OBTENÇÃO DE FARINHA DE FEIJÃO CAUPI

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Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.14, n.1, p.31-36, 2012
ISSN 1517-8595
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OBTENÇÃO DE FARINHA DE FEIJÃO CAUPI (Vigna unguiculata L. Walp)
Glêce Milene Santana Gomes1, Ronielli Cardoso Reis2, Carla Alexandrina
Delgado Teixeira da Silva3
RESUMO
Este trabalho teve como objetivo desenvolver uma farinha de feijão caupi, utilizando diferentes
temperaturas. Os resultados demonstraram que as temperaturas de secagens estudadas (40, 50 e
60ºC) não influenciaram nas características físico-químicas (umidade, atividade de água e teor
de proteína). Foram determinadas também as propriedades funcionais tecnológicas, sendo que o
Índice de Solubilidade em Água foi maior para as farinhas desidratadas a 50 e 60° C, 20,6 e
20,4% respectivamente. Pode-se concluir que a farinha de feijão caupi se aplica à elaboração de
produtos de rápido preparo, tais como sopas, pudins e mingaus.
Palavras-chave: feijão caupi, secagem, farinha de feijão, propriedades funcionais.
PRODUCTION OF COWPEA FLOUR (Vigna unguiculata L. Walp)
ABSTRACT
This work has as its main objective to develop cowpea flour by using different temperatures.
The results showed that the drying temperatures studied (40, 50 and 60°C) did not influence the
product physical and chemical characteristics (moisture, water activity and protein content). We
have also determined the functional properties of the technology employed, and the Water
Solubility Index were higher for flour dried at 50 and 60 ° C, 20,6 and 20,4%, respectively. It
can be concluded that cowpea flour may be used in the development of fast preparation products
such as soups, porridges and puddings.
Keywords: cowpea, drying, flour beans, functional properties
Protocolo de 12-2010-28 enviado em 24/12/2010
1
Mestranda em Engenharia de Alimentos, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB, Itapetinga – BA, E-mail:
[email protected],
(77) 3261-1720.
2
Professora Adjunto I, Centro de Ciências Agrárias, Ambientais e Biológicas, Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB, Cruz
das Almas- BA, E-mail: [email protected], (75) 3621 9751
3
Graduanda em Engenharia de Alimentos, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB, Itapetinga – BA, E-mail:
[email protected], (77) 3261-1720.
32
Obtenção de farinha de feijão caupi
INTRODUÇÃO
O feijão caupi (Vigna unguiculata L.
Walp.), comumente chamado de feijão de
corda, fradinho ou feijão macassar, é um
alimento comum para as populações de baixa
renda do Nordeste brasileiro. Constitui-se uma
das principais culturas alimentares desta região
e também do Oeste da África (Onwuliri e Obu,
2002).
Esta leguminosa constitui importante
fonte de proteínas (23 a 25% em média) e
carboidratos, destacando-se pelo alto teor de
fibras alimentares, vitaminas e minerais, além
de possuir baixa quantidade de lipídios que, em
média, é de 2% (Embrapa Meio Norte, 2003).
Segundo Frota (2007), em estudo realizado com
hamsters, foi verificado que o consumo de dieta
a base de feijão caupi integral proporcionou
uma redução no colesterol total de 49% e
colesterol não-HDL de 54%.
O mercado do feijão caupi ainda tem
contornos
regionais
concentrando-se,
principalmente, nas regiões Norte e Nordeste do
país. Entretanto, há indícios de certa expansão
da cultura na região Sudeste, principalmente no
Norte de Minas Gerais e Rio de Janeiro,
predominando nesses Estados o grão da
subclasse Fradinho (Embrapa Meio Norte,
2003).
A perecibilidade do feijão caupi tem sido
um problema para armazenagem dos grãos e
comercialização no período de entressafra, uma
vez que depois de dois meses os grãos ganham
cor escura e demoram mais para cozinhar
(Embrapa Agroindústria Tropical, 2008). O
maior tempo de cozimento requer maior
consumo de energia, e o escurecimento dos
grãos influencia na intenção de compra do
consumidor, uma vez que a cor é um dos
atributos para a classificação do feijão em novo
ou velho.
