UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ SHIESE GUERREIRO O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IMPESSOALIDADE: uma análise sob o prisma da Licitação na modalidade Convite Tijucas 2008 SHIESE GUERREIRO O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IMPESSOALIDADE uma análise sob o prisma da Licitação na modalidade Convite Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus de Tijucas. Orientador: Prof. MSc. Alexandre Botelho Tijucas 2008 SHIESE GUERREIRO O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IMPESSOALIDADE uma análise sob o prisma da Licitação na modalidade Convite Esta Monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovada pelo Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus de Tijucas. Área de Concentração/Linha de Pesquisa: Direito Público/Direito Constitucional Tijucas, 23 de junho de 2008. Prof. MSc. Alexandre Botelho Orientador Prof. MSc. Marcos Alberto Carvalho de Freitas Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica Dedico este trabalho à minha amada mãe, meu querido irmão e meu saudoso pai (in memoriam), que no aconchego do lar e no seio do amor, me ensinaram que embora a estrada seja longa, o destino é certo e generoso com aqueles que têm coragem de lutar e sabem onde querem chegar. Agradeço de forma incomensurável à minha adorada mãe, Maria Francisca, por ser o baluarte de minha vida e de meus objetivos, obrigada por seu amor incondicional. Agradeço ao meu querido irmão, Valmor, por acreditar fielmente em meus potenciais e tornar-se um exemplo a ser seguido. Agradeço ao meu saudoso pai, Valmor Guerreiro (in memoriam) que mesmo não estando ao meu lado, faz-se presente em meu coração, por dar-me forças pra resistir aos obstáculos e nunca desistir de meus ideais. Ao Professor Orientador, Alexandre Botelho, norte seguro na orientação deste trabalho, por ter sido compreensivo, preocupado e inteiramente acessível no decorrer desta pesquisa. Agradeço-o de todo o meu coração. Agradeço ao meu primo e amigo Evaldo José Guerreiro Filho, por ter me incentivado a persistir nos estudos e por ter me ensinado a ser uma pessoa melhor a cada dia. Agradeço à Aline Andrade Rodrigues, minha prima de coração, por ter colaborado muito na obtenção dos livros utilizados. Agradeço à minha cunhada Rosemeri por compartilhar de minhas angústias e me acalentar com palavras de apoio. Agradeço ao Dr. Samuel Dal Farra Naspolini pelas peças disponibilizadas e por estar sempre acessível apesar de sua correria diária. Agradeço aos meus patrões, Alexandre José Moreira e Carlos Leandro Moreira pela compreensão durante os dias em que precisei ausentar-me do trabalho. À minha querida amiga Gilmara Monteiro Baltazar por compartilhar comigo agradáveis anos de afinidade e companheirismo. Ao colega Rodrigo Henkels por estar sempre disposto a dirimir dúvidas provenientes da pesquisa jurídica e pelo estímulo concedido. À Priscila Dias de Oliveira Santos por seus conselhos sempre sensatos e por estar sempre presente, apesar da distância. Agradeço de forma especial aos meus amigos Rafaela Ohlson e Ricardo Manoel de Mello por dividirem comigo uma amizade sincera e leal. Agradeço à todos os meus colegas de classe, especialmente os amigos Adilson Machiavelli, Carlos Alberto Loewenthal, Márcia Silva Battistotti, Cláudia Viviane Carniel, Alessandra Cabral, Marlene Maia, Aline Carvalho, José Augusto da Silva, Mery Helen Spader, Mariana Campos, Giovani Zanluca, Ramiro Machado Filho, Maurício Basso, Leandro Agostini, José Antônio Mafessoli, Aguimar de Souza, Rafael Tridapalli, Altino dos Santos Junior, Rita Camanho, Leide Daiana, Rafael Mannrich e Paulo César Cruz, pelos momentos que passamos juntos e pelas experiências trocadas. Aos Professores do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, Campus de Tijucas, que muito contribuíram para a minha formação jurídica. Às funcionárias da biblioteca da UNIVALI, Vanessa, Salete e Maria da Conceição por estarem sempre dispostas a ajudar e pelo excelente atendimento que oferecem. A todas as pessoas que, direita ou indiretamente, contribuíram para a realização desta pesquisa. A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais conseguirei alcançá-la. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar. Eduardo Galeano TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Tijucas, 23 de junho de 2008. Shiese Guerreiro Graduanda RESUMO Esta monografia é resultado da investigação científica sobre o papel dos Princípios Constitucionais que incidem na Licitação na modalidade Convite. Em razão do desempenho dos Princípios Constitucionais no ordenamento jurídico vigente, verifica-se que eles são postos no mais alto nível hierárquico das Normas e servem como fundamentação, interpretação e suprimento das lacunas que possam existir nas Regras de direito positivo. Devem ser tidos como o sustentáculo e a razão de ser do Estado, sendo por ele observados cautelosamente. São Normas que norteiam as Regras e servem de suporte para a criação das mesmas. O Princípio Constitucional da Impessoalidade, entendido como baluarte da boa Administração, corresponde às aspirações de imparcialidade e igualdade dos administrados e permite que a Administração atinja seu objetivo primordial, que é o bem comum, o bem de cada indivíduo em concomitância com o da coletividade. O Princípio da Impessoalidade impede que o Administrador aja de forma pessoal ou subjetiva em razão do cargo que ocupa na Administração. Na Licitação Pública, procedimento administrativo que visa angariar a melhor proposta para futuras contratações por parte da Administração, percebe-se uma modalidade que, no caso concreto, afronta ao Princípio da Impessoalidade que é basilar para a transparência administrativa. Esta modalidade é o Convite, que apesar de não ferir o Princípio da legalidade, viola outros Princípios básicos da Administração Pública. Entretanto, quando se fala em probidade ou moralidade administrativa, significa que não basta a observância restrita à lei, é preciso também observar os Princípios éticos, de boa-fé que assegurem a boa Administração. Palavras-chave: Princípio da Impessoalidade. Licitação. Convite. RESUMEN Esta monografia es el resultado de la investigación científica sobre el papel de los Principios Constitucionales que inciden en la modalidad de Licitación Invitación. En razón del desempeño de los Principios constitucionales en el orden jurídico vigente, se observa que ellos se ubican en el más alto nivel jerárquico de las Normas, y sirven como fundamento, interpretación y suplen las lagunas que puedan existir en las Reglas del Derecho Positivo. Deben ser tenidos como sustento de la razón del ser del Estado, siendo por el observados cautelosamente. Son Normasque guian a las Reglas y sirven de soporte para la creación de las mismas. El Principio Constitucional de la Impersonalidad, entendido como baluarte de la buena administración, corresponde a las aspiraciones de imparcialidad e igualdad de los administrados y permite que la Administración alcance su objetivo primordial, que es el bien común, el bien de cada individuo en concomitancia con el de la colectividad. El Principio de la Impersonalidad impide que el Administrador actue de forma parcial o subjetiva en razón del cargo que ocupe en la administración. En la Licitación Pública, el procedimiento administrativo que tiene el fin de elgir la mejor propuesta para futuras contrataciones por parte de la administración, se percibe que, en caso concreto, se contrapone al Principio de la Impersonalidad que es resguardar la transparencia administrativa. Esta modalidad es el Invitación, que a pesar de no herir el Principio de legalidad, viola otros Principios básicos de la administración Pública. Mientras, cuando se habla sobre honradez o moralidad administrativa, significa que no alcanza el cumplimiento rigoroso de la ley, es necesario observar también los Princípios éticos, de buena fé, que aseguren la buena Administración. Palabras-clave: Principio de la Impersonalidad. Licitación. Invitación. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS art., arts. Cf. artigo, artigos Conforme CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 etc. et cetera (e assim por diante) § parágrafo LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS Lista de categorias1 que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais2. Administração Pública Trata-se da própria gestão dos interesses públicos executada pelo Estado, seja através da prestação de serviços públicos, seja por sua organização interna, ou ainda pela intervenção no campo privado, algumas vezes até de forma restritiva (poder de polícia). Seja qual for a hipótese da administração da coisa pública, é inafastável a conclusão de que a destinatária última dessa gestão há de ser a própria sociedade, ainda que a atividade beneficie, de forma imediata, o Estado. É que não se pode conceber o destino da função pública que não seja voltado aos indivíduos, com vistas a sua proteção, segurança e bem-estar. Cf. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 5. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1999, p. 6. Constituição Lei fundamental e suprema de um Estado, que contém Normas referentes à estruturação do Estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias e deveres dos cidadãos. Cf. MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 36. Convite Convite é a modalidade de procedimento licitatório efetuada mediante convocação específica a pessoas determinadas, cuja idoneidade é presumida, e que, em função da estreiteza do chamamento, exige um mínimo de publicidade indispensável para a observância ao Princípio da isonomia. Cf. DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 81. Licitação O procedimento administrativo pelo qual um ente público no exercício da função administrativa, abre a todos os interessados, que se sujeitem às condições fixadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas dentre as quais 1 Denomina-se “categoria” a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. 8. ed. Florianópolis: OAB Editora, 2003, p. 31. 2 Denomina-se “Conceito Operacional” a definição ou sentindo estabelecido para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas ao longo do presente trabalho. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica, p. 43. selecionará e aceitará a mais conveniente. Cf. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 348. Norma (s) As Normas são preceitos que tutelam situações subjetivas de vantagem ou vínculo, ou seja, reconhecem, por um lado, a pessoas ou a entidades a faculdade de realizar certos interesses por ato próprio ou exigindo ação ou abstenção de outrem, e, por outro lado, vinculam pessoas ou entidades à obrigação de submeter-se às exigências de realizar uma prestação, ação ou abstenção em favor de outrem. Cf. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 94. Princípio (s) Mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes Normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. Cf. MELO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 450. Princípios Constitucionais Os Princípios Constitucionais são os conteúdos primários diretores do sistema jurídico normativo fundamental de um Estado. Dotados de originalidade e superioridade material sobre todos os conteúdos que formam o ordenamento constitucional, os valores firmados pela sociedade são transformados pelo Direito em Princípios. Adotados pelo constituinte, sedimentam-se nas Normas, tornando-se então, pilares que informam e conformam o Direito que rege as relações jurídicas no Estado. São eles, assim, as colunas-mestras da grande construção do Direito, cujos fundamentos se afirmam no sistema constitucional. Cf. ROCHA, Cármen Lúcia Antunes da. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994, p. 21. Princípio Constitucional da Impessoalidade O Princípio da Impessoalidade da Administração Pública traduz-se na ausência de marcas pessoais e particulares correspondentes ao administrador que, em determinado momento, esteja no exercício da atividade administrativa, tornando-a, assim, afeiçoada a seu modelo, pensamento ou vontade. Cf. ROCHA, Cármen Lúcia Antunes da. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994, p. 147. Regra (s) As Regras são Normas imediatamente descritivas, primariamente retrospectivas e com pretensão de decidibilidade e abrangência, para cuja aplicação se exige a avaliação da correspondência, sempre centrada na finalidade que lhes dá suporte ou nos Princípios que lhes são axiologicamente sobrejacentes, entre a construção conceitual da descrição normativa e a construção dos fatos. Cf. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos Princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 70. SUMÁRIO RESUMO................................................................................................................................... 8 RESUMEN ................................................................................................................................ 9 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ........................................................................... 10 LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS ............................ 11 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 14 2 A IMPORTÂNCIA DOS PRINCÍPIOS JURÍDICOS NA COMPREENSÃO DO ORDENAMENTO JURÍDICO ............................................................................................. 18 2.1 A NORMA JURÍDICA ...................................................................................................... 18 2.2 PRINCÍPIOS E REGRAS .................................................................................................. 27 2.3 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS ................................................................................. 34 3 PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IMPESSOALIDADE ........................................ 43 3.1 BREVE ESCORÇO CONCEITUAL ................................................................................. 43 3.2 CONTEÚDO CONSTITUCIONAL DO PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE ............ 52 3.3 O PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE EM CONSONÂNCIA COM OS DEMAIS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS EXPRESSOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ..... 60 4 O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IMPESSOALIDADE SOB O PRISMA DA LICITAÇÃO NA MODALIDADE CONVITE ................................................................... 66 3.1 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ........................................................................................ 66 3.2 LICITAÇÃO....................................................................................................................... 69 3.3 O CONVITE ....................................................................................................................... 79 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 93 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 97 1 INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por objeto o estudo do Princípio Constitucional da Impessoalidade sob o prisma da Licitação na modalidade Convite. A importância do estudo deste tema reside em demonstrar o grau de essencialidade e de hierarquia que emanam dos Princípios Constitucionais como fontes primeiras do Direito e como Norma das Normas, assim como ressaltar a necessidade de sua correta aplicação com o escopo de evitar atos administrativos desconexos do ordenamento jurídico, especialmente no procedimento licitatório, em particular na modalidade denominada Convite. Ressalte-se que, além de ser requisito imprescindível à conclusão do curso de Direito na Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, o presente relatório monográfico também vem colaborar para o conhecimento de um tema que, se na dimensão social-prática não pode ser tratado como elemento novo e na dimensão jurídica ainda encontra-se repleto de nuances a serem destacadas pelos intérpretes jurídicos. Verifica-se que o presente tema, na atualidade, ainda se encontra impregnado de muita confusão semântica, no entanto, na prática licitatória é notória a afronta ao Princípio Constitucional da Impessoalidade, notadamente na modalidade Convite, o que causa grave dano ao interesse e ao erário públicos e ofende a finalidade administrativa. A escolha do tema é fruto do interesse pessoal da pesquisadora em demonstrar que a Licitação na modalidade Convite vem sendo freqüentemente fraudada em razão da inobservância ao Princípio Constitucional da Impessoalidade e dos demais Princípios da boa administração, elencados no artigo 37 da Constituição da República, assim como para instigar novas contribuições sobre assuntos análogos, especialmente no âmbito de atuação do Direito Constitucional/Administrativo. Em vista do parâmetro delineado, constitui-se objetivo geral deste trabalho analisar o Princípio Constitucional da Impessoalidade sob o prisma da Licitação na modalidade Convite. 