Por uma nova gramática comunicacional: Estado, sociedade e políticas públicas. JOSÉ ANTONIO DA COSTA FERNANDES A ideia de uma nova gramática no campo da comunicação está atrelada a noção de um novo paradigma societal na qual a sociedade procura novos meios de comunicação com o Estado, tanto no atendimento de suas demandas como na própria definição do que vem a ser governo; desta forma procura alargar o significado de cidadania. Decorre daí a ideia de que há um confronto entre democracia participativa e democracia representativa, que está balizado na própria concepção do significado que o mercado deve ter nas relações entre o indivíduo, suas necessidades, a sociedade e o Estado. A hegemonia neoliberal protagonizou, enquanto polo ideológico, a resolução dos problemas sociais pelo mercado e por certo tipo de democracia representativa esvaziada da própria ideia da legitimação da representação, pois a representação não deveria ser divisível. Hoje, no entanto, o modelo neoliberal é questionado em diversos flancos, assim, a fetichização da vida e o endeusamento do mercado como regulador da existência do ser humano é hoje arena de intenso questionamento, e, que desde a crise de 2008 se apresentou em um novo palco, na qual a ideia de um Estado regulador retoma seu ímpeto na definição da macroeconomia e das políticas públicas. Marilena Chauí chamava a atenção para este reordenamento, logo após a crise de 2008. Pois está colocada em questão a operação própria do neoliberalismo, qual seja, a de dirigir todos os recursos públicos para os interesses do capital, levando à privatização dos direitos sociais, ao transformá-los em serviços privados a serem adquiridos no mercado. O pensamento e a práxis se abrem porque a percepção da irracionalidade do mercado desmantela a crença em sua suposta racionalidade autônoma, crença que durante 30 anos assegurou a hegemonia ideológica do chamado “pensamento único” (2009, p. 17). Claro que de fundo, está à própria definição dos marcos entre o capital e o trabalho, e, de que como o fetiche da mercadoria e os interesses coletivos se estabelecem, debate que se apresentou, poderíamos dizer como um reclamo social, que foi para as ruas em junho; clamor que se apresenta entre o transporte coletivo e o individual, entre carro e ônibus e mesmo entre o que é desejo e necessidade, e na própria forma de como comunicar estes questionamentos. A necessidade do estado como regulador da economia nos marcos do capitalismo ressurge, portanto, e, o endeusamento do mercado, como diria Marilena Chauí, sofreu revezes, porém ainda é hegemônico no mundo e também aqui. Se o mercado não é e nem deve ser o regulador de nossas existências há a necessidade de políticas públicas que atendam aos cidadãos. Para isto é necessário à comunicação entre o Estado, de um lado, e de outro, o cidadão. Assim, estado e sociedade devem nutrir-se da democracia participativa como mecanismo de interação e da definição de um novo ordenamento não mais neoliberal. A ideia de que é possível combater o neoliberalismo e construir alternativas ao modelo capitalista nos marcos do próprio capitalismo é um tema recorrente também no pensamento de Boaventura de Sousa Santos dentre outros autores da Teoria Crítica. A intenção do autor é diagnosticar e estabelecer a possibilidade de que novos arranjos sociais se apresentem para o Estado, que se constituam em reconhecimento de direitos e permitam a emergência de novas abordagens na construção das políticas públicas. Esta perspectiva esta adensada na ideia de maior participação da sociedade naquilo que outros autores consagram como cidadania ativa (Benevides, 1998), ampliação da cidadania (Jacobi, 2000) ou ainda a ideia de cidadania correlata ao conceito de emancipação política (Montagno & Durigueto, 2010, p 130) entre outros conceitos próximos. A preocupação de Santos é de construir modelos alternativos no estabelecimento da ideia de Estado, que perpassa a própria definição do conhecimento, pois assim há a possibilidade da reinvenção solidária e participativa do Estado. Neste sentido Boaventura de Sousa Santos construiu uma perspectiva que procura interagir as demandas sociais ao Estado. O conhecimento emancipação e a construção do estado como novíssimo movimento social. O presente ensaio compreende que há basicamente dois conhecimentos, segundo a compreensão de Santos, que se encontram