MINISTÉRIO DA SAÚDE FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ INSTITUTO OSWALDO CRUZ Pós-graduação em Medicina Tropical Mestrado acadêmico AVALIAÇÃO DE CITOCINAS NO DESFECHO DA INFECÇÃO AGUDA PELO HCV TAYANY DE DEUS BARROS GONÇALVES Rio de Janeiro Janeiro 2015 INSTITUTO OSWALDO CRUZ Programa de pós-graduação em Medicina Tropical TAYANY DE DEUS BARROS GONÇALVES Avaliação de citocinas no desfecho da infecção aguda pelo HCV Dissertação apresentada ao Instituto Oswaldo Cruz, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ciências. Orientadores: Profª Drª Lia Laura Lewis Ximenez de Souza Rodrigues Prof Dr Ricardo Wagner de Almeida Rio de Janeiro Janeiro 20 AVALIAÇÃO DE CITOCINAS NO DESFECHO DA INFECÇÃO AGUDA PELO HCV TAYANY DE DEUS BARROS GONÇALVES Dissertação apresentada ao Instituto Oswaldo Cruz, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ciências. Avaliada e aprovada pela Banca Examinadora em 22 de janeiro de 2015 composta por: Titulares: Dr. Alvaro Luiz Bertho dos Santos – IOC/FIOCRUZ Dr. Orlando da Costa Ferreira Junior - UFRJ Dr. Luiz Cristóvão de Moraes Sobrino Porto - UERJ Suplentes: Dr. Adeilton Alves Brandão – IOC/FIOCRUZ Dra. Patrícia Dutra - UERJ I DEDICATÓRIA Aos meus pais que se doaram por inteiro, renunciando, por vezes, aos seus próprios sonhos para que eu pudesse realizar os meus. II AGRADECIMENTOS A Deus, por me permitir vivenciar a Ciência e por manter viva a minha fé. À minha orientadora, Drª Lia Lewis, pela oportunidade e todo aprendizado. Ao meu coorientador e amigo, Ricardo Wagner, pela credibilidade, paciência e por me ensinar que mais do que falar, devo aprender a ouvir. Ao Edson Fernandes, gerente da plataforma Luminex, pela capacitação no manuseio dos reagentes e leitura dos resultados do estudo. Ao amigo Paulo Sérgio, pela disposição em me ajudar sempre que requisitado. À amiga Laís Coimbra, pelo incentivo constante, conselhos e pela extrema sinceridade. A todos os amigos do AHV e do LAHEP, Luciana P., Fabíola, Juliana, Bruna, Adilson, Márcia, Majorie, Islene e a todos os outros que contribuíram direta ou indiretamente para a realização deste trabalho. Ao meu grande amor e amigo, Felipe, pela paciência, compreensão e interesse em me ajudar no que fosse preciso. Aos meus inigualáveis pais, Vilma e Almir, que me aceitaram e permitiram que eu abrisse os olhos para o mundo. Quero sempre ser motivo de orgulho e felicidade. Aos órgãos de fomento CAPES e NIH que tornaram possível a realização deste trabaho. III “Por vezes, sentimos que aquilo que fazemos não é senão uma gota de água no mar, mas o mar seria menor se lhe faltasse uma gota”. (Madre Teresa) IV INSTITUTO OSWALDO CRUZ Avaliação de citocinas no desfecho da infecção aguda pelo HCV RESUMO DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM MEDICINA TROPICAL Tayany de Deus Barros Gonçalves Citocinas são proteínas imunomodulatórias que regulam e amplificam a resposta imune do hospedeiro. Na infecção pelo HCV as citocinas podem influenciar o desfecho da infecção aguda e a progressão da hepatite C crônica. No entanto, em virtude do grande número de casos assintomáticos, pouco se sabe sobre o papel, produção e progressão das citocinas durante a fase inicial da infecção. O objetivo desde estudo foi investigar a possível relação dos níveis de citocinas plasmáticas com à resolução espontânea ou com à persistência da infecção pelo HCV em indivíduos sintomáticos. Para análise das concentrações das citocinas TNFα, INFγ, IL-2, IL-4, IL-6, IL-10, IL-7, IL-21 e IL-17A foi utilizado imunoensaio multiplex pela metodologia Luminex. Para tanto, foram selecionados 14 pacientes ictéricos, na fase aguda da infecção pelo HCV, distribuídos em dois grupos, de acordo com o desfecho da infecção: eliminação viral espontânea (9) e persistência viral (5). Para a comparação dos níveis das citocinas entre os grupos, dois períodos da fase aguda foram selecionados a partir da provável data da infecção de cada paciente: T1= 8,0-10,5 semanas (compreende o início da resposta imune celular); T2= 16,0-18,5 semanas (diferença na qualidade da resposta das células T em relação ao desfecho da infecção). Nove controles saudáveis também foram selecionados e utilizados como padrão de normalidade para cada citocina estudada. Os resultados demonstraram que os níveis plasmáticos das citocinas IL-6 e IL-10 apresentaram-se mais elevados no grupo correspondente à persistência viral em ambos os períodos da fase aguda analisados ((IL-6 T1 p=0,03/ T2 p=0,01), (IL-10 T1 p=0,04/ T2 p=0,04)), quando comparados ao grupo correspondente à eliminação viral espontânea. Com relação aos níveis de IFNγ, estes não apresentaram diferença significativa entre os dois grupos no tempo 1. Contudo, no tempo 2 foram identificados níveis mais elevados desta citocina no grupo eliminação viral espontânea (T2 p=0,03). Verificou-se ainda acentuada elevação nos níveis de IFNγ do tempo 1 para o tempo 2 (p=0,009) neste mesmo grupo. Quanto à IL-7, não foram observadas diferenças significativas entre os dois grupos em ambos os períodos analisados. Sendo assim, o aumento dos níveis plasmáticos das citocinas anti-inflamatórias IL-6 e IL-10 durante a fase aguda da infecção pelo HCV sugere possível relação com a persistência da infecção. Além disso, a elevação dos níveis plasmáticos de INFγ observada ao longo da fase aguda sugere provável relação com a resolução espontânea da hepatite C. Em contrapartida, os níveis de IL-7 encontrados nos grupos estudados não sugerem qualquer relação desta citocina com o desfecho da infecção aguda pelo HCV. Palavras chaves: hepatite C aguda, citocinas, persistência viral, eliminação viral espontânea V INSTITUTO OSWALDO CRUZ Evaluation of citokynes on acute HCV infection outcome ABSTRACT DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM MEDICINA TROPICAL Tayany de Deus Barros Gonçalves Cytokines are immunomodulatory proteins which regulate and amplify the host’s immune response. In hepatitis C virus (HCV) infection, cytokines can influence the outcome of acute infection and the progression of chronic hepatitis C infection. However, due to the large number of asymptomatic cases, little is known about the role, production and progression of cytokines during the initial phase of the infection. The aim of this study was to investigate the possible association of plasma cytokine levels with spontaneous resolution or persistence HCV infection in symptomatic individuals. For analysis of concentrations of TNFα, INFγ, IL-2, IL-4, IL-6, IL-10, IL-7, IL-21 and IL-17A were used a multiplex immunoassay for the Luminex methodology. Therefore, 14 jaundiced pacients were selected in the acute phase of HCV infection, distributed in two groups according to the outcome of infection: spontaneous viral clearance (9) and viral persistence (5). To compare the levels of cytokines between the groups, based on the probable date of infection of each patient, two periods of the acute phase were selected: T1 = 8.0 to 10.5 weeks (the start of the cellular immune response); T2 = 16.0 to 18.5 weeks (difference in T cell response quality in relation to the outcome of the infection). Nine healthy controls were also selected and used to establish the normal range for each cytokine studied. The results showed that IL-6 and IL-10 plasma cytokine levels were more elevated in both of the periods of the acute phase analyzed among patients with viral persistence ((IL-6 p = 0.03 T1 / T2 w = 0.01) (IL-10 p = 0.04 T1 / T2 p = 0.04)) when compared to patients in the spontaneous viral clearance group. Regarding the INFγ levels, these did not differ significantly between the two groups at T1. However, at T2 higher levels of this cytokine were identified in the spontaneous viral clearance group (T2 p = 0.03). An increase in the INFγ levels was also detected from T1 to T2 (p = 0.009) in this group. As for IL-7, no significant differences were observed between the groups in both periods analyzed. Thus, the increased plasma levels of anti-inflammatory cytokines IL-6 and IL10 observed during the acute phase of hepatitis C infection suggests a possible association with the persistence of the infection. Furthermore, the increase in plasma INFγ levels observed throughout the acute phase suggests probable association with the resolution of HCV infection. In contrast, IL-7 levels found in the groups did not suggest any association of this cytokine with the outcome of acute HCV infection. Keywords: acute hepatitis C, cytokines, viral persistence, spontaneous viral clearance VI ÍNDICE RESUMO V ABSTRACT VI I. INTRODUÇAO 1 I.I HEPATITE NÃO A E NÃO B 1 I.II CLASSIFICAÇÃO TAXONÔMICA E ESTRUTURA GENÔMICA DO HCV 1 I.III ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS 4 I.IV MECANISMOS DE TRANSMISSÃO 6 I.V ENTRADA DO HCV NA CÉLULA HOSPEDEIRA 7 I.VI MANIFESTAÇÕES CÍNICAS E LABORATORIAIS 9 I.VI.I Fase aguda da hepatite C 9 I.VI.II Fase crônica da hepatite C 11 I.VII PATOGÊNESE 12 I.VIII RESPOSTA IMUNE 13 I.VIII.I Resposta imune inata ao hcv 13 I.VIII.II Resposta imune humoral ao hcv 15 I.VIII.III Resposta imune celular e citocinas 17 II. JUSTIFICATIVA 23 III. OBJETIVOS 24 III.I OBJETIVO GERAL 24 III.II OBJETIVOS ESPECÍFICOS 24 IV. MATERIAIS E MÉTODOS 25 IV.I DESENHO DE ESTUDO 25 IV.II ASPECTOS ÉTICOS 25 IV.III AMBULATÓRIO DE HEPATITES VIRAIS – AHV 25 IV.IV COORTE HEPATITE C AGUDA 26 VII IV.V AMOSTRA POPULACIONAL 26 IV.V.I Critérios de inclusão 27 IV.V.II Critérios de exclusão 27 IV.VI GRUPO CONTROLE 27 IV.VII AMOSTRAS BIOLÓGICAS 28 IV.VIII COLETA DE DADOS SECUNDÁRIOS 29 IV.VIII.I Dados demográficos, clínicos e laboratoriais 29 IV.IX LUMINEX: Dosagem simultânea de múltiplas citocinas (multiplex) presente nos plasmas dos indivíduos estudados. 29 IV.X ANÁLISE ESTATÍSTICA 31 V. RESULTADOS 32 V.I DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS DA AMOSTRA POPULACIONAL E DO GRUPO CONTROLE 32 V.II CARACTERÍSTICAS DOS GRUPOS PERSISTÊNCIA VIRAL E ELIMINAÇÃO VIRAL ESPONTÂNEA 32 V.III ANÁLISE DOS DADOS LABORATORIAIS SECUNDÁRIOS (BIOQUÍMICO E MOLECULARES) 34 V.III.I Persistência viral x Eliminação viral espontânea 34 V.III.II Persistência viral (Tempo 1 x Tempo 2); Eliminação viral espontânea (Tempo 1 x Tempo 2) 35 V.IV ANÁLISE QUANTITATIVA DE CITOCINAS PRESENTES NOS PLASMAS DE INDIVÍDUOS INFECTADOS PELO HCV. 35 V.IV.I Persistência viral x Eliminação viral espontânea 35 V.IV.II Persistência viral (Tempo 1 x Tempo 2); Eliminação viral espontânea ( Tempo 1 x Tempo 2) 36 VI. DISCUSSÃO 37 VII. CONCLUSÕES 42 VIII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 43 VIII ANEXOS 65 ANEXO A: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) 66 ANEXO C: Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP/FIOCRUZ) 67 IX LISTA DE FIGURAS E TABELAS FIGURAS: Figura I.II. Modelo esquemático do genoma e da poliproteína do HCV. 3 Figura I.III. Prevalência estimada da infecção pelo HCV de acordo com a região geográfica. 6 Figura I.III.I. Distribuição mundial dos genótipos do HCV. Figura I.V. Internalização e replicação do HCV na célula hospedeira. 9 10 Figura I.VI.I Evolução da Hepatite C. TABELAS: Tabela V.I . Dados demográficos e clínicos da amostra populacional. 31 Tabela V.II. Dados demográficos e vias de transmissão dos grupos testes. 32 Tabela V.III.I. Análise dos dados laboratoriais dos grupos persistência viral e eliminação viral espontânea em relação ao tempo de infecção. 34 Tabela V.IV.I. Padrão de normalidade das citocinas em estudo e suas concentrações nos grupos testes em relação ao tempo de infecção. 