”. Estas form as específicas de resposta
poderiam facilm ente ser arbitrárias porque foram criadas fora do contexto da
relação cliente-terapeuta no qual ocorreria o reforçamento.
7.
Reforce uma classe ampla de respostas nos clientes. Aos clientes é
m ais naturalm ente reforçador dispor, em seu repertório, de um a classe am pla de
respostas porque ela tende a ser generalizável para outras situações. Examinemos
34
Capítulo 2
o caso-de um homem, obsessivo-com pulsivo, que está sendo encorajado pelo
terapeuta a se soltar mais em seus relacionam entos com família e amigos. Ele
gradualmente começa a chegar atrasado às sessões, tenta obter tempo extra ao
final das mesmas e atrasa o pagamento das consultas. U m a reação estrita do
terapeuta seria chamar o cliente às falas, ao passo que reforçaríamos um a classe
de respostas m ais am pla se considerássem os os com portam entos m enos
responsáveis do cliente como m anifestações de progresso (CRB2).
2.
Compatibilize suas expectativas com os repertórios atuais dos clientes.
Isto significa estar atento ao nível atual de habilidades do cliente em quaisquer
áreas nas quais o cliente esteja tentando im plem entar mudanças (por exemplo,
comunicar-se melhor, descrever sentimentos, controlar impulsos) sem estabelecer
expectativas excessivamente elevadas. O conceito de modelagem pode auxiliar
na identificação dos repertórios vigentes. Por exemplo, o segundo autor atendeu
um a cliente chamada Agnes, diagnosticada como borderline, segundo o DSMHI-R, que apresentava flutuações de humor, era explosiva e verbalmente abusiva.
Freqüentemente ela encerrava a terapia de m odo abrupto, sem aviso prévio nem
provocação aparente. Tinha que enfrentar, em sua vida diária, estes mesmos
problemas, o que a levou a passar por inúmeras e breves tentativas prévias de
terapia, porque os terapeutas a consideravam insuportável. A pós um ano de
terapia, no qual demonstrei rara capacidade de paciência e tolerância para com
este comportamento, Agnes novamente parou, ameaçou com eter suicídio, e
afirmou estar fazendo isto em função de eu não m e importar com ela, demonstrado
pela limitação do m eu tempo reservado para ela. Embora pudesse ver este
comportamento como a gota d ’água que transbordaria o copo, o conceito de
modelagem me auxiliou a discriminar este evento como um CRB2 em potencial,
e que deveria ser reforçado. Agnes estava, de fato, pela primeira vez, descrevendo
variáveis externas como causa de seus rom pantes, antes de sair em disparada
consultório afora. Reforcei sua m elhora dizendo-lhe como eu poderia melhor
preencher suas necessidades, e negociei com ela sobre a duração e freqüência
das nossas sessões. Pela modelagem , a raiva e o com portam ento abusivo de
Agnes reduziram-se gradualmente, sendo substituídos por pedidos e descrições
diretas.
3.
Amplifique seus sentim entos para torná-los mais salientes. Por vezes
ajuda adicionar algum com portam ento verbal à reação básica frente ao cliente,
de m odo a garantir ou aumentar a eficiência terapêutica. Em bora a natureza do
reforçador não se m odifique fundam entalm ente ao longo do processo, a
Aplicação Clínica da FAP
35
amplificação pode ser importante do ponto de vista terapêutico. Este cuidado se
traduz no terapeuta sendo muito cuidadoso na explicação de suas reações ao
cliente, bem como ao descrever eventos privados ou reações sutis que possam
não ser discrim inadas de imediato. A título de ilustração, considerem os um
cliente que se preocupa com a questão da intim idade e sente falta de amizades.
A o se com portar na sessão, ele produz no terapeuta reações espontâneas, de
natureza privada. Estas respostas podem incluir: 1) predisposições para agir de
m odo íntimo e carinhoso, e 2 ) respondentes privados que correspondem a “sentirse próxim o” . Como estes comportamentos não são discriminados pelo cliente,
ou possuem pouco valor reforçador, o terapeuta poderia descrever alguma reação
interna e dizer: “E u m e sinto particularm ente próxim o de você agora”. Sem a
am plificação, tais reações básicas im portantes exerceriam pouco ou nenhum
efeito reforçador sobre o com portam ento do cliente que as causou.
4.
Esteja ciente de que seu relacionamento com o cliente existe para o
beneficio deste. Quaisquer intervenções que estejam em andamento, é importante
que o terapeuta sempre se interrogue sobre o que é m elhor para o cliente naquele
m om ento e a longo prazo. Para ilustrai' este princípio, vamos exam inar a relação
entre o conceito de reforçam ento natural e o tipo de terapia proposto por Cari
Rogers. Em bora Rogers estivesse vinculado a um a abordagem m uito diferente
da FAP, as características do terapeuta naturalm ente reforçador lembram, em
diversos aspectos, a postura cuidadosa e genuína de Rogers. Conhecido por sua
oposição ao “uso do reforçam ento” corno form a de controle sobre as outras
pessoas, Rogers certam ente não tentaria fazê-lo. M as uma análise cuidadosa de
suas reações aos clientes indica que há contingências (Truax, 1966), pois Rogers
reagia diferencialm ente a certas classes de com portam ento do cliente. Deste
m odo, ele produzia um padrão de reforçamento.
Ao nosso ver, a atenção de Rogers provavelmente manifestava-se como
um interesse, preocupação, sofrimento ou envolvimento, que terminavam, natural­
m ente, punindo C R B ls e reforçando CRB2s e CRB3s. Deste modo, sugerimos
que a proposição rogeriana é um método indireto de fortalecer a ocorrência de
contingências naturalmente reforçadoras. Um terapeuta que dá atenção, confoime
a formulação aqui apresentada, é alguém naturalmente reforçador, ou governado
pelo que é m elhor para o cliente.
N a medida em que na relação terapêutica há um desequilíbrio de poder,
é especialm ente importante obedecer a esta diretriz. Do contrário, os clientes
poderiam ser facilmente abusados e feridos. Clientes que se envolvem sexualmente
36
Capítulo 2
com seus terapeutas sâo um destes casos. Peck (1978) discutiu muito bem porque
é difícil conceber que um cliente se beneficie do relacionam ento sexual com o
terapeuta:
Caso eu tivesse um caso sobre o qual concluísse, após cuidadoso e sistemático
exame, que o crescimento espiritual do meu paciente seria substancialmente
beneficiado pelo nosso relacionamento sexual, eu aceitaria a idéia. No entanto,
em quinze anos de atividade profissional, nunca encontrei um caso assim, e acho
difícil imaginar que isto sequer seja possível. Antes de mais nada, o papel de um
bom terapeuta é ser um' bom pai, e pais não se relacionam sexualmente com os
filhos por uma série de razões, todas bastante fortes. A tarefa de um pai é estar a
serviço da criança, e não usá-la para sua satisfação pessoal. Cabe ao terapeuta
servir ao cliente, sem fazer uso dele para preencher suas necessidades. A tarefa
patem a é encorajar a criança em direção à independência, e o terapeuta deve
seguir este exem plo. É difícil entender que um terapeuta que se relacione
sexualmente com um cliente não o fizesse por razões pessoais, ou que estivesse,
por meio de tal atitude, promovendo a independência do cliente, (p. 176)
5. Se usar reforçadores atípicos, fa ça-o som ente p o r tempo limitado,
como fo rm a de transição. Ocasionalmente, um terapeuta pode desejar utilizar
reforçadores atípicos em um a fase de transição do tratam ento, até que os
reforçadores naturais assumam o controle. Mas esta atitude requer grande cautela.
Além disso, recom enda-se contar ao cliente porque isto está sendo feito, e que
depois haverá substituição pelo reforçamento natural. Ferster (1972b) afirmou
que alguns dos usos bem sucedidos de reforçadores atípicos como alimento ou
elogios devam-se “à form a como eles tom am o comportamento do cliente mais
visível ao terapeuta e ao próprio cliente.” U m a vez que tal consciência se
estabelece, reações do terapeuta naturalmente reforçadoras despertariam, no
cliente, repertórios relevantes que acompanham os reforçadores arbitrários.
Vejamos o caso de um cliente que apresentava altas taxas de faltas no trabalho
e na terapia. Obviamente, sem contato é difícil desenvolver a aliança terapêutica.
Surpresas sob a form a de recom pensas m ateriais de baixo valor, como material
de papelaria, ou brinquedos podem ser oferecidas como indução da presença
regular às consultas. N a m edida em que se desenvolvem novos repertórios que
tom am a terapia em si suficientemente reforçadora, estas recom pensas podem
ser retiradas gradualmente.
6, Evite a punição. Em conformidade com a proposição do behaviorismo
radical, que se opõe ao uso da punição, até agora se enfatizou o reforçamento
A^plicação Clínica da FAP
37
p o sitiv o . O s estím u lo s aversivos som ente d everiam ser usados quando
procedim entos que envolvam o reforçamento positivo se mostrarem ineficazes
A oposição ao uso terapêutico de estím ulos aversivos baseia-se em seus
problem áticos efeitos colaterais: 1 ) pode gerar esquiva da terapia, 2 ) propicia a
agressividade em geral, 3) o comportamento produtivo acaba substituído por
fuga e esquiva. Ferster apontou que a m aior parte do controle aversivo que
ocorre entre pessoas é, na sua essência, arbitrário. Portanto, faz sentido evitar,
sempre que possível, o uso de controle aversivo no tratamento de adultos atendidos
em nossos consultórios.
H á casos, entretanto, nos quais os C R B ls do cliente consistem em
com portam ento de fuga e esquiva, o que im possibilita a ocorrência de CRB2s,
ou seja, o desenvolvim ento de repertórios m ais efetivos. N estas situações, o
terapeuta pode tentar bloquear a esquiva reapresentando ao cliente o estímulo
discrim inativo que originalmente evocou a fuga ou esquiva. Consideremos, por
exem plo, um a simples questão feita pelo terapeuta; “Como foram os exercícios
de relaxam ento durante a semana?” , num contexto no qual o cliente concordara
com a tarefa. Para alguns, a pergunta seria um estím ulo aversivo, que evocaria
fuga ou esquiva do cliente, seja mudando o assunto, m entindo ou respondendo
de m odo ambíguo.
Estas reações (por exemplo, fornecendo um a resposta indireta) poderiam
se relacionar com um a série de problemas do cliente em termos de relacionamentos
interpessoais. Se o terapeuta m uda de tópico e “parte para outra” , haveria
reforçam ento da esquiva CRB1, sem que se possibilite o desenvolvimento de
u m repertório significativo do cliente, pleno de im plicações, relacionado a “ser
direto”. Portanto, a técnica principal para enfraquecer a esquiva seria introduzir,
novam ente, o estím ulo aversivo, o que, no caso acima, eqüivale a repetir a
pergunta sobre o cum prim ento dos exercícios de relaxam ento.
N o ssa im pressão é que C R B ls de esquiva ocorrem freqüentemente na
terapia, talvez em toda sessão. O terapeuta pode sem pre se interrogar - “O que
esta resposta consegue evitar?” . É difícil detectar a esquiva porque a situação
aversiva pode ser extrem am ente idiossincrática, dificultando que o terapeuta
consiga perceber o que ocorre. N o exemplo anterior, o cliente poderia começar
a sessão já se referindo a um a crise, antes m esm o que o terapeuta lhe pergunte
sobre o relaxam ento. A crise pode, ou não, ser esquiva do conversar sobre a
lição de casa. A não ser que o terapeuta tenha form ulado hipóteses a respeito
dos C R B 1s referentes à tarefa, a crise seria um a esquiva bem sucedida. O conceito
de esquiva, do ponto de vista funcional, freqüentem ente tem pouco a ver com o
38
Capítulo 2
cliente estar consciente do que ocorre e é, basicam ente, um comportamento
modelado pelas contingências. Conforme salientou-se antes, o efeito de qualquer
contingência pode ser o fortalecimento ou enfraquecimento de um comportamento,
e não teria a ver com a capacidade do cliente estar ciente da contingência em
vigor (ver capítulo 5 para um a discussão sobre consciência e comportamento
modelado pela contingência).
N ão se recomenda bloquear todas as respostas de fuga e esquiva porque
o bloqueio funciona como controle aversivo e isto acarreta todos os efeitos
indesejáveis a ele associados. D e modo correspondente, deveria ser aplicado
com moderação no contexto de um am biente prim ordialm ente baseado em
reforçamento positivo e estar de acordo com o nível atual de tolerância do cliente
aos estím ulos aversivos. A tolerância se refere a um a reação dim inuída e ao
efeito desorganizados da estimulação aversiva. O reforçamento positivo resultante
do novo comportamento que se desenvolve após a aversividade inicial gerada
pelo bloqueio da esquiva, acaba por facilitar o aumento da tolerância. Um
repertório verbal que corresponda às variáveis de controle envolvidas na esquiva
(Regra 5) também pode auxiliai' no aumento da tolerância. Um exemplo seria:
“Vou lhe perguntar novamente sobre o relaxam ento porque você não respondeu.
Faço isto porque acho que sua ausência de resposta é como quando sua esposa
lhe pergunta sobre seu dia e vocês terminam com sentimentos de irritação. Esta
talvez seja um a oportunidade para fazermos algo a respeito do problem a.”
7. Seja você mesmo, na medida do possível, considerando as restrições
impostas pelo relacionamento terapêutico. O terapeuta, enquanto membro da
com unidade verbal, tem acesso a reforçadores naturais contingentes a um
com portam ento específico que ocorre na sessão. Para ter acesso a estes
reforçadores naturais, o terapeuta pode observar as reações espontâneas privadas
que ocorrem logo após o comportamento do cliente. Tecnicamente, a reação
privada não é p e r se reforçadora, mas vem acom panhada por disposições para
agir publicamente de formas que são naturalm ente reforçadoras. Outro método
é perguntar a si mesmo “Como a comunidade responderia a este comportamento?”
N enhum a das alternativas garante que o reforçador obtido seja natural e,
tampouco, terapêutico, mas é um ponto de partida. Três fatores deveriam ser
levados em conta para determ inar se as reações privadas do terapeuta são
provavelmente reforçadoras: 1 ) o repertório atual do cliente; 2 ) o que é melhor
para o cliente; 3) o repertório que deverá ser desenvolvido no cliente.
Aplicação Clínica da FAP
39
Abordagens indiretas
A té aqui discutim os abordagens diretas que propiciem o reforçamento
natural do com portam ento apresentado pelo cliente na sessão. Como se apontou
anteriorm ente, há riscos envolvidos no uso da abordagem direta. Ou seja, pode
ser arbitrário o terapeuta seguir- um a regra sobre o que fazer na hora de reforçar,
visto que a regra não faz parte do processo quando o reforçamento ocorre no
am biente natural. Por exem plo, um bom pai geralmente age em função do que é
benéfico para a criança, sem que tenha que seguir um a regra, ou estar consciente
a respeito do que fazer. A s abordagens indiretas, por outro lado, buscam auxiliar
a m anipulação, no am biente natural, de variáveis diferentes daquilo que se faz
im ediatam ente após a detecção do CRB. Por exemplo, terapeutas evitam estar
fam in to s o u ex austos d u ran te o trab alh o , alim entam -se e buscam estar
descansados ao início de suas sessões. Isto pode ser entendido como um a forma
indireta de to m ar m ais provável que o terapeuta reforce naturalm ente os
progressos do cliente. Ou seja, os cuidados do terapeuta com seu bem estar
físic o p o d em to m á-lo m ais atento, pacien te, com preensivo e, portanto,
naturalm ente reforçador.
1.A m pliar a percepção do que reforçar. É importante lem brar que as
m udanças podem assum ir diferentes formas e ocorrem em ritmos distintos.
M elhorar nossa percepção do que reforçar é o com portamento enunciado pela
Regra 1 e, dentre os m étodos indiretos, é o mais importante. Há m ais chance das
reaçõ es espontâneas do terap eu ta serem naturalm ente reforçadoras se o
com portam ento do cliente for entendido como um progresso clínico.
2.
Avalie o seu impacto. A idéia geral é rever detalhadamente as interações
terapêuticas. Registrai' as sessões em áudio e vídeo, ou dispor de pessoas
qualificadas para observarem a sessão (como ocorre nas clínicas-escola) poderia
auxiliar o processo. Este fe ed b a ck favorece o aperfeiçoamento das reações do
terapeuta (Regra 4).
3. P ratique boas ações, que propiciem benefícios às pessoas em geral.
Outra proposta é o terapeuta se engajar em comportamentos cujo único reforçador
disponível (para o com portam ento do terapeuta) fosse beneficiar terceiros.
Sugere-se, por exemplo, aumentar o número de boas ações em prol de estranhos,
engajar-se em trabalho voluntário, auxiliar pessoas economicamente desfavore­
cidas, com fom e, entre outras. Faça-o freqüentemente; se possível, todo dia.
Espera-se, deste modo, fortalecer repertórios que beneficiem terceiros, o que
40
Capítulo 2
caracteriza um dos aspectos do reforçainento natural. Se o repertório fortalecido
for transferido para a sessão, pode aumentar a disponibilidade do reforçamento
natural, favorecendo a qualidade da terapia.
4.. Selecione clientes apropriados à FAP. Na medida em que a FAP requer
que o reforçamento natural disponível na situação terapêutica seja relevante aos
comportamentos do cliente relacionados ao problema, a seleção de clientes que
provavelmente: a) tenham problemas que ocorram durante a sessão, e b) sejam
afetados pelas reações do terapeuta, seria um a quarta abordagem que, de modo
indireto, propicia a ocorrência do reforçam ento natural.
R eg ra 4: O bserve os efeitos potencialm ente reforçadores cio com portam ento
â o te ra p e u ta em relação aos CMBs do cliente
A Regra 4 deriva-se diretamente de princípios analítico-comportamentais
que enfatizam a im portância dos efeitos das consequências do comportamento
sobre sua futura probabilidade de ocorrência. Em bora um a m udança no
comportamento do terapeuta possa ser um subproduto do seguimento dessa
regra, ela, em si, especifica somente que o terapeuta observe o relacionamento
reforçador durante a sessão e não sugere ao terapeuta que intencionalmente
modifique seu próprio comportamento. O bservar a relação reforçadora pode
apresentar efeitos importantes sobre os resultados da terapia. Por exemplo, se o
terapeuta observar que suas reações parecem punir o comportamento desejável
do cliente mas que ocorrem com baixa freqüência, isso pode levar a m udanças
no com portam ento do terapeuta, que se to m ará positivam ente reforçador.
Entretanto, é também possível que o terapeuta continue a punir o comportamento
favorável mesmo após identificar a natureza antiterapêutica da punição. Neste
caso, o desenlace seria um a decisão de encam inhar o cliente a outro terapeuta
o u o próprio terap eu ta se subm eteria à terapia visando m o d ificar estes
comportamentos específicos.
A observação do terapeuta dos efeitos reforçadores de suas reações
sobre o comportamento do cliente pode favorecer o seguimento da Regra 5 e o
desenvolvimento de comportamentos similares no c lie n te -C R B 3 .0 modo mais
óbvio pelo qual isto ocorreria seria o terapeuta inform ar ao cliente sobre a autoobservação: “Notei que cada vez que você com eçou a falar sobre suas crenças
espirituais eu mudei de assunto e você não m ais o trouxe à tona.” Deste modo,
o terapeuta fornece um modelo ao estabelecer um a relação funcional para o
cliente.
Aplicação Clínica da FAP
41
A Regra 4 pode tam bém levar o terapeuta em busca de maneiras de
fortalecer os efeitos de reações que seriam reforçadoras para o CRB mas que
não são percebidas pelo cliente. Por exemplo, imagine um cliente do sexo
m asculino com dificuldades de expressão de sentimentos em função de uma
h is tó ria de te r sid o rid ic u la riz a d o ou criticad o quando o fazia.. E stes
com portam entos não aumentaram de freqüência, a despeito do terapeuta ouvir
atentam ente com expressões faciais de empatia e tecer comentários, ditos com
voz suave, em cada ocasião na qual o cliente expressou um sentimento. Quando
inquirido a respeito, d escobriu-se que as reações do terapeuta não eram
discernidas pelo cliente porque o ato de expressão dos sentim entos evocava
emoções tão intensas (respondentes internos colaterais) que a estimulação externa
não era percebida. Após o terapeuta ampliar a reação empática falando com
voz clara e alta, ocorreu um aum ento da taxa de comportam entos de expressar
sentim ento do cliente.
É recom endável evitar o início do tratamento, se parecer provável que
as contingências naturais não favoreçam a m elhora de um cliente específico.
Isto se aplica quando a Regra 4 leva o terapeuta a concluir que a m aioria das
reações frente ao cliente serão punitivas e que essas reações negativas não se
re la c io n a m com o p ro b le m a do cliente, tal com o “As p esso as reagem
negativam ente frente à m inha pessoa”. O terapeuta pode reconhecer que não
gosta do cliente por razões que provavelmente não se modificarão em breve (por
exem plo, o cliente desperta no terapeuta as lem branças de um pai adotivo cruel
ou um cônjuge que fugiu com o/a amante na semana anterior).
R e g ra 5: F o rn e ç a in te rp re ta çõ e s de variáveis qu e afetam o com portam ento
do cliente
N ossa hipótese é que as interpretações com portam entais especificadas
pela R egra 5 irão auxiliar na produção de regras m ais efetivas (Zettle & Hayes,
1982) e aum entar o contato com as variáveis de controle. Esses aspectos são
discutidos com m aiores detalhes mais tarde.
Ao se perguntar: “Porque você fez aquilo?”, respondemos com um motivo
ou interpretação. Em geral, a razão inclui um a descrição do que fizemos (ou
pensamos, sentimos, ouvimos) e um a afirmação acerca das causas. O que fizemos
e dissem os a respeito depende, é claro, de nossas histórias pessoais. Do mesmo
m odo, as observações e interpretações do com portamento feitas pelo terapeuta
42
Capítulo 2
são em função de um a história, o que inclui sua experiência clínica e formação
teórica. Entretanto, independente de quem o faça, um motivo é apenas uma
unidade de comportamento verbal, um a sequência de palavras. De todo modo,
cada terapia parece incluir ensinar ao cliente a atribuição de m otivos que, aos
olhos do terapeuta, sejam aceitáveis. Especificamente, o terapeuta cognitivista
ensina os clientes a explicarem seus problemas e progressos à luz de suas crenças
ou supostos, enquanto que o terapeuta da FAP espera que os motivos se reportem
à história de reforçamento e variáveis de controle atuais. O cliente da psicanálise,
por outro lado, deve atribuir razões em termos de conflitos infantis e memórias
reprim idas. A disseminação da atribuição causal em psicoterapia é ilustrada
pela descrição que Woolfollt e M esser (1988) fazem da psicanálise: um processo
no qual o cliente relata o que ocorreu e fornece explicações, que serão
interpretadas pelo analista, acompanhadas por um a explicação diferente. A
análise está completa quando as razões tanto do cliente quanto do analista
confluírem para o mesm o ponto.
Enquanto terapeutas, esperamos que as razões que fornecemos aos nossos
clientes os auxiliem em seus problem as da vida diária. Dependendo da razão
fornecida e da história do cliente, é possível, entretanto, não surtir' efeito algum,
ou mesmo, se configurar em uni obstáculo p aia o cliente. Ao nosso ver, há dois
m odos pelos quais a atribuição de motivos pode afetar o cliente.
Primeiro, a razão pode conduzir a um a prescrição, instrução ou regra.
A interpretação “Você está agindo com sua esposa do mesmo modo como o fez
com relação à sua mãe”, pode facilmente ser compreendida como uma prescrição
ou regra que o cliente entende como “N ão seja injusto com sua esposa; procure
tratá-la de outro modo já que, obviamente, ela não é sua mãe. E se você a tratar
bem, seu relacionamento conjugal vai melhorai'.” Se a regra ou instrução irá de
fato ter alguma valia, dependerá do quão precisa é sua correspondência com o
am biente natural. Por exemplo, imaginemos duas razões que podem ser dadas
por um a menina que pegou um biscoito quando não deveria fazê-lo. Uma razão
poderia ser “O demônio me obrigou a fazer.” Esta razão não corresponde às
condições ambientais que controlaram seu com portamento. Por outro lado,
afím iar “Peguei o biscoito porque não comia nenhum há m ais de um a semana,”
corresponde aos eventos ambientais e sugere possíveis intervenções que poderiam
influenciar o roubo de biscoitos (por exemplo, autorizá-la a comer biscoitos
mais freqüentemente).
Em segundo lugar, um a razão pode am pliar o contato com as variáveis
de controle e aumentai- a densidade do reforçamento positivo e negativo (Ferster,
Aplicação Clínica da FAP
43
1979). U m a analogia com a pesquisa animal pode ilustrar esse princípio. Ratos
foram colocados po r um certo período de tempo em duas caixas experimentais
diferentes nas quais recebiam choques inescapáveis. Em uma das caixas, choques
não contingentes foram m inistrados em intervalos aleatórios. N a outra caixa, o
mesmo número de choques não contingentes foram ministrados, mas cada choque
foi antecedido p o r um a luz de aviso. Quando lhes era dada a possibilidade de
escolher, os ratos invariavelm ente preferiam a condição sinalizada. O m esm o
dado foi obtido com alim ento sinalizado e não sinalizado. As escolhas dos ratos
indicaram que um sinal auxiliou a m elhorar sua experiência. Do mesm o modo,
um a interpretação poderia sinalizar eventos para os humanos.
Por exemplo, um a cliente aprende durante a FAP que a razão pela qual
sente-se, às vezes, rejeitada durante a sessão é função da atenção do terapeuta e
m ais, que esta atenção se relaciona com o quão perturbado ou com pressa o
terapeuta pareça estar no início da sessão. Tal interpretação poderia aum entar a
chance da cliente observar o hum or do terapeuta no início da sessão e afetar
significativam ente a sua experiência frente a um lapso de atenção por parte do
terapeuta. Disso resulta que a cliente estabelece um m elhor contato (ela observa
quão perturbado está o terapeuta) e experiencia a desatenção do terapeuta como
sendo m enos aversíva.
Especificações de Relações Funcionais
O repertório verbal a ser desenvolvido por terapeutas envolve afirmações
que relacionam eventos durante a sessão por meio de símbolos como S d R -4 Sr.
Isto representa um com portam ento operante no qual 1) o Sd é o estím ulo
discriminativo ou a situação antecedente cuja influência sobre a ocorrência dei?
varia com a história de reforçam ento; 2) o R é a resposta ou com portam ento
operante influenciado pelo Sd; e 3) Sr é o reforçam ento ou efeito da resposta no
ambiente.
Por exemplo, “Quando líie perguntei como você se sentiu a meu respeito
(o Sd), você m e respondeu falando sobre sua experiência na prisão (a R), que é
um tópico no qual você sabe que eu tenho interesse. Eu recompensei sua esquiva
discutindo sobre a prisão e não sobre seus sentim entos a m eu respeito (o Sr).”
E m geral, é preferível utilizar a linguagem cotidiana, mas pode-se discutir a
conveniência de ensinar ao cliente a linguagem comportamental. Contudo,
afirmações parciais de relações funcionais são m elhores do que omiti-las (por
C apítulo 2
44
exemplo, “Sempre que lhe pergunto sobre seus sentimentos em relação a mim
[Scf], você muda de assunto [/?]”).
Os repertórios da Regra 5 que correspondem ao comportamento que
ocorre na sessão são preferidos, se comparados àqueles correspondentes a eventos
que ocorrem em outro lugar. Ainda m elhores são os repertórios verbais que
relacionam variáveis de controle que ocorrem fora da sessão àquelas que ocorrem
na sessão, pelo fato de propiciarem a generalização.
N o caso a seguir.ilustrarem os o uso da Regra 5. Audi, um a lésbica
negra, na faixa dos vinte anos, buscou terapia com o segundo autor porque
desejava “modificar padrões antigos que me impedem de aproximar-me das
pessoas.” De início, ela tinha dificuldade de falar sobre seus sentimentos e de
demonstrar qualquer tipo de afeto na terapia e descrevia ter comportamento
similar em outros locais. Com cerca de seis meses de tratamento, no intervalo
e n te um a sessão e outra, Andi espontaneamente começou a me escrever lembretes
com um a expressão mais afetiva. Considerando a escassez de expressão de
A ndi nas sessões, fiquei encantada, li e respondi as anotações, as quais
aumentaram em freqüência e tamanho. Estava ciente (Regra 1) da possibilidade
de que as anotações fo ssem um passo na direção certa, em term os do
desenvolvimento de relações de intim idade (CRB2) e sabia que o conteúdo das
anotações incluía descrições de variáveis de controle (CRB3).
Após um ano de terapia ela escreveu: “Estou apavorada pela dependência
que estou sentindo. N ão imagino você fora da m inha vida. Um a coisa é tomarm e dependente da terapia, mas pior é depender de um a pessoa específica, a
terapeuta. E mais, terapeutas existem em todos os lugares, mas não há muitas
terapeutas feministas nascidas no Terceiro M undo, situadas politicam ente à
esquerda do liberalismo, que compreendem a comunidade lésbica e que gostam
da m aneira como escrevo.”
O diálogo abaixo ocorreu na sessão seguinte:
T: E tudo verdade, mas você deixou de lado o fato de que nosso relacionamento é
especial e único e que eu realmente me importo com você. (Eu sabia que este é um
estímulo discriminativo [SW] para o tipo de comportamento de intimidade ausente
em Andi [CRB2] e que evoca a esquiva bem como as dificuldades na manutenção
de relacionamentos de intimidade [CRB1]).
C: Muitas pessoas se importam comigo, mas aquelas características a diferenciam.
(Andi respondeu de uma maneira que me desconsiderou; eu provavelmente estava
Aplicação Clínica da FAP
45
na posição que outras pessoas candidatas ao relacionamento íntimo estiveram,
quando expressaram se importarem com Andi - um CRB1),
T: Eu me sinto diminuída quando você afiima isso.
Andi estava visivelm ente chateada com esta reação. Descrevi então
aspectos im portantes da relação funcional “Andi, quando disse que realm ente
m e im portava com você e quis reiterar meus sentim entos, você reagiu de uma
maneira impessoal. Esta reação puniu m eu comportamento de lhe contar o quanto
m e im porto com você e fez com que eu sentisse que m eus sentimentos não eram
relevantes. A cho que sei porque você reagiu deste m odo, você não quer que eu
cultive m eus cuidados e sentim entos positivos com relação a você.”
A ndi discorreu sobre este tem a e descreveu como, em geral, lhe era
difícil escutar m ensagens carinhosas, de elogio ou sintonizadas com seus
sentim entos - um padrão que interfere na aproxim ação de pessoas.
Ê nfase nos processos comportamentais
Com o um a estratégia geral, o terapeuta reinterpreta as afirmações do
cliente em term os de relações funcionais, um a história de aprendizagem e
com portam ento. Tais interpretações com portam entais enfatizam a história e
reduzem a im portância de entidades mentalistas e não-comportamentais. Isto é
im portante para o cliente porque dirige sua atenção aos fatores que acabam
gerando as intervenções terapêuticas.
Por exemplo, Angela, em tratamento com o primeiro autor, não confiava
em si mesma, possuía baixa auto-estima, sentia-se insegura nos relacionamentos
e com dificuldade para pedir aos outros o que desejava deles.
C: Eu sinto que eu não tenho direito de existir. É como se eu não devesse viver,
comigo tudo dá problema. Eu acho que fui covarde como um rato. Quando aprendi
a dirigir eu congelava na minha vez de atravessar um cruzamento. Eu achava que
eu nunca tinha o direito de me meter entre os carros. Isto ainda me é um pouco
traumático, embora eu já tenha melhorado um pouco. De qualquer modo, tudo
isso já me indica que alguma coisa está errada. .Mas e agora? [pausa longa] (A
maior parte destas descrições, especialmente a da encruzilhada, poderia indicar
Capítulo 2
46
como Angela se sente agora, ao se relacionar comigo. Ver o Capítulo 3 sobre
análise do comportamento verbal do cliente.)
T: Eu não sei. Eu posso te apresentar meus pensamentos ou você poderia escolher um
rumo a seguir. (Estou possibilitando amplificar minhas reações privadas.)
C: Ah! Mas eu não tenho um rumo.
T: Você quer que eu te conte quais são meus pensamentos?
C: Ou você poderia escolher um rumo. (A expressão facial e o tom de voz indicam
que ela não quer saber de meus pensamentos.)
T: É verdade, eu poderia escolher um ramo. Me parece que a idéia de lhe contar
quais são meus pensamentos não lhe ateai. Acho que você não gosta dessa idéia.
Você poderia me falar mais a respeito? (A esquiva de Angela de ouvir meus
pensamentos é um CRB1 porque relaciona-se às dificuldades que possui para manter
relações de proximidade.)
C: Bom, acho que é um tipo de... acho que não... acho que não é meu jeito. Sabe de
uma coisa? Eu acho que eu fico dando voltas ao redor mas meio que não fico...
T: ...pessoal?
C : (acenando com a cabeça) Hu-hum. Eu meio que escolho ficar na superfície.
T: Veio alguma coisa agora na tua cabeça quando eu falei que podia te contar os
meus pensamentos? Alguma idéia despertou na tua mente?
C: Foi uma coisa meio idiota. Eu penso como se fosse um desses pontos meio que
perigosos, sabe como é? Eu simplesmente recuo. Eu acho que não é uma boa idéia.
Quer dizer, às vezes é uma boa idéia, eu acho, mas nem sempre. Talvez algumas
vezes. Acho que eu não quero responder à tua pergunta. (Uma descrição de um Sã
aversivo e um CRB de esquiva da intimidade, da confiança, do escutar o desejo
dos outros.)
T: Hu-hum. Ok, então eu quero te contar os meus pensamentos. Quando você disse
que não tinha direito de existir, eu me lembrei do quanto sua mãe ficou chateada
quando você caiu no riacho porque isto a incomodava. Este foi mais um exemplo
de como ela te ensinou a não ter o direito de existir, de causar qualquer transtorno
a alguém. (Uma interpretação baseada na história de aprendizagem e a definição
de “não ter o direito de existir” em termos de não se engajar em comportamentos
que causassem problemas aos outros.)
T: Nós nos confrontamos aqui quando você não queria de forma alguma que eu ficasse
em apuros ou que eu saísse do meu rumo para caminhar em direção ao seu, ou
' ainda, que eu, de alguma forma, me acomodasse a você. Isto é parecido com a
encruzilhada. Você não quer que os outros tenham que esperai'. Se eles quiserem
Aplicação Clínica da FAP
47
seguir, não deveriam ser impedidos de fazê-lo. (Estou fazendo um paralelo entre a
vida diária e a relação cliente-terapeuta apontando a contingência de evitar causar
problemas.)
T: Então, este é um tipo de idéia sobre como eu acho que você funciona. E uma outra
coisa que eu pensei é o quanto parece que eu sou importante para você, você me
tem em alta conta. De fato, acho você maravilhosa e mesmo quando eu me permito
contar isto, minhas palavras não parecem ter algum impacto sobre você. Eu acho
que você não querer conhecer meus pensamentos tem algo a ver com isto. De
alguma maneira você não entra em contato com isto. É teu jeito de ser. Bom, isto
é o que eu penso. (Deste modo teve inicio uma ampliação do comportamento
privado e se introduziu na sessão uma situação de vida diária na qual recebe
feedback positivo e o carinho dos outros sem ser muito influenciada por isto. É
também uma tentativa de redefinir o problema em termos comportamentais, um
comportamento de esquiva difícil de descrever. A interpretação pode ser vista
como uma regra encoberta: “não faz sentido você reagir frente a mim como o fez
em relação à sua mãe”.)
C: Tá bom, considerando que eu deveria acreditar em você e não na minha mãe, eu
não sei como fazer isto. (Seria apropriado fornecer aqui uma interpretação
comportamental de sua experiência de “não saber como fazer isto”, que corresponde
à diferença entre comportamento modelado pela contingência e comportamento
governado por regra, tal como é discutido no Capítulo 5. A interpretação enfatizaria
que o problema não é como acreditar em mim mas sim a emissão e o reforçamento
do novo comportamento de ser assertiva e causar algum problema.)
E X E M P L O D E C A SO C L ÍN IC O
G ary buscou terapia com o prim eiro autor devido a um a história de
relacionam entos pessoais que com eçavam bem m as tom avam -se, algum tempo
depois, superficiais e pouco satisfatórios, terminando em função dos sentimentos
“ruins” que surgiam. A lém disso, ele apresentava, há um longo tem po, uma
depressão que flutuava em função da qualidade dos relacionamentos interpessoais
do m om ento. Atualm ente ele estava envolvido num relacionam ento importante
com um a m ulher, o qual parecia seguir o trágico destino dos relacionamentos
anteriores.
G ary parecia afetivo e cativante, não aparentando qualquer dificuldade
p ara se relacionar comigo nos estágios iniciais da terapia. D e início, coletou-se
48
Capítulo 2
a história e o tratamento incluiu intervenções diretivas tais como: terapia racionalemotiva. ensaio comportamental e terapia conjugal, O contrato inicial de 10
sessões foi ampliado para 20. ao longo de um período de nove meses. Nesta
primeira fase da terapia, as discussões sobre o problema de Gary centravam-se
no comportamento atual ou rem otam ente distante ocorrido fora da sessão.
Identificou-se que seu problema teve origem nos primórdios da infância. Tais
discussões lhe auxiliaram a alinhavar um repertório verbal razoavelm ente
plausível, correspondente à relação entre sua história de vida e as variáveis de
controle atuais que afetavam seu problem a clínico.
D este m odo, ao térm ino de 20 sessões, G ary aprendeu que seus
relacionam entos pareciam azedar quando ficava chateado ou irritado com sua
p a r c e ir a , sem d is c u tir su a s p re o c u p a ç õ e s co m e la . E le se to rn a v a
progressivam ente mais deprimido, a parceira reciprocam ente retribuía com
depressão ou raiva e, por fim, ocorria o rom pimento. No início do tratamento,
Gary concordou em expressar seus sentimentos negativos para sua namorada.
Ele concordou porque sentiu que, se não o fizesse, incidiria numa falta de abertura,
a qual fomentaria sentimentos ruins e uma óbvia deterioração do relacionamento.
Em bora Gary estivesse consciente do problema e tivesse se submetido à terapia
cognitiva, ao ensaio comportamental e à terapia de casais, todas com o objetivo
de tentar resolver o problem a, m esm o assim ele não conseguiu expressar
adequadam ente os sentimentos negativos e o relacionam ento chegou ao fim tal
como os anteriores.
A cada sessão subseqüente ao rompimento, Gary parecia m ais reticente
e deprimido. Perguntado sobre sua crescente depressão, Gary afirm ou que ela
devia-se ao luto pelo relacionam ento perdido e sua inadequação pessoal. Eu
tam bém observei que, nas sessões, houve piora na gravidade da depressão e,
por isso, focalizei o tratamento em seu estado depressivo, nos pensam entos
próprios negativos e na desesperança de viver um relacionamento bem sucedido.
Com a aplicação da R egra 1, hipotetizei que os problemas de Gary se
manifestavam na sessão. Ao perguntar ao cliente se estava bravo comigo ou se
havia qualquer sentimento negativo, ele negava e afirmava que seu estado reticente
e a depressão não tinham nada a ver comigo. Embora não estivesse completamente
convencido, abandonei temporariam ente o tem a da relação terapêutica e me
centrei na terapia comportamental para depressão. Entretanto, o m eu desconforto
foi aumentando progressivam ente durante as sessões e encontrei dificuldades
para dar seguimento à interação. D a parte de Gary, ele parecia estar se tornando
m ais deprimido ainda. Quando sugeri que Gary fosse a um m édico para se
A plicação Clínica da FAP
49
avaliai" a possibilidade de medicação anti-depressiva, ele explodiu num discurso
raivoso dizendo que os m édicos nunca sabiam o que estavam fazendo e que
causavam m ais m alefícios do que benefícios.
H ipotetizando que os com entários de Gary sobre os m édicos foram
estim ulados p o r sua reação a m im , (ver Capítulo 3, Causas M últiplas), teci a
seguinte interpretação com portam ental (Regra 5):
Ti Parece que está acontecendo agora - o seu problema, quero dizer. Nossa relação
começou de maneira legal, muito descontraída e aberta. Você não tinha dificuldade
em me contar sobre seus sentimentos e problemas e eu esperava ansiosamente
por nossas sessões. A forma como nossa terapia começou, se assemelha à forma
como a maioria de seus relacionamentos passados começaram. Então, as coisas
foram se tornando ruins. Você não conseguia expressar em voz alta para Joyce
os seus sentimentos negativos, apesar de termos tentado várias abordagens
terapêuticas. O seu relacionamento terminou. Voeê foi ficando deprimido e menos
aberto em nossas sessões. Isto foi piorando gradualmente até o ponto atual você tem muito pouco a dizer e eu estou achando as sessões frustrantes, porque
eu não sei o que fazer para ajudar.
C: É similar ao que aconteceu no passado e eu ando pensando em terminar. (Uma
evidência adicional de que está acontecendo um CRB1.)
T: Então nosso relacionamento está mesmo destinado ao passo final que parece ter
ocorrido tão freqüentemente no passado. Ele chega ao fim deixando um sabor
amargo. (Para uma comparação entre comportamento intra-sessão e na vida
diária, ver Capítulo 3.)
C: Eu me sinto deprimido e mal com isto tudo. É o que sempre acontece e eu me
frustro porque não sei o que fazer.
T: Ótimo, agora você tem uma chance de modificar o nosso relacionamento e não
se sentir mal ou frustrado. Ou você deixa nosso relacionamento terminar como
os outros e você continua infeliz e deprimido ou você pode agir de outro modo e
talvez sentir-se melhor.
C: O que você quer dizer com agir diferente? Eu não sei como fazer isto.
T: Baseado no seu padrão passado, devem existir sentimentos negativos e/ou hostis
em relação a mim.
Ci Tudo o que eu sei é que estou deprimido e quero ajuda porque me sinto mal.
(Esquiva do CRB1.)
T: Você não respondeu à minha pergunta. Eu disse que eu achava que você tinha
Capítulo 2
50
sentimentos negativos ou hostis em relação a mim. (Regra 3, bloqueio da esquiva.)
G Eu não tenho, vamos falar da minha depressão. (Esquiva do CRB 1.)
T: Acho que você está evitando alguma coisa relacionada a mim que lhe incomoda.
Quando você começou a terapia, eu disse que tentaria lhe ajudar. Agora você me
pede ajuda e eu tento conduzi-lo a um tema que você não acha que esteja relacionado
e tenta mudar de assunto. (Regra 2, apresentando a situação evocadora - estou
novamente tentando ajudar agora, o que já não funcionou anteriormente; levantase a hipótese de que o insucesso de minhas intervenções anteriores em ajudar
evocou em Gaiy sentimentos negativos e a esquiva subseqüente. Aqui são também
demonstradas a Regra 3, bloqueio da esquiva, e a Regra 5, uma inteipretação
comportamental.)
C: Eu fiz tudo que você me pediu para fazer e, mesmo assim, Joyce me abandonou.
(CRB2)
T: Você fez o que pedi, Joyce o abandonou e ...
C: E você não me ajudou como prometera. (CRB2, a primeira vez na qual uma queixa
é diretamente expressa a mim.)
T: Eu tentei, mas não deu certo, e você fez tudo o que eu pedi. Eu me sinto mal com
isso e me pergunto o que eu deveria ter feito diferente para que Joyce e você
pudessem permanecer juntos. Acho importante você ter trazido isto à tona, e quero
desta vez ver o que pode ser feito. (A Regra 3 está sendo seguida, ou seja, o
refòrçamento natural de uma queixa é levá-la a sério e tentar fazer algo a seu
respeito. Em sessões subseqüentes, observei em Gary um aumento de expressões
de insatisfação com a terapia e comigo, Regra 4.)
O relacionamento terapêutico intensificou-se após este ponto com um
aumento das expressões de reações emocionais entre Gary e eu. N a medida em
que as sessões centraram-se quase que exclusivamente no nosso relacionamento,
Gary revelou mais detalhes sobre seu desapontamento para comigo e falou sobre
temas correlatos à questão da confiança. Sentimentos positivos de carinho e
afeto foram tam bém manifestados. Os C R B ls de esquiva anteriores surgiram
em m enor freqüência, m as sempre que detectei a incidência de um deles,, fiz o
bloqueio e favoreci o desenvolvimento, em Gary, de um novo repertório de
expressão aberta de sentimentos negativos referentes à confiança, desapontamento
e raiva. Gary tom ou-se capaz de observar o com portam ento clinicam ente
relevante no momento em que ocorria (CRB3), o que por sua vez produziu um
relacionam ento terapêutico de maior qualidade. Os repertórios desenvolvidos
na terapia foram prontam ente transferidos para o am biente externo, e Gary
relata estar vivendo a mais satisfatória relação íntim a que jam ais experienciou.
3
Supíementação
Aumentando a capacidade do terapeuta para
identificar comportamentos clinicamente relevantes
A funcionalidade terapêutica nasce da detecção daqueles comportamentos do
cliente que são exemplos de comportamento clinicamente relevante (CRB). Temos
observado que, quanto mais CRBs forem detectados, m ais profunda, intensa,
em ocional e fascinante é a terapia. Assim, há lugar na FAP para qualquer método
ou conceito que possa auxiliar a detecção de CRB, especialmente porque as
ocorrências destes com portam entos durante as sessões não são, de um modo
geral, facilmente identificadas. Como os CRBs são variáveis fracas no controle
das o bservações p o r parte do terapeuta, elas g eralm ente requerem um a
supíementação (Skinner, 1957) com o intuito de aumentar o seu poder de controle.
N as próxim as seções (Classificação de Com portam ento Verbal e Situações
Terapêuticas que Evocam CRBs), nosso objetivo é oferecer suplementos para
aum entar a capacidade e com petência do terapeuta em observar os CRBs,
tam bém cham ados algumas vezes de sensibilidade ou insight.
C L A S S IF IC A Ç Ã O B E C O M P O R T A M E N T O V E R B A L
Como acontece em todo campo de trabalho humano, um sistema de
classificação ou taxonomia estimula uma observação mais minuciosa. Por exemplo,
um a garotinha que aprende a classificar insetos procurará e observará mais insetos,
51
Capítulo 3
52
e quando os encontrar, certificar-se-á quanto ao número de patas dos mesmos. Da
mesma forma, nós propomos um sistema de classificação que aumente a observação
do CRBs. A classificação de com portam entos verbais ajuda a aum entar a
competência do terapeuta na observação de CRB. de duas maneiras. Primeiro, ela
descreve o tipo de afirmações do cliente que levam à detecção do CRB. Depois,
ela se firma na noção de que toda vez que o cliente fizer uma declaração, é possível
que um CRB tenha ocorrido - mesmo que isso não seja facilmente identificável.
O exem plo a seguir dem onstra com o o uso de nosso sistem a de
classificação pode conduzir a um a produtiva intervenção terapêutica. Uma sessão
com Karen, que foi tratada pelo primeiro autor, com eçou com:
T: Como foi sua semana?
C: A semana passada foi muito ruim, eu tomei uma multa de $ 108 [suspiro] por
licença vencida.
Nosso sistema de classificação verbal me levou a considerar que havia
algo na resposta de Karen além do aparente à prim eira vista. Baseado no meu
conhecimento de Karen, algumas possibilidades me vieram à mente:
1. Ao receber a multa, ela foi pega em flagrante; talvez, seja assim
que ela vê a terapia e por conseguinte, reage à m im como se
estivesse com o policial.
2. Talvez ela esteja preocupada com o custo da terapia e o pagamento
de suas contas.
3. Ela está obviamente aborrecida com a multa e talvez seu comentário
realm ente indicasse “por favor, ajude-m e a m e sentir melhor!”
4. Ela pode ter mencionado esse problem a por não ter feito a tarefa
de casa que eu lhe dei, e o fato de trazer o assunto da m ulta à tona
pode ser um a m aneira de evocar solidariedade ou desviar a atenção
do assunto temido.
5. Talvez ela tenha visto um policial logo antes da sessão ou notado
que havia um a passagem aérea sobre a m esa da recepcionista ao
passar por lá.
Eu então passei a checar algumas dessas hipóteses, e é assim que ela
reagiu quando eu perguntei sobre a conta:
T: E quanto à nossa conta, você está preocupada com ela?
C: Não, porque meu seguro tem $100 dedutíveis, que eu já uséi em medicamentos.
Isso então cobre o dedutíve] e eles me asseguraram que as primeiras 10 sessões já
Su plem en tação
53
estão pagas. E u não esto u c erta sobre o que a co n tece d e p o is disso, m as eles têm
sid o m u ito bons.
T: À ra zã o p e la qual eu esto u a b o rd a n d o esse assu n to é que esto u ten ta n d o d e sc o b rir
o que in co m o d a v o cê no fato de m e dev er algum d inheiro.
C: E u n ã o g o sto d e d e v e r d in h e iro a ninguém .
T: E u sei, m as v a m o s nos ate r ao n o sso assunto e sp e cífic o . O q u e in c o m o d a ria vo cê?
C i E u ten h o p e n sa d o m u ito n isso , e u m a nota de d ó la r m e v e m à m en te to d a v e z que
e u p a sso p e la porta.
E ssa últim a declaração apoiou a hipótese de que a preocupação de Karen
em relação às contas se m anifestou em seus comentários sobre o incidente da
multa. M ais importante, entretanto, é que minha hipótese quanto aos significados
“ocultos” m e levou a descobrir que Karen se preocupava com o fato de me
dever dinheiro da mesma maneira, que a preocupava dever para qualquer outra
pessoa. Sua preocupação e ansiedade em relação a várias contas não pagas fôra
o foco da terapia de reestruturação cognitiva em sessões anteriores e ela se
esquivou de trabalhai- m ais este assunto, dando a entender que esse já era um
problem a superado. Conforme está indicado na transcrição, ainda representava
um problema. Sua falta de consciência e modo indireto de lidar com esse problema
durante a sessão, no entanto, se assemelhavam ao modo inadequado de conduzir
sua vida cotidiana. A identificação deste CRB1 alertou-me para um a abertura
terapêutica. Ali estava um a oportunidade in vivo de bloquear a esquiva de Karen
e encorajar maneiras m ais adequadas para o encaminhamento do problema.
Durante os seis meses seguintes, Karen desenvolveu repertórios melhores para
lidar com o problema das contas por meio do aprendizado de como lidar com a
sua dívida comigo. Isto também propiciou o trabalho terapêutico sobre um problema
m ais abrangente, relacionado às suas respostas a outras pessoas quando sentia
que estava sendo negativamente avaliada.
A lguns de nossos leitores podem estar se perguntando se a nossa
especulação sobre os significados ocultos se encaixa na esfera do behaviorismo, e
mais ainda, podem desconfiar de sua similaridade com a Psicanálise. Mais tarde,
quando explicarmos nosso sistema de classificação de comportamento verbal,
mostraremos como a teoria behaviorista radical leva a este tipo de atividade
interpretativa. Mas, por enquanto, a inclusão dos significados ocultos na teoria
behaviorista radical será ilustrada pela história do desafio amigável feito ao
behaviorismo por Alfred North WhiteheacL Em um jantar com Skinner em 1934,
54
Capítulo 3
Whitehead disse a ele, “Vamos ver sua resposta ao meu comportamento, quando,
sentado aqui, eu digo ‘nenhum escorpião preto está caindo nessa m esa’ N a manhã
seguinte, Skinner com eçou a escrever Comportamento Verbal - um relato
comportamental sobre a linguagem. N o epilogo desse livro, que levou 23 anos para
ser concluído, Skinner esquematizou os princípios comportamentais nos quais a
afirmação de Whitehead se basearia. Uma das conclusões foi a de que o significado
do “escorpião preto” de Whitehead era behaviorismo. A interpretação de Skinner
derivou-se da sua teoria contextuai do significado, a qual forma o centro da proposta
behaviorista para a linguagem. Uma vez que Skinner, um behaviorista declarado,
usou princípios comportamentais paia revelar o significado oculto de uma declaração
feita 23 anos antes, parece correto argumentar que tal esforço pertence à esfera do
behaviorismo. De fato, o terapeuta se encontra em uma posição mais cômoda que
Skinner para fazer interpretações sobre os relatos do paciente fundamentadas na
teoria comportamental, já que ( 1 ) elas podem ser feitas imediatamente após a
ocorrência dos relatos, (2 ) o terapeuta está em contato mais direto com as
circunstâncias que rodeiam o relato, e (3) o terapeuta continua a interagir com o
cliente, e pode obter informações adicionais que legitimem a sua interpretação.
A pesar desta atividade interpretativa se parecer com a atividade
psicanalítica, há profundas diferenças quanto às implicações clínicas e aos
pressupostos básicos. Acima de tudo, o terapeuta comportamental deve se manter
humilde, tendo sempre em mente que suas interpretações são apenas hipóteses.
Além disso, a validade de suas inteipretações é difícil de ser avaliada pois as
variáveis de controle não podem ser isoladas em um a situação de laboratório. A
teoria behaviorista sugere que os significados ocultos (na verdade, causas ocultas
e variáveis de controle) estão no ambiente circundante, não são necessariamente
relevantes do ponto de vista clínico, e não são o resultado de alguma coisa
dentro da pessoa que luta para se expressar. N ossa visão dos comportamentos
verbais do cliente sugere que inteipretações psicanalíticas são úteis quando
permitem que o analista obseive CRBs. Como a FAP é especificamente planejada
para aum entar a observação de CRBs, o desempenho desta tarefa se tom a mais
eficiente.
O S is te m a d a F A P d e C la s s ific a ç ã o d a s R e s p o s ta s d o C lie n te
As respostas ou o comportamento verbal do cliente podem se constituir
em dicas para que o terapeuta utilize o sistema de classificação da FAP de
form a a chegar às possíveis causas deste com portamento enquanto ele está
Suplementação
55
ocorrendo. O sistem a de classificação da FAP é baseado em conceitos do
Comportamento Verbal (1957) de Sldnner. Um livro freqüentem ente criticado'
mas raram ente lido, é um a rica fonte de conceitos que podem ajudar a detectar
CRBs na situação terapêutica. É um livro de leitura difícil e os conceitos não
são de fácil compreensão. Por havermos usado alguns dos conceitos de Sldnner,
e apesar de termos feito um esforço para tomai' nossa classificação compreensível,
ela pode estar além do interesse de muitos de nossos leitores. Então, aqueles que
não estão interessados em aprender o sistema de classificação em detalhes nesse
mom ento, consultem a próxim a seção, que resum e as suas im plicações. Em
seguida, pule os detalhes de classifícáção e vá direto à seção Situações
terapêuticas que fi~eqüentemente evocam CRB.
Im p lic a ç õ e s d o S is te m a d e C la ssific a ç ã o d e R e sp o sta s p a r a a F A P
As sugestões dadas abaixo agilizam o desenvolvim ento da relação
terapeuta-cliente e dos CRBs, assim como fazem deles um objetivo da interação
terapêutica.
1.Encorajar e reforçar as descrições do cliente que se relacionam a
estímulos presentes no ambiente terapêutico. Aqui inclui-se qualquer comentário
ou descrição sobre o terapeuta, a relação terapêutica, sentimentos sobre a terapia
(eficiência, preço, qualidades, defeitos, etc.), diálogos anteriores ou outros eventos
ocorridos durante a sessão, como se sentem ao vir para as sessões, qualquer
sentimento que tenham experimentado durante a sessão, o conforto ou desconforto
da cadeira, da luz, e assim por diante. São exemplos de questões e afirmações
foimuladas pelo terapeuta que possibilitam o relato dessas descrições por parte dos
clientes: “Como se sentiu ao vir para cá hoje?”; “Como se sentiu após nossa última
sessão?”; “Como se sente em relação à terapia?”; “O que você acha que eu penso
de você?”; “Sobre o que está pensando?”; “Estou incomodado com sua hostilidade
para comigo.”; “Estava imaginando se você acha que estamos fazendo progressos
suficientes”; “Estive pensando no que ocorreu durante nossa última sessão.”
2.E n co ra jar com parações controladas p o r eventos ocorridos na
terapia e na vida cotidiana. São exem plos de relatos de clientes que se
* M ais conhecida foi a revisão de Chomsky (1959), aceita por muitos como a critica definitiva que desacreditou
o C om portam ento Verbal. G rande parte da revisão de Chomsky, entretanto, refere-se ao behaviorismo
m etodológico, que Skinner rejeitou veem entem ente e que portanto não era a abordagem utilizada no
Com portam ento Verbal.
56
Capítulo 3
enquadram aqui: “A ansiedade que estou sentindo agora é parecida com a que
eu sinto conversando com a diretoria.” ; “Você me lembra muito meu p a i” :
“Você é como todos os outros - não se pode confiar em você.” ; “Esse é o único
lugar onde me sinto seguro.”
Exemplos de questões terapêuticas e interpretações que estimulam esse
tipo de comparações: “O que acaba de ocorrer é o mesm o que acontece quando
você vê sua mãe?”; “De que modo o jeito como se sente agora se assemelha ao
que você sentiu no trabalho?”; “Você pode comparai' seus sentimentos em relação
a m im com outra pessoa muito próxim a a você?” ; “O jeito que você reagiu
quando eu disse que me importava com você parece com o jeito com que você
diz agir quando outra pessoa mostra afeição por você.”
3.Encorajar desejos, sugestões e pedidos diretos. Exemplos deste tipo
de resposta são: “Por favor, me ajude a superar essa ansiedade.” ; “E u preciso
de mais atenção”; “Eu não quero m e lembrar de minha infância.” ; “Você poderia
reduzir o valor da sessão?”.
Os terapeutas podem encorajar os pedidos de clientes dizendo: “É
perm itido e desejável que você queira e peça o que quer de mim. Eu levarei em
consideração todos os seus comentários, mesmo que não seja possível para mim
fazer tudo conforme o seu desejo.” Im itar este tipo de comportamento para os
clientes é bem saudável. Exemplo: “Eu gostaria que você chegasse no horário.”,
e “Eu gostaria de conversar sobre seus débitos para com igo” .
4.
Use as descrições dos eventos da vida cotidiana do cliente como
metáforas para eventos que tenham ocorrido em sessão. De acordo com os
princípios do Comportamento Verbal, qualquer resposta do cliente pode ser
determ inada por m últiplos fatores; ou seja, podem haver m otivos ocultos
(variáveis de controle m enos explícitas) que o próprio cliente desconhece.
Sugerim os então que você levante algum as hipóteses sobre quais poderiam ser
esses eventos na sessão e se são clinicamente relevantes. Por exemplo, um cliente
relata o quão incom petente seu dentista é. O terapeuta pode responder, “Eu me
pergunto se você está preocupado com o m eu conhecim ento acerca do meu
trabalho”, ou, no caso de um tratam ento recém -iniciado, “Você acha que os
psicólogos sabem o que estão fazendo?” .
O terapeuta pode tam bém especular se a m etáfora é m ais que um a mera
descrição de eventos ocorridos na sessão. Pode ser um pedido disfarçado e o
terapeuta pode fazer suposições sobre quais reforçadores ocultos podem estar
S u plem entação
57
envolvidos Por exemplo, se o cliente descreve o quão insatisfatória foi a semana
e o quão infeliz ele tem estado, isso poderia ser compreendido como um pedido
encoberto com reforçadores ocultos de solidariedade, e para que o terapeuta não
force m uito durante a sessão.
M otivos ocultos podem também ser entendidos como apelos diretos.
Por exem plo, o pedido do cliente de term inar a terapia poderia ser reforçado
pela esquiva de um conflito, decorrente de se sentir atraído sexualmente pelo
terapeuta.
C la s s ific a n d o o c o m p o r ta m e n to ve rb a l
A abordagem de Skinner não se parece com nenhum outro sistema de
classificação lingüística porque classifica o que é falado com base nas causas
m ais do que em sua forma ou formação fonética. A pesar de haver m uitos níveis
de causas*, aquelas às quais nos referim os aqui são simplesmente estímulos
discrim inativos que ocorrem antes das respostas e estímulos contingentes que
ocorrem logo após. O prim eiro grupo tem ênfase na definição do “tato” e o
segundo no “m ando”. Esses dois term os, tato e mando, exercem o papel central
do nosso sistem a de classificação e se referem a com portamentos verbais que
diferem um do outro em suas causas.
U m a visão geral do processo de classificação é representada n a Figura
1 . O processo com eça com a classificação da resposta do cliente como tato
(quad ro 1), um m ando (q u ad ro 3), ou um in trav erb al (quadro 4). N ós
visualizam os o sistem a de classificação apresentado aqui como uma introdução
ao uso dos p rin cíp io s do com portam ento verbal de Skinner n a situação
terapêutica. Para efeitos práticos, lim itam os arbitrariam ente o núm ero de
conceitos de com portam entos verbais aos três citados acim a, porém não
exaurimos as implicações da abordagem. Ainda que um a aplicação mais completa
do comportamento verbal pudesse adicionar m uito mais ao processo terapêutico,
sua discussão está além dos objetivos deste livro.
L O tato. U m tato é definido como um a resposta verbal que está sob
controle preciso de estím ulos discrim inativos, e é reforçado por reforçadores
’ D o ponto de vista behaviorista, há ( l ) contingências de causas de sobrevivência (causas evolucionárias
ou de constituição); (2) contingências de sobrevivência cultural (práticas culturais); e (3) contingências
de re fo rça m e n to (S k inn er, 1974).
Figura 1. Uma classificação das verbalizações do cliente. As flechas em destaque indicam
pontos nos quais são feitas as interpretações sutis
Resposta do C lien te
58
Capítulo 3
Supíementação
59
secundários generalizados. Por exemplo, se lhe m ostram uma bola verm elha e
perguntam , “O que é isso?” e você diz, “U m a bola verm elha”, você estaria
’’tateando” pois a form a de sua resposta (“bola verm elha”) é controlada pelo
objeto e é reforçada por um reforçador condicionado generalizado, como “uhhuh”, “certo”, ou “obrigado”, ou qualquer outra resposta que indique que você
foi com preendido. N ote que a contingência ou reforçador é amplo e geral, ao
passo que o estímulo discriminativo inicial (Sd) é específico.
O tato é, assim, produzido pela presença de um estímulo particular (no
caso, um a bola verm elha) e um a audiência (o terapeuta ou um parente). Os
tatos, neste sentido, assem elham -se à noção de rótulos ou nomes. Entretanto,
como os term os rótulo ou nome sugerem a idéia de representação simbólica,
usam os “tato” ao invés de “rótulo” para reforçar essa diferença. D o ponto de
v ista c o m p o rta m e n ta l, as p a la v ra s “b o la v e rm e lh a ” não re p re se n ta m
sim bolicam ente nem significam o objeto, assim como a pressão à barra por
ratos não representa ou significa um a luz sinalizadora am arela num a caixa de
Skinner. O problem a com um a palavra que “representa” ou “sim boliza” um
objeto é que em seguida dever-se-ia explicar qual o significado destes dois termos
para que houvesse a compreensão da resposta verbal. Por outro lado, ao dizermos
que o tato é “controlado” por um estímulo discriminativo inicial, podemos explicar
um com portam ento sim plesm ente nos referindo ao processo de discriminação
delineado. Este processo abrange o significado com um de “simbólico” ou “quer
dizer” alguma coisa. Isso não significa, no entanto, que nós aceitamos as palavras
de nossos clientes como verdade absoluta. N ossa posição, exem plificada no
caso da m ulta de $108, nos conduz a um a visão bem divergente.
