ANAIS UMA APLICAÇÃO DO MODELO DE CUSTEIO ABC OPERACIONAL EM UMA ORGANIZAÇÃO MILITAR ERIVELTON ARAUJO GRACILIANO ( [email protected] , [email protected] ) FACC / UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CLAUDIO ANTONIO PAULA ( [email protected] ) FACC / UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO SAMUEL COGAN ( [email protected] ) UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO Resumo As discussões sobre métodos de custo fazem com que a literatura se renove de maneira constante. Assim, o custo ABC e a Teoria das Restrições tiveram períodos de auge e de críticas, permitindo estudos sobre a integração de ambos, como o modelo desenvolvido por Kee (2001), chamado de ABC operacional. O presente trabalho estuda o modelo proposto por Kee, aplicando-o em uma organização militar prestadora de serviços na administração pública federal, por meio de pesquisa exploratória e descritiva. Os resultados obtidos com a análise da unidade militar demonstram uma alternativa adequável para a racionalização dos seus gastos públicos. Palavras-chave: Custeio ABC. Teoria das Restrições. ABC operacional. 1. Introdução O controle dos custos mantém uma relação direta com as decisões gerenciais de uma empresa, seja para quantificar os resultados econômico-financeiros e fazer projeções, seja para modificar uma estrutura operacional ou uma composição de produtos. Porém, o método de custeio utilizado pode, sistematicamente, condicionar e distorcer os custos de produtos individuais, quando os distribui pelos produtos por medidas simplistas e arbitrárias, normalmente baseadas na mão-de-obra direta, e que não representam as demandas de cada produto sobre os recursos da empresa. E, quando somente se dispõe de informações distorcidas sobre os custos dos produtos, existe o risco de decisões equivocadas na fixação do preço, no suprimento, no mix de produtos e nas respostas aos concorrentes. A busca por informações de custos mais precisas faz com que a literatura contábil se enriqueça por modelos criados no meio acadêmico e, muitas vezes, no interior das empresas. Assim, acredita-se que tenha ocorrido com o método de custo baseado em atividades (ABC), quando na década de 60 os contadores da empresa General Elétric aperfeiçoaram um sistema de informação para controlar os aumentos dos custos indiretos (LATSHAW e CORTESEDANILE, 2002, apud OLIVEIRA et al, 2008). De modo análogo, o físico israelense Eliyahu Goldratt desenvolveu um método de administração da produção, chamado posteriormente de Teoria das Restrições, para auxiliar no gerenciamento de uma determinada empresa (NOREEN, SMITH e MACKEY, 1996, p.5). Não obstante, o método ABC e a Teoria das Restrições (TOC) são modelos opostos, com visões diferentes que subsidiam as decisões de curto e longo prazo. Em razão de suas 1/13 ANAIS vantagens e desvantagens, ambos foram criticados e defendidos por autores diversos, até que a idéia de integração dos dois métodos fosse defendida por alguns desses autores, como Demmy & Talbott, Cooper & Slagmulder e Stewart & Stovall (OLIVEIRA, 2008). Em 2001, com base nos pensamentos de Woods, Christensen & Sharp e Kaplan & Atkinson, o professor Robert C. Kee, da Universidade do Alabama (EUA), propõe um modelo de custeio ABC, chamado de operacional, em seu artigo “Evaluating the Economics of Short and Long-Run Production-Related Decisions” (SILVA, 2007). Com referido modelo, ele busca suprir as limitações do ABC tradicional, quanto à avaliação das implicações econômicas das decisões operacionais, e considera os custos relevantes e as restrições da capacidade produtiva. A princípio, os modelos de custeio são criados para a aplicação nas empresas, onde o lucro é um dos fatores prepoderantes para medição de desempenho. No setor público o desempenho está relacionado ao conceito de eficiência e eficácia dos gastos públicos. As mudanças no modo de pensar da administração pública ganharam maior destaque a partir da crise do petróleo ocorrida em 1973, com a questão do ajuste estrutural, que representava ajuste fiscal e as reformas orientadas para o mercado. Neste período, passaram a ser adotados modelos gerenciais importados da iniciativa privada, que foram os propulsores das grandes mudanças implementadas na administração pública. Para Wiemer e Ribeiro (2004), a legislação existente enfatiza a necessidade de um sistema de custos como forma de se mensurar conceitos como a eficiência, a eficácia e de avaliação dos resultados da