35 X LISTA DE ABREVIATURA E SIGLAS AHV ALT Anti-HCV APC C CD81 CHC ELISA E1 E2 GCFS HCV HNANB HPT IFNγ IRES IgG IgM IOC IL-1 α IL-1 β IL-2 IL-4 IL-5 IL-6 IL-7 IL-8 IL-10 IL17A IL-21 LAHEP LDL LDRL LTC Mdc NAbs NK NKT NS2 NS3 NS4A NS4B Ambulatório de Hepatites Virais Alanina Aminotransferase Anticorpo contra o antígeno “core” e “ns” do HCV Célula apresentadora de antígeno Proteína Core Grupo de diferenciação 81 Carcinoma hepatocellular Enzyme-Linked Immunosorbet Assay Glicoproteína do envelope 1 Glicoproteína do envelope 2 Fator de estimulação de colônias de granulócitos Hepatiti C virus ou vírus da hepatite C Hepatite não-A, não-B Hepatite pós-transfusional Interferon gama Sítio de entrada interno ribossomal Imunoglobulina G Imunoglobulina M Instituto Oswaldo Cruz Interleucina - 1 alfa Interleucina - 1 Beta Interleucina – 2 Interleucina – 4 Interleucina – 5 Interleucina – 6 Interleucina – 7 Interleucina – 8 Interleucina – 10 Interleucina – 17A Interleucina – 21 Laboratório de Hepatites Virais Lipoproteína de baixa densidade Receptor da lipoproteina de baixa densidade Linfócito T citotóxico Célula dendrítica mielóide Neutralizing antibodies ou Anticorpos neutralizante Natural Killer cell T natural Killer cell Proteína não- estrutural 2 Proteína não- estrutural 3 Proteína não-estrutural 4A Proteína não-estrutural 4B XI NS5A NS5B ORF Pdc pH P7 RNA RNAm RNAt RpRd SR-B1 Th TLR TNFα TGF β Treg UTR VLDL 3’UTR OU 3´NC 5’UTR OU 5’NC Proteína não-estrutural 5A Proteína não-estrutural 5B Open Reading frame ou fase de leitura aberta Célula dendrítica plasmocitóide Potencial hidrogeniônico Proteína P7 Ácido Ribonucleico Ácido Ribonucleico mensageiro Ácido Ribonucleico transportador RNA polimerase RNA dependente Scavenger receptor class B type 1 T helper Toll like receptor Fator de necrose tumoral alfa Fator de crescimento tumoral beta Linfócitos T reguladores Untranslated region ou região não traduzida Lipoproteína de muito baixa densidade Região 3' não codificante ou não traduzida Região 5' não codificante ou não traduzida XII LISTA DE SINAIS, SÍMBOLOS E UNIDADES DE MEDIDA % = > < kb α β γ pg/ml UI/ml µl p Percentual Igual Maior Menor Kilobase Letra alfa Letra beta Letra gama Picograma por mililitro Unidades internacionais por mililitro Microlitro Valor de probabilidade XII I. INTRODUÇÃO I.I - Hepatite não-A, não-B Na década de 70, um estudo realizado com pacientes submetidos à transfusão de sangue, constatou que 10% destes indivíduos desenvolveram hepatite pós-transfusional (HPT). No entanto, tais pacientes não apresentaram qualquer marcador sorológico para as hepatites já conhecidas, hepatite A e B, sugerindo a existência de um novo agente viral para explicar esta nova forma de hepatite, descrita até então como “hepatite não-A, não-B” (HNANB) (Feinstone et al. 1975). Somente em 1989, Qui-Lim-Choo e colaboradores, utilizando-se de técnicas moleculares, relataram a clonagem e sequenciamento genético parcial de uma cepa isolada do plasma de chimpanzés cronicamente infectados com o patógeno da HNANB. Dessa forma, o agente causal da HNANB foi identificado, passando a ser conhecido como vírus da hepatite C (HCV) (Choo et al. 1989). A partir desta descoberta, foram desenvolvidos os primeiros ensaios para a detecção do anticorpo anti-HCV que permitiu constatar que o HCV foi responsável por cerca de 80 a 90% dos casos de HPT (Donahue et al.1992; Chen & Morgan. 2006). Desde então, a hepatite C é caracterizada como um dos maiores problemas de saúde pública mundial, constituindo-se uma das principais causas de hepatite crônica e indicação para transplante hepático (Ministério da Saúde 2011; WHO 2014). I.II Classificação taxonômica e estrutura genômica do HCV O HCV está classificado no gênero Hepacivirus, pertencente à família Flaviviridae. Sua partícula viral, cujo tamanho pode variar de 40 a 70 nm de diâmetro, é constituída por um nucleocapsídeo envolto por envelope lipoproteico, contendo as glicoproteínas E1 e E2, duas das principais proteínas do vírion (Penin et al. 2004; Ashfaq et al. 2011). O genoma do vírus é formado por uma fita simples de RNA de polaridade positiva com cerca de 9600 nucleotídeos (9,6 kb) que apresenta alta variabilidade genética, devido à incorporação errônea de nucleotídeos (ocasionada pela falta de atividade corretiva da enzima RNA polimerase viral no processo de replicação) e a altas taxas de replicação de aproximadamente 10¹² 1 partículas virais por dia (Blackard et al. 2008; Lauring & Andino 2010). Estas alterações encontradas no genoma viral durante o curso da infecção possibilitam a formação de vírus heterogêneos designados quasispecies que estão geneticamente relacionados entre si, dentro de um mesmo hospedeiro (Khaliq et al. 2011). Essas variantes funcionam como estratégia viral contra o sistema imune do hospedeiro, estabelendo a infecção crônica, uma vez que não são reconhecidas por anticorpos neutralizantes pré-existentes (Timm et al. 2007; Moradpour et al. 2007). As extremidades da fita de RNA apresentam duas regiões não codificadoras: 5’UTR (Untranslated region) ou 5’NC (Não-codificante), com aproximadamente 341 nucleotídeos; e 3’UTR ou 3’NC, com cerca de 230 nucleotídeos. A primeira extremidade contém uma série de estruturas secundárias e terciárias onde está inserido o sítio de entrada interno ribossomal ou “Internal Ribosome Entry Site (IRES)”, onde é iniciada a tradução do genoma do HCV em uma poliproteína, gerada a partir de uma sequência de leitura aberta ou Open Reading Frame (ORF), localizada entre as extremidades não codificadoras (Kin & Chang 2013). A poliproteína apresenta aproximadamente 3.010 a 3.033 aminoácidos (de acordo com o genótipo) e sob a ação autoproteolítica e proteolítica da célula hospedeira, origina as proteínas estruturais (C, E1, E2) e as proteínas não estruturais (NS2, NS3, NS4A, NS4B, NS5A, NS5B e o polipeptídeo p7) (Drexler et al. 2009; Idress et al. 2013). A figura I.II mostra o esquema do genoma do HCV e a codificação de sua poliproteína. 2 Figura I.II: (a) O genoma fita simples do RNA do HCV codifica uma região de fase aberta de leitura (ORF) flanqueada por duas regiões não-codificadoras (UTR), que possuem sinais para a proteína viral, síntese de RNA e à coordenação de ambos os processos. A tradução é iniciada através de um sítio de entrada interno ribosomal (IRES), localizado na extreminada 5’UTR. (b) A poliproteína traduzida é processada por proteases celulares e virais. Os números abaixo da poliproteína indicam as posições dos aminoácidos nos sítios de clivagem. (c) Como resultado, 10 proteínas estruturais e não estruturais são codifiadas. A proteína F (“frameshift”) é traduzida a partir de uma região de leitura alternative (ARF). Fonte modificada: Rehermann, 2009. A análise filogenética de cepas do HCV isoladas de várias regiões do mundo levou à identificação de sete genótipos, denominados através de algarismos arábicos (Smith et al. 2014). Essa classificação é baseada no grau de homologia pela análise filogenética de regiões da poliproteína viral. Os genótipos podem apresentar em suas sequências nucleotídicas uma diferença média de cerca de 30%, cuja maior variabilidade concentra-se nas regiões E1 e E2 (Simmonds et al. 2005). Estes grupos genéticos apresentam mais de 50 subgrupos denominados “subclados” ou “subtipos” identificados por letras minúsculas (1a, 1b e etc.) que diferem entre si aproximadamente 20% das suas sequências nucleotídicas (Chen et al. 2006). Entre as “quasispecies” as 3 sequências nucleotídicas do HCV divergem de 1% a 5% (Torres-Puente et al. 2007) I.III Aspectos Epidemiológicos Estima-se que a cada ano cerca de 3 a 4 milhões de pessoas sejam infectadas pelo HCV e que mais de 350 mil evoluem para óbito, vítimas de complicações da infecção. Dados atuais mostram que aproximadamente 130150 milhões de indivíduos, 2,14% da população mundial, encontram-se cronicamente infectados, com risco de evolução para cirrose e hepatocarcinoma (WHO 2014). Apesar da hepatite C ser considerada um problema de saúde pública em diversas regiões do mundo, existe variações quanto à distribuição geográfica do vírus. Em muitos países, há ausência de dados que dificultam investigar a prevalência da infecção. Sendo assim, as estimativas são baseadas em médias ponderadas para cada região, limitadas em sua maioria aos pré-doadores de sangue (Martins et al. 2011). Nas regiões como Ásia Central, Norte da África, Oriente Médio e Europa Oriental, a prevalência para a infecção é alta, sendo estimada em mais de 3,5% (Shepard et al. 2005; Sievert et al. 2011). No sul e sudeste da Ásia, África Subsaariana, Europa Ocidental e Austrália, a prevalência é intermediária, ou seja, cerca de 1,5-3,5% (Alter 2007; Comberg et al. 2011), enquanto na América Latina e América do Norte a prevalência para a infecção é baixa, sendo estimada em menos de 1,5% (Mohd Hanafiah et al. 2013). No Brasil, a grande maioria dos estudos sobre a prevalência da infecção pelo HCV referem-se a doadores de sangue, hemodialisados e hemofílicos. Segundo o último estudo de prevalência de base populacional realizado na faixa etária de 10 a 69 anos, a prevalência para a infecção é de aproximadamente 1,38%, o que classifica o país como região de baixa endemicidade (Ximenes & Moreira 2010). De acordo com o último boletim epidemiológico referente ao período de 2009 a 2011, a grande maioria dos casos no país ocorre nas regiões sudeste (63,2%) e sul (22,3%), (Ministério da Saúde 2012). A figura I.III mostra a prevalência da infecção pelo HCV de acordo com a região geográfica. 4 Figura I.III: Prevalência estimada da infecção pelo HCV de acordo com a região geográfica. Fonte modificada: CDC 2011 Em relação aos genótipos do HCV, estes se encontram distribuídos em diversas regiões geográficas, alguns com destribuição mundial, outros restritos a áreas específicas. Os genótipos 1, 2 e 3 estão presentes em todas as regiões do mundo, porém variando as suas prevalências de acordo com a região (Lee et al. 2008). O genótipo 1, subtipos 1a e 1b, é predominante na Europa, América do Norte, América do Sul e Japão (Kamal 2006). O genótipo 2, subtipos 2a e 2b, é mais comum na China (Dong et al. 2012), também sendo encontrado em altas prevalências em agregados na região do Mediterrâneo (EASL 2011) e nos Estados Unidos (Manos et al. 2012). Nas regiões como Sul da Ásia, Índia e Austrália, o genótipo 3, subtipo 3a, aparece com maior prevalência, assim como em algumas regiões da Europa (Sievert et al. 2011; Chakravarti et al. 2011). O genótipo 4 é mais frequente no norte da África e no Oriente Médio, enquanto os genótipos 5 e 6 aparecem com maior frequência no sul da África e na Ásia (Huy, 2004; Nguyen et al. 2005). Quanto ao genótipo 7, há evidências que apontam sua origem na África Central (Smith et al. 2014). No Brasil, o genótipo 1 possui maior prevalência, variando de 51,7% a 74,1%, seguido do tipo 3, com taxa 5 aproximada de 30,6% e tipo 2, com prevalência de cerca de 4,6% (EspíritoSanto et al. 2007; Silva et al. 2007). Os genótipos 4 e 5 já foram descritos em alguns estudos, porém são pouco frequentes no país (Lampe et al, 2002; Levi et al. 2002). A figura I.III.I mostra a distribuição dos genótipos do HCV no Brasil e em diversas regiões do mundo. Figura I.III.I: Distribuição mundial dos genótipos do HCV Fonte: WHO 2014 I.IV Mecanismos de transmissão Inicialmente o fator mais fortemente associado à disseminação do HCV eram os procedimentos transfusionais. Todavia, desde a implantação dos testes sorológicos anti-HCV em bancos de sangue em 1992, o risco de infecção associado à transfusão de sangue e/ou hemoderivados caiu drasticamente. No entanto, todos os indivíduos submetidos a procedimentos tranfusionais antes de 1992 com ou sem histórico de HPT, constituem grupo de risco para a hepatite C, e devem ser testados para o vírus. No Brasil, a triagem laboratorial nos bancos de sangue tornou-se obrigatória em 1993 para os candidatos a doadores de sangue (Strauss 2001; Chan 2014). 