A localização do estímulo discrim inativo (Sd) que controla o tato é
im portante na classificação da FAP do com portam ento verbal. Do ponto de
vista terapêutico, o m undo pode ser dividido em dois tipos de Sds - aquele
localizado nas sessões de terapia ou aquele da vida cotidiana do cliente. Os dois
tipos de Sds são mostrados na Figura 1, no quadro 6 (SdVc) para a vida cotidiana,
e no quadro 7 (SdT) para terapia. Uma categoria final, reservada para os tatos
evocados pelos Sds localizados tanto na terapia quanto na vida cotidiana, é
m ostrada no quadro 8 (SdTVc). Então, se a situação da “bola verm elha” ocorreu
durante a sessão terapêutica, o tato “bola verm elha” foi m otivado por um SdT
um a vez que a bola verm elha estava localizada na sessão terapêutica.
U m a cliente que descreve um a briga com seu m arido está emitindo um
tato sob o controle de um estímulo discriminativo localizado em sua vida cotidiana
(isto é, u m SdVc, m ostrado no quadro 6). U m a cliente falando sobre um a
60
Capítulo 3
discussão com seu terapeuta está sob controle de estím ulos localizados 110
ambiente terapêutico (ou seja. um SdT localizado na quadro 7). A mesma cliente
que diz que sua briga com o marido é semelhante à sua discussão com 0 terapeuta
está fazendo um tato sob 0 controle de estímulos localizados na terapia e 110
am biente da vida cotidiana, e é mostrado no quadro 8 (denominado SdTVc).
O foco inicial da FAP está em respostas controladas por estímulos
ocorridos durante a sessão terapêutica. Assim, 0 terapeuta da FAP (1) fica alerta
e (2) encoraja respostas controladas por SdT e SdTVc. Identificar essas respostas,
aquelas controladas por S d T e SdVc, ajuda claramente na determinação de quais
respostas do cliente são mais importantes. Por exemplo, aponta as respostas
m ais importantes entre aquelas emitidas por Andréa, um a cliente cujo problema
era um a infelicidade crônica e fobia social. Aqui estão suas declarações no
início de um a sessão:
1. “Hoje eu perdi a calma, porque fui chamada e m e disseram que eu
tinira que estar em Boise semana que vem para um a entrevista de
emprego de secretária. E eu não sei se posso fazer isso, eu não sei se
posso conseguir isso.”
2. “Quando saí daqui sem ana passada, eu me senti leve. Eu m e senti
realmente bem e não sei 0 porquê.”
3. “Eu até mesmo tinha que m arcar a entrevista de modo que não
interferisse com 0 horário da m inha medicação. E isso me fez sentir
estúpida. Eu imaginei 0 que aconteceria se eles soubessem, se eles
soubessem que eu não poderia estar lá ao m eio-dia porque teria que
interromper 0 encontro para tom ar m inha pílula.”
4. “Se eles descobrissem que estou tom ando tranqüilizantes, eles não
iriam querer me contratar.”
Essas respostas seriam classificadas como tatos óbvios, m as apenas
um a, a resposta 2, é controlada por um estímulo dentro da sessão - um SdT. E,
aliás, a resposta mais relevante do ponto de vista clínico (assumindo que todas
estão igualm ente relacionadas ao seu atual problema).
Lembre-se que um tato ocorre simplesmente devido à presença de um
estímulo. Essa característica do tato é particularmente importante para a compreensão
da discussão sobre causas múltiplas e dos assim chamados significados ocultos. Nós
não dizemos que 0 cliente “usa” 0 tato para descrever o estímulo, assim como não
S up lem en tação
61
dizemos que alguém “usa” o andar para se deslocar daqui até lá. Evitamos ver o
cliente como “usuário” de uma resposta verbal porque então nos depararíamos com
um a compreensão do que está sendo “usado”. Esse “o quê” que está sendo usado é
a resposta verbal e assim retornamos ao problema original o qual tentamos resolvercompreender a resposta verbal. Por exemplo, digamos que você esteja tentando
entender as causas de um a ameaça de suicídio. Se você disser que o cliente “usa a
ameaça”, então, temos que compreender as causas do comportamento de “usar”,
bem como as palavras empregadas. Por outro lado, através da nossa perspectiva,
poderíamos dizer que a ameaça poderia ser motivada pela atenção que ela recebe
(um mando, como veremos abaixo) ou ela poderia ser controlada por comportamentos
pré-suicidas (um tato) ou um a combinação dos dois. Além disso, o cliente pode ou não
estar ciente dos fatores controladores e/ou motivadores.
2 .0 m ando. M andos são os discursos que fazem parte de demandas,
comandos, pedidos, e questões. U m mando é um comportamento com as seguintes
características: ( 1 ) ocorre porque é seguido por um reforçador particular, (2 )
sua força varia conform e a privação relevante ou estim ulação aversiva, e (3)
aparece sob um a am pla faixa de estímulos discriminativos. Assim, se você disser,
“Eu gostaria de um pouco de água” porque você está com sede, isto seria um
m ando pois haveria aí a ação de um reforçador m uito específico - alguém
escutando você e lhe dando água ou mostrando onde conseguí-la. A resposta a
“Eu gostaria de um pouco de água” não teria a influência de um reforçador
secundário generalizado com o p o r exemplo, alguém dizendo “Está bem ”, ou
“O brigado por com partilhar isso com igo”, ou ainda “Eu entendo o que você
quer dizer.” Sua força tam bém poderia variar de acordo com a necessidade que
você tem de água. Seu m ando por água pode ocorrer em quase todas as situações
em que você esteja com sede e haja outra pessoa para escutar.
Do m esm o m odo, se um cliente lhe diz “Eu gostaria de um a sessão
extra essa semana”, isso seria reforçado (e por isso possível de ocorrer novamente)
pelo fato de conseguir u m a nova sessão (um reforçador específico). O mando
pode indiretam ente envolver privação ou estados aversivos como “Por favor,
leve-m e a passear”, ou “N ão m e abandone”. O com portam ento do cliente, que
ocorre especificam ente porque evoca o cuidado do terapeuta, é um mando.
C om o m o stra a F ig u ra 1 e já foi dito anteriorm ente, a prim eira
classificação a se fazer é verificar se a resposta do cliente é um tato (quadro 1 ),
um m ando (quadro .3) ou um iuíraverbal (quadro 4). O intraverbal é um compor­
tam ento verbal evocado p o r estím ulos verbais e geralm ente abrange aquelas
62
Capítulo 3
respostas que não podem ser classificadas como tato ou mando. Por exemplo,
quando perguntam “Como você está?”, a resposta “Bem ” geralmente é um
intraverbal, uma vez que ela realm ente não tem nada a ver com os sentimentos
do falante, sendo simplesmente uma resposta apropriada ao conjunto de palavras
“Como está você” (se a resposta “Bem” estiver realm ente demonstrando os
sentimentos do falante então teríamos aí um tato, e não um intraverbal). As
respostas do cliente a questões como “Onde nasceram seus pais?” e “Onde seu
parceiro trabalha?” são intraverbais.
3.
M andos disfarçados. Você não pode ter certeza se um a resposta dada
é tato ou mando com base apenas em sua form a (ou som). A palavra/ogo, por
exemplo, poderia ser um mando para um bom beiro ou um tato enquanto um
incêndio. Visto que a classificação de um comportamento verbal com base em
sua forma ou som é denominada análise form al, o método Skinneriano de
classificação com base em suas causas é denominado Análise Funcional. Usando
a abordagem funcional sldnneriana, quanto mais soubermos acerca do contexto
e da história que levam à resposta, mais certeza teremos sobre suas causas e sua
classificação enquanto tato, mando ou intraverbal. Assim, se você vir o incêndio
e o falante apontando para ele, você terá o contexto necessário para classificar
seguramente aquela resposta como um tato.
O exemplo do fo g o ilustra bem o fato de que a mesm a palavra pode ter
diferentes causas. O significado de um a palavra (ou sentença, gesto, discurso,
etc.) corresponde à sua função, ou seja, um delineamento de suas causas. Quando
dizemos que a “mesma” palavra pode ter “diferentes” significados, “mesma” se
refere ao aspecto formal da palavra (seu som e a sua grafia) e “diferente” se
refere ao seu aspecto funcional. Consideremos o exemplo de um cliente que diz
“Eu vou me matar”. Se a resposta do cliente tem um histórico de comportamento
suicida, como planos de suicídio e alguns sentimentos associados a eles, então a
afirmação é um tato. Se a declaração é primariamente m antida pela preocupação
que evoca em outras pessoas, então temos um mando. Em nosso esquema de
classificação, o primeiro caso está representado como um tato no quadro 1 e o
segundo como um mando disfarçado no quadro 2 . É disfarçado porque parece
um tato se nos basearmos em sua forma, mas de fato, é um mando baseando-se
em sua funcionalidade. Os não-behavioristas podem preferir diferenciar esses
dois tipos de discursos suicidas com base nas intenções e propósitos do cliente.
Em bora estes termos denotem um significado similar, eles podem ser confusos
ou ambíguos. Por exemplo, a intenção ou propósito im plicam consciência? Sé
não implicam, o que significa ter um a intenção inconsciente? Usando nossa
Suplementação
63
teoria de tato versus mando, a consciência é um assunto à parte e não tem
nada a v er com nossa classificação. A ssim , o cliente pode ou não estar
consciente do motivo que o leva à am eaça de suicídio, mas isso não impede a
sua classificação enquanto tato ou mando. Adem ais, se utilizam os as intenções
ou propósitos para explicar a tentativa de suicídio por parte do cliente, o próximo
passo na terapia seria descobrir a origem dessa intenção ou propósito. Tatos e
m andos, por outro lado, já estão definidos em term os de suas origens.
O exemplo da am eaça de suicídio m ostrou como a m esm a expressão
pode ter diferentes significados. De maneira correspondente, diferentes expressões
com o “P or favor, m e am e” e “ Sou inútil e desprezível” podem ter o mesmo
significado funcional (causas). O pedido explícito por am or pode ser causado
por um a história passada de obtenção de am or e carinho sempre que solicitado
e/ouum a atual falta de am or e carinho*. Pela consistência de forma e de função,
nós podem os dizer que esse cliente realm ente sente aquilo que diz. A resposta é
representada no quadro 3 e é abreviada como Ma. O reforçador deste mando,
am or e carinho, recai no sistem a de classificação m ostrado no quadro 10 e é
representado por SrE, A segunda declaração, sobre ser inútil, poderia tam bém
ser causada pelo desejo de am or e carinho. Assim, é um mando, apesar de
parecer um tato; ou seja, na experiência de vida do cliente, am or e carinho
ocorriam com m aior probabilidade depois de um á auto-depreciação e não após
um pedido direto. Como indicam os anteriormente, esses mandos disfarçados de
tatos são os mandos disfarçados (quadro 2 ). O reforçador que é contingente aos
m andos disfarçados é considerado um reforçador especial, SrE (quadro 9), de
m aneira a significai' que um reforçador específico apropriado a um m ando está
envolvido, e não sim plesm ente o reforçam ento secundário generalizado que é
contingente aos tatos.
D esta foim a, é possível term os afirm ações formalmente similares e
funcionalm ente diferentes (o exem plo do suicídio), assim como formalmente
diferentes e similares funcionalm ente (o exem plo do am or e carinho).
4.
C ausas M ú ltip la s e E stim ulação Suplem entar. A m aioria dos
com portam entos verbais tem m últiplas causas. E m adição a um estím ulo
controlador inicial, geralmente há estímulos controladores adicionais que também
influenciam as respostas. Isso fica óbvio em lapsos verbais onde a multiplicidade
de causas produz um a distorção das respostas. U m exemplo é a m ulher que diz
* Um a circunstância possível seria a de que o cliente tem um histórico de nunca ter ganho qualquer coisa de
terceiros sem que haja pedido direta e forçosamente. Assim, apesar da possível ausência de am or e carinho, o
m ando ocorre agora devido à força de m andos em geral.
64
Capítulo 3
ao namorado que irá encontrá-lo para jantar às sexo horas", A resposta “sexo”
é resultado da presença simultânea de estímulos primários evocando a resposta
“seis” e de outros adicionais evocando “sexo”, apesar de aqueles para sexo
serem menos visíveis a um observador externo, A m aior parte das causas
m últiplas, entretanto, são menos dramáticas e não produzem um a distorção tão
óbvia nas respostas. Ao contrário, podem evidenciar porque um comentário em
particular está naquele instante sendo feito, ao invés de outros que também
seriam possíveis. U m a cliente que está sendo estimulada tam bém por suas pre­
ocupações sobre os efeitos nocivos da terapia, pode contar as experiências que
teve com um quiropata incompetente na semana anterior. Um outro cliente, com
estimulação adicional por sua raiva pelo terapeuta, pode trazer à tona um inci­
dente em que tenha perdido a compostura com sua parceira. Skinner se refere a
esse processo como seleção de respostas e o propõe como alternativa para
justificar porque o cliente ’’escolheu” àquela expressão em particular dentre
tantas outras disponíveis e possíveis.
Causas m últiplas, mandos disfarçados e reforçadores especiais são
conceitos que explicam o que tradicionalmente costuma chamar-se de significados
ocultos, latentes ou inconscientes. C onseqüentem ente, tem os dado um a
explicação comportamental a este tipo de fenôm enos, tais como, lapsos de
linguagem e o m odo como os clientes conseguem dizer um a coisa querendo
dizer outra. Em geral, os clientes não estão conscientes destas variáveis, mas
sofrem seus efeitos independentemente dessa consciência. Não situamos esses
efeitos em um m ecanism o interno como o inconsciente, mas, ao invés, nos
referimos a eles como efeitos de variáveis sutis. Em contraste, as variáveis óbvias
são aquelas que correspondem de fato à form a da resposta. U m a metáfora, da
m aneira usada neste livro, refere-se a respostas controladas pelas variáveis sutis.
Por exemplo, um a experiência ruim no dentista é a variável óbvia que atua no
cliente quando ele diz ao terapeuta “M eu dentista m e m achucou.” Se o cliente
está contando ao terapeuta sobre o dentista naquele momento em particular
porque tam bém foi ferido pelo terapeuta, então a variável sutil é a dolorosa
experiência com o terapeuta. De acordo com nossa definição, o “m eu dentista
m e m achucou” é um a m etáfora pois é um a resposta de causas múltiplas sob
controle parcial de um a variável sutil. O cliente não precisa ter (e provavelmente
não tem ) consciência de que a variável sutil teve efeito sobre o que ele disse.
Como mostra a Figura 1, todas as respostas do cliente são primeiramente
classificadas com base nas variáveis óbvias com o sendo Tato (quadro 1), um
' N . do T.: em inglês, six-seis e sex-sexo.
S up lem entação
65
M ando (quadro 3) ou um Intraverbal (quadro 4). Depois, naqueles locais
indicados pelas flechas escuras (quadros 1, 3 e 6 ) há a sugestão de que a
variável sutil deve ser considerada. Por exem plo se. tendo como base a forma,
você classificou a resposta com o um tato óbvio (quadro 1 ), e a localização dos
estímulos controladores está na vida cotidiana (quadro 6). então pode-se especular
em relação a quais estím ulos sutis presentes na sessão (quadro 5) poderiam ter
sido acrescidos aos óbvios para que aquela resposta ocorresse. Por exemplo, se
o cliente está falando sobre um a relação de amizade, quais elementos da relação
terapêutica estão presen tes tam bém na relação exterior e que podem ser
responsáveis por ele m encionar o assunto neste momento? Se o cliente descreve
seus sentim entos em relação a outra pessoa, pode-se aventar a hipótese de que
há similaridade com o que ele sente por você. Se o cliente descreve um evento
ocorrido na sem ana, o que poderia haver em com um entre a relação terapêutica
e o fato?
U sar o sistem a de classificação da FAP ajudará a criar hipóteses sobre
as variáveis sutis que podem influenciar os com entários do cliente. Levantada a
hipótese, outras informações podem ser coletadas para ajudar em sua legitimação
ou rejeição.
C lassificação e O b se rv a ç ã o de C o m p o rta m e n to C linicam ente R elevante
Aqui estão alguns exem plos de com o a classificação pode ajudar a
identificar com portam entos clinicam ente relevantes (CRBs) em seus clientes:
1. A lguns clientes raram ente ou nunca observam a si m esmos ou outros
no “aqui e agora” . A falta dessas observações poderia ser um CRB1 que interfere
em relações m ais íntim as. A observação de si m esm o e dos outros no aqui e
agora deriva da classe de respostas do tato controladas por eventos n a sessão TaSdT (quadro 7). O principal m étodo utilizado na identificação de CRB1 é o
de pedir aos clientes para com parar seus com portam entos durante as sessões e
a sua vida cotidiana (por exem plo, “Você desviou o olhar e ficou quieta quando
eu pedi para falar sobre seus sentim entos em relação a mim. É assim também
com seu parceiro?”). A resposta da comparação do cliente pode ser um TaSdTVc
(quadro 8).
2. TaSdTVc (quadro 8 ). Esse tipo de resposta se enquadra no aprim o­
ram ento de CRB3, a descrição dos clientes sobre seu comportamento e suas
66
Capítulo 3
causas. CRB3 é uma forma especial de tato controlada por estímulos ocorridos
du ran te a sessão te ra p ê u tic a. A m o d elag em de CRB3 com eça com o
encorajam ento pelo terapeuta, de qualquer tato controlado por estím ulos
discriminativos na terapia (TaSdT), e tanto na terapia quanto na vida cotidiana
(.TaSdTVc). Uma comparação entre o com portamento nas sessões versus na
vida cotidiana encaixa-se na categoria de CRB3 que pode ajudar a transferir os
ganhos da terapia para a vida cotidiana.
3.Respostas sutis geralmente constituem CRB1. Primeiramente, elas
m ostram um a falta de consciência. Assim, quando um a resposta sutil ocorre,
fom ece um a oportunidade terapêutica para aum entar a consciência por meio de
dicas e de reforçamento do CRB3 apropriado. Por exemplo, se um cliente está
sob controle da variável sutil de ser magoado pelo terapeuta e conta a ele sobre
um a experiência dolorosa no dentista, o cliente se beneficia por descrever a
variável sutil e como isso o afeta (CRB3). Ou seja, o terapeuta deve ajudai' o
cliente a tomar consciência das variáveis que afetam o seu comportamento (Regra
5). Acreditamos que esse processo comportamental é muito semelhante ao que o
psicanalista descreve como “tomar consciente o inconsciente”. Em segundo lugar,
a razão pela qual muitas variáveis controladoras “se escondem ” e tomam-se
sutis é, principalmente, devido aos efeitos do condicionamento aversivo, indicando
assim um CRjBl de esquiva. Em terceiro lugar, m andos disfarçados são
freqüentemente C R B ls pois são m aneiras indiretas de pedir alguma coisa e a
solicitação direta é geralmente m ais eficiente.
4.Classificar as respostas do cliente leva o terapeuta a um melhor contato
com o contexto total do comportamento do cliente. Ao invés de aceitar os
comentários do cliente ao pé da letra, o sistema de classificação pode ajudar o
terapeuta a ver as respostas como resultado de variáveis óbvias e sutis que
refletem a história do cliente, bem como os efeitos da relação terapeuta-cliente.
Enxergar esse “quadro m aior” aumenta a sensibilidade ao CRB e ao papel do
reforçamento nas sessões.
E importante lem brar que a classificação não é o único motivo pelo
qual o CRB deve ser considerado durante a sessão. Todo o comportamento do
cliente deve ser constantemente avaliado quanto às suas possibilidades de CRB.
Uma avaliação de CRB é feita antes mesmo das respostas serem classificadas e
o diagrama montado. Considere, por exemplo, um cliente tímido e temeroso que
nunca se defrontou com um a autoridade e que repentinam ente deixa escapar
“Você não está prestando atenção no que eu estou dizendo e isso m e irrita
profundam ente”. Imediatamente podem os identificar nesta frase um CRB2 e
Suplementação
67
um C R B 3 sem n em m e sm o u sa rm o s o p ro c e sso d e c la s s ific a ç ã o do
comportamento verbal. O propósito desse processo classificatório é tom ar visíveis
m ais CRBs do que aqueles que podem ser rapidam ente averiguados, m as não
deve ser visto como o único m étodo para se reconhecer este CRB. Vamos agora
passar a alguns exem plos de classificação.
E xem plos de C lassificação de R esp o stas do C liente
1 ."São dez p a ra as cinco. E hora de ir. ” De acordo com o diagram a,
primeiramente nos perguntamos “Isso é um tato óbvio (quadro 1), m ando (quadro
3), ou intraverbal (quadro 4)?” . N ossa resposta é “tato óbvio” desde que o
relógio seja aparentemente o estímulo controlador subjacente à form a específica
da resposta “dez para as cinco” , que por sua vez serve com o dica para o fim da
sessão. Prosseguindo no diagrama, nós determinamos a localização do estím ulo
discrim inativo (Sd). Como o cliente se referiu ao relógio e este está localizado
na sessão terapêutica, é um óbvio S d T (quadro 7).
Agora, a avaliação do CRB: se um problema da vida cotidiana do cliente
é que ele vive com pulsivam ente sob controle do relógio e “deve” encerrar a
sessão pontualm ente às cinco horas, então a resposta é um CRB 1. Entretanto,
se o com entário do cliente é um a m elhora em relação à sua com pulsão típica do
tem po, já vista em sessões anteriores (onde sim plesm ente levantaria e sairia), a
resposta é um CRB2. O diagram a tam bém direciona nossa atenção para fatores
sutis; quer dizer, a possibilidade de que a resposta possa ser um m ando disfarçado
(quadro 2 ).
Por exem plo, um a cliente que deseja que você pare de perguntar sobre
seus sentimentos. O reforçam ento especial seria, então, a esquiva de discussões
maiores sobre este assunto. Sendo esta um a interpretação sutil, a natureza indireta
da resposta poderia ser um CRB1.
2.
"Minha esposa se recusa a lavar as roupas. ” Novam ente, primeiro
nos perguntamos “Isso é um tato óbvio, mando, ou intraverbal? É um tato (quadro
1 ), se assum irm os que o próprio fato da esposa se recusar a lavar roupas é a
variável de controle sobre a resposta. A localização deste evento é a vida cotidiana
do cliente (SdVc quadro 6). A o avaliar as possibilidades de CRB, se o cliente
m ostrara-se anteriormente receoso de ser critico em relação à sua esposa, então
poderíàm os ter um CRB2. O próxim o passo, de acordo com o diagram a é o de
68
Capitulo 3
fazer uma interpretação sutil de um mando disfarçado (quadro 2). E possível que
o cliente não esteja simplesmente “relatando os fatos” como está implícito no tato
óbvio, mas, ao contrário (ou em adição), tenha motivos ocultos (isto é, reforçadores
sutis ou especiais - quadro 9). Os possíveis reforçadores especiais são aqueles
em que o cliente deseja que o terapeuta diga algo como “Que esposa irresponsável
você tem”; “Aqui está a maneira de fazer sua mulher lavar a roupa” ; ou “Isso é
péssimo, num momento em que você já está estressado” . U m possível CRB1
relacionado às motivações ocultas seria “querer que os outros o apoiem em seus
conflitos conjugais e interpessoais, sem que tenha que pedir diretamente.”
3. "Quanto você cobra pelas sessões? " A resposta é um óbvio mando
(quadro 3) pois exprime um reforçador específico (quadro 10). O reforçador
óbvio é o terapeuta estabelecer um a taxa. E possível que o mando não seja o que
aparenta, mas envolva um reforçador especial e sutil, SrE (quadro 9). A mais
óbvia dessas preocupações é o valor fixado pelo terapeuta. Por exemplo, o cli­
ente poderia querer dizer “Reduza o preço.” Essa m otivação oculta indicaria o
CRJ31 de não ser direto ou não estar consciente. Se o cliente evita estabelecer
comprom issos em geral, então outro C R B 1 poderia ser a esquiva em estabele­
cer o compromisso de iniciar a terapia, usando o preço como desculpa.
4. “Ninguém gosta de mim. ” Com base em sua forma, a resposta é um
tato óbvio (quadro 1). A localização do S d de controle parece ser um SdTVc
(quadro 8) pois o “ninguém” pode se referir também ao terapeuta. Se o problema
atual da cliente, em suas próprias palavras, é que “ela não é digna de ser amada”,
então a resposta indica que um CRJB1 está ocorrendo. Em term os de um a
interpretação sutil, o mando disfarçado (quadro 2) poderia ser “Por favor, goste
de mim ” ou “Diga-me que gosta de m im ”. A qualidade indireta ou inconsciente
do m ando disfarçado poderia ser um CRB1.
5. “Eu sinto náuseas. ” É um tato óbvio (quadro 1) porque a resposta
parece ser controlada por um estímulo vindo do estômago. A localização do Sd
de controle deste tato está na sessão terapêutica, um Sd T (quadro 7). Em geral,
as declarações de sentimentos são tatos óbvios porque considera-se que sejam
controladas por estímulos anteriores. Pode ser interessante notar que os estímulos
de controle são privados. A resposta indica que um CRB1 está ocorrendo, se a
náusea é o problema atual, ou um CRB2 se o cliente nunca reclama de problemas
físicos. Um a interpretação sutil é que a resposta é um m ando disfarçado por
em patia ou esquiva de algo que acontecia antes da reclam ação ser feita.
S u plem entação
69
SITUAÇÕES T ER APÊUTICAS Q U E FREQÜENTEMENTE
E V O C A M CO M PO R TA M EN TO S CLINICAMENTE
RELEVANTES
Há estímulos, comuns a situações terapêuticas, que com freqüência
ocasionam certo tipo de com portam ento do cliente que pode ser clinicamente
relevante. Cham am os a atenção para essas situações com o objetivo de que elas
possam ser observadas quando ocorrerem na sessão.
1. Estrutura do tempo. As sessões de terapia têm hora marcada de
início e fim. O cliente pode chegar atrasado, empenhar-se ao máximo para chegar
cedo, querer sair m ais cedo, ou não sair 110 horário. Chegar atrasado a um
comprom isso pode estar relacionado a problem as atuais, tais como a esquiva de
discussões emocionalmente carregadas, o planejamento do tempo, ou problemas
de trabalho gerados por não ser pontual. Ter dificuldades para sair ao final da
sessão pode estar relacionado a com portam entos como dependência ou apego
excessivos que tenham causado problem as em outros relacionamentos. D ar
atenção exagerada à pontualidade pode estar relacionado a problem as como
compulsão ou m edo extremado de desapontar os outros, associado a um a baixa
auto-estima.
C hegar atrasado às sessões quando está havendo progresso terapêutico
tam bém pode ser um exemplo do problem a, para o cliente que tem dificuldade
em com pletar tarefas e acha que “estragou” situações onde poderia ter sido bem
sucedido. C hegar tarde ou sair cedo po d em ser exem plos de operantes
clinicam ente relevantes para o cliente que apresenta problem as de ansiedade.
Em cada caso, o comportamento operante observado durante a sessão é avaliado
à procura de sua possível relevância para os problem as específicos do cliente.
2. Férias do terapeuta. Alguns clientes, especialm ente aqueles com
histórias de rejeição e abandono, reagem fortem ente a interrupções no padrão
de contato com o terapeuta. Para esses clientes, a saída do terapeuta pode eliciar
m edo intenso, ansiedade, raiva e/ou tristeza, junto com pensamentos como “Você
não voltará” ; “Você está tentando fugir de m im porque eu sou ‘m au ’” ; “Você
estará-díferente e não se preocupará m ais com igo quando voltar” ; “Como pode
m e abandonar justo agora quando eu preciso tanto de você?”; “Eu não posso
vivèr sem você”; e “Eu não consigo tom ar conta de m im m esm o”. A maioria
70
Capítulo 3
dos com portam entos que acom panham este tipo de sentim entos (outros, além
do de falar neles) são CRB1 (ou seja, procurar isolar-se, quebrar coisas,
tentativas de suicídio).
3.E ncerram ento. O tipo m ais difícil de encerram ento é o de um
tratam ento incom pleto que term ina devido a fatores na vida do terapeuta tais
como m udança de em prego, de lugar, ou o fim de um estágio. Isso pode fazer
■aflorar os sentimentos descritos no item anterior de um modo ainda m ais intenso.
Em encerramentos de consenso, é o momento do terapeuta ficar atento em relação
aos CRBs evocados pelo término. Encerram entos podem trazer preocupações
acerca da independência e da auto-confiança, e tristezas acerca de perdas
anteriores, separações e mortes. É um a chance para o cliente aprender a dizer
adeus de um a m aneira adequada, através da expressão da gam a de sentimentos
causados pelo fim de um a relação especial, mas transitória. O m odo como o
cliente reage ao fim do tratamento tem grande probabilidade de tam bém ser uma
indicação de como ele reage aos começos ou términos em outras áreas de sua
vida pessoal.
4 .Contas.
O m odo como o cliente lida com o pagam ento da terapia
pode representar a form a como ele lida com o dinheiro em geral. O cliente paga
em dia? O cliente gerencia suas contas adequadamente? O assunto do preço
po d e ser in serid o no tratam en to de v árias m an eiras: (a) P o d e le v a r a
comportamentos de afastam ento e término que estão associados a declarações
do tipo “Eu não m ereço gastar este dinheiro comigo, outros m em bros da família
são mais importantes e m erecem muito m ais do que éu.” (b) Pode ser usado para
evitar sentimentos de intim idade em relação ao terapeuta - “Você está sendo
legal com igo porque eu lhe pago e esse é o seu serviço.” (c) Pode ser usado para
explorar o com portam ento e/ou sentimento evocado por produzir (ou não) um a
certa quantia de dinheiro; sentimentos de sucesso, inferioridade, incompetência,
insegurança, vergonha; competitividade com ou inveja do terapeuta, (d) Ao invés
de expressar diretamente para o terapeuta seus sentimentos negativos em relação
às contas, a esquiva pode envolver o atraso do cliente no pagam ento da terapia,
(e) O cliente pode tentar um a redução dos custos da terapia através da menção
do salário que recebe, (f) Se o cliente está em crise financeira, ele pode aceitar a
idéia de dever o pagam ento e dessa fonna receber um em préstim o do terapeuta?
Nessas ocasiões freqüentemente podemos observar comportamentos relacionados
ao dar e receber num a relação, e a não querer dever nada a ninguém , m esm o a
ponto de ter prejuízo pessoal.
Suplementação
71
5. “Erros ” ou com portam entos não intencionais do terapeuta, O ditado
“Tudo o que cai na rede da terapia é peixe” se aplica aqui. M esm o o m elhor
terapeuta pode chegar atrasado à sessão, passar do horário com o cliente anterior,
pensar em outra coisa enquanto o cliente está contando algo importante, esquecer
de fazer urna ligação que havia prom etido ao cliente ou agir de qualquer outra
maneira que faça com que o cliente se sinta pouco importante ou incompreendido.
Com o o seu cliente reagiria a um terapeuta que não fosse perfeito? Os erros do
terapeuta são ocasiões que podem evocar os seguintes CRBs: esquivar-se de
expressar diretam ente a raiva e frustração, problem as associados a sentim entos
de baixa auto-estim a, ou reagir aos erros do terapeuta de form a extremada,
decorrente de idealizar os outros a tal ponto que um a desilusão se tom a inevitável
Q ualquer um desses com portam entos pode interferir no desenvolvim ento de
relações estáveis.
6 . Silêncios e lapsos na conversa. A característica m ais evidente da
psicoterapia de adultos é que esta consiste em duas pessoas conversando entre
si. É com um essa conversa chegar a um beco sem saída e parar - ambos parecem
não ter nada m ais a dizer. E ssa situação pode evocar CRBs no cliente, além de
no próprio terapeuta. U m lapso na conversa evoca ansiedade aliada a um a certa
confusão que, p o r sua vez, dificulta ainda m ais o reinicio da conversa. A
ansiedade, confusão, e dificuldade em retom ar a interação são o problem a. O
CRB2 se constituiria em aprender a tolerai' mais os silêncios, extinguir a ansiedade
e/ou desenvolver um com portam ento que facilite a retom ada da conversa nas
ocasiões em que ela se interrom pe.
7. Expressão de afeto. Estam os nos referindo à expressão dos sentimentos
que resultam do contato com estím ulos que eliciam os respondentes cham ados
em oções e/ou descrições de sentim entos. N ossa visão das em oções é dada no
C apítulo 4, que traz um a explicação m ais com pleta e fom ece a racional para
nossos com entários nessa seção. A expressão de afetos tais como tristeza,
necessidade, vulnerabilidade, raiva e carinho, facilita o desenvolvim ento e a
m anutenção de relações m ais próxim as. Há, entretanto, m uitos fatores que
prejudicam essa expressão. A ssim , por exemplo, m uitos clientes têm problem as
em chorai- na frente dos outros ou em expressar adequadam ente sua raiva. Esse
desconforto 'em m ostrar suas em oções m ais fortes freqüentem ente dificulta o
tratamento. Clientes têm afirm ado que m ostrar sentim entos significaria “tomarse fraco”, “tom ar-se inferior”, “ser vulnerável dem ais”, “não ser capaz de parar”,
72
Capítulo 3
“ estar fora de c o n tro le ” ou “ ser m o tiv o de c h a c o ta ” . Inclu em -se nos
comportamentos de esquiva que estão associados à demonstração de afeto: mudar
o assunto; conversas interm ináveis e detalhadas sobre tópicos tangenciais; não
falar; focalizar um objeto no escritório; contagem regressiva de 1000 até 1, Em
alguns raros exemplos, o CRB é o uso deliberado que o cliente faz da raiva ou
das lágrimas, para controlar o com portam ento dos outros.
8 . Sentindo-se bem, estando bem. Para alguns clientes, sentir-se bem
ou estar bem serve como um estímulo aversivo. Isso motiva um comportamento
de esquiva que aparece na fo rm a de ser e agir de m aneira infeliz ou depressiva.
A lguns clientes contam que sentem ansiedade, medo, perda de controle e “um a
sensação de estar chegando ao fundo do p o ço ,” Suas histó rias revelam
experiências nas quais foram punidos de algum a form a por sentirem -se bem , e,
em conseqüência disso, atribuíram ao “estar bem ” suas propriedades de controle
aversivo. Por exemplo, um pai ciumento e com distúrbios psicológicos que se
afasta, ou, então, pune a criança que é bem sucedida. Estar bem tam bém poderia
sinalizar a perda do terapeuta, pois a terapia se encerraria. É desnecessário
dizer que o CRB 1 que consiste de depressão ou de infelicidade como form a de
esquivar-se ao estar bem ou o térm ino do tratam ento poderiam com prom eter
seriam ente o reforçam ento positivo a longo prazo para o cliente.
9. F eed b a ck p o sitiv o e d em o n stra çõ es de a feiçã o p o r p a r te do
terapeuta. Alguns clientes não reagem bem às expressões positivas vindas do
terapeuta. Eles podem reagir ao feedback positivo como se este fosse um reforçador
arbitrário, um sinal de exigências crescentes, ou uma indicação da retirada de
reforçamentos positivos. Os clientes, desta maneira, podem resistir, se esquivar,
ignorar ou ainda desconsiderar o que o terapeuta lhes tenha dito. Suas respostas
podem também estar acompanhadas de sentimentos de embaraço, inutilidade,
desconforto e de pensamentos como “Agora terei que corresponder a essas suas
expectativas ou você irá me desaprovar”; “Você não m e conhece realmente, e
quando conhecer, irá me deixar”; “Você está m e dizendo isto para ser agradável e
eu não acredito em você” . Todas essas respostas podem ser adquiridas em famílias
nas quais o feedback positivo tenha sido associado a conseqüências aversivas.
10. Sentindo-se íntimo ao terapeuta. Q uando o terapeuta demonstra
afeto, preocupação e compreensão, ou fica ao lado do cliente durante momentos
difíceis, o cliente pode sentir-se íntim o do terapeuta. E sses sentim entos
normalm ente são acompanhados de um repertório de m anter contato, que inclue
passar m ais tem po com a pessoa, contato ou proxim idade física; expressão de
S u p le m e n ta ç ã o
73
sentim entos positivos; fazer coisas para ajudar ou proteger a pessoa.. No entanto,
estes repertórios com portam entais podem ter sido punidos no passado por meio
de perdas, rejeições ou abandono. Além disso, as limitações da relação terapêutica
(limite de tem po, contato restrito à sessão, etc.) tam bém resultam em punição
para estes “rep ertó rio s de p roxim idade” . Q ualquer que seja a causa, essa
proxim idade é geralm ente um S d aversivo que m otiva o cliente a em itir um
com portam ento que a rem ova. Com o essa esquiva pode ser difícil de detectar
pois m uitos desses com portam entos de proxim idade não ocorrem durante a
sessão, o terapeuta guia-se pelos sentim entos colaterais. Q uando você se sente
próxim o ao cliente, ele se com porta de tal m aneira a facilitar essa proxim idade,
ou ele em ite com portam entos que dim inuem seus sentim entos de proxim idade?
Um a variedade de respostas de esquiva pode resultar no distanciamento, incluindo
tom ar-se crítico, sentir raiva, sentir-se entorpecido p or dentro e sem sentimento
nenhum , dizer que não precisa m ais com parecer às sessões ou fazer comentários
que desm ereçam o valor da relação apenas porque esta é um a relação profissional.
U m prim eiro passo para resolver este problem a está em o cliente aprender a
falar sobre a relação funcional (C RB 3s), com o no exemplo “N este instante eu
estou m e sentindo próxim o a você, estou querendo ficar com você, m as sei que
isso não é possível. Isso m e entristece, então quero afastar você de m im ”.
11. C aracterísticas do terapeuta. C ertas características estáveis do
terapeu ta com o idade, sexo, raça, peso, atrativos físicos, e tendências de
com portam ento p ara ser falante ou quieto, gentil ou confrontador, expansivo ou
discreto, liberal ou inflexível, podem evocar CRB. P o r exemplo, um terapeuta
m ais velho pode fazer lem brar do pai; um terapeuta falante ou confrontador
pode evocar falta de assertividade, além de sentim entos de intim idação e
v u ln e ra b ilid a d e ; u m te ra p e u ta m agro p ode c a u sar inveja, retraim en to e
com entários do tipo “Você não é capaz de entender m eu problema” , a um cliente
acim a do peso. Todo te ra p e u ta deveria ten tar p en sar sobre suas próprias
características e procurar pelos possíveis efeitos evocativos de CRB.
12. E ventos incomuns. A lgum as vezes o CRB m ais im portante pode
o co rre r sob co n d iç õ e s p o u co com uns. A lguns exem plos desses eventos
idiossincráticos podem ser. encontrar o terapeuta com outra pessoa fora do
consultório; a terapeuta engravidar, quebrar um a perna, ou ter que viajar por
causa de um a em ergência n a família. Eles podem servir como estímulos aversivos
m uito fortes que provocam com portam entos tais com o sentim entos intensos de
posse, rivalidade, dependência, desam paro e m ortalidade.
74
Capítulo 3
13.
Sentim entos ou privacidade do terapeuta. As respostas privadas
do terapeuta em relação ao cliente podem ser um a boa fonte de informações
sobre os comportamentos clinicamente relevantes. Sentimentos de tédio, irritação
ou raiva no terapeuta podem indicar que as m aneiras pelas quais o cliente está
se com portando têm grande probabilidade de fazer em ergir esses m esm os
sentim entos em outras pessoas. P or exem plo, um a cliente reclam a que tem
dificuldade em fazer amizades e não entende o porquê. Você nota que facilmente
se entedia com ela e sua atenção se dispersa, porque ela fala m onotonam ente
sobre trivialidades por um longo período, sem se preocupar se você está ou não
in teressad o no assunto. A ssim , um a au to -o b serv ação pode a u x iliar na
discriminação destes com portam entos-problem a e tam bém pode ser usada para
detectar as melhoras (CRB2), como por exem plo, falar de m odo mais animado
por um período de tempo menor, e form ular perguntas.
Em resum o, as situações terap êu ticas que foram analisadas são
representativas das diversas maneiras pelas quais os estímulos associados à
terapia podem evocar CRB no cliente. O sistem a de classificação do com por­
tam ento verbal apresentado na prim eira parte deste capítulo pode ajudar a
aum entar a consciência do CRB através da focalização da atenção do terapeuta
nas causas sutis das verbalizações do cliente. As auto-observações dos clientes
no aqui e agora, e tam bém suas com parações dos eventos na terapia com a vida
cotidiana, são descrições que podem ajudar na generalização dos ganhos obtidos
na terapia.
4
O Papel de Emoções e
Lembranças nã Mudança do
Comportamento
Em oções e lem branças sem pre ocuparam um a posição central em psicoterapia.
A utilidade delas é atraente, contudo sua definição e mensuração são enganosas.
Os fundam entos behavioristas radicais da psicoterapia analítica funcional (FAP)
trazem um a perspectiva diferente sobre esses tópicos e sobre a sua relevância
na prática clínica.
EMOÇÕES
M uitas pessoas erroneam ente acusam os behavioristas radicais de
sustentar a teoria de caixa preta da emoção. D e acordo com esta visão, emoções
ocorrem dentro da p essoa (caixa preta), e p o r esta razão estão fora do interesse
do analista do com portam ento. Conform e foi m encionado no Capítulo 1, na
realidade são os behavioristas m etodológicos que sustentam essa visão. Em
oposição, b eh av io ristas rad icais pen sam que “como as pessoas sentem é
freqüentem ente tão im portante quanto aquilo que elas fazem ” (Skinner, 1989,
p. 3).
75
76
Capítulo 4
Neste capítulo, o term o sentir é usado tanto como verbo quanto como
substantivo. Quando usado como um verbo, sentir é uma atividade, um tipo de
ação sensorial, tal qual ver ou ouvir. Quando sua função é a de substantivo,
sentir’ é usado como sinônimo dos termos emoção e afeto. D a mesma forma que
existem objetos que são vistos, o sentir substantivo é o objeto que é sentido,
como em “eu sinto um sentim ento” . Qual é o objeto sentido, entretanto, quando
nos sentimos deprimidos? Outros objetos, como uma casquinha de sorvete, podem
ser vistos, sentidos e provados; ou seja, o objeto (a casquinha de sorvete) pode
ser conhecido de várias m aneiras. Se não estiverm os seguros do que estamos
vendo, podem os prová-lo ou m esm o perguntar a alguém o que ele é. Este não é
o caso quando o objeto é depressão ou ansiedade - nós podem os apenas sentilas.
A visão behaviorista afirm a que aquilo que sentim os é o nosso coipo.
De nossos três sistemas nervosos sensoriais - exteroceptivo, interoceptivo e
proprioceptivo - os dois últim os estão envolvidos com processos do sentir. O
sistem a nervoso proprioceptivo conduz estimulação dos músculos, articulações
e tendões, e está envolvido com m ovim ento e postura. O sistem a nervoso
interoceptivo conduz estimulação das vísceras, tais como a bexiga e o estômago,
tanto quanto das glândulas, dutos e sistema vascular. Esses dois sistemas nervosos
são estim ulados pelas partes do corpo envolvidas no m edo, raiva, depressão,
ansiedade, alegria, e assim p o r diante. E ntretanto, relativam ente pouco é
conhecido sobre quais órgãos específicos estão envolvidos com os vários
sentimentos que experimentamos. Esta escassez de conhecimento é especialmente
evidente quando comparada ao que sabemos sobre o sistem a exteroceptivo. Este
terceiro sistem a nervoso sensorial está envolvido com o ver, ouvir, sentir cheiro,
e tatear, e os órgãos sensórios específicos são claram ente identificáveis como o
olho, ouvido, nariz e pele.
Até este ponto nós discutim os (1) a atividade de sentir ou perceber a
emoção e (2 ) o objeto que é sentido - o corpo. A questão que levantam os agora
é, “Com o o coipo entra naquele estado particular que é então sentido?” N ossa
resposta presum e que o estado do corpo seja “um produto colateral de causas
am bientais” (Skinner, 1974, p. 242). D essa forma, para cada comportamento
há um estado corpóreo corresp o n d en te. Q uando estam os envolvidos no
comportamento que classificamos como falar, por exemplo, o sistema músculoesquelético e o sistem a nervoso estão em um estado particular que m uda de
N ota do tradutor. N o caso de “feeling” enquanto substantivo, a lingua portuguesa adm ite a tradução
pelos term o s “sen tir” e “ sentim ento” , que tam bém serão u tilizados, dependendo da situação.
Emoções e L em branças na M u d a n ç a do C o m p o rtam en to
77
acordo com as palavras que estão sendo ditas. Q uando nós dizem os a palavra
“alô”, os vários m úsculos necessários para esta tarefa estão num a posição
particular, que então se m odifica conform e continuam os a dizer, “Como vai
você?” De maneira similar, quando estamos comprometidos em comportamentos
operantes e respondentes de estarmos emocionados, há tam bém estados do"corpo
que são correlatos àquelas respostas. Para fins ilustrativos, estes estados
corpó reo s podem inclu ir m udanças na taxa cardíaca, dilatação da pupila,
constrição das v eias, secreções g landulares e contrações m usculares. N a
realidade, o presente estágio do conhecimento impede qualquer medida fisiológica
precisa desses estados. Tudo o que é relevante para nossa discussão é que um a
p esso a sente diferentes estados corpóreos, conhecidos apenas por ela, em
correspondência com em oções diferentes.
R espostas em ocionais operantes e respondentes são evocadas por
situações particulares. P or exem plo, Skinner (1953, p. 166) descreveu um a
situação na qual um hom em foi criticado no em prego. Este hom em reagiu com
u m padrão de resposta em ocional que é cham ado de raiva. E ste padrão incluiu
as seguintes respostas: ( 1 ) com portam entos respondentes - o hom em ficou
verm elho, suas m ãos transpiraram , ele parou de digerir seu alm oço, seu rosto
assum iu a expressão característica de raiva (enrugou a testa, inflou as narinas,
crispou os lábios), e ( 2 ) com portam entos operantes - falou secam ente com seus
colegas de trabalho, bateu um a porta, chutou um gato e assistiu a um a briga de
ru a com especial interesse. H avia um estado corpóreo correlato a este padrão de
respostas operantes e respondentes. Se o hom em se envolvesse com a atividade
de sentir seu estado corporal, então ele se sentiria com raiva. Entretanto, outras
pessoas que observaram esta p essoa poderiam dizer que ele estava com raiva
m esm o que o hom em não tivesse sentido a raiva éle próprio.
E sta descrição das respostas do hom em à crítica no em prego, incluindo
seus com portam entos operantes e respondentes, não pretendeu ser um a descrição
concisa e com pleta da raiva. A o invés disso, a descrição é apenas as respostas
desse hom em nesta oportunidade, que são vistas por ele próprio e pelos outros
com o sendo raiva. Em geral, a variedade e as nuanças das em oções sugerem que
tentar classificá-las definitivam ente seria quase im possível.
A lgum as vezes, os clientes queixar-se-ão que sentem de um a forma,
m as agem de outra. Este com entário parece não fazer sentido de um ponto de
vista com portam ental, um a vez que tudo aquilo que pode ser sentido são estados
corporais que são colaterais a ações (respostas). D essa form a, o cliente tem dois
estados corpóreos qiie podem ser sentidos, m as diz que som ente um deles é um
78
Capítulo 4
sentimento. Um a interpretação com portamental deste comentário é que estados
corporais associados com respondentes são experienciados m ais intensamente
que estados corporais associados a operantes. Freqüentemente o comportamento
operante afeta o com portam ento respondente, mas quando isso não acontece, o
resultado é sentir de um a form a e agir de outra. Por exemplo, suponha que o
hom em raivoso do exemplo anterior tenha se com portado de todas as formas
descritas, com exceção de que ele afagou o gato e forçou um sorriso amistoso.
Desta feita, se ele disser que agiu amigavelm ente, mas sentiu-se com raiva, o
sentimento ao qual ele se refere seria aquele relativo aos estados corporais
associados à raiva, e não aos estados coipóreos associados ao sorrir e afagar o
gato. Se pudeim os assum ir que ele realm ente sente os colaterais coiporais do
afagar e sorrir tanto quanto outras respostas, seiia mais correto se ele dissesse,
“Eu sinto dois sentimentos e eles são diferentes, mas um a das form as que eu
sinto (colaterais de sorrir e afagar) não é o m eu sentim ento verdadeiro” . A base
destas duas formas diferentes de sentimentos tem a ver com as razões para o seu
afagar o gato e sorrir. Em particular, ele poderia estai' consciente de que o
afagar e o sorrir são resultantes de contingências sociais para fazê-lo “ficar
calmo e civilizado”. Ele não vê os sentim entos associados ao comportamento
causado por tais contingências como relevantes para os seus sentim entos
verdadeiros.
Conforme está esquematizado abaixo, problemas clínicos algumas vezes
envolvem o cenário oposto; quer dizer, o sentimento ou a sensação das respostas
públicas que estão sob controle é o que o cliente relata ser o sentimento verdadeiro
e as respostas privadas não são observadas (por exemplo, o hom em relataria
sentir-se afetuoso em relação ao gato e não perceberia seus sentimentos de raiva).
N este caso, o cliente é descrito com o não estando em contato com seus
sentimentos, e a tarefa do terapeuta é m udar o controle para esses estados
corporais que são mais privados.
A p ren d en d o os Significados dos S entim entos
O processo pelo qual aprendem os o que são nossos sentim entos é de
m aior relevância para o psicoterapeuta do que a atividade de sentir. N ós não
nascemos sabendo o que nossas emoções são, assim como não sabemos ao nascer
o que é um a árvore. Isto precisa ser ensinado por nossos páis. Visto que o objeto
a ser sentido é privado, o pai que tentai-ensinar um a criança a identificar (tatear)
Emoções e Lembranças na Mudança do Comportamento
79
sentim entos está em desvantagem . Ao ensinar um a criança a tatear um objeto
público, com o um a árvore, o pai pode apontar para a árvore, pronunciar seu
nom e, e refo rçar um a resposta parecida, tal com o “ávole” . Depois de muitas
experiências como esta, o estímulo público, a árvore, controla a resposta “árvore”.
N o caso de u m sentim ento, os estím ulos que esperam os que ganhem controle
são estados corpóreos privados. Para cum prir este objetivo, os pais devem olhar
para estím ulos públicos, supor o que está ocoirendo dentro da criança com base
n e sse s estím u lo s p ú b lic o s, p ro n u n ciar seus nom es e refo rç ar a resposta
apropriada. P o r exem plo, os pais podem olhar para um estímulo público, tal
com o a hora do dia e o choro da criança, e supor que o estímulo privado de fome
esteja presente. O pai então encorajará a criança a dizer “bebê fome” . Finalmente,
se os pais forem sensíveis, o estímulo privado de fome poderá ser tateado como
“eu estou com fom e” .
Tal processo de aprendizagem tem vários resultados. Prim eiro, o tatear
e a discrim inação de sentim entos não alcançarão a m esm a confiabilidade do
ta te a r o b jeto s p ú b lico s, tais com o pedras e aviões. Segundo, no caso de
sentim entos, os estím ulos públicos podem inadvertidam ente ganhar controle
parcial do tato porque os pais não podem estar sem pre corretos a respeito de
qual sentim ento privado está presente com base no estímulo público. Por exemplo,
algum as vezes os pais dirão “o bebê está feliz” com base no seu sorriso, quando
o estím ulo pxivado é som ente um a dor de barriga devida a gases. Em outras
ocasiões, seu sorriso é um a indicação precisa de que a alegria privada está
presente e d izer “o bebê está feliz” está m ais próxim o do acerto. Conform e esta
criança se desenvolve, o significado da palavra fe liz vai depender do quão
freqüentem ente os estados corpóreos privados de alegria estiverem presentes
quando ela fo r instigada a dizer “feliz”. Certos m om entos nos quais esta criança
estiv er de fato doente ou com dor em um am biente aparentem ente “feliz” (por
exem plo, u m a festa de aniversário) interferirão, com seus estados corpóreos
privados ganhando controle sobre o seu tatear preciso de sentimentos, a m enos
que alguém perceba e diga, “oh, você parece estar doente” . Em essência, o
significado de felicidade para esta criança é o resultado do treino discriminativo
sim ilar àquele observado em tarefas de form ação de conceito. N essas tarefas,
estím ulos com plexos são apresentados num a série de tentativas (por exemplo,
grande círculo azul, pequeno círculo azul; grande círculo verm elho, pequeno
círculo azul; um grande triângulo verm elho, pequeno triângulo verde) nas quais
apenas aspectos específicos do estímulo são relevantes ao conceito (por exemplo,
“m aio r que” ). D epois de um núm ero suficiente de tentativas, esses aspectos
relevantes passam a controlar o conceito.
80
C apítulo 4
U m a vez que os pais usam estím ulos públicos para identificar o
sentimento a ser tateado, a criança pode inadvertidam ente ficar sob controle
parcial desses mesmos estímulos. Este fenômeno de controle público acidental
sobre um sentimento é com um enle reconhecido na literatura de pesquisa sobre o
controle da fome. Estím ulos públicos, tais como a hora do dia (hora do almoço)
e a atratividade da com ida, podem resultar em “estou com fom e”. Conforme
está detalhado no Capítulo 6, não é sim plesm ente a resposta verbal que é
controlada m as a própria experiência; ou seja, a pessoa realm ente sente a fome
como vindo de dentro, m esm o quando a resposta é am plam ente controlada pelo
relógio indicando a hora dò almoço e muito pouco por um estôm ago cheio. Uma
implicação interessante desta visão é que, se fosse possível para alguém sentir
os sentimentos de outro, eles poderiam ser sentidos como similares ou diferentes,
dependendo das fontes de controle. Assim, se a sua fome fosse controlada por
estím ulos privados gerados no seu estômago, e você pudesse sentir a fom e de
outrem controlada por estím ulos externos, você descobriria que essas duas
experiências são muito diferentes. Os únicos sentim entos em com um seriam
aqueles associados com disposições para comer e procurar comida.
D adas as condições sob as quais o tatear sentim entos é adquirido,
qualquer emoção pode inadvertidamente ficar parcialmente sob controle público,
resultando num a confusão ou m á nom eação da experiência interna real.
S entim entos com o C au sas de C o m p o rtam en to
U m a em oção ou sentim ento é um estado do corpo. Para cada resposta
há um estado do corpo que a acompanha. Por exem plo, quando se corre, um
estado que acom panha o corpo pode ser sentido. Em bora tanto o correr quanto
os sentimentos colaterais estejam presentes, nós usualm ente não dizem os que o
correr seja causado pelo sentim ento. Ao invés disso, nós podem os dizer que
estam os correndo para alcançar o ônibus. Ou seja, não atribuím os um papel
causal aos sentim entos quando, como no caso do correr para alcançar o ônibus,
pode ser identificada um a clara causa externa.
H á outras ocasiões, entretanto, nas quais as causas externas não são
identificadas ou claram ente conhecidas. Por exem plo, um a m ulher que corre
diariam ente pode ter esquecido ou nunca ter estado consciente das condições
externas (por exem plo, sua m elhor am iga que corre tam bém , seu corpo ficando
m ais firm e, cum prim entos das outras pessoas dizendo que ela está com melhor
aspecto) que a levam à prática de correr todos os dias. Sob estas condições,
Emoções e Lem branças na M u d an ça do C o m p ortam ento
83
tendem os a atribuir a causa aos estados corporais colaterais que são sentidos.
A ssim , a praticante da corrida pode dizer que corre porque aprecia fazer isso.
De m odo semelhante, uma pessoa que está com endo pode dizer que está fazendo
isto porque está com fome. Isto geralm ente significa que os antecedentes c!e
am bos, tanto dos sentim entos colaterais da fom e quanto do comer, nã© são
identificados, e é dado um status causal ao sentimento.
O u tra s situ a ç õ e s tam b ém c o n d u z e m a a trib u iç õ e s c a u sa is dos
sentim entos. F reqüentem ente, o sentim ento pode ser sentido antes que o
com portam ento seja em itido. N ós podem os estar com fome sem comer, com
raiva sem sermos agressivos, e com medo sem fugirmos. Nesses casos, tendemos
a agir, m as não o fazem os. Já que a ação é ausente ou o sentim ento precede a
ação, é tentador atribuir status causal ao sentim ento.
O problem a em atribuir status causal a estados corpóreos colaterais é
que isto pode desviar a atenção dos fatores que causam tanto o com portam ento
(ou a inclinação para agir) quanto o sentim ento c o lateral
P or exem plo, Jan, um a cliente do segundo autor que teve problem as
diretam ente resultantes da busca de seus objetivos, atribuía seu insucesso a um a
“falh a fatal de índole, um a inabilidade de suportar a m im m esm a” . D eter-se e
tentar m udar esses seus estados internos, que supostam ente eram responsáveis
pelo fracasso em term inar a graduação e a escola profissional, apenas fez com
que Jan se sentisse pior a seu respeito e m ais im potente. Eu perguntei o que a
m anteve durante seis anos em terapia comigo, e ela respondeu, “Coisas diferentes
em ocasiões diferentes - m eus amigos todos fazendo terapia, hábito, desespero,
esperança, um sentim ento de m ovim ento, m eu apego a você, ser valorizada por
você” . E u sugeri a ela que ninguém poderia realizar tarefas difíceis num vácuo,
sem suporte externo, e que ela havia tido o m eu apoio e o de seus am igos, que a
ajudaram através de tem pos difíceis n a terapia. P or outro lado, seus pais não a
apoiaram em sua escolha profissional, e ela não ficou na escola por tempo
s u fic ie n te p a ra f a z e r a m ig o s o u p a ra c o n s e g u ir m u ita s e x p e riê n c ia s
recom pensadoras. Por ter focalizado as condições externas que a conduziram a
sucessos e fracassos, e por olhar para seus estados internos ou sentim entos
com o colaterais, Jan ficou m ais esperançosa de poder m udar seu comportamento.
M esm o que sentim entos não causem com portam ento, conform e foi indicado
anteriorm ente, a expressão dos sentim entos tem um papel im portante na FAP.
H ayês (1987) baseou um sistem a terapêutico em problem as causados
p o r clientes que vêem seus sentim entos com o causas. De acordo com H ayes, a
v isão in co rreta da n atu reza causal dos sen tim entos conduz os clientes a
82
Capítulo 4
esforçarem -se para elim inar pensam entos e sentim entos, de form a a conseguir
m udar seus com portamentos e ter um a vida melhor. Os esforços dirigidos para
a elim inação de sentimentos, no entanto, são fundam entalm ente errados porque
o problem a não é o sentimento, m as sim os esforços do cliente para m odificar o
sentim ento. O sistem a terapêutico de Hayes, distanciam ento com preensivo, é
um a abordagem inventiva que usa m étodos m etafóricos e experienciais para
enfraquecer o enfoque ineficaz do cliente para resolver problem as.
E x p ressan d o sentim entos
A expressão de sentimentos refere-se a um continuum de comportamento.
U m a ponta do continuum é referida com o com unicação de sentimentos. Esses
são comportamentos operantes verbais cujo propósito é inform ar a outra pessoa
sobre os sentimentos do falante. “E u sinto raiva” e “E u amo você” são exemplos.
N a o u tra p o n ta do continuum estão as d em onstrações de sentim entos com portam entos respondentes não verbais que são eliciados automaticamente.
Esses respondentes podem incluir o rubor, a risada, expressões faciais primitivas,
e soluçar de tristeza. Localizados em pontos diferentes nesse continuum estão
as respostas que são parcialm ente respondentes, m as que foram modeladas
tam bém pelas contingências. Exemplos são, o choro que tenha sido parcialmente
m odelado pela atenção que recebe, o “nó na garganta” pelo pesar, a exclamação
“ai” que é eliciada p o r um estímulo doloroso, m as que tam bém m ostra os efeitos
das contingências (por ex., tal expressão recebe a form a “ai-yoh” em chinês).
E xpressar sentim entos pode ser m uito útil em algum as situações,
particularmente no desenvolvimento e manutenção de relações de intimidade. Já
que ter dificuldades em relacionar-se com intimidade é um problema comumente
apresentado, expressões inadequadas de sentim entos são freqüentem ente
focalizadas, na FAP. Relações íntimas, por definição, envolvem uma sensibilidade
aos efeitos do comportamento de uma pessoa sobre outra. Considerando-se o
protótipo, os pais são bastante conscientes dos efeitos reforçadores e punitivos de
seus comportamentos sobre seus filhos. O comportamento dos pais,, por sua vez, é
modelado pela criança. Esse processo ocorre em paxte porque os pais são sensíveis
às nuanças das reações da criança. Entretanto, não importa o quão sensível o pai ou
a mãe seja, a intimidade somente poderá ocorrer se a criança expressar sentimentos.
Na relação íntima adulta, expressar sentimentos tem o mesmo papel.
U m a expressão de sentim entos tam bém aum enta a probabilidade de
que as necessidades de um a pessoa sejam atendidas (obtendo reforçam ento de
Emoções e Lembranças na Mudança do Comportamento
83
outros). A s necessidades podem ser satisfeitas porque um a expressão efetiva
de sentim entos pode evocar no ouvinte alguns dos m esm os estados corpóreos
que estão sendo expressos. Esse processo é útil porque os ouvintes podem
então p redizer m elhor o com portam ento do falante perguntando a si próprios
( 1 ) com o eles se comportariam se estivessem sentindo o que está sendo expresso,
ou ( 2 ) que tip o s de com portam entos acom panharam a expressão de tais
sentim entos p o r essa pessoa no passado. C onhecer bem a outra pessoa, por
sua vez, envolve ser apto a predizer o que a outra pessoa fará (incluindo predizer
o que poderia ser reforçador para aquela pessoa). Relações íntim as parecem
exigir bastante conhecimento do que esperar da outra pessoa e, por conseguinte,
exigem expressão emocional.
D os dois tipos de expressão em ocional (com unicar e dem onstrar), as
declarações verbais (com unicações) tais com o “Eu estou feliz” e “E u estou
triste” têm a vantagem de serem facilm ente discriminadas. A utilidade dos tatos
sim ples, entretanto, é lim itada porque a variedade e as nuanças de sentim entos
excedem em muito a essas simples descrições concentradas em um a única palavra.