15 O objetivo institucional da presente Monografia é a obtenção do Título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus de Tijucas. Como objetivo específico, pretende-se demonstrar através da pesquisa jurídica o valor dos Princípios Constitucionais como baluartes de criação da Regra jurídica, bem como analisar a aplicação do Princípio Constitucional da Impessoalidade à Licitação na modalidade Convite. A análise do objeto do presente estudo incidirá sobre as diretrizes teóricas propostas por Carmen Lúcia Antunes da Rocha, na obra Princípios da administração pública; Rui Samuel Espíndola, na obra Conceito de Princípios constitucionais; Joel de Menezes Nihebur, na obra O Princípio da isonomia na licitação pública; Paulo Bonavides na obra Curso de direito constitucional; Lívia Maria Armentano Koenigstein Zago, na obra O Princípio da impessoalidade; Helly Lopes Meirelles, na obra Direito administrativo brasileiro; e Marco Luciano Wahlbrinck, no artigo A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa. Este será, pois, o marco teórico que norteará a reflexão a ser realizada sobre o tema escolhido. Sob sua luz, pretende-se investigar os deslocamentos percebidos pelo objeto central da pesquisa, especialmente na literatura jurídica contemporânea, colmatando seu significado na atualidade. Com a realização deste trabalho não se pretende esgotar as dúvidas existentes sobre o objeto, nem mesmo estabelecer conceitos fechados, tampouco apontar para a necessidade de engessar o Direito. Por certo não se estabelecerá um ponto final em referida discussão. Pretende-se, tão-somente, aclarar o pensamento existente sobre o tema e desta forma colaborar com o amadurecimento do Direito no que tange às diversas interpretações concernentes a ele. Para o desenvolvimento da presente pesquisa foi formulado o seguinte questionamento: a) O Princípio Constitucional da Impessoalidade pode ser afrontado pela Licitação na modalidade Convite de forma concreta? Já as hipóteses consideradas foram as seguintes: a) Sim, pois no que tange à escolha e convite de pessoas para a prática do procedimento licitatório de forma concreta, o Princípio Constitucional da Impessoalidade está 16 sendo violado, já que através do poder discricionário o administrador público tem a faculdade de escolher e convidar pessoas determinadas para tal ato, estando elas cadastradas ou não; Ainda, as características da Licitação na modalidade Convite facilitam a infração dos administradores ao Princípio da Impessoalidade e aos demais Princípios da Administração Pública, visto que promovem atos ímprobos em razão de sua simplicidade. b) Não. O Princípio Constitucional da Impessoalidade não pode ser afrontado pela Licitação na modalidade Convite de forma concreta. Finalmente, buscou-se nortear as hipóteses formuladas com as seguintes variáveis: a) O exercício do poder constituinte derivado através do Congresso Nacional, alterando a CRFB/88; b) O exercício do poder legislativo alterando a Lei n. 8.666/93. O relatório final da pesquisa foi estruturado em três capítulos, podendo-se, inclusive, delineá-los como três molduras distintas, mas conexas: a primeira, atinente aos Princípios Constitucionais, na qual se procurou demonstrar as duas espécies normativas, quais sejam, os Princípios e as Regras, bem como diferenciar cada um deles, delimitando o grau de hierarquia concernente aos Princípios Constitucionais, por serem o baluarte na criação da Regra e por indicarem a diretriz a ser seguida pelo legislador; a segunda, referente ao Princípio Constitucional da Impessoalidade, que traz no seu cerne, caráter fundamental para a boa administração, visto que evita o favorecimento de pessoas determinadas em detrimento de outras. Faz com que o Estado aja com neutralidade e imparcialidade diante dos administrados, possibilitando assim, a igualdade de tratamento entre eles; e, por derradeiro, cuidou-se de demonstrar a aplicação do Princípio Constitucional da Impessoalidade na Licitação em sua modalidade Convite, visto que a inobservância do Princípio da Impessoalidade pode vir a ferir a finalidade administrativa, bem como infringir o direito dos administrados de imparcialidade por parte da Administração Pública. Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na fase de investigação foi utilizado o método dedutivo, e, o relatório dos resultados expresso na presente monografia é composto na base lógica dedutiva3, já que se parte de uma formulação geral do problema, buscando-se 3 Sobre os “Métodos” e “Técnicas” nas diversas fases da pesquisa científica, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica, p. 99-125. 17 posições científicas que os sustentem ou neguem, para que, ao final, seja apontada a prevalência, ou não, das hipóteses elencadas. Nas diversas fases da pesquisa, foram acionadas as técnicas do referente, da categoria, do conceito operacional e da pesquisa bibliográfica4. É conveniente ressaltar, enfim, que, seguindo as diretrizes metodológicas do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, as categorias fundamentais, são grafadas, sempre, com a letra inicial maiúscula e seus conceitos operacionais apresentados em Lista de Categorias e seus Conceitos Operacionais, ao início do trabalho. Os acordos semânticos que procuram resguardar a linha lógica do relatório da pesquisa e respectivas categorias, por opção metodológica, estão apresentados na Lista de Categorias e seus Conceitos Operacionais, conforme sugestão apresentada por Cesar Luiz Pasold, muito embora algumas delas tenham seus conceitos mais aprofundados no corpo da pesquisa. Ressalte-se que a estrutura metodológica e as técnicas aplicadas neste relatório estão em conformidade com as propostas apresentadas no Caderno de Ensino: formação continuada. Ano 2, número 4, assim como nas obras de Cezar Luiz Pasold, Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito e Valdir Francisco Colzani, Guia para redação do trabalho científico. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre o tema abordado. Com este itinerário, espera-se alcançar o intuito que ensejou a preferência por este estudo: o de demonstrar se ocorre violação (ou não) ao Princípio Constitucional da Impessoalidade na Licitação em sua modalidade Convite de forma concreta. Pretende-se demonstrar o respeito (ou não), aos Princípios constitucionais elencados no artigo 37 da Constituição da República, em especial o Princípio da Impessoalidade, já que sua inobservância possibilita ao administrador estabelecer um procedimento de índole pessoal e subjetiva nas escolhas que faz para proceder a Licitação na modalidade Convite. 4 Quanto às “Técnicas” mencionadas, vide PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica, p. 61-71, 3141, 45- 58, e 99-125, nesta ordem. 2 A IMPORTÂNCIA DOS PRINCÍPIOS JURÍDICOS NA COMPREENSÃO DO ORDENAMENTO JURÍDICO O presente relatório monográfico possui como objeto a aplicação, ou não, do Princípio da Impessoalidade nos procedimentos licitatórios, particularmente na modalidade Convite, em face do objeto monográfico, acredita-se conveniente apresentar, ao início do trabalho, uma noção, ainda que vaga e sem a intenção de esgotar as polêmicas desta seara jurídica, a respeito da compreensão da categoria jurídica dos Princípios. Assim, o presente capítulo possui por intento, identificar para o leitor o papel dos Princípios Constitucionais no Ordenamento Jurídico vigente. Para alcançar este desiderato opta-se por apresentar, inicialmente, o gênero ao qual pertencem os Princípios, ou seja, a Norma jurídica. Sem solução de continuidade, apresentar-se-á de que modo os juízos de valores interferem na compreensão principiológica do Ordenamento Jurídico. Ato contínuo buscar-se-á identificar e enumerar os elementos que distinguem os Princípios das Regras jurídicas, de modo a permitir uma exata compreensão do objeto da pesquisa nos capítulos seguintes. Ao final deste capítulo proceder-se-á uma apresentação das principais características que conformam a compreensão dos Princípios Constitucionais por parte da doutrina, com a finalidade de ressaltar os elementos conformadores de sua aplicação na práxis administrativa, especificamente, para fins deste trabalho, no que diz respeito ao procedimento licitatório na modalidade Convite. 2.1 A NORMA JURÍDICA Antes de se adentrar no objeto de estudo a que se propõe este item, mister se faz esclarecer, ainda que de forma superficial, a razão de sua existência e o fim que busca alcançar. Necessita o relacionamento social, de predisposições que instruam as pessoas a como se comportar e o que fazer diante de outras pessoas ou mesmo de determinadas situações, isto 19 ocorre principalmente pelo fato de que estas pessoas pretendem, ou buscam alcançar certos fins na vida em sociedade. Isto cria uma necessidade social de regulamentação para que estas relações possam ocorrer. Essas mesmas Regras, que conduzem os atos em sociedade, denominam-se Normas sociais, as quais têm por objetivo harmonizar e concretizar a pacificidade em uma determinada sociedade dentro de uma época específica5. Montoro afirma categoricamente que “a Norma Jurídica é, em primeiro lugar, uma Regra de conduta social. Seu objetivo é regular as atividades dos homens em suas relações sociais”. Com base no entendimento supra, verifica-se que, a Norma social nada mais é, senão a própria Norma jurídica, por possuírem ambas o mesmo sentido e finalidade6. Para clarear o entendimento acerca da Norma jurídica, apresenta-se o conceito fornecido por Silva: As Normas são preceitos que tutelam situações subjetivas de vantagem ou vínculo, ou seja, reconhecem, por um lado, a pessoas ou a entidades a faculdade de realizar certos interesses por ato próprio ou exigindo ação ou abstenção de outrem, e, por outro lado, vinculam pessoas ou entidades à obrigação de submeter-se às exigências de realizar uma prestação, ação ou abstenção em favor de outrem7. Diniz complementa o enunciado acima, ao afirmar o seguinte a respeito das Normas jurídicas: Poder-se-á dizer que não há uma Norma jurídica que não deva sua origem a um fim, a um propósito, a um motivo prático. O propósito, a finalidade consiste em produzir na realidade social determinados efeitos que são desejados por serem valiosos, justos, convenientes, adequados a subsistência de uma sociedade, oportunos etc. (...) Resultado, pois, claro que o fim da Norma jurídica consiste em lograr que seus sujeitos cumpram a conduta que aparece como ordenada, por exemplo: que respeitem a vida, a integridade física do próximo, a liberdade lícita dos demais; que não se apoderem dos bens alheios, que paguem os impostos etc. Assim, segundo o que observou Ihering, a Norma jurídica é o instrumento elaborado pelos homens para lograr aquele fim consistente em que se produz a conduta desejada; é, portanto, um meio especial adotado pelos indivíduos em sociedade para assegurar a realização dos fins cujo logro consideram 5 MONTORO, André Franco. Introdução à ciência do direito. 25. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 302. 6 MONTORO, André Franco. Introdução à ciência do direito, p. 305. 7 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 94. 20 necessário à sua vida. A teleologia social tem, portanto, um papel dinâmico e de impulsão Normativa8. Bobbio leciona que “o valor de uma Norma jurídica, indica a qualidade de tal Norma, pela qual esta é conforme o direito ideal; (...) dizer que uma Norma jurídica é válida ou justa significa dizer que esta corresponde ao direito ideal”. Verifica-se na afirmação de Bobbio, que o “direito ideal” ao qual ele refere-se é o direito intrínseco nos Princípios, que emanam a justiça, as aspirações e predisposições de uma sociedade em determinada época e espaço9. Assim, a Norma tem a finalidade de preservar o direito das pessoas, de forma a guiar a conduta humana, permitir, proibir ou sancionar determinados atos a fim de alcançar ou de fazer valer o bem comum. Destarte, pode-se afirmar que a Norma é o Princípio posto em prática, ou seja, a Norma encarna o Princípio, fazendo valer a verdade e o valor intrínsecos no mesmo. Diante da vida em sociedade, para que se alcance uma convivência harmônica, as pessoas criam padrões para as coisas que lhe são comuns, criam conceitos comuns com o intuito de se relacionar com outras pessoas e conseqüentemente, com outras situações, a este fenômeno, pode-se denominar valor10. Difícil encontrar um conceito rematado para a palavra valor, o que se pode fazer, é tentar clarear a acepção da palavra, a fim de dar-lhe sentido, razão de ser. Para Hessen11 “valor é, sem dúvida, algo que é objeto de uma experiência, de uma vivência”. Não é possível viver sem proferir constantemente juízos de valor, visto que é da essência do ser humano conhecer e querer, tanto como valorar, de forma que a todo conhecer e querer pressupõe um valor. Não se pode desejar algo senão aquilo que de alguma maneira pareça valioso e como tal, digno de ser almejado12. A construção dos valores, bem como a dos Princípios e das relações que estes valores estabelecem com as pessoas, faz parte de um processo histórico, o qual se manifesta na 8 DINIZ, Maria Helena. Conceito de norma jurídica como problema de essência. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 24-25. 9 BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone, 1995, p. 137. 10 HESSEN, Johannes. Filosofia dos valores. 5. ed. Coimbra: Armênio Amado, 1980, p. 35. 11 HESSEN, Johannes. Filosofia dos valores, p. 37. 12 HESSEN, Johannes. Filosofia dos valores, p. 40. 21 construção da própria sociedade. Assim, cada indivíduo encarna o valor que lhe foi cedido através da construção da sociedade da qual faz parte, porém, isto não impede que cada indivíduo possua valores subjetivos em relação a outras coisas, pessoas ou situações13. Hessen afirma ainda que se possa extrair do valor Normas para a ação fática, tais Normas serão, desta feita, o “metro para medir” os atos humanos14. Assim, o valor indica a direção, o rumo a ser seguido por uma determinada sociedade, numa determinada época e espaço. Determina ainda, a estruturação desta mesma sociedade, bem como dos indivíduos que dela fazem parte, rumando todos para um mesmo norte, tendo um mesmo objetivo a alcançar, qual seja, a liberdade, a paz e a justiça plenas. “Todo o dever-ser, funda-se em um valor”, afirma Hessen. Em razão desta afirmação, entende-se que o valor encarna o sentido do dever-ser para que se possa alcançar a harmonia entre os seres de uma sociedade e suas relações. O dever-ser nada mais é do que o modo de ser ideal, o modo justo de viver em sociedade15. Para Hessen “não é o dever-ser que nos dá o fundamento do valor, mas o valor que nos dá o fundamento do dever-ser”. Percebe-se clara e evidente a idéia de que todo o dever-ser se fundamenta num valor, como já mencionado anteriormente, e este valor é o mesmo para uma mesma sociedade, um mesmo povo, visto que possuem os mesmos objetivos e ideais16. Kelsen17 afirma que à palavra “dever” está ligada a idéia de um valor moral absoluto. O Princípio segundo o qual o homem deve cumprir sempre o seu “dever” ou os seus “deveres” pressupõe evidentemente que haja deveres absolutos, inteligíveis para todos. Salienta Langaro que o dever “é o bem enquanto obrigatório”. Nesse sentido, pode-se notar que o bem é a realização, é a satisfação plena da finalidade do homem, de suas tendências e faculdades dentro da ordem humana18. 13 HESSEN, Johannes. Filosofia dos valores, p. 44. 14 HESSEN, Johannes. Filosofia dos valores, p. 46. 15 HESSEN, Johannes. Filosofia dos valores, p. 84. 16 HESSEN, Johannes. Filosofia dos valores, p. 84. 17 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 131. 18 LANGARO, Luiz Lima. Curso de deontologia jurídica, p. 19. 22 Neste mesmo diapasão, Langaro salienta que “o bem é como o pleno gozo de suas aspirações espirituais e racionais”, é simplesmente a realização e a observação do que deve ser cumprido, do dever moral19. A obrigatoriedade do dever-ser pertence à essência do valor, está contido no seu modo de ser ideal, no seu modus essendi (modo de ser). Este dever-ser, não implica necessariamente em um dever-fazer algo, dirigido a uma vontade, a um querer de um indivíduo, trata-se, tão somente, de um querer-ser puro e ideal. Do fato de alguma coisa ser em si mesma valiosa não significa que alguém a deva realizar, mas sim que esta coisa deve ser. O valor e o dever-ser ideal confundem-se e não podem, jamais, andar separados, visto que possuem a mesma essência20. Observa-se que o dever-ser ideal, fez parte da posição jusnaturalista, que sustenta que para uma Norma ser válida deve ser valorosa, ou seja, justa, sustentando ainda que nem todo o direito existente é, portanto, direito válido, porque nem todo direito válido, é justo21. O dever-ser indica, portanto, a direção para ou sobre alguma coisa, visto que o valor implica onde o dever-ser deve chegar, para cumprir seu escopo. Para que se tenha um entendimento satisfatório acerca da valoração dos Princípios Constitucionais, necessário se faz verificar, ainda que de forma concisa, o alcance do significado da categoria “Princípio”, por ser utilizado em inúmeros campos do saber humano. A categoria “Princípios” é utilizada para guiar e estruturar, muitas vezes um conjunto ou sistema articulado de conhecimentos a respeito dos objetos cognoscíveis exploráveis em determinada esfera22. No vernáculo, o dicionário Aurélio conceitua Princípio em inúmeras acepções: Princípio. [Do lat. Principiu.] S. m. 1. Momento ou local ou trecho em que algo tem origem (...) 2. Causa primária. 3. Elemento predominante na Constituição de um corpo orgânico. 4. Preceito, Regra, lei. 5. P. ext. base; germe (...) 6. Filos. Fonte ou causa de uma ação. 7. Filos. Proposição que se põe no início de uma dedução, e que não é deduzida de nenhuma outra 19 LANGARO. Luiz Lima. Curso de deontologia jurídica, p. 19. 20 HESSEN, Johannes. Filosofia dos valores, p. 85. 21 BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico, p. 137. 22 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais: elementos teóricos para uma formulação dogmática constitucionalmente adequada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 46. 23 dentro do sistema considerado, sendo admitida, provisoriamente, como inquestionável23. Mais adiante, noutra passagem do já mencionado dicionário, verifica-se mais um significado para o termo em questão, que entende ser os Princípios proposições diretoras de uma ciência, às quais todo o desenvolvimento posterior dessa ciência deve estar subordinado24. Podem-se compreender os Princípios como verdades de uma determinada época, dos quais se parte para conseguir encaminhar e legitimar uma série de acontecimentos que fazem parte da vida das pessoas25. A necessidade de ordenar o pensamento para facilitar o entendimento, para se construir conhecimento ou para se relacionar em qualquer processo, social ou não, está ligada diretamente a uma espécie de raciocínio, ou seja, uma concepção que mostra como pensar e como ordenar os pensamentos, ou pelo menos como o pensamento deve se apresentar diante da sociedade, para que possa ser entendido pelas demais pessoas e, além disso, para que exista uma diretriz a ser seguida pelas mesmas pessoas através de um ponto de partida, um ícone de valor26. Assim, é possível entender que os Princípios são espécies de conceitos prévios, necessários para que possa existir alguma construção coerente diante de um modo de pensar e para que seja possível estabelecer certa organização nos diversos ramos de atuação humana. É por isso que os Princípios se apresentam como o ponto que estrutura determinada esfera do saber humano, sobretudo do conhecimento, são eles o ponto de partida do pensamento organizado acerca de determinado assunto27. 