6 Embora a hepatite pós-tranfusional tenha se tornado rara, outros meios parenterais e não parenterais continuam a disseminar o vírus. Atualmente, o compartilhamento de parafernalhas para o uso de drogas ilícitas intravenosas e intranasais constituem uma das principais vias para a infecção, principalmente em países da Europa e nos Estados Unidos (Lauer 2001; Pereira et al. 2013). Outros fatores como acidentes ocupacionais com materiais perfurocortantes contaminados, procedimentos odontológicos, confecções de tatuagens e colocação de piercings, realizados sem as adequadas normas de biossegurança, bem como o compartilhamento de materiais pessoais como alicates de unha, lâmina de barbear e escova de dente, também estão associados à infecção pelo HCV (Martins et al. 2011; Ministério da Saúde 2011). A transmissão nosocomial, definida como aquela que ocorre dentro de ambiente hospitalar ou em qualquer unidade de saúde, tem sido descrita principalmente em pacientes submetidos à hemodiálise e a procedimentos cirúrgicos, sendo muito comum em países como Brasil e Espanha (Santantonio et al. 2006; Martinez-Bauer et al. 2008; Ferreira et al. 2011). A transmissão sexual, também tem sido relacionada à infecção pelo HCV, porém em pequena escala, com maior risco entre indivíduos homossexuais, parceiros heterossexuais (se houver coinfecção pelo HIV), indivíduos com múltiplos parceiros sexuais, relações desprotegidas ou com trauma na mucosa (Jou & Muir 2012). Outra via de exposição ao vírus é a transmissão vertical, ou seja, da mãe para o filho, que desempenha papel de menor importância na infecção, através da exposição do recém-nascido ao sangue contamidado, provavelmente no momento do parto (Yeung et al. 2014) I.V Entrada do HCV na célula hospedeira e replicação O HCV possui tropismo primário por células hepáticas (Pfaender et al. 2014). Todavia, células como os linfócitos B e células dendríticas, também estão sujeitas à infecção pelo vírus (Pachiadakis et al. 2005; Ito et al. 2012). Estudos sugerem que a entrada do HCV no hepatócito depende da interação com receptores de membrana como o CD81, uma proteína 7 tetraspanina, expressa por uma série de células, incluindo os hepatócitos, que se liga a glicoproteína E2 do envelope viral, assim como ocorre com a molécula de superfície celular, o receptor scavenger classe B tipo 1 (SR-B1), mediando à entrada do vírus na célula hospedeira. Há evidências que também apontam a associação do HCV ao receptor da lipoproteína de baixa densidade (LDLR) e ao receptor claudin-1 (Bartenshlager & Lohmann 2000; Brass et al. 2006; Lavie et al. 2007; Dubuisson et al. 2008). Segundo Moradpour et al. (2007) e André et al. (2005), O HCV circula sob várias formas no hospedeiro infectado, podendo estar circulante sob a forma de vírions livres, vírions ligados a imunoglobulinas, bem como associar-se a lipoproteínas de baixa densidade (LDL) e as de muito baixa densidade (VLDL). Desta forma, o receptor LDLR pode servir como coletor primário de partículas do HCV para posterior direcionamento aos receptores SR-B1 e CD81. O receptor claudin-1 supostamente atua no último estágio do processo de entrada do vírus na célula hospedeira, logo após a ligação e interação do HCV com o receptor CD81. Através destas etapas o vírus entra no hepatócito por endocitose mediada por clatrina e acredita-se que ocorra fusão de peptídeos do envelope viral à membrana do endossoma, mediado por baixo pH (Kotsoudakis et al. 2007; Tscherne et al. 2006). Após a entrada do vírus e a liberação da cadeia positiva do RNA do HCV no citossol da célula hospedeira, inicia-se a etapa de tradução em que os ribossomos reconhecem a sequência IRES localizada junto ao códon AUG na extremidade 5’NC. À medida que a tradução ocorre, os aminoácidos que surgem sinalizam para que o complexo traducional (RNAm – ribossomo – RNAt – peptídeo) se dirija para a membrana do retículo endoplasmático rugoso. Nesta organela, a sequência é submetida a clivagens proteolíticas por ação de peptidases celulares para a obtenção das proteínas estruturais (C, E1 e E2) e do polipeptídeo p7 (Moradpour et al. 2007; Penin et al. 2004). A proteína NS2, a primeira proteína não estrutural liberada, inicia a autoclivagem juntamente a uma série de eventos bioquímicos para a origem das outras proteínas não estruturais (NS3, NS4A, NS4B, NS5A e NS5B) a partir do restante da cadeia proteica. As fitas negativas de RNA, complementares ao RNA viral, são obtidas através da ação de uma RNA polimerase - RNA dependente (RpRd), ativada através da associação da NS5A com a NS5B. As fitas geradas servem de molde para que 8 as RpRd sintetizem as novas fitas de RNA polaridade positiva. Ao fim da produção das novas partículas virais, estas são então encapsidadas no retículo endoplasmático e posteriormente envelopadas e maturadas no complexo de golgi, antes da liberação para o meio pericelular (Lindenbach & Rice 2005; Pawlotsky et al. 2007). A figura I.V esquematiza o processo de internalização e replicação do HCV na célula hospedeira Figura I.V: representação esquemática do ciclo replicativo do HCV. (1) Interação dos receptores de membrana celular e partículas virais com internalização do vírus. (2) Endocitose. (3) Desnudamento e liberação citoplasmática. (4) Tradução mediada por IRES e processamento do precursor da poliproteína. (5) Processamento da poliproteína com a clivagem das proteínas não estruturais. (6) Formação do complexo de replicação. (7, 8 e 9) Replicação do RNA. (10) Empacotamento e montagem. (11) Maturação do vírion nas vesículas de transporte. (12) Liberação do vírion. Fonte modificada: Palotsky et al. (2007). 9 I.VI Manifestações clínicas e laboratoriais I.VI.I Fase aguda da hepatite C A fase aguda da infecção pelo HCV dura um período de 6 meses e caracteriza-se pela elevação das transaminases, principalmente alanina aminotransferase (ALT/TGP), associada ou não a período prodrômico (WHO 2014). Os níveis séricos de ALT começam a aumentar entre 2 e 8 semanas após à exposição ao vírus, traduzindo necrose dos hepatócitos, geralmente atingindo níveis até 10 vezes superior ao limite da normalidade, frequentemente com padrão flutuante (Major et al. 2004; Chung 2005). Durante as primeiras 2 semanas de infecção aguda, o RNA do HCV poderá ser identificado no soro/plasma do indivíduo antes da presença do antiHCV. Os níveis de HCV-RNA aumentam rapidamente, atingindo o ponto máximo entre 105 e 107 UI/ml, antes dos picos dos níveis séricos das transaminases, coincidindo com o início dos sintomas, o que não ocorre com os indivíduos assintomáticos (Chen & Timothy 2006; Ozaras & Tahan 2009) (Figura I.VI.I) Figura I.VI.I: Evolução da hepatite C. Fonte: Ministério da Saúde, 2011 Neste período, a grande maioria dos indivíduos infectados apresenta evolução subclínica com cerca de 80% dos casos assintomáticos e anictéricos. Apenas 20-30% dos indivíduos infectados apresentam icterícia (caracterizada pela coloração amarelada da pele, mucosas e escleróticas) e cerca de 10-20% 10 desenvolvem sintomas inespecíficos, semelhantes aos decorrentes de infecções por outros agentes virais hepatotrópicos, como anorexia, colúria, astenia, malestar e dor abdominal, que podem ter início em aproximadamente 6 a 12 semanas após a exposição ao vírus. Em apenas 20% dos pacientes sintomáticos o início dos sintomas precede à soroconversão, o que raramente ocorre num período superior a 6 meses (Ministério da Saúde 2011). Na infecção aguda autolimitada, os sintomas podem persistir durante algumas semanas e diminuir com o decréscimo dos níveis de ALT/TGP e dos níveis de HCV-RNA. A resolução da infecção é caracteriza pela não detecção do HCV-RNA no soro/plasma do indivíduo infectado (geralmente em até 12 semanas após o início da doença) (Wasley et al. 2000; Nomura et al. 2004; Sofian et al. 2012), e está mais frequentemente associada ao desenvolvimento de sintomatologia e a fatores intrínsecos do hospedeiro como raça branca, sexo feminino e idade abaixo de 40 anos (Conjeevaram et al. 2006; Santantonio et al. 2008; Hajarizadeh et al. 2013). I.VI.II Fase crônica da hepatite C A fase crônica da infecção é decorrente da persistência do HCV por mais de seis meses após o início da doença (WHO 2014). Neste período, os níveis séricos de ALT apresentam-se com elevações intermitentes em aproximadamente 60-70% dos casos, não ultrapassando 15 vezes o valor da normalidade, e os níveis de HCV RNA permanecem relativamente estáveis durante longo período, variando menos 0,5 log na maioria dos indivíduos infectados (Kuramoto et al. 2002; Alberti et al. 2005). Nas primeiras duas décadas após a infecção, há evolução progressiva sem sinais ou sintomas. Nos casos mais graves, em cerca de 5-20% dos indivíduos infectados, ocorre progressão para cirrose com descompensação hepática, caracterizada por hipertensão portal cursando com ascite, varizes esofágicas e encefalopatia hepática. Na ausência de tratamento, há risco de evolução para carcinoma hepatocelular (CHC), o que ocorre aproximadamente em 1-5% dos casos (Charlton et al. 2001; Sheeff 2002; Chen & Timothy 2006). 11 Frequentemente os indivíduos infectados são diagnosticados nesta fase da infecção. Como os sintomas são inespecíficos, a doença pode evoluir durante anos, sem diagnóstico. Na maioria dos casos, o diagnóstico específico é obtido após testes sorológicos de rotina e em alguns casos em doações de sangue (Roth et al. 2002; Thomas et al. 2000). I.VII Patogênese O HCV é um vírus que não exerce efeito citopático direto sobre a célula hospedeira. A necrose celular dá-se através de mecanismos imunomediados e da indução de fenômenos metabólicos como esteatose hepática, estresse oxidativo e resistência à insulina. Alguns fatores virais, como as proteínas codificadas por regiões subgenômicas do vírus e suas quasiespécies, podem influenciar os mecanismos acima e assim contribuir para a patogênese da hepatite C (Arrese et al. 2010; Kondo et al. 2011; Irshad et al. 2013). Fatores intrínsecos do hospedeiro também parecem estar implicados na patogênese da infecção, como o gênero e a raça, sendo aceito que a doença costuma progredir mais rapidamente no sexo masculino e em afrodescendentes (Conjeevaram et al. 2006; Missiha et al. 2008). A idade do paciente no momento da infecção também se mostra relevante, havendo pior prognóstico naqueles com idade superior a 40 anos. Fatores extrínsecos como a coinfecção com o vírus da hepatite B (HBV) e/ou HIV também podem contribuir para a progressão da doença e para o desenvolvimento de cirrose e/ou hepatocarcinoma. Outro importante fator, variável independente no prognóstico evolutivo da fibrose hepática é o consumo alcoólico (Lauer & Walker 2001; NIH 2002). Embora a infecção pelo HCV persista em cerca de 55-85% dos casos, cerca de 15-45% dos indivíduos infectados sofrem eliminação viral espontânea durante a fase aguda da doença (WHO 2014). No entanto, os fatores imunológicos que determinam a resolução ou a persistência da infecção não estão bem definidos. Como os indivíduos infectados raramente apresentam sintomatologia durante a fase inicial da infecção, pouco se sabe sobre a resposta imunológica durante este período (Selvarajah et al. 2012; Grebly et al. 2012; Lauer 2013). 