D escrever o estado corpóreo, com freqüência, não é tão efetivo quanto descrever
analo g ias, m etáforas, ou condições externas que podem produzir aquele
sentim ento. Seguem -se exem plos de tais descrições feitas por nossos clientes:
(1) Sentim ento de não ser suficientem ente adequado - “É como quando você
tenta colocar um a porca num parafuso de aproxim adam ente o m esm o tam anho,
m as a rosca não é exatamente a mesma. Eles quase apertam e você fica tentando,
m as eles não se ajustam ” . (2) M edo - “É com o se eu estivesse andando num a
viela escura e ouvisse passos atrás de mim , e eu andasse m ais rápido e ouvisse
os passos m ais rápidos tam bém ”. (3) T en o r - “É como se eu estivesse sozinho
na casa, e a eletricidade term inasse. Eu posso ouvir um invasor se m ovendo
pelo piso de baixo, e eu penso que ele está tentando me matar. Eu pego o telefone
para p ed ir socorro e a linha foi cortada” .
P or outro lado, há desvantagens no uso da com unicação de sentimentos
com o u m a form a de expressão em ocional. A principal é que o significado do
sentim ento pode ser altamente idiossincrático devido à ambiguidade do estímulo
controlador. A declaração “Eu estou deprim ido” de um a pessoa pode ter pouco
em com um com um a declaração idêntica de outra. U m a desvantagem adicional
é que é fácil enganar o outro com o com portam ento verbal. P or exemplo, “Eu te
am o” pode ser dito som ente para conseguir um a relação sexual ou para ganhar
presen tes caros. A lém disso, a sensibilidade do com portam ento verbal às
contingências sociais pode facilm ente resultar em ser dito o que é socialm ente
apropriado ao invés de se dizer aquilo que realm ente a pessoa está sentindo.
84
C apítulo 4
A vantagem da dem onstração de sentim entos (enquanto oposta à
com unicação de sentimentos) como um m étodo de expressar sentimentos é
que ela (a demonstração) é menos suscetível às contingências e dessa forma é
m ais espontânea e m enos provável de ser m al-interpretada. Por exemplo,
em b o ra seja p o ssív el fin g ir um ch o ro , é re la tiv a m e n te d ifícil fazê-lo
convincentemente. De m aneira similar, é quase impossível parar um rubor a
despeito das suas conseqüências negativas [que esta m udança corpórea possa
receber]. Para a m aioria das pessoas, a extensão e as nuanças das emoções
ex p ressas são m aio res através da sua d em o nstração do que através de
descriçõ es verbais. P o r essas razõ es, a dem onstração de sentim entos é
particularmente útil na FAP como indicativa de contato com variáveis importantes.
E v itan d o sentim entos
N ós já discutimos um a das causas para as dificuldades do cliente em
expressar sentimentos; ou seja, os clientes podem não saber como se sentem
porque nunca aprenderam a ficar sob o controle privado de seus corpos. A
expressão dim inuída de sentim entos pode tam bém resultar de repreensão em
num erosos contextos. Enquanto crianças, expressões de sentim entos podem ter
sid o p u n id a s p e lo s p a is p o r se re m in c o n v e n ie n te s ou p e rtu rb a re m .
Paradoxalm ente, a principal fonte de punição é derivada de um dos usos da
expressão de sentimentos discutidos na seção anterior - expressar sentimentos
permite aos outros nos conhecerem e predizerem nossos comportamentos. Embora
tal conhecimento conduza ao reforçamento positivo numa relação íntima, também
pode conduzir à punição, se o conhecim ento for usado contra nós. Talvez esta
seja a razão pela qual a expressão emocional é algumas vezes descrita como
“estar vulnerável”.
A expressão de sentim entos é freqüentem ente punida na vida adulta
po rq u e a m aior p arte das culturas estab elece grandes pro ib içõ es p a ra a
dem onstração de emoção (Nichols & Efran, 1985). A razão para esta punição
cultural é que a dem onstração significa que a pessoa está “fora de serviço” e
não está atendendo à tarefa que lhe foi designada. Isto parece ser verdadeiro
para um a vasta gam a de situações. U m gerente de m ercearia que responde com
emoção por que um a cliente lhe lem bra sua mãe abusiva, sofrerá conseqüências
negativas, assim como um piloto de avião que “sucum be” em um a emergência.
E stá freqüentem ente nos m elhores interesses da cultura lim itar a expressão de
Emoções e Lem branças na M u d a n ç a do C om portam ento
85
afetos.. O lado ruim de lim itar a expressão dos sentim entos é que isto causa
problem as nas relações, particularm ente nas intimas.
Quando a expressão dos sentimentos é punida, as condições que evocam
respostas em ocionais tam bém se tornam aversivas e são evitadas. Por exemplo,
se um a criança é punida por sentir-se e agir afetivamente, então as situações que
evocam afeição podem tam bém se tornar aversivas. Sentir afeição (os estados
corpóreos associados com afeição) pode tam bém se tom ar aversivo devido à
sua associação com punição. E im portante notar que sentim entos aversivos não
causam a esquiva de afeição; a punição causou tal esquiva tanto quanto os
sentim entos aversivos. Para superar este problem a, não se deve enfocar os
sentim entos aversivos diretam ente porque eles são sim plesm ente um estado
colateral, m as sim as condições que evocaram os sentim entos aversivos. D este
m odo, a m eta seria o indivíduo não m ais esquivar-se de condições que evocam
afeto de form a que novas conseqüências reforçadoras positivas possam ser
experimentadas.
Falando de m aneira geral, tam bém é de interesse da pessoa subm etida à
p u n ição p o r e x p ressar sen tim en to s, lim itar tais expressões. O pro cesso
comportamental envolvido na limitação de expressão afetiva é a esquiva simples.
A ssim com o um rato esquiva de correr num a pista porque isto term inou em
punição e, em seu lugar, corre em outra, as pessoas esquivam -se de prestar
atenção a certos aspectos de um a situação evocativa em favor de prestar atenção
a outros. Tecnicam ente, pode-se (1) esquivar às condições que trazem à tona o
estado corpóreo (por exem plo, fazer sexo), ou ( 2 ) não esquivar das condições
precipiíantes, mas esquivar-se de sentir o estado corpóreo (por exemplo, “desligarse” durante o sexo). Os problem as dos clientes freqüentem ente são resultado
destas esquivas e atenções seletivas. Como resultado, o foco do tratamento clínico
freqüentem ente recai sobre as experiências e lem branças m ais aversivas dos
clientes - justam ente aquelas evocadas por situações às quais o cliente se esquiva
de prestar atenção.
G r a u de c o n ta to com v a riá v e is de contro le
A FA P im p lica em ap ren d izag em de no v o s c o m p o rtam en to s. O
com portam ento, entretanto, não pode ser separado de seu contexto. Para o
terapeuta que se utiliza da FAP, o m esm o com portam ento em dois contextos
d ife re n te s tê m sig n ific a d o s co m p letam en te d istin to s. P o r e ssa raz ão , o
86
Capítulo 4
aprendizado de novos com portam entos durante a FAP não será útil a menos
que o contexto da sessão seja relevante para a vida cotidiana do cliente. Por
exem plo, a abordagem do treino de habilidades sociais para assertividade pode
ou não ser eficiente. Quando isto não acontece, provavelm ente é porque um
novo com portam ento foi aprendido fora do contexto relevante. O u seja, os
clientes foram instruídos para agirem assertivam ente em um contexto diferente
daquele no qual sua assertividade seria necessária. Seguindo as instruções do
terapeuta para serem assertivos, eles estão, de fato, sendo complacentes. Do
ponto de vista da FAP, esses clientes teriam um a chance m elhor de aprenderem
a ser assertivos na vida cotidiana se eles não quisessem fazer o exercício de
asserção e se recusassem a fazê-lo. Assim, é im portante ter o contexto da vida
diária operando durante a sessão, A presença do CRB é o m elhor indicador do
contexto da vida diária. O CRB, por outro lado, estará presente à m edida em
que as variáveis de controle forem acessadas.
O que é entendido por grau ou quantidade de contato não é mais elaborado
do que a relação entre a saliência de um estímulo discriminativo (Sd) numa caixa de
Skinner e o contr ole exercido por aquele estímulo. Se um a lâmpada de baixa potência
for usada para sinalizar a disponibilidade de comida para a pressão à barra e for
ligada enquanto o rato estiver de costas para ela, a luz terá um pequeno ou nenhum
efeito sobre o comportamento de pressionar a barra. Outra forma de descrever a
relação fraca entre a luz sinalizadora e a pressão à barra é que o rato está apenas
parcialm ente, se tanto, em contato com o estímulo. M ais controle sobre o
comportamento pelo Sd pode ser visto durante um a apresentação subseqüente da
luz se sua intensidade for aumentada e se o rato estiver orientado em sua direção.
Então, nós diríamos que o rato teve mais contato com as variáveis de controle.
Como um a analogia para a situação terapêutica na qual um cliente
aprende a reagir de um a nova forma, digam os que nós quiséssem os m udar o
com portam ento do rato no exemplo prévio de m aneira que ele coce sua cabeça
sem pre que a lâm pada acenda, em lugar de pressionar a barra. O procedimento
de retreino deveria envolver o reforçamento do coçar somente quando a lâmpada
estivesse acesa. Desnecessário dizer que seria im possível fazer o coçar ficar sob
controle da luz e elim inar a pressão à barra de um a só vez sem que o rato
estivesse em contato com a luz. N ão haveria oportunidades de treino. A situação
é com parável à dificu ld ad e que um clien te teria em aprender um novo
com portam ento durante a sessão quando os estím ulos de controle relevantes
não estivessem presentes. Por exemplo, um cliente cujos comportamentosproblem a somente sejam provocados por situações íntim as, terá dificuldade em
Emoções e Lembranças na Mudança do Comportamento
87
aprender novos com portam entos se a situação provocadora de intim idade não
ocorrer durante a sessão.
E ntrar em contato com as variáveis de controle pode evocar tanto
com portam entos operantes quanto .respondentes. P or exem plo, a lâm pada na
caixa de Skinner serve concomitantemente como um Sd que controla o pressionar
a barra operante e tam bém como um estímulo condicionado que provavelm ente
elicia salivação e outras m udanças autonôm icas. Sim ilarm ente, o cliente que
entra em contato com as variáveis de controle pode tam bém apresentar tanto
comportamento operante quanto respondente. Por exemplo, a ocorrência de uma
interação íntim a entre o terapeuta e um cliente com problem as de intim idade
pode produzir dois efeitos simultâneos. U m pode ser a expressão de sentimentos
envolvendo lágrim as e tristeza (respondentes), enquanto o outro pode ser um
CRB envolvendo um a tentativa de term inar a terapia (operante).
D ependendo do grau de contato, a luz terá m ais ou m enos efeitos
discrim inativos e eliciadores e em conseqüência, m ais ou m enos efeitos sobre o
com portam ento do rato. D e m odo similar, durante a FAP um cliente pode ter
m aior ou m enor contato com variáveis de controle. Correspondentem ente, o
cliente apresentará m ais ou m enos dos operantes ou respondentes associados.
A lém de prover novas oportunidades de aprendizagem , a lim itação da
esquiva e o contato crescente com as variáveis de controle têm o efeito de diminuir
a esquiva generalizada e aum entar o contato generalizado com o m undo. É
nossa suposição que a esquiva em um a área da vida tenha m ais repercussões
generalizadas, diferentes para cada pessoa. Por exem plo, se alguém evita chorar,
pode tam bém evitar dem onstração de afeto em geral, e deve ter dificuldade em
experim entar sentim entos intensos de qualquer tipo, incluindo prazer e alegria.
O caso de Jonathan, um cliente do segundo autor, fornece um exemplo
específico do quanto a esquiva em uma área aparentemente pequena apresenta
ramificações muito maiores. Ele estava vindo à terapia duas vezes por semana por
dois anos e havia feito um imenso progresso -parado de beber, contatado e trabalhado
com a dor de ter crescido numa família disfuncional, aprendido como descrever
seus sentimentos, desenvolvido um sentido mais sólido de si próprio, e estava
começando a desenvolver um a relação íntima na qual havia um grande acordo de
troca mútua. Ele estava indo tão bem que havíamos falado em diminuir a freqüência
de sua terapia, mas um a coisa m e intrigava. Quando eu perguntei a ele sobre seus
sentimentos à m eu respeito, ele disse que não tinha nenhum. Ele disse que era grato
a mim pela minha ajuda, mas que isto estava restrito a uma relação profissional e
^•a jJ H U J O
4
não era apropriado que ele tivesse por mim sentimentos iguais aos que ele tinha por
outras oessoas de sua vida. Eu estava aberta para a idéia de que não havia
similaridades funcionais entre nossa relação e suas relações fora da terapia, uma
vez que estas pareciam ter melhorado muito, sem que nós tivéssemos enfocado
muito a nossa relação. Mas eu lhe disse que queria que ele explorasse a possibilidade
de que sua esquiva em ter quaisquer sentimentos a meu respeito pudesse significar
que ele estava evitando outras coisas das quais nós não estávamos conscientes.
Começamos a focalizar muito mais a nossa relação, e Jonathan concordou em
prestar maior atenção a qualquer sentimento que tivesse em relação a mim. Ele
começou relatando ter percebido que despertava com sentimentos calorosos a meu
respeito e imediatamente ele os cortava. Eu bloqueei a esquiva de Jonathan mudando
o foco da terapia para os sentimentos e reações dele que eram dirigidos a mim. Isto
o conduziu a ter pensamentos, tais como “Eu não mereço ter bons sentimentos, eu
vou querer coisas de você e vou ficar desapontado, nossa relação ficará cada vez
mais fora do controle, eu me sentirei muito vulnerável”. Nos poucos meses seguintes,
eu o encorajei a m anter-se atento à nossa relação, às formas pelas quais eu
expressava m eu cuidado para com ele, e em como ele cortava seus sentimentos a
m eu respeito. Ele gradualmente passou a ter sentimentos mais intensos dirigidos a
mim, e um dia ele veio e disse, “N a noite passada eu senti essa ligação em meu
corpo e me senti muito bem. Eu não sentia isso há muito, muito tempo [começou a
fic a r choroso] ... desde que eu era garoto... um sentimento de pureza interna,
tirando um peso das minhas costas. Eu era realmente um bom garoto [chora],
simpático, honesto, precavido... E u penso que tenho essa coisa geral, que há alguns
sentimentos que não são legais que eu tenha, como sentimentos carinhosos pela
minha mãe, sentimentos sexuais pelo meu terapeuta, e sentimentos alegres como
de um garoto.” Jonathan também relatou que tinha problemas em atingir o orgasmo
durante o sexo, e o que ele experimentava quando estava próximo ao orgasmo era
similar à maneira como ele evitava ter sentimentos a m eu respeito. Em resumo,
explorar um a área lim itada de esquiva com Jonathan abriu m ais esferas de
experiência para ele do que qualquer um de nós poderia ter imaginado.
A visão da FAP das emoções pode ser contrastada com concepções
mentalistas predominantes. Vários sistemas psicoterapêuticos e o público em geral
vêem as emoções como algo que se pode guardar, reprimir e descarregar. Por mais
atraentes que pareçam ser essas noções, elas nos deixam com questões incômodas
tais como, onde elas são armazenadas, para onde vão quando são descarregadas, e
o que é deixado em seu lugar quando são descarregadas. Tratar as emoções como
entidades leva-nos a focalizar estes tipos de questões e nos desvia para longe do
seu contexto como parte da experiência e do comportamento de um a pessoa.
c jjCJiiutaii^n
na
iviuuduijti
mw
v,» iijn.;i uiiucmv.;
q j
L E M B R A N Ç AS
Clientes têm dois tipos de lem branças de experiências da infância que
são úteis durante a psicoterapia. U m dos tipos ocorre espontaneamente no decorrei
da conversação. P o r exem plo, enquanto falava sobre o dinheiro devido ao
terapeuta, um a cliente lem brou-se espontaneam ente que sua família foi despejada
de um prédio de apartam entos quando ela era uma criança porque seu pai havia
perdido o dinheiro do aluguel em jo g o . O outro tipo de lem brança é diretam ente
instigado pelo terapeuta. Por exem plo, uma cliente que tenha uma vaga lembrança
de um evento incestuoso deve ser encorajada a pensar a respeito do evento e
lem brar-se m ais sobre o que ocorreu. A visão com portam ental desses dois tipos
de lembranças estabelece um a visão um tanto diferente das noções predominantes
sobre lem branças e sobre com o são recuperadas. D e fato, o behaviorismo radical
não acredita que h aja u m a coisa tal qual um a “m em ória” que seja guardada na
m ente. Porém , nós acred itam o s em “lem b ran ça” e que este processo seja
im portante na FAP.
N ossa visão é que lem brança é o processo comportamental de ver, ouvir,
sentir cheiros, tocar, e de sentir o gosto de estím ulos que não estejam presentes.
Para explicar esta abordagem particularm ente estranha das lembranças, nós
discutirem os apenas o “v er estím ulos” que não estejam presentes, visto que
nossos argum entos apiicam -se igualm ente aos outros sentidos.
C om ecem os com a noção de que ver seja um com portam ento. Quando
vem os um a tulipa, h á u m a atividade privada ocorrendo. Não podemos descrever
a atividade m uito b em j á que ela é privada e nós não aprendem os como falar
sobre ela. E ntretanto, é o com portam ento privado associado com a atividade
fisiológica que ocorre quando vem os algum a coisa. Porém , a atividade privada
de ver não é a atividade fisiológica. Talvez um a analogia com o falar ajudará a
esclarecer este ponto. F alar é u m com portam ento. Diferente do ver, podem os
descrevê-lo porque ele é público e n ós aprendem os como descrever este tipo de
atividade pública. Sem elhante ao com portam ento de ver, há um a atividade
fisiológica associada ao falar. O posto ao caso do ver, entretanto, o falar não é
um a atividade fisiológica.
F alar fornece estím ulos discrim inativos; ou seja, podem os ouvir as
palavras ditas e descrever m ovim entos m andibulares, e assim por diante. Ver
tam bém foníece u m a com plexa gam a de estím ulos discriminativos. Os estímulos
discriminativos fom ecidospelo ver são o objeto sendo visto. Assim, a experiência
90
Capítulo 4
que tem os quando vemos um objeto é o resultado de estímulos discrim inativos
gerados pelo com portam ento de ver.
Lem brar, o com portam ento de ver na ausência de um objeto, pode
ocorrer de duas formas. Prim eira, deve haver um ver condicionado de forma
respondente; quer dizer, o cliente vê X porque X foi sendo associado a outros
estím ulos no passado. Por exem plo, considere a palavra sete. Para algumas
pessoas, pode ter havido um breve vislum bre do numeral 7 em seu “olho da
m ente” quando elas viram a palavra impressa. N ós argum entam os que este é
um exemplo do ver condicionado de m aneira respondente na ausência do objeto
(o num eral 7) sendo visto. Similarm ente, lem brar de um delicioso jan tar em um
restaurante pode ser evocado ao passar em frente a este restaurante. N o caso
de N ancy (discutido quase ao final deste capítulo), ela espontaneam ente
recordou-se de um a expeiiência de separação na casa de um a tia durante sua
infância, que fôra previam ente esquecida. Isto provavelm ente foi o resultado
de estar em contato com alguns dos estím ulos que foram associados com o
traum a original. Dessa forma, durante a sessão, houve alguns estím ulos de
separação (o terapeuta havia anunciado que estaria saindo nas férias) que foram
associados com os estím ulos na casa da tia, e o ver condicionado de forma
respondente (lembrar) ocorreu. Esta visão do lem brar é consistente com um a
vasta literatura sobre a aprendizagem dependente do estado. Esta literatura
dem onstra que lem brar é facilitado pela ocorrência de estím ulos na situação
presente que são similares àqueles presentes quando o evento lembrado ocorreu
pela prim eira vez (Catania, 1984). A nterior à recordação, o lem brar foi inibido
porque a cliente evitou o contato com os estímulos relevantes que tanto poderiam
ter eliciado o afeto quanto evocado a m em ória. Deste ponto de vista, então,
lem branças espontâneas de eventos traum áticos são um efeito autom ático do
contato e servem como um indicador ou m arcador que m ostram a presença de
variáveis de controle relevantes. U m a vez que o contato ten h a ocorrido,
com portam entos novos e m ais adaptativos podem ser aprendidos. Assim, de
acordo com a visão da FAP, o problem a fundam ental produzido pelo traum a
passado é que os estím ulos presentes que nos lem bram do traum a são evitados.
Quando é pedido diretam ente a um cliente que se lembre de um evento,
este é um operante “ver na ausência do estím ulo”. Diferente do ver condicionado
por processo respondente, o qual é eliciado por um estímulo presente que foi
pareado com outros estímulos no passado, o ver operante é afetado por estímulos
discrim inativos verbais ou não, estados de privação e reforçam ento. O u seja, o
ver operante sem a presença de estímulos ocorre devido a reforçam ento passado
para tal visualização. D e acordo com esta visão, quando se pergunta a alguém
Emoções e Lembranças na Mudança do Comportamento
91
com o é o seu quarto de dormir, a pessoa sim plesm ente se em penha no m esm o
com portam ento de ver privado (ou similar) que acontece quando ela está de fato
no quarto. Este ver é parecido com qualquer outro com portam ento voluntário e
sua força reflete sua história de reforçam ento passado. D a m esm a form a que o
v e r sem que o estím ulo esteja presente é similar ao ver quando o estím ulo está
presente, o lem brar-se produzirá funções discrim inativas sim ilares.
Assim, se você estiver tentando lembrar-se da localização exata da janela
o u de u m a cadeira em seu quarto, em penhar-se na visão do quarto pode ajudar
a descrever exatam ente onde a cadeira está de um m odo m uito sem elhante a
quando se vê, de fato, o recinto. A pessoa fam inta que im agina com ida, ou a
pesso a sexualm ente privada que im agina estím ulos sexuais, estão tam bém
em penhadas com o ver operante. N esses dois exem plos, a privação (de comida
ou de sexo) aumenta a probabilidade do operante (ver comida ou sexo na ausência
de u m estím ulo).
O utra im plicação do ver operante é que, com o outros operantes, este
não ocoirerá se foi punido, ou se não foi reforçado positivamente. Assim, punição
po d e resultar em esquecim ento seletivo e am nésia. Esquecim ento seletivo e
am nésia têm um papel principal em transtornos dissociativos tais como, estados
de fuga e transtornos de personalidade m últipla (ver Capítulo 6).
A o ajudar um a cliente a lem brar-se de m odo operante de um evento
incestuoso que ocorreu em seu quarto, ela poderia primeiro ser instada a lembrarse dos aspectos físicos do quarto no qual o evento ocorreu. O lem brar-se da
cliente é m odelado e reforçado pelo terapeuta. P or exem plo, se lem brar-se do
quarto produzir aversividade em dem asia e for evitado, a cliente pode ser instada
a lem brar-se do corredor que levava ao quarto.
Lem brar-se de um traum a antigo pode servir a pelo menos duas funções.
U m a vez que o traum a tenha sido lem brado, o cliente pode, então, form ular um a
regra (ver C apítulo 5) que possa ajudar a m elhorar o funcionam ento da vida
diária atual (Zettle, 1980). P or exem plo, Zettle descreveu um a cliente que não
gostava de sexo com seu m arido por causa de um incesto esquecido. Por ter
esquecido o incesto, a cliente havia form ulado um a regra im produtiva de que os
p ro b lem as sexuais eram devidos à inaptidão de seu m arido. A regra era
im produtiva porque direcionava o foco de atenção para os tem as errados e
provavehnente conduzia a discussões e frustração. U m a vez que o incesto foi
lem brado, um a regra nova e m ais produtiva foi form ulada (por ex.: “E u estou
reagindo negativamente ao m eu marido devido a experiências aversivas passadas),
a qual, p o r sua vez, levou a focalizar tem as m ais relevantes.
Capítulo 4
92
Uma segunda e mais importante função do lem brar é que ele ajuda a
reduzir a aversividade dos estímulos que são evitados no presente, e assim ajuda
a aum entar o contato com eles e perm ite a aprendizagem de com portam entos
novos e m ais eficazes. Ou seja, quando os eventos traum áticos são lembrados
de m aneira operante, a aversividade é reduzida através de extinção. N a seqüência,
os estím ulos presentes que até então foram evitados porque eliciavam o ver
respondente, serão agora contatados. Considerando o caso descrito por Zeítle. o
lem brar operante do traum a ajuda porque a aversividade é reduzida. Então,
dim inuiria a probabilidade da relação sexual atual ser aversiva e o contato seria
melhorado porque o ver respondente evocado seria m enos aversivo. O esperado
seria que isto ajudasse diretamente a m elhorar a relação sexual.
D e m aneira similar, o lem brar operante do traum a passado pode também
aumentai-o contato com estímulos durante a sessão, os quais por sua vez resultam
na evocação de CRB. Por exemplo, considere um cliente que apresenta problemas
relacionados a não acreditar em outras pessoas e por isso evita relações íntimas.
O cliente também evita confiar e formar um a relação próxim a com o terapeuta.
Suponha que o cliente, então, lembre de forma operante de um traum a precoce
de abandono e, em conseqüência disso, reduza a aversividade da lembrança.
Então os estímulos que evocam confiança e intimidade na relação cliente-terapeuta,
os quais lembram ao cliente do abandono (um lembrar respondente), teriam também
sua aversividade reduzida. Dessa maneira, os CRB2s de confiança e intimidade
se tom am mais prováveis de ocorrer e de ser fortalecidos pelo terapeuta.
N a estrutura da FAP, a esquiva de m em órias é problem ática pois
interfere com o contato de estím ulos im portantes na relação cliente-terapeuta.
Assim como o afeto, a lem brança espontânea de eventos traum áticos é um
sinalizador que indica contato com estím ulos clinicam ente significantes dentro
da relação terapêutica.
IM P L IC A Ç Õ E S C L ÍN IC A S
As im plicações clínicas de nossa conceituação teórica das emoções
co n duzem a um conjunto de reco m en d ações: (1) o fereç a um a racional
comportamental para a importância da expressão afetiva, (2) aumente o controle
privado do cliente sobre sentim entos, (3) aum ente a expressão afetiva do
terapeuta, e (4) m elhore o contato do cliente com variáveis de controle. Alguns
dos nossos m étodos são sem elhantes ou idênticos a técnicas de outras terapias;
E moções e L e m b ra n ç a s na Mudança do Comportamento
93
o encorajam ento difundido e a facil itação da expressão afetiva como um enfoque
na terapia fala da utilidade de tal expressão. Embora não necessariamente únicos,
nossos procedim entos partem de fundamentos teóricos muito diferentes das outras
terapias. D essa form a, como acontece com várias terapias, freqüentem ente o
p o r que nós fazem os o que fazem os nos distancia de outros sistem as m àis do
que aquilo que nós realm ente fazemos. Nossas recom endações são discutidas
abaixo.
O f e r e ç a u m a R a c io n a l C o m p o r ta m e n t a l p a r a E n t r a r e m C o n ta to
c o m S e n tim e n to s
A FAP difere significativamente de outras visões no fato de que a ênfase
não é n a liberação catártica com o um fim nela m esm a. Nós acreditam os que a
esquiva de sentim entos é obtida por m eio de contatos reduzidos com variáveis
de controle para os CRBs, o que por sua vez dim inui a oportunidade para a
aquisição de novo com portam ento. A explicação que dam os ao cliente sobre a
im portância de entrar em contato com os sentim entos não envolve apelos tais
com o “É b o m colocar para fora, liberar aqueles sentim entos reprim idos” ou,
“ Se você segurá-los, eles vão sair de outro je ito .” A o invés disso, é dito ao
cliente que a em oção é apenas um produto eventual do lidar com os problem as,
ou do en trar em contato com estím ulos im portantes. A ausência de emoção,
entretanto, é um problem a sério indicando u m a esquiva que interfere com a
terapia e tam bém interfere com outras áreas da vida do cliente. Assim, a expressão
em ocional é crucial, não porque seja curativa por si m esm a, m as porque serve
para m ostrar que o cliente está em contato com variáveis de controle importantes,
e que n ovos com portam entos podem agora ser aprendidos.
E m term os leigos, para um cliente que passou recentem ente pelo fim de
um relacionam ento, nós podem os dizer algo parecido com , “E im portante que
você se deixe entristecer, porque se você evitar pensar, sentir, falar sobre Jesse,
você acabará evitando m uitas coisas, tais com o atividades que vocês faziam
ju n to s o u encontrar novos hom ens, coisas estas que poderiam aflorar quaisquer
sentim entos sobre ele. Evitando todas essas coisas, não é apenas a riqueza da
sua v id a que sofrerá interferência, mas você tam bém não terá oportunidade de
im aginar o que aconteceu de errado e de aprender novas form as de lidar com
alguém p róxim o a você quando problem as sem elhantes aparecerem ” .
Idealm ente, a resposta do terapeuta a dem onstrações de emoção deveria
ser n a tu ra lm e n te reforçadora. É im provável que u m terap eu ta que tenha
Capítulo 4
94
dificuldade com sua própria expressão afetiva ou com a expressão afetiva de
outros ofereça tal encorajamento, e pode punir o afeto do cliente. Por essa
razão, alguém com este tipo de repertório deficiente será claramente menos
capaz de trabalhar bem com clientes que requeiram contatos gradativamente
m aiores com estím ulos que evoquem respostas emocionais.
A u m e n te o C o n tr o le P r iv a d o d e S e n tim e n to s
Freqüentemente, acontece a seguinte interação entre terapeuta e cliente:
T: O que você está sentindo neste momento?
C: [pausa, parece perplexo] Eu não sei.
N ossa interpretação sobre esta observação é baseada nos estímulos (o
ambiente) que são encontrados no consultório psicoterapêutico típico. A situação
é geralm ente aprazível - as luzes são relativam ente amenas, as janelas deixam
entear pouca luz e a decoração é neutra. U sualm ente, cliente e terapeuta estão
sentados e inativos exceto por falarem e se m overem dentro dos limites da
poltro n a. As expressões faciais, gestos, e tom de voz do terapeuta são
relativam ente controlados. Já que há um a quase com pleta ausência de estúnulos
públicos que possam indicar aos clientes como eles estão se sentindo, eles
precisam contar quase que exclusivam ente com estím ulos privados. Se a sua
história passada falhou em dar-lhes controle suficiente através de estímulos
privados, então eles serão incapazes de responder à questão do terapeuta. Dessa
forma, o ambiente terapêutico típico é evocativo do CRB de controle público
acidental de emoções. U m objetivo do tratam ento para CRB1 associado com
controle público acidental pode ser direcionado a fornecer m ais controle aos
estímulos privados associados com sentimentos. Para alcançar isto, em primeiro
lugar, o terapeuta deve estar razoavelm ente certo de que os estados corpóreos
relevantes estejam presentes e, em segundo lugar, usai' os princípios de treino
discriminativo de forma a que os estímulos privados do cliente (estados corpóreos)
ganhem controle sobre a descrição de sentimentos.
Suponha que esse tipo de interação tenha se estabelecido no início de
um processo de terapia, e que o problem a do cliente era um a inabilidade em
Emoções e Lembranças na Mudança do Comportamento
95
expressar sentim entos. A lém disso, que ele tivesse descrito em tom m onótono
como um colega de trabalho o traiu. Nós o encorajaríamos a reviver a experiência,
descrevendo detalhes da traição. N ossa esperança é que este recontar dos detalhes
possa evocar os estados corpóreos de raiva. N ós tam bém o observaríam os
cuidadosam ente para tentar encontrar qualquer sinal de raiva. Então seria dito a
ele “ Se isto acontecesse para m im , eu estaria com m uita raiva, e parece que
você deve estar experim entando alguma raiva neste m om ento”. Depois de alguns
eventos terapêuticos sim ilares nos quais o cliente é incitado especificam ente
para tatear a raiva, a especificidade das dicas deve ser gradualm ente retirada. O
objetivo é fazer com que os estados corpóreos privados do cliente ganhem controle
sobre seus relatos de raiva.
D o ponto de vista da FAP, a potência da intervenção terapêutica é
foxtalecida se a situação em ocionalm ente evocativa ocorrer de fato na sessão.
Por exem plo, suponha que um cliente im plore ao segundo autor para que ligue
para o seu chefe com o propósito de ajudá-lo a conseguir um vital aumento de
salário. Eu recuso, e observo que o cliente parece desapontado e magoado. Neste
ponto, eu estou razoavelm ente certa de que os estados corpóreos relevantes de
raiva estão presentes. Usando os princípios de treino discriminativo, inicialmente
eu proveria estímulos públicos proeminentes para induzir o cliente aos sentimentos
que d e v e ria m ser sen tid o s. E u p o d e ria dizer, “Você p arece m agoado e
desapontado, e é o que eu sentiria se eu estivesse no seu lugar” . Então, depois de
várias ocasiões nas quais um a variedade de situações de mágoa e desapontamento
tivessem sido processadas, eu gradualm ente iria fornecer m enos orientação
pública. N o lugar de declarar sentim entos específicos, eu diria, “Esta situação
m e lem bra de outras que você viveu no passado nas quais você sentiu alguns
sentim entos fortes” . M ais tarde, na terapia, a sim ples pergunta “Com o você se
sente?” seria suficiente. U m a sobreposição existe entre as condições que levam
a um a falha do controle piivado dos sentim entos e problem as do self. (Este tem a
e o processo terapêutico que conduzem a um crescente controle de estím ulos
privados sobre as respostas do cliente serão discutidos no Capítulo 6.)
D ada a preponderância da inabilidade dos clientes para responder ao
terapeuta quando perguntados a respeito de com o eles se sentem , o controle
pxiblico acidental de em oções pode ser m ais com um do que se imagina. Uma
falha n a clareza daquilo que alguém está realm ente sentindo enquanto adulto,
reflete a inevitabilidade dos problem as que ocorrem quando entidades externas
(por exem pío, um dos pais) tentam dar um significado para um a experiência
interna da criança que eles não podem ver ou conhecer.
96
Capítulo 4
Â.5i!B6iit6 3 E x p r e s s ã o d e S e n tim e n to s p e lo T e r a p e u ís
Com clientes que tenham dificuldade em aceitar o carinho de outros (a
esquiva da expressão de sentim entos de atenção por outros), e que precisem de
ajuda para ter contato com seus sentim entos e expressá-los, especialmente
sentimentos de intimidade, nós encorajamos um a expressão ativa de sentimentos
por parte do terapeuta. Por exem plo, a interação seguinte foi estabelecida entre
o segundo autor e Evelyn, cliente há quatro anos.
C; [enquanto criança] Eu tinha muita vergonha de ser pobre, de não ter nada. Minha
mãe me humilhava por ser bêbada e por partir toda vez que estava bêbada. Ninguém
era saudável o suficiente para ser agradável. Não havia nunca qualquer segurança,
lugares bons. Eu até via você da mesma forma que eu costumava ver as pessoas
que tentavam ser legais. Não é real, eu não estou segura, as pessoas não são capazes
de cuidar das outras. Isto sim é verdade. É perigoso demais confiar. No meu íntimo,
eu sinto que não é seguro.
T: Certamente não foi seguro durante o seu crescimento. Com referência à minha
delicadeza não ser real, na semana passada eu pedi a você que tentasse sentir o
meu carinho e você disse que sentiu angústia.
C: Sim, pontadas de angústia, uma invasão nos meus limites. Este é o último soldado
que não se rendeu porque a guerra ainda continua. Como aqueles caras que você
encontra rastejando entre as árvores, ainda armados dez anos depois que a guerra
terminou. Para sobreviver a todos aqueles abusos, este é o último vestígio, a crença
de que o mundo ainda é ruim. Eu não sei como fazer as pessoas me amarem. Este
é o segredo - eu não sei como fazer isto.
T: Você pode começar prestando atenção na suavidade da minha voz, nos meus ollios,
no toque das minhas mãos, quando eu falo com você, e a pensar sobre todos os
momentos especiais que nós tivemos trabalhando juntas todos estes anos.
C: Minha sensação é que, se você realmente me conhecer, você não vai gostar de
mim.
T; Eu a conheço melhor do que qualquer outra pessoa, não é?
C: É.
T: (Eu me coloquei sentada diretamente em frente a ela e pedi que ela olhasse nos meus
olhos enquanto eu falava.) Evelyn, quando eu penso em você tenho sentimentos de
Emoções e Lem branças na M u d an ça do C om p ortam en to
97
afeição e amor no meu coração. Você é muito especial para mim. Você sobreviveu a
tantos traumas, e você é uma pessoa maravilhosa e talentosa. Eu tenho estima por
você e quero o melhor para você. Eu considero um verdadeiro privilégio que você
tenha se mostrado tão vulnerável para mim. que você tenha me deixado saber quem
você é. e que me tenha sido permitido ver você mudar e florescer neste tempo.
C: [começando a chorar] É difícil pra mim me permitir acreditar em você. Como é que
ninguém disse isso antes para mim?
D izer a E velyn o que eu sentia por ela íeve pelo m enos quatro funções.
A prim eira, deu a ela um a oportunidade para aprender, através de exemplo,
como expressar sentim entos de carinho. Segunda, eu bloqueei sua esquiva da
m inh a expressão p o r interm édio de fazê-la experim entar a aceitação dos
sentim entos de carinho vindos de um a outra pessoa num a relação próxim a
(CRB2), Terceira, dar a ela inform ações sobre os m eus sentim entos me tom a
m ais vulnerável a ela. Isto aum entou sua capacidade para predizer o m eu
comportamento e em conseqüência sentir-se mais segura na relação. Finalmente,
dizer-lhe os m eus sentim entos positivos em relação a ela, ajudariam E velyn a
desenvolver auto-tatos m ais positivos, tais com o “E u sou um a sobrevivente, eu
sou especial, eu sou m aravilhosa, eu sou talentosa” . Estes auto-tatos poderiam
ajudar da m esm a m aneira que a terapia cognitiva faz algumas vezes (ver Capítulo
5 para um a interpretação com portam ental deste fenôm eno).
M e lh o r e o C o n ta t o d o C lie n te c o m V a r iá v e is d e C o n tr o le
C om o nós tem os re ite ra d o , tra z e r co m portam entos clin icam ente
relevantes (C RB s) para a sessão é a m aior prioridade para o terapeuta que
esteja exercendo a FAP. A lgum as vezes, estes CRBs não ocorrem porque o
cliente não está em contato suficiente com as variáveis de controle. N o contexto
de nossa discussão das em oções, consideram os u m a variável de controle como
sendo qualquer coisa no presente que lembre a alguém eventos emocionalm ente
estressantes o u traum as que ocorreram no passado. São inúm eros os exem plos
de variáveis de controle e são, é claro, idiossincráticos para o indivíduo. Eles
podem incluir questões ou declarações feitas pelo terapeuta, a intim idade na
relação terapêutica, um a foto de alguém am ado, cenas de um filme ou um livro,
um a canção específica ou o horário do pôr-do-sol.
D esnecessário dizer que nós estamos m ais interessados em variáveis de
controle que possam ser produzidas na terapia. D e fato, todos os exem plos
Capítulo 4
anteriores poderiam ter sido incorporados a um a sessão. Em geral, a tarefa do
terapeuta é aum entar o contato do cliente com variáveis de controle e lim itar a
sua esquiva de situações, as quais ocorrem durante a sessão e que evocam
afeto. Quando o contato ocorrer, haverá expressão afetiva, a qual, por sua vez,
pode evocar mais com portam entos de esquiva.
A ssim, a expressão da emoção p o r parte de um cliente durante a sessão
serve como um indicador de que o cliente está em contato com as variáveis de
controle que eliciam a emoção. O afeto aponta que está havendo contato da
m esm a form a que um ajpessoa que chega perto de um forno quente m ostra o
contato real com o forno através de (1) gritar de dor, (2) retirar a mão da superfície
quente, e (3) dizendo, “Ôrra! Isto está quente!” . Todas essas expressões de afeto
são evocadas pelo contato com o fogão quente. O estado coipóreo que é sentido
é a experiência associada de dor. Se um cliente não estiver em contato com
variáveis de controle relevantes que eliciariam um a resposta emocional em outros
contextos diferentes, emoções consideradas um m arcador e o CRB associado
não ocorrerão.
N ote que esta análise de variáveis de controle e formas de contatá-las é
u m a e lab o ração da R eg ra 2 (v e r C a p ítu lo 2) - “E v o c a r C R B s” . Três
recom endações principais que ajudam o terapeuta a propiciar ao cliente entrar
em contato com variáveis de controle serão agora discutidas: (1) Reapresente o
estím ulo aversivo. (2) Enfoque as form as pelas quais o cliente está evitando
afeto. (3) Enfoque o afeto do cliente relacionado a sim ilaridades funcionais
entre terapia e vida cotidiana.
R e a p r e s e n te o estím u lo a v e rsiv o
Observar quando o cliente está tentando evitar afeto e então reapresentar
o estímulo aversivo ou variável de controle relevantes, freqüentemente bloqueará
a esquiva do afeto pelo cliente. D ois estudos de caso ilustram este princípio.
No primeiro caso, o prim eiro autor estava conduzindo um a entrevista
inicial com Amy, um a contabilista de 48 anos de idade que sofria de um a
inexplicável dor de cabeça 24 horas por dia. A m y era m uito m eticulosa com
datas e lugares, medicações, história de trabalho, e coisas semelhantes. Ela era
incapaz, entretanto, de precisar o início de sua dor exceto ao dizer que ela havia
com eçado 8 ou 9 anos atrás e que estava presente desde então. Ela pareceu ficar
Emoções e Lembranças na Mudança do Comportamento
99
pertu rb ad a quando eu insisti em m in h as questões sobre a data do início. Ela
tam b ém era hábil em m u d a r o tópico da conversa e o fez m uitas vezes. Eu
avaliei a esquiva com o um possív el CRB1 e continuei pressionando para o
contato com variáv eis de controle. E u lhe pedi que m e desse um inventário de
to d o s os eventos im po rtan tes que h av iam ocorrido há 8, e depois 9 anos atrás.
E u queria saber, p o r exem plo, o que ela hav ia feito no N atal, que hóspedes ela
teve durante o ano, que m éd ico s ela havia consultado, se havia algum problem a
conjugal, etc. C onform e a entrevista continuou e a esquiva foi sendo bloqueada
rep etid as vezes, ela m o stro u m ais e m ais sentim entos. Q uando eu perguntei a
ela com o se sentia, ela disse que se sentia bem . E u tom ei isto como evidência de
que ela não estav a sentindo m u ito b em seu estado corpóreo. E u persisti com
m inhas perguntas sobre eventos significativos durante aquele período de tempo,
e finalm ente ela falo u sobre a m o rte de sua filha de 14 anos ocorrida 8 anos
atrás. E la fico u su fo cad a com lágrim as, e o seu corpo trem ia e seus braços se
agitav am com angústia. E u gentilm ente a encorajei a recontar em detalhes as
circunstâncias que env o lv eram a m orte de sua filha. A ntes desta catarse, ela
h avia evitado com pletam ente q ualquer situação que estivesse ligada à m orte de
sua filha. E la m u d o u -se p ara um a n o v a casa sem nunca voltar para a antiga
vizinhança, evitou quaisquer discussões que pudessem conduzir a assuntos sobre
sua filha, m u d o u seu escritório, p assav a as férias fora de Seattle (cidade onde
m o rav a), e n u n ca se lam entava. D e várias form as sua vida havia se tom ado
extrem am en te restrita. E u a encontrei um a sem ana depois e ela relatou que sua
d or de cabeça h av ia desaparecido. M inha interpretação da dor de cabeça de
A m y é que ela era causad a p o r um estado corpóreo crônico, ou seja, a dor tinha
um a origem física diretam ente ligada a um estado corpóreo crônico que era
e v o c a d o p e la a v e rs iv id a d e da e sq u iv a a m p lia d a * . O s eventos da sessão
p rev en iram esq u iv as p o steriores e o coipo de A m y voltou a um estado m ais
norm al; a d o r d esapareceu.
O segundo caso é o de Roxie, um a cliente do segundo autor. Roxie tinha
um a h istó ria de ep isó d io s de depressões severas, tentativas de suicídio, e
alucinações. E sses episódios intensos pareciam ser provocados por situações
interpessoais n as quais R oxie era criticada, contrariada ou até m esm o rejeitada.
E la r e a g ia d e fo rm a m u ito e m o tiv a a ta is e v e n to s e a rrisc a v a -s e em
com p o rtam en to s tais com o, ten tar se apunhalar com um a faca ou ingerir um a
overd o se de barbitúricos. Isto era particularm ente verdadeiro quando a rejeição
E ste é u m exem plo no qual p o d e-se dizer que u m sentim ento causou um sintom a; ou seja, o sintoma
(d o r d e c a b e ç a ) e ra u m e sta d o c o rp ó re o q u e era o re s u lta d o d ire to de ou tro e sta d o c o rp ó re o
(e v o c ad o p e la a v e rsiv id a d e q u e ela estav a evitando).
100
Capítulo 4
ocorria em uma relação que evocava apego e dependência. Depois de dois
anos de terapia m arcados por várias crises, a relação terapêutica desenvolveuse ao ponto de ter se tom ado próxim a do tipo de relação que poderia evocar
episódios graves se Roxie experim entasse um a rejeição por parte da terapeuta.
Do ponto de vista da FAP. tal ocorrência poderia fornecer uma oportunidade
inestim ável para o desenvolvim ento de formas m ais efetivas de lidar com a
rejeição (CRB2) e aum entaria o auto-entendim ento (CRB3).
Apesar de relutante, eu estava antecipando justamente uma oportunidade
destas porque eu estava,prestes a dizer a Roxie que a quantidade e o tipo de
chamadas telefônicas que ela me fazia à noite e no final de semana deveriam ser
restringidos. Quando esta limitação foi apresentada a Roxie, ela pouco pareceu
reagir à informação. Ela não chorou nem agiu com raiva, mas somente pareceu
ficar menos falante e mudou o assunto. Parecia que havia sido feito pouco contato
com a situação presente. Era como se ela não tivesse ouvido ou entendido o que
havia sido dito. Numa tentativa de levar Roxie a entrar em contato com os estímulos
que poderiam evocar a resposta emocional, eu voltei ao assunto de estabelecer as
limitações, pedindo a Roxie que repetisse o que havia entendido sobre a limitação
nas cham adas telefônicas. Conform e Roxie falava, tornou-se m ais agitada.
Enfocando novamente o assunto e com as minhas observações declaradas de sua
esquiva, Roxie começou a soluçar e rapidamente vocalizou um pensamento suicida.
N os vários meses seguintes, Roxie obteve um entendim ento m aior das
variáveis de controle (CRB3) - um estímulo discriminativo complexo envolvendo
sua ligação a m im , a limitação das chamadas telefônicas, e um a história de
rejeição e abandono. A lém disso, no tom a-lá-dá-cá da interação, ela aprendeu
um a nova form a de reagir à rejeição. Ao invés de esquivar e ocupar-se com
com portam ento suicida, ela aprendeu a discutir sua dependência e m edo do
abandono e buscar segurança em mim. Ela foi levada gentilm ente a exam inar
quais dos seus com portam entos afastavam as outras pessoas, incluindo a m im
m esm a. E u tentei dar a ela segurança sobre m eu com prom isso com o seu
crescimento e melhora contínuos, tanto em palavras quanto em ações. E u também
persisti em colocar limites nas cham adas telefônicas. A lição m ais im portante
para R oxie foi que o seu contato com estím ulos evocativos na sessão resultou
num a relação m ais íntim a (m ais reforçadora). Assim , ela tornou-se capaz de
experimentar o meu cuidado (segurança, atenção, ajuda na solução de problemas,
etc.) ao m esm o tempo em que ela tam bém entrou em contato com os aspectos
em ocionais de ter os seus privilégios telefônicos lim itados. E m bora tenha
demorado vários m eses, Roxie era repetidam ente levada a entrar em contato
Emoções e L em b ran ças na M u dan ça do C om p ortam en to
101
com a lim itação das cham adas telefônicas e com as reações em ocionais que
eram evocadas. Este provou ser o m om ento crucial para m udar a maneira como
ela reagia à rejeição e criou as condições para o desenvolvim ento de outros
repertórios interpessoais m elhorados.
F o c a liz e a s f o r m a s p e la s q u a is o c lie n te e stá evita n d o afeto
E m adição à reapresentação do estím ulo, outra form a de aum entar o
contato com variáveis de controle ou de bloquear esquiva é pedir para que o
cliente observe atentam ente o que ele está fazendo para ignorar o sentir. Com a
pergunta, “O que você está fazendo agora para im pedir a si m esm o de sentir?” ,
nós encontram os que entre a m aioria das form as pelas quais os clientes evitam
afeto incluem -se as seguintes: (1) atividades cognitivas de distração (por exemplo,
contar p ara trás de sete em sete a partir de m il, enfocar um a imagem em branco,
repetir p ara si m esm o “E u não vou chorar”); (2) estreitar o campo visual (por
exem plo, olhando atentam ente para algum a coisa do lado de fora da janela, ou
um pequeno objeto no consultório com o o botão de cima da camisa do terapeuta,
o u u m a m ancha no teto), e (3) atividades cinestésicas distrativas (tensionando
os músculos, permanecendo bem imóvel, ou não respirando). A partir do momento
em que conhecem os o que eles estão fazendo p ara esquivar do afeto, pedim os a
eles p ara pararem de fazê-lo ou que façam algum a coisa incom patível, assim
com o respirar profundam ente e devagar, ou olhar nos nossos olhos. A lgum as
vezes, sim plesm ente perguntar “H á algum a coisa que você está evitando pensar
ou falar neste m om ento?” trará à vista um tem a intenso e o seu afeto associado.
F o c a liz e n o a fe to d o c lie n te re la c io n a d o à s sim ila rid a d e s fu n c io n a is
e n tre te r a p ia e v id a c o tid ia n a
U m a sim ilaridade funcional entre terapia e o dia-a-dia é qualquer coisa
n a situação terapêutica que possa evocar sentim entos ou ações no cliente,
sim ilares aos evocados por um a situação fora da terapia. Para ilustrar, voltaremos
ao caso de N aney, cujos problem as centravam -se em criar e m anter relações
íntim as. E la havia estado em FAP com o prim eiro autor por vários meses, e um a
relação gradãtivam ente m ais próxim a foi desenvolvida. Em bora tenha ocorrido
progresso, algum as deficiências de repertório ainda se m antinham . U m a delas,
conform e descrita p o r Naney, dizia respeito a um m edo de que a pessoa de quem
102
Capítulo 4
ela se tom ava próxim a poderia desaparecer, que nunca voltaria depois de estar
tem porariam ente separada dela devido a um a viagem ou outra razão qualquer.
Ela sentia que ficaria desolada e não seria capaz de continuar com a sua vida.
N ancy via esses sentim entos com o parte da sua relutância passada e presente
em se tom ar intimamente envolvida. Este problema também interferia nas relações
conform e elas iam se desenvolvendo, p o r causarem a ela tanto um a intensa
tristeza quanto a fuga da situação, quando am eaçada por separação. Ela podia
tam bém relacionar seus m edos a ter sido deixada por um nam orado vários anos
antes.
O julgam ento de N ancy sobre como seus m edos relacionavam -se a seus
problem as de relacionamento é um a descrição de seu comportamento-problema
e das possíveis variáveis de controle (CRB3). Seu relato, entretanto, não constituía
um a real ocorrência do problem a durante a sessão (CRB1). Do ponto de vista
da FAP, as chances de m elhora clínica são aum entadas se os medos e CRBs
associados p ro v o cad o s p ela intim idade realm ente oco rrerem na relação
terapêutica e, em decorrência, fornecerem para o cliente um a oportunidade para
aprender novas form as de responder. A lém disso, um a descrição do seu
com portam ento-problem a e das variáveis de controle, baseadas em um evento
que ocorra durante a sessão, deveria ser mais benéfico do que basear-se apenas
no com portam ento do passado do cliente.
As propriedades indicadoras de afeto foram observadas no instante do
choro de N ancy quando eu contei a ela sobre um período de duas semanas de
férias no futuro próxim o. Depois de relatar um a tristeza esm agadora, ela então
tentou m inim izar o evento, m udando de assunto, e com um sorriso falou sobre
não p re c is a r m ais de te ra p ia . Eu e stav a c o n sc ie n te de que um CRB1
provavelm ente estaria ocorrendo. Em conseqüência disto, depois de algumas
palavras de empatia, eu voltei ao assunto da m inha futura viagem. Nancy ficou
de novo chorosa e u m a discussão intensa seguiu-se, envolvendo nossos
sentim entos um em relação ao outro, tanto quanto possíveis soluções para o
problem a im ediato causado pelas férias, tal com o ter contato telefônico. Em
adição, um a lembrança de uma experiência traumática infantil de ter sido deixada
na casa de um a tia foi relem brada por Nancy.
Durante a sessão seguinte ao m eu retorno, N ancy relatou que ela se
sentiu m uito m elhor durante a m inha ausência do que ela podia ter imaginado.
A interação foi boa durante aquela sessão com am bos nos sentindo próximos
um do outro; isto foi diferente das interações raivosas e ressentidas que usualmente
Emoções e Lembranças na Mudança do Comportamento
103
seguiam as reu n iõ es anteriores com pessoas significativas, incluindo a m im
m esm o . N o s m e se s su b se q ü e n te s, nossas separações to m aram -se m enos
perturbadoras e, conseqüentem ente, N ancy relatou que era capaz de perm anecer
estável e não a b a n d o n ar a relação ao pensar na separação de um a pessoa com a
qual ela estivesse se envolvendo. Parecia que novos repertórios interpessoais a
respeito de separação dentro de um a relação íntim a haviam sido desenvolvidos.
A exp ressão de N an cy sobre seus sentim entos foi im portante em duas
m aneiras. P rim eira, sua presença foi um a indicação de que a situação terapêutica
era funcionalm ente sim ilar às suas situações cotidianas que envolviam intimidade
e separação. E x p ressõ es sim ilares de sentim entos e de retraim ento da situação
ocorreram quando a am eaça de separação ocorreu tanto n a vida diária quanto
na terapia. U m terap eu ta que esteja atento para estes tipos de sim ilaridades será
m ais capaz de d etectar CR B s. Segunda, o desaparecim ento de afeto junto com
a tentativ a de m u d a r o tem a foi indicativo de que a cliente estava perdendo
contato com variáv eis de controle. E u interferi trazendo novam ente à tona a
separação im inente, o que ajudou a m anter contato com as variáveis de controle.
Se o contato é m an tid o , o CRB pode ocorrer e gerar a oportunidade para a
aprendizagem de repertórios melhorados.
CASO IL U S T R A T IV O
K elly, 24 anos de idade, a m ais nova de três irmãos, veio à terapia com
o p rim e iro a u to r a p re se n ta n d o os seguintes p roblem as: dores de cabeça,
depressão, relacionam entos caóticos, tom ando-se chorosa e com demonstrações
sim ilares de em oção sem qualquer m otivo aparente, e sentindo-se desajeitada,
inadequada, incom petente, sem valor, e sem im portância. Parte de sua história
fam iliar en v o lv eu seu pai abandonando a fam ília quando K elly tinha 8 anos e,
posterio rm en te, encontros com ele a cada 5 anos aproxim adam ente. Ela disse
que não tinha n en h u m sentim ento e poucas lem branças a respeito de seu pai.
Sua histó ria interpessoal é caracterizada por interações sociais com hom ens, a
p a rtir da p ersp ectiv a de ser superior ou inferior à pessoa com quem ela está
falando. U m a pesso a que seja superior a ela pode aceitá-la ou abandoná-la, tem
pou ca co nsideração p o r ela, não a respeita e finalm ente a abandonará. Ela sente
atração p o r h o m en s que são superiores a ela m as, ou evita estar envolvida com
eles o u tem u m a relação passional m as estressante na qual ela se sente sem
forças p ara term inar e sabe que será deixada. D urante os prim eiros quatro m eses
104
C apítulo 4
de FAP, ela esteve distante e mostrou pouco afeto. Quando questionada sobre
o que ela achava que eu sentia ou pensava sobre ela. respondeu. “Como uma
pessoa que você vê muito mas que você nunca pensa nela até que você a veja..
eu não sei como descrever isto, é como se eu existisse sem um a presença”.
Seu sentimento de existir sem presença reflete sua história. Ela não teve
nenhum homem importante que tenha se dedicado a ela, ela foi ignorada na
presença deles. É com preensível que por esta razão ela se sinta desprezível e
sem im portância na presença do terapeuta. A interação continuou:
T: Bem, como você reage a mim? (Esta é uma questão padrão da FAP que tem por
objetivo trazer os tatos sob o controle dos estímulos inerentes à sessão).
C: Eu tenho este tipo de temor reverente. É muito... você é a autoridade e é ótimo que
você esteja olhando por mim. É. Eu não me permito ser colocada numa posição na
qual eu possa ser machucada. Eu penso que é assim, mas parece muito clichê que
eu não confio em ninguém, mas não é tanto isto quanto alguém olhar para mim
pelo que eu sou. Eu sei que algumas vezes eu realmente não me vejo desta maneira
com outras pessoas, você sabe, mas eu me sinto inferior. (A cliente está descrevendo
nossa relação de uma forma que parece similar a como ela se sente em relação a
outros na sua vida diária. Ela evita envolvimento emocional com homens que são
superiores a ela porque senão ela pode ser magoada. Sua descrição é um CRB3. A
resposta é boa do ponto de vista da FAP porque está principalmente sob controle
de estímulos inerentes à sessão.)
T: Agora em nossa relação, como você pode ser magoada por mim?
C: Bem, houve algumas ocasiões em que eu prendi a respiração esperando por você,
e você traz alguma coisa à tona e eu não estou segura para onde isto está se dirigindo.
É como se você fosse dizer “Bem, eu cheguei à conclusão de que eu devo parar de
vê-la, isto não está funcionando”. E, é como se eu estivesse esperando ser dispensada
o tempo todo.
(Kelly começou a chorar neste ponto. Falando sobre nossa relação, ela teve
contato com estímulos evocativos associados a ter sido abandonada. Ela está
tateando seus sentimentos que são evocados na sessão. Devido ao seu abandono
primitivo, ela evita permanecer nesse tipo de situação no cotidiano. Esta esquiva
contribui para os seus problemas de relacionamento. Seu afeto sugere que a relação
cliente-terapeuta fornece uma oportunidade de superar sua esquiva e seu medo
através do contato repetido com o estímulo evocativo, experimentando um resultado
melhor do que no seu passado, e em conseqüência melhorando suas relações na
vida diária.)
(Poucos minutos mais tarde)
Emoções e L em b ran ças na M u d a n ç a do C om portam ento
105
T: V ocê e sta v a , p o r a ssim dizer, c h o ro sa antes, certo?
C: S im . Eu fic o d e sse je ito m u ita s v e ze s. E u fico d e sc o n c e rta d a e su fo cad a.
I : D e v e h a v e r a lg u m a c o isa q u e ap are ce u n a n o ssa c o n v e rsa , o rig in a d a no q u e nós
e stá v a m o s fa la n d o e q u e te a tin g e . (E u e stav a su g e rin d o que v a riá v e is ex te rn as,
a lg o n a n o ss a in te ra ç ã o , e ram re sp o n sá v e is p o r su a re sp o sta e m o c io n al. )
C: É.
T: E você não sabe o que é?
C: Não, eu não sei.
T: Então, há um tipo de gatilho emocional aqui e você não está certa do que dispara
o gatilho.
C: Quando eu vi meu pai pela primeira vez desde que eu tinha 15 anos, que aconteceu
quando eu estava com 19 ou 20, eu devo ter chorado por dois dias seguidos. Quero
dizer literalmente baldes de choro, eu não conseguia parar de chorar. Eu até ria
durante o choro e eu pensava.... bom, seja o que for. (Esta é uma lembrança que foi
evocada por eventos ocorridos na sessão que também evocaram respostas similares
àquelas da situação lembrada.)
(Mais tarde na mesma sessão)
T: Há um tipo de gatilho emocional aqui que, sem dúvida, foi causado pela sua relação
com seu pai, e que, agora há pouco, surgiu entre nós. Você está convivendo com
uma reação em você que não entende e que não pode antecipar a sua ocorrência.
(Eu estou oferecendo uma inteipretação - Regra 5.)
N o decorrer dos 2 anos seguintes, CRBs relacionados a seus m edos e a
lem branças sobre seu pai continuaram a ocorrer enquanto K elly form ava um a
relação m ais próxim a com igo. D urante esse tem po, eu expressei abertam ente
m eus sentim entos (incluindo m inha alta estim a por ela) e os expressei da m esm a
m aneira que ela era encorajada a fazer.
Como discutido previam ente, a expressão de sentimentos pelo terapeuta
tem vários efeitos positivos. N este caso, eu m e tom ei m ais previsível para Kelly
e ela sabia m elhor o que esperar, um contraste em relação à m aior parte de suas
relações anteriores que foram experimentadas como perigosamente imprevisíveis.
Sua capacidade em predizer m elhor o m eu com portam ento, por sua vez, reduziu
106
Capítulo 4
sua esquiva e facilitou sua expressão de sentimentos. D a m esm a form a, ela
experim entou isto com um a confiança crescente em mim. Além disso, m inha
abertura e declarações positivas espontaneam ente aum entaram enquanto ela se
tom ava mais expressiva emocionalmente, fornecendo assim reforçamento natural
para suas m elhoras. Sua expressão em ocional aum entada aliada à m inha
aceitação dessa expressão encorajou e fortaleceu o s e lf (ver Capítulo 6). Houve
tam bém várias discussões a respeito das características da nossa relação e sobre
cada um de nossos repertórios que a tom avam tão reforçadora (Regra 5, CRB3).
Essas desciições verbais ajudaram Kelly a conhecer especificamente o que esperar
em um a boa relação. A 'experiência positiva da nossa relação perm itiu a ela
procurar por relações positivas sim ilares em sua vida diária.
Próxim o ao final da terapia de Kelly, ela estava relaxada e confiante
durante as sessões. Ela se relacionava com igo como um a igual e não existia
m ais aquele temor reverente em relação a mim. Ela valorizava a nossa relação e
via a si própria como sendo im portante para mim. Suas relações com hom ens
tam bém refletiram esta melhora.
5
Cognições e Crenças
O prim eiro autor p e d iu a H arriet que m udasse o horário regular de sua sessão
terapêutica, de seg u n d a-feira às 17hs para terça-feira às 15hs. Em bora tenha
concordado, H arriet revelou, várias sem anas m ais tarde, que a m udança lhe
havia causado um a grande quantidade de problem as. Para acomodar a mudança,
ela teve que reorg an izar seus h orários de trabalho e de escola, e seus problem as
atuais de ansiedade e depressão aum entaram . Q uando questionada do porque
n ão recu so u o pedido o u ex p lico u o quanto a m udança seria difícil, H arriet deu
a seguinte explicação. E m b o ra lh e tenha ocorrido contestar, pensou: “M inha
b o a vontade em co n co rd ar m ostra quanto eu m e preocupo com você e, além
disso, eu não q ueria que v o cê se zangasse com igo. E u não posso suportar a
idéia de que pessoas com q u em eu m e im porto fiquem zangadas com igo” .