23 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, p. 1.393. 24 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa, p. 1.393. 25 GELBCKE, Séfora Cristina Schubert. O papel dos Princípios constitucionais na licitação pública. 2005. 130 f. Dissertação (Mestrado) - UNIVALI, Itajaí, 2005, f. 24. 26 GELBCKE, Séfora Cristina Schubert. O papel dos Princípios constitucionais na licitação pública, f. 25. 27 GELBCKE, Séfora Cristina Schubert. O papel dos Princípios constitucionais na licitação pública, f. 26. 24 Para Rocha “No Princípio repousa a essência de uma ordem, seus parâmetros fundamentais e direcionadores do sistema normado”28. Destarte, quanto ao termo Princípio, pode-se dizer que [...] designa a estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou Normas por uma idéia mestra, por um pensamento chave, por uma baliza normativa, donde todas as demais idéias, pensamentos ou Normas derivam, se reconduzem e/ou se subordinam29. Para permitir ao leitor uma exata compreensão da generalidade que envolve a categoria Norma, necessário invocar a concepção dada por Canotilho ao afirmar que se entende por Norma, o modelo de ordenação juridicamente vinculante, positivado na Constituição e orientado para uma concretização material e constituído: (1) por uma medida de ordenação expressa através de enunciados lingüísticos; (2) por uma constelação de dados reais30. Na linha de pensamento de Bonavides, menciona-se o fato de que os Princípios atuam normativamente, sendo parte jurídica e dogmática do sistema de Normas e sendo ainda, ponto de partida, o qual se abre ao desdobramento judicial de um problema31. Três foram as fases precursoras da normatividade32 dos Princípios, quais são elas: a jusnaturalista, a positivista e a pós-positivista. Far-se-á uma análise breve dessas três fases a fim de clarear o entendimento acerca dos antecessores da normatividade dos Princípios. Leciona Bonavides que na fase jusnaturalista, os Princípios habitam ainda esfera abstrata e sua normatividade, basicamente nula e duvidosa, entra em contraste com o reconhecimento de sua dimensão ético-valorativa de idéia que inspira os postulados de justiça. 28 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes da. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994, p. 21. 29 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 48 30 CANOTILHO. J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, p. 1129 31 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 271 32 Cf. CANOTILHO. J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, p. 1.128 “a Normatividade é o efeito global da Norma num determinado processo de concretização. O efeito Normativo pressupõe a realização da Norma constitucional através de sua aplicação-concretização aos problemas carecidos de decisão. A Normatividade não é uma “qualidade” da Norma; é o efeito do procedimento metódico de concretização”. 25 Eram os Princípios nesta fase, considerados como fonte secundária do Direito existentes apenas para preencher supostas lacunas da lei e inúmeras vezes considerados escassos, obrigando o intérprete a buscar no Direito natural33, a solução para o vácuo normativo, porém, posteriormente foram finalmente reconhecidos pela corrente jusnaturalista como parte do ideal de justiça, ainda que mesclados com o Direito Natural34. Foi com o advento da escola histórica do direito, fato este que precedeu o positivismo jurídico35 através de sua crítica ao Direito Natural, que os Princípios passaram a fazer parte dos códigos como fonte normativa, porém apenas subsidiária, visto que eram tidos como derivados da própria lei e não precursores dela. Eram os Princípios vistos como abstratos, genéricos e valorativos, assim não poderiam conduzir aspirações jurídicas concretas36. Na terceira e última fase, a pós-positivista37, a qual ocorreu nas últimas décadas do século XX, os Princípios passam a ser tratados como direito e conseqüentemente como Norma jurídica. Acentua Bonavides38 que o Pós-positivismo é marcado pela necessidade de trataremse os Princípios como direito, abdicando, desta forma, a doutrina positivista e adotando a possibilidade de que tanto uma constelação de Princípios quanto uma Regra positivamente constituída podem impor obrigação legal. 33 Cf. BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico, p. 21 “O Direito natural é aquele que obtemos conhecimento através da razão, de vez que esta deriva da natureza das coisas; o direito positivo é aquele que vimos a conhecer através de uma declaração de vontade do legislador”. Bobbio, citando Grócio, acrescenta ainda que “O direito natural é um ditame da justa razão destinado a mostrar que um ato é moralmente torpe ou moralmente necessário segundo seja ou não conforme à própria natureza racional do homem, e a mostrar que tal ato é, em conseqüência disto, vetado ou comandado por Deus, enquanto autor da natureza”. 34 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 259. 35 Acentua BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico, p. 135, que “o Positivismo Jurídico nasce do esforço de transformar o estudo do direito numa verdadeira e adequada ciência que tivesse as mesmas características das ciências físico-matemáticas, naturais e sociais. O Positivismo Jurídico representa portanto, o estudo do direito como fato, não como valor; o juspositivista estuda tal direito real sem se perguntar se além deste existe também um direito ideal (como aquele natural), sem examinar se o primeiro corresponde ou não ao segundo e, sobretudo, sem fazer depender a validade do direito real da sua correspondência com o direito ideal”. 36 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 263. 37 A fase Pós-positivista, inaugurada nas últimas décadas, caracteriza-se pela saída dos Princípios do direito privado (código), ingressando no direito público (constituição). Essa corrente traz a hegemonia dos Princípios, uma vez que passam a ser constitucionalizados. Nessa nova fase, já não são institutos supletivos da lei, mas sim, orientadores das demais Normas. Cf. GOMES FILHO, Mário. Pós-positivismo e os avanços do novo código civil brasileiro: o art. 950 e a indenização na forma de pensão. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3884>. Acesso em: 17 mar. 2008. 38 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 265. 26 Ratificando a normatividade reconhecida pelos Princípios, Rocha os define como “os valores superiores havidos na sociedade, postos como raiz e meta do sistema constitucional. Valores transformados em Princípios jurídicos, com normatividade e eficácia plena, abrigados na Constituição”39. Espíndola afirma a normatividade dos Princípios quando leciona de forma manifesta: Hoje, no pensamento jurídico contemporâneo, existe unanimidade em se reconhecer aos Princípios Jurídicos o status conceitual e positivo de Norma de direito, de Norma jurídica. Para este núcleo de pensamento, os Princípios têm positividade, vinculatividade, são Normas, obrigam, têm eficácia positiva e negativa sobre comportamentos públicos ou privados bem como sobre a interpretação e aplicação de outras Normas, como as Regras e outros Princípios derivados de Princípios de generalizações mais abstratas40. No sentido de salientar a credibilidade concedida à normatividade dos Princípios na sociedade contemporânea, informa Rocha que: As novas características que dominam o conceito contemporâneo de Constituição dotam de importância capital os Princípios que nela se incluem, marcando a essência de cada sistema jurídico fundamental sem embaraçarlhe a maleabilidade, identificando-lhe a natureza sem comprometer-lhe a finalidade de Norma de libertação e segurança dos indivíduos em sua experiência política na sociedade estatal. Os Princípios Constitucionais, seu conteúdo, sua finalidade e, principalmente, sua normatividade jurídica e sua eficácia jurídica e social são, pois, os pontos fundamentais do modelo sistêmico constitucional, possibilitadores da adaptação do significado e continuidade da Constituição como instrumento necessário à experiência estatal e fundamental para a prevalência do Direito na relação política entre as pessoas. Direito sem obrigação e aplicação é mentira inútil, que esvazia o conteúdo da Norma, desconstrói o sistema jurídico e cala a justiça. (...) a Constituição é uma lei e tudo o que nela se contém – especialmente seus Princípios – tem esta idêntica natureza41. A preservação do sistema constitucional está intimamente ligada à normatividade dos Princípios, visto que eles sustentam e dão suporte ao mesmo sistema. Os Princípios evitam o engessamento do Direito em razão da sua versatilidade, pois são fundados em juízos de valor, em verdades preexistentes. São eles que fornecem a diretriz para o Direito, o dever ser, 39 ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública, p. 43. 40 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 84. 