A secagem é um dos processos
largamente utilizados na conservação de grãos,
uma vez que possui um custo mais baixo e a
operação é mais simples (Pontes, 2002). O
processo de secagem tem como princípio a
diminuição do teor de água do produto e, por
conseguinte, a redução da atividade de água,
esta por sua vez minimiza as razões de reações
microbiológicas, químicas e enzimáticas. Por
isso, a qualidade e a estabilidade dos alimentos
durante o armazenamento são asseguradas.
Neste contexto, a produção de farinha
por meio da secagem é uma alternativa para o
processamento do feijão caupi, buscando um
Gomes et al.
produto com maior valor agregado e de maior
estabilidade durante o armazenamento. Além
disso, a farinha pode ser empregada na
elaboração de produtos de rápido preparo como
sopas e mingaus, e ainda de produtos prontos
para consumo como pães e biscoitos.
O presente trabalho objetivou estudar o
processo de obtenção de farinha de feijão caupi,
subclasse fradinho, utilizando diferentes
temperaturas de secagem.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi conduzido no
laboratório de Ensaios de Materiais e Projetos
Agroindustriais da Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia, na cidade de Itapetinga-BA.
Foram utilizados grãos de feijão fradinho
obtidos no comércio local da cidade de
Itapetinga-BA.
Antes do processo de secagem, os grãos
foram
hidratados
para
facilitar
o
desprendimento do tegumento (película) que os
envolvem. Tal procedimento foi realizado por
imersão dos grãos em água quente à
temperatura de 80 ºC por um período de 30
minutos.
Após
este
período,
foram
desintegrados em multiprocessador (Walita) e
por fim foi retirado manualmente o tegumento.
A retirada do tegumento é importante para obter
uma farinha que apresente melhores
características de textura e aparência.
Obtenção da farinha
A secagem foi realizada em três
temperaturas (40, 50 e 60 °C), utilizando-se
secador de bandejas, com fluxo de ar de
aproximadamente 4,0 m/s. O experimento foi
realizado no Delineamento Inteiramente
Casualizado (DIC) com três repetições.
Para obtenção da curva de secagem, para
cada temperatura estudada, foram realizadas
pesagens periódicas do produto, no início do
processo (tempo zero) e a cada 15 minutos,
utilizando-se balança digital modelo AS 2000
de 0,01 g de precisão.
A secagem do feijão foi realizada até que
o produto atingisse o teor de água entre 10 a
12% (b.s.), aproximadamente. Após este
período, o produto permaneceu nas bandejas
com o sistema de aquecimento de ar desligado
até o seu resfriamento.
A velocidade do ar de secagem e a
temperatura foram medidas utilizando um
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Obtenção de farinha de feijão caupi
anemômetro
digital
e
um
termopar,
respectivamente.
Para obtenção da farinha os grãos, após a
secagem em cada temperatura, foram triturados
em liquidificador de uso doméstico (Mallory) e
peneirados em peneira de 21 mesh.
As farinhas foram acondicionadas em
embalagens de polipropileno metalizado, por
um período de 30 dias. O fluxograma da
produção da farinha de feijão fradinho está
apresentado na Figura 1.
Gomes et al.
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A atividade de água foi determinada
utilizando-se higrômetro Decagon (AquaLab,
modelo CX-2T), calibrado a 25 °C.
A determinação de proteínas foi efetuada
segundo o método de micro - Kjeldahl, para a
quantificação de nitrogênio total, descrito pela
AOAC (1998). No cálculo da conversão do
nitrogênio em proteínas foi utilizado o fator
6,25, uma vez que este fator deve ser utilizado
para amostras de origem vegetal.
Propriedades funcionais
Feijão
Foram determinados o Índice de
Absorção em Água e o Índice de Solubilidade
em Água, segundo metodologia descrita por
Anderson et al. (1969), com modificações.
O Índice de Absorção em Água (IAA) foi
determinado a partir da equação 1:
Hidratação 80ºC
Desintegração
IAA 
Descascamento
Secagem
PRC
 PRE
PA
(1)
em que:
PRC =Peso do resíduo da centrifugação, g;
PA = Peso amostra, g;
PRE = o resíduo da evaporação g
Trituração
Peneiramento
E o Índice de Solubilidade em Água
(ISA) foi obtido a partir da equação 2:
Acondicionamento
Figura 1 - Fluxograma de produção de farinha
de feijão fradinho.