12 I.VIII Resposta Imune Para combater as infecções virais, o hospedeiro dispõe de dois mecanismos de defesa: a resposta imune inata e a reposta adquirida (humoral e celular). A reposta imune inata funciona como a primeira barreira imunológica. Sua função consiste em limitar a propagação do vírus e ativar a resposta imune adquirida por meio da apresentação de antígenos a células específicas. A resposta imune adquirida é a segunda linha de defesa imunológica indispensável para o controle de infecções por vírus não-citopáticos, como o HCV. Alguns estudos sugerem que na hepatite C, a resposta adquirida modulada por células exerce papel central no desfecho da infecção, uma vez que o HCV possui a habilidade de se ocultar diante da resposta imune inata e humoral (Dustin & Rice 2007; Plauzolles et al. 2013; Larrubia et al. 2014). I.VIII.I Resposta imune inata ao HCV No fígado, existe uma grande população de macrófagos denominados células de Kupffer e uma alta frequência de células natural killer (NK), células T natural killer (NKT) e vários tipos de células dendríticas (DCs) que estão relacionadas à resposta imune inata (Schoggings & Rice 2013). Na infecção pelo HCV, esta resposta aparece minutos ou horas depois da exposição ao vírus, sendo responsável por ativar a produção de citocinas como os IFNs tipo 1 (IFN-α e IFN-β) pelas células de Kupffer e DCs (Shin et al. 2006; Takahashi et al. 2010). Tais citocinas agem na infecção inibindo a replicação do vírus em células infectadas e promovem um estado antiviral em células vizinhas não infectadas, através da indução da expressão de genes antivirais estimulados pelo interferon (ISGs). Não menos importante, os INFs tipo 1 também ativam uma variedade de células efetoras, dentre estas, as células de Kupffer, DCs, células NK e NKT (Bode et al. 2008; Stetson & Medzhitov 2006; Heim et al. 2013). A partir da ativação destas células ocorre a multiplicação da resposta antiviral e a liberação de citocinas pró-inflamatórias e quimiocinas que induzem a ativação de mais células imunes residentes no fígado e o recrutamento de células do sistema imune periférico (Brenndorfer et al. 2011). 13 As DCs, assim como os macrófagos, fazem parte das células apresentadoras de antígenos (APCs). Estas células desempenham papel importante na interação da resposta imune inata com a adquirida, pois, são capazes de migrar do sítio da infecção para os órgãos linfóides secundários e ativar os linfócitos T virgens (naive) através da apresentação do antígeno viral. Isto resulta na indução de células T e B específicas para o vírus (Adema et al. 2009; Zhou et al. 2012). Em humanos, as DCs são divididas em dois subconjuntos: DCs mielóides (mDCs) e DCs plasmocitóides (pDCs). As mDCs secretam citocinas como IL-10 e IL-12 e expressam receptores de reconhecimento de padrões como os Toll-Like receptors (TLR)3 e o TLR8, enquanto as pDCs são caracterizadas pela produção de IFNα e expressão de TLR7 e TLR9 (Kadowaki 2009; Mansour et al. 2010) Na infecção pelo HCV, há evidências que sugerem que os indivíduos que apresentam altas concentrações de mDCs circulantes durante a fase aguda da infecção possuem maior predisposição à eliminação do vírus, enquanto aqueles que mostram baixas alterações nos números de mDCs estão sujeitos à persistência viral (Perrela et al. 2006; Pelletier et al. 2013). Além disso, alguns autores demonstraram que as pDCs apresentam-se com menor frequência no sangue periférico de pacientes com hepatite C crônica, tendo a produção de IFNα prejudicada (Kanto et al. 2004; Dolganiuc et al. 2006). Na infecção autolimitada, um estudo demonstrou produção reduzida de IFNα pelas pDCs (Ulsenheimer et al. 2006). As células NK são caracterizadas pela capacidade de destruir células infectadas e inibir diretamente a replicação viral através da produção de INFγ (Smyth et al. 2005; Stegmann et al. 2012). Estas células são extremamente importantes em infecções no fígado, pois sua presença neste órgão é maior do que no sangue ou em qualquer outro órgão (Racanelli & Rehermann 2006). Na infecção pelo HCV, as células NK atuam através da polarização de grânulos em direção a células infectadas e consequente liberação de perforinas que fragmentam o núcleo da célula, induzindo à morte da mesma (Rehermann et al. 2000). Estas também desempenham função imunomodulatória, estando aptas a secretar uma variedade de citocinas como IL-10, IL-13, TGFβ e TNFα (Andoniou et al. 2006). Além das NK, as células NKT também estão presentes em altas 14 concentrações no fígado, sendo encontradas produzindo as citocinas INFγ e IL-4 na infecção (Geissman et al. 2005; Brenndorfer et al. 2011). Apesar de o hospedeiro montar uma resposta primária contra o HCV, este vírus possui uma série de mecanismos para burlar a resposta imune inata (Horner et al. 2013). Dentre estes mecanismos, destaca-se como principal estratégia de evasão a interrupção da produção da citocina IFNα pela ação inibitória das proteínas NS3 e NS4A do HCV (Horner et al. 2014). Outro importante mecanismo de escape está na atividade anti-ISGs, exercida pela proteína NS5A do vírus, promovendo o declínio na expressão desses genes (Tagushi et al. 2004). A interação da glicoproteína E2 com o receptor CD81 das células NK, também funciona como mecanismo de evasão do HCV, inibindo a atividade das células NK e comprometendo a citotoxidade e a produção de INFγ por estas células (Crotta et al. 2002; Tseng & klimpel 2002). Além disso, evidências demonstraram que o complexo de replicação viral parece ser formado por uma rígida estrutura de membrana, resistente a proteases e nucleases in vitro, o que possivelmente protege o HCV da detecção da resposta imune inata (Thime et al. 2006) I.VIII.II Resposta humoral ao HCV A imunidade humoral ao HCV é avaliada através de testes sorológicos para a pesquisa de anticorpos específicos anti-HCV. Estes anticorpos aparecem tardiamente na infecção pelo HCV, em torno de 7 a 8 semanas após a exposição ao vírus, permanecendo durante todo o curso da infecção crônica. Inicialmente os títulos de anticorpos são geralmente baixos, com afinidade por isotipo limitada (Bowen & Walker 2005; Elliott et al. 2006) Nos indivíduos que eliminam o vírus espontaneamente, os níveis de anticorpos diminuem gradualmente (Strasak et al. 2011). Embora esta resposta seja eficaz em uma minoria de indivíduos que resolvem a infecção pelo HCV, a produção de anticorpos não é uma exigência absoluta para a eliminação do vírus. Alguns estudos demonstraram que indivíduos com hipogamaglobulinemia, caracterizada pela alteração da imunidade devido a baixos títulos séricos de anticorpos, eliminam o vírus espontaneamente em proporções semelhantes à 15 população geral, e que a recuperação não está relacionada aos títulos de anticorpos anti-HCV ou aos títulos de anticorpos neutralizantes (nAbs) (Logvinoff et al. 2004; Semmo et al. 2006). Os anticorpos neutralizantes contra o HCV foram identificados em chipanzés e humanos sendo produzidos pelas células B e direcionados principalmente a região hipervariável 1 da glicoproteína E2 do envelope viral (Farci et al. 1999; Lavillette et al. 2005; Fafi-Kremer et al. 2012). Estes anticorpos encontram-se reativos no soro de pacientes com hepatite C crônica, porém, na fase aguda da infecção os pacientes não exibem títulos detectáveis de nAbs (Bartosch et al. 2003; Logvinoff et al. 2004). A ineficácia dos anticorpos no combate a infecção pelo HCV pode ser explicada pela rápida alteração nas sequências nucleotídicas e mutações das proteínas de envelope viral, também ocasionadas pela pressão imunológica do hospedeiro sobre o vírus, que selecionam variantes genômicas que funcionam como mecanismo de escape a resposta imune. As diferentes mutações originam as quasiespécies do HCV que circulam como uma mistura de variantes imunológicas. Qualquer uma destas variantes pode passar a ser a cepa dominante no instante em que as cepas coexistentes forem controladas pelo sistema imune. A partir das quasiespécies, o vírus burla a resposta humoral se adaptando a pressão imunitária exercida pelos anticorpos, o que acaba por provocar a persistência da infecção, mesmo diante da ação dos anticorpos neutralizantes (Geaninnni & Bréchot 2003; Heo et al. 2004; Fishman & Branch 2009). Em alguns estudos, foi observado que a infecção pelo HCV foi resolvida pela resposta celular modulada pelos linfócitos T CD8+ e CD4+ específicos, onde não houve produção de anticorpos anti-HCV, mostrando que a imunidade humoral nem sempre é necessária na infecção pelo HCV (Lechner et al. 2000; Takaki et al. 2000; Shoukry et al. 2003; von Hahn et al. 2007) I.VIII.III Resposta imune celular adquirida e citocinas A resposta imune celular mediada por linfócitos T (LT) é um dos mecanismos principais envolvidos na lesão hepática e de suma importância nas 16 doenças virais e auto-imunes (Martins 2001). Esta resposta aparece tardiamente na infecção pelo HCV, geralmente a partir de 8 a 12 semanas após a exposição ao vírus, independentemente do desfecho (Abdel-Hakeem & Shoukry 2014; Park & Rehermann 2014). De acordo com Irshad et al. (2008) e Heller et al. (2013) os linfócitos T CD8+ citotóxicos (LTC) e T CD4+ estão intimamente relacionados com a resolução espontânea e com a persistência do HCV. Estas células quando ativadas pelos estímulos antigênicos do vírus, iniciam a expansão clonal e proliferam exercendo funções específicas na infecção. Segundo Bertoletti & Ferrari (2003), Neumann-Haefelin et al. (2007) e Schmidt et al. (2013), em indivíduos com hepatite C crônica, o fenótipo e a função dos linfócitos T CD8+ encontram-se comprometidos. Nesta fase da infecção, os linfócitos T CD8+ não proliferam significativamente devido à persistência na expressão de receptores para a molécula PD-1 (programmed death – 1) em sua superfície celular, e não expressam os receptores de IL-7, o CD127, que desempenha papel crucial na sobrevivência de linfócitos T maduros. Como consequência, ocorre baixa produção de citocinas como o IFNy e o nível de citotoxidade específica encontrase comprometido. Em contrapartida, em indivíduos que evoluem para a resolução espontânea, ocorre a perda da expressão de receptores para a molécula PD-1 e há aumento na expressão de receptores como o CD127 na superfície dos linfócitos T CD8+. Desta forma, estas células respondem a infecção de forma mais vigorosa e direcionada a mais de um epítopo do vírus, promovendo a indução da apoptose nas células hepáticas infectadas ou impedindo a replicação viral através da produção da citocina INFγ (Lauer et al. 2004; Jo et al. 2009; Sung et al. 2014). Quanto aos linfócitos T CD4+, estes respondem de forma fraca, retardada ou transitória nos indivíduos que desenvolvem infecção crônica. Por outro lado, estas células apresentam resposta duradoura, altamente vigorosa e multiespecífica naqueles que eliminam espontaneamente o vírus (Wertheimer et al. 2003; Schulze Zur Wiesch et al. 2012; Lauer 2013). Quando ativados, os linfócitos T CD4+ diferenciam-se em três subtipos celulares diferentes: T helper 1 (Th1), T helper 2 (Th2) ou T helper 17 (Th17), que produzem conjuntos distintos de citocinas que contribuem para a defesa do hospedeiro, regulação 17 das respostas imunológicas e proliferação e diferenciação das células T e B (Carbo et al. 2013). Segundo Abbas (2011) citocinas são proteínas heterogêneas solúveis que dirigem e amplificam a resposta imune do hospedeiro. Estas proteínas são produzidas por uma série de células envolvidas na resposta imune inata e adquirida e exercem papel extremamente relevante frente à infecção provocada pelo HCV, contribuindo para maior ou menor lesão hepática e progressão da doença (Marcellin et al. 2002). De uma maneira geral, as citocinas modulam e regulam todos os aspectos da resposta imune do hospedeiro através da capacidade de atuarem em diversos tipos celulares, exercendo efeitos biológicos variáveis devido a propriedades distintas (Fallahi et al. 2012). Existe uma série de citocinas que atuam em diversas células teciduais. No entanto, na maioria dessas células, como os hepatócitos, a síntese dessas citocinas é nula ou baixa, porém, frente a infecções como a provocada pelo vírus da hepatite C, a expressão dessas proteínas passa a ser estimulada. Na infecção pelo HCV, são expressas citocinas