41 ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública, p.43. 27 estruturam o horizonte da sociedade, visto que o homem está em constante mudança e como tal, o Direito também está42. Doravante pretende-se fazer a distinção entre as duas espécies normativas abrangidas neste estudo, quais sejam, os Princípios e as Regras. 2.2 PRINCÍPIOS E REGRAS Os Princípios surgem como máximas doutrinárias ou meros norteadores do pensamento jurídico, podendo logo, adquirir o caráter de Normas de direito. Com o advento do pós-positivismo o Princípio Normativo deixa de ser apenas ratio legis (razão da lei), para se tornar lex (lei), e como tal, passa a constituir as Normas jurídicas, pertencendo então, ao Direito positivo43. Assim como as Regras, os Princípios também são Normas jurídicas, pois também se estabelecem com o auxílio de expressões fundamentais como mandamento, permissão e proibição44. Mesmo que sejam fundamentos de espécie distinta, os Princípios, assim como as Regras, informam juízos concretos de dever. A diferença existente entre Princípios e Regras é, portanto, a diferença entre duas espécies normativas, as quais possuem inúmeros critérios de distinção, sendo o mais acentuado deles o da generalidade, visto que as Regras possuem grau de generalidade relativamente baixo e os Princípios, do contrário, são Normas dotadas de alto grau de generalidade45. Com o fito de elucidar ao leitor as diferenças existentes entre as duas espécies normativas apresentadas, quais sejam Princípios e Regras, indispensável se faz conceituar ambos os institutos, com a finalidade de alcançar uma maior clareza com relação aos mesmos e identificar suas aproximações e distanciamentos. Tanto as Regras como os Princípios são Normas Jurídicas, pois possuem caráter imperativo, ou seja, regulamentam o que deve ser. Ambos podem se manifestar com a ajuda 42 GELBCKE, Séfora Cristina Schubert. O papel dos princípios constitucionais na licitação pública, f. 25. 43 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 271 44 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 277. 45 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 277. 28 das expressões basilares do mandamento, da proibição e da autorização. Os Princípios, tais quais as Regras, são causas para juízos concretos de dever ser, mesmo que sejam razões de um tipo muito diferente. Na sua essência, tanto Princípios como Regras possuem o mesmo caráter normativo, porém, apresentam feições normativas diversas que justificam a natureza peculiar de ambos os institutos. Atribui-se aos Princípios a conceituação proferida por Rocha: Os Princípios Constitucionais são os conteúdos primários diretores do sistema jurídico normativo fundamental de um Estado. Dotados de originalidade e superioridade material sobre todos os conteúdos que formam o ordenamento constitucional, os valores firmados pela sociedade são transformados pelo Direito em Princípios. Adotados pelo constituinte, sedimentam-se nas Normas, tornando-se então, pilares que informam e conformam o Direito que rege as relações jurídicas no Estado. São eles, assim, as colunas-mestras da grande construção do Direito, cujos fundamentos se afirmam no sistema constitucional46. Percebe-se que os Princípios, enquanto Normas jurídicas, desempenham a função de dar fundamento às demais Regras integrantes da sistemática normativa, ou seja, pode-se entender por sistema, o todo do Direito Positivo, e os subsistemas como as suas ramificações estrutural-normativas, como o Direito Privado, o Direito Civil etc.47. No que tange às Regras, Ávila assim as define: As Regras são Normas imediatamente descritivas, primariamente retrospectivas e com pretensão de decidibilidade e abrangência, para cuja aplicação se exige a avaliação da correspondência, sempre centrada na finalidade que lhes dá suporte ou nos Princípios que lhes são axiologicamente sobrejacentes, entre a construção conceitual da descrição normativa e a construção dos fatos 48. Compreende-se a partir dos conceitos acima delineados, que os Princípios, além de possuírem normatividade, servem como suporte e estruturam as Regras, para que estas sejam aplicadas de forma que possam corresponder ao caso concreto. 46 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública, p. 25. 47 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 73. 48 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos Princípios jurídicos. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 70. 29 O entendimento acerca da complexidade existente em diferenciar Princípios e Regras é uníssono por parte dos doutrinadores, por este motivo, far-se-á uma análise mais aprofundada a este respeito, para que se possa alcançar uma inteligência satisfatória e prudente sobre o assunto em tela. Canotilho49 afirma que existem alguns critérios a serem considerados para chegar a uma conclusão a respeito da diferenciação entre Princípios e Regras, quais são: a) grau de abstração: os Princípios possuem um grau de abstração relativamente superior ao das Regras; b) grau de determinabilidade: os Princípios por serem vagos e indeterminados, necessitam de mediações concretizadoras no caso concreto, já as Regras possuem aplicação imediata; c) caráter de fundamentabilidade no sistema das fontes de direito: os Princípios são Normas de natureza fundamental no ordenamento jurídico em razão de sua posição hierárquica no sistema das fontes, ou à sua essencialidade estruturante dentro do sistema jurídico; d) proximidade da idéia de direito: os Princípios são padrões juridicamente vinculantes arraigados nas exigências de justiça ou na idéia de Direito, as Regras, a saber, podem ser Normas vinculativas com um conteúdo meramente funcional; e) natureza normogenética: os Princípios são fundamentos de Regras, ou seja, são Normas que servem de base, de fundamento para a criação das Regras jurídicas. Espíndola acentua que a primeira característica que difere Princípios e Regras é a generalidade dessas duas espécies de Normas, ou seja, possuem tais Normas generalidades distintas, pois, a Regra é editada para ser aplicada a uma situação jurídica específica, determinada. Ao contrário, o Princípio é geral porque compreende uma série genérica de aplicações. Ainda, dois outros critérios devem ser analisados no que tange a relação supracitada: o primeiro, o do tudo ou nada, e o segundo, o do peso ou da importância50. 49 CANOTILHO. J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, p. 1086. 50 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 74. 30 De acordo com o primeiro critério, as Regras jurídicas são aplicáveis no todo, ou não são, de maneira alguma, aplicáveis. Desde que se corroborem os pressupostos de fato aos quais a Regra se refira, em um caso concreto, e sendo ela válida, deverá ser aplicada. Já os Princípios atuam de modo distinto, pois mesmo aqueles que mais se assemelham às Regras, não se aplicam necessariamente quando as condições previstas como hábeis para sua efetiva aplicação se manifestam51. O segundo critério, distinto do primeiro, salienta que os Princípios possuem uma dimensão que não é própria das Regras jurídicas, que é a dimensão do peso ou importância. No momento em que se chocam dois ou mais Princípios, quem há de resolver o conflito deve levar em conta o peso relativo de cada um deles. Não obstante, as Regras não possuem a mesma dimensão, pois, não se pode afirmar que uma delas, no âmago do sistema normativo, possui maior valor do que outra, de modo que, no caso de conflito entre ambas, deva preponderar uma em virtude do seu peso maior, no entanto, uma delas não terá validade52. São os Princípios Normas jurídicas compatíveis com vários graus de concretização em conformidade com as condições fáticas e jurídicas; as Regras são Normas que prescrevem imperativamente uma exigência, elas impõem, permitem ou proíbem, possuem natureza coercitiva, são ou não cumpridas53. Os Princípios possuem convivência conflitual, sendo que a convivência das Regras é antinômica, assim, os Princípios coexistem, as Regras antinômicas excluem-se. Os Princípios permitem o balanceamento de valores e interesses, de acordo com seu peso e a ponderação de outros Princípios eventualmente conflitantes. Já as Regras não facultam espaço para qualquer outra solução que não seja a de sua aplicação, na medida exata de sua validade54. Havendo conflito entre Princípios, estes podem ser elementos de ponderação, de harmonização, pois eles contêm apenas declarações ou padrões que devem ser alcançados, ao 51 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988: interpretação e crítica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990, p. 107-108. 52 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 67. 53 CANOTILHO. J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, p. 1087. 54 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 67. 