ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DA ILHA DE SÃO LUÍS VARA DE INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS AÇÃO CIVIL PÚBLICA 0804192-28.2016.8.10.0001 AUTOR MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO PROMOTOR DE JUSTIÇA Ronald Pereira dos Santos RÉU MUNICÍPIO DE SÃO LUIS PROCURADOR Julio César de Jesus SENTENÇA 1. RELATÓRIO Trata-se de Ação Civil Pública com pedido de tutela antecipada proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO em desfavor de MUNICÍPIO DE SÃO LUIS com a finalidade de garantir o fornecimento dos medicamentos: XILOCAÍNA GEL A 2% OU KY GEL; AMITRIPICILINA; BACLOFENO 10MG; OXIBUTININA 5MG; MINILAX; do MATERIAL DE USO CONTINUO: SONDAS URETRAIS; SONDA URETRAL; ÁGUA BORICADA; LUVAS; GASES; SACOS COLETORES; e da DIETA ENTERAL LÍQUIDA, além de outros medicamentos e insumos, ora não especificados, tudo de acordo com as necessidades de cada paciente. Narra o órgão ministerial em sua petição inicial que: “Em 12 de agosto de 2015, foi instaurado na 14ª Promotoria de Justiça Especializada na Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência o Inquérito Civil nº 019731-500/2015, versando sobre a omissão da Secretaria Municipal de Saúde quanto ao fornecimento de medicamentos (XYLOCAÍNA, AMITRIPTILINA 25MG, BACLOFENO 10MG, OXIBUTININA 5MG, MINILAX, para manejo do intestino neurogênico); materiais de uso contínuo (SONDAS URETRAIS 12, PACOTE DE GASES, TUBOS DE XILOCAÍNA GEL 2% OU KY GEL, DISPOSITIVO URINÁRIO EXTERNO) ao Sr. FRANCISCO DAS CHAGAS BRAGA, pessoa com paraplegia traumática completa, conforme demonstram os autos anexos. O presente procedimento foi iniciado com o recebimento do Ofício nº 55/2015 AMPEM/ Gbp, datado de 12 de agosto de 2015, informando que o Senhor FRANCISCO DAS CHAGAS havia comparecido à SEMUS para efetuar cadastro em programa para obtenção de medicamentos. Entretanto, a SEMUS informou que o programa não estava estruturado para o fornecimento de tais materiais e medicamentos e que não tinha previsão de entrega, fls. 06). No dia 14 de outubro de 2015, representantes do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência e do Fórum da Pessoa com Deficiência, dentre estes o Sr. CARLIVAN CONCEIÇÃO FERREIRA NETO, relataram que várias pessoas, inclusive os próprios representantes do movimento social, estavam sem receber os medicamentos e os materiais médico-hospitalares de uso contínuo dos quais 1 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DA ILHA DE SÃO LUÍS VARA DE INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS necessitavam; e que até o KIT DE CATETERISMO VESICAL entregues estavam incompletos, trazendo sofrimento e danos irreparáveis à saúde de todos, conforme demonstra Ata de Reunião, data de 14 de outubro de 2015, fls. 33. Em 09 de dezembro de 2015, o Senhor KENESON KLAY GONÇALVES MACHADO compareceu à 14ª Promotoria de Justiça Especializada na Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência para informar que embora tenha solicitado, em 19/10/2015, DIETA ENTERAL LÍQUIDA para sua tia MARIA DO CARMO GONÇALVES, pessoa com deficiência e hipossuficiente, até a presente data não havia perspectiva de recebimento. A injustificável demora nos três casos aqui relatados motivou a instauração do Inquérito Civil nº 019731-500/2015 por esta Promotoria de Justiça Especializada, que pretende a tutela de direitos difusos e coletivos de todas as pessoas que demandaram ou vierem a demandar medicamentos e outros insumos médicohospitalares junto à Secerataria Municipal de Saúde de São Luís, sendo os casos concretos relacionados apenas elementos instrutórios a demonstrar cabalmente a omissão do gestor municipal e a inteira procedência da pretensão ministerial. Ante essa informações, a 14ª Promotoria de Justiça expediu vários expedientes endereçados à SEMUS requerendo informações; porém, essa Secretaria Municipipal, relativamente aos casos de CARLIVAN CONCEIÇÃO FERREIRA NETO e MARIA DO CARMO GONÇALVES, que pleiteiam MEDICAMENTOS e MATERIAIS DE USO