que podem ser classificadas em subgrupos de acordo com sua função, são estas: citocinas pró-inflamatórias, como a IL-1 (α e β), IL-8, IL17A, IL-21 e o Fator de Necrose Tumoral (TNFα); citocinas anti-inflamatórias como a IL-6 e IL-10; citocinas próprias de infecções mediadas pela resposta Th1 como IL-2 e IFNγ; citocinas envolvidas na resposta Th2 como IL-4 e IL-5 e por fim, citocinas fibrogênicas como o Fator de Crescimento Tumoral–TGF (β) e as anti-fibrogênicas como o INFα (Tilg et al. 2006; R-Viso et al. 2010). A IL-17A, comumente chamada de IL-17, é produzida pelas células Th17, células NK, células NKT, bem como outros tipos celulares (Xu & Cao 2010). Esta interleucina estimula as células dendríticas a promover a resposta Th1 (Feng et al. 2011) e exerce efeito sobre células mielóides e mesenquimais para induzir a expressão do fator de estimulação de colônias de granulócitos ou granulocyte colony-stimulating factor (GCSF), bem como de IL-6 e algumas quimiocinas, para o recrutamento de neutrófilos no sítio da infecção (Kolls & Lindén 2004). Algumas pesquisas sugerem que a IL-17 contribui para a inflamação no fígado, induzindo a produção de citocinas pró-inflamatórias e de quimiciocinas (Lafdil et al. 2010). Na infecção pelo HCV, alguns autores observaram esta interleucina aumentada no fígado de pacientes com hepatite C crônica (Harada et al. 2009; 18 Lan et al. 2009), enquanto outros evidenciaram altos níveis de IL-17 no plasma de pacientes que eliminaram o vírus espontaneamente durante a fase aguda da doença (Kared et al. 2013) e após transplante de fígado (Seetharam et al. 2011). A IL-21 é expressa por células NKT e pelos linfócitos Th17. Atua na proliferação de células linfoides, na diferenciação das células B, podendo exercer efeito proapoptótico. Também aumenta a citotoxidade dos linfócitos T CD8+ e células NK, inibe a apresentação de antígeno pelas células dendríticas e regula o desenvolvimento das células Th17 (Leonard et al. 2008). Além disso, esta citocina está relacionada ao desenvolvimento de doenças autoimunes e a atividade antitumoral (Spolski & Leonard 2008; Sondergaard & Skak 2009). Alguns estudos sugerem que na infecção pelo HCV a IL-21, produzida pelas células Th17, possa contribuir para a eliminação viral em pacientes com hepatite C crônica através do resgate dos linfócitos T CD8+ (Yi et al. 2009; Feng et al. 2013). Por outro lado, outra pesquisa evidenciou forte produção de IL-21 e altas concentrações desta citocina no plasma de pacientes que evoluíram para a eliminação viral espontânea durante a fase aguda da infecção pelo HCV (Kared et al. 2013). O TNFα é produzido pelas células de Kupffer e células T (Lafont et al. 2000). Esta citocina exerce proteção contra vírus, aumenta a expressão da molécula de histocompatibilidade classe I (MHC), potencializa os linfócitos citotóxicos auxiliando na lise de célula infectadas por vírus, além de estimular a produção de outras interleucinas (Janeway et al. 2007). Também esta relacionada à proliferação de hepatócitos normais e a inflamação e apoptose de hepatócitos infectados (Koutouras et al. 2003; Kasprzak et al. 2004). Na infecção pelo HCV, alguns trabalhos evidenciaram altas concentrações de TNFα no sangue de pacientes com hepatite C crônica (Nelson et al. 1997; Moura et al. 2009) e outro estudo relacionou as baixas concentrações à lesão hepática mínima (Macías et al. 2001). Por outro lado, um estudo constatou altas concentrações de TNFα na fase aguda da hepatite C e relacionou a eliminação viral espontânea (Osborn et al. 2013). A IL-6 é produzida pelas células de Kupffer, células endoteliais, células T, entre outros tipos celulares. Esta citocina tem função extremamente relevante na síntese de proteínas de fase aguda na inflamação hepática como a proteína C reativa (CRP), na hematopoiese, e defesa do hospedeiro (Tanaka & Kishimoto 19 2014). Na hepatite C crônica, a IL-6 foi encontrada em concentrações significativamente altas tanto no fígado quanto no sangue (Ueyama et al. 2011; Zampino et al. 2013) e está relacionada a progressão para o câncer hepático (Bower & Walker 2005; Porta et al. 2008). A IL-10 é secretada por monócitos, macrófagos, células B e por vários subtipos de células T, principalmente pelos linfócitos Th2 (Sabat et al. 2010). No fígado esta citocina é produzida pelos hepatócitos, células endoteliais, células de Kupffer, células estreladas e linfócitos (Zang & Wang 2006). Sua função biológica principal consiste na limitação e eliminação de respostas inflamatórias, bem como a regulação da diferenciação e proliferação de células T, células B, células NK, células apresentadoras de antígenos (APCs), mastócitos e granulócitos (Asadullah et al. 2003). Alguns estudos sugerem que a IL-10 participe de respostas inflamatórias inibindo a produção de INFγ (Piazzolla et al. 2000) e suprima a proliferação de respostas Th1, Th2 e Th17, induzindo a anergia (Taylor et al. 2006; Oft 2014). Há evidências do aumento desta citocina na fase inicial da infecção pelo HCV, em indivíduos que progrediram para infecção crônica (Kaplan et al. 2008; Flyn et al. 2011; Osborn et al. 2013). Alguns trabalhos demonstraram redução da fibrose hepática em pacientes infectados pelo HCV quando esta interleucina é administrada (Nelson et al. 2003; Paladino et al. 2006) e outras pesquisas relataram que o polimorfismo no gene da IL-10 pode influenciar a eliminação espontânea do HCV na fase aguda (Lio et al. 2003; Ramos et al. 2012). A IL-2 é produzida principalmente pelos linfócitos Th1 e em menor extensão pelos linfócitos T CD8+, células NK, entre outras células. Esta citocina desempenha papel crucial na homeostase das células T regulatórias (Treg), expansão dos linfócitos T CD8+ específicos ao antígeno, bem como a diferenciação das células T CD4+ efetoras para o fenótipo Th1 (Malek 2008; Yu et al. 2009; Boyman & Sprent 2012). Na infecção pelo HCV, as altas concentrações de IL-2 podem estar associadas à resolução espontânea (SmykPearson et al. 2008), enquanto as baixas concentrações à progressão para a hepatite C crônica (Semmo et al. 2005). O IFNγ é uma citocina pleiotrópica, produzida pelos linfócitos Th1, linfócitos T CD8+, células NK, células B, células NKT e pelas (APCs) (Frucht et al. 2001; Flaishon et al. 2000). Esta citocina é um potente ativador de 20 macrófagos, aumentando a sua atividade microbicida através da indução da produção de citocinas como IL-1, IL-6, IL-8, TNFα e óxido nítrico. Também atua na ativação de neutrófilos, células NK e células endoteliais vasculares, na diferenciação de células B e linfócitos T CD8+, aumenta a atividade das células Th1 e inibe a produção de células Th2 bloqueando os efeitos da IL-4. É uma citocina ativa em infecções virais, com efeito inibitório na replicação do patógeno em células infectadas (Gattoni et al. 2006; Janeway et al. 2007). Na hepatite C, alguns estudos evidenciaram a inibição da replicação do HCV pelo INFγ (Frese et al. 2002; Windish et al. 2005) e outra pesquisa encontrou baixos níveis desta citocina em pacientes na fase crônica da infecção (Mousa et al. 2014). Outros autores observaram alta produção de INFγ na fase aguda da doença em pacientes que eliminaram o vírus espontaneamente antes dos seis meses (Gruner et al. 2000; Flynn et al. 2011), assim como no modelo animal chimpanzé (Thimme et al. 2001). Todavia, alguns estudos associaram às altas concentrações desta proteína no fígado e no sangue a hepatite C crônica (RViso et al. 2010; Zhao et al. 2013). A IL-4 é expressa principalmente por células Th2, mastócitos, eosinófilos e basófilos. Esta citocina aumenta a expressão de moléculas de histocompatibilidade classe II (MHC), exerce efeito proliferativo e antiapoptotico nas células T, promove a diferenciação dos linfócitos T CD4+ efetores para o fenótipo Th2, estimula a produção de anticorpos neutralizantes, bloqueia os efeitos do INFγ e da IL-1, inibi a ativação de macrófagos e estimula a produção de TGFβ e IL-10 (Janeway et al. 2007; Gadani et al. 2012; Chambers et al. 2013). Na infecção pelo HCV, as concentrações de IL-4 demonstraram-se elevadas durante a fase crônica da doença (Spanakis et al. 2002; R-Viso et al. 2010). A IL-7 é produzida preferencialmente por células epiteliais e mesenquimais de órgãos linfoides como timo e medula óssea (Hara et al. 2012). Esta citocina atua como fator de crescimento e fator anti-apoptótico das células T e B e é necessária para a manutenção das células T de memória e sobrevivências das células T virgens (naive) (Abbas 2011). No fígado, a IL-7 foi encontrada induzindo a proliferação dos linfócitos T CD8+ citotóxicos em resposta a infecções virais crônicas (Sawa et al. 2009; Nanjappa et al. 2011). Na hepatite C, as informações sobre o papel da IL-7 são escassas. Todavia, alguns 21 estudos propõem a utilização desta citocina como estratégia terapêutica no combate à hepatite C crônica (Seigel et al. 2011; Pellegrini et al. 2011). Mais recentemente, um estudo demonstrou que o receptor da IL-7, o CD127, é expresso pelos linfócitos T CD8+ quando a infecção é eliminada durante a fase aguda, sugerindo que a IL-7 pode estar relacionada à resolução da infecção (Shin et al. 2013). 22 II. JUSTIFICATIVA A investigação de citocinas associadas à patogênese da hepatite C aguda ainda é limitada devido ao grande número de casos assintomáticos (Bush, 2001; Selvarajah et al. 2012). Na grande maioria dos estudos, as amostras biológicas analisadas na fase inicial da infecção são obtidas através do monitoramento frequente de indivíduos em situação de risco, como usuários de drogas e profissionais de saúde, que geralmente não desenvolvem sintomatologia (Lechner et al. 2000; Thimme et al. 2001; Flynn et al. 2011; Osborn et al. 2013). Além disso, o alto custo de pesquisas com primatas não humanos e a não existência de um modelo animal não primata, dificultam a pesquisa e o conhecimento da interação do HCV com o hospedeiro. Deste modo, apesar de ser encontrado na literatura diversas correlações entre hepatite C e citocinas, os dados ainda são bastante controversos e se questiona quais destas proteínas estão de fato associadas à resolução ou à persistência da infecção pelo HCV. Para sanar tais questionamentos, são necessários estudos voltados para os primeiros meses de interação entre o HCV e a resposta imune do hospedeiro que apontem os determinantes imunológicos iniciais responsáveis pelo desfecho da infecção. Neste contexto, este estudo avaliou a expressão e a concentração de diversas citocinas no plasma de pacientes ictéricos, durante a fase aguda da infecção pelo HCV, que poderiam estar relacionadas com a resolução espontânea ou com a persistência viral. A investigação de citocinas envolvidas no desfecho da hepatite C aguda é recurso extremamente importante para a compreensão da patogênese da infecção e para o prognóstico evolutivo da doença, de forma a evitar a progressão para a hepatite C crônica. 23 III. OBJETIVOS III. I Geral Investigar a relação dos níveis plasmáticos de citocinas com o desfecho da hepatite C aguda em indivíduos sintomáticos III. II Específicos a) Avaliar a expressão das citocinas TNFα, INFγ, IL-2, IL-4, IL-6, IL-10, IL-7, IL-21 e IL-17A em amostras de plasma de indivíduos ictéricos na fase aguda da infecção pelo HCV, através de imunoensaio multiplex. b) Comparar os níveis de citocinas entre pacientes que evoluíram para a eliminação viral espontânea durante a fase aguda e pacientes que desenvolveram infecção persistente. 