A ssim com o H an iet, os clientes freqüentemente descrevem e/ou agem de
form a a sugerir um a relação causal entre seus pensamentos e sentimentos e seus
comportamentos (públicos). A visão do terapeuta sobre a natureza da relação causal
entre os pensam entos (ou cognições) e o comportamento (ou ações e sentimentos)
é importante, porque tal visão afeta o que ele diz e faz no decorrer da terapia. Em
nenhum contexto isso é m ais aparente do que nos procedimentos amplamente
usados pela terapia cognitiva. Com o m uitos terapeutas estão familiarizados com os
107
108
Capítulo 5
preceitos da terapia cognitiva, nós a usaremos como base de comparação para
realçar as similaridades e diferenças da Psicoterapia Analítica Funcional (FAP).
De maneira geral, nós acreditamos que a terapia cognitiva seja um tratamento útil
que pode ser melhorado com a adição da teoria e da prática da FAP,
]Pgi>^Ajpj a
fQCNTTTVA
Existe um a considerável diversidade dentro do que é compreendido
como teoria e prática da terapia cognitiva, e a fornia específica em que se
estabelece a relação pensam ento-com portam ento depende de cada orientação
em particular e da concepção que cada um a tem sobre pensam entos. Por
exemplo, Albert Ellis (1962,1970), um pioneiro da terapia cognitiva, introduziu a
idéia de que os pensamentos e sentimentos do cliente poderiam ser representados
através da Figura 2a, na qual A representa eventos am bientais externos, B
rep resen ta cognição e C é a ação e/o u em oção resultantes. Para Ellis, o
tratam ento clínico então envolveria dar aos clientes a explicação A B C de seus
problem as e direcionar esforços para m udar B , para que B não fosse mais
disfuncional.
Como há problem as com esse paradigm a A B C , ele foi revisto (Beclc
Rush, Shaw & Emery, 1979; Guidano & Liotti, 1983; Hollon & Kriss, 1984;
Turk e Salovey, 1985). É nossa opinião, no entanto, que a reform ulação da
terapia cognitiva jo g o u fora o bebê junto com a água da banheira; ou seja, ela
tem perdido algumas das características clinicam ente úteis da formulação ,45 C
e não tem abordado os problem as adequadamente. Antes de olhar a visão revista
da terapia cognitiva, deixe-nos brevem ente examinar alguns dos problemas com
a terapia cognitiva em si e com a form ulação ABC .
(c)
(d)
F ig u ra 2. Paradigm as que m ostram relações e n tr e i (evento antecedente), B (crença ou pensam ento), e C
(comportam ento conseqüente ou sentimento): (a) o pensam ento influencia o com portam ento; (b) o pensa­
m ento não tem nenhuma influência no comportamento; (c) o pensam ento tem influência parcial no compor­
tamento; e (d) o comportamento influencia o pensamento.
C ognições e Crenças
109
P r o b l e m a s c o m & t e r a p i a c o g n itiv a e o p a r a d ig m a A B C
Prim eiro, o paradigm a Ai?C exclui m aneiras alleraativas peias quais as
cognições e os com portam entos poderiam ser relacionados. Por exemplo, Russel
e B randsm a (1974) sugeriram que os problem as dos clientes poderiam começar
ajustando-se ao m odelo do paradigm a A —> B —> C. Então, após num erosas
repetições da seqüência A B C durante a sua vida, o condicionam ento clássico
rem overia a ocorrência de B. Em outras palavras, A se to m a um estimulo
condicionado de segunda ordem que elicia diretam ente C. O utra possibilidade,
sugerida p o r K lein (1974), é que o autoconceito negativo de um paciente
deprim ido, o seu desam paro e o ato de culpar-se são m ais aceitos como um
efeito do que com o um a causa da condição. E m outras palavras, o cliente
prim eiram ente se sente deprim ido e então tem as cognições negativas.
A experiência clínica também sugere outros paradigmas alternativos. Quando
os clientes fazem comentários tais como “Eu aceito racionalmente que eu não
preciso ser amado por todos, mas eu ainda m e sinto desolado quando sou rejeitado”,
eles relatam a presença de um B que é inconsistente com C. Por outro lado, alguns
clientes alegam que eles não experienciam nenhum B conscientemente que preceda
seus C problemáticos, assim indicando que não há B, ou que B é inconsciente.
U m segundo problem a com o paradigm a A B C é que seu uso na terapia
pode levar a alguns procedim entos clínicos questionáveis. P or exem plo, se o
terapeuta cognitivo acredita realm ente na hipótese ABC, a rejeição do cliente a
ta l c re n ç a do te ra p e u ta é en tão d esafiad a. O desafio to m a a form a de
questionam ento direto da lógica ou da sinceridade do cliente, ou ainda propõe
que haja cognições inconscientes adicionais a serem descobertas. Os desafios
tam bém podem ser indiretos. Em vez de confrontar a rejeição do cliente ao
m odelo A B C na sessão, o terapeuta pode dar a ele um a tarefa de casa adicional
ou testes p a ra v e rific a r suas convicções. A não aceitação de paradigm as
alternativos é encontrada até n a terapia cognitiva de Aaron B eck (1976), que
rejeita a teoria contida no m odelo ABC: U m exem plo disso é que B eck sugeriu
que clientes que dizem racionalm ente “ saber” que não são pessoas sem valor,
m as que não aceitam isso num nível em ocional, precisariam de m ais terapia
cognitiva, pois seus sentim entos disfuncionais só poderiam ocorrer quando eles
não “acreditam realm ente” no pensam ento racional (Beck et a l , 1979, p. 302).
A prescrição de “m ais terapia cognitiva” é u m a m aneira indireta de desafiar a
rejeição do cliente ao m odelo A B C .
110
Capítulo 5
D ada a com plexidade do com portam ento humano, a exclusão de outras
explicações concorrentes e não cognitivamente mediadas, como propõe o modelo
A BC , parece não ser razoável.
D o ponto de vista da FAP, um efeito antiterapêutico do m odelo A B C
poderia acontecer quando um cliente que não aceita a teoria A B C é desafiado
pelo terapeuta. Se esse cliente estivesse procurando ajuda para se tom ar m ais
assertivo ou ter m ais confiança em suas próprias opiniões, então, contestar a
teoria A B C do terapeuta poderia ser um com portam ento desejável. Como ideal,
essa m elhora em sessão,deveria ser reforçada pela aceitação do terapeuta e não
punida com a apresentação de m ais desafios.
Um terceiro problema com o paradigm a^45Crefere-se à evidência usada
para dar sustentação à noção de que sentim entos e ações disfuncionais são
causados por Bs desviantes, irracionais ou patológicos. U m tipo de evidência
que dá suporte a isso é obtida ao com parar-se os pensam entos e atribuições de
clientes com os de sujeitos “norm ais” (para u m a revisão atualizada, ver Beidel
& Tumer, 1986).
N ão é su rp resa que os clien tes ten d em a te r m ais p ensam entos
disfuncionais do que as pessoas “norm ais”. Tal pesquisa é problem ática porque
só dem onstra que as pessoas com problem as clínicos tam bém têm pensamentos
irracionais, não demonstrando que os pensam entos verdadeiram ente causam os
problem as. Tais inform ações, ao m esm o tem po em que dão suporte ao status
cáusal das cognições, fortalecem tam bém a noção de que as cognições são
causadas por sentim entos e ações disfuncionais, ou que ambas, as cognições e
as ações/sentim entos, são causadas p o r u m a terceira variável. A lgum as
inform ações indicam até m esm o que pessoas deprim idas podem avaliar a
realidade com mais precisão do que pessoas norm ais (Rrantz, 1985). Esses
dados são inconsistentes com um a explicação A B C para a depressão, na qual o
B é definido como um a visão desviante ou distorcida da realidade. U m a revisão
recente da literatura experimental sobre a relação entre estados internos e ações
fundam enta tam bém a noção de que B (o estado interno) e C ( a ação) são
algum as vezes não-congruentes (Q uattrone, 1985).
Um quarto problem a se deve à relação teoria-prática. N ão está claro
com o a hipótese cognitiva (teoria) se relaciona a m uitos dos procedim entos de
tratam ento específico (prática). Por que e com o, por exem plo, a argumentação
lógica ou um a evidência mudam um a estrutura cognitiva? Como a teoria cognitiva
dá suporte à defesa de B eck sobre a adequação do uso de um a abordagem
socrática, na qual os clientes têm que descobrir por si m esm os suas suposições
Cognições e Crenças
111
im plícitas? A té que ponto esta teoria seria relevante para a instrução direta de
Ellis aos clientes p ara que adotem novas crenças? Quais são os princípios teóricos
envolvidos em se atribuir a m udanças cognitivas o resultado das experiências
de avaliação de hipóteses que os clientes realizam em sua vida diária? De que
form a o que o cliente diz sobre cognições e suas respectivas relações a sihtomas
(m etacognição) ajuda a m udar as estruturas? Com o é possível ter terapias
cognitivas que não sejam m etacognitivas (Hollon & Kriss, 1984)? É indiscutível
a eficiência da terapia cognitiva. O que é problem ático é a adequação da teoria
para avaliar os resultados do tratamento. Como foi dito por Silverman, Silverman,
e E ardley (1984, p. 1112), os efeitos clínicos que ocorrem como resultado da
terapia cognitiva estão “esperando pela racional convincente” .
F o r m u l a ç ã o R e v i s a d a d a T e r a p ia C o g n itiv a
N u m a tentativa de m elhorar o m odelo A BC , terapeutas cognitivos se
voltaram p ara a teoria cognitiva básica e revisaram , ou m ais precisam ente
especificaram , o que se entende por B (cognição) e como ele está relacionado a
problem as clínicos. Por exem plo, Hollon e Kriss (1984) delinearam os diferentes
usos do term o cognição e fizeram um a distinção entre produtos cognitivos e
estruturas cognitivas (e processos cognitivos associados)*. Produtos cognitivos
são com portam entos privados, conscientes, diretam ente acessíveis, tais como
pensam entos, autodeclarações e pensamentos automáticos. Estruturas cognitivas,
p o r ex em p lo os “ schem as” (esquem as), são as entidades organizacionais
im plícitas que desem penham um papel ativo no processam ento de informações.
A s estruturas, no entanto, operam num nível inconsciente e como seu conteúdo
não pode ser diretam ente conhecido, deve ser inferido dos produtos.
C om o apontado por H ollon e Kriss, a distinção é sim ilar à diferença
entre a superfície e as estruturas profundas da lingüística. Estruturas superficiais
referem -se ao que é dito (verbalizações abertas) ou pensado (autoverbalizações
encobertas), enquanto que as estruturas profundas se referem ao que se quer
dizer. N a perspectiva de H ollon e K riss, o fator causal é a estrutura cognitiva,
en q u a n to o p e n sa r o u os p ro d u to s cog n itiv o s (pensam entos irracionais,
autoverbalizações, pensam entos autom áticos) constituem “ sinais ou dicas sobre
a natu reza das estruturas de conhecim ento de alguém ” .
' E strutu ras è p ro cesso s não são diferenciados nesse livro porque as distinções entre eles não afetam nossa
análise.
112
C apítulo 5
Por essa razão. Hollon e Kriss sugeriram que qualquer intervenção
clínica que altere os p rodutos cognitivos são sim plesm ente tratam entos
sintom áticos. N um a direção similar. Safran, Vallis, Segai, e Shaw (1986)
advertiram que a m udança nos produtos tem resultados clínicos limitados, e que
os esforços deveriam ser direcionados aos processos “centrais” . Da m esma
forma, Beck (1984) advertiu que uma recaída poderia ser esperada, a menos
que as estruturas cognitivas subjacentes sejam m udadas, e declarou que a noção
de que o fenômeno cognitivo cause depressão é “forçada”. Presum ivelm ente,
os “fenôm enos cog n itiv o s” cuja causalidade B eck rejeitou são produtos
cognitiv o s, enquanto que as estru tu ras centrais ou os “ sc h em a s” ainda
continuaram sendo vistos como causais.
Embora no cam po teórico a causalidade dos produtos cognitivos tenha
sido substituída pelas estruturas, um a m udança correspondente não ocorreu nos
âm bitos onde a terapia cognitiva é realm ente praticada. Os m esm os terapeutas
cognitivos que rejeitaram o papel causal de produtos cognitivos são aqueles que
criam os manuais de tratam ento de terapia cognitiva e os exem plos clínicos que
focalizam a m udança dos produtos cognitivos. P or exem plo, Beck, Emery, e
Greenberg (1986) declararam que o terapeuta “deve ser capaz de expressar
claramente que a ansiedade é m antida por um a avaliação errada ou disíuncional
de um a situação” e “dar essa explicação... na primeira sessão e reiterá-la durante
toda a terapia” (p. 168). Guidano e Liotti (1983, p. 138-142) declararam que o
prim eiro passo importante em terapia ocorre “quando os pacientes entendem
que seu sofrimento é m ediado por suas próprias opiniões”.
Se a prática clínica tivesse seguido a m udança ocorrida na teoria
cognitiva, o enfoque óbvio seria na m udança das estruturas “subjacentes” . De
um ponto de vista comportamental, o cism a da teoria-prática em terapia cognitiva
faz sentido. U m a vez que o único contato que o terapeuta tem com o cliente é
com o seu (do cliente) com portam ento e os produtos cognitivos são definidos
em termos de comportamento, assim a intervenção clínica pode ser especificada
como um processo de mudança de com portamento. Estruturas cognitivas, no
entanto, são definidas como entidades não comportamentais que não podem ser
contatadas pelo terapeuta. Com o as intervenções clínicas são sem pre limitadas
à esfera com portam ental - os pensam en tos, sentim entos, verbalizações,
teorizações, as associações livres do cliente e assim por diante - é impossível
program ar tratam entos que focalizem estruturas que não envolvam esses
com portam entos do cliente. D essa forma, é difícil conceber form as de intervir
nas estruturas que sejam diferentes daquelas usadas para lidar com os produtos.
C ognições e C renças
113
Por exem plo. B eck et al. (1979) declarou que “as intervenções cognitivas e
com p o rtam en tais [utilizadas] p a ra m o d ificar pensam entos são as m esm as
em pregadas p ara m u d ar as suposições ocultas” (p. 252). O que diferencia os
procedim entos de tratam ento clínico de produtos daqueles que são utilizados
para o tratam ento das estruturas, é que este último deve ser primeiramente inferido
(p, ex., o cliente deve abstrair ou deduzir a existência da estrutura). Mas, uma
vez identificada tal estrutura, ela é abordada através dos m esm os métodos
terapêuticos utilizados n a m odificação dos produtos. Direcionados pela teoria a
m udar um a entidade não com portam ental (a estrutura im plícita), enquanto se
encontram lim itados a trabalhar com o com portam ento (produtos) do cliente, os
terapeutas cognitivos ficam num a posição insustentável. Essa dificuldade teórica
em m odificar os esquem as e a ligação tênue entre a teoria e a explicação de
com o ocorre a m udança, têm sido considerados um dilem a por H ollon e Kriss
(1984, p. 46-48). Em bora eles e outros psicólogos cognitivos, tais como Guidano
e L io tti (1983), estejam trabalhando p ara achar m aneiras de sair deste dilema, a
questão é se soluções satisfatórias estão sendo ou podem ser desenvolvidas.
N ão é surpreendente, portanto, que a real prática básica de terapia pareça, pela
necessidade, ater-se apenas aos produtos.
G overnado por regras
C omportamento subseqüente
M ando
M odelado por
contingências
Tato
F ig u r a 3. Tipos de com portam ento verbal que po d em ou não influenciar um com portam ento subseqüente. O
tato a si m esm o e o m ando a si m esm o, os quais influenciam o com portam ento subseqüente, conduzem a um
sub-conjunto de com portam entos governados p o r regras (área som breada).
Capítulo 5
114
A R E V I S Ã O F A P D O A -> B - > C
Como alternativa, organizamos uma formulação da relação pensamento/
com portam ento que m antenha a utilidade clinica, m as evite os problem as das
hipóteses A B C originais. D e acordo com nosso m odelo, as cognições podem
representai' um papel maior, m enor ou insignificante nos problem as dos clientes.
Em decorrência, métodos de terapia cognitiva terão também um a eficácia variável
com clientes diferentes, dependendo do papel que a cognição tenha no problem a
clínico. N ossa concepçpo comportamental da cognição envolve vários tipos
diferentes de com portam ento do cliente, incluindo com portam entos modelados
pelas contingências, com portam entos governados por regras, e dois tipos de
com portam ento verbal, “tatos” e “m andos”. Como m ostrado n a Figura 3, eles
se sobrepõem em vários níveis. De particular im portância nessa análise são os
com portam entos de tato e m ando do cliente para si mesmo. Antes de explicar
nosso m odelo, iremos retom ar os conceitos de tato, m ando e com portam ento
m odelado pelas contingências que foram previam ente discutidos no Capítulo 3.
C o m p o rtam en to M odelado p o r C ontingências
Com o m encionado anteriorm ente, com portam entos m odelados por
contingências são aqueles comportamentos que têm sido diretamente fortalecidos
por reforçam ento. M uitos com portam entos, no entanto, não foram diretamente
reforçados, mas ocorrem m ais em função de estím ulos prévios. Por exemplo, as
instruções são estímulos prévios que podem evocar com portam entos complexos
que nunca tenham sido diretamente reforçados. D a m esm a form a, um instrutor,
dem onstrando o que fazer, pode evocar um com portam ento não reforçado
previam ente. Nesses casos, as contingências m odelaram o com portam ento mais
global (p. ex., im itar o instrutor ou seguir instruções), m as ainda não tiveram a
chance de exercer m uita influência no comportamento específico que está sendo
im itado ou instruído. Pode-se afirm ar, assim , que todo com portam ento é
basicam ente modelado por contingências.
Em bora um a experiência consciente de p razer po ssa acom panhar
freqüentemente um a contingência que envolve o reforço positivo, ela não é uma
parte necessária da m odelagem e do processo de fortalecim ento e não deveria
ser confundida com isso. Q uase todo o nosso com portam ento (p. ex., falar,
andar, coixer, etc.) ocorre por causa dos efeitos fortalecedores do reforço, e
Cognições e Crenças
115
esses co m portam entos foram fortalecidos, na m aior parte das vezes, sem a
no ssa consciência do processo. E xperiências conscientes (a serem discutidas
m ais tarde) têm um p apel im portante, m as diferente daquele do comportamento
que foi d iretam en te m o d e la d o p o r contingências. N o entanto, o fato de a
e x p e riê n c ia c o n s c ie n te s e r m a is d ire ta m e n te se n tid a do que os fefeitos
inconscientes do refo rçam en to , p o d e facilm ente levar à falta de atenção sobre
estes últim os.
U m a m an eira de olhar p ara o com portam ento de H arriet (descrito no
exem plo acim a) seria a de que seu consentim ento foi puram ente modelado pelas
contingências e n ã o foi influen ciad o p o r seus pensam entos precedentes. Desse
p o n to de v ista , se u c o n s e n tim e n to te ria sido m o d elad o d iretam ente por
experiências com pessoas que m ostraram a sua raiva quando ela foi inconveniente.
E ssas experiências p o deriam ter ocorrido na infância m ais tardia e/ou na infância
pré-verbal. D en tre essas experiências, poderiam estar incluídas a punição ao
ob ter com o resposta u m “n ã o ” ou outros tipos de recusa não verbal, o reforço
ao consentim ento, e a falta de aceitação dos outros contingente à expressão de
seus desejos. Isso re su lto u em algum as respostas (consentim ento) terem -se
to rn a d o m a is f o rte s q u e o u tra s (a s s e rtiv id a d e ). P o rta n to , v ê-se que o
consentim ento é resultado direto de contingências e seria esperado que ocorresse
de novo sob as m esm as condições, tais com o as que ocorreram na sessão de
terapia. E m b o ra tais contin g ên cias p ossam ter esses efeitos específicos, isso
não significa que a cliente esteja ciente ou consciente do processo. Desta forma,
é perfeitam ente possív el que H arriet esteja desatenta ou inconsciente das causas
do seu com p o rtam en to . N o s term os do paradigm a A B C , o com portam ento
m odelado p o r contingências corresponderia a.A—>C. O fato de que outras pessoas
responderiam diferentem ente ao m esm o A reflete a diferença em suas experiências
p assadas q u ando e m situ açõ es A .
T a to s e M a n d o s : D o is T ip o s d e C o m p o rta m e n to V erb al
A explicação da m odelagem p o r contingências, no entanto, não responde
p o r B , o p en sam en to que H arriet descreveu. P ara explicar com o H arriet veio a
te r se u s p e n s a m e n to s , n ó s v o lta m o s aos ta to s e m an d o s, dois tip o s de
com portam ento verbal.
P a ia revisar, tatos incluem a rotulação e descrição de eventos e objetos.
E x em p lo s de tato são, “A quilo é água” , “Eu gritei com ele” , e “Eu não suporto
isso” .
116
Capítulo 5
Mandos, por outro lado, incluem com andos, propostas, ameaças e
pedidos. A característica que define um m ando é que ele é reforçado por um
conjunto reduzido de contingências. Por exemplo, o mando, “Eu gostaria de um
pouco de água” somente será reforçado se resultar no comportamento do ouvinte
de prover água ou algum outro líquido para m atar a sede.
De acordo com a posição analítica com portam ental, tatos e m andos são
aprendidos da m esm a m aneira pela qual quaisquer outros comportamentos
tam bém o são. Assim , quando e como nós apresentamos os tatos e os mandos
varia de pessoa para pessoa, dependendo de suas experiências particulares. Para
ter um exemplo de com o o tato é adquirido, considere um a criança que aprende
a dizer “cam inhão” ao ver um caminhão passar porque foi desta m aneira que o
pai ou m ãe o descreveu. A criança é reforçada diretamente (“está certo, aquilo
é um cam inhão”) e indiretam ente como quando “cam inhão” entra em outros
contextos ( a criança diz, “Eu quero um caminhão” ou “Me dê aquele caminhão”).
D a mesma forma que alguém aprende a descrever objetos inanimados ou eventos
passados, tais como “Choveu terça-feira passada”, tam bém aprende a descrever
o com portam ento presente e experiências passadas de outras pessoas e de si
mesmo. Um hom em que se aproxim a da cadeira do dentista e diz, “Isso vai doer
e eu estou com m edo” está provavelm ente fazendo um tato (1) que resulta de
experiências passadas de ser m achucado por dentistas, (2) de seus sentimentos
de m edo (ver Capítulo 4 para um a visão com portam ental de sentim entos e do
que é “sentido”), e (3) de um a predição de como ele vai reagir quando estiver na
cadeira.
Até esse ponto, o tato e o m ando que nós discutimos foram ditos em voz
alta para outra pessoa. Se ditos em voz alta ou a si m esm o, não importa. Nós
sabem os que tato e m ando tam bém ocorrem quando a única pessoa que ouve a
descrição ou o pedido é o falante. Do nosso ponto de vista, tato e m ando a si
mesmo é funcionalmente o mesmo que tato e mando em voz alta quando nenhuma
outra pessoa está presente. Esses dois casos diferem principalmente na intensidade
da resposta. Nós estamos particularm ente interessados no tato e m ando a si
mesmo, pois isso é tam bém conhecido como pensamento. Assim, nossa definição
de pensam ento é tato e m ando a si m esmo.
A questão que iremos abordar agora é porque os pensam entos (e os
sim ilares m andos e tatos em voz alta sem ninguém para ouvir) ocorrem; isto é,
nós explicamos porque um a pessoa faria um tato ou um m ando quando outros
podem ouvir, como em “Isso é terrível”, “E u estou ansioso”, “ Seja paciente”,
C ognições e C renças
117
“ Fique de boca fechada". “ Saia da cam a”, e “ Faça agora". Não fica ião claro
porque isso seria pensado ou dito em voz alta quando não há ninguém por perto.
N ós estam os particularm ente interessados em tato sobre si m esm o e
m ando a si m esm o porque eles freqüentem ente englobam o que se entende por.fi
n a terapia cognitiva. P or exem plo, as palavras deve e deveria são vistas como
causas de neuroses por terapeutas racionais emotivos, e suas intervenções clínicas
são direcionadas à elim inação de tais palavras do pensam ento do cliente (Eilis,
1970). T ipicam ente, essas palavras (deve e deveria) são tam bém encontradas
em m andos que se faz a si m esm o, tais como “E u nunca devo com eter erros” e
“E u deveria estar feliz” . D a m esm a maneira, “E im possível m e am arem ” seria
visto p o r terapeutas cognitivos com o um pensamento irracional ou um a hipótese
disfuncional que causa os problem as do cliente. O pensam ento “E im possível
alguém m e am ar” é um tato dirigido a si m esmo. Portanto um a explicação
com portam ental de porque tato e mando a si mesm o ocorrem e como eles afetam
os problem as do cliente é im portante para nossa compreensão de cognição e
terapia cognitiva.
Tatos e m andos g eneralizados que não têm influência em com portam entos
subseqüentes
N ós acreditam os que o m odelo A B C engloba vários tipos de relações BC. O prim eiro caso que vam os considerar é um a falta de relação entre B e C,
que ocorre quando tato e m ando a si mesm o são sim plesm ente decorrentes de
um a generalização de estímulos e não do fato de eles afetarem um comportamento
subseqüente. A ssim , nós estam os tão acostum ados com o tato e m ando a outras
pessoas que algum a persistência seria esperada quando estam os sozinhos (p.
ex., u m a crian ça dizendo “cam inhão” em voz alta m esm o quando os pais não
estão p o r perto). A generalização de reações públicas para a esfera privada é
particularm ente esperada quando a sua form a pública é forte. Por exem plo, a
força considerável do m ando a outras pessoas é ilustrada por sua freqüente
generalização a objetos inanim ados, tais com o “ligue!” para um carro parado
ou gritos de aviso sobre u m a possível falta a um tim e de futebol n a televisão.
O bviam ente, esses m andos e tatos não têm efeitos nos objetos. Outro exem plo
de m a n d o se m u m a a u d iê n c ia , que o c o rre p e la g e n e ra liz a ç ã o de um
com portam ento de grande força, é observado nos índios Kaingang, que gritam
com tem pestades e com trovões para fazê-los ir em bora (Skinner, 1957). Skinner
118
Capítulo 5
considera esse com portam ento sem elhante àquele de gritar com hom ens para
fazê-los ir em bora, mantido tam bém por reforçam ento acidental decorrente de
as nuvens irem embora.
D eixe-nos retom ar ao caso de H arriet e descrever como ela poderia ter
pensamentos (um comportamento) que parecessem estar ligados de forma causal
a outro com portam ento subseqüente m as que, na realidade, não estão ligados.
N essa ilustração, nós acreditamos que seu pensam ento é um tato para si mesm a,
què o c o rre devid o à g e n e ra liz a ç ã o , e que o seu c o n se n tim e n to é um
com portam ento m odelado por contingências. Para que H arriet apresentasse o
tato a si m esm a decorrente de generalização, ela deveria ter tido um a história na
qual ela tivesse aprendido a descrever o seu próprio com portam ento e suas
experiências a outras pessoas, tais com o dizer à sua mãe, “Quando eu disse
não, papai se zangou” (um tato). Então, por causa da generalização de estímulos,
ela se engaja em com portam entos sim ilares quando outros não estão por perto
(p. ex., fazer tato de experiências recentes). N ós estamos supondo que o pai não
reforçou H arriet a dizer não a ele e reforçou a sua aceitação aos seus pedidos.
Com o essas contingências (reações do pai) foram m odelando diretam ente seu
padrão de comportamento de consentimento e evocando sentimentos associados,
ela tam b ém d e sc re v ia p ara si m e sm a as c o n tin g ên c ia s (p. ex., “P apai
sim p le sm e n te m e a fa sto u q u an d o p ed i su a a te n ç ã o ” ) e seus p ró p rio s
comportamentos operantes e respondentes (“Eu corri para o meu quarto e comecei
a chorar”). Assim, ao m esm o tem po em que o consentim ento e a falta de
assertividade estavam sendo m odelados, ela tam bém descrevia para si m esm a
os eventos no m omento em que iam acontecendo. Ela pensou e consentiu; o
pensam ento e o consentim ento eram independentes um do outro. Agora, em
situações parecidas, H arriet vai se engajar de form a sem elhante nos dois
com portam entos; isto é, ela vai pensar e consentir. Em termos do paradigm a
ABC , essas ações são representadas pela Figura 2b. A contece apenas que B
precede C em tem po, m as B não afeta C.
As combinações dos dois comportamentos separados, consentimento
modelado por contingências e m ando ou tato sobre si mesmo, induzido por
generalizações, oferecem uma noção de como um a pessoa pode ter pensamentos
(comportamento de pensar) e comportamentos (um comportamento subseqüente)
que não estão ligados de forma causal, embora possam parecer estar. Se esse conjunto
de circunstâncias na verdade ocorre para alguns clientes, seria um erro admitir seus
pensamentos como causa, para encaixá-los no paradigma ASC, e (concretizando o
erro) ignorar o papel das contingências na formação do comportamento.
Cognições e Crenças
T a to s e m a n d o s g e n e r a liz a d o s q u e in flu e n c ia m
su b s e q ü e n te s
119
c o m p o r ta m e n to s
A té este ponto, olham os o pensam ento como um com portam ento que
não entra na corrente causal de eventos que leva a C. Agora irem os exam inar as
circu n stâ n c ias n as quais tato e m ando a si m esm o podem te r um efeito
co n sid eráv el no com p o rtam en to subseqüente. A ntes disso, no entanto, é
im portante esclarecer um problem a sem ântico envolvendo a palavra causa.
Psicólogos cognitivistas e behavioristas radicais querem dizer coisas diferentes
quando se referem a causa. Para o psicólogo cognitivista, o efeito do pensamento
de alguém no seu com portam ento representa um tipo de relação causal (seja
parcial, de contribuição, ou outro). O teim o causa sim plesm ente significa que
se considera que os pensam entos trazem um a m udança no comportamento. Para
o behaviorista radical, o term o causa é lim itado aos efeitos das contingências.
O s m esm os efeitos que são cham ados causais pelos cognitivistas, isto é, os
efeitos do pensam ento sobre o com portam ento que se segue, são reconhecidos,
m as são descritos diferentem ente pelos behavioristas radicais.
P or exem plo, Skinner (1957) falou a respeito d e ’com o os eventos
privados são “úteis” o u “de rápida aquisição” (p. 445) e têm “ efeitos práticos”
(p. 440). E m sua discussão sobre a form ulação de regras que guiam nosso
próprio comportamento, Skinner (1969) também falou sobre a pessoa que formula
tato para si m esm a, porque ela m esm a poderia, então, reagir m ais “efetivam ente”
(p. 159). H ayes (1987), ao falar sobre a relação pensam ento/com portam ento,
re fe riu -se aos tip o s de co n tin g ên cias que levariam à o c o rrên c ia de um
c o m p o r ta m e n to e, e s te , c o n s e q ü e n te m e n te , “ iria in f lu e n c ia r ” o u tro
com portam ento (p. 331). Sendo assim , parece que am bos, cognitivistas e
behav io ristas rad icais, observam um fenôm eno similar, m as usam term os
diferentes p ara descrevê-lo. Talvez um a parte do conflito entre as duas posições
seja devida a essa diferença.
O tato sobre si mesmo pode ser útil ao indivíduo quando o ajuda a clarificar
ou identificar a situação que poderia, de outra forma, lhe ser confusa. Por exemplo,
o prim eiro autor estava vendo um a cliente que repentinamente se tom ava hostil
durante as sessões. Várias condições diferentes levavam-na à hostilidade, incluindo
(1) se suas interações com seu marido haviam sido boas naquela semana, e ela
sentia que eu estava muito confrontador e esperando demais dela durante a sessão;
(2) se houvesse tido um a sem ana m im com seu marido e achasse que eu estava
m uito distante ou não envolvido; e (3) se ela sentisse que eu estava sendo muito
120
C apítulo 5
subserviente. Fazer essas interpretações para a cliente (Regra 5) não era útil
nesse ponto de sua terapia e somente evocaria mais hostilidade. As interpretações
eram úteis, entretanto, quando feitas a mim mesmo, O tato sobre mim mesmo me
ajudou a descobrir um jeito de responder à hostilidade de uma maneira terapêutica.
A m aioria das interações humanas são bem complicadas, e o modo como alguém
faz o tato (rotula, categoriza, ou classifica) de um a situação pode ajudar a
determ inar uma reação efetiva.
D e m aneira semelhante, o m ando a si próprio pode aum entar a eficácia
de um a pessoa na realização de um a tarefa que esteja em suas mãos. Um caso
assim é ilustrado nas observações de Skinner sobre um a m enina que falava em
voz alta para si mesma enquanto praticava piano-“N ão, espere,” “Só um minuto,”
e “Isto está certo?” (1957, p. 444). Tais m andos a si m esm a podem tê-la ajudado
a fortalecer os comportamentos subseqüentes de parar e ouvir. Originalmente, a
criança disse esses m andos devido a u m a generalização feita a partir da
experiência de ouvi-los de outras pessoas e dizer aos outros as m esm as coisas.
N o final, com a experiência suficiente para tal, as contingências de tocar melhor
o piano (p. ex., para fins úteis) irão influenciar se a criança continuará ou não a
fazer esses m andos a si m esm a (seja em voz alta ou em pensam ento). Outro
com entário ou tato a si m esm a feito pela criança foi, “Isso está na clave de sol”.
Tal descrição poderia tê-la ajudado a reduzir erros da m esm a m aneira que teria
ajudado se essa declaração fosse feita pela sua professora.
Em bora esta seção seja sobre pensamentos que afetam o comportamento
subseqüente, Skinner fez observações adicionais da m enina que ilustram o caso
anteriormente discutido no qual pensamentos não têm efeito. A garotinha também
disse, “M eu dedo está doendo tanto” e disse ao relógio “N ão faça isso, você está
indo muito rápido!”. Skinner especulou que essas declarações não tinham efeito
no com portam ento subseqüente de tocar piano. Assim , enquanto observava a
m esm a criança executando a m esm a tarefa, Skinner sugeriu que alguns de seus
tatos e mandos a si mesma afetaram seus comportamentos subseqüentes, e outros
não. Isso corresponde à visão da FAP dos pensam entos do cliente. Além disso,
o tato sob re si m esm o e o m ando a si m esm o, os quais propiciam um
fortalecimento do comportamento, contribuem para manter a generalização, sendo
que tam b ém o co rrerão quando n ão tiv e re m efeito s n o com portam ento
subseqüente.
O caso no qual o tato a si m esm o e o m ando a si m esm o levam ao
desejável fortalecimento do comportamento subseqüente pode agora ser aplicado
ao caso de Harriet. Suponha que H arriet tivesse aprendido a descrever certos
Cognições e Crenças
1 21
pedidos feitos por outras pessoas (não importa o quão inocentes) como uma
prova de seu amor por elas. Ela poderia ter aprendido isso, quando criança, de
sua mãe narcisista que, freqüentem ente, precisava de afirm ações de amor, e que
fazia perguntas com segundas intenções. Por exemplo, quando sua mãe perguntava,
“Você gostou da torta que fiz para você?”, a pergunta tinha pouco a ver com o
gosto da torta. Ao invés, o que ela realm ente queria dizer era, “Você me ama e
aprecia o que eu faço? Se não, eu vou ficar deprim ida e vou m e retrair.”
P or conta da dificuldade de um a criança em diferenciar um a pergunta
“real” daquela que tem com o propósito servir de teste, H arriet poderia ter
experienciado punições e recom pensas inesperadas. M ais tarde, suponha que
ela tenha discutido esse problem a com am igos ou um terapeuta e tenha tido
consciência ou discernim ento das condições que diferenciavam um a sim ples
questão de um a questão de “teste” . D epois disso, quando confrontada com um a
questão, H arriet iria revisar privativam ente (tato) as condições para decidir
(discrim inar) se era ou não um teste. E ntão, p oderia dizer a si m esm a: “Esse é
um teste de amor. Se eu agir de u m a m aneira a rejeitar, ela ficará brava; se eu
seguir no m esm o esquem a, ela ficará feliz” . N os term os do paradigm a A B C ,
essa continuação é representada n a Figura 2a.
É claro que essa descrição do p ensam ento de H arriet corresponde, de
m aneira m ais próxima, ao paradigm a da terapia cognitiva no qual B é um produto
co g n itiv o , tal qual as e x p e riê n c ia s de p e n s a m e n to s ou a u to d e c la raç õ e s
conscien tes. E ste m odelo c o n firm a que h á p o u c o ou m esm o n en h u m C
condicionado ou m odelado independentem ente.
N ossa posição, entretanto, é a de que, em bora o comportamento de Harriet
tenha sido influenciado por seu pensam ento e portanto corresponda ao paradigm a
A —> B —> C, ela posteriorm ente experienciaria o sucesso ou o fracasso de seu
processo de decisão. Então seu consentim ento passaria a ser influenciado m ais
pelos efeitos inconscientes resultantes das contingências e m enos pelo “processo
de decisão” consciente. Esse processo, no qual com portam entos m odelados por
contingências e tato e m ando a si m esm o se estabelecem inicialm ente de forma
independente, passando depois a interagir uns com os outros, representa um a
outra organização possível da relação pensam ento/com portam ento. A ssün, no
devido tempo, um a reação que deveu-se prim eiram ente ao tato ou ao m ando a si
m esm o passa a ser modelada por contingências.
U m a interpretação ligeiram ente diferente do pensam ento de H arriet é
a de enxergar C com o m odelado p o r contingências e, ao m esm o tem po, situar
122
Capítulo 5
um B que também reforça C. Em outras palavras, H arriet poderia ter sido
submetida aos efeitos inconscientes do reforço que tom aram o seu consentimento
m ais provável e, ao m esm o tem po, ter se engajado num tato sobre si m esm a
consciente, que tam bém fortaleceria o seu consentim ento. N esse caso, o C
seria m ais forte do que aquele C que fosse somente m odelado por contingências
ou um apenas evocado por B. Esse paradigm a é representado na Figura 2c.
As formulações comportamentais das relações pensamento/comportamento
discutidas até agora não cobrem todas as possibilidades. É possível existir um caso
como o que está representado na Figura 2d, no qual as reações emocionais e/ou
comportamentos são diretamente evocados e só posteriormente, àm oda de JamesLange, os clientes descobrem o que eles teriam pensado. É também possível para
a ocorrência de um B independente, que se tenha um efeito no comportamento
subseqüente por causa do efeito da consistência, no qual se aprende que “uma
pessoa deve praticar o que ela prega” ou “não dizer uma coisa e fazer outra”. No
caso da consistência, pensamentos influenciam comportamentos subseqüentes porque
essés indivíduos foram reforçados por fazer o que disseram que iriam fazer e punidos
quando suas ações não eram consistentes com o seu comportamento verbal.
É também importante mencionar alguns dos problemas especiais gerados
pelo fato que Bs não podem ser obseivados diretamente e devem ser inferidos ou
baseados em autodescrições. Deste m odo, é possível que um a autodescrição de
um B, como a dada por Harriet, possa ser um a sim ples fabricação ou um a fala
necessária conforme a convenção social. M esmo nos casos em que o cliente está
dando sua m elhor descrição de B, acredita-se que tal introspecção não seja
totalm ente confiável e esteja sujeita a m uitas influências do mom ento.
Embora uma completa avaliação da relação pensamento/comportamento
incluísse esses além de outros paradigm as e fatores de influência, a avaliação
pela FAP e algumas de suas principais im plicações teóricas são transm itidas
pelos paradigm as delineados acima.
C o m p o rta m e n to G o v e rn a d o P o r R e g ra s
Iremos agora discutir a relação entre regras, com portam ento governado
por regras, tato sobre si m esm o e m ando a si mesmo. N ós estam os introduzindo
esse tópico porque a literatura sobre regras e com portam ento governado por
regras (Skinner, 1969; Zettle & H ayes, 1982) é relevante para nosso conceito
da relação pensam ento/com portam ento e esclarece questões futuras.
Cognições e Crenças
123
Q uando um tato ou m ando especifica u m a contingência e o com por­
tam ento necessário, é considerado com o um a regra. Por exemplo, a declaração
“ Se você agisse m ais am ig av elm en te teria m ais am igos” é um tato que é uma
regra porque é u m a descrição que especifica um com portam ento (ser amigável)
e um a contingência (ter am igos). “Você deve fazer suas tarefas de casa ou deixar
a terapia” é u m m ando que é um a regra, pois é u m a ordem especificando um
com portam ento (fazer a tarefa) e um a contingência (largar a terapia). Nesse
contexto, leis, princípios lógicos, m anuais de instrução, preceitos, máxim as, e
am eaças são tato s e m an d o s que são tam bém regras. O exem plo do tato de
H arriet sobre si m esm a é u m a instância de um a regra porque especifica o
comportamento necessário (consentimento) e as contingências (evitar problemas).
O com portam ento que ocorre com o um resultado do seguim ento da regra é
cham ado de com portam ento govern a d o p o r regras. Por exem plo, um a m ãe dá
tuna regra quando ela faz um tato a seu filho “ Se você não sair da cam a agora,
v o cê v ai se a tra s a r p a ra a a u la ” . A o b ed iê n c ia do filho seria então um
com portam en to g o v ern ad o p o r regras. A pós um a regra ser apresentada, o
com portam ento governado p o r regras pode ou não ocorrer. Você tam bém poderia
dizer a si m esm o que tem de term in ar o artigo que está escrevendo esta noite ou
se sentirá u m inútil. E m b o ra esse m ando a si m esm o seja um a regra, ele pode
resultar o u não e m u m com portam ento governado por regras (p. ex., você pode
ou não term in ar o artigo).
O com portam ento governado p o r regras nunca ocorreria se o indivíduo
não tivesse sido reforçado p elo com portam ento de seguir regras, de m aneira
geral. E sse p rocesso de reforçam ento ocorre a partir da infância, um a vez que
nos são dadas inúm eras regras n a form a de “Se você fizer (ou não fizer) isso e
isso, então isso e aquilo vão acontecer com você” . O bviam ente, há m uita
variabilidade sobre o quanto u m a regra é precisa. Para algum as crianças, os
pais dão regras precisas e quando a criança segue a regra, a conseqüência
especificada ocorre. P ara outras crianças, as regras não são precisas e a criança
aprende a ignorá-las. P or exem plo, estudantes graduados provavelm ente têm
histórias p révias de reforçam entos p o r seguim ento de regras, particularm ente
aqueles que encontram os em sala de aula. Eles são exem plos evidentes de
pessoas que fo ram refo rçad as p o r seguir as instrações e ensinam entos dos
professores. O com portam ento específico evocado pela regra, entretanto, pode
nunca ter sido reforçado. A ssim , um estudante pode fazer um conjunto complexo
de ações, ta is com o planejar, fazer e analisar um a pesquisa de dissertação, que
não tenha sido m odelado p o r contingências, m as está sob controle de regras.
124
C apítulo 5
No entanto, as contingências irão prevalecer como acontece com todos os
com portam entos governados pelas regras. Se as contingências de fazer a
dissertação são positivas (tais como, achar resultados interessantes e vantajosos
que se mostrem úteis às pesquisas futuras), o estudante pode se tom ar um
profícuo pesquisador. Ao contrário., se as contingências são punitivas (tais como.
obter resultados equivocados, de pouca ajuda e que requeiram um a análise
estatística sem fim), ele pode nunca m ais fazer pesquisas após a dissertação.
Semelhante ao discutido para tatos e m andos, as regras são extraídas
de e x p e riê n c ia s d ire ta s, ta n to n o ssa s q u an to de o u tra s p e sso a s, com
contingências de reforçam ento ou, ainda, através do estudo dos sistem as que
as organizam. O desenvolvim ento do com portam ento de obtenção de regras e
do com portam ento governado por regras tom a grande parte do comportamento
das pessoas porque ele ajuda a encurtar o tedioso processo de m odelagem. O
tato sobre si m esm a que H arriet desenvolveu é um exemplo.
É difícil dizer se uma pessoa está agindo baseada em regras (A
B —>C) ou
contingências (A —>Q , apenas olhando para a ação propriamente dita. Por exemplo,
um jogador de pôquer que calcula as chances que tem antes de fazer unia jogada
(A —> B —> Q poderia fazer as mesmas ações que um jogador que tenha sido
m odelado por contingências (A —> Q , m as suas variáveis de controle são
fundamentalmente diferentes. Assim, um dos jogadores está pensando sobre o que
fazer antes de efetivamente fazê-lo, e o outro está provavelmente confiando em
sentimentos e intuição, que é o aspecto experiencial de uma história de reforçamento
prévio. Da mesma forma, a eficácia de qualquer intervenção direcionada à mudança
de um comportamento dependeria de verificar se o comportamento a ser mudado
é do tipo A —> C ou A —^ B —> C. Se, por exemplo, você desejasse mudar o
comportamento de um dos jogadores de cartas, aquele que calcula as chances
poderia ser m ais influenciado por novos m étodos de como calcular chances
aprendidos em um a escola de apostas, do que o jogador modelado por contingências.
A d is tin ç ã o e n tre c o m p o rta m e n to g o v e rn a d o p o r re g ra s e
com portam ento m odelado por contingências é usada por Skinner (1974) em
sua recon-ceitualização de m uitas polarizações comuns. Algumas dessas são:
deliberação versus im pulso, idealizado versus natural, intelectual versus
em ocional, lógica versus intuição, consciente versus inconsciente, superficial
versus profundo, e verdade versus crença. D a m esm a form a, a distinção feita
por Skinner entre comportamento modelado por contingências e comportamento
governado por regras tem um a sem elhança im pressionante com a distinção
que a terapia cognitiva faz entre produtos cognitivos e estruturas.
Cognições e C renças
125
E s t r u t u r a s C o g ni t i v a s e C o m p o r t a m e n t o M o d e l a d o p o r Contingências
C om o p ontuado anteriorm ente, algum as formas de terapia cognitiva
salientam a im po rtân cia de m udar as estruturas (em oposição aos produtos),
m as faltam -lhes bases teóricas para que isso possa ocorrer. Uma vez que a
an álise do c o m p o rta m e n to é p rim eiram en te u m a teo ria da m udança de
c o m p o rta m e n to , s e ria ú til tra d u z ir a “ e stru tu ra c o g n itiv a ” p a ra term os
com portam entais com o propósito de delinear os m étodos de m udança.
C o m plem entando o que foi dito sobre polarizações n a seção anterior,
há outras sem elhanças entre as características do com portam ento modelado por
contingências e das estruturas cognitivas descritas. Prim eiro, os efeitos do
reforçam ento ocorrem em um nível inconsciente, e as estruturas são também
inconscientes. Segundo, os efeitos do reforço são funcionalmente definidos (isto
é, com portam entos aparentem ente diferentes podem acarretar o m esm o efeito),
o que é consistente com o significado profundo atribuído às estruturas cognitivas.
Terceiro, o com portam ento reforçado é mudado através da experiência com as
contingências e n ão por m eio de “conversas sobre as contingências”, o que
corresponde à presença não essencial dam etacognição na mudança das estruturas
cognitivas.
A ssim , estam os sugerindo que as estruturas centrais a que se referem os
terapeutas cognitivos sejam os com portam entos m odelados por contingências,
o que significaria que os terapeutas cognitivistas deveriam direcionar mais atenção
às contingências quando eles estão tentando m udar as estruturas centrais. Prestar
atenção às contin g ên cias é exatam ente o que Jacobson (1989) fez quando
d esc re v e u com o u so u a relação terapeuta/cliente para m udar um a crença
enraizada do cliente sobre sua “m aldade” . De acordo com Jacobson, a estrutura
central foi m u d a d a pelo fato de o cliente ter “corrido o risco de se deixar ser
conhecido intim am ente” pelo terapeuta e ter sido “compensado” por sua contínua
aceitação e consideração positiva.
U m a d ife re n ç a co n ceitu ai entre o co m portam ento m odelado por
contingências e as estruturas cognitivas é que o primeiro é um a entidade comportamental e o último, uma entidade não comportamental. Enxergar as estruturas
como sendo entidades não comportamentais tem o efeito indesejado de distrair a
atenção do processo com portam ental. P or exem plo, terapeutas cognitivistas
freqüentem ente não reconhecem o papel do reforçamento como parte inerente de
seus procedim entos. O efeito causado pela atenção do terapeuta ou as reações de
126
Capítulo 5
outras pessoas significativas podem ter um impacto importante no que o cliente diz
ou faz. A despeito da orientação teórica, é aceito que o reforço é um fator a ser
relativam ente considerado, em algum momento. A pesar disto, os terapeutas
cognitivistas, em suas análises teóricas, parecem ter um a fobia pelo termo
reforçamento. Hollon e Kriss (1984) nem sequer fizeram um a referência casual a
isso. Sim ilarm ente, no caso descrito por Jacobson (1989), as operações de
reforçamento foram descritas, mas este termo não foi usado. Mesmo Wessells
(1982), numa elegante defesa da psicologia cognitiva, lamentou que os cognitivistas,
infelizmente, negligenciaram o papel das contingências ao explicar o comportamento.
A negligência aò papel das contingências provavelm ente ocorreria em
um a análise do caso de H arriet feita por terapeutas cognitivistas. Partindo da
perspectiva deles, o consentim ento de H arriet teria ocorrido por causa de suas
estruturas cognitivas subjacentes, e as estruturas são vistas como entidades que
têm existência independente do com portam ento. D adas essas afirmações, a
explicação cognitivista das ações de H arriet e dos m étodos necessários à sua
m udança precisaria de algo além de um a sim ples razão para o com portam ento
e para sua m udança. Não é necessário dizer que a explicação da FAP para as
ações de Harriet envolve comportamentos e intervenções clínicas que são descritas
em term os de m udança de com portam ento.
IM P L IC A Ç Õ E S C L ÍN IC A S D A V ISÃ O D A FA P S O B R E AS
CRENÇAS
Em bora concordemos com os terapeutas cogniti vistas a respeito da idéia
de que o p en sam en to p o ssa p re c e d e r as ações, co n sideram os a relação
p en sam en to /co m p o rtam en to sem pre com o u m a relação com portam ento/
com portam ento. Quando os pensam entos são considerados com o comporta­
mentos, o terapeuta é conduzido a considerar as várias origens do comportamento
de pensar existentes e, em particular, a prestar atenção nas contingências de
reforçamento atuantes, tanto ao seu desenvolvim ento quanto à sua modificação.
As quatro m aiores im plicações de se tratar Bs como um com portam ento são
discutidas abaixo.
F o calizan d o o p e n sam en to a q u i e a g o ra
O pensam ento do cliente estará m ais sujeito à m udança terapêutica se
ele acontecer próxim o, no tem po e no espaço, às contingências e aos estímuios
Cognições e Crenças
127
de controle relevantes. Assim , sem pre que possível, nós recom endam os focar
o pensam ento, a crença, e os outros com portam entos relevantes que ocorram
na sessão . F req ü en tem en te o co rrem o p o rtu n id ades de m o d elar B s m ais
adaptativos na m edida em que os pensamentos disfuncionais do cliente aparecem
na relação cliente/terapeuta. Por exem plo, considere que o problem a de H arriet
seja do tipo A -> B —>C. Então, o consentim ento de H airiet ocorre porque ela
pensou que isso m ostraria o quanto ela se importava, e porque ela pensou que,
fazendo o contrário, evocaria a raiva do terapeuta. Esses são exem plos de Bs
ocorrendo dentro do contexto da relação. Tais pensam entos de H airiet poderiam
ter sido desafiados e reinterpretados de im ediato, e um novo com portam ento
poderia te r sido, então, fortalecido.
E m contraste com essa posição, os terapeutas cognitivistas focalizam
com portam entos que ocorrem em algum outro lugar. Quando essa posição é
lev ad a ao extrem o, o terapeuta cognitivista pode explicitam ente evitar ou
descartar oportunidades terapêuticas que surgem da interação cliente/terapeuta.
P or exem plo, em um a discussão a respeito dos “problem as técnicos” de fazer
uso da terapia cognitiva para a depressão, Beck et al. (1979) levantou o problema
de um cliente que lhe disse, “Você está m ais interessado na pesquisa do que em
m e ajudar” . E m prim eiro lugar, B eck sabiam ente assinalou que m esm o que
nada seja dito, um cliente que está em um projeto de pesquisa clínica pode
secretam ente cultivar tais pensam entos. No entanto, o m otivo pelo qual tais
pensam entos ocorrem, de acordo com Beck, é que clientes deprim idos podem
estar distorcendo o que o terapeuta faz. Ele então sugeriu que o terapeuta pergunte
ao cliente se algum desses pensam entos está presente e, então, o acalme. Ainda
de acordo com Beck, se possível, o terapeuta deveria evitar tais problem as, já
desde o início, antecipando sua ocorrência e dando explicações com pletas ao
cliente.
U m a análise feita pela FAP dessa situação seria diferente. Um cliente
deprim ido que não se sente im poitante para o terapeuta, demonstra que a situação
de terap ia poderia estar evocando o problem a que ele experiencia em outras
relaçõ es de sua vida diária - aquele de não agir com o quem pensa que é
im portante, pedindo o que quer. Isso não seria visto como um problem a técnico
a resolver, m as um a situação que cria um a oportunidade terapêutica importante.
M ais ainda, o terapeuta da FAP não assum iria que o cliente esteja distorcendo,
m as apenas_ que o terapeuta e o cliente estão contatando aspectos diferentes
da situação vigente. Pode até ser possível que a pesquisa seja m ais importante
p ara o terapeuta, e se assim for, o cliente não estaria “distorcendo” . A noção de
128
C apítulo 5
que o cliente poderia estar cultivando secretam ente tais idéias, ao invés de falar
sobre elas com o terapeuta, tam bém sugere a ocorrência do problem a clínico
do cliente, isso é, ele pode não estar sendo direto ou assertivo durante a sessão,
Embora a teoria de Beck possa, em geral, levar o terapeuta cognitivista
a negligenciar situações que seriam de interesse para um terapeuta da FAR ele
reconheceu que certas interações terapeuta/cliente podem fornecer oportunidades
terapêuticas. Por exemplo, ao discutir form as de fortalecer a colaboração, ele
assinalou que um cliente pode reagir a um a tarefa de casa como se fosse um
teste de autoconceito e que o terapeuta deveria tentar perceber isso (Regra 1) e
usar tal situação como um a oportunidade para corrigir cognições errôneas. Beck,
no entanto, não deu atenção especial ao fato de que o trabalho terapêutico
evidencia o comportamento que está ocorrendo naquele momento. Em vez disso,
ele considerou que os efeitos seriam os m esm os se lidasse com um a cognição
que ocorreu em algum outro lugar. Jacobson (1989), por outro lado, discutiu a
importância de se focalizar no comportamento durante a sessão, enquanto estava
praticando a terapia cognitiva de Beck. M ais ainda, ele sugeriu que esse fator
fosse incorporado nas bases conceituais da terapia cognitiva para depressão.
L ev a n d o em co n sid eração o p ap el v a riá v e l q u e os pensam en to s podem
exercer
Além de olhar os pensamentos como comportamentos, acreditamos que
é possível ter Bs que podem ou não desem penhar um papel nos problemas do
cliente. Recordando a nossa discussão prévia, examinamos três possibilidades:
(1) que o pensam ento influencia com portam entos subseqüentes; (2) que o
pensamento não influencia comportamentos subseqüentes; e (3) que o pensamento
contribui para aumentar a força de um comportamento modelado por contingências
subseqüente. Em outras palavras, o grau do controle exercido pelo pensamento
sobre sintomas clínicos está num continuum. D e um lado está o tipo A-> B-> C
puro, onde o B precedente é um com portam ento que corresponde a um produto
cognitivo e tem influência no problema do cliente. 0 tratamento para esse tipo de
relação aponta para a mudança dos Bs. Os procedimentos salientados na Regra
.5 para fazer interpretações, são apropriados aqui e incluem as técnicas da terapia
cognitiva de apresentação de argumentos lógicos, questionamento das evidências
e apresentação de instruções para m udança de crenças.
N o outro extremo do continuum está o tipo A - > C no qual o sintom a foi
unicam ente modelado por contingências. N este caso, o tratamento é direcionado
C og nições e Crenças
129
para m udar diretam ente os Cs - o foco seria expor o cliente a reforçamentos
positivos na sessão de terapia e no am biente natural, que poderiam modelar e
s u s t e n t a r n o v o s Cs. As in te r p r e ta ç õ e s d a d a s a o s c lie n te s tam b ém
corresponderiam a A -> C. Para ilustrar, eis o caso de Christina, que foi criada
por um a mãe esquizofrênica paranóica e foi sexualmente abusada pelos padrastos
q u an d o ad olescente. M esm o antes de ter adquirido a linguagem , ela foi
negligenciada, privada, abusada e rejeitada, o que continuou por toda a sua
infância. N ão é de surpreender que ela freqüentem ente ficasse deprimida e
n ervosa.
O relato que se segue é de um a sessão com Christina, depois de ela ter
estado em tratam ento com o segundo autor por 6 anos:
C: A vida é um espetáculo de horrores. Eu sinto uma sensação tão grande de
humilhação. Eu não quero lutar, eu só quero descobrir como morrer. E assim que
me sinto quando estou deprimida. A única coisa que me dana uma perspectiva
seria ter alguém em minha vida. As coisas não me parecem tão assustadoras quando
isso acontece. (Parece que o cliente está fazendo uma interpretação ABC de “Eu
fico deprimida quando não tenho ninguém em minha vida” e “Neste momento, eu
não tenho ninguém, portanto estou deprimida”.)
T: Você parece fechada a mim neste momento, você não está levando em consideração
meu amor e minha preocupação. (Eu respondi assim por pensar que a depressão
fosse um problema ABC, oferecendo a interpretação “Eu estou em sua vida. Tudo
que você tem a fazer é aceitar isso e então você não ficará deprimida”.)
C: Seu problema é que você não tem nenhuma empatia. Você nunca ficou deprimida
da maneira como eu estou. Se tivesse ficado, não diria coisas como “esteja aberta
para mim” e que seu amor deveria melhorar as coisas. Eu fico sozinha 99% do
tempo, dia após dia, semana após semana, e você espera que eu venha aqui e seja
uma pequena flor aberta? (Christina está me deixando saber, de forma clara, que
ela não gostou da interpretação ABC. Isso pode ter sido similar àqueles pedidos
feitos por outras pessoas para que ela sinta e aja de uma forma conveniente para
eles, mas que não é válida para ela. Ver o Capítulo 6 sobre o desenvolvimento do
self.)
N e sse exem plo, fazer qualquer tipo de interpretação que pudesse
p arecer um pedido para que sentisse ou agisse de um a dada m aneira, fazia
C hristina zangar-se e sentir falta de empatia. E u estava num a situação difícil.
A s interpre-tações são a prim eira m aneira usada por um terapeuta para indicar
ao cliente que suas idéias estão sendo levadas a sério. Pensando nisso, eu quis
fazer u m a interpretação que fosse consistente com sua experiência; isto é, uma
Capítulo 5
130
formulação A —>C,e que. ao mesm o tem po, relacionasse a resposta que Christina
apresentou a m im ao contexto de sua história (R egra 5). A lém disso, a
interpretação precisava ser em pática - livre de solicitações - , então eu escrevi
um poema:
D epressão
Devastada e exaurida
pelas atrocidades da vida
afogando em minha vergonha
presa em uma caverna escura e úmida
sem esperança de escapar
uma criança aos gritos dentro de mim
morrendo para ser abraçada
morrendo.
Eu procuro por você
mas você não me escuta
Você e eu estamos separados
por grossas paredes de vidro.
Você me vê mas não pode sentir
o veneno em minha alma.
Você fala comigo sobre maneiras de sair
da minha prisão,
mas não vê que preciso que você
esteja do meu lado
das grades?
Eu sempre fui sozinha.
Sozinha quando pequenina,
bombardeada pela
depressão e esquizofrenia de minha mãe.
Sozinha quando criança,
sem ninguém para segurar minha mão.
Sozinha quando adolescente,
usada como um objeto sexual
por padrastos e seus amigos.
Usada... e descartada.
Cognições e Crenças
131
Eu tento desesperadamente encher o meu vazio
com pênises anônimos
os quais somente golpeiam meu coração.
Ocasionais vislumbres da luz do sol
através das camadas de merda no meu cérebro»
não são suficientes...
Eu não quero viver.
Eu solto minha furia em você
porque não há mais ninguém.
Mas não há nem você.
E u enviei o poem a com essa nota: “Cliristina, eu não sei como te alcançar
quando você está deprim ida. Esse poem a é um a tentativa de m e conectar com
você, de v er o m undo através de seus olhos. E u te amo querida. Tenha força” .
E la m e respondeu dizendo que esta era um a das m elhores coisas que alguém já
havia feito p o r ela.
D urante sua infância, Christina foi tratada como sendo sem valor; isto
é, ela desenvolveu o com portam ento modelado p o r contingências de cuidar dos
outros, m esm o que isso a prejudicasse (esse com portamento é consistente com a
noção de que ela p rópria não tinha valor). Ela se sentiu, agiu e se descreveu
como sendo sem valor. De acordo com o nosso modelo, ela desenvolveu o autotato
“E u não tenho valor” (A —>B—>C). E u aceitei seus pensam entos de não ter valor
com o sendo autotatos que decorrem de seu passado e sua experiência de si
m esm a. A ssim , eu não usei a lógica para convencer Christina de que sua crença
era in c o rre ta e então m u d á-la p ara ver-se com o um a pessoa de “v alor” ,
especialm ente porque ela já sabia todos os argumentos lógicos. E u tam bém não
tratei a autocrítica de “sem valor” de Christina com o se fosse um a hipótese que
precisava ser testada e rejeitada. Ao invés, eu me concentrei em fortalecer aqueles
repertórios que são característicos de um a pessoa de “valor”. Esse procedim ento
vinculava reag ir a ela com o sendo um a pessoa de “valor” por um longo período
de tem po, considerando e reagindo seriam ente a todos os seus pensam entos e
idéias, tratando-a com preocupação e respeito, usando o tem po e energia que
são devidos a u m a p esso a de “valor” . O poem a foi consistente com essa
abordagem .
É desnecessário dizer que tratar a experiência de depressão e baixa
auto-estim a de C hristina com o “irracional” teria sido contraterapêutico, dada a
rejeição e o desprezo p o r seus pensamentos e sentimentos que ficariam implícitos
nesta ação. A ssim , de um ponto de vista com portam ental, a terapia apropriada
132
Capítulo 5
para um cliente com este tipo de problem a A —>C deveria ser m ais na linha da
“ e x p e riê n c ia e m o c io n a l c o rre tiv a ” d e fe n d id a p o r a lg u n s te ra p e u ta s
psicodinamicamente orientados.