balizados em pilares: “pilar da regulação” e o “pilar da emancipação”1. O conhecimento emancipação deve preocupar-se em visualizar e descortinar, um ou mais conhecimentos criativos, desenvolvidos pelos sujeitos sociais e muitas vezes reconhecidos, principalmente, por meio dos movimentos sociais, mas também, pelas subjetividades dos atores sociais e até mesmo dos governos. A intenção desta construção conceitual segundo Santos é de permitir que o conhecimento emancipador identifique e compreenda novos mecanismos de participação, e que eles se apresentem ao Estado. Assim novas formas de se fazer política se estabelecem e acabam por interferir na construção das políticas públicas e na própria Administração Pública. A expectativa deste conhecimento emancipador está presente na afirmação de Boaventura de Sousa Santos: Proponho a ideia de uma dupla ruptura epistemológica como forma de superar este beco sem saída. A expressão dupla ruptura epistemológica significa que, depois de consumada a primeira ruptura epistemológica (permitindo, assim, à ciência moderna diferenciar-se do senso comum), há um outro acto epistemológico importante a realizar: romper com a primeira ruptura epistemológica, a fim de transformar o conhecimento científico num novo senso comum. Por outras palavras, o conhecimento-emancipação tem de romper com o senso comum conservador, mistificado e mistificador, não para criar uma forma autonóma e isolada de conhecimento superior, mas para se transformar a si mesmo num senso comum novo e emancipatório. O conhecimentoemancipação tem de converter-se num senso comum emancipatório: impondo-se ao preconceito conservador e ao conhecimento prodigioso e impenetrável, tem de ser um conhecimento prudente para uma vida decente (Santos, 2000, p. 107). 1 “O paradigma da modernidade é muito rico e complexo, tão susceptível de variações profundas como os desenvolvimentos contraditórios. Assenta em dois pilares, o da regulação e o da emancipação, cada um constituído por três princípios ou lógicos.” (...) O pilar da regulação compreende o Estado, o mercado e a comunidade; já o pilar da emancipação compreende: “... a racionalidade estético-expressiva das artes e da literatura, a racionalidade cognitiva-instrumental da ciência e da tecnologia e a racionalidade moral-prática da ética e do direito.” (Santos, 2000, p. 50). Assim, este panorama deve imbricar elementos e mecanismos analíticos de tradução desta realidade, desta transição paradigmática, até porque o caminho percorrido compreende a reflexão deste real amparado em um conhecimento que está em processo de construção, não apenas como constatação teórica, mas, sobretudo, um conhecimento que possibilite pensar e visualizar alternativas para a sociedade, que não estão necessariamente dadas, nos marcos do capitalismo, mas que tendem a se apresentar ao Estado, principalmente se há a possibilidade da institucionalização de mecanismos de maior participação da sociedade. A análise do autor recupera a compreensão do Estado enquanto elo de transformação social em dois polos: reformista e revolucionário. Compreende que o reformismo, na impossibilidade da revolução, instigou o Estado a equacionar os problemas da humanidade, assim institucionalizou demandas sociais. Na atualidade, em que há uma hegemonia liberal assente na compreensão do Estado mínimo, o risco da desconstrução dos ideais reformistas balizados no Estado de bem estar social é uma constante, baseado na concepção do estado-empresário. Neste, estado-empresário, reside a concepção do paradigma capitalista e na atualidade neoliberal. Mas, nos últimos anos a luta contra a hegemonia neoliberal teve diversas vitórias nos países do Sul, principalmente na América Latina. Esta circunstância permitiu construir alternativas concretas ao modelo de Estado empresário, mas também ao modelo europeu ou estadunidense de bem estar social. Para Boaventura de Sousa Santos (2008), o Estado pode ser concebido como toda forma de participação, na qual a legalidade coexiste com a democracia representativa e participativa. Assim, a Administração Pública discute o orçamento público e outras questões de interesse dos cidadãos diretamente com a sociedade civil, através dos movimentos sociais; como conselhos municipais, estaduais e federais e outras organizações civis. Trata-se de uma tentativa de ampliar os espaços da ação política para além