24 IV. MATERIAIS E MÉTODOS IV.I Desenho de estudo Trata-se de um estudo retrospectivo, longitudinal, realizado a partir de amostras pertencentes ao biorrepositório de amostras do Ambulatório de Hepatites Virais (AHV), unidade de atendimento ambulatorial integrante do Laboratório de Referência Nacional para Hepatites Virais (LAHEP), do Instituto Oswaldo Cruz (IOC)/Fiocruz, para a investigação da relação dos níveis plasmáticos de citocinas com o desfecho da infecção aguda pelo HCV em indivíduos sintomáticos. A análise retrospectiva também foi baseada na consulta de dados registrados nos prontuários dos pacientes atendidos no AHV. IV.II Aspectos Éticos Este estudo está vinculado ao projeto base: “Fase aguda da infecção pelo vírus da hepatite C: avaliação da resposta imunológica celular e humoral”, financiado pelo Instituto Nacional da Saúde (National Institute of Health ou NIH) dos EUA, sob o nº U19 AI066345-01 (Catalog of Federal Domestic Assistance CFDA Nº 93.856), desde 2005 com renovação até 2015. O mesmo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Fiocruz (CEP/Fiocruz 0142/2001) (Anexo A), com o termo de consentimento livre esclarecido (TCLE) obtido de todos os participantes (Anexo B). IV.III O Ambulatório de Hepatites Virais (AHV) O LAHEP/IOC foi credenciado, em 1986, como Laboratório de Referência Nacional para Hepatites Virais pelo Ministério da Saúde, desempenhando importante papel na assessoria ao mesmo, por meio de uma série de atividades relacionadas à pesquisa e ao diagnóstico precoce das hepatites virais. O Ambulatório de Hepatites Virais, criado em 1997, é o local de captação dos pacientes e amostras biológicas para os estudos desenvolvidos no LAHEP. Sua atuação concentra-se na investigação e esclarecimentos dos diferentes quadros e tipos de hepatites virais. Desde sua criação até o ano de 2014 foram 25 registrados pelo menos 19 mil atendimentos de casos suspeitos de hepatites virais, com aproximadamente 200 casos caracterizados como hepatite C aguda. IV.IV Coorte hepatite C aguda A coorte de hepatite C aguda do AHV é constituída de cerca de 200 pacientes com quadro confirmado ou suspeito de infecção aguda. Estão inclusos na coorte, indivíduos maiores de 18 anos, sintomáticos e assintomáticos (com soroconversão recente para anti-HCV positivo), monoinfectados e coinfectados com o vírus da hepatite B e/ou HIV, e portadores de doença renal crônica. A via de transmissão da maioria dos casos foi a nosocomial (70%), seguido da sexual (25%). Cerca de 75% destes pacientes desenvolveram sintomatologia na fase aguda, tendo apresentado icterícia e/ou colúria, com elevação nos níveis de ALT, e aproximadamente 50% destes apresentaram resolução espontânea durante este período. Uma vez que o diagnóstico de hepatite C aguda é dificultado pela ausência de um marcador específico, foram considerados como casos confirmados todos os indivíduos que apresentaram soroconversão recente para anti-HCV e HCV-RNA detectado no soro ou plasma. Aqueles que não apresentaram soroconversão, porém tinham fator de risco compatível com a transmissão do HCV, níveis de ALT elevados, pelo menos 5 vezes acima do valor da normalidade, história clínica nos últimos seis meses, incluindo icterícia e HCV-RNA detectável, foram classificados em casos suspeitos. IV.V Amostra populacional A amostra populacional foi constituída de pacientes sintomáticos inclusos na coorte de hepatite C aguda do AHV, recrutados de janeiro de 2003 a dezembro de 2012. Esta amostra foi distribuída em dois grupos de acordo com o desfecho da infecção: eliminação viral espontânea e persistência viral (cronicidade). 26 IV.V.I Critérios de inclusão Apenas pacientes ictéricos, com permanência mínima de 1 ano no projeto base, e recrutados na fase aguda da infecção pelo HCV foram incluídos no estudo. Estabeleceu-se ainda, 2 períodos distintos da infecção aguda, relacionados a resposta imune celular adquirida durante estes períodos, conforme relatado na literatura por Lauer (2013) e Park (2014). Desta maneira, o tempo 1 correspondeu a 8,0-10,5 semanas (início da resposta imune celular) e o tempo 2 a 16,0-18,5 semanas (diferença na qualidade da resposta das células T em relação ao desfecho da infecção). Tais tempos foram selecionados a partir do cálculo da provável data da infecção de cada paciente. Desta forma, os pacientes ictéricos com o fator de risco para a infecção conhecido como: intervenções cirúrgicas, procedimentos invasivos (endoscopia, colonoscopia, acesso intravenoso), procedimentos odontológicos, acidente perfurocortante com material de fonte HCV positivo, tatuagens e piercings, tiveram a data da exposição de alto risco considerada como a data da infecção. Na ausência desta informação, foi considerada como provável data de infecção 6 semanas anteriores ao início da icterícia (Lewis-Ximenez et al. 2010). IV.V.II Critérios de exclusão Não foram incluídos no estudo pacientes que apresentaram um ou mais dos seguintes critérios: uso de imunossupressores e/ou antivirais; coinfecção pelo vírus da hepatite A (anti-HAV IgM positivo); coinfecção pelo vírus da hepatite B (HBsAg positivo); coinfecção pelo vírus da imunodeficiência humana (anti-HIV 1+2 positivo); doença renal crônica. IV.VI Grupo controle Foram selecionados indivíduos do AHV, soronegativos para as hepatites virais A, B e C, e HIV negativos (n=9) como integrantes do grupo controle com o objetivo de obter um padrão de normalidade para cada citocina em estudo. Estes indivíduos apresentaram distribuição por sexo, idade e raça semelhantes a amostra populacional 27 IV.VII Amostras biológicas Foram selecionadas duas amostras de plasma de cada indivíduo admitido no estudo, separadas de acordo com o desfecho da hepatite C aguda: eliminação viral espontânea e persistência viral. Cada uma destas correspondeu a um momento distinto da infecção pelo HCV estabelecidos para análise. Quanto ao grupo controle, apenas uma amostra de plasma de cada indivíduo foi utilizada, totalizando nove amostras para testagem. Todas as amostras selecionadas foram analisadas no LAHEP/IOC para a pesquisa de marcadores sorológicos para as hepatites virais A, B e C. Todavia, apenas as amotras da população de estudo foram submetidas a ensaios para a detecção do HCV-RNA (teste quantitativo) e genotipagem viral, bem como para a dosagem de alanina aminotransferase (ALT), conforme protocolo de acompanhamento dos pacientes atendidos no AHV. Os ensaios para pesquisa de anticorpos anti-HIV 1+2 (HIV Ag/Ab COMBO Architect System, Abbott, EUA) foram realizados no Laboratório Central Noel Nutels – LACEN/RJ. Para a detecção e quantificação do HCV-RNA e genotipagem viral, foram utilizados métodos moleculares distintos ao longo do período de acompanhamento dos pacientes, dependendo da disponibilidade dos mesmos à época das análises. A técnica de PCR em tempo real Abbott RealTime HCV Test (Abbott Molecular Laboratories, EUA) foi utilizada como um dos ensaios para a detecção e quantificação do HCV RNA no plasma dos indivíduos infectados. Esta técnica possui uma faixa de detecção de 12 UI/ml – 100.000.000 UI/ml, e consiste na utilização de “repórter” e “quencher” específicos para a região 5’NC do genoma do HCV. A concentração de HCV RNA é quantificada por comparação com as curvas de amplificação de um cDNA, a partir da piruvato hidroxi-redutase, que é utilizado como padrão interno. Este padrão é amplificado com iniciadores diferentes dos utilizados para o HCV RNA e pode ser essa a razão para a quantificação linear de concentrações muito baixas, independentemente do genótipo (Michelin et al. 2007). Outra técnica utilizada foi a Cobas TaqMan HCV Test 1.0 (Roche Molecular Systems, EUA) que possui faixa de detecção de 25 UI/ml – 391.000.000 UI/ml. Este ensaio também usa “repórter” e “quencher” específicos para a região 5’NC do HCV, e para o modelo do controle interno, um RNA 28 sintético, que se liga aos mesmos iniciadores do HCV RNA. A transcrição reversa e amplificação de cDNA são executadas por uma DNA Z05 polimerase, que é uma polimerase com atividade 5’ – 3’ exonuclease. O teste mostra-se qualitativamente sensível e quantitativamente linear, com excelente desempenho para a detecção do HCV RNA, com exceção do genótipo 4 do HCV (Vermehren et al. 2008). Para a identificação dos genótipos do HCV foi utilizado a técnica de hibridização reversa pelo ensaio INNO-Lipa HCV II (Bayer Diagnostics, EUA), que consiste na utilização de sondas de oligonucleotídeos ligadas à membrana de nitrocelulose e específicas para a região 5’NC, capaz de identificar os principais genótipos do HCV (Haushofer et al. 2003). IV.VIII Coleta de dados secundários IV.VIII.I Dados demográficos, clínicos e laboratoriais O acesso aos dados dos prontuários médicos foi realizado pelos médicos da equipe clínica do AHV. Foram coletados dados demográficos e clínicos, tais como: idade, gênero, raça/etnia, data presumida da infecção, data do início da icterícia, fator de risco para a infecção e o desfecho da infecção. Quanto aos dados laboratoriais, foram obtidas informações relacionadas à dosagem de ALT, ao genótipo viral e à detecção quantitativa do HCV-RNA. IV.IX LUMINEX: Dosagem simultânea de múltiplas citocinas (multiplex) Os níveis séricos das citocinas TNFα, INFγ, IL-2, IL-4, IL-6, IL-7, IL-10, 1L-17A e IL-21 foram avaliados utilizando-se o conjunto comercial de reagentes Millipex® Map Human high sensitivity T Cell panel (EMD Millipore Corporation, EUA) contendo microesferas do tipo multiplex. A tecnologia utilizada baseia-se na utilização de microesferas magnéticas fluorescentes, onde cada uma destas apresenta uma tonalidade diferente devido a dois corantes internos capazes de criar 100 tons de cores diferentes. Cada microesfera é revestida por um anticorpo de captura específico para uma citocina, e quando esta é capturada, um anticorpo de detecção biotinilado é 29 introduzido. Logo após, a mistura é incubada com um conjugado StreptavidinaFicoeritrina (PE) para completar a reação na superfície de cada microesfera, que em seguida passam rapidamente por um laser que excita seus corantes internos marcando-as. Um segundo laser excita o PE, corante fluorescente da molécula “repórter”, e por fim os processadores de sinais digitais de alta velocidade identificam cada microesfera individualmente e quantificam os resultados do imunoensaio com base nos sinais fluorescente emitidos pela molécula “repórter”. Resumidamente, foram realizadas as seguintes etapas: a) A placa com 96 poços contendo filtros foi pré-umidecida com 200 µl de tampão de lavagem (contendo água deionizada e 0,05% de Proclin) sendo a solução aspirada em seguida por sucção a vácuo (EMD Millipore Corporation, EUA); b) Para a construção da curva padrão, um padrão de citocinas humanas foi reconstituído com 250 µl de matriz de soro (solução contendo água deionizada, soro fetal bovino (SFB) e 0,08% de Azida de sódio) para se alcançar uma concentração de 10.000 pg/mL de padrão para todas as citocinas. Para tanto, foram realizadas diluições seriadas de acordo com a orientação do fabricante. Cada ponto de diluição conteve um volume final de 200 µl, mas somente 50 µl foram adicionados a cada poço correspondente. Cada ponto da curva padrão foi feito em duplicata; c) Quanto às amostras de plasma de cada paciente, estas foram diluídas a 1:2 em matriz de soro, sendo apenas 25 µl das amostras adicionados aos respectivos poços, em duplicata, seguido de mais 25 µl de solução de trabalho (contendo SFB); d) Em seguida, foram adicionados aos poços correspondentes às amostras e a curva padrão 25 µl das microesferas revestidas com anticorpos monoclonais contra os nove alvos a serem analisados. Nos poços correspondentes ao branco foram adicionados somente 50 µl de matriz de soro; e) Após a adição das microesferas, a placa foi incubada por 60 minutos, sob leve agitação, a temperatura ambiente; f) Logo após, a placa foi lavada três vezes com 200 µl de solução de lavagem em cada poço, sendo a solução em seguida aspirada a vácuo; 30 g) A cada poço foram adicionados 50 µl de anticorpos de detecção, diluídos conforme orientação do fabricante. Em seguida, a placa foi incubada por 60 minutos, sob leve agitação, a temperatura ambiente; h) Posteriormente, foram adicionados à placa 50 µl de estreptavidina conjugada à PE sendo a mesma novamente incubada por 30 minutos, a temperatura ambiente; i) Logo após, a placa foi lavada três vezes com 200 µl de solução de lavagem em cada poço, sendo a solução em seguida aspirada a vácuo; i) Em seguida, foram adicionados a cada poço 150 µl da solução de trabalho para a ressupensão das microesferas e posterior análise no leitor Luminex 200 TM (EMD Millipore, EUA). IV.IX Análise Estatística O programa estatístico utilizado para a análise dos resultados foi o GraphPad Prism 5.0. As variáveis qualitativas foram analisadas de forma descritiva e representadas por frequência relativa (%) e as quantitativas por média e desvio padrão. Para verificar a relação entre as citocinas estudadas e os níveis de HCV RNA e de ALT dentro dos grupos testes nos dois momentos analisados, foi utilizado o teste de correlação de Spearman. O teste não paramétrico Mann-Whitney foi utilizado na análise comparativa dos níveis de HCV RNA (transformados em log), níveis de ALT, e níveis de citocinas entre os grupos de estudo. Para todas as análises quantitativas adotou-se o nível de significância de p<0,05. 