CONTÍNUO e ALIMENTAÇÃO ENTERAL respectivamente, quedou-se inerte. No que pertine ao caso de FRANCISCO DA CHAGAS, a SEMUS limitou-se a informar que o fornecimento das medicações OXIBUTININA 5MG, BACLOFENO 10MG E MINILAX não eram de sua responsabilidade, sem indicar a esta Promotoria de Justiça Especializada ou aos representantes do paciente qual órgão deveriam buscar para pleitear a garantia de tão importante direito fundamental, qual seja o direito á saúde, o que, de fato, embaraçou a aquisição dos fármacos pretendidos. Frise-se, por oportuno, que, uma vez demandada, a FARMÁCIA ESTADUAL DE MEDICAMENTOS ESPECIALIZADOS – FEME, informou que os referidos medicamentos não eram fornecidos pelo Estado do Maranhão, conforme consta no Ofício nº 28/2016 - AMPEM/Gb.P., datado de 11 de fevereiro de 2016.” Ao final, arrimado no contexto fático acima exposto, o autor requer a procedência dos pedidos formulados na ação, constituindo-se estes nos seguintes pleitos: “1. seja deferida, “inaudita altera pars”, a MEDIDA LIMINAR requerida na presente ação, obrigando o Município de São Luís a adquirir e a entregar, no prazo de 15 (quinze) dias, a medicação XILOCAÍNA, AMITRIPTILINA 25MG, OXIBUTININA 5MG, BACLOFENO 10MG E MINILAX (sorbitol 70% e laurilsulfato de sódio); material de uso contínuo (KIT DE CATETERISMO VESICAL COMPLETO) e DIETA ENTERAL LÍQUIDA aos Senhores FRANCISCO DAS CHAGAS BRAGA, PAULO ROBERTO BARBOSA MELO, CARLIVAN CONCEIÇÃO FERREIRA NETO, WERBET BARBOSA SOUSA, MARIA DO CARMO GONÇALVES e a todos os requerentes atualmente inscritos junto à Secretaria Municipal de Saúde para recebimento dos medicamentos, materiais de uso contínuo e dieta 2 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DA ILHA DE SÃO LUÍS VARA DE INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS enteral líquida, inclusive àqueles que venham a se inscrever até o dia 31 de dezembro de 2016, sob pena de pagamento de multa por dia de atraso no fornecimento de cada medicamento, material de uso contínuo e dieta enteral líquida solicitado, A SER FIXADA PONDERADAMENTE POR ESSE JUÍZO, sem o afastamento de outras providências tendentes ao cumprimento da ordem judicial;” (...) ao final da instrução processual seja julgada procedente a presente ação para condenar em definitivo o réu a disponibilizar os medicamentos, materias de uso contínuo e dieta enteral líquida necessários aos Senhores FRANCISCO DAS CHAGAS BRAGA, PAULO ROBERTO BARBOSA MELO, CARLIVAN CONCEIÇÃO FERREIRA NETO, WERBET BARBOSA SOUSA, MARIA DO CARMO GONÇALVES, bem como a todos os requerentes atualmente inscritos ou que venham a se inscrever até o dia 31 de dezembro de 2016, perante a Secretaria de Saúde do Município, para recebimento dos referidos insumos, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de pagamento de multa por cada dia de atraso no fornecimento de cada medicamento, material de uso contínuo e dieta enteral líquida, sem prejuízo de outras providências tendes ao cumprimento da ordem judicial.”. 5. Petição inicial instruída com o Inquérito Civil nº 019731-500/2015. A parte ré, em sua contestação (ID 2547968), argumenta, em síntese, que : “a municipalização no atendimento do cidadão através do SUS – Sistema único de Saúde não pode servir de pretexto, no entanto, para que o Estado do Maranhão e a União deixem de cumprir sua parte na pactuação estabelecida, sob pena de o planejamento orçamentário da SEMUS – Secretaria Municipal de Saúde sofrer um colapso administrativo e financeiro. Note-se que há uma enxurrada de ações judiciais propostas somente contra a Administração Municipal, onde, na maioria das vezes, os remédios não são de sua responsabilidade, ficando o Município de São Luís prejudicado com a inércia dos demais entes federativos, no tocante à aquisição da medicação. Perceba-se que a medicação pretendida pelo Autor foge à listagem da Farmácia Básica. Senão leia-se: a) Fibersource – para quem tem risco nutricional e necessita de uma nutrição enteral. Não há previsão legal, também, que a sua entrega deva