24 Estudo das Energias e Funções de Onda em um Ponto Quântico Cilíndrico Study of Energies and Wave Functions in a Cylindrical Quantum Dot Sílvio José Prado Faculdade de Ciências Integradas do Pontal – FACIP – UFU, Uberlândia, MG. [email protected] Resumo – este trabalho são calculadas a estrutura eletrônica e as funções de onda de um ponto quântico cilíndrico de CdTe. O modelo utilizado para realizar o cálculo se baseia no Hamiltoniano k.p 8×8 de KaneWeiler, o qual leva em consideração a forte mistura entre as bandas de condução e de valência, assim como permite estudar o conjunto de simetrias associadas com estes estados eletrônicos. Observe-se que, uma vez definido um cilindro de altura 2Hz, ao variar o raio o caráter do segundo e terceiro níveis de energia da banda de valência sofrem mudanças entre os estados de buraco pesado e buraco leve, devido a cruzamentos e anti-cruzamentos entre os níveis de energia. espacial leva a quantização de todos os graus de liberdade do elétron, fazendo com que seu espectro de energia seja semelhante ao de um átomo, ou seja, consiste de um conjunto discreto de autovalores, neste fato é que está o grande interesse do ponto de vista da física fundamental, como neste caso em que foi feito um estudo das energias, funções de ondas e da identificação dos estados eletrônicos, que são objetos de estudo em cursos de Física Moderna e Mecânica Quântica, assim como para as possíveis aplicações em microeletrônica e Palavras-chave – Ponto quântico cilíndrico. Estrutura eletrônica. Funções de onda. Hamiltoniano k.p. dispositivos opto-eletrônicos tais como diodos Simetrias. emissores de luz (PRADO2, 2003). Abstract – In this work I calculate the electronic structure and wave functions of a cylindrical quantum dot of CdTe. The model used to perform the calculation is based on the Hamiltonian 8 × 8 k.p Kane-Weiler, which takes into account the strong mixing between the conduction band and valence, as well as allows to study the set of symmetries associated with these electronic states. I note that, once defined a cylinder of height 2Hz, to vary the radius the character of the second and third energy levels of valence band undergo changes between the states of heavy hole and light hole, due to anticrossings and crossings between energy levels. Keywords – Cylindrical quantum dot, Electronic structure, k.p Hamiltonian; Symmetries. I INTRODUÇÃO Os pontos quânticos (PQ’s) semicondutores têm sido intensivamente investigados devido as suas propriedades ópticas e elétricas dependentes do tamanho. O confinamento ISSN: 1984-3151 Para compreender e interpretar os resultados experimentais é necessário um estudo da dependência dos níveis de energia com o tamanho do ponto quântico e sobre as simetrias espaciais. A teoria de massa efetiva tem fornecido bons resultados na descrição da estrutura eletrônica em pontos quânticos (NORIS et al., 1996). Várias versões desta teoria usando diferentes aproximações têm sido formuladas para nanoestruturas tipo bulk, como blenda de zinco (zinc-blende) e vurtzita (wurtzite). Foi escolhido usar o modelo k.p 8×8 de KaneWeiler (KANE, 1966), para estudar todos os diferentes aspectos da interação entre as bandas de condução, valência e spin-órbita assim como as simetrias dos estados eletrônicos (SERCEL; VAHALA, 1990). www.unibh.br/revistas/exacta/ Vol. 3 N.º 2 (2010) 25 II TEORIA Para realizar este estudo teórico foi utilizado o Hamiltoninao k.p 8×8 de Kane-Weiler (PRADO1, 2003, SERCEL; VAHALA. 