administração. Ressaltam, ainda, que a implantação de sistema de custos é importante para a avaliação dos impactos das políticas públicas, tanto como forma de orientar o Estado no corte dos gastos públicos quanto na aplicação dos recursos. Nesse contexto, embora com suas especificidades relacionadas à missão constitucional, sob o conceito de hierarquia e disciplina, as organizações militares se vêem obrigadas a otimizar os recursos orçamentários em prol da eficiência e eficácia administrativa. Dessa forma, o estudo prático do modelo desenvolvido por Kee (2001), denominado de ABC operacional, em uma unidade militar, pode contribuir para o conhecimento sobre o tema em questão. Este trabalho procurou comparar, por meio de estudo de caso em uma pesquisa exploratória, descritiva, bibliográfica e documental (qualitativas), os resultados obtidos na aplicação real dos métodos de custeio ABC e ABC operacional e da Teoria das Restrições em uma unidade militar prestadora de serviços. Os resultados indicam que as organizações militares, por executarem suas atividades com capacidade operativa e recursos orçamentários restritivos, frente à demanda interna e externa à própria Força Armada, podem se beneficiar de alternativas de método de custeio baseado em atividades e na Teoria das Restrições. O trabalho encontra-se dividido em quatro partes, alem desta introdução. A primeira consiste na apresentação do objetivo e metodologia da pesquisa. A segunda define e caracteriza o custeio baseado em atividades (ABC) e a Teoria das Restrições, remete à importância das decisões de mix de produtos e apresenta as características do modelo de custeio ABC operacional. A terceira traz o levantamento dos dados na organização militar e os analisa com base em comparações dos métodos de custeio utilizados. E, finalmente, na quarta parte são apresentadas as considerações finais. 2. Objetivo e Metodologia Este trabalho tem como objetivo comparar os resultados obtidos na aplicação real dos métodos de custeio ABC e ABC operacional e da Teoria das Restrições em uma unidade 2/13 ANAIS militar prestadora de serviços. O estudo será baseado no modelo proposto por Kee (2001), cuja aplicação utilizou um exemplo numérico hipotético. Para classificação do estudo, tomou-se como base o critério proposto por Gil (2002). Com base no objetivo geral do trabalho, trata-se de uma pesquisa exploratória e descritiva. Exploratória porque procura tornar mais explícito a aplicação do modelo ABC Operacional em uma organização militar e Descritiva porque expõe as características principais do método de custeio ABC, da Teoria das Restrições e do modelo operacional de Kee (2001). Com base nos procedimentos técnicos utilizados, a pesquisa é bibliográfica, documental e estudo de caso. Bibliográfica porque, para a fundamentação teórico-metodológica do estudo, foi realizada a investigação sobre abordagens de diversos autores; Documental, quando se utilizou de relatórios internos da organização; e Estudo de caso porque coletou dados primários junto a integrantes da unidade militar pesquisada, permitindo uma melhor compreensão da aplicação dos métodos de custeio. Como base teórica, utilizou-se da literatura que aborda o custeio baseado em atividades (ABC) e a Teoria das Restrições, uma vez que as ferramentas propostas por essas teorias foram com o intuito de auxiliar no alcance do objetivo desse estudo. Dessa forma, a pesquisa bibliográfica (com base em material publicado em livros, revistas e redes eletrônicas) também foi utilizada como recurso tecnológico. Como as análises e considerações foram realizadas em uma unidade específica, os procedimentos adotados aproximam-se de um estudo de caso. Segundo Yin (2001), este recurso metodológico é largamente utilizado como estratégia de pesquisa em estudos que envolvem a administração pública, estudos de instituições públicas, estudos gerenciais e organizacionais. Para a escolha da unidade de análise foi considerada a tipicidade de operações para a pesquisa. 