O fereça explicações relevantes sobre os p ro b lem a s do cliente
N ossa análise tem tam bém implicações para as explicações oferecidas
aos clientes sobre seus problemas. Em bora seja possível para um cliente com
um problem a A ->C m elhorar quando lhe é dada um a interpretação A —>B-$C,
resultados menos favoráveis tam bém ocorrem. Isso é especialm ente verdadeiro
p ara clientes que tenham crescido em fam ílias disfuncionais, com adultos
insensíveis a seus sentim entos. M uitos de nossos clientes sofreram abusos
em ocionais, que incluem negligência, negação, ou punição pela expressão de
seus sentim entos. C rianças às quais é dito repetidam ente, seja direta ou
indiretamente, que “não há motivo para você se sentir ou pensar dessa maneira”
freqüentemente crescem com problemas do self (ver Capítulo 6 para elaboração).
Eles não confiam em seus sentim entos e não estão certos de quem são. Tratar
tais clientes com técnicas da terapia cognitiva e dar a eles explicações que contêm
a sugestão implícita de que suas suposições, crenças, ou atitudes são disfuncionais
e/ou irracionais, leva ao risco de reeditar as contingências que estão associadas
com a invalidação ou alienação que eles experienciaram enquanto cresciam.
Adicionalmente, clientes A —>C que são tratados como se seus problem as fossem
A —>B—>C, podem desistir do tratam ento no caso de sentirem -se invalidados ou
alienados.
O utra possibilidade é que clientes, aos quais é erroneam ente dito que
seus problem as são controlados por pensam entos precedentes e não por um a
história de reforçam ento, podem gastar m uito tem po trabalhando em seus
pensam entos e se excluindo de experienciar o m undo real. Por exem plo, veja o
caso de um a mulher cujos medos de rejeição provêm de experiências pré-verbais
com um a m ãe psicótica. Suas reações à rejeição são im ediatas e inconscientes.
E m ais importante para essa cliente ser exposta a um a variedade de experiências
interpessoais que não sejam seguidas pelas conseqüências extremas que ela
experienciou com sua mãe, do que engajar-se em longas argum entações lógicas
sobre desistir da idéia irracional “Eu preciso ser am ada por todo mundo o tempo
todo”.
C og n içõ es e Crenças
133
Use com c u i d a d o a ma ni pu l a ç ã o cognitiva direta
N ó s nos lem os concentrado nos problem as que podem ocorrer quando
tratam os um problem a A —^C com o se fosse um problem a A —>B—>C. Coíltudo,
as m anipulações cognitivas diretas, às vezes usadas por terapeutas cognitivos,
p odem b eneficiar os clientes m esm o se o problem a for do tipo A —>C. Nós
definim os m anipulação cognitiva direta como sendo comportamentos do terapeuta
que envolvem apelar para a razão, argum entos lógicos, ou dizer ao cliente que
u m a c ren ça em p articular não com bina com as observações do terapeuta.
P ortanto, a m anipulação cognitiva direta é, basicam ente, dar regras. Quando o
cliente responde às regras m udando seus Bs (produtos cognitivos tais como
crenças e pensam entos autom áticos), essas m udanças são com portam entos
governados p o r regra. Esse processo pode ser benéfico ao cliente por vários
m otivos. Prim eiro, parece razoável dizer que as crenças contribuem, pelo menos
em algum grau, em m uitos problem as do cliente, m esm o quando o fator inicial
é resultado de contingências. Esse paradigma é ilustrado na Figura 2c. Os métodos
de terap ia cognitiva direcionados para m udar B s diretam ente seriam então de
grande ajuda, particularm ente se o cliente tam bém fosse exposto às contingências
que p oderiam levar a um com portam ento melhor.
As técnicas de terapia cognitiva para problem as A ^ C também poderiam
ben eficiar alguns clientes que fossem pensadores lógicos e lineares e que já
interpretam seu problem a de acordo com a hipótese A B C (em bora seu problem a
seja A —> C). O benefício ocorreria porque tais pessoas aprenderam a ser
consistentes, isto é, elas cresceram em am bientes onde “praticar o que se prega”
era altam ente valorizado e “dizer uma coisa e fazer outra” não o era. H á alguma
inclinação desse tipo de cliente para agir de acordo com um a “crença” que um
terap eu ta fez um cliente adotar diretam ente. A força de tais inclinações, no
entanto, é geralm ente fraca e depende da proporção de ênfase que foi posta na
consistência pela subcultura do cliente.
U m a outra m aneira pela qual a m anipulação cognitiva direta pode ajudar
em p roblem as A -> C dá-se através das contingências e das regras encobertas
que tais procedim entos abrigam . P or exem plo, um efeito não pretendido ao se
conven cer racionalm ente os clientes a sustentarem um a certa crença, é que tal
procedim ento envolve um a solicitação ou descrição do terapeuta nas quais está
im plícito que"se eles se com portarem de acordo, eles irão m elhorar (um aregra).
Se então, os clientes se com portarem da m aneira indicada e essa nova m aneira
de se com portar for naturalm ente reforçada, os clientes melhoram .
134
Capítulo 5
Por exemplo, convencer Harriet de que ela pode suportar a raiva poderia
ser visto como um a solicitação encoberta ou uma instrução implícita do terapeuta
para que ela agisse diferentemente. M udanças no com portam ento de H arriet
seriam então o resultado do seguimento de tais instruções ou do comportamento
governado por regras. M elhoras clínicas significativas ocorrerão se o seu novo
com portam ento for naturalm ente reforçado em sua vida diária. Esse processo
fica mais óbvio quando a terapia cognitiva envolve instruções abertas e explícitas
ao cliente para a m udança do com portam ento. Por exemplo, B eck et al. (1979)
encorajou clientes a agirem contra suas suposições porque esta é a “maneira
mais poderosa de m udá-las” (p. 264). Em bora Beck tenha preferido ver essa
intervenção como m udança de um a cognição (uma suposição), isso tam bém
pode ser visto como sendo o terapeuta formulando um a regra para o cliente que,
ao segui-la, realiza um a exposição de seu com portam ento às contingências que
podem fortalecer diretam ente o seu novo com portam ento. E ssa ênfase em
construir um novo com portam ento é consistente com a FAP.
N o entanto, pode ser contraterapêutico quando produtos cognitivos e
um com portam ento subseqüente m udam porque o cliente está tentando agradar
o terapeuta. O perigo está no fato de que as m elhoras não serão m antidas pelos
reforços naturais da vida diária do cliente, e os ganhos obtidos na terapia se
perderão quando a terapia acabar. Esse problem a foi discutido no Capítulo 2,
no tópico de reforçam ento natural versus reforçamento arbitrário. Um a vez que
as manipulações cognitivas diretas envolvem instruções diretas sobre como pensar
ou se comportar, e tom ar explícitas as requisições para as m elhoras, é difícil
deixar de agradar o terapeuta. U m a exceção notável é o uso do m étodo socrático
e o “teste de hipótese” de Beck et al. (1979), os quais vem os com o m aneiras
engenhosas para reduzir a m otivação de agradar o terapeuta e colocar os clientes
em contato com reforçadores naturais.
E m bora terapeutas da FAP possam apelar à razão, diferenças teóricas
entre a FAP e as terapias cognitivas levam a com portam entos terapêuticos
diferentes quando tais intervenções não são bem sucedidas. Um a abordagem
que o terapeuta cognitivo poderia tentar seria a de aparecer com argumentos
adicionais sobre a im propriedade dos pensam entos do cliente. N a perspectiva
da FAP, levar H arriet a m udar sua crença, convencendo-a racionalm ente (à
m oda de A lbert Ellis) de que “ela pode suportar a raiva”, não é garantia de um
re s u lta d o fa v o rá v e l q u an d o e la se e n c o n tra r em um a situ a ç ã o fu tu ra
verdadeiramente problemática. Não existe garantia, porque não há clareza sobre
qual foi o com portam ento m udado com o “convencim ento” , a não ser o de ela
dizer “Qk, eu acredito que posso suportar.”
Cognições e Crenças
135
Q uando o cliente m u d a sua declaração de u m a crença por causa dos
argum entos lógicos do terapeuta, o sentido da declaração m uda. A ntes da
intervenção terapêutica, a declaração de crença tinha a propriedade de ser uma
descrição de experiências p assadas ou u m a indicação da sim ilaridade de certas
açõ es. D e p o is q u e as c re n ç a s do c lie n te fo ra m m u d ad as p o r cau sa da
argum entação lógica do terapeuta, elas n ão derivam m ais de experiências, mas
são apenas um a resposta p ara agradar o terapeuta ou se conform ar com as
regias de lógica. Portanto não é surpresa que m uitos clientes que tenham sido
“co n v en cid o s” a m u d ar suas cren ças, subseqüentem ente não m udem seus
com portam entos nas situações problem áticas. Tais “falhas” são freqüentem ente
acom panhadas p o r explicações, tais com o “E u acredito nisso intelectualm ente,
m as não aceito num nível em ocional” . O terapeuta da FAJP não ficaria perplexo
com este fato, pois não haveria m otivo p ara esperar nada diferente.
E m c o n tra ste , n ós a c e ita ríam o s as “ in c o n sistê n cia s” do cliente e
tentaríam os identificar variáveis que respondem pelos comportamentos, tais como
de (1) ap o iar um a crença X e agir consistentem ente com um a crença Y, (2)
tentar ser consistente em apo iar e agir, o u (3) ten tar agradar o terapeuta sendo
racional.
IL U S T R A Ç Ã O D E C A S O
N o caso de K elly (descrito anteriorm ente no Capítulo 4) o B parecia
c o n trib u ir p a ra o fo rta le c im e n to de se u c o m p o rta m e n to m o d elad o por
contingências. O seu tratam ento e a explicação de seu com portam ento eram
baseados nesse m odelo. K elly tin h a relações caóticas com hom ens devido, em
parte, às suas ações erráticas e estava p ara recriar o m esm o padrão ao term inar
prem aturam ente a terapia com o prim eiro autor. Q uando lhe foi perguntado
porque q ueria parar, K elly disse que fazia isso porque tinha a sensação de que
eu estava, n a verdade, p ara dizer-lhe que não iria vê-la m ais, e ela pensou que
d ev eria a cab ar prim eiro . E m b o ra isso soe com o um pro b lem a puram ente
A —>B—>C, no qual B era sua h ipótese sobre m inhas intenções, eu assum i que o
com portam ento m odelado p o r contingências tam bém estava presente porque
K elly não pôde identificar nada que eu tivesse feito para lhe dar essa impressão.
E sse é o fenôm eno que leva os terapeutas psicodinâm icos a dizer que as causas
da esquiva de K e lly eram inconscientes.
A história de abandono de K elly, com eçando n a infância, e a tentativa
de se esquivar de u m possível abandono futuro, retirando-se de relacionamentos
136
C apítulo 5
próximos, também fundam entavam a hipótese da presença do comportamento
modelado por contingências.
Assim, a ocorrência do CR’B1 de prem aturam ente largar a terapia, foi
usada como uma oportunidade in vivo para Kelly checar suas suposições. Eli
assegurei a ela que eu estava com prom issado a com pletar a terapia e não iria
p recip itad am en te term iná-la. M ais confiante, os m edos de K elly foram
amenizados e ela perm aneceu na terapia. Como o seu problem a era também
modelado por contingências, a segurança tinha apenas efeitos tem porários e
seus m edos retornariam . N o entanto, algumas vezes ela poderia pensar sobre
m inha atitude de renovar sua confiança e, por conseguinte, m oderar seu
com portam ento de esquiva e as suas reações emocionais.
Ofereci a K elly um a interpretação baseada nos efeitos com binados de
um B co n scien te e de um com p o rtam en to m odelado p o r contingências
inconsciente. E u lhe expliquei que ao dizer a si m esm a “Ele não m e abandonou
ainda, não há evidência de que me abandonará e ele disse que não o faria”, ela
poderia produzir os m esm os efeitos benéficos de eu dizer a ela a m esm a coisa.
N o entanto, também assinalei que ela tinha experiências passadas com situações
nas quais ela fora abandonada em condições semelhantes às da terapia e que
essas eram inconscientes e não mediadas por suas declarações. Às vezes, portanto,
ela experienciaria o m edo e tentaria m e evitar, m esm o tentando assegurar-se
conscientem ente. E la sentiu que essas interpretações correspondiam a seus
sentimentos. Conform e o relacionam ento terapêutico evoluiu, as contingências
presentes reforçaram os seus com portam entos que eram consistentes com seus
pensam entos de que eu não a abandonaria. Por exem plo, eu era consistente na
manutenção dos compromissos e, quando os feriados ou as viagens interrompiam
o calendário, eu ten tav a agendar um horário para rep o r as sessões. Em
conseqüência, o novo e m elhorado B (tal como, “N ão parece que ele vai me
a b a n d o n a r” ) a ju d o u a d e se n v o lv e r um co m p o rta m e n to m o d e la d o por
contingências de “perm anecer lá para dar um a chance” e vice-versa.
Em suma, nós apresentamos um modelo no qual os pensamentos contribuem
inteiramente ou parcialmente ou, ainda, não contribuem com os problemas clínicos.
Embora esse modelo aceite as técnicas de terapia cognitiva, ele enfatiza a importância
das contingências para determinar ou alterai' os efeitos do pensamento em outros
comportamentos. Assim, o uso de apelações para a racionalidade dentro da FAP é
apenas um a pequena parte de um conjunto maior de interações terapêuticas que
irão ajudar a desenvolver um novo conjunto de experiências e comportamentos do
cliente e produzir um a mudança favorável nas crenças a eles associadas.
Sem dúvida, h á um a ligação m uito próxim a na seguinte interação entre Beatrice
e sua terapeuta:
Beatrice:
É terrivelmente difícil para mim ser eu mesma.
Terapeuta: Se você não é você mesma, quem é você?
Beatrice:
Eu sou quem os outros querem que eu seja. Nem eu mesma sei quando
estou sendo eu mesma,
O “s e l f ’ ao qual B eatrice se refere possui alguns atributos confusos.
Prim eiro, ela se refere ao s e l f com o algo diferente de seu próprio corpo; ou
seja, ela descreve o seu í e / f m udando conform e o desejo dos outros, ao m esm o
tem po em que seu corpo físico obviam ente perm anece o m esm o. Seu self,
portan to , não é físico - não é o seu corpo. Segundo, ela deduz que há uma
experiência interna de seu s e lf controlada por algo que é externo. E finalmente,
ela constata que esse s e l f que ela experiencia, não é propriam ente seu, porque
é controlado- p o r outros. Isso então im plica que há ou poderia haver um a
ex p eriên cia de seu s e lf verdadeiro que seria im utável, e não controlada por
outros.
137
138
Capítulo 6
Ao analisarm os a literatura disponível acerca do s e lf constatam os uma
abundância deste tipo de paradoxos. Isso levou um autor a nom ear seu tratado
sobre o s e lf de “Há alguém 110 com ando?” (G reenw ald, 1982). Neste capítulo,
forn ecerem o s u m a concep ção b e h a v io rista de s e l f que co n sid era esses
paradoxos e diversos sentidos de s e lf típicos ou “norm ais”, bem como os seus
problem as ou estados “patológicos”. Em seguida, m ostrarem os como aplicar
nosso m odelo coinportam ental ao tratam ento.
Com eçarem os por dem onstrar as dim ensões do s e lf que serão incluídas
n e ste re la to . N o sso m o d e lo irá e x p lic a r, a p a rtir de um a ab o rd ag em
com poitam ental, as características essenciais dessas descrições não patológicas,
bem com o das patológicas.
DEFINIÇÕES COMUNS DO SELF
As quatro descrições de s e lf feitas p o r não-behavioristas que estão a
seguir representam 0 senso comum, não patológico do termo:
1. Experienciando o s e lf como 0 “E u ”. A m aioria de nós tem um
sentim ento do “E u”. D e acordo com D eikm an (1973), esse “E u” é “uma
consciência perm anente, descaracterizada e im utável, algum a coisa central que
testem unha todos os eventos externos e internos” (p. 325). D eikm an ainda
define esse s e lf com o consciência.
2. O s e lf como deflagrador de ações. U m outro tipo de “Eu” que é
sentido é o “Eu quero” de “Eu quero um cairo novo” ou “Eu não levantarei da
cadeira enquanto não tiver term inado m eu trabalho”. D eikm an descreve esse
“E u” como um a força organizadora, que im pulsiona 0 indivíduo a agir.
3. O s e l f com o fo n te de g esto s espontâneos. Segundo W innicott
(1965), 0 s e lf “real” ou “verdadeiro” é fonte de gestos espontâneos e idéias
personalizadas. Do m esm o m odo, M asterson (1985) definiu a criatividade como
“a expressão m ais real do s e l f (p. 17). O falso self, por outro lado, não tem
idéias originais, mas apenas aquelas originadas do outro.
4. O s e l f com o id en tid a d e p e sso a l. E rik so n (1968) descreveu a
identidade pessoal com o um a experiência consciente de duas percepções
simultâneas: (a) a igualdade do s e lf - “a percepção da igualdade do s e lf e a
co n tin u id ad e da e x istê n c ia do ser n o tem p o e no esp a ço ” , e (b) outro
reco n h ecim en to de ig u ald ad e - “a p ercep ção do fato de que os outros
reconhecem essa igualdade e continuidade” (p. 50).
O s e lf
139
Essas d efinições representam noções com uns sobre o self, tanto na
prática clínica quanto na vida cotidiana. Os conceitos utilizados nessa descrição
do s e l f parecem estar além da esfera do behaviorism o, e um behaviorista que
p re te n d a e x p lic a r esses fen ô m en o s encontrará algum as dificuldades. P or
exem plo, com o explicar, em term os behavioristas, noções com o “saber o que
os o u tr o s q u e r e m ” , “ n ã o se r e u ” , ou “ u m a c o n s c iê n c ia im u tá v e l e
desc ara cte riz a d a ” ?
A própria noção de “s e lf’ enquanto um conceito explicativo, é uma antítese
da esquiva comportamental de usar entidades internas para explicar o comportamento.
Quando alguém pretende explicar o comportamento do cliente em te rn o s de
problem as do jg^Xentendendo-se o s e lfcomo entidade não comportamental), uma
entidade ficcional é construída e erroneamente usada para explicar o comportamento.
Por exem plo, alguém poderia dizer que a dependência extrema do cliente pelo
terapeuta é causada por um s e lf inadequado. Isto é, o terapeuta pode consertar
essa inadequação desenvolvendo um s e lf mais completo; por esta razão, o cliente
se tom a dependente, pois ele(a) experiencia um s e lf roais adequado na presença
do terapeuta. Esse tipo de explicação não serve ao behaviorista, uma vez que “self
com pleto” e “s e lf inadequado” são novos, estruturas não comportamentais que
ainda precisam ser descritas. Sem querer se ater a este tipo de explicações
equivocadas, os behavioristas, em geral, têm evitado utilizar este teimo e portanto,
não têm se concentrado nos problemas do s e lf ou seu tratamento.
E m tem po, a única exceção foi Skinner, que fez inúmeras análises
teóricas do s e l f {1953, 1957) e contribuiu com um a base para um trabalho sob
a ótica behaviorista. N ossa intenção é desenvolver as noções postuladas por
Skinner e ex p lo rar suas im plicações clínicas. H á pelo m enos duas razões pelas
quais u m esforço deve ser feito neste sentido. Prim eiro, os problem as do cliente
descritos em term o s de desordens do s e lf parecem ser im portantes e aparecem
constantem ente. U m a indicação disso está na literatura sobre este assunto, dentro
da p sican álise m o d ern a, psicologia do s e lf e relações objetais. Segundo, o
fenôm eno do s e lf parece ser parte da experiência hum ana e os clientes geralmente
descrevem seus p roblem as em term os do seu self.
UMA FORMULAÇÃO BEHAVIORISTA DO SELF
Q u alq u er ex plicação adequada sobre o s e lf deve levar em conta a
experiência ou senso do self. Isto é verdadeiro pois as inúmeras descrições de
14-0
Capítulo 6
s e l f p ato ló g ico ou norm al envolvem a e x p eriên cia da pessoa (ou seja.
“experienciando uma continuidade e igualdade do s e l f ou os clientes que “não
sabem quem são” ). Desta forma, nosso objetivo está em entender e explicar o
sentido ou experiência de s e lf Apesar de não haver um consenso quanto ao que
constitui uma explicação ou um entendimento de um a experiência, seria vantajoso
entender o que é experienciado, pela identificação dos estím ulos que evocam o
sentim ento ou sensação e o tipo de experiências passadas que afetam este
processo . A pesar de p arecer um a ab o rd agem esotérica quando descrita
form alm ente, é um m étodo com um ente utilizado nas experiências cotidianas.
Para ilustrar, tentemos imaginar a experiência de alguém sentindo calor.
Poderíamos colocar esta pessoa num quarto com a tem peratura controlada, variar
esta tem peratura, tom ar nota das tem peraturas observadas e concluir qual
tem peratura é necessária para a pessoa relatar que sente “calor” . Variando-se a
umidade, do mesmo modo poderíamos determinar a influência dessa variável na
experiência. Nosso estudo estaria ainda m ais completo, entretanto, se pudéssemos
saber algo m ais sobre a história prévia desta pessoa com relação ao calor. Se
esta pessoa, por exemplo, cresceu no deserto, um aumento considerável de
tem peratura seria necessário para evocar essa sensação de calor, ao contrário
de um a pessoa que tenha nascido e vivido no Alaska. Essa tentativa de explicação
envolve um conhecim ento m aior acerca dos fato res relacionados a esta
experiência. M ais especificam ente, quanto m ais souberm os com referência às
variáveis que levam à sensação de calor na pessoa, m ais poderem os dizer que
“entendem os” a sua experiência. Como vocês podem notar, nossa abordagem
ao tentar entender a experiência de um a pessoa reside no fato de entendermos o
relato verbal dessa experiência. Apesar de não serem a m esm a coisa, assumimos
aqui que os mesmos fatores que afetam a experiência de alguém tam bém afetam
o relato verbal dessa experiência. A lguns dos leitores podem se opor a esta
equivalência, baseando-se no fato de que sua própria experiência é não-verbal.
Pedim os a estes leitores que reservem seu julgam ento final quanto ao assunto
para m ais tarde. Um a experiência não-verbal do s e lf é consistente com a presente
análise comportamental.
Nosso entendimento da experiência do s e lf é paralela ao exemplo do
calor. Assim como explicamos a experiência do calor identificando o estímulo e a
história da resposta “Eu sinto calor”, tentaremos explicar a experiência do se /f
descrevendo os estímulos e a história que se relacionam com as palavras que
identificam o self. Palavras estas que incluem “Eu”, “M im ”, “Querido”, “Davie”
ou “Dottie” (quando usados para se referir ao seu self) e “Você” (quando utilizado
O self
141
por uma criança pequena para se referir ao seu self). Por propósitos ilustrativos,
entretanto, concentrarem os nossa discussão no “E u ” genérico. Nossa abordagem
para o entendimento do “E u ’' com algum as sutis variações, se aplicaria tanto para
os sinônimos de “E u” quanto a outros term os equivalentes. Assim, nossa análise
do “Eu” pode ser vista com o um protótipo para a análise de outras respostas
verbais associadas ao self. D esta m aneira, o entendim ento do “Eu” em particular
parece contem plar uma larga faixa de experiências do self. A especificação dos
estímulos que se referem ao “E u ” tam bém ajuda a en xergam os a natureza do
estímulo que geralm ente controla a experiência do self.
C onceitos B ásicos
N ossa hipótese sobre o s e l f é essencialm ente um a hipótese sobre um
com portam ento verbal. E specificam ente, o entendim ento da experiência do s e lf
é a especificação dos estím ulos controladores da resposta verbal “E u” . Alguns
conceitos de com portam ento verbal form am o fundam ento de nossa abordagem:
controle de estím ulos, tato, unidades fu n c io n a is e a emergência de pequenas
unidades fu n cio n a is. C om o j á discutim os controle de estím ulos e tato, farem os
aqui apenas um breve resum o.
Controle de E stím ulo
Im agine um pom bo que é reforçado por bicar um a chave apenas quando
um a luz estiver acesa. N o final, seguindo a luz, u m a resposta de bicar a chave
aparecerá. A lgum as conclusões óbvias que podem os tirar dessa situação são:
1. A resposta de b icar a chave ocorre quando o S d (estím ulo discrim inativo luz acesa) está presente.
2. B icar a chave está sob controle do estím ulo da luz acesa.
3. Bicar a chave é um a unidade funcional, definida como o com portam ento que
ocorre entre o S d e o reforçador. (D iscutirem os isso em m ais detalhes na
seção das unidades funcionais.)
P or ser im portante p ara a com preensão do nosso conceito com portam ental do s e l f discutirem os o processo através do qual o acender a luz se
transform a num Sd. N o início do experim ento, o pom bo é exposto a um grupo
142
Capítulo 6
grande de estím ulos que consistem no sinal lum inoso, m ovim entos e barulhos
no ambiente, luz da sala, a orientação do próprio pombo em relação à luz, assim
como à riqueza dos estímulos privados ou internos, tais como atividade fisiológica
e a estim ulação sinestésica que provém do sinal luminoso. Assim, m esm o que o
experim entador possa sentir que a luz é o estím ulo m ais óbvio, pode não o ser
necessariam ente para o pom bo. Entretanto, após repetidas tentativas, a luz se
destaca o suficiente para controlar as reações de bicada na chave, pois é o
elemento do grupo de estímulos que está sempre presente quando os reforçadores
estão em ação.
O Tato
Im agine um a criança do sexo fem inino que está aprendendo a falar, e é
reforçada pela alegria de seus pais por dizer “m açã” sem pre que lhe m ostram
um a maçã, e não quando lhe mostram uma banana ou laranja. Finalmente, apenas
o fato de m ostrar a m açã a ela pode resultar na reação “m açã”, “m acã”, “m aã”
ou outra aproximação fonética. A lgum as conclusões óbvias podem ser tiradas
dessa situação, a saber:
1. A resposta balbuciada “m açã” ocorre quando o Sd (estímulo discriminativo),
um a m açã, está presente.
2. A resposta “m açã” está sob o controle do estímulo maçã.
3. A resposta “m açã” é um a unidade funcional.
4. N ão podem os dizer no entanto, que o tato “m açã” corresponde m ais à fruta
m açã do que, no outro experim ento, a “b icada” na chave pelo pom bo
corresponde ao sinal de luz. Desta m aneira, não podem os dizer que a criança
usa a palavra “m açã” tanto quanto não dizem os que o pom bo usa a “bicada
n a chave” .
A ssim como no caso do pom bo e o sinal da luz, a fruta m açã controla a
resposta verbal “m açã” pois esta era o estím ulo que estava presente toda vez
que dizer “m açã” foi reforçado. A p esar de parecer óbvio, para que este
condicionam ento verbal pudesse acontecer, os pais tiveram que ver a m açã (ou
seja, saber que ela estava presente). C om o reafirm arem os m ais tarde, a
O s e lf
143
im portância dos pais saberem que o S d está presente, é um aspecto fundam ental
quando a criança estiver aprendendo o “E u” .
Unidades F uncionais
Com o j á vim os, a bicada na chave pelo pom bo é um a unidade funcional.
Q uando vem os um a bicada, podem os dizer “A í está” . M as quando se trata de
u m com portam ento verbal, fica m enos claro o que pode ser considerado um a
unidade ou um a ocorrência única. M esm o que fiquem os tentados a dizer que a
unidade do com portam ento verbal é um a palavra, isto pode levar a alguns
problem as, já que experienciam os nossas verbalizações com o sendo, às vezes,
m enores e, às vezes, m aiores que um a palavra. U m exem plo ocorreu quando o
prim eiro autor aprendeu o hino nacional. E u lem bro de ter aprendido um a grande
unidade totalm ente sem sentido - "landaliverty” *. D e m aneira sem elhante, o
alfabeto é norm alm ente ensinado em grandes unidades ordenadas. Toma-se difícil
verbalizar as letras na ordem se com eçarm os p o r qualquer ponto do alfabeto
que não seja o início. C ontrariam ente, algum as palavras com plexas, como
inconstitucionalissim am ente, são realm ente um a com binação das unidades
m enores “in” , “constitucional” , “m ente” .
A unidade funcional é um a concepção sk inneriana de unidade de
com portam ento verbal e seu tam anho depende de com o foi aprendida e mantida.
Sendo a unidade funcional um com portam ento que ocorre entre o S d e o reforço,
seu tam anho verdadeiro p o d e variar com a experiência. Por exemplo, uma criança
pequena pode prim eiram ente ser instigada a d izer “b ebê”, com o duas unidades
m enores - os pais dizem “b e” e esperam a criança repetir “b e”, e então dizem
“bom , agora fala bê” . D epois deste tipo de dica, quando se pede para a criança
tatear bebê, ela poderá dizer algo com o “B e - B ê”, o qual ainda assim evidencia
unidades m enores que a com posição inteira. Porém , com o tem po, a unidade
singular “bebê” emergirá. A ssim , unidades funcionais podem ser pequenas, como
as p alav ras (“m a ç ã ” e “ o i” ) e fo n em as (be, e bê). U nidades m aiores de
com portam ento verbal seriam frases com o “C om o você está” , “Q ue D eus nos
ajude” , “cachorro-quente” , e “Estados U nidos da A m érica” . U nidades ainda
m aiores, com o Conselho de A dm inistração e Finanças da U niversidade, se ditas
em conjunto, podem incluir o alfabeto.
' (N.T.: ju n ç ã o de três palavras em inglês que form am um som único = land o f liberty).
144
Capítulo G
A emergência de pequenas unidades funcionais
Para os objetivos deste capítulo, estamos particularm ente interessados
no “Eu" como uma pequena unidade funcional, ou seja, um a palavra individual
que tenha um significado independente. Iremos contrastar dois m odos pelos
quais um a simples palavra pode se transformar numa unidade funcional quando
um a criança está aprendendo a falar. Essa unidade funcional com um a única
palavra pode ser aprendida separadam ente ou pode emergir como subproduto
da aquisição de respostas maiores contendo elementos idênticos (Skinner, 1957,
p. 120). A aprendizagem separada da palavra enquanto unidade foi ilustrada no
exem plo anterior, que m ostrou como o tato “m açã” foi adquirido. Naquele
exem plo, a palavra “m açã” foi aprendida como um a unidade.
Agora usarem os um exem plo para explicar como um a palavra pode se
transformar num a unidade via emergência proveniente da aquisição de unidades
maiores. Neste caso, será usada a palavra “grande”. Suponhamos que um pequeno
garoto tem os tatos “m açã”, “cam inhão”, “lápis”, “laranja” e “cachorro” em
seu repertório, m as não o tato “grande” . Seus pais apontam para um a grande
m açã num a caixa de m açãs e dizem “Esta é um a m açã grande, diga ‘maçã
grande’”. Depois de algumas vezes e depois que a dica foi gradualmente retirada,
a criança tateará “m açãgrande”. Note que neste mom ento, devido às condições
específicas sob as quais a criança aprendeu, “grande” não é um a unidade
funcional. De fato, “grandemaçã” é um a unidade singular sem qualquer conexão
com “m açã”, e assim, não é um a combinação de duas unidades, “grande” e
“m açã” . Depois, os pais falam “cam inhão grande”. Após inúm eras tentativas
com o caminhão grande, a criança tateará “cam inhãogrande”. Finalm ente, após
a criança haver experim entado um núm ero suficiente de experiências similares
com grandes laranjas, bonecas, lápis e outros objetos, a palavra “grande” emerge
como um a pequena unidade controlada pelo estímulo do tamanho. Isso acontece
porque “grande” é o elem ento idêntico dentre um a variedade de situações nas
quais objetos específicos (laranjas, bonecas, lápis) variam e tamanho é o elemento
com um do estímulo. Após a em ergência da unidade “grande”, a criança poderá
tatear “cachorro grande” m esmo que nunca tenha tido um a experiência prévia
com cachorros grandes.
D iferentem ente do processo no qual o “grande” em erge de unidades
m aiores, seria possível estabelecer experiências de aprendizagem de m odo que
“grande” fosse aprendido separadam ente. Para isso, os pais teriam que apontar
uma grande maçã e dizer “grande” (ao invés de “grande m açã”) e assim a criança
O se lf
145
poderia tatear “grande". O m esm o se repete para outros objetos até que seja o
tam anho das coisas que passe a controlar o tato “ grande"'.
Os exem plos citados servem para ilustrar dois métodos pelos quais uma
palavra pode se transform ar em um a unidade fu n cio n al Mós sim plificam os
propositadam ente as experiências de aprendizagem , e as descrevem os de um
m odo estereotipado a fim de clarear o papel dos processos fundam entais
e n v o lv id o s . N ão e sta m o s s u g e rin d o q u e n o ss o s ex em p lo s sejam um a
correspondência direta dos “passos” da criança ao aprender “grande” em seu
próprio am biente natural. N a vida real, dicas, modelos e reforçamento são usados
m ais a esm o e inconsistentem ente. Assim , a palavra “grande” é adquirida
provavelm ente através da combinação de aprendizados separados e da emergência
de grandes unidades e/ou outros processos m enos relevantes à nossa discussão
(por exem plo: aprendizagem de significados através de definições).
Ao apren d er a falar, a criança sim ultaneam ente adquire unidades
funcionais singulares num a faixa de tam anho que varia de pequeno a grande. O
período de vida com preendido entre os 6 m eses e os 2 anos é conhecido como
“período de um a só palavra” para os lingüistas e psicólogos do desenvolvimento.
A creditam os que seria m ais apropriado cham ar este período de “Período das
unidades funcionais singulares” pois a criança deve aprender unidades que tenham
um a ou m ais palavras, m as que ainda continuam sendo unidades funcionais
singulares. A observação da linguagem das crianças durante esse período legitima
essa visão de unidade funcional (Dore, 1985). No início deste período, as unidades
singulares são palavras ou fragm entos de palavras como “boneca” , “m açã” ,
“m aã” (para m açã), “vete” (para sorvete), “cae” (para cair). Ao final deste
período ou durante o segundo ano de vida, m uitas dessas palavras únicas tom am
a form a de frases com duas ou três palavras com o “m ordi você”, “bebê - m ordi
- você”, “m ais suco”, e “eu - m ais - suco”, m as perm anecem unidades singulares
funcionais. N esta idade, as unidades m aiores não se form aram da com posição
feita p ela criança das unidades pequenas; elas são aprendidas como um todo.
Á e m e rg ê n c ia do “E u ” com o u m a p e q u e n a u n id a d e funcional
A creditam os que o “E u ” ’ em erge com o um a unidade funcional da
aq u isiç ã o de u n id ad es m a io re s enquanto a c rian ça aprende a fala r num
* N ossa análise do term o “Eu” , tam bém se aplica a “meu” , “m e”, “nom e próprio”, e similares, e assum im os que
estes term os têm um a sobreposição no significado fu n cio n ai
Capítulo 6
146
desenvolvim ento norm al e não patológico. D esignam os três estágios de desen­
volvim ento relevantes para essa aprendizagem e os ilustram os na Figura 4, que
m ostra unidades de três tam anhos, cada qual correspondente a um estágio de
desenvolvimento.
E stá g io I
E stá g io I I
Estou com calor
Estou com fotae
Estou aqui
Estou
Me sinto triste
Me sinto mal
Me sinto feliz
Sinto
Ouero sorvete
Quero suco
Quero mamãe
Ouero
Veio carro
Veio mamãe
Vejo peixe
Veio
Eu X coelho
Eu X giz de cera
Eu X bebê
Eu X y
E stá g io I I I
Figura 4: Os 3 estágios de desenvolvimento do comportamento verbal que resultam na emergência
do “eu” como um a unidade funcional pequena. No estágio I a criança aprende unidades m aiores
independentes que são a base para unidades abstratas de tamanho intermediário do estágio II.
Então, o “eu” do estágio III emerge dessas unidades interm ediárias do estágio II
D urante o estágio I, a criança aprende várias unidades m aiores como
“eu tenho um a boneca”, “eu tenho um coelho”, “eu quero sorvete” , “eu quero
suco”, “eu vejo o carro” e “eu vejo m am ãe” . Tenha em m ente que, na verdade,
estas frases devem soar como “m im vê m am ã”, ou “nenê sorvete” e que estamos
usando “E u ” com o um a form a genérica de auto-referência. Essas grandes
unidades são aprendidas como um todo (ou seja, são unidades funcionais). Esse
estágio ocorre durante os dois prim eiros anos de vida.
O s e lf
147
D urante o estágio TI, unidades funcionais m enores emergem, como “eu
tenho” , “eu quero” e “eu v ejo” , que podem ser então com binadas com alguns
objetos. É durante este estágio que a criança pode dizer “eu quero futebol”
m esm o que ela não ten h a pronunciado antes esta frase em particular.
D urante o estágio III, um a unidade ainda m enor e única do “Eu” emerge,
e ao m esm o tem po, a ex periência do “E u” . A partir de nossa perspectiva, a
aquisição da experiência do “E u ” é sem elhante à aquisição da experiência do
futebol, do sorvete, da m am ãe, ou do calor. Todos estes são tatos. Entretanto,
essas experiências diferem do “E u” no fato de estarem sob o controle de estímulos
públicos específicos e po d em ser aprendidas separadam ente. “E u”, por outro
lado, está sob o controle de um estím ulo pessoal complexo e parece ser aprendido
exclusivam ente através d a aquisição destas unidades maiores.
O real entendim ento dessa experiência do s e lfv e m da descrição dos
estím ulos que controlam as respostas em cada um dos três estágios. Q uando
essas unidades funcionais se voltam para o “Eu”, há um a mudança correspondente
nos estím ulos controladores e um a ênfase m aior nos com ponentes privados.
E stágio I: A prendendo g ra n d es unidades fu n cio n a is
C om o em todas as aprendizagens que envolvem discriminação, os pais 4
devem usar estím ulos públicos (que estejam disponíveis para os pais) ao ensinar
as crianças a tatear. A pontam os anteriorm ente para o fato óbvio que um pai
precisa ver a m açã, u m estím ulo público, a fim de ensinar o tato “m açã” . A gora
atente para o estím ulo público que o pai utiliza para ajudar a criança a aprender
u m tato sem elhante, em bora diferente, “eu vejo a m açã”, como um a grande
unidade. E stam os presenciando os tatos “m açã” e “eu vejo m açã” com o tendo
diferentes significados (isto é, sendo controlados p o r diferentes estím ulos no
adulto falante). O tato “m açã” é controlado m eram ente pela presença da maçã.
E m term os cotidianos, diríam os que o tato descreve um estímulo público como
em “aquilo é u m a m açã” . O tato “eu vejo um a m açã” , entretanto, é controlado
p o r um a atividade do falante - ver. E m term os cotidianos, ele descreve um a
atividade do falante, então irem os nos referir a isto como ver. Em alguns casos,
a atividade de ver pode não se relacionar com a presença de um estímulo público,
com o quando o falante im agina um a m açã (Skinner, 1957).
' R econhecem os que, entre os prim eiros professores de crianças, estão incluídas tam bém outras pessoas além
dos pais. Porém , para sim plificar, usam o s o term o pais para nos referirm os a todas as pessoas que participam
da educação das crianças.
148
Capítulo 6
Agora imagine como os pais ensinam à criança a agir sob o controle da
atividade de ver quando dizem “eu vejo m açã". De um modo ou de outro, os
pais dão um a dica e encorajam a criança a dizer “eu vejo m açã", quando é
evidente que a criança está vendo a maçã. Os pais. entretanto, não podem observar
diretamente a criança “vendo a maçã” pois isso é pessoal e está disponível somente
para a criança. A questão é, qual é o estím ulo público que os pais usam para
indiretam ente observar a criança vendo e então, que estímulos realm ente estão
controlando a resposta da criança? N ovam ente, nossa descrição do processo é
propositadamente estereotipada e simplificada para facilitar os processos básicos
de aprendizado envolvidos. N a vida real, os pais ensinam a criança de modo
mais casual e inconsistente, apesar dos processos fundamentais serem os mesmos.
A parte de cima da Figura 5 (a-c) m ostra um estímulo público à esquerda
e um estímulo privado à direita, que estão presentes quando o pai incita a criança
a dizer “eu vejo m açã” . A perspectiva (como m ostra a Figura 5a) é a relação
espacial entre a criança e os objetos externos. Apesar de ser um estímulo público
que está presente, ele não interfere neste m om ento no aprendizado da criança de
“eu vejo m açã” (ele é mostrado pois o discutirem os m ais adiante). Os estímulos
públicos mostrados na metade à esquerda das Figuras 5b e 5c são aqueles que
os pais poderiam utilizar potencialm ente para saber se a criança está mesmo
“vendo a maçã” . Esses estímulos públicos são a orientação da criança em direção
à m açã e a própria maçã. A orientação que os pais observam pode incluir o
virar da cabeça e o olhar fixo e intenso na direção da maçã. Os componentes
dessa orientação podem variar sutilmente de tem pos em tempos.
Além desses estímulos públicos, uma gama de estímulos privados adicionais,
acessíveis apenas à criança, são representados como os objetos menos destacáveis
mostrados na coluna dos estímulos privados na parte de cima da Figura 5. Ura
desses estímulos seria a atividade privada associada com a orientação pública era
direção à m açã (lado direito da Figura 5b). Esse componente privado de orientação
talvez corresponda aos componentes fisiológicos do reflexo de orientação. Outro
estímulo poderia ser a atividade do sistema visual individual associado com ver a
m açã (lado direito da Figura 5c), bem como um componente geral que designamos
aqui como “ver” (Figura 5d). O componente geral de ver é aquele que ocorre
independente do que está sendo visto. Os componentes internos da perspectiva
(lado direito da Figura 5a) também estão presentes. Como não podemos ter acesso
aos estímulos privados, podemos apenas tecer a hipótese de que há muitos outros
estímulos privados envolvidos de alguma forma com a atividade privada, tais como:
a visão, audição, olfato, paladar, autonomia e estímulos cinestésicos.
O
s e if
149
Na situação sim plificada que estamos descrevendo, na qual os pais
estão ensinando pela prim eira vez à criança o tato “eu vejo m açã” , espera-se
que os estím ulos públicos essenciais ganhem controle sobre o com portam ento
da criança dizer “eu vejo m açã” . Esses são os m esmos estím ulos que os pais
usam para saber se criança está vendo a maçã. Assim, durante esse estágio do
desenvolvim ento, o tato. “eu vejo m açã” é aprendido com o um a unidade e é
controlado pela presença da maçã e dos aspectos externos de orientação, como
m ostra a F igura 5e. A pesar dos estímulos privados e outros públicos (como a
perspectiva) estarem presentes durante o aprendizado, não aparecem na Figura
5e, pois não há razão p ara eles se transform arem em Sds e eles não têm nenhum
efeito. N este sentido, eles são irrelevantes, não perceptíveis e portanto não
experienciados. N este ponto do desenvolvim ento da criança, a declaração “eu
vejo m açã” , não envolve, como no adulto, a descrição da experiência de ver. Ao
contrário, neste estágio, “eu vejo maçã” provavelmente tem um significado muito
m ais próxim o do tato sim ples “m açã” . Apesar dos estímulos privados não terem
um papel neste estágio, são im portantes em estágios posteriores.
D urante o estágio I, outras unidades grandes envolvendo “E u” bem
com o “eu vejo m açã” tam bém são aprendidas. “E u quero leite de soja” , “Eu
estou com calor” e “E u jo g o bola” são exemplos. N ossa discussão se concentra
no “eu vejo” m as a análise se aplica a outras unidades tam bém .
E stágio II: A prendendo unidades funcionais menores e o desenvolvim ento do
controle p o r estím ulos privados
D epois de aprender um certo núm ero de unidades funcionais grandes
envolvendo “eu vejo”, com o em “eu vejo um a cabra”, “eu vejo papai” e “eu vejo
o cachorro”, as unidades funcionais m enores “eu vejo” do estágio II emergem.
A m enor unidade de “eu vejo”, um a vez adquirida, pode agora ser com binada
com quase todos os outros tatos que estão no repertório, e a criança pode criar
outras expressões singulares. 0 “eu vejo” em erge como um a unidade pois é o
elem ento com um em cada um a das variedades de respostas “eu vejo X ” . A
orientação pública que os pais usavam p ara saber se a criança estava vendo
poderia ser de algum m odo diferente em cada um a das várias situações “eu
vejo” existentes. Por exem plo, se a criança estivesse olhando para um avião no
céu, a orientação seria diferente da utilizada se a criança estivesse olhando para
o rosto do pai. A pesar da estim ulação advinda da orientação variar de acordo
Capítulo 6
150
Estíiaulo Externo
Estímulo Interao
(a) Perspectiva
I I
I 1
A
(b) Orientação
(c) Objeto
(d) Ver
R
Sr
Resposta
R eforçam ento
>d
Estímulo
D iscrim inativo
(e) O Processo
de Tatear
“E u vejo m açã”
ojãr
‘Sim, você vê”
Yy
Figura 5. N a parte de cima, os estím ulos privados e públicos se apresentam quando a criança aprende a dizer
“Eu vejo maçã”, incluindo (a) a perspectiva da relação espacial entre a criança e objetos externos, (b) a orientação
como a virada de cabeça e direção dos olhos, (c) um a m açã, e (d) a atividade privada de ver. N a parte de baixò,
(e) os estím ulos discrim inativos, que surgem para controlar a resposta, são as orientações públicas e a maçã.
O s e lf
151
com os objetos vistos, os estím ulos privados associados à atividade “vendo”
são os m esm os em todos os “eu vejo X ” , independente do que “X ” venha a ser.
A atividade privada de ver é m ostrada na Figura 5d. Isto sem pre e tão som ente
acontece nas situações “eu v ejo ” , m as não nas “ eu qu ero ” ou em outras
com binações com “eu” . Portanto, parece provável que os estím ulos internos
associados à atividade “v er” ganhem controle de “eu vejo” .
Se “eu vejo” fica sob controle dos estím ulos privados, como sugerimos,
então a resposta “eu vejo m açã” teria um significado diferente de “aquilo é uma
m açã” . O segundo seria unicam ente um a descrição de um estím ulo externo ou,
em term os m ais precisos, um tato controlado pela m açã. N o entanto, “eu vejo
m açã” é agora um a com binação de duas unidades m enores onde “m açã” é um
tato controlado pelo estím ulo público e “eu vejo”, um tato controlado pela
atividade “ver” do falante.
E stam os definindo o am biente ideal não patológico com o aquele que
resulta no controle de “eu v ejo” e outras unidades interm ediárias do estágio II
(ou seja, eu quero, eu sinto, eu sou, eu tenho) por estím ulos internos. Esse tipo
de am biente envolveria os pais que dão dicas e reforçam a criança a dizer “eu
vejo X ” toda vez que a criança está de fato vendo o objeto X' e não em outras
horas quando a criança está vendo Y. E sse ideal é im possível, entretanto, dado
que os pais não vêem dentro da criança e devem se ater aos sinais públicos.
A ssim , as habilidades de discrim inação dos pais e a atenção a esses estím ulos
públicos são fatores im portantes na determ inação de qual grau do “eu vejo”
será controlado p o r estím ulos privados.
Para ilustrar, vam os assum ir que “eu vejo” em ergiu com o um a unidade
funcional durante o estágio II, depois de considerável experiência com unidades
maiores como “eu vejo bola”, “eu vejo gatinho” e “eu vejo carro” . Neste momento,
tanto os estím ulos públicos quanto os privados estão presentes e podem controlar
a resposta “eu vejo” . Se, então, a criança relata v er um estím ulo imaginado,
com um n a fantasia ou na im aginação infantil, então a criança vê na ausência
dos estím ulos públicos com apenas a presença de estím ulos privados. Os pais
que apoiam a validade de tais experiências, aceitando a fala da criança seriamente,
estão reforçando o controle p o r estím ulos privados. Com o resultado, a criança
irá dizer “eu vejo objeto X ” baseada em sua própria atividade “ver”, que é
privada. Os pais que ridicularizam ou criticam crianças neste aspecto, diminuem
o controle pelos estím ulos privados e a criança irá dizer m ais provavelm ente
“eu vejo objeto X ” baseada apenas nas suas reações de orientação externa e
quando X estiver presente tanto p ara o pai com o p ara a criança.
152
Capítulo 6
Tenha em m ente que não estam os descrevendo o processo no qual a
criança se torna relutante em relatar sua experiência interna visual por medo
ou embaraço. Esse tipo de supressão pode ocorrer apenas depois do objeto ser
visto. Estamos descrevendo o processo pelo qual o objeto é visto pela primeira
vez: a gênese da relação (ou sua falta) entre a experiência interna e “v e r ’,
Uma outra im portante fonte de reforçam ento do controle de “eu vejo”
pela estimulação privada de “ver” é a aceitação dos relatos “eu vejo” da criança
em situações onde os pais não podem ver os estím ulos públicos ou estes são
obscuros (por exemplo, um peixe na água que se esconde após o relato da criança,
ou um coelho escondido nas folhas). Os pais que levam os relatos “eu vejo” das
crianças à sério, quando não conseguem observar o estím ulo controlador,
proporcionam um am biente norm al ou não patológico por meio do qual os
estím ulos privados finalm ente controlam o com portam ento. U m a indicação de
sucesso no ensino do controle privado de “eu vejo”, poderia ser a habilidade da
criança em responder a um pedido para fazer exercícios de imaginação. Outra
aquisição seria a habilidade de fazer relatos sobre os estímulos limiares como os
usados em pesquisas de psicofísica ou nos exam es de visão. (Os efeitos de
treinam entos mal sucedidos são discutidos no desenvolvim ento patológico.)
Estágio III: O desenvolvim ento do "Eu ” através de estímulos internos
Após um núm ero considerável de tatos “eu X” terem sido aprendidos, a
criança entra no estágio III, e aí um a unidade m enor “E u” emerge. “E u” é um
elemento idêntico em cada um a das situações “eu X ” onde X varia.
V am os a g o ra fa la r dos e s tím u lo s q u e c o n tro la m o “ E u ” . N o
desenvolvimento norm al, “Eu” é um tato sob o controle daqueles estímulos
com uns a cada um dos tatos “eu X ” independente do que venha a ser X (ver,
querer, ter, ser, etc). É o mesm o processo pelo qual “eu vejo” emerge como uma
unidade sob o controle de estímulo “vendo”, proveniente de “eu vejo m açã”, “eu
vejo cam inhão”, e assim por diante.
Usam os o term o perspectiva, m encionado anteriorm ente em nossa
discussão e m ostrado na Figura 5a, para representar o estímulo que controla o
“Eu” . Tomamos este term o em prestado de H ayes (1984), que discutiu a noção
de perspectiva na sua análise behaviorista radical sobre a espiritualidade. Como
m ostra a Figura 5a, a perspectiva tem tanto componentes públicos quanto privados
e inclui as características físicas do local da criança no espaço em relação aos
O s elf
153
outros. É onde a criança se encontra (aqui), em oposição ao local onde a criança
não se encontra (lá). N a F igura 5a, a criança está representada com o tom
m ais escuro, é a figura central e todos os outros objetos (pessoa, cachorro, etc)
estão localizados em relação à criança. É o estím ulo público da perspectiva que
os pais usam para ensinar à criança o tato “você quer sorvete” versus “eu
quero sorvete” e “eu vejo coelho” versus “você vê coelho”. Os aspectos públicos
da perspectiva tam bém estão envolvidos quando os pais estão m odelando a
resposta “eu vejo um a boneca” enquanto a criança está visivelm ente olhando
para a boneca. Os pais estão orientados para a criança e/ou de algum a m aneira
indicando quem deve dizer “eu vejo boneca”. Se outra criança também se encontra
no quarto, o pai deve agir de m odo que fique claro qual criança deve dizer “eu
vejo boneca” .
A p erspectiva é o estím ulo que se m antém constante para todos os “eu
quero X ” e “eu vejo X ” , etc., u m a vez que os X s e as atividades (querer, ver,
etc.) variam constantem ente. Os aspectos públicos do estím ulo podem variar
consideravelm ente em cada situação. A lgum as vezes, a criança pode estar bem
ao lado do pai, ou, em outras vezes, a 50 m etros deste. D adas essas variações
possíveis de lugar “aqui” versus “lá” , pode ser provável que um aspecto privado
venha a g an h ar controle. D u ran te um desenvolvim ento não patológico, a
perspectiva é a localização física das atividades privadas tais com o, ver, querer,
ter. A ssim , a resposta “E u” com o unidade está sob o controle de estím ulo do
lugar (locus).
Q u a lid a d e s do “ E u ”
C om o m odo de m o strar as características do estím ulo privado que
controla o tato “E u ” , vam os contrastá-lo com o estím ulo público que controla o
tato “borboleta” .
Prim eiro, a pessoa que experiencia a borboleta (ou seja, que se coloca
sob o controle do estím ulo da borboleta) pode descrevê-la em term os físicos.
Por exemplo, a pessoa poderia dizer “parece ter dois centímetros de comprimento,
cor preta e am arela e tem asas”. Esses atributos são as características do estímulo
público. A experiência do “E u”, entretanto, ultrapassa os term os físicos. A única
característica do locus é a sua relação com onde acontece a atividade privada de
ver. Assim, a p essoa poderia d escrever a característica física do S d que controla
“Eu” com o a falta de características físicas, tal qual em “Este não é m eu corpo” .
154
Capítulo 6
O locus perm anece constante mesm o que a pessoa cresça e se torne um adulto,
m ude de emprego ou perca peso. O estím ulo controlador do “Eu” e portanto, a
experiência do “Eu” , perm anece constante m esm o que as características físicas
p e s s o a is e a lo c a liz a ç ã o m u d em . E s s a c a ra c te rís tic a é se m e lh a n te à
“descaracterização” da descrição do s e lf feita por Deikman.
Segundo, a borboleta tem um lugar específico - ali, por exemplo. O
“Eu” é descrito como estando dentro, a localização usual do estímulo privado,
que se parece com o “algum a coisa central” de Deikman.
Em terceiro lugàr, a localização da borboleta pode m udar de lá para cá.
Um a vez que o estímulo controlador do “E u” está sempre localizado onde está a
estim ulação privada do querer, ver, sentir e similares, o “E u” é experienciado
com o estando sem pre no m esm o lugar. A borboleta pode desaparecer, ao passo
que o “Eu” não. Além disso, a borboleta m uda de tempos em tem pos - envelhece
e m orre. Tomando-se que o “Eu” é controlado por um a perspectiva que nunca
muda, é descrito como atemporal. Essas características se assemelham à definição
de D eikm an do s e lf com o sendo “im utável e atem poral” e às noções de Erikson
de “igualdade do s e l f e “continuidade” .
Como dissemos anteriormente, o s e lf como aquele que origina um a ação
tam bém aparece nas descrições de s e lf de Masterson e Deikman. N ossa explicação
desse aspecto da experiência do s e /f envolve o aprendizado que ocorre após a
em ergência do “Eu” enquanto um a unidade. Esse aspecto da experiência do s e lf
reflete talvez uma m oderna m anifestação do anim ism o primitivo. Anim ism o é
um a teoria das causas do com portam ento. Sua proposição básica é que a fonte
de toda ação pode ser atribuída à vontade de um ator. O anim ista explica as
ações identificando o ator que, assume-se, está presente. Assim, para o animista,
a atividade “ver” deve ser atribuída a um a entidade que a origina. A teoria
anim ística parece perm ear a cultura e as pessoas aprendem a atribuir quase
todas as ações a um a entidade instigante. O corpo pode ser essa entidade que
pratica o “ver”, mas isso nos rem ete à questão de quem faz o corpo agir e ao
dilema mente-coipo. O “Eu” que foi descrito não é experienciado como o próprio
corpo. Assim, para o anim ista que existe em todos nós, um a fonte aceitável de
ação seria o “Eu”. De nossa perspectiva, com certeza, isso não faz muito sentido.
Seria o m esmo que dizer “a origem de toda ação é um locus” .
A consciência tam bém aparece na definição de s e lf D eikm an chegou
m esm o a d iz e r q u e o s e l f era a c o n sc iê n c ia . T rad u zin d o p a ra term o s
com portamentais o qüe consideram os que D eikm an quis dizer, a consciência é
O s e lf
155
a observação de nosso próprio com portam ento tal qual o podem os descrever.
Isso é tam bém entendido com o auto-conhecim ento. A ssim , poderíam os dizer
que tem consciência alguém que diz “Eu vejo um a borboleta”, em oposição a
“A quilo é um a borboleta”. O utros exem plos são, “E u bebo”, “Eu c o i t o ” , e “Eu
digo”, que são tatos do com portam ento público de u m a pessoa, e “Eu escuto”,
“E u quero” e “E u penso”, os quais são tatos de com portam ento privado. Um
relato com portam ental de “níveis m ais altos de consciência” envolveria a
repetição de tatear um tato de um com portam ento privado. Por exemplo, “Eu
m e vejo olhando um a borboleta”, e “E u m e vejo vendo a m im olhando um a
borboleta” .
C om o pode este tatear levar à experiência descrita por D eikm an de que
o “E u” é a consciência? Em nossa visão, a consciência é um a atividade e não
um a coisa. P o r outro lado, o “E u” ou m ais precisam ente, os Sds controladores
do “E u” , são um a coisa e não um comportamento. D izer que o se lfé consciência
é com o d izer que o com portam ento é um a coisa ou vice-versa. N a nossa
experiência diária, no entanto, as coisas são igualadas a comportamentos quando
os dois estão m uito associados um ao outro. Desde que o com portam ento de ser
consciente (ou seja, com portam ento de tatear seu próprio com portam ento) está
m uito associado com a unidade funcional “E u”, os dois são erroneam ente
igualados. W oodw orth (citado em Catania, 1984) discorreu sobre a natureza
enganosa de igualar verbos com substantivos:
Ao invés de “memória” deveríamos dizer “lembrando”; ao invés de
“pensamento”, deveríamos dizer “pensando”.., Mas, da mesma forma
que outros ramos aprendidos, a Psicologia está inclinada a transformar
seus verbos em substantivos. Então, o que acontece? Esquecemos que
nossos substantivos são simples substitutos para os verbos, e saímos à
caça de coisas denominadas pelos substantivos; mas essas coisas não
existem. Há apenas as atividades as quais começamos... lembrando, (p.
303)
E m sum a, os estím ulos particulares que controlam a resposta “E u” e o
sentim ento do “E u” depende da experiência de aquisição específica, como
ilustrado em nosso relato de com o a unidade de resposta “Eu” emerge. A pesar
do desenvolvim ento noim al levar a um alto grau de controle da resposta “E u”
por estímulos privados, propomos que o desenvolvimento mal-adaptativo envolve
o oposto - u m baixo grau de controle do “E u” por estím ulos internos.
Capítulo G
156
B E S E N V O L V IM E N T O M A L -A D A P T A T IV Q D A
E X P E R IÊ N C IA D O S E L F
Propomos um continuum de gravidade dos problem as do se//'baseada
no grau de controle privado da unidade funcional “E u” . U m a ponta desse
continuum representa problem as menos severos do se//"desenvolvidos a partir
de um controle privado insuficiente sobre um pequeno número de respostas “eu
X ” . Sendo o “Eu” um a umidade que emerge de um grande núm ero de unidades
“eu X ”, o número comparativamente m enor que não é controlado privativamente
teria um efeito insignificante na experiência do s e l f ou seja, o s e lf seria
experienciado como relativamente imutável, localizado centralmente e contínuo.
Quanto m aior for a faixa de respostas “eu X ” que os pais falham em trazer ao
controle privado, m ais problem as a pessoa experienciará com o self. Problemas
graves de s e lfe stão na outra ponta deste continuum e correspondem à falta do
controle privado sobre inúm eras unidades “eu X ”.
Os problemas de s e lf descritos na literatura psicanalítica serão explorados
dentro do nosso m odelo com portam ental. Esses problem as de s e lf foram
colocados sob as categorias de “menos severo” e “severo” para indicar toscamente
suas posições no continuum referente ao grau de controle privado sobre as
respostas “eu X ”. Esses problem as, no entanto, não se excluem mutuam ente, e
pessoas com distúrbios severos do se/fpodem experienciar os problemas descritos
sob a categoria “m enos severo” de um m odo m ais extremado.
D istú rb io s m enos g rav es de S e l f
Pessoas com distúrbios leves a m oderados do s e lf têm um número
substancial de respostas “eu X ” evocadas por estímulos privados, mas também têm
um número significativo dessas respostas sob controle público parcial ou total. Assim,
seu senso de se lf pode ser consideravelmente afetado pela presença de outras
pessoas e suas opiniões, humores, e desejos. É importante notar que não estamos
nos referindo a pessoas não assertivas ou que sabem o que sentem ou querem, mas
têm dificuldade em expressar isso aos outros. Mais apropriadamente, estamos
descrevendo uma situação na qual o que a pessoa sente ou deseja em primeiro
lugar está sob o controle dos outros. Em cada um desses problemas descritos
abaixo, o grau de dificuldade experienciada pelo indivíduo variará de acordo com o
grau de controle privado sobre as respostas “eu X”.
O self
157
0 S e lf instável ou inseguro
Se um núm ero insuficiente de “eu X ” ficar sob o controle privado, então
a em ergência do “E u ” enquanto unidade funcional ficará afetada, Como
apontamos, no desenvolvimento normal, o “Eu” que está emergindo fica sob o
controle de estímulo do locus onde as atividades de ver, querer, sentir, pensar,
ocorrem. Se essas atividades estiverem parcialmente sob o controle público, então
a experiência do s e lf também estará parcialmente sob o controle público. Uma
vez que os estímulos públicos, tal como o comportamento dos pais, podem variar
com o tem po, a experiência do s e lf irá. variar também, de acordo com o grau em
que ela estiver sendo controlada publicamente. Desta forma, um s e lf inseguro
será sentido porque varia de acordo com quem estiver presente. N a realidade, o
s e lf controlado publicam ente variará mais nas relações mais próximas. Como
descrevem os no controle público sobre “eu X ”, era tuna pessoa muito importante
- um dos pais - que se tomava um Sd, N a vida adulta, o se lfiik variar primeiramente
de acordo com outras pessoas significativas. É por esta razão que relações íntimas
podem ser um a fonte de grandes conflitos. Para o indivíduo com um se//lnstável,
a esquiva à intimidade remove essa fonte de instabilidade. Um a cliente que se
sinta bem com ela m esm a quando está sozinha, m as lam enta que “perde a si
m esm a” sem pre que entra em algum relacionam ento, está descrevendo esse
fenômeno. D ois subgrupos desse problema, dificuldade em conhecer o que o
outro quer e sente e extrem a sensibilidade aos outros, são descritos abaixo.
1.
D ific u ld a d e em co n h ecer o que os outros querem ou sentem .
U m pai que ensina condicionalm ente seu filho um “E u X ”, ou seja, que só deve
em itir o com portam ento quando o pai deseja que ele assim o faça, poderia ser
u m a d e s c riç ã o c o m p o rta m e n ta l d a p ro p o s ta p sic o d in â m ic a de que o
desenvolvim ento patológico envolve pais que têm dificuldade em distinguir as
necessidades (reforçadores) da criança de suas próprias. O resultado de tais
experiências poderia ser um a pessoa que tem dificuldade em produzir um a
resposta “eu quero X ” na ausência de estímulos públicos visíveis, tais como, a
pessoa que form ulasse a questão também indicasse qual “deveria ser a resposta” .