1990), o qual leva em consideração exatamente a interação entre as bandas de condução e de valência e considera as contribuições de bandas remotas. Os estados dos elétrons e dos buracos em um ponto quântico cilíndrico (PQC) podem ser caracterizados pelos autoestados do momento angular total definido pela soma dos estados de Bloch, J, e do momento angular, L, da função envelope. Dentro do modelo k.p, estes estados podem ser escritos como uma expansão linear na forma de uma função espinor de oito componentes. Devido à impossibilidade de resolver o problema exato, algumas aproximações são necessárias, tais como: (i) Uso de um modelo de barreira de potencial infinita, pois para os pontos quânticos crescidos em matriz vítrea, os portadores de carga do material semicondutor encontram uma diferença de energia na interface semicondutorvidro da ordem de 3,0 eV, tornando este aproximação bastante boa. (ii) O Hamiltoniano k.p apresenta inversão de simetria e a estrutura dos operadores permite determinar uma simetria inerente, a qual por sua vez permite a separação do espaço de Hilbert em quatro subespaços ortogonais. Para satisfazer a simetria de inversão dos operadores da diagonal e fora da diagonal no Hamiltoniano, cada subespaço deve ser formado por uma combinação especial de funções pares e ímpares (ver as equações (3) e (4)). Considerando o Hamiltoniano completo, existem termos que quebram a simetria de inversão, não permitindo a separação do subespaço de Hilbert em quatro subespaços, que possibilitam a identificação dos estados eletrônicos e simplificam o cálculo computacional. (iii) A componente do momento angular Lz = hM da função de onda envelope é um bom ISSN: 1984-3151 número quântico. As funções de onda para qualquer estado eletrônico são representadas por um espinor de oito componentes. Um conjunto completo de autofunções para o Hamiltoniano k.p para um PQ cilíndrico pode ser expandido em termos do produto das funções periódicas de Bloch J , J z em k=0 e das funções envelope. A função de onda foi expandida em termos das soluções exatas dos operadores da diagonal para cada tipo de portador. Cada componente do espinor tem a forma F ± n , L ,m ( ρ , φ , z ) = Φ n L ( ρ , φ ) f ± ( z ), (1) onde o termo situado no plano é dado por, Φ n L ( ρ , φ ) = An , L J L (k L n ρ ) e ± iLφ 2π , sendo An ,l , a constante de normalização da função de Bessel J L ( x ) . O termo dependente em z é dado por f + (z) = mπ 1 cos( 1 z ), m1 = 1, 3, 5,..., 2H z Hz f − ( z) = mπ 1 s en( 2 z ), m 2 = 2, 4, 6,..., 2H z Hz (2) onde Hz representa a meia-altura do cilindro. Devido à simetria inerente ao método k.p e à geometria cilíndrica do ponto quântico, os subespaços podem ser construídos como uma combinação especial de funções pares, Φ n 2l ( ρ , φ ) e f + ( z ) , e ímpares, Φ n 2l +1 ( ρ , φ ) e f − ( z ) . A forma geral do conjunto de espinores que formam os subespaços é (PRADO1, 2010) Cnm,21 L(2L+1) Φn (ρ ) f + 2L(2L + 1) m1 n + Cn,2L+1(2L) Φ 2L +1(2L) (ρ) f m n − Cn,22 L(2L+1) Φ 2L(2L + 1) (ρ) f Cm2 Φn (ρ ) f − n,2L(2L+1) 2L(2L + 1) ψ I (II ) (ρ) = ∑ m n n,L,m1,2 Cn,22 L+1(2 L) Φ (ρ ) f − 2L +1(2L) Cnm,22 L(2L+1) Φn (ρ ) f − 2L(2L + 1) Cm1 (ρ ) f + Φn n,2L+1(2L) 2L +1(2L) m1 + n Cn,2L+1(2L) Φ 2L +1(2L) (ρ) f www.unibh.br/revistas/exacta/ Vol. 3 N.º 2 (2010) e+ hh+ lh+ so+ e− hh− lh− so− (3) 26 e C Φ ( ρ) f 2L +1(2L) m1 n + Cn,2L(2L+1) Φ 2L(2L + 1) (ρ) f m n − Cn,22 L+1(2L) Φ 2L +1(2L) (ρ) f Cm2 Φn ( ρ) f − n,2L+1(2L) 2L +1(2L) ψ III (IV ) (ρ) = ∑ m n n,L,m1,2 Cn,22 L+1(2L) Φ ( ρ) f − 2L(2L + 1) Cnm,22 L+1(2L) Φn ( ρ) f − 2L +1(2L) Cm1 Φn ( ρ) f + n,2L(2L+1) 2L(2L + 1) m1 + n Cn,2L(2L+1) Φ 2L(2L + 1) (ρ) f m1 n,2 L(2 L+1) n + + e hh+ lh+ so+ e− hh− , (4) valor mais baixo de L no conjunto das bases para os estados das bandas de condução e de valência, s representa o spin para cima (up) ou para baixo (down) e m representa o número quântico relativo à função f + ( − ) que aparece nas equações (3) e (4). Estados pertencentes ao mesmo subespaço não podem se cruzar, como será mostrado na Figura 1 para os níveis de energia. O esquema de diagonalização utilizado permite identificar facilmente os níveis de energia, ou seja, qual o seu caráter dominante so− em relação aos componentes dos espinores (3) m onde Cn , L são constantes a serem determinadas. e (4). lh− De acordo com o modelo, os estados (3) e (4) devem satisfazer a seguinte condição de contorno: ψ nI ,(LII, m), III ( IV ) ( ρ ≥ R, φ , z ≥ H z ) = 0 , tanto no raio R do cilindro, quanto na meia-altura Hz e, portanto o número de onda que aparece em cada função Φ n L ( ρ , φ ) é dado por k l n = µ nl R onde µ nl é o n-ésimo zero da função de Bessel. A ordem imposta sobre o número quântico orbital m