3. Referencial Teórico 3.1 Custeio baseado em atividades e Teoria das Restrições Lacerda (2005) aborda a diferença entre sistemas e métodos de custeio, onde os primeiros, filosoficamente, norteiam o tratamento das informações e os segundos viabilizam a operacionalização do princípio. Como sistemas de custeio têm-se o sistema por absorção, que consiste na apropriação de todos os custos de produção aos bens elaborados, e o sistema variável ou direto, onde somente os custos variáveis são alocados aos produtos, ficando os custos fixos como despesas do período. O Activity Based Costing (ABC) é um método de custeio que consiste em seccionar a empresa em atividades, mensurar essas atividades com base nos recursos utilizados e alocar custos aos produtos de acordo com a utilização dessas atividades. A abordagem de custeio baseado em atividades resulta em conjuntos mais homogêneos dos custos indiretos de produção, procurando minimizar as distorções de rateios arbitrários e contribuindo para o aprimoramento do sistema de custeio utilizado. De acordo com Horngren, Datar e Foster (2004, p. 131), uma das melhores ferramentas para o aprimoramento de um sistema de custeio é o custeio baseado em atividade, na medida em que consideram as atividades individuais como objetos de custo fundamentais. Ele calcula os custos das atividades e atribui custos para os objetos de custo, como os produtos ou serviços, com base nas atividades necessárias para produzir cada produto ou serviço. Uma atividade é um evento, tarefa ou unidade de trabalho com um propósito específico. Para Nakagawa (2001, p.39), o objetivo do ABC é “rastrear” as atividades mais relevantes, identificando-se as mais diversas rotas de consumo dos recursos da empresa. 3/13 ANAIS Sob o aspecto conceitual, Perez Jr. et al (2001, p.227) afirmam que o método ABC é uma técnica de controle e alocação de custos que permite: identificar os processos e as atividades existentes nos setores produtivos, auxiliares e administrativos de uma organização, seja qual for sua finalidade; identificar, analisar e controlar os custos envolvidos nesses processos e atividades; e atribuir os custos dos produtos, tendo como parâmetro a utilização dos direcionadores (ou geradores) de custos. O ABC permite usar um grande número e variedade de direcionadores e conjunto de custos; isso significa que ele exige a estimativa de muitas funções de custos (HORNGREN, DATAR e FOSTER, 2004, p. 316). Para os autores retro referenciados, o sistema com abordagem ABC classifica custos de várias atividades em quatro grupos, numa hierarquia de custos, com o objetivo de identificar as bases de alocação: custos de produção no nível das unidades, custos no nível dos lotes, custos de sustentação do produto e custos de sustentação da empresa. Uma forma de identificar as atividades é mapear os processos da empresa com a participação das áreas de produção e apoio. A atribuição de custos às atividades deve ser feita da forma mais criteriosa possível de acordo com a seguinte ordem de prioridade: a) alocação direta; b) rastreamento; c) rateio. A alocação direta se faz quando existe uma relação clara e objetiva dos itens de custos com certas atividades. O rastreamento é uma alocação com base na identificação da relação de causa e efeito entre a ocorrência da atividade e a geração de custos. O rateio é realizado apenas quando não há possibilidade de se utilizar nem a alocação direta nem o rastreamento (MARTINS, 2003, p. 101). A Figura 1 apresenta uma ilustração de um modelo ABC esquematizado por Cogan (1998). Figura 1 – Modelo de ABC Fonte: adaptado de Cogan (1998, p.37) Os principais custos e limitações de um sistema com abordagem ABC são as medidas necessárias para implementá-lo. A sua implementação exige que a administração estime os custos dos conjuntos de atividade e identifique e meça os direcionadores de custos para esses conjuntos para servirem como bases de alocação de custos. À medida que esses sistemas ficam muito detalhados, sendo criados mais conjuntos de custos, são necessários mais alocações para calcular os custos da atividade para cada conjunto de custo (HORNGREN, FOSTER e DATAR , 2004, p. 141). Para Garrison e Noreen (2001), o método de custeio baseado em atividade é projetado para municiar os gerentes com informações de custo, para decisões estratégicas ou de outra natureza gerencial, que potencialmente afetem a capacidade e os custos fixos. Assim, o custo 4/13 ANAIS é projetado de forma que não possa ser atribuído diretamente ao produto; logo, é descarregado inicialmente nas atividades necessárias para a sua produção, para em seguida chegar aos produtos. Martins (2003, p.87) ressalta que a diferença fundamental entre o ABC e os sistemas de custeio tradicionais está no tratamento dado aos custos indiretos, pois estes vêm aumentando continuamente e são geralmente alocados aos produtos de forma arbitrária. Não há dúvida de que um sistema de alocação de despesas gerais