do Estado e da esfera pública, vista como reducionista pelo autor. Tal esforço se justifica como estratégia de ampliar o escopo da ação participativa e romper com os monopólios de interpretação impostos pelo paradigma moderno. A partir desta construção teórica podemos perceber a posição que o autor tem em relação ao aumento da participação política dos cidadãos. Boaventura de Sousa Santos sustenta que estamos vivendo um momento de transição paradigmática, no qual o paradigma da modernidade se encontra em declínio, em função do colapso do pilar da emancipação no pilar da regulação, fruto da convergência do paradigma da modernidade e do capitalismo. Na perspectiva do autor, a participação política possui um papel fundamental neste processo de redescoberta das práticas societárias. É através dela que aqueles deixados à margem poderão ser incluídos no processo democrático, colaborando na própria definição da comunidade em que estão inseridos. A democracia, então, é um projeto de inclusão social e de inovação cultural que se coloca como tentativa de instituição de uma nova soberania democrática, o que na visão do autor vai influenciar também a Administração Pública. Neste sentido, Boaventura de Sousa Santos faz uma reflexão em um dos seus últimos livros considerando a possibilidade do estado alargar sua compreensão democrática para se aproximar dos movimentos sociais. Denominou esta ideia de “Estado como novíssimo movimento social” (Santos, 2008). Boaventura de Sousa Santos afirma, que nem o Estado e nem tampouco a comunidade, podem isoladamente garantir a sustentabilidade de interdependências não mercantis, sem a qual a convivência e a sociedade se transformam em uma forma de fascismo social. A ideia de fascismo social é um conceito utilizado por alguns autores, tendo como matriz o pensamento de Santos, que têm como perspectiva designar a atuação de grupos criminosos como protagonistas de políticas públicas. Como exemplo as milícias armadas do Rio de Janeiro. Para Boaventura as concepções da Reforma do Estado devem aprofundar os pontos de articulação entre a democracia representativa e democracia participativa. Assim, Boaventura compreende que as concepções para uma definição do Estado e da Administração Pública, devem aprofundar os pontos de articulação entre a democracia representativa e democracia participativa, para impedir o avanço do diversos tipos de fascimo social que possam existir. Teoria crítica e um novo paradigma comunicacional O conceito de Comunicação Pública está vinculado à ideia de comunicação governamental. Teve como raiz histórica a intenção de estabelecer uma transformação societal na perspectiva da viabilização da democracia e até mesmo na transformação do perfil da sociedade. Podemos considerar que a questão da comunicação no Brasil envolve basicamente dois momentos históricos: um anterior a Constituição de 1988, que teve como baliza fundamental a ideia do controle da comunicação e o outro período posterior que envolve a ideia da democracia e de seu fortalecimento, que permitiu o surgimento de novos mecanismos de comunicação governamental e também outras formas de articulação social por meio dos movimentos sociais. Nos últimos anos, o avanço da tecnologia permitiu uma abrangência ainda maior da comunicação e do processo de participação e de pressão que têm forçado os governos e a Administração Pública a constituir novas ferramentas de escuta da população para dar atendimento às exigências, sejam elas individuais ou coletivas; seja um indivíduo ao fazer uma denúncia individual num clic no computador ou um conjunto de atores organizando uma manifestação, por meio do facebook ou de outra comunicação digital. Claro que este fato não delimitou um novo paradigma comunicacional, mas têm permitido a constituição de um novo campo entre a sociedade e o Estado, e entre a sociedade civil e os governos, o que permite uma nova articulação comunicacional da Administração Pública. Claro que este é um desenho feito a muitas mãos e está em processo. No entanto podemos destacar que manifestações coletivas, na atualidade, têm imenso potencial de articulação, e, na mesma esteira a outrora hegemonia dos canais de TV privados perdem sua eficácia no controle da comunicação e da disputa pelo poder político. Os mecanismos de comunicação são, portanto, variados e multiformes. Assim, a esfera da política e