31 passo que as Regras possuem definições normativas fechadas, sendo insustentável a validade e aplicabilidade concomitante de Regras contraditórias55. Os Princípios ocasionam problemas de validade e peso (importância, ponderação), as Regras dispõem apenas questões de validade (pois, sendo elas incorretas, devem ser alteradas)56. Na mesma linha, afirma Larenz que os Princípios podem entrar em contradição entre si, porém, sua atuação pode acontecer o que não ocorre com a aplicação das Regras, numa medida maior ou menor. No caso de uma contradição entre Princípios tem, porquanto, cada Princípio de ceder perante o outro, de modo a que ambos sejam operados. Ratificado está, segundo as afirmativas de Larenz e Canotilho, que havendo divergências entre Princípios, o que melhor se justapõe ao caso concreto deverá ser aplicado, sobrepondo-se ao outro sem que aquele perca sua eficácia, de acordo com o grau de valoração e fundamentabilidade existentes entre ambos57. Em relação às Regras, cabe ressaltar os ensinamentos de Ávila, quando explana que estas são aplicadas ao modo tudo ou nada, ou seja, ou a Regra é válida e a conseqüência normativa deve ser aceita, ou ela não é tida como válida. Portanto, no caso de conflito entre Regras, uma delas deverá ser considerada ineficaz, inválida58. Os Princípios, ao contrário, não causam absolutamente a decisão, entretanto, contém fundamentos os quais devem ser compatíveis com outros fundamentos originários de outros Princípios. Daí tem-se a afirmação de que os Princípios, diferente das Regras, possuem uma dimensão de peso, o qual se percebe diante de um conflito entre Princípios, caso em que o Princípio com peso relativo maior se sobrepõe ao outro, sem que um deles perca sua validade59. A distinção entre Princípios e Regras deve se resumir, sobretudo, há dois fatores a serem considerados: o primeiro restringe-se na diferença quanto à colisão, na medida em que 55 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 67. 56 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 67. 57 LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 1997, p. 675. 58 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios, p. 28. 59 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios, p. 28. 32 os Princípios colidentes apenas têm sua realização normativa limitada reciprocamente, o que não acontece com as Regras, cuja colisão é resolvida com a declaração de invalidade de uma delas ou com a abertura de uma exceção que exclua a antinomia60. O segundo fator propõe a diferença quanto à obrigação que instituem: visto que as Regras instituem obrigações absolutas, não superadas por Normas contrapostas, enquanto os Princípios instituem obrigações prima facie (à primeira vista), na medida em que podem ser superadas ou derrogadas em função dos outros Princípios colidentes61. Ainda valendo-se dos ensinamentos de Ávila62, convém ressaltar que demonstra o mesmo que os critérios utilizados usualmente para a distinção entre os institutos em tela são: Em primeiro lugar, o critério do caráter hipotético-condicional, que se fundamenta no fato de as Regras possuírem uma hipótese e uma conseqüência que predeterminam a decisão, enquanto os Princípios apenas indicam o fundamento a ser utilizado pelo aplicador para futuramente encontrar a Regra para o caso concreto, assim, entende-se que a Regra possui aplicação imediata ao caso concreto, podendo, ou não, ser aplicada, enquanto o Princípio é anterior à Regra, tendo servido de alicerce para a criação da mesma. Em segundo lugar, tem-se o critério do modo final de aplicação, que se ampara no fato de as Regras serem aplicadas de modo absoluto, tudo ou nada, ao passo que os Princípios podem ser aplicados de modo gradual63. Em terceiro lugar, o critério do relacionamento normativo, que se baseia na idéia de que as antinomias entre as Regras consubstanciam verdadeiro conflito, solucionável com o reconhecimento de invalidade de uma das Regras ou com a criação de uma exceção, de forma que o relacionamento entre os Princípios possui solução quando se pondera a atribuição de uma dimensão de peso a cada um deles. Em quarto lugar, há o critério do fundamento axiológico, que aprecia os Princípios, ao contrário das Regras, como fundamentos de valor para a decisão a ser tomada64. 60 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios, p. 30. 61 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios, p. 30. 62 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios, p. 30. 63 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios, p. 31. 64 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios, p. 31. 33 Na mesma linha de raciocínio afirma Niebuhr que a Regra, diferente dos Princípios, é aplicada em sua totalidade, não sendo lícito, ponderá-las, tampouco equilibrá-las. Como exemplo, pode-se destacar a necessidade da presença de testemunhas para firmar testamento. Se a Regra A prescreve que o testamento deve ser assinado por três testemunhas, e a Regra B que o testamento deve ser assinado por cinco testemunhas, impossível seria balancear ou combinar ambas as Normas e concluir que o testamento deve ser assinado por quatro testemunhas. As relações existentes entre as Regras são excludentes: uma delas é válida em detrimento da outra, que se torna inválida65. Desta feita, diferentemente das Regras, um Princípio pode ser perfeitamente válido e não imperar na aplicação de um caso concreto. A Regra, sob a dialética do tudo ou nada, sendo válida, deve ser aplicada. Poderá a Regra não responder no caso concreto, havendo uma exceção prevista, podendo esta ser enunciada, entretanto, as exceções a um Princípio não são passíveis de enumeração, por serem indetermináveis. Repousam os Princípios na dimensão de sua importância, centrados na recíproca complementação e adaptação de valores. Se apontam direções divergentes, deve-se levar em conta o que cada um concebe, ponderando os fatos que demonstram o caso específico66. Terá maior ou menor importância um Princípio, de acordo com o valor que encarna. À medida que este valor for mais ou menos relevante para a sociedade, com maior ou menor intensidade o Princípio será efetivado67. Nega-se, portanto, a hierarquia entre Princípios, porém não se nega que uns são mais importantes que outros em determinados casos específicos, no qual o valor representado pelo Princípio deve ser ponderado diante da situação fática. No entanto, a importância do valor que o Princípio incorpora não se confunde com hierarquia, posto que a hierarquia é rígida, prefixada, enquanto a precedência dos Princípios se enfoca nos fatos que informam o caso, porque só assim, se visualizará os bens sujeitos ao sacrifício em concreta tensão68. 65 NIEBUHR, Joel Menezes. Princípio da isonomia na licitação pública. Florianópolis: Obra Jurídica, 2000, p. 30. 66 NIEBUHR, Joel Menezes. Princípio da isonomia na licitação pública, p. 31. 67 NIEBUHR, Joel Menezes. Princípio da isonomia na licitação pública, p. 32. 68 NIEBUHR, Joel Menezes. Princípio da isonomia na licitação pública, p. 33. 34 Feitas estas breves considerações sobre os signos que aproximam e distanciam os Princípios e as Regras no âmbito normativo, passa-se, agora, a examinar os Princípios Constitucionais, de modo a permitir ao leitor, nesta meada, uma compreensão razoavelmente adequada em relação ao objeto desta pesquisa. 2.3 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS Na seara constitucional, os conhecimentos apresentados alhures a respeito dos Princípios não sofrem profundas alterações, para demonstrar este pensamento, é essencial destacar a definição dada por Clemente quando diz ser o Princípio de Direito, o pensamento diretivo que serve de base para as formações das disposições do Direito de um sistema jurídico, de um código, bem como do Direito Positivo. No Princípio, repousa o mais alto sentido de uma lei ou instituição de Direito, o motivo determinante, a razão informadora do Direito, a idéia primeira, pela qual se explicam os preceitos particulares69. Tendo em vista o conceito supracitado, convém salientar que os Princípios são Normas reguladoras implícitas, de valor proeminente, em relação aos quais, toda e qualquer decisão jurídica, bem como os atos e demais ações devem estar subordinadas e submetidas, obtendo, desta feita, um Ordenamento Jurídico harmônico e justo70. Em razão de sua suposta natureza “transcendente”, ou em razão de seu conteúdo e versatilidade, eram os Princípios qualificados como meras exortações, ensinamentos de ordem moral ou política, mas não legítimos comandos de Direito, visto que a própria Constituição não representaria um corpo precisamente jurídico, aparecia ela como o repertório natural dos Princípios assim considerados71. Sobre os Princípios adverte Grau: 69 O autor ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 48, não faz menção à referida obra. 70 Cf. FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Atlas, 1994, p. 174. “A noção de ordenamento é complexa. Em Princípio, um ordenamento é um conjunto de Normas. O Ordenamento Jurídico brasileiro é o conjunto de todas as suas Normas, em que estão incluídas todas as espécies que mencionamos ao classificá-las”. 71 ROTHENBURG, Walter Claudius. Princípios constitucionais. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1999, p, 13. 