baseado em atividades adota um enfoque de longo prazo ao invés de um enfoque de curto prazo no comportamento dos custos (SHANK e GOVINDARAJAN, 1997, p.221). Para Cogan (1994, p.78), as técnicas do ABC desenvolvidas para os custos fabris também podem ser aplicadas às organizações do setor de serviços, e nas funções de apoio das empresas. Desta forma, nota-se que o custeio ABC pode ser aplicado às mais diferentes atividades. Na visão de Martins (2003, p. 297), é possível utilizar o método ABC em instituições financeiras, concessionárias de serviços públicos, hospitais, escolas, etc. Enfim, atividades e objetos de custeio são encontrados em todas as organizações, inclusive naquelas de fins não lucrativos. Embora o método ABC tenham sido, por décadas, amplamente disseminado e divulgado como uma excelente proposta de alocação de custos indiretos e, conseqüentemente, prometendo melhor decisão gerencial, alguns autores como Theeuwes e Adriaansen (1994, apud KEE, 2001) passaram a criticar este sistema, seja pelo custo elevado de implementação seja pela dificuldade para a tomada de decisões operacionais, no que tange ao curto prazo. Essas dificuldades do ABC abriram espaço para a disseminação da Teoria das Restrições (TOC), com a finalidade de tomada de decisões de alocação dos materiais a curto prazo. A TOC foi inicialmente descrita pelo físico israelense Eliyahu Goldratt em 1984, no seu livro chamado de “A Meta” (WANKE, 2004). Segundo Noreen, Smith e Mackey (1996, p.5), a TOC teve seu desenvolvimento a partir da década de 70, quando Goldratt auxiliou o gerenciamento da empresa de um amigo: utilizando o processo de raciocínio aplicado à física, Goldratt focalizou-se no desafio de tentar melhorar o desempenho daquela organização; notando que a maior deficiência era a logística da produção, desenvolveu seu próprio método de administração da produção. Grande crítico da contabilidade de custos, bem como de qualquer metodologia correlata, Goldratt desenvolveu a Contabilidade de Ganhos, um sistema de contabilidade gerencial da Teoria das Restrições, onde não há alocação de custos aos produtos e sim a medida de impacto de uma decisão no lucro líquido e no retorno sobre o investimento de uma empresa. A TOC é um desenvolvimento relativamente recente no aspecto prático da tomada de diversas decisões organizacionais nas quais existem restrições. Um dos conceitos mais fundamentais é o reconhecimento do importante papel da restrição de qualquer sistema (CSILLAG e CORBETT NETO, 1998, p.15). Conforme Goldratt (apud CORBETT NETO, 1997, p. 39) a restrição é "qualquer coisa que impeça um sistema de atingir um desempenho maior em relação a sua meta [....]." Diante da meta que fora proposta, as restrições são tratadas como "problemas" a serem resolvidos para o alcance do objetivo. Todo sistema de uma empresa que visa o lucro tem que ter pelo menos uma restrição, cujo gerenciamento deva ser cumprido para que o desempenho do sistema seja melhorado (CSILLAG e CORBETT NETO, 1998, p.23). A meta de uma empresa é ganhar dinheiro hoje e no futuro. A TOC centra-se na gestão das restrições baseado em cinco passos: 1º) identificar a(s) restrição(ões) do sistema; 2º) decidir como explorar a(s) restrição(ões) do sistema, ou seja, não desperdiçar nada dessa restrição; 3º) subordinar qualquer coisa à decisão do passo 2; 4º) levantar a(s) restrição(ões) do sistema; e 5º) voltar ao passo 1 se, nos passos anteriores, uma 5/13 ANAIS restrição for quebrada, porém não deixando que a inércia se torne uma restrição do sistema (COGAN, 2007, p.22). Segundo Cox III e Spencer (2002), a TOC é um processo de melhoria contínua que possui metodologias como o processo de focalização, que consiste em focalizar a meta do sistema, determinar medidas de melhoria, identificar a restrição, gerenciá-la e subordinar todos os recursos a esta restrição. Para julgar se a empresa está indo em direção à sua meta é necessário responder três perguntas: quanto dinheiro é gerado pela nossa empresa? quanto dinheiro é capturado pela nossa empresa? e quanto dinheiro deve-se gastar para operá-la? (GOLDRATT,1991, apud CSILLAG e CORBETT NETO, 1998, p.30). Para responder a tais perguntas, Goldratt propõe uma mudança conceitual e sugere a adoção dos seguintes parâmetros: Ganho; Inventário; e Despesa Operacional. Na concepção de Corbett Neto (1997, p.43), o Ganho (G) é todo o capital gerado pelo sistema através das vendas e é a diferença entre o faturamento e os custos totalmente