31 V. RESULTADOS V.I Definição e características da amostra populacional e do grupo controle Foram identificados 118 pacientes com infecção aguda pelo HCV no período de janeiro de 2003 a dezembro de 2012. Destes, 69 apresentaram icterícia, porém quatro foram excluídos por apresentarem doença renal crônica, e outros três por apresentarem outra doença infecciosa (HIV/HBV). Dos 62 pacientes restantes, 48 foram excluídos por não terem sido submetidos à coleta de amostras dentro dos períodos de infecção estabelecidos para este estudo. Sendo assim, 14 pacientes com um dos seguintes desfechos da infecção aguda pelo HCV: Eliminação viral espontânea (9) e persistência viral (5), foram selecionados. A maioria destes com relatos de infecção adquirida via nosocomial 42,8% (6/14) (através de procedimentos cirúrgicos), seguida da via sexual 35,7% (5/14) (através de relações sexuais desprotegidas ou relações sexuais secas com trauma na mucosa). Somente um paciente, 7,1% (1/14), foi infectado através de acidente biológico, e outro, 7,1% (1/14), relatou como provável fonte de infecção o acidente com material perfurocortante de fonte HCV positivo (alicate de unha). Aquele que apresentou mecanismo de infecção desconhecido ou não determinado totalizou outros 7,1% (1/14) da amostra populacional estudada. A média de idade dos pacientes selecionados correspondeu a 42,7±13,9 anos, havendo predomínio de indivíduos do sexo feminino, 71,4% (10/14) e da raça branca, 57,1% (8/14), seguido por apenas três casos, 21,4% (3/14) de raça negra, e três de raça parda, 21,4% (3/14) (Tabela 1). Tabela V.I: Dados demográficos e clínicos da amostra populacional CI= Código de identificação; Idade no momento da soroconversão; M= Masculino, F= Feminino; B= Branca, N= Negra, P= Parda. O grupo controle constituiu-se de indivíduos com uma média de idade igual a 43,3±3,6 anos. Houve predomínio de indivíduos do sexo feminino, 66,6% 32 (6/9) e da raça branca, 77,7% (7/9), seguido de apenas um indivíduo de raça parda, 11,2% (1/9) e um de raça negra 11,2% (1/9). V.II Características dos grupos persistência viral e eliminação viral espontânea. O grupo correspondente à persistência viral (n=5) apresentou média de idade igual a 54±13,4 anos e constituiu-se majoritariamente por indivíduos do sexo feminino, 60% (3/5), e da raça branca, 80% (4/5), seguido de apenas um caso, 20% (1/5), constado de raça negra. Neste grupo, houve predomínio da transmissão via sexual, 40% (2/5), seguido de casos com infecções adquiridas via nosocomial, 20% (1/5), através de acidente biológico, 20% (1/5), e compartilhamento de material perfurocortante de fonte HCV positivo, 20% (1/5). O grupo referente à eliminação viral espontânea (n=9) apresentou média de idade equivalente a 36,5±10,2 anos. Houve predomínio de indivíduos do sexo feminino, 77,7% (7/9), e da raça branca, 44,4% (4/9), seguido de três casos, 33,3% (3/9), de raça parda, e dois casos, 22,3% (2/9), de raça negra. Neste grupo, a via mais relatada como provável mecanismo de transmissão do vírus foi a nosocomial, 55,5% (5/9), seguido da transmissão via sexual 33,3% (3/9). Em um paciente, 11,2% (1/9), não foi possível definir o mecanismo de transmissão do vírus. (Tabela 2) 33 Tabela V.II: Dados demográficos e vias de transmissão dos grupos teste PV EVE 5 9 54 ± 13,4 36,5 ± 10,2 Feminino 3 (60%) 7 (77,7%) Masculino 2 (40%) 2 (22,3%) 4 (80%) 1 (20%) 4 (44,4%) 3 (33,3% 2 (22,3%) N Idade Sexo Raça Branca Parda Negra Fator de Risco Nosocomial 1 (20%) 5 (55,5%) Sexual 2 (40%) 3 (33,3%) Outros 2 (40%) Desconhecido 1 (11,2%) PV= Persistência viral; EVE= Eliminação viral espontânea; Idade média ± desvio padrão. V.III Dados laboratoriais secundários (bioquímico e moleculares) V.III.I Persistência viral x Eliminação viral espontânea Foram selecionadas um total de 28 amostras de plasma, sendo 18 destas pertencentes ao grupo eliminação viral espontânea e as outras 10 ao grupo persistência viral. A análise dos dados laboratoriais demonstrou que todos os indivíduos infectados pelo HCV (100%) apresentaram o genótipo tipo 1 do vírus. Também foi constatado que no grupo correspondente à persistência viral, os níveis de HCV RNA apresentaram-se mais elevados em ambos os períodos da fase aguda analisados (T1 p=0,02/ T2 p=0,03), bem como os níveis de ALT no tempo 1 (p=0,04), quando comparados ao grupo eliminação viral espontânea. (Tabela 3) 34 Tabela V.III.I: Análise dos dados laboratoriais dos grupos persistência viral e eliminação viral espontânea em relação ao tempo de infecção ᵠ UI/mL, Log10, média ± desvio padrão; ¤ U/L, média ± desvio padrão; NS = Valor de p não significativo (>0,05); PV= Persistência viral, EVE= Eliminação viral espontânea. V.III.II Persistência Viral (Tempo 1 x Tempo 2); Eliminação viral espontânea (Tempo 1 x Tempo 2) A análise dentro dos grupos em relação ao tempo de infecção, demonstrou acentuado declínio nos níveis de HCV RNA (p=0,04) e de ALT (p=0,004) do tempo 1 para o tempo 2, no grupo corresponte à eliminação viral espontânea. Todavia, no grupo persistência viral apenas os níveis de ALT apresentaram declínio (p=0,02) neste mesmo intervalo de tempo. V.IV Análise quantitativa de citocinas presentes nos plasmas dos indivíduos infectados pelo HCV. V.IV.I Persistência viral x Eliminação viral espontânea A quantificação plasmática de 9 citocinas presentes em pacientes infectados pelo HCV, demonstrou que a IL-6 apresentou-se em níveis significativamente mais elevados nos dois momentos da infecção aguda estabelecidos para este estudo, no grupo correspondente à persistência viral (T1 p=0,03/ T2 p=0,01), quando comparados ao grupo de indivíduos que evoluíram para a eliminação viral espontânea. O mesmo ocorreu com a citocina IL-10 que apresentou níveis mais elevados nos indivíduos que desenvolveram infecção persistente nos dois períodos da infecção analisados (T1 p=0,04/ T2 p=0,04). Os níveis plasmáticos da citocina IFNγ não apresentaram diferença significativa entre os dois desfechos no tempo 1 (p=0,12). Todavia, o mesmo não ocorreu no tempo 2, onde os níveis desta citocina encontraram-se mais elevados em pacientes que eliminaram espontaneamente o HCV (T2 p=0,03). Quanto aos 35 níveis de IL-7, não foram identificadas diferenças significativas entre os grupos, nos dois momentos selecionados (T1 p=0,26/ T2 p=0,87). (Tabela 4) Os níveis plasmáticos das demais citocinas, IL-21, TNFα, IL-17A, IL-2 e IL-4 encontraram-se abaixo dos níveis de detecção do teste comercial. Para ambos os grupos, nenhuma citocina em estudo apresentou correlação com os níveis de HCV RNA e ALT nos tempos 1 e 2. Tabela V.IV.I: Padrão de normalidade das citocinas em estudo e suas concentrações nos grupos testes em relação ao tempo de infecção Citocinas em pg/ml, média ± desvio padrão; PV= Persistência viral, EVE= Eliminação viral espontânea; ND= Não detectado. VI.IV.II Persistência Viral (Tempo 1 x Tempo 2); Eliminação viral espontânea (Tempo 1 x Tempo 2) A análise dentro dos grupos em relação ao tempo de infecção, demonstrou acentuada elevação nos níveis de IFNγ do tempo 1 para o tempo 2 (p=0,009) no grupo correspondente à eliminação viral espontânea. As demais citocinas não apresentaram diferenças significativas neste intervalo de tempo. No grupo persistência viral nenhuma citocina apresentou diferença significativa entre os períodos analisados. 36 VI. DISCUSSÃO Na literatura existem poucos estudos voltados para a investigação da resposta imune do hospedeiro na fase aguda da hepatite C, principalmente no que se refere à análise de citocinas neste período da infecção. Este estudo avaliou os níveis plasmáticos das citocinas TNFα, INFγ, IL-2, IL-4, IL-6, IL-10, IL7, IL-21 e IL-17A em dois momentos distintos da fase aguda da doença (T1= 8,0-10,5/ T2= 16,0-18,5 semanas) em 14 indivíduos que desenvolveram icterícia e evoluíram para um dos seguintes desfechos da hepatite C aguda: eliminação viral espontânea (n=9) e persistência viral (n=5). No entanto, em virtude de algumas destas citocinas estarem abaixo dos níveis de detecção do teste comercial, apenas foi possível investigar a relação dos níveis plasmáticos das citocinas IFNy, IL-6, IL-10 e IL-7 com o desfecho da infecção aguda pelo HCV. A primeira análise realizada no estudo objetivou verificar os fatores virais e do hospedeiro como, fator de risco para a infecção, carga viral, genótipo viral, ALT, sexo, idade e raça/etnia que pudessem predizer a evolução da infecção pelo HCV para a eliminação viral espontânea ou para a persistência viral. Ao avaliar o fator idade, foi verificado que o grupo correspondente à persistência viral foi composto por indivíduos com média de idade acima de 40 anos, quando comparados àqueles que eliminaram espontaneamente o vírus. Estes dados são similares aos resultados encontrados em alguns estudos que apontam a idade acima de 40 anos como um dos fatores que influenciam a progressão para a hepatite C crônica (Yen et al. 2003; Wong & Lee 2006; Missiha et al. 2008). Quanto à análise dos fatores sexo e raça, foi verificado neste estudo que os dois grupos de análise (eliminação viral espontânea e persistência viral) obtiveram predomínio do sexo feminino e da raça branca. Para alguns autores, pacientes do sexo feminino e de ancestralidade européia estão mais associados a resultados favoráveis de cura espontânea da infecção pelo HCV (Micallef et al. 2006; Conjeevaram et al. 2006; Hajarizadeh et al. 2013). De uma maneira geral, a via de transmissão nosocomial foi a mais relatada entre os pacientes e está de acordo com dados obtidos em outras pesquisas (Santantonio et al. 2006; Fabrizi et al. 2008; Martinez-Bauer et al. 2008), tendo os procedimentos cirúrgicos como uma das principais causas. Quanto aos níveis de HCV-RNA e de ALT, foram observados níveis mais elevados em pacientes que desenvolveram infecção persistente, em ambos os períodos analisados. Além disso, neste mesmo grupo 37 foi verificado declínio nos níveis de ALT do tempo 1 para o tempo 2. Em contrapartida, no grupo correspondente à eliminação viral espontânea, tanto os níveis de HCV-RNA quanto os de ALT apresentaram acentuado declínio neste mesmo intervalo de tempo. Estes resultados corroboram com dados encontrados na literatura que relatam que quando há resolução espontânea na fase aguda da infecção pelo HCV, a viremia e os níveis de ALT tendem a declinar de forma acentuada até atingir o completo desaparecimento