mesmo das eleições encontrou um novo modo de atuação. O relacionamento do governo com os cidadão pode ocorrer de diversas formas. O mundo da política, das eleições e até mesmo da legislação eleitoral, de certa forma, já estabelecem mecanismos de comunicação e relacionamento. No processo eleitoral há a necessidade de comunicação com a sociedade que ocorre por meio da apresentação de programas de governo com propostas de administração e projetos de políticas públicas entre outros; muito dos quais estabelecidos na legislação eleitoral. Assim, uma proposta de governo, poderá ser cobrada após as eleições e o governante deverá comunicar-se com a sociedade para explicar, “as quantas andam” suas propostas ou projetos. O governante deve estabelecer mecanismos de relacionamento que podem ser dos mais tradicionais: por meio da Câmara Municipal e da liderança de governo, no atendimento aos cidadãos na própria sede, em reuniões comunitárias entre outros. Porém, podem também ocorrer por mecanismos mais democráticos e representativos como: orçamento participativo, conselhos municipais, ouvidorias entre outros. Neste processo devemos observar como o governo pode ser mais eletrônico, “e-gov” e, portanto mais acessível e participativo. Devemos ressalvar que há vários mecanismos de aproximação e relacionamento entre os governos e os cidadãos. Dentre estes modelos alguns se estabelecem por meio da participação mais ativa da sociedade como o orçamento participativo, os conselhos municipais de saúde, segurança, entre outros mais antigos ou outros mais jovens como do negro, cultura e outros protagonizados pelas Conferências Nacionais de Políticas Públicas. Há, portanto, vários mecanismos que garantem a participação da sociedade, porém há ainda a necessidade de maior envolvimento e da criação de novos procedimentos. A Administração Pública tem que se abrir, porém há resistências, seja em razão da problemática inerente ao modelo burocrático legal, ou ainda, de uma cultura política, da obediência e do mando, que ainda prevalece e não permite uma oxigenação democrática nos órgãos da Administração Pública. Compreender este processo é de extrema importância para a necessária problematização e superação do modelo por outro balizado pelo conhecimento emancipação. Já foi possível constatar que há uma crise paradigmática dos modelos de universalidade, e ademais, do próprio modelo de Estado e da Administração Pública. Assim, há a criação de modelos que podem estar vinculados, dentro da Teoria Crítica, ao conhecimento emancipação ou ao conhecimento regulação, mesmo que os limites e aproximações entre um e outro sejam tênues. Boaventura de Sousa Santos um dos signatários da Teoria Crítica observa que há uma disputa pela hegemonia que se apresenta em vários flancos, e também na esfera da democracia e da comunicação, pois a própria concepção de ciência vem sendo colocada em xeque pelos argonautas do liberalismo ocidental que estabelecem que a melhor concepção na definição da democracia é a própria liberdade baseado no endeusamento do mercado. Este disputa decorre de um conflito central, e, maior, - em uma escala de intensidades - que é o conflito entre o Norte e o Sul, da qual a concepção de democracia representativa e democracia participativa são decorrentes. Segundo Santos esse confronto decorre do fato de que a democracia representativa tem recusado à legitimidade da democracia participativa. Porém, o próprio autor observa que a solução para este conflito irá decorrer da possibilidade de que se estabeleça a complementaridade das duas formas de legitimação das vontades, por meio do entrelaçamento dos modelos e de suas variações (Santos, 2003, p. 27-28). Dentre os autores da Teoria Critica há o pensamento de Jürgen Habermas, que podemos considerar ser um dos que melhor se ajusta as análises que envolvem a comunicação e o relacionamento com a sociedade, pois suas apreciações, desde a fundação da Escola de Frankfurt, recaiam preferencialmente para a questão da Democracia, da Cidadania, do fenômeno da Comunicação de Massas, da Indústria Cultural entre outros temas correlatos. A concepção de democracia, estabelecida pelo filósofo alemão, baseiase na teia de relações sociais e nas condições de comunicabilidade que se estabelecem, e, têm como perspectiva obter resultados racionais e consensuais, por meio do ajuste e da estabilização dos diversos