N este caso, o problem a do se /fse ria experienciado principalm ente como “não
saber se o que eu quero é realm ente o que eu quero, ou se é apenas o que os
outros esperam que eu deseje” .
Como um exemplo de como um a pessoa pode punir ou deixar de reforçar
um conjunto de respostas do tipo “eu quero”, suponham os que um a m ãe esteja
com sua criança em um shopping e se depara com um a m áquina de doces. A
158
Capítulo 6
m ãe é quem quer o algodão-doce, mas ao invés de sim plesm ente comprá-lo,
ela instiga sua criança dizendo, “nene quer doce” . Por outro lado, se o bebê
disser “nene qué doce”, e ela estiver de m au humor, dirá “não, nenê não quer
doce agora” . E se, além desse algodão-doce, a m ãe agir desse m esm o m odo
com todos os doces prazeres, ou seja, ela ( 1 ) induz a criança a dizer “eu quero
sorvete” quando na verdade é ela quem quer o sorvete, e ( 2 ) ela pune a resposta
da criança (como por exem plo, “você não quer sorvete, acabou de tom ar um”),
então, para esta criança, “querer prazer” não surgirá sob controle exclusivamente
privado. A extensão do controle privado dependerá de o quão sensível esta mãe
for aos desejos de sua criança.
N a m elh o r das h ip ó teses, será e sta b e le c id a um a discrim in ação
condicional na qual a criança vai querer os doces apenas quando dois estímulos
estiverem presentes: ( 1 ) o estímulo privado de querer e (2 ) o estímulo público da
m ãe tam bém querer. Quando ambos estiverem ausentes, a criança não irá querer
doces. Ou pior, seu desejo por doces dependerá apenas dos desejos pessoais de
sua m ãe num determinado m om ento. Quando esta criança se to m ar um adulto,
um a m anifestação de seu problem a de s e lf dim inuído poderá ocoirer em um
cenário como este: ele está comendo fora com amigos, o garçom pergunta se ele
vai querer sobremesa. O adulto ficará confuso, virará para os amigos e perguntará
“vocês querem sobrem esa?”, e irá querer som ente se os am igos quiserem.
Uma situação mais problemática ocorre quando um espectro maior de
respostas “eu X” não ficam sob controle privado adequado. Neste caso, os pais
punem ou não reforçam a faixa de respostas que são normalmente controladas por
estímulos acessíveis apenas à criança como “eu quero picles”, “eu tenho dor de
barriga”, “eu acho que ninguém me ama”, “m eu sonho foi realmente assustadof ’ e
“eu quero mais”. Pior, um problema severo do se lf se desenvolverá, no qual a criança
irá “sentir” ou “desejaf’ apenas quando os pais ou outros indicarem que ela pode
assim sentir ou desejar, e para ela será muito difícil se deparai' sozinha com seus
próprios desejos e vontades. Ou, em uma hipótese melhor, ocorrerá sob controle
privado, um “queref ’ ou “sentif ’ condicional. Em outras palavras, quando a criança
estiver sozinha, estímulos internos controlarão a resposta, mas quando os pais estiverem
presentes, a criança se esquivará ao máximo da punição e maximizará a recompensa
ficando atenta às reações dos pais para emitir um a resposta aceita por eles. Tenha em
mente que não estamos nos referindo ao fato da criança suprimir um relato verbal de
sentimentos ou necessidades. Ao invés, estamos discutindo os antecedentes do
desenvolvimento de se tomar consciente de seus sentimentos e desejos (reforçadores)
e como podemos vir a identificá-los e defini-los, em primeiro lugar.
O s e lf
159
Em term os de reforçam ento para os vários tipos de com portam ento
verbal, tanto o tam anho com o a consistência das respostas variará m uito mais
no am biente natural do que nos sim ples exem plos explicativos que aqui demos.
E m geral, com o foi discutido no capítulo sobre em oções, esperam os uma
inconsistência m aior e um a confiança indevida em estím ulos públicos durante o
desenvolvim ento de “eu sinto X ” , onde X é u m a reação em ocional, fom e, ou
dor, um a vez que essas reações são principalm ente privadas e seus aspectos
públicos são sutis. E m outras palavras, m esm o em adultos com pouco ou nenhum
problem a de self, seus estados internos podem ser bastante afetados por estímulos
externos (por exem plo, sentir-se feliz em u m a festa, não sentir fom e ou dor de
cabeça quando intencionalm ente trabalhar além do horário, a fim de cum prir
prazos).
E m geral, quanto m enos respostas “eu X ” a pessoa tiver sobre o controle
privado, m aio r será a confusão ou dificuldade que ela terá para responder a
questões que tenham a ver com preferências pessoais, desejos e valores, quando
outra pessoa que estiver presente não for transparente em relação aos seus
próprios desejos. E ssas questões podem incluir: “O que você gosta?”, “O que
você quer?” , “E m que você acredita?” e “Q uais são seus objetivos?”
2.
S ensibilidade extrem a à opinião dos outros. Sensibilidade extrem a
às opiniões, crenças, desejos e hum ores dos outros é outra form a para dizer que
o “eu X ” de um a p essoa que deveria estar sob controle privado, está na verdade
sob controle público. Se o sentido de s e l f de um a pessoa é instável, qualquer
percepção o u crítica pode ser experim entada com o devastadora, pois seria
entendido que os “eu X ” criticados são errados e devem ser trocados pelos da
pessoa que criticou. Isso tam bém envolve u m a substituição do controle privado
fraco pelo controle de outros. E m alguns casos, a crítica de um dos pais pode ter
significado u m a grande m udança em seu hu m o r e, portanto, tom ou-se um
estím ulo discrim inativo p ara m udanças m arcantes no pensar, sentir ou ver
associados com “eu X ” .
A vida é im previsível, caótica, sujeita aos desejos de outros, sendo, por
tudo isso, aversiva. U m exem plo dessa sensibilidade ocorreu durante um a sessão
de terapia com Irene e o prim eiro autor. E u tentei suavem ente discipliná-la,
dizendo de u m m odo educado e alegre, “Oh, vam os Irene, você pode fazer
m elh o r que isso ” , quando ela estava m eio d esarticulada em responder as
questões. A p esar de não aparentar, Irene m e rev elou m ais tarde te r ficado
arrasada com m eu com entário sobre sua pessoa, se retraiu, e queria term inar a
160
Capítulo 6
terapia. Se o se if de alguém é influenciado principalm ente pelo externo, se há
controle sobre o “eu X ” e as respostas “Eu” são controladas publicamente, a
reação exagerada de Irene faz então sentido.
Uma experiência semelhante ocorreu com o segundo autor e uma cliente
cham ada Shelly que estava em terapia há alguns anos. Estávam os num período
sem muito progresso e eu pedi a Shelly para ficar mais ativa na terapia:
T: Gostaria que pensasse nos objetivos da terapia entre agora e a próxima sessão, e aí
poderemos conversar sobre eles.
C: [Parecendo agitada] Não sei o que você quer dizer com isso.
I: Não tenho uma noção muito clara de onde quer chegar, e queria que você tomasse
um papel mais ativo. Algumas vezes sinto que trabalho muito para tirar você de
dentro de si quando você não quer falar.
C: [Lágrimas rolam de seus olhos, levanta da cadeira e tenta sair do consultório] Não
posso agüentar mais isso. Estou fora.
T: Não, Shelly, você não vai a lugar nenhum. Sente-se e vamosconversar sobreisso.
C. [Soluçando e tendo dificuldades em falar] Eu não achava que algo estivesse eirado. Eu
achei que estivesse melhorando em relação a falar. Não posso fazer o que você quer.
T: Só estou tentando falar sobre formas de fazer a sua terapia melhorar, e você age
como se eu quisesse te mandar embora.
C: É como eu sinto, e vou deixá-la antes que me deixe.
T: Eu estou muito compromissada com meu trabalho com você, Shelly. Nossa relação
não está de forma alguma em risco. Não é essa a questão, Gostaria de poder pedir
para você falar mais ou ter mais iniciativa sem você ameaçar largar a terapia.
Por Shelly ter um histórico de ser abandonada por pessoas significativas
e sofrer de um se//" instável, ela reagiu de um m odo extrem ado à m inha crítica.
E la sentiu como se o seu m undo tivesse caído por eu não perceber as coisas da
form a que ela percebia. Devido à m inha crítica, Shelly ficou confusa em relação
ao seu “eu X ” e a única opção era adotar a m inha concepção. Assim, a terapia
e eu nos tornam os im previsíveis e am eaçadoras. Em sessões futuras, eu dei-lhe
dicas e a reforcei p o r ter diferentes percepções de m im sobre quanto ela falava.
Com o parte do processo, eu a encorajei a (1) evitar tatear nossas diferenças no
sentido de eu estar certa e ela errada e (2 ) adotar um a regra de que m eu pedido
p ara fazê-la com portar-se de m odo d iferen te não queria dizer que eu a
O self
161
abandonaria se não conseguisse ou não pudesse fazer o que eu pedia (ver o
C apítulo 5 sobre cognição e crenças).
Uma analogia em relação às resp o stas de Irene e Shelly usando
estím ulos públicos m ais concretos seria; Pessoa A diz “eu vejo um a m anga” e a
pessoa B diz “N ão, seu idiota, aquilo é um a laranja” . Se a pessoa A acreditar
em sua própria percepção, tom aria os com entários de B com o loucura ou diria
que B é que é idiota. M as se a pessoa A não confiar em suas próprias percepções
(isto é, se a sua resposta “eu X ” não estiver sob sólido controle interno) ela
ficaria zangada e desorientada, pois sua percepção de m undo foi ju lgada como
sendo errada.
D ificuldade em acessar o Verdadeiro Self, E spontaneidade e Criatividade
Q uando o com portam ento desenvolver-se sob o controle de estím ulos
aversivos, a fonte do controle é experienciada com o vindo de fora e a pessoa
não se sente livre (Skinner, 1971). Estímulo aversivo se refere à punição, retirada
de reforçam ento positivo e am eaça de dano e privação. Assim , a criança que
cresce tentando agradar seus pais pois eles retirarão o am or se ela não o fizer,
sentir-se-á controlada por outros. Com o discutim os anteriorm ente, o uso de
estím ulo aversivo é quase sem pre um exem plo de reforçam ento arbitrário, e a
criança que cresce sob o controle de refo rçam en to arbitrário irá sentir-se
controlada e m anipulada.
Com o se diz em nossa cultura, um ato espontâneo é aquele que é
experienciado com o despontando de dentro de nós. P or isso, a ausência de atos
espontâneos corresponderia a um a história dom inada por controles aversivos.
O “Eu” instável tam bém poderia desem penhar u m papel aqui. Assim com o é
possível para os “querer” de “eu quero” serem experim entados como originados
de fora, o m esm o ocorre tam bém com a idéia de “eu tenho um a idéia” , ou os
pensam entos de “eu penso” . Se esse tipo de controle público estiver presente,
interferirá na experiência de atos espontâneos. D o m esm o m odo, a sensibilidade
à crítica que caracteriza o “E u ” instável, p oderia lim itar a espontaneidade e a
criatividade. Ações espontâneas e criativas são m em bros de um a larga classe de
re sp o s ta s q u e c o n té m p e c u lia rid a d e s , a sp e c to s in c o m u n s, in d e c ê n c ia ,
obscenidade e outras respostas geralm ente rejeitadas por outros. A ssim , um a
grande sensibilidade às críticas resultaria n a fraqueza de um a classe inteira de
respostas, que incluiria os atos espontâneos e criativos.
162
Capítulo 6
Transtorno de P ersonalidade N arcisista
D e acordo com K ohut (1971, 1977), um a pessoa com transtorno de
personalidade narcisista experiencia as outras pessoas como indiferenciadas do
próprio indivíduo que serve as necessidades do self, ou seja, a pessoa narcisista
fantasia um controle sobre outros que é similar ao controle que um adulto exerce
sobre seu próprio corpo. Eles são incapazes de se basear nos próprios recursos
intem ós e, portanto, criam intensas ligações com os outros.
H á um a equivalência b eh aviorista de transtorno de personalidade
narcisista que corresponde à descrição de Kohut. Hipotetizamos que os indivíduos
narcisistas crescem em condições típicas para o desenvolvimento de se/finstáveis
(ou seja, não receberam amor e atenção consistentes às necessidades emocionais,
não foram consistentem ente respeitados em suas próprias experiências e pontos
de vista), m as tam bém foram reforçados de m aneira lim itada ou superficial por
serem charm osos, exigentes, bonitos (geralm ente em mulheres) ou poderosos
(especialm ente em homens). U m a pessoa com esse histórico (1) não teria o
controle privado sobre o “Eu”, e assim teria dificuldade em diferenciar os desejos
dos outros de seus próprios; (2 ) apoiar-se-ia indevidam ente em reforçadores
externos (por exemplo: admiração, elogios e presentes dados pelos outros) para
ter um senso de self, e (3) saberia como controlar e m anipular os outros (ou
seja, através de charm e e poder) para tom ar as relações m ais toleráveis.
Miller (1983) propôs uma hipótese interessante sobre as histórias da infância
dos psicoterapeutas. Ela colocou que a sensibilidade às necessidades de outros e o
desejo de ajudar aqueles que estão angustiados, qualidades estas de um bom
psicoterapeuta, são originalmente modeladas e reforçadas por um a m ãe narcisista
(os termos modelagem e reforçamento são nossos e não foram usados por Miller).
Obviamente, no caso da criança que cresce e se tom a um psicoterapeuta, o grau de
narcisismo é limitado, tanto quanto o é o distúrbio do self.
D istú rb io s grav es do s e lf
Um grande núm ero de respostas “eu X ” sob controle público escondem
pro b lem as graves de self. E ssa situ ação é p ro d u z id a p o r p ais que são
inconsistentes em suas próprias reações a estím ulos públicos visíveis (por
exemplo: um pai ou m ãe esquizofrênicos ou borderline). Com pais tão instáveis,
a resposta “eu vejo”, por exemplo, seria unicamente reforçada quando os seguintes
O s e lf
163
Sds estivessem presentes: (1) o estím ulo que consiste na orientação pública da
criança a um objeto público; ( 2 ) o estím ulo da orientação pública dos pais; e ( 3 )
o estím ulo dos pais não aparentando estarem preocupados, distraídos ou tendo
u m episódio psicótico. Sob essas condições de aprendizado, m uito pouco da
atividade privada de v er controlaria a resposta “eu vejo” . Pelo contrário, ô ver
da criança seria controlado principalm ente pelo hum or e orientação pública dos
pais. Sob essas circunstâncias extrem as, estando os pais presentes, a criança
veria u m peixe apenas se houvesse estím ulos públicos bem claros, consistindo
tanto no peixe quanto n a indicação que os pais vêem o peixe.
O “Eu” que emerge sob essas condições é dependente das dicas fornecidas
pelos pais. Com o resultado, quando os pais estão presentes, o que é visto, sentido,
desejado, gostado, desgostado e assim p o r diante, é dependente das dicas dadas
pelo pai ou mãe. Por exem plo, um conjunto de dicas poderia ser o pai aparentar
estar de bom humor, aberto ao m undo, estar atento ao que está em redor (os
estím ulos públicos) e dar indicações de que os desejos da criança serão atendidos.
E ntão, baseado nas experiências anteriores da criança de “pai de bom hum or”,
um extenso repertório de respostas “eu X ”, tais com o “estou com fom e” e “eu
acabei de ver um pássaro” , aparecerão e serão reforçadas. O “E u” que emerge
nessas condições estará sob controle público; ou seja, o sentido ou experiência
do “E u ” é dependente de dicas dadas pelos pais. E ntretanto, quando o pai ou a
m ãe está com hum or diferente, desatento, disperso ou m esm o alucinado, um
outro repertório “eu X ” é acionado e um a ex periência diferente de “E u ”,
controlada por estím ulos públicos, em erge (p. ex., um a criança que não m ostra
necessidades ou sentim entos, ou que é super sensível às necessidades dos pais).
A s ca te g o ria s d ia g n o stic a s de p erso n a lid a d e b o rd e rlin e e tra n sto rn o de
personalidade m últipla, discutidas abaixo, representam desordens graves do self.
T ranstorno de P e rso n a lid a d e B orderline
A declaração “eu m e sinto vazio”, que é característica de cliente com
diagnóstico de transtorno de personalidade borderline, poderia ser um efeito da
relativa ausência de S ds privados que controlam o “E u” . U m a vez que querer,
sentir, pensar, etc., quase não estão sob controle privado em casos de patologia
extrem ados, o locus é prim ariam ente externo e depende do com portam ento dos
pais. A localização “externa” dos estímulos que evocam “Eu” seria experimentada
com o despersonalização, e quando esses estímulos externos estivessem ausentes,
a pesso a experim entaria a ausência ou perda do self. D esde que o vazio se refira
164
Capílulo õ
a algum a coisa que estava contida dentro e agora se foi, a presença e ausência
de estím ulos que controlam a experiência do s e lf seria tateado como “vazio”
De acordo com Linehan (1987), um ambiente parental inadequado leva
ao desenvolvim ento de um a personalidade borderline. Esses pais, em geral, ( i )
invalidam os relatos que a criança faz das experiências em ocionais presentes,
especialm ente as negativas (por exem plo, não as ouvem com seriedade,
desconfiam dos relatos, agem como se a criança não sentisse aquilo que reporta );
( 2 ) sim p lific a m d e m a is a fa c ilid a d e d as p e s s o a s de se c o n tro la re m
emocionalmente, pensarem e agirem, invalidando assim as experiências da criança
com a dificuldade e a necessidade de ajuda; (3) criticam excessivam ente ou
respondem punitivam ente quando a criança expressa preferências, valores e
crenças que não reflitam aquelas desejadas pelos pais.
A visão com portam ental de Linehan é que invalidação é a falta de
reforçadores positivos aos controles privados de respostas da criança. Segundo
sua descrição (mas com nossas palavras), isso interfere no controle privado de
um a larga faixa de respostas “eu X ”, como “eu quero” , “eu sinto”, “eu preciso”
e “eu acredito” . Com o j á salientado, estas contingências afetam não só a
experiência do “Eu quero”, “Eu sinto” , “Eu preciso”, “Eu acredito”, mas também
irão afetar a experiência do “E u ” que emerge disso.
Para ilustrar este m odelo, nos reportarem os a Angela, um a cliente que
descreveu como era fazer compras no supermercado com sua mãe. Ela enfatizou
que na m aioria das vezes sua m ãe era rude e a rejeitava. Ela se lem bra de ficar
sentada no carrinho de com pras e sentir-se abandonada e confusa. Em uma das
raras ocasiões em que sua m ãe estava gentil e m ais acolhedora, entretanto,
perguntou a Angela se ela queria alguma guloseima. Seu sentimento de abandono
desapareceu, e ela teve um e repentina consciência das coisas boas que queria e
pediu ansiosamente por uma. Assim , controlada pelos estím ulos públicos do
com portam ento de sua mãe, o “senso do s e l f , o “querer” e o “ver” apareceram.
O que observam os no caso de A ngela foram os efeitos dos “eu Xs”
controlados publicam ente sobre o descontínuo e instável senso de self. O caso é
tam bém um exemplo da extrema sensibilidade de Angela aos humores dos outros.
Especificamente, um a m udança relativam ente pequena no com portam ento de
sua m ãe serviu como estímulo discrim inativo para m udanças acentuadas no
pensar, sentir e ver associados ao “eu X ” .
O que é a experiência do “Eu” quando não há alguém significativo
presente? Em ambientes norm ais, onde o “E u”, ao final, aparece sob controle
O sei/
165
privado, a experiência do “E u” seria sem elhante em todas as situações. Em um
am biente nâo-adaptativo. entretanto, a ausência dos pais removeria o estímulo
evocador do “E u ”. de m odo que a pessoa ou perderia a noção de se lf ou
desenvolveria uma noção de s e lf distinta do s e lf ou dos ‘selfs’ evocados por
outros. A explicação de com o esse s e lf “solitário” pode se desenvolver está
relacionada ao caso m ais geral que abrange o m odo com o falar consigo mesmo
é reforçado e mantido - um assunto discutido no Capítulo 5, sobre cognição.
B aseado nas noções do C apítulo 5, há m om entos nos quais fazer certas
declarações “eu X ” para o s e l f de alguém pode ser válido (reforçador). Por
exem plo, dizer a si m esm o, “eu estou cansado e preciso descansar” pode ser útil
n a identificação do m om ento de descanso. N esses casos, é mais provável que o
reforçador seja natural, e portanto consistente. O s e lf solitário desenvolvido sob
essas condições seria m ais consistente e im utável, em bora pudesse ser m enos
extenso do que aquele desenvolvido sob um a base m ais am pla de “eu X ” .
Um a descrição do que pode acontecer com um se#”ausente quando
solitário, foi dada por Tom, um cliente que geralm ente se retrai e se afasta em si
m esm o. Durante esses afastam entos, de acordo com Tom. ele pode relaxar e ser
ele m esm o. Um dia inteiro pode passar, com pouca consciência do que está
acontecendo ao seu redor. A pesar de parecer que ele tem um a noção pequena do
s e /f quando sozinho, esse se lf'foi experimentado como sendo estável, não sujeito
aos anseios de outros, e portanto, era um a experiência positiva para ele. Em
contraste, ele considerava um a introm issão que atrapalhava este estado quando
tinha que se relacionar com seu terapeuta ou com a sua mulher. E le lem brou-se
de ter começado a praticar esses afastam entos durante um a infância caótica e
continuou a fazê-lo sem pre que possível.
A esquiva dessas situações nas quais o “E u ” é controlado externam ente
continuaria se, num caso igual ao de Tom, a pessoa som ente pudesse ficar
“relaxada” quando o “E u” não está sendo controlado por outra pessoa. U m a
das form as dessa esquiva seria evitar todos os outros e tornar-se um eremita.
U m a form a mais prática seria evitar apenas as relações nas quais os outros
exerçam controle sobre o “E u” . De nossa perspectiva, sempre que as reações
dos outros forem importantes fontes de reforçam ento, os outros podem controlar
o “E u” . Assim , relações íntim as e significativas são evitadas. Como Angela
descreveu, ela perdia sua identidade toda vez que ela ou outra pessoa com eçava
a se importar. “Q uando isto acontece” , ela diz, “é hora de pular fora” .
D e outro lado, m uitas pessoas que têm pouco controle privado sobre o
“E u” consideram quase intolerável estar sozinhas. H ipotetizam os que, além das
166
Capítulo 6
condições de invalidação que interferiram em seu desenvolvim ento do “Eu”,
eles tam bém ficaram sujeitos à extrem a negligência de não ter as necessidades
básicas atendidas (por exem plo, na fase em que eram crianças m uito pequenas,
eles eram deixados com fome, com sede, sujos, com frio e com medo, por longos
períodos). Para essas pessoas, a negligência extrem a ocorreu pois seus pais
eram ausentes e/ou desatenciosos. A ausência de self, por outro lado, tam bém
era evocada p o r pais ausentes ou desatentos. Sob essas circunstâncias, as
condições que evocavam um s e lf ausente eram assustadoras. Com esse histórico,
eles procurariam por com panhias constantes, não apenas para escapar a esse
vazio, m as tam bém para evitar o pânico associado às experiências anteriores de
negligência.
Não é incom um que indivíduos com pouco ou nenhum senso de self
procurem avidamente tanto a solidão quanto a com panhia de outros. Um a cliente
desse tipo, Penny, poderia m ergulhar em um a série de encontros casuais para
escapar ao seu vazio interior, m as assim que alguém com eçasse a se tom ar
parte m ais significativa em sua vida, ela se sentia zangada e sufocada e afastaria
essa pessoa dela. Esse com portam ento fazia sentido já que ela esteve sujeita a
um am biente insuportável em sua infância, tanto com controles aversivos como
tam bém experiências de abandono e negligência.
Transtorno de Personalidade M últipla
Transtorno de Personalidade M últipla (M PD) é o diagnóstico aplicado
ao indivíduo que age como se fosse m ais de um a pessoa. P or várias vezes, o
paciente com Transtorno de Personalidade M últipla pode falar, dramatizar,
lem brar e experienciar o self de form as que norm alm ente são vistas apenas em
indivíduos diferentes. N ossa opinião acerca da natureza e do tratam ento do
Transtorno de Personalidade M últipla que são apresentados nesta seção, é
m ajoritariam ente baseada no abrangente texto de Putnam (1989).
A pesar de pouca coisa ser conhecida sobre esse com plexo e intrigante
transtorno, o fator etiológico de traum a na infância é bem aceito. Um estudo,
por exem plo, constatou que 97% de todos os pacientes com Transtorno de
Personalidade M últipla contaram ter tido experiências de traum as graves de
infância (Instituto Nacional de Saúde Mental, citado em Putnam). Esses traumas
incluíam abuso sexual e/ou físico, negligência extrem a e testem unho de mortes
violentas.
O s e lf
167
O caso clássico de Transtorno de Personalidade M últipla envolve o
seguinte: durante um abuso grave, a criança experim enta deixar a cena ou
despersonaliza, algo com o um a experiência fora do corpo na qual a criança
percebe seu s e lf flutuando acim a de seu corpo ou indo a outro lugar. M ais
tarde, e com freqüência, pelo resto de sua vida, os detalhes do abuso são
esquecidos; ou seja, há um a am nésia do abuso. N a literatura disponível sobre
Transtorno de Personalidade M últipla, esse se lfq a e experim enta sair de cena e
tem am nésia é conhecido com o host. A pesar do host te r se retirado, um outro
aspecto do self, no entanto, está presente e consciente dos detalhes do abuso
enquanto ele está acontecendo. Este aspecto do s e lf é conhecido como alter
(ou alters, já que usualm ente existe m ais do que um). A consciência de um
alter pelos outros pode existir ou não.
Os repertórios de com portam entos que definem o host e alter(s) têm
m uitas características de pesso as distintas. O fato de serem considerados
separados depende da definição de pessoa ou indivíduo. Se essa definição inclui
um único corpo, então, o host e alter não podem ser considerados separados.
Se, no entanto, um a definição com portam ental for utilizada, é então possível
consideram os os m últiplos como pessoas m ais ou m enos separadas. U m a pessoa
pode ser definida em term os de seu m odo característico de agir, incluindo-se aí,
os estilos de falar e de relações interpessoais, assertividade, habilidades especiais
(exem plo: um im pressor, um m édico), m em órias (lem branças), bem como seus
reforçadores (interesses, valores, preferências, etc). M ais ainda, um a experiência
pessoal individual do s e l f inclui continuidade, um a consciência perdurável, e
um originador de ações. Em outras palavras, um a pessoa experiencia seu self
com o o locus onde ver, ouvir e lem brar ocorrem. Esse locus é diferenciado de
pessoa para pessoa. D o ponto de vista com portam ental, o host e alters podem
ser, assim , considerados pessoas distintas, na m edida que têm características de
com portam ento de pessoas distintas. O fato de serp eio m enos possível para um
alter saber das experiências privadas do host, entretanto, é um a característica
com portam ental que não é encontrada em pessoas distintas.
A natureza da personalidade individual do host e alter é dramaticamente
ilustrada quando um alter é violento ou persecutório. Putnam relata que m uitas
tentativas sérias de suicídio (e presum ivelm ente alguns suicídios) são resultado
de um com portam ento hom icida de um alter dirigido ao host e/ou outros alters.
De outro m odo, alguns alters possuem som ente um as poucas características de
u m a o u tra p esso a, e são co n h ecid o s, na lite ra tu ra so bre T ranstorno de
Personalidade M últipla com o fragm entos de personalidade. Por exemplo, o alter
168
Capítulo 6
pode ser um bebê com um repertório m uito limitado. Para os clínicos que não
tiveram experiência direta com o Transtorno de Personalidade M últipla, talvez
seja difícil aceitar a n o ção de que um a lter (ou seja. u m a p esso a cuja
individualidade é definida por seu com portamento) pode ser experienciado por
outros (o terapeuta) como pessoa distinta. Ambos os autores tratam clientes
com Transtorno de Personalidade M últipla e podem corroborar com os relatos
de outros clínicos de que o hosi e alters são freqüentem ente experienciados
como indivíduos diferentes. E condizente com o ponto de vista comportamental
que. em muitos casos, são pessoas diferentes.
A possibilidade de que o Transtorno de Personalidade M últipla possa
ser disfarçado deve tam bém ser considerada, e há casos docum entados desse
fenômeno. Foi tam bém sugerido que o Transtorno de Personalidade M últipla é
u m tran sto rn o ia tro g ê n ic o , ou seja, te rap eu tas que p ro c u ra m dram as e
características teatrais no T ranstorno de P ersonalidade M últipla podem
inadvertidamente sugerir e reforçar esse comportamento em seus clientes. Mesmo
que não seja diretamente sugerido ou encorajado, tratar esses alters como pessoas
distintas libera contingências para m anter essa separação. Um certo apoio para
o papel das co ntingências no T ranstorno de P ersonalidade M ú ltip la foi
demonstrado por Kohlenberg (1973), o qual mostrou que as várias personalidades
de um paciente apareciam e desapareciam conform e eram reforçadas para tal.
A pesar de termos que considerar as contingências iatrogênicas e de fingimento,
evidências sugerem que a m aioria dos casos de Transtorno de Personalidade
M últipla não são evocados para o beneficio do terapeuta. Em particular, o
diagnóstico do transtorno e a descoberta dos alters freqüentem ente ocorrem
depois de 5 anos ou m ais de terapia. Já que o valor adaptativo do Transtorno de
Personalidade M últipla está intim am ente relacionado ao segredo e à decepção,
pode ser possível que m uitos ou m esm o a m aior parte dos casos nunca sejam
diagnosticados.
A Avaliação Com portam ental do Transtorno de P ersonalidade M últipla.
Explorarem os a aplicabilidade de nossa concepção com portam ental do
s e lf aos vários fenôm enos de Transtorno de Personalidade M últipla. Esses
fenômenos incluem os repertórios distintos de com portam ento e a experiência
do seZ/que caracteriza o Transtorno de Personalidade M últipla. U m a avaliação
do Transtorno de Personalidade M últipla deveria m ostrar tam bém porque a
O s elf
169
reação ao estresse ocorre som ente na infância e apontar possíveis diferenças
individuais que expliquem o porquê do transtorno não se desenvolver em todas
as crianças gravem ente traum atizadas.
E ntendem os que, antes do traum a, a criança já havia desenvolvido
re p e rtó rio s de c o m p o rta m e n to q u e a p re d isp u n h a m ao T ran sto rn o de
Personalidade M últipla. Então, no mom ento do traum a, esses repertórios são
acionados e o Transtorno de Personalidade M últipla se desenvolve.
Prim eiro, o self, no m om ento do traum a, não está com pletam ente sob
controle privado. De certo modo, a teoria do s e l f apresentada neste capítulo é
um a teoria de com o experienciam os nosso s e lf enquanto pessoas individuais,
antes de tudo. Até o instante em que os estím ulos privados controlem o “Eu” ,
algum as características do indivíduo (a personalidade única) não emergem.
E specificam ente, a criança tem um a experiência relativam ente pequena do s e lf
com o (1) contínuo, (2) originador de ações, e (3) um a consciência perm anente
que vê tu d o . P a ra que esses estad o s o c o rra m , os p a is devem refo rç ar
consistentem ente as respostas “eu X ” para que o locus ganhe controle. Antes
desse processo norm al se completar, um a grande variedade de experiências do
s e lf são possíveis.
C om o a criança em desenvolvim ento é m ais propensa a m udanças na
experim entação do s e lf a norm a é o seZ/Tlutuante. P or exem plo, quando abraça
seu pai, a garotinha pode estar quieta, controlada e passiva, m as quando está
com outras crianças, ela se transforma. Ela pode tom ar-se agitada, descontrolada
e agressiva. N ão só esses repertórios observáveis podem mudar, m as a criança
tam bém poderá experienciar esses se lf, como separados (cujo limite será de que
a experiência do seu “E u” fique sob o controle público). A creditam os que essa
atividade de ser “outra pessoa” é facilitada por essas experiências norm ais da
infância de selfs separados.
A atividade de ser outra pessoa é geralm ente observada em crianças.
Elas brincam de fingir que são adultas, m édicos, bruxas, pais e mães. Elas estão
expostas aos estím ulos públicos de ver seus pais em ação, tom arem parte como
leitores num a história, ou vendo personagens de desenhos anim ados na TV.
E sses personagens são estím ulos públicos que m odelam o m odo com o a criança
irá agir, sentir e ver. Com um a pequena deixa e encorajam ento, a criança
geralm ente adota esses papéis. Em qualquer shopping-center, as crianças podem
ser vistas vestidas com a capa do Batm an e pulando de bancos, correndo em
roupas de cowboy, ou fazendo barulhos de aviões. E ssa parafernália m ostra
170
Capítulo 6
como os pais geralmente induzem e reforçam esta atividade. A pesar dos adultos
tam bém poderem “participar em ser outra pessoa”, estam os afirm ando aqui
que esta experiência é diferente nas crianças. Como a criança tem um s e lf
m ais m aleável, a experiência é m ais real no sentido de que um conjunto m aior
de atividades “eu X ” pode tam bém ser afetado. O u seja, a criança pode
realm ente experienciar a sensação e a im agem visual de ser grande, forte e ágil
como o B atm an (o cliente com Transtorno de Personalidade M últipla pode na
verdade ver pessoas diferentes quando se olha no espelho, dependendo do
alter presente). Em contraste, o ator adulto está em m aior contato com um
senso estável de s e lf e com experiências visuais que o lem bram que é um a
pessoa com um que está representando o papel de algum a outra.
Outras contingências podem ajudar a m anter o ser outra pessoa. Um
garoto pode ser encorajado diretam ente pelos pais a agir como outra pessoa
quando lhe dizem “ Saia e aja como um hom em ” . Ser outra pessoa tam bém
parece ser reforçado em brincadeiras de crianças como policia e ladrão. Mas, o
que é relevante a este tópico é que ser outra pessoa tam bém pode ser reforçado,
porque reduz a aversividade da punição. Por exemplo, se um a criança é mandada
a seu quarto, e lá finge ser o Super H om em , isso pode distraí-la da condição
aversiva que a levou a estar no quarto. Tenha em m ente que a atividade de fingir
por um a criança, cujo “Eu” continua controlado por estímulos públicos, pode
transform ar a experiência básica do que é visto ou sentido.
A m aleabilidade do s e lf que se m olda de acordo com as exigências dos
estím ulos públicos, é também dem onstrada pela suscetibilidade crescente à
sugestão, que é encontrada em crianças. As crianças, como um grupo, são muito
mais hipnotizáveis que os adultos (Putnam, 1989, p. 52). Entendemos a condição
de ser hipnotizável como responsividade ao controle público em detrimento
daquilo que é visto e experienciado (ou seja, sugestões hipnóticas em form a de
“você sente seus olhos pesados, muito pesados”, “você está ficando com calor” ,
“você vê um a estrela brilhando sobre você e ela está ficando m aior e m ais
brilhante”). C onform e a criança vai crescendo, há um a relativa dim inuição do
controle pelo estímulo público, o s e lf é m ais estável, e a possibilidade de ser
hipnotizável diminui.
Em term os do papel do traum a, quando um evento altam ente aversivo
ocorre repetidam ente, a criança é m otivada a fugir e esquivar-se. Com o fugir
ou enfrentar o abusador é perda de tem po, outros repertórios de fuga e esquiva
podem emergir. Ser outra pessoa pode ser um desses repertórios; ou seja, se a
criança expeiim enta ser outra pessoa, pode ser funcional fazer isto no momento
O self-
171
do traum a. Isso é particularm ente verdadeiro se o fato de ser outra pessoa já
tiver sido efetivo para reduzir a aversividade (como no exem plo do garoto
m andado ao quarto com o castigo). A lém da redução da aversividade através
da distração, o personagem que a criança finge ser poderia ajudá-la a evitar a
aversividade, tendo um a consciência lim itada (como um bebê) ou aum entando
a tolerância à dor (com o Super H om em ).
Ser outra pessoa durante o traum a seria particularm ente adaptativo se
o host não se lem brasse do que aconteceu (am nésia). Com o discutim os no
Capítulo 4, lem brar é um com portam ento que é sujeito às suas conseqüências
com o qualquer com portam ento operante. M esmo sem ser outra pessoa, eventos
traum áticos geralm ente não são lem brados. O lem brar é facilitado pelo contato
com o estím ulo relacionado ao evento que está sendo lembrado. N ão lem brar é
ajudado pela esquiva daquelas situações relem bradas. Ser outra pessoa que vê
de m odo diferente do que o prim eiro self, de fato, transform a os estím ulos que
são vistos e assim , evita contato com os estímulos relacionados ao evento que
está sendo relem brado. Isso, por sua vez, facilita a amnésia. Talvez a função
prim ária de ser outra pessoa durante o traum a é a de facilitar a am nésia nesses
casos.
Tom ar-se outra pessoa durante o traum a e depois reverter e não lembrar,
tem o efeito de isolar o evento traum ático. Se a am nésia não acontecesse, então
os efeitos do traum a seriam m ais intrusivos na vida cotidiana da criança, sendo
este o caso do transtorno de stress pós-traum ático de adultos. Assim, a criança
teria tem ores e evitaria o abusador e tudo o m ais que tivesse algum a ligação
com o traum a. Esse tipo de esquiva não seria adaptativa pois costum eiram ente
o abusador é um dos pais ou alguém muito próximo. A criança é então dependente
do abusador e deve viver no am biente onde o abuso ocorreu. Ao invés, com o
isolam ento do traum a, a criança pode até m esm o ser am ável e afetuosa com o
abusador na m aior parte do tem po e assim receber a atenção necessária à sua
sobrevivência.
U m a vez ocorrido o isolam ento do traum a, o desenvolvim ento do s e lf é
fragmentado. Em oposição a um crescimento dos controles privados de um único
“E u” , há m ais de um “E u” que pode ser controlado por diferentes estím ulos
privados, e pode haver m ais de um locus ou perspectiva. E m adição ao locus do
“E u” p ara o host, pode haver diferentes locus onde a visão do alter ocorra.
Essas fontes m últiplas de controle sobre o “E u” podem vir a influenciar a
experiência da localização do s e l f Essa situação pode contribuir ainda para as
e x p e riê n c ia s fo ra -d o -c o rp o c o n ta d a s p o r c lie n te s co m T ra n sto rn o de
172
Capítulo 6
Personalidade Múltipla., as quais geralm ente são com paradas a assistir a um
filme ou olhar seus corpos do alto, Essas experiências separadas do host e alters
permitem o desenvolvimento independente de qualquer aspecto da pessoa. Assim,
cada alter pode ter seus próprios desejos, gostos, vocabulário, experiência de
s e l f experiências visuais, etc. A lguns alters podem ser estáticos em seu
desenvolvim ento, devido ao seu contato lim itado com o mundo e permanecem
com a m esm a idade de quando foram formados pela prim eira vez. Outros alters
estão em m aior contato com o m undo e transform am -se ou am adurecem com a
experiência.
Características do tratamento de Transtorno de Personalidade Múltipla.
O modo como o terapeuta deve se relacionar com os alters é um assunto
im portante no tratam ento e leva a conflitos de aconselham ento. Por um lado,
P utnam (1989) enfatiza que as personalidades dos alters não são pessoas
separadas e devem sempre ser tratadas como partes de um m esm o indivíduo.
Por outro lado, quando Putnam dá detalhes do tratam ento, a verdade parece ser
o oposto. P or exem plo, ao detalhar procedim entos do tratam ento, Putnam
encoraja o terapeuta a perguntar aos alters seus nomes, a averiguar como um
controla o outro, a não ter favoritos, e a pedir para todos prestarem atenção
quando o terapeuta tem um a im portante declaração a fazer.
Existe um a boa justificativa, no entanto, para cada um dos enfoques
contraditórios em relação aos alters. Por um lado, o tratam ento objetiva uma
integração ou unificação. Tratar os alters como pessoas separadas mina este
objetivo. M as, por outro lado, existe um a parte da terapia que necessariam ente
envolve acessar os alters secretos, e eles perm anecem secretos, a não ser que
sejam tratados como pessoas separadas. Sizem ore (1989), que é a “Eva” do
fam oso “A s 3 Faces de Eva”, descreve a im portância da aceitação clínica dos
alters como reais: “Com os clínicos enxergando os alters de pacientes com
Transtorno de Personalidade M últipla com o partes, fragmentos ou ilusões, mas
os pacientes enxergando os seus alters como outras pessoas, a comunicação
sofre um a quebra” (p. 267). Nosso modelo conceituai de comportamento parece
oferecer um caminho a este dilema e ainda aponta algumas direções terapêuticas.
E m term os de com portamento, os alters são m ais ou m enos pessoas
separadas. Portanto, eles devem ser tratados na terapia de acordo com o tipo de
pessoa que são. U m alter que descreve a si m esm o como tendo 6 anos seria
tratado de form a diferente de outro que se diz um adolescente. O objetivo do
O self
173
tratam ento é trazer os aliers a um a m aior conscientização das experiências um
do outro. G eralm ente este processo é altam ente aversivo e evoca esquiva: ou
seja. contar ao host que ele tem m últiplas personalidades provoca ansiedade,
porém esta ainda é m enor do que contar os detalhes das experiências dos aliers.
A ssim com o na terapia fam iliar, paciência e precaução devem ser tom adas, a
fim de fazer os alters revelarem seus pensam entos m ais íntim os e discuti-los
com os outros alters. Isso é bastante verdadeiro nos Transtornos de Personalidade
M últipla, pois a razão pela qual os alters surgiram era para esconder algo. No
decorrer da terapia, o terapeuta deve oferecer ajuda ao alter do m esm o m odo
que ofereceria a qualquer outro cliente. A atenção ao CRB é sempre importante.
Claro que o m aior CRB 1 é a falta de consciência e os repertórios distintos que
são característicos do Transtorno de Personalidade M últipla. Outro C R B l é
um a raiva voltada ao terapeuta p o r um alter que tam bém está nervoso com
outros alters e com outras pessoas na vida cotidiana. A m edida em que os alters
m elhoram e aum entam sua consciência uns dos outros, o terapeuta pode ir
retirando gradualm ente seu papel de m ediador. Com o tem po, o repertório dos
alters vai se hom ogeneizando, e o com portam ento do cliente se to m a m ais o de
um a pessoa individual. A terapia é considerada bem sucedida quando esses
clientes têm um a vida cotidiana satisfatória, m esm o que não experienciem um
s e lf único com o a m aioria das outras pessoas. Sizem ore (1989) descreve sua
experiência pós-terapia da seguinte maneira: “M esm o alguns term os como
unificação e integração parecem reforçar um a visão artificial do self. Pois, embora
o paciente integrado com Transtorno de Personalidade M últipla possa aceitar
esses term os clínicos de um a form a intelectual, este paciente ainda possuirá o
que é m elhor descrito com o um a convicção inconsciente: Antes eu era muitos.
A gora, sou um . M as não sou um quebra-cabeças m ontado” (p. 267). Ou, como
sugeriu Putnam , a experiência pós-terapia de Transtorno de Personalidade
M últipla pode ser igual àquela de um a sociedade ou um a corporação. N a
conferência internacional anual de Transtorno de Personalidade M últipla e
transtornos dissociativos, em Chicago, o segundo autor ficou particularm ente
com ovido com u m a terapeuta com Transtorno de Personalidade M últipla que
falou em um w orkshop sobre suas experiências de cura. Ela disse que estava
agora integrada, m as todo dia ela m editava e visualizava cada vim de seus alters,
dizendo a eles, “E u nunca esquecerei vocês, e nunca os abandonarei.”
Capítulo 6
174
IM P L IC A Ç Õ E S C L ÍN IC A S
Em term os gerais, clientes com problem as am plos de s e l f iniciam o
tratam ento de uma form a cuidadosa, desconfiados, extrem am ente atentos e
interessados na opinião do terapeuta sobre eles, e não descrevem sentimentos,
crenças, desejos, do que gostam e do que não gostam, de m aneira confiante.
Todos esses com portam entos provavelm ente são CRB1, e indicam um a falta
de controle privado sobre estím ulos internos. Se o tratam ento é bem sucedido,
os com portam entos nas sessões se tom am confiantes, e incluem CKB2s de
descrições livres de pensam entos íntim os, sentim entos, desejos, e crenças.
A descrição do com portam ento do cliente, que foi exposta no parágrafo
an terio r, p o d e ria p a ssa r p elo p ro b lem a g eral do clie n te e pelo esforço
psicoterapêutico geral. Essa observação com binada com a literatura sobre o
desenvolvim ento e tratam ento de problem as de s e lf provavelm ente reflete a
prevalência de problem as do s e lf Já que um a fonte básica das dificuldades do
cliente é a falta de controle privado, o tratam ento feito por um terapeuta que é
acolhedor, responsivo e que encoraje a “expressão ou declaração de sentimentos”
poderia naturalm ente prover as contingências para o fortalecim ento do controle
privado. Este ambiente terapêutico genérico é o antídoto para o ambiente familiar
pouco válido que falhou no reforçam ento do controle po r estím ulos privados.
Ainda mais, nosso modelo comportamental leva a algumas sugestões específicas
(discutidas abaixo) que podem alavancar a psicoterapia m ais geral.
R efo rçan d o a fala n a au sência de dicas e x te rn a s específicas
Em clientes com problem as de self, m uito de seu com portam ento está
sob o forte controle de estímulo de terceiros. Parecem ser vigilantes e estão
focados intensam ente no terapeuta, observando cada nuança de sua expressão
facial e inflexão de voz. A pesar de não ser m uito óbvio no início, quase tudo o
que o cliente fala sobre si m esm o e sobre seus sentim entos e pensam entos pode
estar m u ito in flu en ciad o p elo co n tro le d isc rim in a tiv o do terap eu ta. O
procedim ento terapêutico que descreverem os alm eja a perda desse controle
através do encorajam ento e reforçam ento da fala na ausência de sugestões
externas específicas. Em outras palavras, o tratam ento consiste em reforçar os
CRB2s de “eu X ” controlados internam ente, os quais tam bém auxiliariam na
em ergência do controle privado sobre “E u”, ao final.
O s e lf
175
Um a m aneira de ajudar os clientes a estabelecerem o controle privado é
usar a ferram enta psicanalítica da passividade, não estruturar cada m om ento da
sessão com questões. Isso certam ente irá aum entar as chances de evocai- CRB2
- reações “eu X ” sob controle privado. Ao m enos nos estágios iniciais do
tratam ento, esse tipo de estratégia é problem ático por dois m otivos. Primeiro,
ele p o d e e v o c a r um fo rte CRB1 de esq u iv a aco m p an h a d o de re açõ es
extrem am ente em ocionais que, em últim o caso, resultariam no abandono do
tratam ento pelo cliente. Tivem os num erosos clientes reclam ando asperam ente
sobre falhas em tratam entos anteriores, devido à passividade de seus “exterapeutas” .
Segundo, essa tática im pede o terapeuta de reforçar um CRB2, caso
este ocorresse. Por exem plo, o cliente poderia dizer “Eu não suporto m ais isso”.
Esse tipo de declaração é um a resposta “eu X ” que deveria ser reforçada pelo
terapeuta ao ouvi-la seriam ente, enquanto que a m anutenção da passividade
provavelm ente não seria reforçadora. U m terapeuta m ais ou m enos passivo,
entretanto, seria justam ente ‘o que o médico receitou’, num estágio mais avançado
da terapia quando os clientes já tiverem feito alguns progressos na conquista de
um s e l f o u de u m repertório de respostas “eu X ” privativam ente controlado. No
outro extrem o, um terapeuta altam ente ativo que evita evocar a ansiedade dos
clientes, fará com que o cliente sinta-se e com porte-se bem durante a sessão,
m as im pedirá a probabilidade de ocorrência dos CRB2s. U m a terapia ideal
seria aquela altam ente estruturada no começo e que gradualmente vai se tomando
desestruturada, conform e o progresso do cliente.
Para ilustrar estes pontos, vam os tom ar um cliente de nom e Terry como
exem plo. D urante os m eses iniciais de terapia com o prim eiro autor, Terry se
concentrou principalm ente em seu tratam ento médico e nos rem édios que usava
para controlar seus sintom as psicossom áticos. Q uando eu form ulava questões
m ais gerais sobre hum or ou qualquer outro estado emocional, Terry ficava ansioso
e bloqueado. Prim eiram ente, eu o ajudava sugerindo um a resposta específica
baseada em estím ulos públicos específicos. P or exem plo, quando um novo e
grave sintom a m édico apareceu, que era sim ilar a um outro que resultou na
m orte de um parente, eu sugeri que Terry estivesse sentindo medo, ou seja, eu
dei um estím ulo público dizendo “m edo” . Isso é m uito parecido com o que os
pais fazem quando concedem aos seus filhos tatos para emoções. N um a fase
in icial do tra ta m e n to , eu fiz m uitas sugestões p arecid as de sentim entos
esp ecífico s p a ra situ açõ es específicas. G radualm ente, nos m eses que se
passaram , a especificidade foi sendo reduzida. M elhor do que continuar a dar
176
Capítulo 6
um sentimento específico, eu lhe dava uma lista para escolher (por exemplo,
dor, medo, raiva, desapontamento, irritação ou frustração). Em outras palavras,
eu estava ainda apontando uma resposta baseada em estím ulo público, mas a
especificidade do estím ulo foi ampliada. T em ’ estava seguro de que não seria
punido por responder, uma vez que lhe era dada um a resposta “aprovada’’ no
primeiro caso, e um a “lista” de respostas aprovadas no segundo. A idéia central
era a de que a estrutura fosse sendo gradualm ente reduzida a fim de perm itir
que mais estím ulos privados ganhassem o controle.
C o m b in a r tarefas terap êu ticas com o nível de controle in te rn e no repertório
do cliente
A fim de variar a quantia de controle público sobre o comportamento
do cliente, usam os um a variante de associação livre como técnica. Assim como
a estratégia geral do terapeuta pode variar de passiva a altam ente estruturada, a
tarefa de associação livre pode ser apresentada com m ais ou m enos estrutura.
Quando usada na FAP, a primeira intenção da associação livre não é a de descobrir
significados escondidos ou fazer uso do seu conteúdo, apesar deste ser algumas
vezes relevante. Ao invés disso, é o com portam ento da associação livre que
interessa. N a sua form a m ais desestruturada, as instruções da associação livre
são: “Diga-me tudo o que lhe vem à m ente - todos os sentim entos, pensamentos
e imagens. É im portante não censurar nada. Relate tudo o que vier, mesmo que
pense que é banal, trivial, embaraçante, não importante, etc” . Pedim os ao cliente
para que continue isso sem feedback do terapeuta e até podem os pedir para que
faça isso sentado, de m odo que o terapeuta fique fora de seu cam po visual.
N ossa visão desta tarefa é que ela requer falar com a outra pessoa (o
terapeuta) com um mínim o de sugestões externas provenientes do ouvinte. Sob
essas condições, é possível ao cliente dizer “eu sinto X” ou “eu vejo essa imagem”
sob condições que favorecem o controle pelos estímulos privados. Como podemos
ver no próxim o caso, os clientes com problem as extensivos de s e lf ficam muito
ansiosos e não conseguem realizar esta tarefa, devido a um a falta de estimulação
pública. Eles podem realm ente experim entar “um a perda do s e lf' na ausência
de dicas do terapeuta. Um fenôm eno parecido ocorre quando o terapeuta
com portam ental usa técnicas de relaxam ento ou m editação e sente que seu
cliente fica altam ente ansioso quando a tarefa é m uito desestruturada. Então,
quando usam os a associação livre durante a FAP, são geralm ente empregadas
O self
177
variações do form ato clássico não-estruturado. Vários tipos de tarefas de
associação livre são usados e envolvem um aumento gradual do grau de controle
privado. As tarefas iniciais são de com pletar frases e de associar palavras.
D epois, são intro d u zid as tarefas envolvendo im aginação m ental e autoobservação de respostas privadas.
U m a variação m ais estruturada de associação livre é a tarefa do “cinema
em sua m ente”. Pedim os aos clientes para fecharem os olhos e im aginar que
estão sentados num cinema. Prim eiro são instruídos a ver um a tela branca em
suas m entes. Então, quando o filme começa, a prim eira cena é estipulada para
ser a do cliente e o terapeuta sentados no consultório naquele exato momento.
D epois, o film e é descrito com o voltando para trás, com o cliente andando para
fora do consultório e de volta a seu carro. O film e então com eça a correr cada
vez m ais rápido, virando um borrão. Pedimos ao cliente para visualizar o borrão
que pára de repente e pedim os a ele para descrever a cena. Seria im portante, é
claro, reforçar qualquer resposta “eu X ”, pois elas provavelm ente estão sob
pelo m enos um pequeno controle privado. H á u m a enorm e variedade dessas
tarefas im aginativas, usadas na terapia gestáltica, psicossíntese e hipnoterapia,
que podem ser adaptadas p ara a FAP.
O utra adaptação da associação livre envolve o uso de um com putador e
um processador de textos. Pedim os ao cliente p ara digitar qualquer coisa que
lhe venha à cabeça sem censurar nada. U m a vantagem neste m étodo é que ele
m esm o dá form a ao processo. Prim eiro, é dada a chance ao cliente de apagar ou
arrum ar qualquer coisa antes que o terapeuta veja. A fim de reforçar a fala
(digitação) na ausência de estím ulos públicos, o terapeuta, sem fazer críticas,
revê o arquivo durante a sessão. Com o tem po, o cliente é encorajado a apagar
o m enos possível.
O princípio de com binar tarefas terapêuticas com o nível de controles
internos do cliente será ilustrado com o caso de Fred, um físico de 34 anos. Ele
se sentia esm agado pela ansiedade quando era criticado ou rejeitado, tanto no
nível pessoal como nas relações de trabalho. Q uando criticado ou ao tem er ser
criticado, ele desaparecia, se isolava e não cum pria com suas responsabilidades.
O bviam ente, esse com portam ento resultou em problem as no emprego, ainda
que estivesse inconsciente de ter causado algum problem a. Além disso, Fred
geralm ente era retraído e evitava contato hum ano. Ele tinha dificuldades em
saber como se-sentia; ou seja, faltavam-lhe respostas “eu sinto X ” que estivessem
sob controle privado. Fred fora cham ado de “alexitím ico” (ou seja, incapaz de
Capítulo 6
178
ex p ressar sentim entos) p o r um terap eu ta anterior. P revisivelm ente, Fred
lem brava de seus pais como sendo frios, exigentes, explosivos, desaprovadores
e pouco afetivos.
Em sessão com o prim eiro autor, foi dada a F red um a versão de
associação livre com tempo limitado:
T: O que faremos aqui: eu lhe pedirei para fechar os olhos e então, tudo o que quero é
que me conte que tipo de imagens ou sentimentos ou pensamentos ou memórias lhe
vêm à mente. Se você vê uma imagem manchada, apenas diga, “Estou vendo qualquer
coisa manchada”. Você me conta rapidamente o que aparece, mesmo que nada
venha à sua mente.
(O cliente é induzido a dar respostas “eu X”, e lhe é assegurado que qualquer
resposta é válida.)
C: Ok. (Uma longa, longa pausa) Terrível (meio rindo).
(Fred não faz conforme o solicitado.)
T: O que está havendo?
C: Eu, eu simplesmente não consigo (Uma longa pausa). Quer dizer, eu não consigo,
não consigo me concentrar, é realmente embaraçoso, você sabe, eu deveria ser
capaz de fazer isso.
T: Qual foi a sua experiência ao fechar os olhos, o que aconteceu?
C: Quero dizer, é como se nada, nada, sei lá, entende....
(Ele está descrevendo um evento privado - nada aconteceu.)
T: Um branco total, total?
(Provavelmente esta não era a melhor resposta para reforçar o comportamento
privativamente controlado.)
C: É.
T: Bem, tudo bem. Quero que me diga o que é nada. Você também disse que era
terrível, então, em algum momento você deve ter se sentido assim também, certo?
(Uma tentativa de remediar a possível punição ea resposta anterior por dizer que
estava tudo bem em reportar uma mente em branco. Também uma dica de “Eu me
sinto terrível” baseada na presença de estímulos públicos - seu comentário
“terrível”.)
C É
T: Então, o que faria é dizer algo como “Eu não vejo nada”, assim está bem, e “Eu me
O s e lf
179
sinto terrível, ou estou me sentindo ruim porque deveria ver alguma coisa.” Veja, o
que estou pedindo para relatar é tudo o que está acontecendo, imagens ou nenhuma
imagem, como se sente e o que diz a si mesmo sobre isso.
(Dando dicas de “Eu X”.)
C: Eu acho que o que está acontecendo é, eu tenho que ser capaz de recuar um pouco,
quero dizer, eu até tento e mesmo assim tenho problemas com isso.
(Fred indica o quão difícil é a tarefa. Eu entendi o comentário em relação a recuar
como sendo um tipo de resposta de consciência do self. Mas também entendi
como um mando disfarçado para que eu recue.)
T: Você está tendo problemas para recuar e me contar sobre isso?
C: Certo, E [pausa], você sabe, ser um observador nessa situação.
T: Então quando seus olhos se fecham é como se você estivesse tendo essa experiência,
e não pode fogir dela, é isso o que está dizendo? Você não pode se ver tendo essa
experiência?
C: Certo,
T: Olc. Você está disposto a fazer isso? Quer continuar com os olhos fechados por 5
minutos e eu não direi nada a você. O que você vai fazer é experimentar o que está
experienciando e depois tentar me dizer sua experiência. Então, pode ficar em
silêncio por 5 minutos de modo a se sentir preparado para isso. Talvez 5 minutos
seja muito tempo; diria 2 minutos. Vamos fazer por 2 minutos. Então, quer tentar
dois minutos?
(Reestruturando a tarefa, Uma vantagem de ver a tarefa como instruções para
evocar respostas privativamente controladas é que o terapeuta pode modificar isso
como bem entender, a qualquer momento, a fim de auxiliar a atingir o objetivo.)
C: Ok. Eu acho [pausa], que parte do problema que tenho, intuitivamente é que não
quero perder o contato com você.
(Esse comentário revela como é importante para Fred ter o feedback de outro, de
modo a realizar a tarefa que supõe-se deveria estar sob controle interno. Note
tam bém que é um CRB3, uma im portante e rara descrição das variáveis
controladoras da esquiva e ansiedade em Fred.)
T: Quando você frca fora de contato, então você fica ansioso?
C: Sim, acho que ficaria pior. Quanto mais durar isso.
T; Faz sentido.-Faz sentido para mim. E para você?
(Faz sentido para mim como um behaviorista radical que tem uma teoria sobre
como pais invalidadores afetam o controle sobre estimulação privada e pública.)
C apítuio 6
180
C: Não muito.
(Quase 5 minutos de conversa)
C : O que significa contar a você? Faz sentido para você, mas não estou muito certo de
que faz sentido para mim.
Ti Bem, tem a ver com o fato de que sou uma pessoa significativa para você. E acho
que isso demonstra um medo básico que você tem em relacionamentos com pessoas
significativas para você. Acho que você necessita ver as reações das pessoas pois
se você confiar apenas na sua impressão, verá tudo de forma errada e estará em
apuros.
(Estou tentando uma interpretação comportamental que descreve os problemáticos
estímulos discriminativos [Sds] incluindo outras pessoas significativas, a história
de reforçamento envolvendo punição para controles privados, e a esquiva de punição
por estar sob controle público.)
Ci É, acho que sim.
T: Eu acho que esse é o jeito de descrever isso em termos que fazem sentido. Mas
saber disso não acho que irá ajudá-lo, acredito que seja inconsciente, Quero dizer,
acho que se sente assim, e acho que isso reflete sua história.
(Aqui estou colocando a interpretação e o “conhecimento” nos seus lugares, como
auxílio no comportamento governado pela regra e reconhecendo a natureza do
problema modelado pelas contingências.)
C: É, eu concordo.
T: Mas eu veria isso como muito importante para você tentar superar esse problema
(a necessidade de estar em contato).
C: É. [Pausa] Estou tentando descobrir um jeito de contornar o problema (a necessidade
de estar em contato). Você sabe, eu acho que estou mais consciente das barreiras.
Estou ficando mais e mais consciente disso. Eu acho que é uma grande barreira,
bem, minha cabeça diz que tenho que refazer o meu caminho em tomo disso ou
descobrir uma solução.
(Fred descreve seu aumento de consciência das experiências privadas da barreira.
A barreira dá uma indicação da intensidade do sentimento gerado pela falta de
estímulo público.)
T: É, era o que eu estava pensando também.
C: Bem, se fizermos isso aos poucos, talvez aumentando o tempo, e depois se eu
explicar o que lembrar, e sem editar depois...
(Aqui está um CRB2 de sugestão de uma solução para a barreira, ao invés de sua
dissociação.)
O s elf
181
T: Certo. Podemos tentar uma vez por 15 segundos?
C: Claro.
T: Ok. Comece (Uma pausa de 15 segundos). Fim do tempo.
C. [Pensativo] A barreira definitivamente permanece, eu acho.
T: O que aconteceu quando você estava de olhos fechados?
C: Eu realmente não tive, quero dizer, novamente, esse branco, quero dizer, esse borrão,
mas é como se houvesse alguma coisa lá girando, hurnm, talvez meu nível de
ansiedade não estava muito alto.
(E um relato “eu X”, o relato mais elaborado de Fred da experiência imaginária
até aqui,)
(Alguns minutos depois.)
Ti Então, esse processo pelo qual passamos nos últimos minutos não foi algo com o
qual você estivesse acostumado. É o seguinte, eu tinha uma expectativa que era
muito alta para você. Você ficou muito ansioso em relação a isso, conversamos
sobre isso, e chegamos a uma tentativa diferente que se adequasse mais ao seu
nível. E você conseguiu melhorar na tarefa de imaginação. Esse processo não é
nada em comparação com o ocorrido entre você e seu pai. Isso está também
relacionado a alguma coisa que acontece no trabalho. Eles lhe pedem para fazer
algo, e se você não consegue, você simplesmente congela de medo.
(Seguindo a Regra 5, eu fiz uma interpretação baseada em eventos recém ocorridos.
A situação, história, comportamento e conseqüências são dados relacionados com
a vida cotidiana.)
C: É verdade. Eu acho que sinto que fiz um pequeno progresso.
T: Certo, eu também acho isso.