%ISA 
PRE
* 100
PA
(2)
Análises das farinhas
Análises microbiológicas
Após 30 dias de armazenamento as
farinhas foram submetidas às análises físicoquímicas,
propriedades
funcionais
e
microbiológicas. Todas foram realizadas em
triplicada para cada repetição do experimento.
Foram realizadas as análises de
coliformes totais, coliformes à 45ºC e contagem
de bolores e leveduras, seguindo os
procedimentos descritos pela American Public
Health Association (APHA, 2001).
Análises físico-químicas
Análise dos dados
As farinhas foram submetidas às análises
de umidade, atividade de água e de proteínas. A
umidade foi determinada por método direto, ou
seja, a água é retirada do produto, por processo
de aquecimento utilizando-se um aparelho de
infravermelho (Gehaka, modelo IV 2000), cujo
teor de umidade é calculado pela diferença de
peso das amostras no início e no final do
processo.
Para a obtenção da curva de secagem foi
realizada análise de regressão dos dados de
umidade (variável dependente) com o tempo de
secagem (variável independente). O modelo
exponencial abaixo (equação 3) foi ajustado
para os dados experimentais mediante análise
de regressão.
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Obtenção de farinha de feijão caupi
(3)
em que:
y = teor de umidade no tempo x (% base seca).
a e b = constantes de secagem.
x = tempo de secagem (min).
Gomes et al.
Os resultados microbiológicos obtidos
foram comparados com dados da Resolução
RDC nº 12, de 02 de janeiro de 2001, do
Regulamento Técnico sobre os Padrões
Microbiológicos para Alimentos (Brasil, 2001).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os dados das análises físico-químicas
foram submetidos à análise de variância
(Anova) ao nível de 5% de probabilidade pelo
teste F.
Os
resultados
das
propriedades
funcionais foram avaliados de forma descritiva.
Curva de secagem
A Figura 3 apresenta a curva de secagem
experimental do feijão fradinho para as
temperaturas de 40, 50 e 60 ºC.
160
Umidade (% b.s.)
140
40°C
120
50°C
100
60C
80
60
40
20
0
0
15
30
45 60
75 90 105 120 135 150 165 180 195 210
Tempo (min)
Figura 03 – Curvas de secagem de feijão fradinho.
Observou-se que o tempo de secagem
realizada na temperatura de 40°C apresentou-se
superior ao tempo das demais temperaturas. Já
com relação à diferença de tempo de secagem
entre as temperaturas de 50 e 60°C foi apenas
de 15 min. O tempo total do processo foi de
210, 135 e 120 min. com teores de umidade
final de 15,8; 13,7 e 12,6% (expressos em %
base seca) para as temperaturas de 40, 50 e 60
°C, respectivamente.
Tabela 03 – Equações de taxas de secagem e
valores de R2.
Temperatura (°C)
Equação
ajustada
R2
40
y = 131,7e-0,01x
50
y = 145,1e
-0,02x
0,992
60
y = 142,1e-0,02x
0,998
0,985
Os valores de R2 obtidos a partir curva de
secagem foram superiores a 0,98 indicando um
bom ajuste do modelo exponencial aos dados
experimentais para as três temperaturas em
estudo (Tabela 3).
Análises físico-químicas
A Tabela 4 apresenta os valores médios
dos teores de umidade (% b.s.), atividade de
água (Aw) e de proteínas determinados para as
farinhas obtidas pela secagem do feijão a 40, 50
e 60 ºC.
Tabela 04 – Resultados das análises físicoquímicas da farinha de feijão fradinho.
Temperatura
(°C)
40
50
60
%
Umidade
(b.s)
15,8
14,6
14,3
Aw
% Proteína
(b.s)
0,702
0,688
0,691
26,5
26,4
24,6
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Obtenção de farinha de feijão caupi
Apesar das diferentes temperaturas de
secagem utilizadas, não se constatou diferença
significativa ao nível de 5% de probabilidade
pelo teste F para nenhuma das variáveis
medidas. Este resultado era esperado em
relação ao teor de umidade, pois essa variável
foi padronizada, sendo o processo de secagem
interrompido quando o produto alcançava à
umidade próxima à desejada para a farinha.
A atividade de água para as três farinhas
obtidas encontram-se < 0,70 indicando um
produto microbiologicamente estável, uma vez
que a maioria dos fungos se desenvolvem em
atividade de água superior a 0,8 e os xerófilos
crescem na faixa de 0,70 a 0,75.