nas equações (3) e (4) é determinada pelos elementos fora da diagonal do Hamiltoniano k.p. Os operadores P̂± mudam a paridade da função de Bessel, enquanto que Pˆz muda a paridade da função f ± ( z ) . O acoplamento entre a banda de condução e a banda de valência e a mistura de estados na banda de valência aparecem devido às contribuições dos termos fora da diagonal do Hamiltoniano. O cálculo da estrutura eletrônica foi feito para um ponto quântico cilíndrico semicondutor de CdTe, com meia-altura Hz = 100 Ǻ. Como o ponto quântico é simétrico na direção z, a paridade da função de onda também é introduzida como um número quântico. Os estados para um dado número quântico fz, são denotados por m X n ,s onde n é o índice do estado que enumera os níveis de energia do menor para o maior, X representa o ISSN: 1984-3151 III RESULTADOS E DISCUSSÃO Os parâmetros para o CdTe usados no cálculo são a energia do gap Eg = 1,6069 eV, energia da interação spin-órbita ∆0 = 0,953 eV. Os parâmetros de Luttinger γ 1L = 5,37, γ 2L = 1,67, γ 3L = 1,98, a não-parabolicidade da banda de condução (1 + 2F) = 1,24, a massa efetiva do elétron me = 0,091m0, e o parâmetro de Kane de acoplamento das bandas de conduçãovalência Ep = 17,9 eV (PRADO2 et. al., 2003). Para realizar o cálculo numérico cada subespaço foi construído com relação aos números quânticos L e m. A convergência dos valores numéricos foi atingida usando matrizes de tamanho 8N0 × 8N0, com N0 ≤ 30, para um erro de 2,5 e V nas energias. Na FIG. 1 é mostrado o espectro de energia para o ponto quântico cilíndrico de CdTe, calculado no ponto Γ e plotados como função do inverso do raio, para um valor de Hz = 1,0A, onde 1A = 100Ǻ. Nessa figura, assim como na FIG. 2 estão plotados as energias referentes aos subespaços I e IV, pois as energias referentes aos subespaços I (III) e II (IV) são degeneradas. Como esperado as energias aumentam na banda de condução conforme o raio diminui, e diminuem para a banda de valência. www.unibh.br/revistas/exacta/ Vol. 3 N.º 2 (2010) 27 Os estados da banda de valência exibem um comportamento mais interessante, do que aquele dos estados da banda de condução, como o cruzamento e o anti-cruzamento do segundo, terceiro e quarto níveis de energia. números quânticos, L = 0, m1 = 1 e spin para cima, 1 e1↑ (I), ou um estado com L = 0, m1 = 1 e spin para baixo, 2 e1↓ (II), vindo do subespaço II, pois como foi mencionado os níveis de Primeiro, observa-se na FIG. 1 que o energia dos subespaços I e II são degenerados. nível de energia fundamental desta banda é caracterizado como um estado de buraco pesado, sendo representado como 1 hh1↑ (IV) ( 1lh1↑ (III)) e não troca de caráter conforme o raio diminui. Segundo, na FIG. 2, a qual é uma ampliação da região marcada com um círculo na FIG. 1, onde ocorre o anti-cruzamento entre os níveis de energia da banda de valência em torno de 1/R = 0,87A (115 Ǻ), o estado é 3↑ caracterizado como 3 lh3↑ (I) ( 2 lh (II)), tanto antes quanto após o cruzamento. Entretanto o segundo nível de energia representado como 3 lh2↑ (I) ( 2 lh2↓ (II)) troca de caráter após o anti- cruzamento passando a ser 3 hh2↓ (I) Figura 1. Espectro de energia de elétrons e buracos para ( 2 hh 2↑ (II)). um ponto quântico cilíndrico de CdTe, com Hz = 1,0A Terceiro, o cruzamento entre os níveis (100 Ǻ) plotado em função do inverso do raio. As linhas de energia mencionados ocorrem entre níveis sólidas (pontilhadas) representam os estados referentes ao subespaço I (IV). pertencentes a subespaços diferentes, como previsto, este fato implica que o segundo nível de energia, muda conforme o raio do PQ diminui, ou seja, para R < 115Ǻ (1/R = 0,87 A), o caráter dominante do terceiro nível é 3 lh3↑ (I) ( 2 lh3↑ (II)), e acima deste valor passa a 3↑ ser 2 lh (IV) ( 1lh3↓ III), ou seja, trocando de caráter na região onde R ≅ 125Ǻ (0,8A). As figuras 3a, 3b e 4a e 4b, mostram as energias e as funções de onda, dadas pela equação (1) na direção z, em ρ = 0, ou seja, no centro do cilindro. Estas figuras são para R = 0,5A, 1,0A, 1,15A e 1,50A, respectivamente. Nas figuras, o primeiro estado da banda de condução tem dois nós situados nas “tampas” do cilindro, ou seja, e Hz = ± Figura 2. Ampliação da região marcada com um círculo 1,0A, e nenhum antinó como esperado para o na figura 1, banda de valência, mostrando o cruzamento nível fundamental. Esta função de onda e o anti-cruzamento entre os níveis de energia discutidos no texto. representa um elétron do subespaço I com ISSN: 1984-3151 www.unibh.br/revistas/exacta/ Vol. 3 N.