variáveis (matérias-primas); Inventário (I) é todo capital investido na compra de matérias-primas, a serem transformadas em produtos vendáveis; e despesas operacionais (DO) compõem o capital gasto para transformar inventário em ganho. Essas três medidas fazem a ponte entre o Lucro Líquido (LL) e o Retorno Sobre o Investimento (RSI). As equações do LL e RSI são, respectivamente: LL = G – DO e RSI = LL / I. 3.2 Decisões de mix de produtos Uma das decisões mais difíceis relacionadas à produção da empresa envolve selecionar quais produtos produzir, a fim de maximizar o seu lucro líquido. Para a contabilidade de custos, a redução de custos unitários corresponde ao aumento de lucratividade, enquanto que, para a contabilidade de ganhos, uma decisão de mix de produtos somente pode ser adotada quando se identifica a restrição do sistema de uma empresa, no que tange a sua capacidade de produção. A capacidade do sistema deve ser gerenciada, e os limites de capacidade devem ser levados em consideração no processo de tomada de decisão (CORBETT, 2000). A precisão do custo do produto fundamenta decisões gerenciais tais como determinação do mix de produtos, estabelecimento do preço do produto e ênfase ou não em uma linha de produto (WARREN et al, 2001, p. 388). Horngren, Datar e Foster (2004, p. 139) definem Activity Based Management (ABM) para descrever as decisões gerenciais que usam as informações do custeio baseado em atividades para satisfazer os clientes e melhorar a rentabilidade, o que inclui decisões sobre precificação e mix de produtos. Um importante benefício do ABC é o fornecimento de informações para uma melhor tomada de decisões, quando comparado a um sistema tradicional. Para Cogan (1998, p. 29), o ABC fornece as informações e o ABM a utiliza para as várias análises que objetivam o melhoramento contínuo da produção. Kee (2001) lembra dois importantes fatores que influenciam as decisões de quais produtos produzir: os custos relevantes influenciados pelo tempo de decisão e a capacidade das atividades de produção da empresa. A curto prazo, assim como os materiais diretos, o custo de oportunidade deve ser considerado para avaliação do produto, e a longo prazo as políticas contratuais e gerenciais podem transformar custo comprometido em custo flexível. Já em relação à capacidade de produção, uma capacidade inferior à demanda é causada pela atividade restritiva, o que reduz a produção e altera a composição ótima dos itens a serem produzidos; uma capacidade ociosa representa uma perda de valor adicionada que diminui o lucro que poderia ser obtido com um mix de produtos. 6/13 ANAIS 3.3 Modelo de custeio ABC operacional Para Kee (2001), embora o método de custeio baseado em atividade e a Teoria das Restrições tenham sido igualmente desenvolvidos para fornecer informação que mensurassem as conseqüências financeiras das decisões relacionadas à produção, antagonicamente os dois sistemas de medida fazem suposições radicalmente diversas acerca da economia de manufatura dos produtos fabricados. A diferenciação dos dois sistemas se manifesta na metodologia de tomada de decisão: o ABC (contabilidade de custos) focaliza a redução do custo por unidade, não considera o impacto do ganho da empresa e aceita qualquer aumento de eficiência local; por outro lado, a TOC (contabilidade de ganhos) somente considera a redução no custo total da empresa, focaliza primordialmente o aumento do ganho e somente aceita aumentos de eficiência originados pelo aumento do ganho ou redução dos custos totais (CORBETT, 2000). Essa diferenciação faz com que a TOC seja considerada uma melhor ferramenta para decisões de curto prazo, e o ABC para decisões de longo prazo. Não obstante, decisões econômicas de curto prazo impactam resultados futuros de longo prazo e, não diferentemente, decisões estratégicas de longo prazo podem influenciar resultados presentes. Dessa forma, utilizar os dois sistemas de maneira estanque pode afetar adversamente a implementação adequada de ambos. Em face da importância e das limitações que o ABC e o TOC apresentam, este trabalho adotou como modelo de integração dos dois sistemas, para aplicação real em uma organização militar, o modelo formulado por Robert C. Kee, conforme consta em seu artigo “Evaluating the Economics of Short and Long-Run Production-Related Decisions”. De maneira semelhante, Silva et al (2007) e Oliveira et al (2008) aplicaram esse método, chamado por Kee de ABC operacional, em uma organização