ser feita pelo Município de São Luís. O Ministério da Saúde tem o dever de dirimir tais questões, para que o orçamento municipal não sofra com a municipalização do SUS. Ademais, Excelência, é preciso chamar a atenção do MM. Juízo, que para o uso de tal medicamento se faz necessária a renovação da prescrição nutricional. Ou seja, não se admite que haja uma única receita do profissional da saúde à paciente, para que receba a medicação por tempo indeterminado. Primeiro, porque as unidades de saúde do SUS retêm o receituário sempre que é feita solicitação pelo interessado; segundo, para evitar danos ao próprio paciente que pode ter o seu quadro 3 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DA ILHA DE SÃO LUÍS VARA DE INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS melhorado diminuindo a quantidade necessária; terceiro, para controlar os gastos da Administração. Data venia, a Autora necessita de avaliação periódica para saber se o remédio solicitado se adéqua a sua necessidade. Por isso, se o MM. Juízo Fazendário defere, sem qualquer critério, o fornecimento do remédio acima citado, ou seja, sem que se determine a apresentação periódica de receitas médicas, põe em risco, data maxima venia, a saúde da própria Autora, a quem tanto se quer tutelar. Outrossim, deve ser dito, ainda, que não há desinteresse ou descuido da Administração Municipal em fornecer remédios a qualquer cidadão, muito menos à Autora, sobre cujo estado de saúde se reconhece a inconteste e extrema necessidade de medicação. Não é à toa que o Município de São Luís vem entregando à paciente, ainda que não seja de sua plena responsabilidade -, a medicação ordenada pelo MM.Juízo, em sede de tutela antecipada (doc. 11).”. MPE, em Audiência de Instrução e Julgamento (ID 2983878), requereu “o julgamento do processo no estado em que se encontra”. O réu, embora intimado, deixou de comparecer à mencionada audiência. É o que cabia relatar. 1. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 Do Julgamento Antecipado do Mérito À luz do artigo 19 da Lei 7347/85, aplica-se à ação civil pública, naquilo em que não contrarie suas disposições, o Código de Processo Civil. Assim, é aplicável, na espécie, o disposto no artigo 355, I, do CPC, o qual impõe que “o juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando não houver necessidade de produção de outras provas ”. Nesse panorama, percebe-se que os elementos probatórios existentes no processo se mostram adequados para o julgamento da demanda. 2.2. Mérito A questão debatida se restringe à verificação do dever do Município de São Luís de fornecer os medicamentos e insumos apontados na exordial às pessoas que deles necessitam e não podem custeá-los, especialmente os senhores Francisco das Chagas Braga, Paulo Roberto Barbosa Melo, Carlivan Conceição Ferreira Neto, Werbet Barbosa Sousa, Maria do Carmo Gonçalves. 4 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DA ILHA DE SÃO LUÍS VARA DE INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS A razoabilidade das pretensões jurídicas deduzidas pelo autor decorre do sistema jurídico de promoção da saúde, estabelecido em especial a partir do artigo 1º, III, da CF, que constitui a dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil. O artigo 196 da Constituição da República, igualmente, afirma que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que tenham como objetivo a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Esses dois preceitos constitucionais indicam que o modelo político, social e econômico adotado pela sociedade brasileira não admite como válida, do ponto de vista jurídico, qualquer prática tendente a ofender o direito universal à saúde. E, uma vez verificada a ocorrência de lesão a esse direito, cabe ao Poder Judiciário, após ser provocado, impor as medidas necessárias para restauração desse direito. Sendo o direito à saúde um direito social constitucionalmente estabelecido – art. 6º da CF , cabe registrar que apresenta dupla função: uma de natureza negativa, a qual orienta a 1 Administração Pública a se abster de prejudicar os administrados, e a outra de natureza positiva, a qual impõe ao Estado a implementação das políticas públicas necessárias a proporcionar efetividade ao direito social em tela. Nesse sentido, por sua clareza e didática, bem como por expressar com maestria o entendimento que pauta este comando sentencial, transcreve-se ementa de julgado prolatado por nossa Corte Constitucional: “DIREITO CONSTITUCIONAL. SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. SOLIDARIEDADE DOS ENTES FEDERATIVOS. PRECEDENTES. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 24.02.2011. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido da responsabilidade solidária dos entes federativos quanto ao fornecimento de medicamentos pelo Estado, podendo o requerente pleiteá-los de qualquer um deles (União, Estados, Distrito Federal ou Municípios). Controvérsia divergente daquela em que reconhecida a repercussão geral pelo Plenário desta Casa - RE 566.471-RG/RN. Inadequada a aplicação da sistemática da repercussão geral (art. 543-B do CPC). Agravo regimental conhecido e não provido”. (Ag. Reg. no Recurso Extraordinário com Agravo nº 744.223/RJ, 1ª Turma do STF, Rel. Rosa Weber. j. 27.08.2013, unânime, DJe 11.09.2013). No que tange ao argumento de aplicação do princípio da reserva do possível, vale dizer que este não é absoluto, vez que admite temperamentos ao ser confrontado com os demais princípios da ordem constitucional. De modo que, no caso em julgamento, deve ser mitigado no propósito da prevalência do princípio da dignidade da pessoa humana. Ademais, a temática em referência é objeto de entendimento consolidado do Tribunal de Justiça do Maranhão, vejamos: 1 5 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DA ILHA DE SÃO LUÍS VARA DE INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS APELAÇÃO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. ÔNUS DA PROVA. LUCENTIS INTRAVÍTREO. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PRESERVAÇÃO DA VISÃO. TEORIA DA RESERVA DO POSSÍVEL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. MULTA DIÁRIA MANTIDA. I. Embora a prescrição médica não goze de presunção absoluta, é suficiente para demonstrar a necessidade do tratamento indicado, sendo ônus do ente público, por força do art. 333, inciso II, do CPC, demonstrar a viabilidade de tratamento menos gravoso com a mesma eficácia, o que não se verificou na espécie. II. A Constituição Federal estabelece, em seu art. 196, que a saúde é direito de todos e dever do Estado, cabendo a este, portanto, resguardá-lo, sob pena de afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana. III. A Teoria da Reserva do Possível encontra óbices intransponíveis no mínimo existencial e na dignidade da pessoa humana, sendo, ademais, imprescindível, à sua aplicação, a prova robusta da insuficiência de recursos do ente público demandado. IV. Mostra-se razoável e proporcional, para compelir o Estado do Maranhão a fornecer medicamento tido como único capaz de preservar a visão de pessoa acometida de grave doença ocular, o valor arbitrado em R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia de descumprimento do comando judicial. V. Recurso improvido. (Apelação Cível nº 20.088/2013 (135754/2013), 2ª Câmara Cível do TJMA, Rel. Vicente de Castro. j. 17.09.2013, unânime, DJe 23.09.2013). APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. TRATAMENTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DE TODOS OS ENTES DA FEDERAÇÃO. ARTIGOS 23, II, E 196, CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRECEDENTES. IRRELEVÂNCIA DE O PROCEDIMENTO NÃO ESTAR PREVISTO EM LISTA. JURISPRUDÊNCIA PACIFICADA. RESERVA DO POSSÍVEL. INAPLICABILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA. CÓDIGO CIVIL, ART. 381 (CONFUSÃO). 1. Comprovada a necessidade de fornecimento de medicação e tratamento médico, bem como a carência financeira para custeá-la, é dever do ente público o fornecimento, garantindo as condições de saúde e sobrevivência dignas, com amparo nos artigos 196 e 197 da Constituição Federal. 