º 2 (2010) 28 A função de onda do segundo nível é semelhante a do primeiro nível, pois ela advém do subespaço IV, onde o elétron de menor energia tem os números quânticos L = 1, m1 = 1 e spin para baixo, portanto ele tem energia menor do que o estado do elétron com spin para cima do mesmo subespaço que apresenta os seguintes valores de L = 0 e m2 = 2. Logo o nível de energia fundamental deve ter número quântico m igual a 1. Na banda de valência observa-se que o estado fundamental, buraco pesado, subespaço IV, com L=0, m1=1 e spin para baixo, assim como o estado fundamental da banda de condução tem dois nós e nenhum antinó, para todos os valores de R mencionados. O segundo estado para R = 0,5A, FIG. 3a, tem um antinó e dois nós e advém do subespaço I, como pode ser visto na FIG. 1 (1/R=2A). Este estado tem os seguintes números quânticos L = 0, m2 = 2 e spin para baixo, como o estado fundamental deve ter m1 = 1, este nível de energia representa um estado excitado, já o terceiro nível aparece do subespaço IV e como pode ser visto na figura representa o primeiro estado da banda de buraco leve. Na FIG. 3b, onde 1/R = 1,0A, observa-se que o segundo e o terceiro estados pertencem ao subespaço I, assim como na FIG. 4a, e representam os estados excitados das bandas de buraco pesado e leve, respectivamente, ou seja, como mencionado as funções de onda tem um antinó. A FIG. 4a é para a região de anticruzamento entre os segundo e o terceiro níveis de energia (1/R = 0,87A). Quando o raio aumenta para 1/R = 1,5A, FIG. 4b, o segundo estado continua a se buraco leve e o terceiro estado passa a ser buraco leve como na FIG. 3a. Figura 3. Espectro de energia e funções de onda em z para ρ=0, plotado em função da altura do cilindro. A figura (3a) é para um PQC de raio 0,5A e a figura (3b) para um PQ de raio 1,0A. Figura. 4. O mesmo da FIG. 3, agora para raios de 1,15A e 1,50A, respectivamente figuras a e b. ISSN: 1984-3151 www.unibh.br/revistas/exacta/ Vol. 3 N.º 2 (2010) 29 LUTTINGER, J. M. e KOHN, W., Motion of Electrons and Holes in Perturbed Periodic Neste trabalho foram calculadas a estrutura Fields, Physical. Review. Vol. 97, p. 869, eletrônica e as funções de onda de um ponto 1955. quântico cilíndrico de CdTe. Para realizar o NORIS, D. J. et al. Size dependence of cálculo foi utilizado o Hamiltoniano k.p de oito exciton fine structure in CdSe quantum bandas. dots, Physical Review B, Vol. 53, p. 347 Os resultados mostram que as funções (1996). de onda estão de acordo com os resultados encontrados nos livros didáticos de Mecânica PRADO1, S. J., Efeitos de tensão em um Quântica, para um poço com barreira de ponto quântico cilíndrico auto-organizado, potencial infinita. Outro resultado importante aceito para publicação, Ciência e Engenharia, observado nas figuras 1 e 2 é que, dado um ISSN 0103-944X; ISSN eletrônico 1983-4071, cilindro com uma certa altura fixa Hz, para 2010. valores de R (raio) que variam de R< Hz PRADO2, S. J. et al. Optical transitions in a (cilindro “estreito” e “alto”) a R> Hz (cilindro single CdTe spherical quantum dot, Physical “largo” e “baixo”) o caráter do segundo e Review B, Vol. 68, p. 235327-1-1235327-9, terceiro níveis de energia da banda de valência 2003. sofrem mudanças. SERCEL, P. C. e VAHALA, K. J., Analytical REFERÊNCIAS formalism for determining quantum-wire and quantum-dot band structure in the Semiconductor and multiband KANE, E. O., envelope-function Semimetals, Willardson, R.K. e Beer, A.C., approximation. Physical Review. B, Vol. 42, eds. (Academic Press, New York, 1966), vol. 3690, 1990. 1, p.75. IV CONCLUSÕES ISSN: 1984-3151 www.unibh.br/revistas/exacta/ Vol. 3 N.º 2 (2010)