pública prestadora de serviços odontológicos e em uma empresa do setor automobilístico, respectivamente, obtendo resultados que ratificam a otimização de decisão de mix de produtos quando integrados os dois sistemas. A integração e coordenação do ABC e da TOC podem otimizar decisões de curto e longo prazo, tendo em vista uma melhor alocação dos recursos. O custeio ABC aloca os custos pelo sistema de absorção, diferenciando-se do custeio tradicional por concentrar-se fundamentalmente nas atividades. Para uma melhor medição do custo adicional dos materiais utilizados por produtos ou outros objetos de interesse de curto prazo, Kaplan e Athinson (1998, apud KEE, 2001) sugerem que o custo de uma atividade seja separado em custos variáveis e fixos, ou melhor, componentes de curto prazo flexível e comprometido. O sistema TOC segrega os componentes variáveis dos fixos, porém, somente considera como custo variável os materiais diretos, o que exclui itens variáveis de produção que podem ocasionar decisões de produção menos lucrativas. Custos flexíveis representam os custos dos recursos adquiridos como demandados, enquanto os custos comprometidos representam os custos dos recursos contratados em adiantamento ao uso (Kee, 2001). O ABC operacional de Robert C. Kee busca superar as limitações do ABC tradicional ao refletir os custos flexíveis de curto prazo nos recursos das atividades e sua utilização na capacidade de uma atividade “gargalo”. Um gargalo é uma atividade mais restrita que limita suas operações e determina as oportunidades de produção disponíveis na empresa. O método consiste em desagregar os componentes flexíveis e os comprometidos de curto prazo, tendo em vista que estes últimos são irrelevantes para o processo de decisão. As taxas direcionadoras de custos são computadas com base nos custos flexíveis das atividades, sendo usadas para medir o custo de produção de curto prazo ou incremental quando traçadas 7/13 ANAIS aos produtos. A rentabilidade do produto é mensurada com base na sua utilização das atividades mais restritas e a seleção de um mix de produtos e sua lucratividade, no curtoprazo, é influenciada pela capacidade das atividades de suporte e de produção da empresa. No próximo tópico, este trabalho buscará identificar o ranking otimizado de um mix de produtos para obter a maior lucratividade dos produtos em análise. Para tanto, o ABC operacional de Kee será calculado da seguinte maneira: identificação dos custos unitários flexíveis; apuração do lucro unitário obtido entre o preço e os custos flexíveis; e divisão do lucro unitário pela hora média unitária na atividade “gargalo”. Essa mensuração permite, ainda, calcular o maior lucro líquido no curto prazo. 4. Aplicação do modelo de custeio ABC operacional 4.1 Dados levantados A unidade militar pesquisa é um órgão de apoio da Administração Pública direta que vem gerenciando seus recursos como uma empresa privada e, por conseguinte, contabilizando os custos operacionais de seus serviços e as despesas administrativas para a sua manutenção. Esses tipos de organizações militares prestam serviços a outras unidades e, eventualmente, a entidades externas à Administração Geral em uma das seguintes áreas: industrial, de pesquisa e desenvolvimento de ciência e tecnologia, hospitalar, de abastecimento ou de serviços especiais, efetuando a cobrança pelos serviços prestados, a partir dos custos e das despesas. A organização em análise projeta e executa serviços de instalação, manutenção e reparo de equipamentos militares, bem como, promove a elevação do nível técnico profissional de seu pessoal especializado e incentiva a indústria nacional no desenvolvimento e produção de materiais alternativos a fim de contribuir para a garantia da operacionalidade da Força subordinada. Para cumprir essas tarefas, de caráter industrial, possui oficinas de mecânica, precisão, eletrônica, eletricidade e ótica. Os dados foram levantados na Oficina de Ótica, a fim de tornar possível a pesquisa no tamanho que este trabalho requer. A coleta baseou-se nas informações do ano de 2008, onde, dentre diversos serviços executados, foram considerados três para estudo de caso. Essa redução quantitativa de serviços analisados visa obter maior simplificação e melhor otimização do conteúdo apresentado. Os dados estão dispostos em três tabelas correlacionadas, sendo que a primeira apresentará a estrutura operacional, ramificando as atividades desenvolvidas e o preço dos serviços em