E m su m a, q u atro aju stes tiv eram que ser feito s p a ra ta re fa s de
im aginação ou de associação livre em prestadas de outras terapias. Prim eiro,
elas devem ser apresentadas ao cliente como tarefas cujo valor é derivado do
processo (isto é, im aginai- e descrever na presença do terapeuta). Idealm ente, os
clientes deveriam ser inform ados, em term os fáceis de entender, de que o
im portante n a tarefa é que evoquem CRB2s sob controle privado. Segundo, a
tarefa deve ser selecionada ou m odificada de m odo a variar no grau de controle
privado requerido, para com binar com o nível de repertório do cliente. Por
exem plo, a tarefa do “cinem a” poderia com eçar com a apresentação de um a tela
sem im agem ou poderia ter um tempo limitado. Terceiro, o cliente deve ser
182
Capítulo 6
reforçado ao fazer declarações “eu X ”. Se necessário, induzir declarações “eu
X ”, como ilustrado no caso de Fred, tam bém deve ser usado. Quarto, o terapeuta
deve ter em m ente que outros CRBs, além dos relacionados aos problem as de
self, podem ser evocados, e poderão prover oportunidades terapêuticas. Por
exem plo, no caso de Terry, a tarefa de imaginação não apenas evocou um
CRB relacionado ao self, m as tam bém relacionado a problem as que ele tinha
no trabalho, ao enfrentar tarefas muito difíceis.
R e fo rç a n d o ta n ta s d e c la ra çõ e s “ eu X ” do cliente q u a n to possível
É extremamente importante tratar com respeito todas as idéias, intuições,
teorias e crenças do cliente que diferem das do terapeuta. Entendemos por respeito
o fortalecim ento do com portam ento do cliente através da reação do terapeuta,
m esm o que este indique que pensa diferente. Idealm ente, a reação do terapeuta
deveria ser positivam ente reforçadora, m esm o que isso tam bém refletisse um a
opinião divergente da do cliente. U m significado especial é dado às declarações
“eu X ” do cliente que diferem das do terapeuta, pois são precisam ente esses
com portam entos que m ais provavelm ente estão sob controle privado. A idéia é
reforçar tantos “eu X ” quanto possível.
Como dissemos anteriorm ente, se o problem a de s e lf do cliente estiver
relacionado com um a falta de controle privado sobre o “eu quero”, é vital reforçar,
se possível, esse tipo de resposta se ela ocorrer. U m a dica im portante para saber
se o “eu quero” do cliente está sob controle privado (em oposição ao controle
público, isto é, o controle do terapeuta) é a inclinação do terapeuta em rejeitar o
pedido.
Por exemplo, um a cliente, cujo problem a de s e lf exa. que ela não sabia o
que queria e não podia dizer o que queria, pediu ao prim eiro autor para tentar
hipnose, a fim de que descobrisse o que queria. M inha prim eira reação foi negar
e dar a ela as razões pelas quais eu não usava hipnose. Usando m inha inclinação
de rejeitar seu pedido com o um a pista que assinalava a possibilidade de que seu
“querer” estivesse sob controle privado, m inha reação seguinte foi reconhecer
privativam ente que seu pedido era um CRB2. Vendo que isso era algo que ela
realm ente desejava, eu m udei de opinião e concordei em hipnotizá-la.
O utro exem plo pode ser visto no caso da cliente que perdeu sua
identidade quando teve um a intensa relação com um homem. Ela tam bém
desenvolveu um a intensa relação com o prim eiro autor e m e contou sobre suas
experiências paranorm ais. M esm o que eu pessoalm ente não acredite nisso,
O s e lf
183
reconheci seu com portam ento com o CRB2 e prossegui com ela me contando
sobre suas crenças.
Para clientes que não sabem com o se sentem , pode ser im portante, nos
estágios iniciais do tratam ento, serem ajudados pelo terapeuta a descobrir como
se sentem. Fazendo assim , o terapeuta fom ece um a experiência parecida com
a que ocorre no estágio I. Reagindo ao estímulo público, quase da m esm a maneira
que um pai faz quando ensina à criança tatos de sentim entos, o terapeuta auxilia
na construção de tato de sentimento. As sugestões externas usadas pelo terapeuta
poderiam se referir à aparência física do cliente (ou seja, o cliente pode parecer
tenso, cansado, ansioso ou deprim ido). O terapeuta então diz “você parece
cansado” ou “deprim ido” ou seja lá o que for.
U m a outra sugestão extem a é a natureza da interação terapêutica que
acaba de ocorrer. Por exemplo, um terapeuta que persiste em perguntar ao cliente
sobre um evento desagradável mesmo que o cliente não queira falar, deve perceber
que o cliente sente-se incom odado, ressentido com sua insistência. O terapeuta
deve então encorajá-lo a dizer “eu sinto X ” . O perigo em usar este procedim ento
é que o terapeuta pode insistir nesta conduta por tem po dem ais, ou confiar
excessivam ente em estím ulos públicos, e assim im pedir ou interferir no ganho
de controle de estím ulos privados. A pesar de nossa discussão se concentrar em
clientes que não sabem com o se sentem , procedim entos sem elhantes podem ser
usados em estágios m ais iniciais da terapia com clientes que não sabem o que
querem , ou em que acreditam ou o que sabem.
U m a conjuntura delicada é exposta quando um cliente, cujo problem a
de se/finclui um a escassez de respostas “eu sinto”, diz “eu sinto que você não se
im porta com igo” . Esse com entário do cliente não é incom um e deve ser tratado
com o um exem plo de CRB2 (adm itindo que não seja um m ando disfarçado). É
im portante para o terapeuta considerar os com entários com seriedade e não
punir o CRB2 classificando-o como transferência ou fazendo a interpretação de
que a resposta do cliente não está baseada em algo que aconteceu na sessão,
m as sim que veio da infância. A o contrário, as respostas m ais reforçadoras
seriam aquelas que validam o m otivo pelo qual o cliente se sente assim. D esta
m aneira, é papel do terapeuta rever cuidadosam ente os eventos passados na
terapia e olhar internam ente para procurar quais eventos poderiam em basar a
observação do cliente.
Por exemplo, o terapeuta pode ter ficado distraído ou preocupado durante
a sessão ou pode tam bém ter-se irritado com o cliente. D esnecessário dizer que
184
Capítulo 6
a validação do tato do cliente não retira a importância do terapeuta em enfatizar
seu afeto pelo cliente em geral.
Uma situação ainda m ais difícil é encontrada quando o cliente vem
com declarações “eu. X ” que são contraprodutivas, calúnias a si mesmo, suicidas
ou homicidas. Nossas sugestões para lidar com esses tipos de declarações são
dirigidas ao cliente com problem as de s e lfq a s está com eçando a desenvolver
u m controle privado m aior sobre declarações “eu X ”, e menos voltadas aos
clientes que se engajam cronicam ente em com portam entos destrutivos,
1. Contraprodutivo. C om portam entos de clientes que levam à esquiva
geralmente parecem contraprodutivos para o terapeuta. Por exemplo, o segundo
autor estava supervisionando um caso no qual a cliente disse, com lágrimas em
seus olhos, “Eu não quero falar sobre a m orte de m inha mãe. Isso apenas remoe
lembranças e não leva a nada” . Respostas apropriadas do terapeuta devem incluir
tanto a ênfase em qu.e ela não precisa falar sobre isso, quanto explorar a situação
m ais a fundo: (a) “Parece que você está prestes a chorar, como se estivesse
realm ente ferida por dentro... O que está sentindo? ... Está com m edo de que se
continuar falando irá chorar?... Com o sua m ãe e pai te tratavam quando você
era criança e chorava?” (b) “O que você quer dizer com ‘rem oer o passado’? ...
O que acontecia antes quando você falava sobre a m orte de sua m ãe?” (c) “Estou
confuso porque eu realm ente quero respeitar seus sentim entos de não querer
falar sobre a m orte de sua m ãe, m as não quero com pactuar com sua esquiva de
sentim entos de dor, porque creio que evitá-los está relacionado com evitar
relacionam entos próxim os em geral.... O que acha que a levaria a um m aior
crescim ento neste m om ento - forçar você a falar e a sentir os sentim entos sobre
sua m ãe ou respeitar seus sentimentos de não querer falar sobre ela, mesmo que
você saiba que é isto que eu quero?... Como podem os satisfazer tanto seu desejo
de não querer falar agora, que é im portante para o desenvolvim ento de seu
senso de se//, quanto seu desejo de fazer progressos na terapia em geral
descobrindo seus sentim entos?”
2. Caluniar a si mesmo. “Eu sou um a vagabunda, e um a piranha... eu
m e sin to com o a e sc ó ria da h u m a n id a d e.... te n h o m edo de m e to m a r
esquizofrênica, pois m inha m ãe era assim ” . Essas são as declarações feitas em
m om entos distintos ao segundo autor por Ú rsula, um a cliente que eu estava
vendo. N o inicio, m inha reação era, a cada vez, assegurar a Ú rsula que isso
não era verdade, e toda vez ela se zangava pois não se sentia reconhecida por
O self
185
mim. Ela sabia que. apesar de a m inha afirm ação ser importante, não permitia
que ela descrevesse os sentim entos com os quais estava entrando em contato.
G radualm ente, ela m e treinou a com binar m inha reafirm ação com a
perm issão para que ela tivesse a oportunidade de explorar seus sentim entos
“Você com certeza não é um a vagabunda, m as conte-m e seus sentim entos e
pensam entos sobre ser um a vagabunda, antes que eu te diga por que eu acho
que não o é ” . “A p esq u isa sobre esquizofrenia indica que se você não a
desenvolveu ainda, é praticamente impossível que o fará. M as deve ser assustador
para você ter este m edo. C onte-m e sobre isso” .
3.
Suicidas ou hom icidas, A pesar de fantasias suicidas e hom icidas
serem aversivas para a m aioria dos terapeutas escutarem em detalhes, não é
incom um p ara clientes com problem as de s e lf entrarem em contato com esses
sentim entos, pois suas histórias são repletas de necessidades insatisfeitas. É
importante reforçar essas expressões de sentimentos, ajudando o cliente a contar
sua história, até que o terapeuta entenda porque faz sentido para o cliente sentirse assim. Além disso, é importante que o terapeuta proíba essas ações prejudiciais,
não apenas dando um a ordem verbalm ente, m as ajudando o cliente a separar
sentimentos de ações (ou seja, a conexão entre pensar sobre o suicídio, sentir-se
suicida e possuir com portam ento suicida é aquela da relação com portam entocom portam ento, onde um não leva necessariam ente ao outro), e explorando a
fundo as conseqüências de ações suicidas ou hom icidas. Se essas declarações
suicidas e hom icidas forem n a realidade m andos disfarçados com o tatos (ou
seja, am eaçar suicídio p ara obter um a m aior atenção por parte do terapeuta),
então o cliente deve ser confrontado e ensinado a pedir diretam ente pelo que
quer, sem com portam entos nocivam ente ameaçadores.
E m su m a , n o s sa v isã o dos p ro b le m a s de s e l f se c o n c e n tra no
desenvolvim ento precoce de com portam entos m odelados por contingências. Se
nossas noções forem válidas, então, fazer aflorar m udanças no significado de
com portam entos im portantes como “E u te am o”, “E u te odeio”, “E u estou
nervoso” e “E u preciso de atenção”, parece requerer um am biente de apren­
dizagem no qual eles possam ser evocados. A FAP é um a ferram enta particular­
m ente construída para esta tarefa.
7
Psicoterapia Analítica Funcional
Uma ponte entre a Psicanálise e a Terapia
Comportamental
N ossa interpretação behaviorista radical da psicoterapia nos leva à inesperada
conclusão de que o centro do processo terapêutico é a relação psicoterapêutica.
D izem os que ela é inesperada porque outras pessoas direcionam o behaviorism o
radical para o cam po oposto, no qual o terapeuta evita ou dim inui o valor de
um a relação terapêutica que seja profunda e em ocional. Carl Rogers, por
exemplo, comentou: “Para mim [o m undo de Skinner] destruirá a pessoa humana
enquanto aquela que conheci...na relação...nos m om entos m ais profundos da
psicoterapia” (1961, p. 391).
M esm o aqueles que aceitam a idéia de que o behaviorism o radical pode
levar a um a ênfase na relação terapêutica afirm am que a Psicoterapia A nalítica
Funcional (FAP) pouco adiciona àquilo que já é postulado nos sistemas de terapia
existentes, e questionam “Então, o que há de especial?”. N ós tem os duas reações
a essas afirm ações. Prim eiram ente, concordam os com que o foco dado pela
FAP à relação terapêutica está de acordo com as tendências vigentes no campo
da psicoterapia. É particularm ente interessante que a FAP e a psicanálise sejam
sim ilares a esse respeito, visto que derivam de bases filosóficas e teóricas bem
diferentes. Pontos em comum entre tratamentos que advêm de origens tão diversas
são intrigantes, pois podem sugerir variáveis universais que são especialm ente
187
188
C apítu lo 7
im portantes na produção de mudança terapêutica, Nossa segunda reação seria a
de afirm arm os que acreditam os que m uitos aspectos da FAP são novos e
diferentes. A visão que a FAP proporciona sobre a relação terapêutica e sobre o
processo de m udança tem im plicações no tratam ento, que a distingue da
psicanálise e de outros sistemas terapêuticos.
N a discussão que segue, apontaremos similaridades e diferenças entre a
FAP e os enfoques psicodinâm icos. Posteriorm ente, com pararem os a FAP com
as psicoterapias comportamentais atuais e exploraremos como ela (FAP) fornece
um a ponte única entre sistemas terapêuticos tão divergentes como a psicanálise
e a terapia comportamental.
A FAP EM CONTRASTE COM ENFOQUES
PSICODINÂMICOS
A psicanálise é um sistema em desenvolvimento que apresenta diversas
formas. Suas com parações com a FAP estão lim itadas à m aneira particular com
a qual caracterizam os a psicanálise. A parte inicial de nossa discussão será
focalizada na visão psicodinâm ica m ais tradicional sobre transferência e aliança
terapêutica. N ós exam inarem os, então, com o um a form a m ais recente de
psicanálise - relações objetais - é mais com patível com a FAP, porém ainda
difere dela de form a significativa, devido a suas bases psicodinâm icas.
Transferência
Para o psicanalista, a transferência é um im portante com ponente da
relação cliente-terapeuta. A transferência é relevante para esta discussão porque
se refere ao com portam ento do cliente dentro da sessão. O conceito, porém,
“tem suscitado preocupações teóricas e técnicas e exigido constantes e repetidos
esclarecim entos” (Paolino, 1981, p. 91). Conseqüentem ente, examinaremos
apenas alguns de seus significados centrais, primeiramente dando suas definições
e descrições psicanalíticas e, depois, traduzindo as m esm as para a linguagem
cotidiana ou para term os behavioristas. A preciarem os, então, como as noções
psicanalíticas de transferência podem afetar aquilo que o terapeuta faz durante
as sessões, ou seja, olharem os para os aspectos relacionados ao controle por
P sicoterapia Analítica Funcional
189
regras Na seqüência, perguntarem os como o com portam ento do psicanalista
favorece a evocação e a detecção de CRJBls e o reforçam ento de m elhoras ou
CRB2s. Desse modo, apesar de o psicanalista seguir regras im plícitas a uma
teoria que não é baseada em conceitos com portam entais, nós exam inarem os as
im plicações clínicas dessas regras em term os com portam entais.
Freud descreveu a transferência como sendo um a reação do cliente ao
terapeuta, com o se ele não fosse ele próprio, mas sim alguém (im portante) no
passado do cliente. Ele afirm ou que essa “relação em ocional intensa entre o
[terapeuta] e o cliente”, a qual é baseada no passado, surge em toda análise e
que, de fato, “é im possível um a análise sem transferência” (1925, p. 42).
A descrição de Freud sobre transferência se parece com o conceito
comportamental de generalização de estímulo (também conhecido como transfer)
e traz consigo a noção de que o com portam ento que ocorre na hora de terapia
está relacionado com a m aneira com o o cliente age em seus relacionam entos
significativos. A lém disso, F reud considerou esses com portam entos que
acontecem dentro de sessão com o essenciais ao tratam ento e enfatizou a
importância de emoções intensas ocorrerem dentro da sessão. Estas características
poderiam servir como regras (ver Capítulo 5), as quais direcionam o terapeuta
analítico a 1) prestar atenção às reações em ocionais do cliente em relação ao
terapeuta que tam bém ocorram em outros relacionam entos im portantes; e 2)
encorajar essas reações, já que elas são essenciais. D isto tendem a decorrer
efeitos clínicos positivos, visto que os com portam entos citados nos itens 1) e 2)
são sim ilares àqueles produzidos pelas Regras 1-Prestar atenção aos CRBs- e
2-Evocar CRBs- da FAP.
A ntes de olharm os para outros significados e possíveis efeitos clínicos
neg ativ o s da tran sferên cia, d iscu tirem o s o conceito com portam ental de
generalização em maiores detalhes. De um ponto de vista comportamental, todos
os nossos com portam entos atuais que são direcionados para um a outra pessoa
(terapeuta ou outros) estão baseados em nossas experiências de aprendizagem
passada, com aquela e/ou com outras pessoas. Conseqüentem ente, antes mesmo
de o terapeuta obter a oportunidade de reforçar um a resposta específica do
cliente, ele já é um estím ulo de propriedades evocativas, dependendo de sua
similaridade funcional com as pessoas pertencentes à história de vida do cliente.
P or exem plo, após chegar tarde, pela prim eira vez, a um encontro, o
cliente poderia antecipar as reações do terapeuta baseado em experiências
passadas que teve com pessoas similares. Em um experimento que visava ilustrar
190
Capítulo 7
o conceito de sim ilaridade funcional, Diven (1936) utilizou o condicionamento
clássico com sujeitos adultos, em parelhando a palavra barn (celeiro) com um
choque elétrico. Quando m ais tarde efetuou o teste para verificar generalização
ou transferência, u tilizan d o -se de p alav ras que não foram previam ente
condicionadas, ele descobriu que os sujeitos tinham respostas galvânicas
condicionadas na pele para a palavra “cow” (vaca), m as não para a palavra
“yam ” (fio). Portanto, a transferência ocorreu em uma dim ensão funcional
[“b am s” (celeiros) e “cow s” (vacas) são encontrados em fazendas] e não em
um a dim ensão física [a similaridade fonética entre “bam ” (celeiro) e “yam ”
(fio)]. Voltando a nosso cliente: além do que foi m encionado acima, esse cliente
em particular poderá antecipar a reação do terapeuta a atrasos, baseado em
experiências de chegar atrasado a m édicos (se a dim ensão funcional é “alguém
que você vai para te ajudar”), ou figuras de autoridade (se a dimensão funcional
é “pessoas que estão no comando”) ou pais negligentes (se a dimensão funcional
é baseada em “pessoas que não têm tem po suficiente ou têm um envolvim ento
lim itado”). A generalização tam bém pode ser baseada em um a com binação de
várias dim ensões funcionais.
Do ponto de vista da FAP, tudo que o cliente faz durante a sessão (diz,
sente, pensa, percebe, etc.) são comportamentos aprendidos que ocorrem devido
a 1) similaridade funcional entre os estímulos presentes durante a sessão e aqueles
que estavam presentes na experiência passada de aprendizagem, e 2) experiência
real durante a terapia. Esses conceitos sobre os com portam entos que ocorrem
d en tro da sessão p o d em e x p lic a r os m esm os fen ô m e n o s que a noção
psicodinâm ica de transferência explica, importantes diferenças conceituais entre
a psicanálise e o behaviorism o apontam , porém , para algum as implicações
clínicas negativas do conceito de transferência.
D eflnindo comportamento-problema
O conceito de transferência está im pregnado com um a variedade de
características, além da generalização de respostas a pessoas importantes. Em
um a de suas form as m ais restritas, Freud lim itou a transferência a aqueles
comportamentos que acontecem dentro da própria sessão e que são derivados de
certas experiências “infantis” que ocorrem no período edipiano (Langs, 1976).
Por exemplo, a transferência estritamente se referia às clientes do sexo feminino
que exigiam am or ou am izade de seus analistas do sexo m asculino. Essa visão
de transferência resultaria em um a regra que direcionaria o terapeuta a prestar
Psicoterapia A nalítica Funcional
191
cuidadosa atenção aos com portam entos do tipo edipiano. que ocorrem dentro
da própria sessão. Se os problemas diários da vida do cliente forem desta natureza,
então a sensibilidade do terapeuta em relação a assuntos do tipo edipiano o
levaria à detecção de C R B 1 e poderia ter efeitos clínicos positivos. Inversamente,
efeitos negativos aconteceriam, caso os problem as do cliente não fossem dó tipo
edipiano, e o enfoque do terapeuta em assuntos deste tipo o impedisse de perceber
qualquer outro tipo de CRB.
A lexander e French (1946) definiram m ais am plam ente a transferência
com o sendo “um a repetição neurótica de... com portam ento estereotipado ou
im próprio baseado no passado do paciente”, o que é diferenciado de “reações
noim ais ao terapeuta e à situação terapêutica com o realidade” (p. 72-73). Essa
regra, portanto, im plica um dever do terapeuta de procurar com portam entos
definidos com o neuróticos e não com o n o im ais. H istoricam ente, definir
anorm alidade é um a tarefa bastante difícil e com plexa. N a verdade, interpretar
a anorm alid ad e de um com portam ento, independente de seu contexto, é
p ra tic a m e n te im p o ssív e l. C o rre sp o n d e n te m e n te , os te rm o s n eu ró tico ,
estereotipado e impróprio requerem julgam entos arbitrários, reconhecidos ou
não pelo terapeuta. P or exem plo, é óbvio que n em todo com portam ento
“estereotipado” pode ser considerado transferência (anormal). O cliente pode
“estereotipadamente” dizer “oi!” no início de cada sessão, e é bastante improvável
que o terapeuta julgue isso com o transferência. D e igual modo, o terapeuta deve
fornecer um contexto a partir do qual poderá ju lg a r a inadequação de um
comportamento. É possível, por exemplo, que um terapeuta tenha valores sexistas
inconscientes que o levem a classificar o desejo de um a paciente do sexo feminino
de se entregar inteiram ente à carreira, como um com portam ento neurótico ou
impróprio.
Do ponto de vista da FAP, incluir os critérios de anorm alidade na
definição de transferência cria efeitos clínicos diversos. Tal definição poderia
s e rv ir com o re g ra que lev a o te ra p e u ta a p e rc e b e r os com p o rtam en to s
problem áticos que ocorrem dentro da sessão e especificados na definição, e isso
poderia ter efeitos positivos para o cliente, caso os seus problem as diários
estivessem incluídos nesses com portam entos. Porém , no lado negativo, um
com portam ento im portante que não estivesse incluído nessa definição poderia
passar despercebido.
M esm o que um CRB seja identificado, um problem a ainda m ais sério e
preocupante é o do im pacto causado por um a regra nos efeitos reforçadores ou
punitivos da resposta do terapeuta ao CRB. Perceba que ajuda ser capaz de
192
Capítulo 7
notar o CRB. porque entende-se que um terapeuta que está consciente do
com portam ento problem ático de seu cliente, ocorrido dentro da sessão, irá
naturalm ente encorajar e reforçar um com portam ento melhorado. As vezes,
entender a resposta do cliente como transferência pode interferir no reforçamento
do com portam ento que indica melhora. Por exem plo, se um cliente tem sido
com pulsivo em sua vida diária, então o fato de ele verificar repetidam ente o
horário de sua consulta pode ser apropriadamente considerado como neurótico,
de acordo com a definição de transferência. Se, ao contrário, o cliente tem sido
historicam ente despreocupado a respeito de com prom issos e horários, então a
preocupação com o tempo pode ser considerada um a melhora. N esse último
caso, o terapeuta, que é guiado por uma visão fixa e não-contextual do que não
é saudável, pode oferecer um a interpretação que, sem intenção, acabe punindo o
com portam ento que indica m elhora. Pelo fato de definições form ais de
anorm alidade ignorarem o contexto, o terapeuta vê o com portam ento como
neurótico, inapropriado, ou estereotipado, e é provável que as suas reações
naturais tenham efeitos punitivos não intencionais.
R eal ou não?
Para m uitos psicanalistas, a transferência envolve um a distorção da
realidade. Freud considerava um a “ilusão” a reação do cliente e, assim, ignorava
a “personalidade, o com portam ento e o papel” do terapeuta (Langs, 1976, p.
27). Um a visão menos extremista foi apresentada por Alexander e French (1946),
que sugeriam que antes da reação do cliente ser classificada como transferência,
o analista deveria excluí-la com o um a “reação norm al em relação ao terapeuta
e em relação à situação terapêutica enquanto realidade” (p. 72-73). Esse
significado de transferência pode servir de regra que direciona analistas a
exam inarem seus próprios com portam entos “reais” e a “real” seqüência de
eventos, a fim de determ inar se a resposta do cliente é, ou não, “norm al” . De
fato, essa situação leva o terapeuta a prestar atenção às variáveis presentes à
sessão que podem afetar ou não o com portam ento do cliente. Caso o terapeuta
resolvesse com partilhar suas observações com o cliente, m esm o isso não sendo
parte do processo psicanalítico, tal interação poderia ser benéfica, pois seria
um a descrição de relacionam entos funcionais, requerida na R egra 5.
Em bora a distinção do real versus transferência possa levar terapeutas
a examinarem suas próprias contribuições em relação à resposta do cliente,
essa visão poderia ter im plicações clínicas negativas, pois presum e um a
Psicoterapia Analítica Funcionai
perspectiva única e estática (do terapeuta) da realidade.. A visão da realidade:
“eu estou certo e você está errado” pode não ser. talvez, problem ática quando o
cliente expressa acusações extrem as do tipo “o terapeuta está se encontrando
secretam ente com o seu chefe (do paciente) e arm ando um a conspiração para
matá-lo”. A realidade “verdadeira” , no entanto, não está tão clara em comentários
m ais típicos do cliente, tais com o: “Eu não acho que você realm ente se importa
o bastante comigo” , “Você está cansado de m im ”, ou ainda “Terapia custa muito
dinheiro” . Filosoficam ente, existem m otivos para se questionar a noção de uma
única e Fixa verdade. É bastante provável que a realidade possa nunca ser
conhecida totalm ente (é esta a visão behaviorista radical discutida no prim eiro
capítulo). M esmo se houvesse apenas uma única realidade “verdadeira”, seria
pouco razoável presum ir-se que o terapeuta estaria sem pre certo.
Clinicam ente, nós nos preocupam os com que um terapeuta, que aceita
o aspecto distorcido de realidade da transferência, esteja m enos inclinado a
considerar a possibilidade de que a percepção do cliente é válida, quando ela for
diferente de sua própria percepção. Isso, por sua vez, poderia privar o cliente da
oportunidade de aprender com o processar e resolver u m a situação interpessoal
n a qual cada pessoa tem um a visão diferente, porém justificável, do m undo.
Similarmente, um cliente submisso que tenha um inadequado senso de autocrítica
poderia vir a ser punido p o r ser assertivo quando a sua visão da realidade diferir
da de seu terapeuta. Temos preocupações parecidas quando a validação da
percepção do cliente pode ser essencial para a sua m elhora (ver C apítulo 6). Tal
validação necessária pode ser lim itada ou dificultada pela noção distorcida da
realidade.
Também nos tornam os apreensivos em relação ao fato de que a noção
distorcida da realidade possa inadvertidam ente reforçar um a posição rígida ou
até m esm o autoritária de terapeutas que já tenham propensão a seguir esse
caminho. Junto a essas preocupações, psicanalistas têm expressado outras no
sentido de que terapeutas possam utilizar o conceito de transferência do “não
real” para evitar um envolvim ento real com o cliente (G reenson, 1972). A falta
de um envolvim ento genuíno com o cliente im pede tanto a evocação do CRB
quanto a ocorrência de reforçam ento natural, o que é essencial para um benefício
terapêutico na FAP.
Psicanalistas tam bém reconhecem os problemas relacionados à suposição
de que a visão dos clientes a respeito da realidade seja um a ilusão. Por exemplo,
recentem ente, Gill e H o fím an (1982) pro p u seram um a visão diferente de
transferência, que vem a ser m ais coerente em relação à posição da FAP:
194
Capítulo 7
“A creditam os que o com portam ento verdadeiro do terapeuta afete fortemente a
experiência verdadeira do paciente, inclusive o que é norm alm ente designado
com o os aspectos transferenciais daquela experiência... Discordam os, portanto,
daqueles que enfatizam distorção da realidade como um aspecto distintivo da
transferência” (p. 139). A visão de H offm an e Gill sobre os efeitos do controle
por regras teria mais probabilidade de produzir, nos analistas, com portam entos
que se assem elham aos da Regra 5 da FAR
T ra n sfe rê n c ia e c o m p d rta m e n to a p re n d id o
Freud (1925) acreditava que a transferência era autom ática e resultava
de um im pulso inerente. Isso ocorria em todos os casos (exceto se o cliente fosse
psicótico) e sem a perm issão do terapeuta (p. 42). Essa idéia é lem brada por
Greenacre (1954), que conceituou transferência como um ubíquo “instinto social
prim itivo” (p. 672). Essa teoria da transferência autom ática dilui a atenção
sobre as ações do terapeuta que produzem e m antêm as reações do cliente. Em
resum o, as funções que o aprendizado, o estím ulo atual e o reforço imediato
desem penham em uma situação terapêutica são anuladas. Essa orientação do
não-aprendizado reflete-se em muitas noções psicanaliticas. Tome como exemplo
Langs (1982), que descreveu o efeito da com unicação perturbada do terapeuta
com o “dando aos pacientes um a oportunidade de colocarem suas próprias
perturbações no terapeuta e, portanto, encobrirem suas próprias doenças” (p.
136). O bviam ente, é difícil reconceituar tais noções dentro dos term os do
aprendizado.
A inda assim , acreditam os que os efeitos de estím ulos atuais e do
aprendizado são tão fortes que devem ser acom odados dentro da psicanálise.
Por exem plo, W aterhouse e Stiupp (1984) viam o terapeuta como um professor
que criava, durante o tratamento, condições que trariam m udanças para o cliente.
Stone (1982) escreveu que “as m elhores liç õ e s ... [ocorrem] no relacionam ento
terapêutico entre duas pessoas, ou seja, no fenômeno de transferência. Pelo fato
de a situação terapêutica ser testem unhada pelo terapeuta, a lição que se tira da
sua própria observação terá um a pureza e um a realidade nem sempre presentes
em m ateriais derivados da vida lá fora” (p. 271). A posição psicanalítica,
entretanto, não articula claram ente o que vem a ser o aprendizado, como ele
acontece, ou qual é o seu grau de im portância em relação a outros processos.
N a m elhor das hipóteses, é incerto com o e quando o com portam ento dentro de
um a sessão está sujeito ao aprendizado, ou é resultado dele. N a pior das hipóteses,
aprendizado é relegado a um papel inferior ou secundário. E ssa confusão a
Psicoterapia Analítica Funcional
195
respeito da função do aprendizado produz conceitos psicanaliticos que envolvem
regras conflitantes.
Considere-se, por exem plo, o comentário de Freud de que “é impossível
destruir alguém que esteja ausente ou apenas pela im agem ” (1912, p. .108).
P rovavelm en te, o “alg u ém ” a quem Freud se referia era o pai ou a m ãe
responsáveis pelo com portam ento disfuncional do cliente. O restante de seu
com entário se refere à dificuldade em m udar esse com portam ento disfuncional
com a terapia, a não ser que o pai ou a m ãe estejam presentes durante a reação
de transferência. E ssa noção sugere um a regra que considera positivo o cliente
reagir ao terapeuta da m esm a m aneira que reagiria em relação ao pai ou à mãe.
Enquanto essa regra encorajar o CRJB, ela terá efeitos clínicos positivos. Porém,
se essa regra não fizer m enção aos princípios do aprendizado, ela não dá ao
terap eu ta analítico m u ita orientação a respeito de com o obter reações de
transferência. A suposição da “transferência autom ática” diz que tudo que o
terapeuta tem a fazer é esperar até que tal com portam ento ocorra.
Ainda pior, a falta de princípios de aprendizado cria outros procedimentos
que podem interferir na aquisição de transferência. U m exemplo é o princípio de
neutralidade que afirm a que “o m édico não deveria ser transparente em relação
aos seus pacientes mas, como um espelho, deveria refletir apenas o que é mostrado
a ele” (Freud, 1912, p. 118). Searles (1959) tam bém alertou para as reações
em ocionais do terapeuta, descrevendo-as como tentativas por parte do terapeuta
de levar o paciente à loucura. A regra im plícita é obvia - ser ponderado, não
reagir em ocionalm ente, e não se auto-revelar. Do ponto de vista da FAP, se o
com portam ento de ser im passível e de não m ostrar reações to m a o terapeuta
parecido com o pai ou a m ãe do cliente, evocando assim o com portam ento
problem ático deste, então isso pode ser um a boa coisa a se fazer (desde que o
terapeuta não esteja alterando deliberadamente seu comportamento, de tal maneira
que possa trazer à tona os perigos do reforço arbitrário, conform e discutido no
prim eiro capítulo). Baseando-se no conceito de generalização, entretanto, é m ais
provável que o CRB que envolve confiança, medo, amor, ódio, decepção e outros
sentim entos parecidos, seja evocado por um terapeuta que reage positivam ente
ou negativam ente em relação ao cliente e que esteja querendo, ocasionalm ente,
revelar-se. O CRB é, portanto, m ais provável de ser evocado por um terapeuta
que apresente u m a grande variedade de estímulos inteipessoais do tipo que são
passíveis de ocorrer em relações m ais íntimas e significativas.
A confusão psicanalítica, no que diz respeito ao papel do aprendizado,
pode tam bém interferir no processo de reforçamento. Por exemplo, consideremos
196
Ca p í t u l o
t
o princípio dos efeitos da neutralidade nas atividades de reforço do terapeuta.
l)m a reação o p aca do te ra p e u ta ten d e a ser d e sp ro v id a da em oção e
espontaneidade que geralmente servem com o reforçadores em relações mais
próximas. Do ponto de vista comportamental, isso poderia ser contraterapêutico.
pois as reações norm ais do terapeuta são vistas como o agente primário de
m udança. De acordo com a FAP, as reações do terapeuta deveriam ser. ora
amplificadas (como quando o terapeuta tem uma reação positiva ao cliente,
porém muito sutil para ser notada), ora m oderadas (pois pode sobrecarregar).
Em resumo, a nossa posição é a de que a transferência é um compor-tamento
operante que ocorre em razão da similaridade entre a atual situação (que inclui o
terapeuta e a relação cliente-terapeuta) e situações passadas que o cliente tenha
vivenciado. Além disso, as reações do terapeuta são contingentes às respostas do
cliente e poderão ter efeitos reforçadores. Finalmente, como mu operante, não há
garantias de que o problema ocorrerá durante a sessão. Essa visão de transferência
oferecida pela FAP tem a vantagem de sugerir suas causas, sua relação com os
problemas diários do cliente, e como são afetados pelo processo terapêutico.
 Aliança Terapêutica
AJém da transferência, considera-se aliança terapêutica um outro
im portante com ponente da relação cliente-terapeuta. A aliança terapêutica é
im portante por ser considerada saudável ou “b o a ” , em contraste com a
transferência que norm alm ente é considerada neurótica ou “ruim ”. De uma
maneira não muito precisa, a aliança terapêutica corresponde ao CRB2, enquanto
transferência corresponde ao CRB1. Como é característico de todos os conceitos
psicanalíticos, existem num erosas e conflitantes visões a respeito da aliança
te ra p ê u tic a . E x a m in a re m o s d o is te m a s c e n tra is, a p re se n ta re m o s um a
interpretação com portam ental e então observarem os as im plicações clínicas.
A aliança terapêutica era considerada por Freud a força m otivadora
prim ária por trás do tratamento. Isso explica os aspectos “de colaboração” da
relação terapêutica e é indiferenciável da “transferência não-sexual e positiva”
(Paolino, 1981, p. 100). Presum im os que os aspectos colaborativos a que se faz
referência envolvem com portam entos do cliente, tais com o, ir a um a sessão
m esm o quando prefere não ir, conversar com o terapeuta m esm o quando isso é
m uito difícil, e seguir as regras do terapeuta m esm o quando são desagradáveis.
A lém disso, ao descrever esses com portam entos como não-sexuais, eles seriam
P sicoterapia A nalítica Funcional
197
considerados norm ais ou saudáveis. Assim, um analista que seguisse essa visão
teria o com portam ento governado por regra de exam inar cada reação do cliente
a fim de ver se é problem ática (transferência) ou colaborativa (aliança), e de
estar procurando sem pre por um “bom ” ou por um “m au” com portam ento
Sucessivamente, isso levaria o analista a reagir naturalmente aos comportamentos
classificados com o aliança terapêutica, por meio de reforçam ento positivo,
fortalecendo-os desse modo. N ós vemos isso como um efeito positivo, pois o
terapeuta está respondendo, até certo ponto, de acordo com as maneiras requeridas
pelas Regras 1(Prestar atenção aos CRBs) e 3 (Reforçar CRB2), da FAP.
N o entanto, efeitos negativos podem ocorrer em razão da natureza nãocontextual da definição de aliança terapêutica. Por exemplo, é possível que, diante
de algumas circunstâncias, o atraso de um cliente a um a sessão, ou sua recusa
em fazer associações livres, possa ser considerada um a m elhora que precisa ser
reforçada. Este pode ser o caso de um cliente extremamente passivo ou compulsivo
cuja melhora pode ser punida, se o terapeuta interpretar seu comportamento de
não-obediência como problemático, por não ser aliança terapêutica.
O segundo tem a envolvendo aliança terapêutica gira em tom o da
habilidade do cliente de envolver-se em auto-observação. Por exem plo, a visão
de Sterba (1934) da aliança terapêutica envolvia um a das duas partes do ego.
U m a parte (defensiva) é governada por forças repressivas e instintivas que
interferem na terapia, enquanto que a outra parte (aliança terapêutica) é realista,
procura entendimento, m udança e crescimento psíquicos. De igual modo, Paolino
(1981) descreveu um a característica da aliança terapêutica como sendo “um
acordo entre terapeuta e paciente de observarem o funcionam ento psíquico do
paciente e o seu comportamento, a fim de obter o entendimento dos determinantes
de tal com portam ento” (p. 100). Essas noções têm com o tem a o cliente não
apenas agindo, m as tam bém distanciando-se e observando essas ações. M ais
adiante, um a vez que essas auto-observações acontecem , o cliente é capaz de
descrever o que aconteceu a partir de um a perspectiva histórica. Por exem plo, o
cliente pode ter u m a explosão de raiva em relação ao terapeuta pelo fato deste
não ter respondido a um a questão, m as pode tam bém observar e descrever essa
explosão como um ato de irritação baseado no fato de que seu pai nunca respondia
a suas questões por considerá-las tolas.
Essa segunda visão de aliança terapêutica poderia funcionar como regra
que levaria o terapeuta a ser vigilante, a encorajar e a reforçar naturalm ente os
com portam entos do cliente de se auto-observar e de descrever as causas do que
foi auto-observado. Tal com portam ento poderia ter vários efeitos clínicos
198
Capítulo 7
positivos, como, por exemplo, distanciar-se e observar a si próprio, o que é
parte do CRB3. Conforme descrito 110 Capítulo 2, os melhores CRB3s envolvem
a o b se rv a ç ã o e a d e sc riç ã o do p ró p rio c o m p o rta m e n to . E sse m esm o
com portam ento dá início à form ação das próprias regras (Capítulo 5) e ao
desenvolvim ento do “s e lf ’ (Capítulo 6). Assim, auto-observaçãô e descrição
contribuem para um a grande melhora em vários aspectos da vida de um a pessoa.
Todavia, é provável 0 surgim ento de efeitos desagradáveis em razão
de não se enxergar auto-observação e autodescrição como com portam entos
aprendidos. P or exem plo, se eles forem vistos com o funções do ego, então a
atenção do analista poderá voltar-se para a m obilização dos im pulsos psíquicos
envolvidos 110 fortalecimento das funções do ego, muito mais do que simplesmente
sugerir e reforçar os com portam entos relevantes. Além disso, separar aliança
terapêutica de transferência é incompatível com a noção de que comportamento
é contextual e que aliança e transferência estão no mesm o continuum. Entender
aliança e transferência com o duas coisas com pletam ente diferentes interferiria
no processo natural de m odelagem . Por exem plo, estes cinco com portam entos
estão todos no m esm o continuum: (1) “Eu som ente reagi irritadam ente com
você quando disse que te odiava”, (2) “E u tenho sentim entos de ódio por você”,
(3) “Eu odeio você” , (4) “G rrrrr” (em itir qualquer som de irritação, ódio), e (5)
bater nos m óveis do terapeuta. O prim eiro, logicamente, seria considerado um a
b o a resp o sta de alian ça terap êu tica. U m a clien te com um histó rico de
com portam ento violento, no entanto, pode ter apenas 0 quinto com portam ento
no seu repertório, revelando, desta forma, falta de aliança terapêutica. Partindo
da perspectiva da FAP, neste caso a ocorrência do quarto comportamento poderia
ser encorajada e reforçada como um com portam ento melhorado.
Até agora m encionam os dois com ponentes da teoria psicanalítica:
transferência e aliança terapêutica. O utros aspectos im portantes da teoria
psicanalítica tradicional podem ser resumidos brevemente: (1) um modelo de desejo
é enfatizado, onde desejos instintivos e impulsos libidinosos são nossas forças
motivacionais primárias; (2) 0 id, 0 ego e 0 superego são considerados estruturas
primárias da psique humana; (3) 0 período edipiano é enfatizado; 0 desenvolvimento
psicológico mais favorável está ligado a ocorrências que acontecem no quinto ou
sexto ano de vida; (4) 0 pai ocupa um papel central, por criar medo de castração
no menino e sentimento de inveja do pênis na menina e tem poderosa influência
no fato da criança trabalhar com êxito, ou não, 0 período edipiano; e (5) a
psicopatologia está relacionada a fixações psicosexuais e à incapacidade de liberar
adequadamente tensões libidinosas (Eagle, 1984). Ao invés de discutir neste
Psicoterapia Analítica Funcional
199
m om ento com o a FAP discorda dessas suposições, irem os prim eiram ente
contrastá-las com aquelas da teoria das relações objetais, e, então, comparar a
terapia das relações objetais com a FAP. Finalmente, iremos resum ir como a FAP
difere de ambas, psicanálise tradicional e teoria de relações objetais.
Relações Objetais
Os teóricos das relações objetais (Kem berg, 1976; Klein, 1952; Kohut,
1971; Mahler, 1952), embora se considerem psicanalistas, propuseram um a revisão
dos importantes aspectos da teoria psicanalítica tradicional que estão listados
acima. As m aiores diferenças são de que na teoria das relações objetais (1) o
enfoque é dado para run modelo relacional, em que as relações hum anas são
consideradas a “pedra fundamental” ou base da existência; entender como os
relacionam entos são internalizados e como eles se transform am em um a noção
do “s e lf ’ ajuda a tom ar m ais claro o que motiva as pessoas e como elas se vêem;
(2) os elem en to s d a p siq u e co n siste m em e stru tu ra s rela cio n a is (plano
representacional no qual estão as intemalizações de relacionamentos); (3) o período
pré-edipiano é enfatizado; acontecimentos críticos que modelam a vida das pessoas
acontecem dos 5 aos 6 meses; (4) a interação com a m ãe é vista como modelo
para todas as relações subseqüentes, pois essa relação inicial ocupa um grande
espaço dos prim eiros anos da vida da criança, e tam bém por estar tão relacionada
com gratificação emocional e privação; e (5) a psicopatologia se centraliza em
falhas no desenvolvimento do “s e lf’ e em anomalias no processo psicológico de
separação; um a vez que o “se lf’ é construído interpessoalmente, distúrbios mentais
são equivalentes a perturbações nas relações interpessoais (Cashdan, 1988).
A seguir, está a visão da FAP das cinco diferenças entre psicanálise tradicional
e relações objetais: (1) Mudar a ênfase, antes sobre os desejos, para os efeitos do
relacionamento, é mais compatível com a FAP, um a vez que os relacionamentos
podem ser traduzidos m ais facilmente em term os de controle de estímulos e
reforçamento. (2) Embora a FAP evite explicações que destaquem entidades nãocomportamentais, o que é característico de todas as formas de psicanálise, a visão
que as relações objetais têm das estruturas como sendo provenientes de experiências
de relacionamento, as tomam mais prontas paia serem testadas em termos de fatores
externos, do que as estruturas do id, ego e superego. (3) A ênfase dada pelas relações
objetais ao desenvolvimento do comportamento pré-verbal poderia ter alguma relação
com antecedentes que são necessários para o desenvolvimento do comportamento
verbal relacionado ao “se lf’ (discutido no Capítulo 6). U m a análise comportamental
200
C apítulo 7
mais completa do “se lf’ iria então incorporar essas experiências iniciais. No entanto,
como não há nenhum conceito de “estágio critico” na FAJP, tanto o ponto de vista
tradicional quanto o das relações objetais são incompatíveis com a FAP nesse aspecto.
(4) Na F /J 5, não se dá significado especial ao papel do pai ou da mãe, e não se faz
diferenciação entre o papel desempenhado por país, mães ou babás. O que importa é
a natureza das interações específicas e das contingências.
Entretanto, alguns aspectos da posição das relações objetais a tornam
m ais compatível com a FAP. Prim eiro, as noções de gratificação e privação
estão mais próximas dos conceitos comportamentais de reforçamento e privação,
o que facilita sua transposição para eventos com portam entais. Segundo,
gratificação e privação são noções m ais abstratas de m otivação do que são a
castração e o sentimento de “inveja” do pênis, se assem elhando, portanto, ao
reforçam ento (um conceito m uito abstrato de motivação). Finalm ente, embora
discordem os da conclusão de que a m ãe desempenha sem pre o papel mais
importante, o argumento de que a criança é m odelada por aquela pessoa que
m ais contingências estabelece é coerente com a posição da FAP. (5) O conceito
das relações objetais sobre separação (visualizando a si próprio ou outra pessoa
como ora totalmente bom , ora totalm ente ruim) é apresentado como um processo
e permite um a interpretação m ais clara quando envolve processos comportamen­
tais (tais como, ver sob controle discrim inativo e lembrar) ao invés de conceitos
como fixações psicosexuais e a descarga de tensões libidinosas. O isomorfismo
entre estados m entais e estados interpessoais tam bém cham a a atenção para
as variáveis externas que constituem um relacionam ento interpessoal.
Considerando a maior compatibilidade dos conceitos das relações objetais
com a FAP, seria precoce dizer que o processo clínico pode tam bém ser mais
compatível. Conforme esperado, a descrição de Cashdan (1988) de terapia de
relações objetais carrega um a semelhança impressionante com a FAP:
“Das várias relações que constroem a vida do paciente, considerações
importantes deveriam ser feitas ao relacionamento com o paciente. Não
somente isso acontece no fenomenológico “aqui e agora”, mas também
contém muitos dos elementos críticos que operam no relacionamento
do paciente com outras pessoas. A relação cliente-terapeuta,
conseqüentemente, seria vista como uma expressão in vivo do que é
patológico na vida do paciente. Se esse fosse o caso, seria razoável
concluir que a relação cliente-terapeuta contém o maior potencial de
mudança. Ao invés de ser vista como uma maneira de produzir “insight”,
autoconhecimento, ou outras mudanças “no paciente”, apropria relação
cliente-terapeuta é que se transformaria no foco de mudança” (p, 28).
Psicoterapia A nalítica Funcionai
201
Apesar das semelhanças impressionantes, a terapia das relações objetais
de Cashdan revela algum as divergências m arcantes em relação à FAR Por
exem plo, ela enfatiza o m ecanism o psicológico de identificação projetiva do
paciente, um padrão de comportamento interpessoal no qual o paciente manipula
outras pessoas para que se com portem ou respondam dentro de um pádrão
limitado. Identificações projetivas distorcem e enfraquecem as relações atuais
do paciente e representam “esforços m al-adaptados para reparar o equilíbrio
e n te bondade e m aldade do m undo interior” (p. 56), que são originárias de
relações objetais insatisfatórias, históricas por natureza. Assim , o indivíduo
“inconscientem ente projeta um a parte do seu próprio eu em outro ser humano,
o b je tiv a n d o c o n v e rte r um a b a ta lh a in te rn a re la c io n a d a à m ald a d e e à
inaceitabilidade em um a outra externa” (p. 57). D e acordo com Cashdan, a
maioria das identificações projetivas incluem dependência (que induz sentimentos
de cuidado nas outras pessoas), poder (que induz sentim entos de fraqueza e
incom petência nas outras pessoas), sexualidade (que induz desejo sexual) e
ingratidão (auto-sacrifício, que induz outras pessoas a serem gratas).
É desnecessário dizer que essa profusão de entidades m entais não está
de acordo com o enfoque da FAP. O bservando a identificação projetiva de
dependência, teríam os a seguinte visão: (1) N ada é projetado para outra pessoa,
o cliente está reagindo de m aneira dependente porque foi estim ulado a fazer isso
no passado, e, provavelm ente, quando criança, era punido se mostrasse qualquer
com portam ento independente. (2) N ão sucede nenhum a conversão de batalha
interna para externa; a batalha interna é um efeito colateral de respostas tanto
dependentes quanto independentes, que foram punidas em períodos de tem po
diferentes. (3) Ser dependente perdeu muito do seu valor passado de adaptação;
a dependência agora constitui um comportamento de esquiva que impede o cliente
de contatar contingências m ais positivas associadas com a construção de novos
com portam entos (por exemplo, ser assertivo, tom ar o controle de um a situação,
ser capaz de dar e receber).
M ais im portante ainda, em term os de im plicações clínicas, é que
entendem os que designar as identificações projetivas com o com portam entos
específicos (por exemplo, dependência, poder, comportamento sexual, ingratidão)
tende a ser problem ático. Existe um julgam ento a prio ri que diz que, se um
terapeuta responde ao com portam ento do cliente com sentim entos de cuidado,
incom petência, desejo sexual ou gratidão, isso é um reflexo da patologia do
cliente, sendo, portanto, indesejável. C om o afirm am os repetidam ente, os
com portam entos não podem ser julgados com o problem áticos fora de um
202
Capítulo 7
contexto; isto é, em bora certos com p o rtam en tos de clientes possam ser
problemáticos (CRB1), tam bém é provável que sejam melhoras (CRB2), quando
considerado o repertório atual do cliente. P or exem plo, se um a cliente evitava
relacionamentos por medo de estar sendo muito dependente, então, o surgimento
de um com portam ento de dependência seria realm ente um CRB2 e deveria ser
reforçado nos prim eiros estágios da terapia. O u, se a dependência havia sido
considerada como um CRB 1, então, m elhoras precisam ser modeladas e refor­
çadas, e não punidas. U m a m elhora pode ser o fato de o cliente ligar para o
terapeuta um a ou duas vezès por semana, ao invés de quatro ou cinco, ou diminuir
o tem po de suas ligações telefônicas para m enos de dez minutos. U sar a visão
das relações objetais para avaliar o com portam ento como patológico pode levar
à pun ição de com portam entos de depen d ên cia, m esm o quando eles são
considerados avanços.
Em resumo, embora alguns aspectos das relações objetais sejam mais
compatíveis com a visão do behaviorismo radical do que é a psicanálise tradicional,
tanto as relações objetais quanto a visão psicanalítica tradicional compartilham
suposições fundamentais que discordam da FAP. São estas: (1) estruturas mentais
causam comportamentos (adaptativos e não-adaptativos), (2) a base de nossa
personalidade é formada através de importantes interações tanto com o pai como
com a m ãe, durante períodos críticos de desenvolvimento, e (3) comportamentos
específicos do cliente (separação, identificações projetivas) são considerados
patológicos a priori. Em contraste, a FAP (1) prioriza eventos ambientais como
causas definitivas do comportamento, (2) afirma que importantes eventos modelam
nosso comportamento no decorrer da vida, e (3) enfatiza o significado contextuai
do comportamento - que um mesmo compor-tamento pode ser patológico ou
adaptativo, dependendo do contexto em que ocorre.
FAP EM CONTRASTE COM TERAPIAS ATUAIS DO
COMPORTAMENTO
A FAP difere de outras terapias com portam entais na essência do
significado dado a certos aspectos da relação terapêutica. Especificam ente, a
FAP afirm a que o relacionam ento terapêutico é um am biente que pode provocar
e im ediatam ente dar início a um com portam ento clinicam ente relevante. Esse
aspecto do relacionam ento raram ente tem sido m encionado por terapeutas
com portam entais. Algumas exceções notáveis incluem G oldfried e Davisón
Psicoterapia Analítica Funcionai
203
(1976), que m ostraram que o com portam ento dentro da sessão poderia,
eventualmente, ser útil no processo de terapia comportamental. Goldfiied (1982)
tam bém cham ou a atenção para o relacionamento cliente-terapeuta como aspecto
prim ordial para o entendimento da resistência durante a terapia comportamental.
Essa oportunidade terapêutica, de os problem as do cliente ocorrerem na sessão
terapêutica, foi tam bém reconhecida p o r G oldfiied, que entendia a resistência
com o sendo “ uma benção contraditória pois, ao mesm o tem po em que interfere
no andam ento da terapia, tam bém fornece ao terapeuta am ostras em prim eira
m ão do problem a do cliente” (p. 105). Em bora esses autores reconhecessem a
ocorrência dos problemas do cliente dentro da sessão e sua respectiva contribuição
potencial para o tratam ento, eles tam bém os entendiam como desem penhando
um papel relativam ente m enor dentro dos m étodos de terapia com portam ental.
Assim, essas visões parecem ter rido pouco impacto na área. Ao contrário, quando
terapeutas coinportamentais falam a respeito da relação terapêutica e reconhecem
a sua im portância, eles tipicam ente se referem a tais fatores como “efeitos nãoespecíficos”, “o uso de um ‘bom relacionam ento’ como base para se obter
cooperação durante o tratam ento” ou “usar o valor de reforçam ento social do
terapeuta para m otivar ou m anter m udanças na vida diária” . M esm o tendo
considerável im portância, essas variáveis não direcionam a atenção para os
comportamentos clinicamente relevantes que ocorrem na sessão terapêutica, como
acontece na FAP.
E ssa diferença de enfoque está clara na revisão de Sw eet (1984) sobre
a ssu n to s de re la c io n a m e n to te ra p ê u tic o a p re s e n ta d o s p o r te ra p e u ta s
comportamentais, que incluem fatores como o impacto do relacionamento, tempo
do terapeuta, e reforçam ento social. N enhum dos estudos revisados m encionou
a im portância dos com portam entos-problem a do cliente que ocorrem durante a
sessão. Algum as vezes esses com portam entos foram ignorados, m esm o tendo
atraído a atenção do terapeuta, com o neste caso exem plificado por Sweet: ele
descreveu um a cliente que estava com m edo de progredir no tratam ento, o que
era m anifestado, em parte, por suas reações negativas perante os elogios do
terapeuta (reforçamento social foi o procedimento empregado). O terapeuta usou
“flo o d in g ” para “superar esse im passe” . Ao citar esse caso como um exemplo
de como superar um a dificuldade técnica, o “medo do sucesso” dentro do processo
terapêutico, Sweet desconsiderou a importância deste fator como um a ocorrência
de um problem a que tinha im pacto significativo em outras áreas da vida do
cliente. A lénfdisso, não foram levados em consideração os benefícios potenciais
que a “superação da dificuldade técnica” poderia ter tido na vida do cliente.
204
C apítulo 7
A FAP se parece com o treinam ento de habilidades sociais porque ela
enfatiza os déficits em repertórios interpessoais como a causa dos problemas
do cliente e vê o tratam ento com o um m eio para rem ediar esses déficits.
Entretanto, as técnicas diferem significativamente, na m aneira como os déficits
de habilidade são detectados e no próprio processo de rem ediação. N a FA.P, o
terapeuta é direcionado a observar, durante a sessão, ocorrências reais de
sintom as apresentados, e as variáveis que os controlam . A definição do tipo e
da quantidade da m elhora comportam ental baseia-se no repertório existente de
cada cliente. Tais “co m p o rtam en to s-alv o ” podem ser sutis e difíceis de
reconhecer sem essa observação direta. Por exem plo, esta situação aconteceu
com Agnes (a cliente m encionada previam ente), cuja m elhora consistia em dar
razões para desistir da terapia antes m esmo de tom ar este fato um a realidade.
Talvez, o m ais im portante na FAP seja que um a m elhora é um a m udança
comportamental que ocorre sob condições de estímulos que causam os sintomas.
N a verdade, a equivalência funcional entre a situação terapêutica e o ambiente
natural é um a pré-condição para a FAP. Se a situação terapêutica não evoca os
sintom as, a FAP não pode ser feita. Assim, no sistem a da FAP, os sintomas e as
m elhoras são definidos funcionalmente.
Diferentemente, o treinam ento de habilidades sociais raram ente implica
observação direta dos sintom as ou das condições que os causam. Além disso, as
habilidades são adquiridas sob condições obviam ente diferentes das que causam
os sintom as. O com portam ento adquirido através de treinam ento, modelagem,
“role-playing”, e ensaio com portam ental, durante a sessão é funcionalmente
diferente do com portam ento que deve acontecer na vida real, m esm o que eles
possam parecer iguais. Ignorar os aspectos funcionais do comportamento é como
ignorar a diferença entre aprender a pronunciar um a frase em francês sem saber
seu significado, e aprender essa m esm a frase conhecendo o idioma. As frases
podem parecer exatam ente iguais para o ouvinte, m as elas são funcionalm ente
muito diferentes. Pode-se encontrar um a alusão a esse problem a em um a revisão
feita por Scott, Him adi e K eane (1983), da literatura que trata da generalização
do trein am en to das h ab ilid ad es sociais. E les co n clu íram que a falta de
generalização demonstrável é responsável pela aceitação limitada do treinamento
das habilidades sociais com o form a viável de tratam ento. D o ponto de vista da
FAP, a falta de similaridade funcional entre o ambiente de treinamento e o natural,
que é típica do treinamento de habilidades sociais, não fornece nenhuma garantia
de que o com portam ento treinado será transferido para um a situação real, e que
são necessárias explicações para dar conta desses casos.
Psicoterapia Analítica Funcional
205
A pesar das diferenças, dever-se-ia enfatizar que a FAP com plem enta
e sobrepõe-se a outras terapias com portam entais. Uma vez que a terapia
com por-tam ental dem onstrou sua eficácia, ainda é o tratamento escolhido para
intervenção inicial na m aioria das situações. Em contraste, os dados em píricos
que confirm am a eficácia da FAP ainda não foram reunidos. Por essa única
razão, faz sentido tentar a terapia com portam ental como prim eira intervenção
e só depois com plem entar com a FAP, conform e for necessário.
A FAP foi desenvolvida dentro do contexto da terapia comportamental.
No início era usada quando esta parecia ser ineficaz. Agora a FAP está sendo
usada em conjunto com a terapia com portam ental desde o início e, às vezes,
tom a-se o modo principal de tratamento. A FAP é facilm ente integrada à terapia
com portam ental porque m uitos dos m étodos desta últim a evocam CRBs. Por
exem plo, instruções específicas sobre a “tarefa de casa” são freqüentem ente
fornecidas pelo terapeuta durante a terapia com portam ental. Para clientes cujos
problem as envolvem docilidade excessiva, rebeldia, culpa ou ansiedade por não
corresponder às expectativas, essas tarefas naturalmente abrem um a oportunidade
para a FAP.
FAP: UM RARO NICHO ENTRE A PSICANÁLISE E A
TERAPIA COMPORTAMENTAL
O s m é to d o s da FA P se so b re p õ e m ao s m é to d o s das te ra p ia s
com portam ental e psicanalítica. Para ilustrar essa posição, vam os considerai- o
caso de M elissa, 29 anos, que procurou terapia com o segundo autor por
apresentar depressão recorrente e sentir-se arrasada em função de seu pouco
valor. O seu dia-a-dia não estava funcionando bem , e a sensação era de estar “se
afo g an d o ” . Sem sen tir n en h u m entusiasm o p e la vida, ela co n fesso u ter
considerado a hipótese de suicídio. E la lutou contra questões do tipo: “E u valho
a pena?”, “Consigo m e perdoar?”, “Vale a pena alguém m e amai'?” . N otam os
que ela nunca tinha tido um a relação íntima. Tradicionalm ente, os tratam entos
com portam entais evitam esses problem as pouco específicos e os deixam para
terapeutas psicodinam icam ente orientados. Todavia nós acreditam os que esse
tipo de problem a do cliente pode ser subm etido a u m a análise comportam ental.
M uitos dos repertórios a serem m odelados eram aqueles necessários a
relacionam entos íntimos. A lém disso, m uitos dos C R B ls de M elissa seriam
206
Capítulo 7
evocados som ente por relacionam entos de longa duração. Devido a isso, o
tratam ento tam bém foi longo - eu vi M elissa por um período superior a 5 anos.
A duração do seu tratam ento lembra a duração de tratam entos psicanalíticos,
porém foram usados princípios comportamentais.
Em nossa opinião, os resultados foram excelentes. Ao final de 5 anos,
M elissa estava em um relacionam ento de com prom isso e escreveu a seguinte
descrição da terapia: “O que [a terapeuta] me ajudou a fazer foi dar tem po a
m im m esm a para cicatrizar a dor. Ela m e ouviu, m e confortou, m e am ou
incondicionalm ente. E, com o resultado de ter dado tempo a m im m esm a e ter
deixado alguém me amar, hoje eu tenho um a vida cheia de am or e esperança,
diferente de qualquer coisa que eu possa ter im aginado antes” . Somos a favor
das avaliações rigorosas que são características dos tratamentos comportamentais
e oferecem os a avaliação do resultado acim a com o um m étodo provisório. No
entanto, a FAP é, assim com o a psicanálise, um tratam ento complexo e de longa
duráção, que não perm ite facilm ente um a avaliação dos resultados nos m oldes
tradicionais.
O m eu papel na terap ia com M elissa foi ser um a pessoa “re al” ,
“verdadeira”, com quem ela poderia relacionar-se e brigar. Ou seja, eu não
escondi m inhas emoções, m eus valores e nem m inhas opiniões. Por essa razão,
evoquei os problem as que ela tinha em form ar e m anter um a relação íntima.
E ntretanto, tam bém forneci, na terapia, a oportunidade de fazer um novo
com portam ento surgir e ser reforçado. Os trechos seguintes são algum as das
interações específicas que refletem o processo que resultou na melhora de Melissa:
Trecho 1
C: Eu estou sempre nervosa perto de você. Eu estou contando a você sobre meus
sentimentos, minha vida; sinto-me nua. Quando não digo nada, me sinto segura.
Quando eu o faço, não sei prever minha reação ou a sua. Eu me preocupo com o
que você irá pensar. (Esse é um CRB2 significativo, uma vez que Melissa raramente
relatava seus sentimentos. Relatos desta natureza são encorajados pela FAP e pela
psicanálise.)
T: Eu me sinto mais próxima de você quando você me deixa saber quem você é. (Eu
estou ampliando uma resposta específica, que é um reforçador natural em potencial.
Apesar de ser geralmente visto como contraterapêutico por psicanalistas, e não
ser normalmente utilizado por terapeutas comportamentais, é recomendável fazer
uso dele, de acordo com as regras da FAP.)