2. De acordo com firme orientação do STF e do STJ, o direito à saúde é dever do Estado, lato sensu considerado, a ser garantido modo indistinto por todos os entes da Federação (União, Estados, DF e Municípios), forte nos artigos 23, II, e 196 da Constituição Federal, sendo irrelevante, no mais, a circunstância do procedimento não integrar a lista de competência do ente estatal demandado. 3. É inegável a preponderância do direito à saúde, assegurado pela Constituição Federal, frente ao princípio da reserva do possível, cuja aplicação, tem sido relativizada pelo Supremo Tribunal Federal, em situações como a dos autos. 4. A alegada insuficiência de verba orçamentária, a par de ceder ante a prevalência do direito à saúde, assegurado pelo art. 196, CF/88, não restou comprovada nos autos. 5. À luz do disposto no art. 381 do Código Civil (que dispõe sobre confusão entre credor e devedor), não cabe a fixação de honorários advocatícios em demanda patrocinada por defensor público contra a pessoa jurídica de direito público da qual é parte integrante. 6. Remessa conhecida e improvida. (Processo nº 136356/2013, 3ª Câmara Cível do TJMA, Rel. Jamil de Miranda Gedeon Neto. j. 19.09.2013, unânime, DJe 01.10.2013). Por fim, o tratamento de saúde adequado merece atenção do Poder Público, pois sua ausência mancha o princípio da dignidade humana – fundamento da República Federativa do Brasil, bem como ofende o direito fundamental à vida. 6 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DA ILHA DE SÃO LUÍS VARA DE INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS Em suma, mostra-se necessária a procedência dos pedidos da ação em razão da conduta omissiva do réu, que, ao não fornecer os medicamentos e insumos em questão, expõe de forma concreta a saúde e a própria vida dessas pessoas que não dispõem de recursos financeiros suficientes para arcarem com o respectivo tratamento. 1. DISPOSITIVO Por todo o exposto, com arrimo no que preceitua o artigo 269, I, do Código de Processo Civil, confirmando a liminar deferida, ACOLHO o pedido formulado pelo Ministério Público Estadual e, por conseguinte, CONDENO o MUNICÍPIO DE SÃO LUÍS: (1º) em obrigação de fazer consistente em fornecer os seguintes medicamentos e insumos: XILOCAÍNA GEL A 2% OU KY GEL; AMITRIPICILINA; BACLOFENO 10MG; OXIBUTININA 5MG; MINILAX; do MATERIAL DE USO CONTINUO: SONDAS URETRAIS; SONDA URETRAL; ÁGUA BORICADA; LUVAS; GASES; SACOS COLETORES e DIETA ENTERAL LÍQUIDA, especialmente aos senhores Francisco das Chagas Braga, Paulo Roberto Barbosa Melo, Carlivan Conceição Ferreira Neto, Werbet Barbosa Sousa, Maria do Carmo Gonçalves, bem como aos que vierem a se cadastrar junto ao ente municipal. Sem condenação em honorários advocatícios e custas processuais, tendo em vista a procedência da ação proposta pelo Ministério Público. Intime-se o Município de São Luís. Notifique-se a Senhora Secretária Municipal de Saúde para que dê cumprimento ao que foi decidido, sob pena de serem adotadas medidas coercitivas à execução da decisão. Esta decisão deverá ser cumprida no prazo máximo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), valor a ser revertido ao Fundo Estadual de Direitos Difusos FDD (Decreto 1.306/94). Digno frisar que a sentença ora proferida produz efeito imediatamente, conforme entendimento extraído do art. 14 da Lei no 7.347/1985. PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. INTIMEM-SE. São Luís, 10 de outubro de 2016. 7 ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DA ILHA DE SÃO LUÍS VARA DE INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS DOUGLAS DE MELO MARTINS Juiz de Direito Titular da Vara de Interesses Difusos e Coletivos CF. Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Assinado eletronicamente por: DOUGLAS DE MELO MARTINS https://pje.tjma.jus.br/pje/Processo/Consul taDocumento/listView.seam ID do documento: 3970039 16101416580866600000003866114 8