análise. Todos os valores foram isolados em duas colunas, de forma a possibilitar a compreensão dos custos flexíveis (CF), separados dos custos totais (CT). Com o intuito de se familiarizar o desenvolvimento do trabalho com os termos utilizados nas referências teóricas, e para tornar clara a diferença entre os serviços relacionados a atividades do custeio ABC e os serviços para designar os objetos de custo, estes serão chamados, ao longo do trabalho, de produtos: Produto “BRAVO”, Produto “SIERRA” e Produto “CHARLIE”. Visando atender ao foco do trabalho, optou-se pela simplificação dos dados apresentados, contudo, mantendo a correta aplicação da sistemática do custeio ABC. Esta simplificação abrangeu o detalhamento da distribuição dos recursos das atividades para os produtos, os quais foram selecionados atendendo ao critério de maior demanda, segundo apontamentos feitos junto aos integrantes da Oficina de Ótica. Ressaltando o tratamento aplicado aos custos da tabela a seguir, percebe-se um tratamento oposto entre os de material direto e os de mão-de-obra. Os custos de material direto foram totalmente considerados como flexíveis, enquanto que os custos de mão-de-obra direta foram integralmente tratados como comprometidos. Os demais custos apresentam um 8/13 ANAIS comportamento misto, pois possuem uma parcela flexível e outra, maior, de custos comprometidos. TABELA 1 - CUSTOS, ESTRUTURA OPERACIONAL E PREÇOS CUSTO UNITÁRIO DO PRODUTO BRAVO CT (R$) CF (R$) MOD 813,74 0,00 MATERIAL DIRETO 55,32 55,32 DESMONTAGEM 90,95 18,89 MANUTENÇÃO 181,91 37,78 MONTAGEM 90,95 18,89 CUSTO ABC PREÇO LUCRO CUSTO UNITÁRIO DO PRODUTO SIERRA MOD MATERIAL DIRETO DESMONTAGEM MANUTENÇÃO ELÉTRICA MONTAGEM CUSTO ABC PREÇO LUCRO CUSTO UNITÁRIO DO PRODUTO CHARLIE MOD MATERIAL DIRETO DESMONTAGEM MANUTENÇÃO REGULAGEM MONTAGEM CUSTO ABC PREÇO LUCRO 1.232,87 1.283,42 50,55 130,87 1.283,42 1.152,55 CT (R$) 724,99 35,71 81,66 163,31 40,83 81,66 CF (R$) 0,00 35,71 17,60 35,20 8,80 17,60 1.128,15 1.171,02 42,87 114,90 1.171,02 1.056,11 CT (R$) 951,60 26,67 82,38 123,57 82,38 82,38 CF (R$) 0,00 26,67 18,32 27,48 18,32 18,32 1.348,97 1.402,93 53,96 109,11 1.402,93 1.293,82 Fonte: Elaborado pelos autores. Dentro do espaço temporal estudado, seriam necessárias 3.383,4 HH (hora homem) para atender toda a demanda necessária, porém, a Oficina dispunha somente de 2.254 HH, valor aproximadamente 33% inferior ao ideal. Os três métodos de custeio considerados neste trabalho são comparados na Tabela 2, onde é apresentado o valor necessário de HH para a execução de cada produto, bem como o lucro ou ganho unitário obtido pelos três métodos, conforme consta na Tabela 1. Ainda na Tabela 2, estão as demandas de cada produto e a classificação em termos de lucratividade dos mesmos. O mix do ABC Operacional foi obtido ao dividir-se o lucro unitário de cada produto, baseado nos custos flexíveis, pelo recurso gargalo, que é o HH da mão-de-obra direta, sendo o produto SIERRA considerado como o de maior lucratividade, seguido pelo BRAVO e, em último lugar, o CHARLIE. 9/13 ANAIS Os resultados obtidos pela aplicação da TOC chegaram ao mesmo mix de produtos do ABC Operacional. Porém, observa-se que o método do ABC tradicional estabeleceu um novo mix de produtos, onde o BRAVO passou a ser o produto de maior lucro percentual em relação ao preço. Em seguida, temos o CHARLIE e o SIERRA, nesta ordem. TABELA 2 – SELEÇÃO DE MIX ÓTIMO E CAPACIDADE NÃO USADA MÉTODOS DE CUSTEIO ABC OPERACIONAL LUCRATIVIDADE/UNID HH MOD/UNID LUCRATIVIDADE/HH MOD RANKING EM LUCRATIVIDADE DEMANDA MIX ÓTIMO DE PRODUTOS HH MOD NÃO USADA BRAVO SIERRA CHARLIE R$ 1.152,55 26,68 R$ 43,20 2º 63 UN 52 UN R$ 1.056,11 23,77 R$ 44,43 1º 48 UN 48 UN R$ 1.293,82 31,20 R$ 41,47 3º 18 UN 0 UN R$ 42,87 R$ 1.171,02 3,66% 3º 48 UN 13 UN R$ 53,96 R$ 1.402,93 3,85% 2º 18 UN 18 UN R$ 1.135,30 23,77 R$ 47,76 1º 48 UN 48 UN R$ 1.376,26 31,20 R$ 44,11 3º 18 UN 0 UN 25,68 HH ABC TRADICIONAL LUCRATIVIDADE/UNID PREÇO LUCRO/PREÇO RANKING EM LUCRATIVIDADE DEMANDA MIX ÓTIMO DE PRODUTOS HH MOD NÃO USADA R$ 50,55 R$ 1.283,42 3,94% 1º 63 UN 63 UN 2,55 HH TEORIA DAS RESTRIÇÕES GANHO HH MOD/UNID GANHO/HH MOD RANKING EM LUCRATIVIDADE DEMANDA MIX ÓTIMO DE PRODUTOS HH MOD NÃO USADA R$ 1.228,10 26,68 R$ 46,03 2º 63 UN 52 UN 25,68 HH Fonte: Elaborado pelos autores. Uma comparação do resultado líquido no curto prazo, entre os três métodos analisados neste trabalho, é apresentada na Tabela 3, onde se encontram dispostas as receitas líquidas