Psicoterapia Analítica Funcional
207
C: Eu nunca senti meus sentimentos tão próximos da superfície antes, nunca os senti
tão intensamente. (A Regra 4 sugere a observação dos efeitos do reforçamento.
Essa resposta parece refletir um resultado imediato dos efeitos reforçadores da
resposta do terapeuta.)
Trecho 2
T: Como será para você não me ver por 4 semanas? (Um enfoque dado ao fato do
terapeuta sair de férias é um procedimento padrão dentro da FAP e da psicanálise.
Embora não seja freqüentemente trabalhado por terapeutas do comportamento, a
FAP oferece uma explicação comportamental para se fazer isso em alguns casos.)
C: Difícil, pois me sinto muito ligada a você. Esse é o único lugar onde posso falar,
chorar, fazer o que quiser. O fato de não te ver por um mês é uma chance para eu
tentar me relacionar mais intimamente com as pessoas de quem eu gosto. (Isto é
um CRB2, uma resposta importante tanto para a FAP quanto para a psicanálise.)
T: Eu também vou sentir saudades. (É permitido fazer isso na FAP, porém não na
psicanálise.)
Trecho 3
C: Eu me fechei (intencionalmente) em relação a praticamente todo mundo. Eu estou
caindo e não quero que eles caiam comigo. Eu não quero ser um peso.
T: Você também sente isso a meu respeito? (Terapeutas do comportamento poderiam
ter desafiado a idéia irracional de ser um peso e não teriam perguntado seus
sentimentos a meu respeito. Psicanalistas teriam provavelmente feito o mesmo
que eu. A FAP talvez tivesse feito as duas coisas.)
Trecho 4
T: Você realmente se abriu para mim, para você mesma e para os outros. Você saiu do
período suicida, e está aprendendo mais sobre o que te coloca e te tira destes estados
de espírito, está correndo mais riscos, aprendendo mais sobre o que você quer, sobre
o que sente e como conversar a respeito desses sentimentos. Você está mais consciente
sobre sua sexualidade. (Essa é uma interpretação que traz aspectos de interesse tanto
para psicanalistas quanto para terapeutas comportamentais. A comparação entre o
comportamento dela dentro da sessão e o comportamento que ocorçe na vida real é
característica-da psicanálise. A ênfase dada ao relacionamento funcional entre o seu
comportamento e o seu humor na vida diária é mais característica da terapia
comportamental. A interpretação da FAP contém elementos de ambos.)
208
T: O q u e v o c ê está se n tin d o
C apítulo 7
agora'?
C Nada [com uma expressão de desdém]
Ti Isso soa como um tapa na cara, sabia? (Esse comentário é uma contingência feita
dentro da sessão que bloqueou a sua esquiva. Psicanalistas teriam notado o
comportamento, porém provavelmente não teriam bloqueado a esquiva com uma
observação pessoal.)
Ci Porquê?
Ti Eu estou te dizendo o que penso, portanto você deve reagir de alguma maneira em
relação a isso, mas você simplesmente diz “nada”, e eu não sei o que está
acontecendo. (Apesar de estar utilizando as regras sugeridas pela psicanálise dentro
da sessão, a interpretação é baseada em princípios comportamentais.)
C: Eu voltarei em alguns minutos, [ela sai e logo retorna] Eu simplesmente me fechei,
fiquei realmente assustada. O que aconteceu de mais importante na minha vida
este ano foi como eu tenho deixado você entrar nela, eu nunca me senti tão
fortemente amparada por ninguém antes. E assustador te dizer isso, (Note que
isso é um CRB2.)
T: Me sinto mais próxima de você quando você me diz o que te assusta. (Novamente
isso é uma ampliação de uma resposta pessoal que serve como reforçador natural.)
Outros tipos de intervenções feitas por m im incluíram ajudar M elissa
diretam ente na sua procura por um em prego, analisando criticam ente seu
currículo, revisando seus form ulários de pedidos de emprego, e ensinando a ela
técnicas de relaxam ento para com bater a ansiedade em relação à entrevista.
Todas estas atividades são norm ais para terapeutas com portam entais, porém
são evitadas por psicanalistas. A FAP fornece um a razão para explicar como e
quando a abordagem da terapia comportamental é apropriada. E tam bém explica
quando a passividade psicanalítica seria m ais eficaz.
Em resumo, esperamos que a FAP possa m ostrar as falhas e ainda incluir
os m elhores aspectos tanto da terapia com portam ental quanto da psicanálise.
Os benefícios e as desvantagens da integração das abordagens comportamental
e psicanalítica foram discutidos por M esser (1983, 1986). Para alguns, as
desvantagens são os com prom issos exigidos para integrar a ênfase na precisão
científica, parcim ônia, e m elhora da terapia com portam ental, com a ênfase
psicanalítica em explorações em aberto e na com preensão de cognições,
comportamento e afeto. Com o desenvolvimento promissor, a FAP parece oferecer
um m eio de integração que poderia m inim izar estes com prom issos.
8
Reflexões §©bre ética, supervisão,
pesquisa e temas eulíurais
N este últim o capítulo, discutirem os alguns tem as éticos existentes na condução
da psicoterapia analítica funcional (FAP). D escreverem os como os princípios
da FA P p o d em ser ap lic a d o s ao p ro c e sso de su p erv isão . E m seg u id a,
enfocarem os a im portante questão: “Onde estão os dados”, e nossas idéias não
convencionais de como proceder na coleta destes dados. Finalmente, para sermos
realm ente diferentes, discutirem os tópicos tais com o fa s tfo o d , espiritualidade,
e de que form a os princípios que são a base da FAP podem ser am pliados para
abranger problem as enfrentados pela nossa cultura.
TEMAS ÉTICOS
Códigos como Os P rincípios Éticos dos P sicólogos (APA, 1981) e
livros com o É tica na Psicologia (K eith-Spiegel e Koocher, 1985) oferecem
padrões profissionais que pretendem orientar clínicos em sua conduta ética.
P ara aum entar .essas orientações (regras), selecionam os um núm ero de tem as
para discussões adicionais.
209
210
Capítulo 8
Antes de prosseguir, no entanto, tem os algumas palavras a dizer sobre a
ética na perspectiva com portam ental, baseadas, em parte, em Z u riff (1987) e
S kinner (1974). Um determ inado evento pode ser um refo rç ad o r para: 1) o
com portam ento do cliente, 2) o com portam ento do terapeuta. 3) o bem estar dos
mem bros do grupo profissional, 4) o bem estar dos m em bros da sociedade como
um todo, e 5) a sobrevivência da cultura. Os problemas éticos ocorrem quando os
reforçadores a longo prazo são positivos para um ou m ais de um desses cinco
grupos, m as não para todos. Posteriorm ente, em um a seção sobre problem as
culturais, farem os m enção ao tem a do conflito entre os reforçadores individuais
e a sobrevivência da cultura. Em bora não seja discutido aqui, tanto algumas das
o rien taçõ es éticas da APA quanto K eith -S p ieg el e K o o ch e r se referem às
contingências conflitantes para o terapeuta individual e o grupo profissional. D e
fato, a definição de ética de Keith-Spiegel e Koocher, um conjunto de orientações
para a conduta, essencial p ara “m anter a integridade e coesão da profissão”
(1985, p. XIII), salienta a importância dos reforçadores para o grupo profissional
em geral. Acreditamos, no entanto, que as contingências do terapeuta e do cliente
que c o n flita m são as fo n te s m a is im p o rta n te s de p ro b le m a s é tico s. P o r
conseguinte, salientam os essas questões nesta seção e em nossas discussões
sobre reforçam ento arbitrário no Capítulo 1 e na R egra 3 do Capítulo 3.
C om o os clientes freq ü en tem en te nos p ro cu ra m , sofrendo e com
necessidade de conforto e orientação, eles são particularm ente sensíveis à
influência do terapeuta. Os psicoterapeutas estão na posição de auxiliar a produzir
grandes mudanças nesse período tão vulnerável da vida dos clientes, mas o
contrário, a possibilidade de prejudicar, tam bém existe. As questões que
levantam os são relevantes para o terapeuta de qualquer orientação teórica,
mas algum as são particularm ente relevantes para a FAP devido à potência de
seus procedim entos. Discutirem os algumas precauções para auxiliar a diminuir
a possibilidade de que a FAP seja usada para m altratar ou explorar clientes.
P ro c e d a c u id a d o sa m e n te
A s variáveis controladoras existentes n a sessão terapêutica podem ser
m uito poderosas. Os procedim entos da FAP tendem a produzir reações em o­
cionais intensas e efeitos reforçadores que são associados com relacionam ento
íntimo. Por causa disto, a FAP pode ser muito benéfica para o cliente afetando
am plos repertórios. P or exem plo, durante a FAP, o cliente pode aprender pela
prim eira vez a confiar em outro ser humano. No entanto, essas m esm as variáveis
Reflexões
211
controladoras presentes na sessão podem ser extrem am ente aversivas e produzir
efeitos prejudiciais para o cliente, como intenso afeto negativo e repertórios
associados de fuga e esquiva. A ssim , o cliente pode abandonar a terapia e tomarse um erm itão porque o “baixar a guarda” que acontece quando um a pessoa
confia pode evocar esquiva e fuga acom panhada de dor.
V isto que é co m u m o CRB1 se r um c o m p o rtam e n to co n tro lad o
aversivam ente, é necessário, freqüentemente, que exista alguma aversividade
para: 1) evocar o CRB que é requerido para a FAP, e 2) bloquear a esquiva que
se segue. Em bora a pouca aversividade atrapalhe o progresso porque a esquiva
do cliente é suficientemente reforçada n a sessão, m uita aversividade pode ser
sufocante e imobilizadora. Os clientes cujos comportamentos diante de estímulos
aversivos são geralmente disraptivos, devem ser expostos à FAP com precaução.
Por exemplo, considere o cliente que é extremamente sensível a críticas. Neste
caso, quando um colega o critica por um pequeno erro, ele fica emocionalmente
desorganizado e perde vários dias de trabalho. A FAP, de início, é utilizada
cuidadosam ente com esse cliente, pois focalizar com portamentos na sessão pode
parecer um a crítica indireta e provavelm ente dem asiada, se ocorre no aqui e
agora. Geralmente, é boa política iniciar o tratamento focalizando os problemas
que ocorrem fora da sessão, usando procedimentos de outros sistemas de terapia,
antes de fazer alguma coisa com os CRBs, ou seja, antes de focalizar a relação
terapeuta-cliente. Esse procedim ento ajudará a desenvolver atarefa de orientação
do tratamento, fornecendo a oportunidade de terapeuta e cliente estabelecerem
um método de trabalhar juntos, sem complicações adicionais oriundas de reações
emocionais disruptivas. Proceder cautelosamente significa também que, identificar
como CRB um com portam ento na sessão é um a hipótese para ser explorada, e
que a relevância clínica necessita ser demonstrada e não assumida.
Evite Exploração Sexual
U m a vez que focalizar o com portam ento que ocorre durante a sessão
intensifica os sentimentos entre cliente e terapeuta, pode acontecer como resultado
um a atração sexual entre os dois indivíduos. Mesmo pensando que discutir esses
sentim entos pode ser um a p o ssib ilid ad e de progresso terapêutico, agir é
contraterapêutico e anti-ético. U m a questão sem elhante existe quando o cliente
tem problemas sexuais. U m terapeuta ingênuo ou “interesseiro” pode argumentar
que, de acordo com os princípios da FAP, a m elhor intervenção seria envolverse sexualm ente com o cliente pois os com portam entos clinicam ente relevantes
212
Capítulo 8
somente surgiriam no relacionam ento sexual.. Ao contrário, nessa situação, a
m elhor intervenção é a terapia sexual do cliente com um a pessoa significativa.
Como sexo entre cliente e terapeuta parece ser reforçamento arbitrário fornecido
pelo terapeuta, o cliente, m ais cedo ou mais tarde. se sentirá explorado e traído.
Isto é confirmado pelo núm ero crescente de processos por prática indevida da
profissão, movidos pelos clientes contra seus terapeutas, por ter havido relações
sexuais entre eles.
Esteja Alerta para Interromper Tratamentos Ineficientes
A noção básica da FÀP de que os CRBs ocorrem na relação terapeutacliente pode resultar na continuação de tratam entos ineficientes. Por exemplo, o
cliente cujos problem as estão centrados em sua incapacidade para term inar
relacionamentos destrutivos, pode tam bém m ostrar comportamento semelhante
durante uma terapia ineficiente. M uitas vezes, o cliente perm anece na terapia
quando seria m elhor term inar o tratam ento ou ser encam inhado para outro
terapeuta. Acrescente-se que o papel do terapeuta como especialista/autoridade
diminui a probabilidade do cliente ter a iniciativa de terminar, principalm ente
quando ele foi advertido contra deixar a terapia prem aturam ente.
A ten te p a r a V alores O p ressiv o s e Preconceituosos
Devido aos fundamentos do behaviorismo radical, a FAP não tem nenlium
pressuposto sexista, racista ou discriminatório; especificamente, não h á modelo
do que um a pessoa saudável deva ser ou de quais tipos de com portam entos
devam estar em seu re p e rtó rio . O que é fav o recid o são os rep ertó rio s
positivam ente reforçados e são abandonados os controles aversivos. Portanto,
não há base teórica para decidir quais os comportamentos específicos que devem
estar nos repertórios de um a pessoa, baseando-se em raça, gênero, orientação
sexual, idade, deficiência física, ou pertencer a qualquer outro grupo. A teoria é
neutra a respeito dessas questões.
O terapeuta, 110 entanto, como membro de uma cultura que contém formas
sutis, e às vezes não tão sutis, de preconceitos e discriminações, pode ter valores
consistentes com essa cultura. Valores se referem aos reforçadores para a pessoa;
isto significa que um terapeuta sexista ou racista pode continuar a reforçar os
Reflexões
213
comportamentos do cliente que foram modelados por uma cultura racista ou
sexista. Nós acreditamos que o efeito mais prejudicial da opressão é que o acesso
aos reforçadores é limitado. Por exemplo, uma m ulher que aprendeu a sempre
concordar, devido ao treino m achista, não terá acesso a reforçadores que
requeiram assertividade. Igualmente, um homem que foi punido por demonstrar
sentimentos, e assim evita situações evocadoras, não terá acesso a reforçadores
disponíveis em uma relação íntima, que requeira expressão de sentimentos. É
desnecessário dizer que o acesso a reforçadores é limitado, quando a educação,
o emprego e as oportunidades de relacionamento são negados com base na raça,
gênero, ou em ser m em bro de grupos m inoritários. Conseqüentem ente, um
terapeuta que reforça baseando-se no sexismo ou racismo, estará interferindo
em repertórios que podem , a longo prazo, aum entar reforçadores positivos,
comprometendo dessa forma os objetivos da FAP. Esse problem a existe pelo
fato de que o viés pode ser sutil e não ser observado pelo terapeuta. Como
precaução contra tal viés, é recom endável ter regularm ente sessões registradas
em vídeo e observadas por indivíduos sensíveis a essas questões.
Evite Tiraíiia Emocional
Tirania em ocional é um termo em pregado por Jeffrey M asson (1988),
para descrever o abuso de poder pelos terapeutas em detrimento de seus clientes.
De acordo com M asson, abuso é construído dentro da própria psicoterapia porque
o poder entre terapeuta e cliente não é balanceado. O poder do terapeuta estrutura
a sessão terapêutica, quanto tem po ela demora, qual a sua freqüência, quais os
comportamentos permitidos ou não durante a sessão, e quanto ela custará. M asson
tam bém duvida do valor da relação terapêutica baseado no acolhimento, atenção
e preocupação do terapeuta, pois essas qualidades só podem existir entre as
pessoas quando a relação é entre iguais. A psicoterapia é, segundo a conclusão
de M asson (p. 251), “um a profissão que depende, p ara existir, da m iséria das
pessoas” e é, por sua própria natureza, corrom pida e falha.
Os abusos m ental, em ocional, físico e sexual com etidos na profissão,
os quais foram docum entados p o r M asson, são am edrontadores e graves. Suas
alegações sobre a falha e a corrupção n a psicoterapia requerem um a rigorosa
análise por parte dos clínicos. Exam inarem os os principais argum entos de sua
crítica, descreverem os a visão da FAP sobre tirania em ocional e sugerirem os
m aneiras de lim itar o abuso de poder na nossa profissão.
214
Capítulo 8
Prim eiram ente, é um a questão de valor social saber se os abusos são
contrabalanceados pelos bons efeitos da psicoterapia. A resposta para esta
questão será baseada em dados empíricos concernentes ao número e à gravidade
dos m aus efeitos em com paração com o núm ero e qualidade dos bons efeitos.
Por um lado parece que o viés de Masson com prom ete seriamente sua avaliação
da questão empírica. Por exemplo, ele usa relatos de pacientes individuais como
evidência de abuso, enquanto que, ao m esm o tem po, analisa como mito relatos
de clientes individuais que apoiam o valor da terapia (“Eu morreria se ficasse
sem sua ajuda” [p. 241]).
Em segundo lugar, M asson considera que um a relação “real” só pode
ocorrer quando é igual. Enfatizar realidade parece m uito restrito. N o mundo
real, relacionam entos reais são iguais em alguns aspectos e desiguais em outros.
Do ponto de vista da FAP, a realidade de um a relação é definida funcionalmente.
Se evoca sentimentos autênticos como raiva, am or ou terror, então alguma coisa
“real” aconteceu. Igualdade em todas as suas dim ensões não é uma condição
necessária para que algum a coisa real aconteça.
Em terceiro lugar, em termos de equilíbrio do poder, nossa visão é de
que o desequilíbrio não pode ser considerado bom , m au, ou neutro, sem se
estabelecer o contexto. Se o poder desequílibrador é terapêutico ou não, depende
da natureza do problem a do cliente e da resposta contingente do terapeuta. Se o
problem a do cliente é evocado por um a diferença de poder, então a diferença do
poder que ocorre na terapia pode ser um a condição necessária (mas não suficiente)
para o sucesso do tratamento. Considere por exemplo, que o cliente seja incapaz
de afirm ar-se e que tenha sido explorado por pessoas que tem poder sobre ele
(como chefes, policiais, editores e professores). Com o ele tem sido incapaz de
aprender novas maneiras de se relacionai' com as autoridades em ambiente natural,
a terapia pode prover um a oportunidade ideal de aprendizagem para este cliente,
porque a diferença do poder é igual ao am biente natural. N o am biente de
tratamento, a assertividade e independência do cliente poderiam ser fortalecidas
se o terapeuta fosse reforçado pela m elhora. N o entanto, se o terapeuta falha em
fazer isso, e no lugar reforça a ausência de poder do cliente, então existe o
abuso.
Do ponto de vista da FAP, o m aior abuso que pode ocorrer na terapia é
quando a ação do terapeuta é controlada p o r outros reforçadores e não pelo
progresso do cliente. N a prática clínica particular, por exem plo, o pagam ento
ao terapeuta é contingente a m anter o cliente em terapia, o que, de outro lado,
Reflexões
215
pode ser contraterapêutico. M ais problem áticos ainda do que dinheiro são outros
reforçadores possíveis para o terapeuta, com o a subserviência do cliente, sua
admiração, civilidade, paquera, m asculinidade, fem inilidade e assim por diante.
S o m e n te p o rq u e e sse s re fo rç a d o re s p o d e ria m se r re s p o n s á v e is p e lo
com portam ento do terapeuta, isto não garante que assim aconteça. N o entanto oproblem a é difícil de resolver.
Tendo em vista a possibilidade de abuso, parece im portante a m onitoria
do processo terapêutico por colegas e supervisores, usando recursos audio­
visuais. O bviam ente, tal m onitoria depende do consentim ento do cliente. Além
disto, ou tras m an eiras p recisam ser en co n trad as p ara g a ra n tir a p rática
terap êu tica: 1) bom treino clín ico , co n sciên cia e sensibilidade; 2) te r o
com portam ento exigido do cliente no seu próprio repertório; 3) ser um a pessoa
capaz de ser reforçada pela m elhora do cliente e não por outros reforçadores
contraterapêuticos. A supervisão da FAP (discutida a seguir) aplica os princípios
da FAP à relação de supervisão, e pode auxiliar a garantir a adequação dos
terapeutas à FAP.
SUPERVISÃO BA FAP
O supervisor da FAP prim eiram ente explica didaticam ente as regras da
FAP de um a forma semelhante à apresentada neste livro. Em seguida, o supervisor
auxilia a colocar em prática essas regras, exam inando as sessões terapêuticas e
oferecendo interpretações baseadas na FAP sobre a interação terapeuta-cliente.
A observação direta, através de um espelho unidirecional, é a m elhor form a de
um trabalho de supervisão, m as tam bém são utilizados recursos audio-visuais.
A eficácia da supervisão da FAP é increm entada, no entanto, se o CRB relevante
para a interação terapeuta-cliente pode ser trazido para a relação supervisorsupervisando.
P or exemplo, o segundo autor estava supervisionando um aluno de pósgraduação, cujo cliente tinha dificuldades em auto-conceito e em expressar
sentim entos, quando esta interação de supervisão aconteceu:
Supervisor: Eu estou contente por trabalhar com você. Eu penso que você é realmente
especial, e sinto uma familiaridade e tranqüilidade com você que é raro eu sentir
com uma pessoa que eu não conheço muito bem.
C apítulo 8
216
Supervisando: Eu estou c o n ten te tam b ém . Eu saí do n o sso ú ltim o e n co n tro se n tin d o a
re la çã o calo ro sa , e decidi que c o n tin u a ria a se n tir isso e n q u an to p u d e sse . Eu disse
às m in h a s am ig as que
é d esta m an eira que o cu rso d e p ó s-g ra d u a ç ã o d e v eria ser
(A lg u n s m eses d epois.)
S u p e rv iso r: Q ual a se m elh an ça e a d ifere n ça e n tre o n o sso p ro c e sso e o seu com o
c lie n te ?
Supervisando: Ela e eu somos ambas fechadas, e estamos trabalhando em estar inteiras
na sessão. As diferenças são que o meu relacionamento com ela é mais limitado,
eu tenho certeza por mims mas eu sinto que é limitado por ela. Eu tenho a tendência
a incorporar a maneira de agir de outras pessoas. Eu quero permanecer eu mesma,
mais constante. Com você, eu tenho sentimentos de intimidade e não sei o que
fazer com isto.
Supervisor: Eu sinto da mesma maneira. Eu não sei se nós temos que fazer alguma
coisa sobre o nosso sentimento de intimidade. Eu tenho uma tendência de me
envolver rapidamente e com intensidade em relacionamentos, por isso eu gostaria
de aguardar e sentir a intimidade entre nós, aproveitá-la, falar sobre ela, e observar
o que acontece.
Essas interações m ostram como o relacionam ento de supervisão pode
ser um m odelo do relacionam ento terapeuta-cliente; ou seja, não só a relação
su p e rv is a n d o -c lie n te é o fo co , m as e x is te p rio rid a d e ta m b é m p a ra o
relacionam ento entre supervisando e supervisor. A natureza educacional da
afiliação traz dimensões adicionais ao relacionamento, e um compartilhar mútuo
pode acontecer entre supervisor e supervisando, que geralmente não seria possível,
ou requerido, com o cliente.
U m a vez que a sessão terapêutica para esse cliente do terapeuta-estudante
geralm ente com eça com o cliente relatando como se sentiu e o que aconteceu
durante a semana, freqüentem ente com eçam os a sessão de supervisão falando
sobre o que sentimos naquele m om ento e as questões que pensam os e que
debatemos. Portanto, não é necessário dizer que os comportamentos clinicamente
relevantes do cliente e os princípios da FAP tom am -se os pontos principais da
discussão. As questões típicas do supervisor incluem:
l.C om o você está se sentindo com essa sessão de supervisão? Como
você se sente a respeito do feedback que eu dou pra você? O que você
quer a m ais de m im? O u a m enos? (Estas questões são comparáveis
às feitas pelo terapeuta ao cliente.)
Reflexões
217
2.Quando o seu cliente fala de coisas que você pensa que são irrelevantes,
quais tipos de causas m últiplas podem estar operando e que expressam
preocupações do cliente? D e que m odo você pode utilizar seus
sentimentos de raiva e aborrecim ento como estímulos discriminativos
para auxiliá-lo a ser um m elhor terapeuta?
3.Quais são seus sentim entos a m eu respeito? Quais são seus m edos e
expectativas sobre o nosso relacionam ento? (Essas são questões que
se com param às form uladas pelo terapeuta ao cliente.)
4.H á
algum as sem elhanças entre os assuntos do seu cliente e os seus?
5.Eu percebi que você não parece diferente quando seu cliente chora. O
que você sente quando ele está chorando? Quais são seus sentim entos
sobre o choro?
6.Eu gostaria que você fizesse um a lista sobre o que você sente ser
adequado querer no nosso relacionam ento, e o que você considera não
ser adequado querer. (E ssa p ro p o sta é sem elhante àquela que o
supervisando deveria dar ao seu cliente.)
Então, em supervisão, não som ente a FAP é ensinada didaticam ente,
m as p rin cip alm en te é en sin ad a ex p erien cialm en te. O relacionam ento na
supervisão é difícil e desafiador, em bora reforçador, para o terapeuta-estudante
que necessita desenvolver habilidades de intim idade, ser aberto, vulnerável,
honesto, consciente e presente. M esm o supondo que os tópicos podem algumas
vezes se sobrepor ao que é analisado em terapia pessoal, ela difere da supervisão,
pois nesta, o foco é o desenvolvim ento das habilidades clínicas do supervisando,
não existindo um foco específico para as questões pessoais do supervisando,
m as principalmente um a exploração de como estas questões pessoais têm impacto
no seu trabalho.
PESQUISA E AVALIAÇÃO
É bem conhecido o com prom etim ento dos behavioristas com a coleta de
dados. Então, a questão que podem os levantar é, “H á um resultado sistem ático
ou processo de coleta de dados no qual a FAP se baseia? Infelizm ente, até o
m om ento, não-há este tipo de dado. A FAP, no entanto, se baseia em inúm eros
dados e estudos de laboratório no que se refere a conceitos básicos como
reforçam ento, esquiva, controle de estím ulo e regras. Porém , nós am pliam os
218
Capítulo 8
estes conceitos para áreas que ultrapassam as condições do laboratório e a
FAP passou a ter a posição de um a hipótese.
M uitas sub-hipóteses específicas, implícitas na FAP, podem ser testadas
empiricamente. Por exemplo, existe a hipótese de que os resultados são melhores
se: 1) a terapia é estruturada para evocar comportamentos clinicamente relevantes
do cliente na sessão; 2) o terapeuta repara no com portam ento problem a e no
comportamento relacionado ao objetivo de seu cliente, à m edida em que ocorrem
durante a sessão; 3) o terapeuta tem em seu repertório o com portam ento final
desejado; 4) as reações do terapeuta m odelam e reforçam m elhora do cliente; e
5) o terapeuta oferece interpretações sobre o com portam ento do cliente que
in clu em estím u lo s d isc rim in a tiv o s, o co m p o rtam en to in te rp re ta d o e o
refo rçam en to . E ssas su b -h ip ó teses p odem ser avaliadas em p regando-se
estratégias convencionais de pesquisa, com pelo m enos dois grupos de sujeitos
escolhidos ao acaso, um dos quais recebe a FAP enquanto o outro não. As
variações destas estratégias tradicionais de pesquisa podem incluir grupos de
controle adicionais e avaliação e comparação dos grupos, fatores do sujeito e do
terapeuta, e tipos de problem as em tratam ento.
N o entanto, considero que questões práticas tom am quase impossível o
emprego de um a abordagem de pesquisa convencional. Por exemplo, a FAP é um
tratamento longo, que requer um treinamento intenso dos terapeutas. Assim, o tempo
e os recursos necessários para esse estudo são imensos. Como a FAP está em
seus estágios iniciais de desenvolvimento, o comprometimento de verbas para estes
estudos é ainda prematuro e sem justificação. Mesmo que estes obstáculos possam
ser transpostos, ainda há razão para questionar a necessidade deste tipo de estratégia
de pesquisa, para os nossos objetivos atuais. N a próxima seção, analisaremos as
falhas dos paradigmas de pesquisa convencional, e procuraremos sugerir métodos
alternativos para a coleta de dados que influenciem a prática clínica.
F a lh a s dos M odelos C o n vencionais de P e sq u isa
Examinando problemas ligados ao planejamento convencional de pesquisa,
nossa prim eira questão é, “Qual é o objetivo da pesquisa clínica?” D e um a
perspectiva funcional, estam os perguntando, “Quais são as contingências que
m antêm os pesquisadores em pregando um m étodo específico de pesquisa?”
Em bora as contingências sociais incluam solicitações para publicação, avanço
na carreira, aceitação por outros pesquisadores e agências financiadoras, a razão
Reflexões
219
principal pela qual os pesquisadores clínicos fazem pesquisas é para descobrir
e m elhorar m étodos de tratam ento que existem na prática clínica. D esta forma,
o clínico atuante é o consum idor da pesquisa clínica. O fato de este utilizar ou
não o produto da pesquisa fica sendo o reforçador final que supostamente mantém
as atividades do pesquisador.
O que supõe-se que aconteça e o que realm ente acontece não são a m esm a
coisa. De acordo com Barlow, um pesquisador clínico renom ado, “a pesquisa
clínica influencia pouco ou nada a prática clínica (1981, p. 147). Isso é verdadeiro
m esm o para os terapeutas com portam entais. Com o pode isso acontecer? Nos
últim os trinta anos, nossa disciplina tem tido o objetivo de integrar a ciência e a
prática, e m ilhares de dólares têm sido gastos com estas pesquisas. A raiz do
problem a, de acordo com Barlow, está na lim itação das estratégias de pesquisas
convencionais em pregando pesquisas de com paração entre grupos.
As exigências para fazer este tipo de pesquisa freqüentem ente excluem a
possibilidade do clínico utilizar os resultados obtidos. Por exemplo, as estatísticas
inferenciais, m arca da pesquisa convencional, têm sido problemáticas. Para obter
resultados de significância estatística, os pesquisadores têm que manter no mínimo
a variabilidade entre os sujeitos, através da seleção de grupos de sujeitos tão
semelhantes quanto possível. Isto significa que certas categorias de sujeitos são
excluídas, tais como 1) os muito jovens, 2) os muito velhos, 3) os homens (ou as
m ulheres), 4) os que estão ingerindo medicação, 5) aqueles que têm dificuldade
em falar o idiom a local, 6) os que têm problem as em ocionais além daqueles que
estão sendo estudados, ou 7) que tenham problem as de saúde graves.
Além disto, as análises estatísticas inferenciais exigem grande núm ero de
sujeitos. A ssim , os únicos problem as clínicos que são estudados são aqueles de
grande núm ero de pessoas. A pesquisa convencional é facilitada se um problema
objetivo e específico, como agorafobia ou disfunção sexual, é estudado quando
está disponível um a m edida confiável do resultado. Freqüentemente, os sujeitos
de pesquisa precisam concordar em esperar pelo tratam ento, coleta de dados,
entender e assinar um a form a com plexa de consentim ento inform ado, ser
atendidos por terapeutas-estudantes, se com prom eterem a concluir o tratamento,
lerem o idiom a local, não serem suicidas, e assim por diante. Como os clientes
atendidos na prática clínica não são selecionados, raram ente eles são os m esmos
da pesquisa convencional.
Conseqüentemente, os resultados obtidos podem não se aplicar a clientes
de consultório. N a prática clínica, os clientes freqüentemente apresentam inúmeras
220
Capítulo 8
queixas vagas e subjetivas Uma vez que os sujeitos de pesquisa tendem a ter
problemas objetivos e específicos, e as informações sobre os sujeitos individuais
não são disponíveis, o clínico pode não encontrar estudos sobre problemas
encontrados em sua prática. Em um a palavra, as estratégias de pesquisa
convencional produzem informações pouco relevantes para a prática clínica.
O utra crítica referente às estratégias de pesquisa convenciona! é que
elas não levam a inovações na teoria ou tratam ento (M ahrer, 1988). Assim,
um a outra razão pela qual os clínicos não utilizam na prática as descobertas da
pesquisa, é que elas contribuem pouco com novidades. Podem os, no entanto,
dar crédito às metodologias das pesquisas convencionais ao considerar que estão
envolvidas em auto-exame, colocando seus m étodos em questão (Barlow, 1981;
G reenberg & Pinsof, 1986; Rice & Greenberg, 1984). Porém , as alternativas
são p o u c o c la ra s. N a p ró x im a se ç ã o , lid a re m o s com esse p ro b le m a
fu n c io n a lm e n te , observ an d o o que in flu e n cia a p rá tic a , fazendo então
generalizações sobre os dados considerados.
M étodos A ltern ativ o s de C oleta de D ados que Influenciam a P rá tic a Clínica
Provavelmente a experiência clínica pessoal figura como primeiro item da
lista de todos os terapeutas ao considerarem as influências em seu repertório clínico.
Joseph Matarazzo, um pesquisador clínico proeminente, afirma que “mesmo depois
de quinze anos, pouco da minha pesquisa afeta a minha prática. A ciência psicológica
p e r se não me orienta em nada. Eu continuo a ler avidamente, mas é de pouca ajuda
prática. M inha experiência clínica é a única coisa que m e ajudou na minha
prática, até hoje” (itálico adicionado) (citado em Bergin & Strupp, 1972, p. 340).
M uitos fatores contribuem para a forte influência da experiência pessoal.
O m ais im portante é que o clínico é exposto a um conjunto de dados brutos, ou
seja, tudo o que foi dito, o tom de voz do cliente, sua expressão facial, postura,
caretas, atividade m otora, bem com o às condições externas, como tem po, crise
internacional, epidem ia de gripe e assim por diante. Para serem reais, os dados
brutos estão sujeitos a viéses (com portam entos de ver e lembrar) do clínico,
m as n o ssa im p ressão é a de que os c lín ico s lem b ram u m a q u antidade
surpreendente de informações detalhadas do período da terapia do cliente. Talvez
esta grande quantidade de inform ações seja retida, porque o envolvim ento do
clínico no processo é com parável ao lem brar em detalhes dos acontecim entos
existentes no decorrer de nossas vidas.
Reflexões
221
Não im porta a quantidade que um clínico vê e lembra, pessoalm ente, sobre a
terapia de um indivíduo, ela excede largamente os dados existentes em escalas,
avaliações, resultados de testes, e descrições fornecidas em relatórios de pesquisas
convencionais, m esm o os m ais m inuciosos. Essas num erosas observações têm
vantagens importantes.
Prim eiro, ela sensibiliza o terapeuta para tendências e classificações de
grande núm ero de variáveis, as quais em contrapartida facilitam o acesso a
mudanças. P or exem plo, a risada autêntica de um cliente durante a sessão de
terapia pode ser um indicador de um a m udança significativa observada pelo
terap eu ta, m esm o pensan d o -se que a au sên cia de risada não foi objeto,
anteriorm ente, de sua atenção. De fato, no decorrer da terapia, o terapeuta coleta
dados de linha de base sobre um grande número de variáveis, permitindo detectar
mudanças significastes. Essas mudanças seriam perdidas em estudos de pesquisa
convencional, porque os dados são coletados para um núm ero lim itado de
variáveis pré-selecionadas.
Segundo, há abundância de inform ações sobre a história do cliente, as
suas interações no cotidiano, e outras características que são baseadas na
entrevista inicial e na relação terapêutica em curso. A m edida que o terapeuta,
obtém experiência com m ais clientes, novos clientes podem ser comparados em
profu n d id ad e com os anteriores. A lém disso, é útil a form a com o essas
com parações são feitas, avaliadas e m odeladas no decorrer do tempo.
Terceiro, há um grande conjunto de inform ações a respeito de como
aplicar a própria intervenção, um a vez que o terapeuta já fez isso, e a observou
em primeira mão. Os efeitos das intervenções são interpretados dentro do contexto
da terapia, incluindo as características do cliente, a natureza da relação terapêutica
até a q u e le p o n to , a b a se das c la s s ific a ç õ e s e te n d ê n c ia s p a ra vário s
com portam entos do cliente, e a história de intervenções prévias com o cliente.
Quarto, são feitas descobertas. Por estar envolvido naquilo que acontece
de m om ento a m om ento, no decorrer da terapia, o terapeuta observa os efeitos
de inúm eras intervenções, intencionais ou acidentais, podendo assim fazer
descobertas.
Q uinto, am eaças à validade interna são consideradas. Validade interna
se refere à exclusão das hipóteses alternativas de porque um a intervenção
funciona. P or exem plo, se o terapeuta oferece um a interpretação e o cliente
m elh o ra n as sem anas seg u in tes, a questão d a v alidade interna trata da
p o ss ib ilid a d e de que o u tro s fato res se ja m re sp o n sá v e is p e la m elh o ra.
222
Capítulo 8
Experim entos, através de grupos de controle, são a m aneira mais fácil de excluir
as am eaças à validade interna, m as, como foi discutido anteriorm ente, falta
relevância a eles (validade externa). N ão estam os sugerindo que os terapeutas
digam a si m esm os, “eu agora vou avaliar sistem aticam ente a validade intem a
da m inha interpretação, decidindo pela eliminação das hipóteses contrárias” .
M as, dependendo do treino e da base, o terapeuta pode considerar outros fatores
que podem ter produzido o efeito. Esses fatores podem incluir o que está
acontecendo na vida do cliente no momento, (p.ex., o cliente finalmente encontroa
trabalho) e o efeito atrasado de intervenções anteriores. O terapeuta poderá
basear-se na fidedignidade da informação disponível e talvez perguntar ao cliente
sua opinião de porque ocorreu a m udança. Juntando todas essas inform ações, o
terapeuta decide, com vários graus de confiança subjetiva, se a interpretação e/
o u outros fatores causaram a m elhora.
Certamente, o problema do viés pessoal pode influenciar o processo.
M uitos terapeutas levariam esses viéses em consideração. Para o bem ou para o
mal, o terapeuta confia nas suas próprias observações, e o problema evidentemente
não é a falsificação de dados. Cada terapeuta leva em consideração a ameaça à
validade interna, em um nível que satisfaz o critério particular de cada um. De
qualquer modo, esse critério pessoal não é nem mais nem menos rigoroso quando
aplicado para avaliar a apresentação de dados de outros (incluindo os estudos da
pesquisa convencional). Todos esses fatores, acreditamos, contribuem paia o
poder da experiência pessoal de influenciar a prática clínica.
A idéia de que a validade interna pode ser avaliada sem fazer um
experimento foi discutida por Kazdin (1981), em um trabalho sobre metodologia
do estudo de caso. D e acordo com K azdin, o estudo de caso “teve um trem endo
im pacto na psicoterapia” (p. 184). Assim , estudos de caso atingiram o objetivo
de pesquisa clínica. Entre os casos históricos influentes tem os o do pequeno
H ans, A nna O ., e pequeno A lbert. B asean d o-nos no estudo de K azdin,
identificam os um a série de dimensões que caracterizam a influência nos estudos
de casos. Essas dim ensões têm m uito em com um com as características que
tom am um a experiência pessoal passível de influenciar:
1. Ocasiões de diagnóstico. Quanto m aior o núm ero de ocasiões de
avaliações, m ais fácil se tom a construir um a inferência válida (a experiência
pessoal é com posta de um gigantesco núm ero destas ocasiões).
2. Projeções passadas e futu ra s. O diagnóstico continuado perm ite a
avaliação de tendências e freqüências básicas, as quais por sua vez perm item
Reflexões
223
projetar o que acontecerá no futuro sem a intervenção. Esta intervenção se
m ostra eficaz à m edida que o com portam ento se desvia das projeções futuras.
E ssas pro jeçõ es futuras tam bém po d em ser b aseadas em descrições dos
problemas do cliente, sua história e vida diária. Por exemplo, o relatório completo
da história de relacionam ento de um cliente, que consistentem ente detalha
características de um transtorno de personalidade grave borderline levaria a
projetar que esses padrões persistirão no futuro. Se esse padrão existente m uda
depois da intervenção, aumenta a confiança de que a intervenção foi responsável
pela m elhora.
3 .0 tam anho e a im ediaticidade do efeito. Q uanto m ais am plo e
imediato for o efeito, mais fácil atribuir esse efeito a um a intervenção específica.
A observação constante, a sensibilidade à freqüência básica e à m udança que
a experiência pessoal prom ove, conduzirão à detecção de efeitos m aiores e
imediatos.
4 .0 tipo de dado. Quanto m ais próxim o o dado estiver da observação
bruta, m ais ele influencia a audiência. Freqüentem ente, tais descrições são
transcritas ou parte do m aterial original é incluído nos estudos de caso. Eles são
próxim os dos dados brutos obtidos na experiência pessoal.
5.D escrições do cliente. A lém das projeções futuras ressaltadas, as
informações detalhadas sobre o cliente permitem aos clínicos comparar os estudos
de casos dos sujeitos com aqueles dos clientes que eles conhecem. D esta forma,
pode ser avaliada a relevância bem com o a credibilidade de um estudo de caso.
ó.D escrição da intervenção e contexto. Os estudos de casos têm m ais
influência quando eles incluem descrições do que foi feito, os efeitos das
intervenções anteriores, as condições que levam ao tempo exato da intervenção
e a troca nas interações que a intervenção produziu.
7.Novidade. D esnecessário dizer que os casos são m ais im portantes
quando eles têm algo novo a apresentar.
8.Avaliação das am eaças à validade interna. E ssa avaliação pode ser
conseguida de várias m aneiras. A reputação do autor pode ser im portante. Por
exem plo, se um autor é conhecido pelo seu pensam ento crítico, abertura e
consciência sobre viéses de interpretação, e sensibilidade às questões de validade
interna, o caso tem m ais influência. Os detalhes do caso, incluindo a atenção
concedida a um a hipótese discordante, são outras m aneiras de considerar a
validade intem a.
224
C apítulo 8
A observação local intensa proposta por Cronbach (1915). foi sugerida
por Barlow (1981) como uma alternativa às estratégias da pesquisa convencional.
Esse método tem pontos em comum com a experiência pessoal e com os estudos
de caso influentes. Sobre a observação local intensa, Cronbach diz:
Um observador que coleta dados em uma situação específica está na
posição de avaliar a prática ou as propostas naquele local, observando
os efeitos no contexto. Na tentativa de descrever e relacionar com o que
aconteceu, ele dará atenção a quaisquer variáveis que foram controladas.
Mas ele dará atenção igual a condições não controladas, às características
pessoais e aos eventos que ocorreram durante o tratamento e as
mensurações. Na medida em que ele passa de uma situação para outra,
sua primeira tarefa é descrever e interpretar o efeito novo em cada local,
talvez levando em consideração fatores únicos daquele local... Conforme
os resultados acumulam, a pessoa que procura o entendimento não
medirá esforços para investigar como os fatores não controláveis
poderiam ter causado as ramificações locais a partir do efeito modal.
Isto é, a generalização ocorre tardiamente, e a exceção é considerada
com tanta seriedade quanto a regra (p. 124-125).
Voltando agora para a coleta de dados da FAP, o objetivo da pesquisa
neste m omento seria influenciar a prática clínica. Nosso sistem a terapêutico
precisa ser m ais desenvolvido para que orientações adicionais sejam fornecidas
ao terapeuta de m odo que ele possa detectar e reforçar adequadam ente os CRBs.
A ssim , necessitaríam os de dados cujas características com petissem com a
experiência pessoal, como aqueles encontrados em estudos de casos relevantes
e na observação local intensa. Estes dados deveriam conter descrições do que
realm ente acontece na interação terapêutica e o m aior núm ero possível de
informações contextuais. A apresentação de m aterial transcrito é m uito próxima
do dado bruto e dá ao consum idor a sensação do que realm ente aconteceu,
assim como esclarece se as conclusões do pesquisador são razoáveis. O emprego
de recursos audiovisuais durante o tratam ento facilita bastante esse processo.
N este livro, fizemos pequenas tentativas nessa direção, apresentando o
material transcrito para ilustrar procedimentos ou fenômenos. U m a apresentação
com pleta deveria incluir m aterial transcrito que: 1) fosse um a am ostragem de
todo o tratam ento avaliando as m udanças no decorrer do tem po: 2) fornecesse
as bases para os resultados da avaliação; 3) se interessasse pela avaliação da
validade interna. Atualm ente, estão sendo realizados estudos deste tipo.
Reflexões
225
PROBLEMAS C U L T U R A IS DECORRENTES DA
P E R D A DE COMUNICAÇÃO
O tem a central da FAP é a im portância da com unicação. Quanto m ais
o cliente estiver em contato com os estímulos existentes na relação terapêutica
que envocam CRBs, m ais m elhoras ele apresentará. U m a falta de com unicação
ocorre devido à esquiva dos aversivos. A ssim , há um aum ento inicial da
aversividade quando a comunicação ocorre, mas ao longo do tempo, ela é reduzida
pelo aum ento de reforçam ento positivo.
O tem a do aum ento de comunicação tem ficado lim itado à psicoterapia.
Contudo, apsicoterapia é um traço cultural ocidental, disponível principalm ente
para aqueles que têm a sorte suficiente de não precisar lutar para conseguir
satisfazer necessidades básicas de alimento e abrigo. Quando sentamos em nossos
consultórios fazendo a FAP, parece que sim plesm ente ajudar pessoas a conduzir
suas vidas de m aneira m ais feliz e produtiva não é suficiente em um m undo que
deve enfrentar a pobreza, o crime, a fome, o consum o de drogas, a poluição, a
devastação am biental, a dim inuição da cam ada de ozônio e a possibilidade de
destruição nuclear. É um tem po no qual ambos, terapeuta e cliente, precisam
dedicar m ais esforços p ara buscar m aneiras de lidar com estes problem as
im portantes. Talvez, um a psicoterapia com um a visão social possa estender o
tem a da com unicação para além das questões interpessoais, e focalizar com o a
esquiva de contingências que estão operando mais profunda e obscuram ente na
cultura afeta os problem as sociais.
N um program a de televisão sobre a vida espiritual n a índia, o americano
que o narrava estava em um a rua, num a cidade sagrada, no meio de um a multidão
de pessoas que tinham claram ente pouca riqueza m aterial. Ele afirm ou que os
ocidentais que olhassem para as pessoas dessa cultura as considerariam atrasadas
e anacrônicas. Ele, então, filosofou que talvez fôssem os nós, do O cidente, os
atrasados, porque perdem os o contato com as coisas m ais profundas em nós.
C oncordam os que nós, da cultura ocidental, perdem os contato m as não
com o que é m ais profundo em nós mesm os. Perdem os contato com aquilo que
está fora de nós. Essa perda de com unicação contribuiu diretam ente para os
grandes problem as que foram enum erados acima. A lém do m ais, nós pensam os
que alguns estilos de vida orientados para aspectos m enos m aterialistas e m ais
espirituais podem aum entar a comunicação e talvez, conduzir a algumas soluções
p ara nossos problem as m undiais.
226
Capítulo 8
Para ilustrar nossos pensam entos sobre estes tópicos, gostaríam os de
ex am in ar o hábito o cid en tal de co m er carne. M as, antes de fazer isso,
necessitam os salientar que a simples m enção deste tópico pode evocar reações
negativas em alguns de nossos leitores. Para algumas pessoas, essa reação
negativa pode resultar em um a inclinação para esquivar ou francam ente evitar
nossa discussão. N ossa escolha de com er a carne de anim ais m ortos, como um
tópico de discussão, pode ilustrar experiencialm ente para alguns leitores o
conceito de esquiva de com unicação. Salientamos que não estamos defendendo
uma posição a favor ou contra com er carne. Estam os sim plesm ente discutindo o
tópico p ara dem onstrar como a nossa sociedade ajuda seus cidadãos a evitar a
com unicação de uma m aneira que pode resultar em nosso próprio prejuízo.
Quando pedimos um hamburguer, ele é servido em um a caixa de plástico
e nós o pagam os com dinheiro. Ele tem um sabor agradável, e somos reforçados
p o r com prá-lo e com ê-lo. N o entan to , n ós p erdem os o contato com as
contingências m ais profundas e secretas. N ossa cultura nos ensinou a evitar o
fato de que o ham burguer provém da carcaça de um animal que um dia viveu. E
compreensível porque isso acontece. A divisão de trabalho é eficiente, prática, e
to m a a nossa vida m ais agradável. Seria im possível para um hom em , por
exem plo, criar os bois que com e, construir os w alkm an Sony que deseja, e
extrair, quando necessário, sua vesícula biliar.
No entanto, se estivéssemos m ais em comunicação com todo o processo,
desde o nascimento do animal até a visão das condições horríveis nas quais vive
e m orre, talvez não com êssem os carne. A lternativam ente, dem oraria um tempo
p aia term os a certeza de que o anim al a ser comido teve um a vida livre de
m iséria e doença, e foi abatido em condições humanas.
N o livro constrangedor, D ie tfo r a N ew Am erica, Robbins (1987) explo­
ra os efeitos menos óbvios e m ais tardios do alto consumo de carne. Para m encio­
nar alguns, o consum o de carne tem sido ligado a problem as circulatórios e
cardíacos. Além disso, a quantidade de grãos utilizada para produzir uma refeição
de cam e poderia ser usada para seivir dez refeições. A energia e a água utilizadas
na produção de cam e estão onerando nossos recursos naturais, e contribuindo
para a poluição. Florestas úm idas são cortadas, transform ando-se em terra ade­
quada para o gado, com efeitos prejudiciais ao ambiente. Assim, reduzir o consu­
m o de cam e melhoraria nossa saúde, dim inuiria a fome mundial, e m elhoraria o
am biente global. Essas contingências m ais tardias, entretanto, são quase im pos­
síveis de serem contatadas diretamente e, por isso, não têm forte efeito emocional
na m aioria das pessoas. Todavia, esses fatores poderiam ter um papel reforçador
Reflexões
227
ampliado, se houvesse m ais contato com o processo de produção de carne. A
experiência direta com a alim entação dos anim ais poderia, põr exem plo, dar
m ais sentido ao argumento referente à quantidade excessiva de grãos utilizados.
O fator im portante de nossa ilustração é que a nossa cultura nos isola
do processo de produção de cam e e, por conseguinte, retira o poder benéfico
que estas contingências poderiam ter. D a m esm am aneira, nós somos afastados
de outras contingências profundas. Por exemplo, nós estamos resguardados
dos sem -teto, dos fam intos, dos idosos em seus asilos, das pessoas m orrendo,
do tratam ento de água potável, do corte dàs árvores para fazer papel, e dos
depósitos de lixo e esgoto. U m m elhor contato com estes processos, em bora
inicialmente aversivo, poderia tam bém m elhorar nossas vidas e trazer benefícios
a longo prazo para o planeta. A única m aneira de saber se os benefícios potenciais
valeriam os custos é aum entar de algum m odo o contato, e descobrir o que
acontece.
A lgum as características de um a vida não m aterialista e espiritual
parecem estar relacionadas com a nossa análise. Definiremos superficialm ente
este estilo de vida como aquele no qual a riqueza não é acumulada, os objetos
possuídos são som ente de n ecessid ad e básica, e o alim ento e as roupas
necessárias são feitos, na m edida do possível, por nós mesmos. U m aspecto
im portante deste estilo de vida é a utilização m ínim a do dinheiro. Como Skinner
(1986) descreveu, o dinheiro é um a fonte indireta e m aléfica de separar as
pessoas das conseqüências do que elas fazem. O dinheiro tom a-se rèforçador
som ente quando é trocado p o r bens e serviços, e assim “está sempre um passo
distante do tipo de conseqüências reforçadoras às quais a espécie originalm ente
tom ou-se suscetível” (p. 569).
O utra característica deste estilo de vida não m aterialista é a ausência
de artifícios para poupar trabalho. E stes artifícios transform aram a sociedade
ocidental em um a apertadora de teclas. N ós apertam os um a tecla para lavar
nossas roupas, para cham ar alguém ao telefone, ou para esquentar um a xícara
de água. Estas teclas nos livram da aversividade provocada pelo trabalho que
estas atividades requerem , m as nos isolam das contingências profundas. Assim,
o estilo de vida não materialista, juntam ente com o uso mínimo de dinheiro e de
artifícios para poupar trabalho, certam ente ajudariam üm a pessoa a ter contato
-com a produção de alim ento, o processam ento do lixo, o consumo de energia, e
assim por diante.
A m editação e a reza são tam bém encontradas nesse estilo d e ;vida.
Em bora essas atividades possam ser vistas com o um olhar para dentro de nós
228
Capítulo 8
m esm os, nós sugerimos que de algum a form a elas podem aum entar o contato
com contingências externas e ocultas. Por exemplo, o ato de meditar é inconsis­
tente com muitas das regras-padrão da sociedade que nos separam das contin­
g ên cias ocultas. A m editação é contra tais reg ras com o “ sem pre trabalhe
bastante”, “tenha sucesso”, “junte bastante dinheiro”, e “não perca tem po”. Essa
atividade pode ser concebida como a prática da rejeição das regras. As regras
são construídas na sociedade ocidental para perm itir aprendizagem através da
experiência dos outros. N osso sistem a educacional é baseado na disseminação
das regras. No entanto, como Skinner salientou, um dos motivos de tanto do nosso
comportamento ser governado por regras, é que muito do que fazemos foi porque
assim nos disseram. Os reforçadores ocultos podem estar m enos disponíveis.
D esta forma, o m editador quebra o controle das regras que poderiam colocá-lo
num a posição de ter contato com outros reforçadores. A m editação tam bém
poderia perm itir o destaque dos processos corporais, com o digestão e funções
circulatórias e cardíacas, as quais por seu lado colocariam o meditador em melhor
contato com as contingências externas que afetam essas funções.
N essa discussão breve, destacam os como pode ser benéfico aumentar
o contato com contingências ocultas. É im portante notar que o comportamento
de aum entar a com unicação conduz não só a um a m aior percepção da dor e
sofrim ento do mundo, m as tam bém há um aum ento da percepção do que é
seleto e sublime. N ós concordam os com o ponto de vista de Skinner (1986) que
a falta de contato com variáveis controladoras causa “enfado, indiferença, ou
depressão” (p. 568) nas pessoas de nossa cultura. N ão estam os sugerindo, de
form a algum a, que todos precisam retom ar a um a vida simples e espiritual.
M as, talvez, algum a variação em nosso atual estilo de vida que aum entasse a
com unicação, não som ente nos ajudaria a ser m elhores psicoterapeutas, mas
tam bém poderia enriquecer a nossa vida com o um todo e nos conduzir à
exploração de soluções para m uitos problem as globais.
CO NCLUSÃO
Este livro é a nossa interpretação do processo psicoterapêutico. Foi
baseado no behaviorism o radical e no nosso com portam ento que tem sido
m odelado por contingências fornecidas pelos nossos clientes. D a m esm a form a
que outras interpretações, seu valor será m edido pela sua utilidade. Se este
livro produzir apenas um a intensa e significativa relação terapeuta-cliente, que
de outra form a não ocorreria, então, para nós ele terá sido válido.
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Ahola, T., 5
Causas m últiplas, 63-64
Alexander, F., 191.192
Cognição, 111-113
Aliança terapêutica, 196-199
estruturas, 125-126
American Psychological Association (APA),
ver tam bém re la çã o p e n sa m e n to -c o m p o rta m e n to
210
Amnésia, 91
Análise experimental do comportamento, 8,
9,11
Com portam ento clinicamente relevante, 1516, 19-20
Comportamento operante, 19, 77, 87
Análise funcional, 6, 17, 62
Comportamento respondente, 19, 76-77, 87,
90
Assertividade, 22, 28, 86, 115
Comportamento verbal, significado de, 63
Associação livre, 31, 176-182
Confiança, 22-23, 31-32
Avaliação inicial, 26
Contato, 7, 41, 43
Análise formal, 62
e problem as culturais, 225-228
durante a terapia, 85-88
Barlow, D .H , 219, 220, 224
Beck, A .I., 108, 109, 112, 127, 134
Contextualismo, 4
Behaviorismo convencional m etodológico, 2
Contingência, ver Reforçamento
Behaviorismo metodológico, 2
Controle de estimulo, 141,
ver
Behaviorismo radical, 1, 2, 3-8
também Sd
Beídel, B., 110
CRB1, 18-19
Bergin, A.S., 220
CRB2. 19-22
Brandsma, J.M ., 109
CRB3, 23 202
Cronbach, L.J.. 224
Cultura Ocidental, 226
Cashdan, S., 199, 200-201
Catania. A.C., 90. 155
235
236
I nd i c e
Day. \\ .1-' "
Greben. S
Deci. E L . 1-1
Greenacre. P . 194
Deikman, A.J
138.154. 155
Divcn. K . 190
1. 31
Greenberg. L.S . 220
Greenberg. R L , 112
Dobes. RAV . 16
Greenson, R R.. 193
Dor de cabeça, 98
Greenwald, A .E . 138
Dore. J . 145
Guidano, V.F., 108, 112, 113
DSM-111-R. 2, 34
Hawkins, R .P, 16
Eagle. M N , 198
Hayes, S.C., 4, 8, 27, 41, 81, 123, 152
Eardley. D , 111
Himadi. W , 204
Efran, J.S., 3, 5
Hipnose, 31, 168-169
EIlis. A.. 108-117
Hoffman,
Eniery, C , 108, 112
Hollon, S D , 108, 111. 113. 126
LZ , 193
Erikson, E., 138
Self
Esquecer, 91
Identidade, ver
Estimulação suplementar, 63-64
Inconsciente, 10, 114. 125
Estímulo discriminativo (Sd), 19, 43-44, 5759
Estímulos aversivos, 36-37, 84-85, 98-101
Ética, 209-215
definição comportámental, 209-211
significado, 51-54, 63-64, 65
Interpretação. 41-42
e sentimentos, 93
c relação pcnsam cnto-com portam cnto,
132, 136
Exercícios de imaginação, 31
Intimidade, 11, 31, 35, 82, 157
Experiência, um relato comportamental da,
139-141
Intraverbal, 57-58,'61-62
Fasnacht, G.. 14
Jacobson, N.S , 125. 126, 128
Ferster, C.B., 12, 33, 36, 42
French, T M ., 191, 192
Kazdin, A .E ., 8, 222
Freud, S., 189, 194, 195
Keane, T„ 204
Função discriminativa, 19-20
Kemberg, O., 199
Função eliciadora, 19-20
Kieth-Spiegel, P., 209, 210
Função reforçadora 19-20
Klein, D,F., 109
Funções de estimulo, 19
Furman, B , 5
Klein. M.. 199
Kohlenberg. R J., 8. 168
Kohut, 1I„ 162, 199
Generalização, 17, 189
Gill, M.M., 193
Goldfried, M R., 202-203
Koocher, G P., 209, 210
Krantz, S .E ., 110
Kriss. M.R., 108, 111, 113, 126
índ ice
Längs, R
237
IVO. 192. 194
Lembrança. 4. 5. 2 1 0 2 . 89-92
Punição ver Estímulos aversivos
Pulnam. FW... 166. 170. 172. 173
L e\ine F M . 14
Lições dc casa. 31
Q u a ítro n c . G A . ÍÍO
Linehan. M M . 164
Liotti. C ; 108. 112. 113
Racismo. 212
Lukens. M D . 3
Reese, E. P., 8
Lukens. R J . 3
Reforçamento, 9-11. 40-41.114
Lutzker. J.R . 8
arbitrário e natural. 11-1.5. 32-40
e estruturas cognitivas, 125-126
Mahler, M ., 199
Mährer, A R , 220
M ando, 57-59, 61, 1 15-122
disfarçado, 62-63
Regras, 122-124
■ exemplos de, 181
e psicanálise, 194
Relação funcional, 6, 43-45
Martin, J.A., 8
Relação pensamento-comportamento. 107-122
M arziaü. E A,. 29
Relação terapêutica. 30-31, 212-214, 216
M asson. J M.. 213. 214
Repressão, ver Lembrança.
Masteson, J.F., 138
Respostas sutis, 66
Matarazzo, J,, 220
M entalismo, 5
R evelar-se a si m esm o, v e r Sentim entos,
Terapeuta
Messer, S.B , 42, 208
Rice. L.N.. 220
Metáforas, 56, 64
R o b b i n s . 226
Miller, A, K.. 162
Rogers, C.R., 35. 187
Rush, A , 108
Paolino, T.J., Jr., 188, 196, 197
Russell, P.L., 109
Passividade, do terapeuta, 31, 174-176
Peck, M.S., 3, 31, 36
Safran, J.D.. 11.2
Pensam ento,
Salovey, P., 108
definição de, 116
Scott, R., 204
Perspectiva, 153
Sd (estimulo discriminativo), 19,42-43. 58-59
Pesquisa,
Segai, Z.V., 112
falhas da 217-220
Seleção de respostas, 64
m étodos alternativos, 218-224
Self,
descoberta e, 220. 221
Pinsoff, W.M.,
220
Psicanálise. 42, 53, 66
e FAP, 188-202, 205-208
relato dc comportam ento dc 140-152
definições de, 138-139
observação. 32, 65
problem as de. 156-172
Sensibilidade, 51
238
Sensibilidade a críticas, 99-100,160-161,162
Sentim entos,
esquiva de 84-85, 93, 101
definição, 75
expressão, 71, 82-83
importância na terapia, 85-88, 94-95
aprendendo sobre, 78-80, 169-171
sua expressão por parte do terapeuta, 34,
38, 72, 96, 105-106
o que é sentido, 76
Sexismo, 212
Shaw. B„ 108
Sliaw, B R, 112
Significado do comportamento verbal, 63
Silvemian, J,, 111
Silvemian, J.D., 111
Sizemore, C.C., 172, 173
Skinner, B,F„ 1, 2, 3, 5, 7, 8, 27, 51, 53, 54,
55, 57, 59, 62, 64, 75, 76, 1‘16, 118, 123,
124, 139. 143, 144, 147, 161, 209, 227,
228
Sr (reforçador), 43-44
Sterba, R .F , 197
Stone, M.H., 194
Strupp, II.. 194, 220
Supervisão, 215-216
Sweet, A.A., 203
Tato, 56-61, 78, 115-122, 142-143
Terapia cognitiva, 108-113
Terapia Comportamental,
e FAP, 202-205
Transferência. 30, 189-195
índice
Transtorno de personalidade Borderline , 163166
Transtorno de personalidade m últipla, 166173
Transtorno de personalidade narcisista, 162
Trauma
e MPD, 166-173
e lembrança, 91
Treino de habilidades sociais, 86
Truax, C.B., 35
Tsai, M „ 8
Turk, D., 108
Tumer, S., 110
Unidades funcionais,
tamanho 143-145
do comportamento verbal, 143-144
Validação, 221
Vallis, T .M , 112
Variáveis de controle, 5
Vulnerabilidade. 84
Wachtel, P L „ 33
W aterhouse. G., 194
Wessells, M.G., 126
W innicott, D .W., 138
Woolfblk, R L , 42
Zettle, R.D., 27, 41, 91, 123
Zuiiff; G„ 210
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