Para verificar se a temperatura de
secagem influenciaria no teor de proteínas da
farinha de feijão, realizou-se tal análise para
cada temperatura estudada. Os teores finais de
proteínas após o processamento do feijão e
obtenção da farinha ficaram entre 24,6 e 26,5%,
expressos em base seca. Não houve diferença
significativa pelo teste F ao nível de 5% de
probabilidade entre as temperaturas de secagem
utilizadas. Estes resultados foram superiores
aos valores encontrados por Martins, et al.
(2006) para farinha de feijão caupi, cujos teores
de proteínas estavam em torno de 21,8%.
Entretanto a composição de alimentos vegetais
pode variar em função da variedade, tipo de
solo, tratos culturais, dentre outros.
Propriedades funcionais
Na Tabela 5 estão apresentados os
valores médios dos Índices de Absorção em
Água (IAA) e dos Índices de Solubilidade em
Água (ISA) das farinhas de feijão fradinho
obtidas nas diferentes temperaturas de secagem.
Tabela 5 – Resultados das análises das
propriedades funcionais tecnológicas da farinha
de feijão fradinho.
Temperatura
(°C)
40
IAA
(g de gel/g de amostra)
2,54
50
2,63
2,47
% ISA
18,7
60
Desvio padrão: IAA=0,08g/g e ISA=1,04%
20,6
20,4
O IAA variou de 2,47 a 2,63 g/g e
apresentou, e para o ISA a variação foi de 18,7
a 20,6%. Os valores de IAA para a farinha de
feijão foram próximos ao verificado para
35
Gomes et al.
farinha de arroz cru (2,84g/g), em trabalho
realizado por Dors et al. (2006). Entretanto os
valores de ISA para a farinha de feijão
apresentaram-se superiores a farinha de arroz
cru (2,10%). Pode-se observar que o ISA
aumentou em média 8,8% com o aumento da
temperatura. Possivelmente o grau de
severidade do tratamento térmico influenciou o
ISA provocando a degradação, gelatinização,
dextrinização e conseqüente solubilização do
amido (Anderson et al., 1969; Mercier e Feillet,
1975; Torres et al., 2005. Assim as
temperaturas de secagem de 50 e 60oC
proporcionaram uma farinha com melhores
propriedades funcionais, pois obtiveram os
maiores índices de solubilidade, propriedade
desejada em farinhas para a produção de sopa,
mingaus e pudins instantâneos, com diminuição
no tempo de preparo em função da maior
solubilização e maior rendimento no produto
final (Santos, 2009).
Análise microbiológica
Os
resultados
das
análises
microbiológicas estão apresentados na Tabela 6.
O teor de coliformes totais e coliformes a 45º C
encontram-se dentro dos padrões estabelecidos
pela RDC nº 12 de 02 de janeiro de 2001
(Brasil, 2001), indicando que o produto foi
elaborado utilizando-se as boas práticas de
fabricação.
Para as análises de bolores e leveduras
observam-se valores da ordem de 102 e 103
UFC/g de produto, não havendo padrão na
legislação para farinhas.
Tabela 6 – Análises microbiológicas da farinha
de feijão fradinho.
Temperatura
(°C)
Coliformes
Totais
(NMP/g)
Coliformes
a 45°C
(NMP/g)
Bolores e
Leveduras
(UFC/g)
40
1,5 x 10
ausente
1 x 102
50
1,1 x 10
ausente
1 x 103
60
0,72 x 10
ausente
3 x103
CONCLUSÕES
Para as diferentes temperaturas de
secagem do feijão fradinho não houve diferença
significativa das variáveis avaliadas. No
entanto, a temperatura de 40°C possui uma
desvantagem em relação ao tempo de secagem,
uma vez que é consideravelmente superior às
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Obtenção de farinha de feijão caupi
temperaturas de 50 e 60°C, podendo representar
maiores custos com o consumo de energia.
As farinhas de feijão obtidas a partir das
temperaturas de secagem de 50 e 60ºC
apresentaram maiores índices de solubilidade
em água e, portanto com melhores
características para o processamento de
produtos de rápido preparo.
Além disso, a farinha de feijão fradinho
pode ser considerada como um produto de boa
estabilidade microbiológica.
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Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.14, n.1, p.31-36, 2012
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