obtidas para cada método, considerando-se os recursos comprometidos que não foram empregados, referentes à mão-de-obra direta, conforme exposto na Tabela 2. Os dados apresentados são resultado da multiplicação das quantidades encontradas nos mix selecionados por cada método pelos valores de preço e custos apresentados na Tabela 1, bem como a capacidade não usada, constante na Tabela 2. O valor do HH em termos de custo é de R$ 30,50 – dado obtido junto à oficina pesquisada. TABELA 3 – RESULTADO LÍQUIDO NO CURTO-PRAZO MÉTODO RECEITA TOTAL RECURSOS USADOS ABC OPERACIONAL ABC TRADICIONAL R$ 122.946,58 R$ 121.331,16 R$ 118.260,36 R$ 116.618,10 10/13 TOC R$ 122.946,58 R$ 118.260,36 ANAIS RECURSOS NÃO USADOS RECEITA LÍQUIDA Fonte: Elaborado pelos autores. R$ 783,24 R$ 3.902,98 R$ 77,78 R$ 4.635,29 R$ 783,24 R$ 3.902,98 4.2 Análise dos resultados Após a apresentação das tabelas, averigua-se que há um mix de produção mais lucrativo no curto-prazo do que o encontrado pelo ABC tradicional, seguindo o modelo proposto por Kee (2001). Ele colocou o ABC como instrumento prático para a necessidade de decisão no curto prazo, por intermédio da separação dos custos flexíveis dos totais, e empregando o gerenciamento de gargalos conforme preconizado pela TOC. Com o emprego do ABC Operacional, obteve-se uma receita líquida 15,80% inferior à obtida na aplicação do método tradicional de ABC. Assim, torna-se válida a afirmação dos autores que defendem limitações neste espaço temporal. A comparação com o método TOC trouxe os resultados iguais, ressaltando-se, porém, que esta teoria, por não calcular custos, deixa de agregar ao material direto os demais custos flexíveis que, conforme já mencionado, são variáveis no curto-prazo. Ocorrendo a adoção de tal prática, novos resultados seriam alcançados, devido ao cálculo do ganho de cada produto ser menor, fato que poderia vir a retirar a primazia da TOC como melhor ferramenta para o curto-prazo. 5. Considerações finais A TOC, fundamentada na contabilidade dos ganhos, vem sendo considerada nos últimos anos como a ferramenta mais adequada para o gerenciamento de decisões no curto prazo. Contudo, o ABC, sistema estabelecido na contabilidade custos, é criticado por não contribuir da mesma forma. Assim, Kee (2001) buscou reverter a imagem da incapacidade do ABC em apoiar as decisões de curto prazo. Para isso, realizou a separação dos custos flexíveis dos custos totais no curto prazo, considerando os custos comprometidos como irrelevantes para a definição do mix ótimo de produção, já que se encontram contratados. Assim, intitulou o novo modelo de ABC Operacional. Este modelo foi aplicado na Oficina de Ótica da unidade militar, corroborando o conjecturado exemplo elucidado por Kee (2001). No referencial teórico apresentado anteriormente, verifica-se uma divergência temporal entre a TOC e o ABC. O primeiro método sendo indicado para o curto prazo e o ABC para o longo. A combinação dessas duas teorias poderá maximizar seus resultados, através do reconhecimento das deficiências e pontos fortes de ambas. Enquanto o ABC visa a análise causal entre os produtos gerados e os recursos empregados na produção, a TOC busca a otimização da produção. Para isso, verifica os gargalos, buscando eliminá-los e reconhece os produtos com melhor ganho, considerando o fator que limita a produção. Já o sistema de custeio ABC propicia maior precisão nos custos e lucratividade. Para uma organização militar com uma capacidade de atendimento inferior à demanda de serviços, em especial quando esses serviços são demandados dentro da própria Força, o que significa somente remanejamento de recursos orçamentários, o modelo de Kee se apresenta como uma alternativa para a tomada de decisões relacionadas à prioridade dos serviços a serem atendidos, ao investimento em setores restritivos (gargalos) e à otimização da aplicação dos recursos dotados no exercício. Uma análise de quais serviços priorizar pode ser desenvolvida com referência à margem líquida pelo fator restritivo, em circunstâncias onde haja gargalos para a execução de qualquer um dos serviços a serem realizados, 11/13 ANAIS configurando-se, desta forma, em uma alternativa adequável para a racionalização dos gastos públicos. Bibliografia COGAN, S. Activity-based costing (ABC) A poderosa estratégia empresarial. São Paulo: Editora Pioneira, 1994. COGAN, S. Modelos de ABC/ABM. São Paulo: Qualitymark, 1998. 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