interesses conflitantes. Esta expectativa reside na ideia de que os acordos conferem legitimidade, pois as formas discursivas podem ganhar formato jurídico, e assim, se converter em política pública, baseados nos princípios da própria democracia. Estes mecanismos garantem a preservação dos espaços públicos e mesmo sua ampliação dotando-os de autonomia, onde não existiam, garantindo participação popular e regulação societal dos meios de comunicação entre outros, e, que podem convergir para procedimentos plebiscitários, alguns já existentes em nossa Constituição, - como o referendo e a iniciativa popular-, ou ainda, alargar para outros como são as conferências públicas, e as Ouvidorias Públicas, que permitem o exercício da democracia participativa. Exemplo de participação e de institucionalização de Políticas Públicas por meio da participação dos atores sociais são as conferências nacionais (Avritzer, 2012) como um novo fenômeno de participação societal. Os espaços públicos, na qual se manifestam diferentes formas de opinião, como afirma Habermas, tem a potencialidade de se converter em poder comunicacional o que permite exercer, - de forma simultânea-, um efeito de resolução sobre o legislador, tornando-se institucional, o que era apenas forma discursiva. A concepção de Habermas aproxima-se de Boaventura de Souza Santos, quando estabelecemos a intenção da aproximação entre Estado e sociedade, por meio de novos mecanismos de participação e de comunicação. Ou seja, a ideia de democracia participativa significa estabelecer novos mecanismos de acesso ao governo, e do governo, em escutar a população. Acesso ao governo, governo eletrônico e ouvidorias públicas no Brasil Conforme foi analisado há uma crise paradigmática dos modelos do universalismo, que se apresentam, tanto para os defensores da reforma, como da revolução, desenhados teoricamente naquilo que Boaventura de Sousa Santos, denomina de uma “transição paradigmática”, que estão estabelecidas também no conhecimento emancipação e no conhecimento regulação. Neste curto circuito reside também a questão da comunicação e do relacionamento com os cidadãos. Se há uma crise, os apontamentos para ela são diferentes, mas podemos afirmar que se situam basicamente em dois pilares: regulação e emancipação. Assim, o caminho do Estado e da Administração Pública no relacionamento com a cidadania se efetiva na tensão destes dois elementos. Desta forma, verificamos que já faz tempo que o desempenho das ações governamentais é colocado sobre intensa crítica, em razão de um distanciamento do cidadão das atividades da Administração Pública, o que estabeleceu crise de confiança entre eles. No entanto nos últimos anos essa crise vem sendo ultrapassada pela criação de novos mecanismos que permitem à Administração Pública escutar as demandas da sociedade. Este processo foi acentuado principalmente com o acesso da população ao telefone e mais recentemente a internet. O oferecimento destes tipos de serviços a camadas mais amplas da população permitiu processos midiáticos com a participação da sociedade e que conduzem o cidadão a uma posição mais atenta e crítica em relação aos problemas sociais. E é neste processo de maior participação e de uma atuação mais efetiva que surge a necessidade da ampliação dos atores sociais e da exigência das Ouvidorias Públicas. Até porque no caso das Ouvidorias Públicas no Brasil, é possível o efeito de regulação por meio da institucionalização de determinados reclamos, o que garante a legitimação de muitas das ações do agente público. A eleição do presidente LULA permitiu que estes novos mecanismos se institucionalizassem. Decore daí, o surgimento de novos organismos criados no transcorrer dos governos Lula e Dilma, principalmente por meio do governo eletrônico “e-gov”. Neste sentido uma das novas abordagens, baseada na ideia de um governo democrático e transparente, foi à institucionalização da Transparência Brasil no Estado brasileiro. A possibilidade do acesso aos valores e gastos dos servidores e agentes do Estado brasileiro, suscitou embates e controvérsias na mídia, e até mesmo na sociedade, seja em razão de um controle maior, mas também de situações de perseguição política contra alguns agentes políticos por parte da mídia nativa. Neste sentido, e, a título de exemplo, o pagamento de despesas por meio do cartão corporativo, que identifica