do vírus e a normalidade das transaminases (Beinhardt et al. 2013; Park et al. 2014). Contudo, diante da persistência do HCV no hospedeiro, a viremia é sustentada e os níveis de ALT podem sofrer elevações intermitentes em até 70% dos casos (Kuramoto et al. 2002; Alberti et al. 2005). Quanto à quantificação de citocinas, verificou-se neste estudo que os pacientes que evoluíram para a hepatite C crônica apresentaram as citocinas IL6 e IL10 em níveis mais elevados, quando comparados àqueles que eliminaram espontaneamente o HCV nos dois momentos selecionados. A IL-6 é uma interleucina pleiotrópica que pode exercer atividade pró e anti-inflamatória em infecções e sua superprodução está relacionada à progressão para infecções crônicas, como na hepatite C, e ao desenvolvimento de diferentes tipos de câncer humano, incluindo o hepatocarcinoma (Bower & Walker 2005; Porta et al. 2008; Liu et al. 2010). Na literatura, os estudos referentes a IL-6 na hepatite C são limitados à fase crônica da infecção, apontando para níveis mais elevados desta citocina neste período e sua associação com o risco progressivo para o desenvolvimento de fibrose e câncer hepático (Grüngreiff et al. 2009; Ueyama et al. 2011; Cussigh et al. 2011; Nakagawa et al. 2014). Todavia, em outras infecções virais como a provocada pelo vírus da dengue (DENV), também pertencente à família flaviviridae, os níveis de IL-6 já se encontram elevados na fase aguda da doença, sugerindo progressão para a forma mais grave da infecção, a febre hemorrágica do dengue (FHD) (Priyadarshini et al. 2010; Levy et al. 2010). Na infecção pelo vírus hepatotrópico HBV, agente causador da hepatite B, um estudo demonstrou elevação progressiva nos níveis de IL-6 da fase aguda à fase crônica da doença, o que indica que os altos níveis desta citocina podem estar relacionados à progressão para a hepatite B crônica (Song et al. 2003). Desta forma, os níveis mais elevados de IL-6 obtidos no presente estudo, durante a fase inicial da infecção pelo HCV em pacientes que evoluíram 38 para a infecção persistente sugerem possível relação com a progressão para a hepatite C crônica. Em relação a IL-10, os resultados obtidos neste estudo corroboram com pesquisas recentes que demonstraram níveis mais elevados desta citocina em diferentes períodos da hepatite C aguda, no plasma, soro e em células mononucleares de sangue periférico (PBMCs), de pacientes que progrediram para a infecção crônica, quando comparados àqueles que eliminaram o vírus espontaneamente (Flynn et al. 2011; Selvarajah et al. 2012; Osborn et al. 2013). A IL-10 é uma citocina anti-inflamatória que pode exercer efeito supressor sobre a atividade das células T, induzindo a anergia, e assim contribuir para a progressão de infecções (Taylor et al. 2006; Oft 2014). Resultados semelhantes podem ser observados em relação à fase aguda da infecção pelo vírus da Dengue, onde algumas pesquisas sugerem que os altos níveis de IL-10 podem estar relacionados à patogênese da fase aguda da infecção, sendo esta citocina encontrada em níveis mais elevados em pacientes que evoluem para a FHD (Malavige et al. 2013; Tsai et al. 2013). Desta forma, os níveis mais elevados de IL-10 obtidos neste estudo durante a fase aguda da hepatite C em indivíduos que desenvolveram infecção persistente, sugerem provável relação com a persistência da infecção pelo HCV Ao avaliar os níveis de IFNγ, não foi observada diferença significativa entre os dois desfechos no tempo 1. Todavia, no tempo 2, os níveis de IFNy apresentaram-se significativamente maiores no grupo correspondente à eliminação viral espontânea, sendo observada expressiva elevação nos níveis desta citocina do tempo 1 para o tempo 2 neste mesmo grupo. O IFNγ é um potente ativador de células Th1 e inibidor da produção de células Th2 (Gattoni et al. 2006; Janeway et al. 2007). Esta citocina desempenha importante papel em infecções virais, impedindo a replicação do patógeno, conforme relatado por Frese et al. (2002) e Windish et al. (2005) ao observarem a ação inibitória do IFNγ sobre a replicação de regiões subgenômica e genômicas do HCV. Assim como o presente estudo, Gruner et al. (2000) e Flynn et al. (2011) também evidenciaram níveis mais elevados desta citocina em indivíduos que eliminaram o HCV espontaneamente durante a fase aguda da infecção, quando comparados àqueles que evoluíram para infecção persistente, porém em amostras de PBMC. Resultados similares também foram encontrados na infecção pelo HBV, onde 39 um estudo demonstrou aumento nos níveis de IFNγ, sendo produzido por células do sistema imune periférico de pacientes que evoluíram para a hepatite B aguda autolimitada (Penna et al. 1997). Mais recentemente, uma pesquisa evidenciou aumento nos níveis de IFNy no soro de pacientes na fase aguda da infecção pelo HBV, demonstrando possível contribuição desta citocina na patogênese da hepatite B aguda e sua relação com a ausência do HBV-DNA e com a soronegatividade para HBeAg (Rizvi et al. 2013). Desta forma, a elevação nos níveis de IFNy observada em pacientes que eliminaram o HCV neste estudo, aponta para uma possível relação com a resolução espontânea da infecção. O aumento nos níveis de IFNy pode estar relacionado ao aumento na proliferação dos linfócitos T CD8+ observado em indivíduos que eliminam espontaneamente o HCV, conforme já relatado na literatura (Gruner et al. 2000; Jo et al. 2009; Sung et al. 2014) Quanto a IL-7, não foram observadas diferenças significativas nos níveis plasmáticos desta citocina entre os dois desfechos da hepatite C aguda, em ambos os períodos da infecção analisados. A IL-7 atua na manutenção das células T de memória e na sobrevivência das células T virgens (naive). Esta citocina também age como fator de crescimento e fator anti-apoptótico das células T e B (Sportès et al. 2009; Abbas 2011). Em outras infecções virais como a provocada pelo HBV, um estudo demonstrou que não há diferença significativa entre os níveis plasmáticos de IL-7 na fase aguda inicial (caracterizada no estudo por altos níveis de ALT (>500 UI/ml)) e tardia (caracterizada por níveis normais de ALT e HBV DNA <6 UI/ml) de indivíduos sintomáticos, sugerindo que a IL-7 não esta relacionada com a patogênese da hepatite B aguda (Markova et al. 2013). Em contrapartida, na infecção provocada pelo vírus da dengue (DENV), há evidências que apontam para o aumento da IL-7 no plasma durante os primeiros dias de sintomatologia de pacientes com DENV-2 (Becquart et al. 2010), e no plasma de pacientes que evoluem para a FHD (Bozza et al. 2008). Na hepatite C, as poucas pesquisas referentes a IL-7 estão voltadas para o potencial terapêutico desta citocina no resgate da resposta antiviral dos linfócitos T CD8+ durante a fase crônica da infecção, visando à eliminação do vírus durante este período (Seigel et al. 2011; Pellegrini et al. 2011). Não foram encontrados relatos na literatura que demonstrem a relação dos níveis plasmáticos de IL-7 com o desfecho da hepatite C aguda. Sendo assim, os 40 níveis desta citocina relatados neste estudo, não sugerem qualquer relação da IL-7 com o desfecho da infecção aguda pelo HCV. Uma limitação deste estudo foi o pequeno tamanho amostral referente aos desfechos estudados. Sendo assim, outras pesquisas com populações maiores, de caráter prospectivo são necessárias para a confirmação dos dados encontrados neste estudo. 41 VII. CONCLUSÕES Coletivamente, os resultados deste estudo demonstraram que: • O aumento dos níveis plasmáticos das citocinas anti-inflamatórias IL-6 e IL-10 durante a fase aguda da infecção pelo HCV pode estar relacionado com a progressão para a hepatite C crônica. • A elevação dos níveis plasmáticos de INFγ observada ao longo da fase aguda da infecção pelo HCV pode estar relacionada com a resolução espontânea da infecção. • Os níveis plasmáticos de IL-7 encontrados nos grupos persistência viral e eliminação viral espontânea sugerem que esta citocina pode não estar relacionada ao desfecho da infecção aguda pelo HCV. 42 VIII. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA Abbas AK, Lichtman AH, Pillai S. Imunologia Celular e Molecular, 7ª ed. Brasil: Elsevier, 2011, 560pp. Abdel-Hakeem MS, Shoukry NH. Protective immunity against hepatitis C: many shades of gray. Front. Immunol 2014. 274(5):1-19. Adema GJ. Dendritic cells from bench to bedside and back. Immunol Lett 2009. 22(2):128-130. 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Pesquisadores: Dra Lia Laura Lewis Ximenez e Dr. Marcelo Alves Pinto. Eu _____________________________________________________ fui convidado(a) a participar de um estudo que irá investigar os processos imunológicos envolvidos na infecção pelo do vírus da hepatite C, ou seja, de que maneira o meu sistema de defesa age durante esta infecção. Para isso eu preciso consentir em doar cerca de 60 ml (12 colheres de chá) do meu sangue e será separado e levado para o laboratório de hepatites virais do Instituto Oswaldo Cruz / FIOCRUZ para pesquisar a presença do vírus da hepatite C e estudar os meus mecanismos de defesa contra este vírus. O meu sangue será coletado por punção venosa por um técnico especializado. Estou sendo informado(a) que posso não ter beneficio imediato dos resultados desta pesquisa, mas este trabalho pode esclarecer problemas relacionados a forma crônica da hepatite C. Os possíveis riscos e desconfortos são aqueles 66 relacionados com a retirada rotineira de sangue, dor ou rouxidão no local. É possível que novas amostras sejam necessárias. Fui informado(a) também que posso ser solicitado(a) a retornar em intervalos de 2 a 4 semanas para fornecer amostras adicionais. Caso seja necessário, serei contatado por um dos integrantes do estudo que irá me perguntar se estou disposto a doar nova amostra de sangue. Estou livre para recusar esta solicitação. A minha participação é voluntária e posso sair do estudo a qualquer momento. Fui informado que caso me torne um portador crônico do vírus da hepatite C serei encaminhado a um ambulatório especializado em hepatologia da rede publica para acompanhamento se eu estiver participando ou não do projeto. Para participar deste estudo, fornecerei também aos pesquisadores algumas informações sobre minhas condições sócio-econômicas e fatores de risco associados a transmissão do vírus da hepatite C. Sei também que amostras do meu sangue serão enviadas, além do laboratório de FIOCRUZ, para as seguintes instituições de pesquisa no exterior: Unidade de Doenças Infecciosas da Universidade de Medicina de Harvard (Estados Unidos) O Instituo de Pesquisa Scripps (Estados Unidos). Centro de Pesquisa em Hepatite Viral do Departamento de Doenças Inefcciosas da Universidade de Medicina de Johns Hospkins (Estados Unidos). 67 Declaro ter recebido informações a respeito deste estudo e autorizo o Coordenador do projeto a utilizar as amostras do meu sangue para realização de exames para estudar o vírus da hepatite C e a minha resposta imunologica. Resultados laboratoriais referentes ao meu quadro clinico serão fornecidas a mim de maneira confidencial. As informações obtidas dos diferentes laboratórios desta pesquisa serão para publicação científica com sigilo da minha identidade. Será fornecido também uma cópia deste termo de consentimento a sua pessoa. Caso tenha alguma dúvida ou necessite de qualquer esclarecimento sobre o estudo você pode entrar em contato com os pesquisadores relacionados acima: Pavilhão 108 – Grupo de Atendimento para Hepatites Virais, fone 25621946, 2598-4224. Assinatura ________________________________________________________ RG __________________________________ ___________________________________________ Assinatura do pesquisador responsável Dra. Lia Laura Lewis-Ximenez Data: ___/___/___ 68 69 70