os gastos por meio do portal da transparência, permitiu debates apaixonados na mídia tupiniquim, mas sem o necessário equilíbrio da mediação e nem mesmo direito de defesa; nem tampouco, o reconhecimento desta política pública, que permitiu uma nova abordagem do gasto público, por meio do governo eletrônico, muito menos lembrar que foi iniciada na gestão LULA. Este mecanismo permite a transparência dos valores e o acesso democrático dos gastos públicos, seja por parte da mídia, como de qualquer cidadão. Claro que um governo eletrônico é uma necessidade internacional que se coloca para os governos democráticos de todo o mundo, mas devemos observar, que aqui sua implementação foi recente, além do que houve a necessária compreensão de que deveria ser institucionalizado tornando-se parte da Administração Pública, e, portanto, não apenas um programa de governo. O Estado precisa estar à altura deste desafio, adaptando-se a uma necessidade cada vez mais imperiosa: tornar eletrônica a maior parte das relações com o cidadão, evitando custos desnecessários e adaptando-se às formas atuais de relacionamento (Ferrer, 2012, p, 14). Neste sentido deve ser observado que o governo eletrônico da gestão LULA, ganhou diversos prêmios, sendo o mais recente do ano de 2011, justamente por possibilitar a ampliação do relacionamento com o cidadão e um controle mais rígido e transparente dos gastos (Transparência, 2014) As Ouvidorias Públicas são parte deste processo democrático no Brasil, pois, surgiram no Brasil no processo da abertura democrática e do descontentamento da população usuária dos serviços públicos em razão de um sistema que não dava garantias sobre os serviços oferecidos pela Administração Pública. Ao longo dos anos 80, houve maior interesse e os modelos foram-se alastrando, pois apresentava eficiência na mediação e controle do sistema público, por parte dos atores sociais no resguardo de seus direitos. A institucionalização deste cenário se deu na própria Constituição Federal, que em seu artigo 37, determinou que a Administração Pública estabelecesse mecanismos que garantissem a obediência a determinados princípios, dentre outros, aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência; bem como assegurar a participação da sociedade na sustentação de serviços de atendimento ao cidadão-usuário, bem como a avaliação periódica, tanto externa, como interna, da qualidade dos serviços. Assim, tornou-se imperiosa uma estrutura de ouvidoria que permitisse a análise de críticas e sugestões aos serviços prestados, garantindo um importante instrumento para a solução de problemas, melhoria de processos e procedimentos da própria Administração Pública. A criação da Lei de Acesso a Informação (Lei 12.527/2011), permite consolidar estas inovações da democracia participativa, pois permite a Administração Pública à necessária garantia para a sociedade, do acesso às informações, que podem se estabelecer nas ouvidorias públicas. Neste sentido, a Controladoria Geral da União disponibiliza instrumentos de fomento para a criação das ouvidorias para que o acesso à informação ocorra para toda a sociedade, mesmo que em pequenos municípios. A institucionalização de determinadas demandas sociais pelos governos e sua apropriação pela Administração Pública, não deve ser considerada como um empecilho ao conhecimento emancipação, e, da mesma forma, da luta da sociedade e dos trabalhadores por maior participação na política e no Estado. Novas políticas públicas inseridas na gestão dos governos conferem a legitimação necessária a uma nova concepção de Estado em que os movimentos sociais e a sociedade de forma mais ampla, tenham efetivamente seu ingresso pela porta da frente dos governos, permitindo um Estado como novíssimo movimento social. Bibliografia: AVRITZER, Leonardo. Conferências nacionais: ampliando e redefinindo os padrões de participação social no Brasil. Texto para discussão. IPEA: Rio de Janeiro, Maio de 2012. Disponível em http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/1137/1/TD_1739.pdf Acesso em 15 de Janeiro de 2014. Conferências Nacionais http://www.secretariageral.gov.br/art_social/publicacoes/folder-conferenciais2013. Acesso em 10 de Abril de 2014. FERRER, Florencia. Políticas e modelos de atendimento ao cidadão no Brasil. São Paulo, Dezembro de 2012. 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