35 Quanto à estatuição, neles também comparece, embora de modo implícito, no extremo completável em outra ou outras Normas jurídicas, tal como ocorre em relação a inúmeras Normas jurídicas incompletas. Estas são aquelas que apenas explicitam ou o suposto de fato ou a estatuição de outras Normas jurídicas, não obstante configurando Norma jurídica na medida em que, existem em conexão com outras Normas jurídicas, participando do sentido da validade delas72. Verifica-se posteriormente, vestígios de reconhecimento de juridicidade dos Princípios que passam a ser admitidos pelo Direito como imperativos. O mesmo reconhecimento, porém, levaria até o ponto oposto da identificação entre os Princípios e os demais preceitos jurídicos, havendo uma distinção de grau (quantitativa), mas não de natureza, entre os primeiros (dotados de uma maior generalidade) e os outros (mais concretos)73. Basilar a colocação de Bandeira de Mello quando versa sobre os Princípios: Mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes Normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico74. Para Reale, são os Princípios verdades ou juízos fundamentais, os quais servem de sustentáculo ou de garantia de certeza a um conjunto de juízos ordenados em um sistema de conceitos relativos à dada porção da realidade. Podem ser compreendidos também como proposições fundantes de um sistema de conhecimento, bem como seus pressupostos necessários75. Reconhece-se que o Princípio é o alicerce, o fundamento para o desenvolvimento do Estado Democrático de Direito76, visto que é provido do valor necessário para guiar e 72 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988, p. 125. 73 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 57. 74 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p, 450. 75 REALE, Miguel. Filosofia do direito. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 1986, p. 60. 76 Estado Democrático de Direito “é o instrumento que legitima a gestão dos interesses públicos através da participação e, por estar em constante evolução, garante um processo de intervenção dos sujeitos sociais”. Cf. LEAL, Rogério Gesta. Teoria do estado: cidadania e poder político na modernidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 247. 36 estruturar o mesmo Estado. Sendo assim, quando se desvirtua o Estado do sentido dos Princípios, logo, encontra-se este sem a veemência necessária para alcançar seu escopo. No mesmo diapasão, afirma Canotilho que os Princípios jurídicos fundamentais são aqueles historicamente objetivados e progressivamente adotados na consciência jurídica, os quais encontram uma recepção implícita no texto constitucional77. Considera ainda Canotilho, dentre os aspectos essenciais: a “proximidade” dos Princípios em relação à idéia básica de Direito que direciona e orienta a ordem jurídica; o “caráter de fundamentalidade” desempenhado pelos Princípios enquanto fontes primeiras de Direito, devido a sua posição hierárquica no sistema das fontes78. Os Princípios são a base fundamental de todo o ordenamento jurídico. O sistema de Normas de um Estado não pode ir de encontro aos Princípios, pois estes consistem no tronco ou no pilar de sustentação do ordenamento e sua inobservância poderá acarretar a rachadura ou, quem sabe, a derrocada de todo o sistema que neles está apoiado79. Para firmar posição com o entendimento supramencionado, Bandeira de Mello compreende o Princípio como centro irradiador, que integra e repercute em diversas Normas, imbuídas do conteúdo e do fundamento contido no Princípio. E de tal sorte, que seu descumprimento é muito mais do que o descumprimento de uma Norma, pois implica (sempre e também) na violação do espírito, do conteúdo, do aspecto mandamental, da própria harmonia de um sistema80. Em consonância com a linha adotada pelos autores anteriormente explanados, tanto quanto ou mais valiosa é a explicação de Bonavides ao versar sobre o assunto em pauta quando leciona: Postos no ponto mais alto da escala normativa, eles mesmos, sendo Normas, se tornam, doravante, as Normas supremas do ordenamento. Servindo de pautas ou critérios por excelência para avaliação de todos os conteúdos constitucionais (e infraconstitucionais, acrescenta-se), os Princípios desde sua constitucionalização, que é, ao mesmo passo, positivação no mais alto 77 CANOTILHO. J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, p. 1090. 78 CANOTILHO. J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, p. 1090. 79 GELBCKE, Séfora Cristina Schubert. O papel dos princípios constitucionais na licitação pública, f. 25. 80 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 87. 37 grau, recebem como instância máxima, categoria constitucional, rodeada do prestígio e da hegemonia que se confere às Normas inseridas na lei das leis. Com esta relevância adicional, os Princípios se convertem igualmente em Norma Normarum, ou seja, Normas das Normas81. De acordo com Bonavides, tudo isso se faz muito claro, desde que a Constituição, sendo, como é, na mais poderosa doutrina constitucional, uma declaração do consenso social sobre os valores basilares, se torna o alicerce da ordem jurídica, fazendo de seus Princípios, intrínsecos naqueles valores, o critério mediante o qual se mensuram todos os conteúdos normativos do sistema82. Para complementar, afirma Bonavides que os Princípios Constitucionais fazem a harmonia, o equilíbrio e a essencialidade de um sistema jurídico autêntico, da ordem jurídica83. Assentados no ápice da pirâmide normativa elevam-se, portanto, ao grau de Norma das Normas, de fonte das fontes. São ainda, qualitativamente a viga mestra do sistema, o apoio da legitimidade constitucional, a garantia da constitucionalidade das Regras de uma constituição84. Evidenciado está que o todo Normativo, as Regras de uma Constituição, são posteriores aos Princípios Constitucionais, que, como salienta Bonavides, são a viga mestra do ordenamento jurídico, não podendo as demais Normas, portanto, contraporem-se às primeiras. Ainda mais que uma diretriz constitucional, são os Princípios a garantia da constitucionalidade das Regras de uma Constituição já que esta é a guardiã dos valores intrínsecos ao Estado e à sociedade85. Tendo visto que é a Constituição a Lei Maior do ordenamento jurídico brasileiro, mister se faz enaltecer a importância que têm os Princípios Constitucionais diante do mesmo 81 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 510. 82 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 512. 83 Cf. CANOTILHO. J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição, p. 1090, “Ordem Jurídica é o sistema de Normasde natureza jurídica que determinam e disciplinam vinculativamente certos âmbitos primários da vida em sociedade dentro do sistema social global”. 84 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 513. 85 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 511 38 ordenamento, visto que nenhuma outra Regra, poderá contrariar estes Princípios, pois do contrário, estará opondo-se à própria Constituição86. Diante do que foi versado em razão dos Princípios Constitucionais, não há como negar a sua natureza de Norma, de lei, de preceito jurídico, ainda que com características funcionais e estruturais distintas de outras Normas, como as Regras de direito. No entanto, os Princípios Constitucionais expressam opções políticas fundamentais, configuram eleição de valores éticos e sociais como fundantes de uma idéia de Estado e de Sociedade87. Os Princípios Constitucionais não apregoam apenas uma natureza jurídica, mas também política, ideológica e social, porém, estas características encontram-se normativamente predominantes, e são entendidas como a concretização do Direito no sentido mais amplo possível, alcançando as diversas organizações e procedimentos vigentes88. No que tange à natureza dos Princípios Constitucionais é válido lembrar que são eles os conteúdos primários dirigentes do sistema jurídico-normativo fundamental de um Estado. São ainda, dotados de originalidade e superioridade material sobre os conteúdos que formam o ordenamento constitucional, os valores consolidados pela sociedade são transformados pelo Direito em Princípios e estes são havidos como pilares que informam e conformam o Direito que rege as relações jurídicas do Estado. Assim, são eles as colunas mestras da grande construção do Direito, cujos alicerces se asseguram no sistema constitucional89. Com a finalidade de identificar as características peculiares dos Princípios Constitucionais, apresentar-se-á a seguir, as observações apresentadas por Rocha, que bem denotam sua natureza singular enquanto Normas constitucionais, assim sendo, caracteriza-os em relação à sua natureza da seguinte maneira90: a) generalidade: permite que a Constituição cumpra seu papel de Lei Maior fundamental do Estado, sem amarrar a sociedade a modelos inflexíveis e definitivos, visto que a sociedade está em constante mudança e adaptação; 86 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 511 87 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 76. 88 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 76. 89 ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública, p. 28. 90 ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública, p. 28. 39 b) primariedade: defende que os Princípios seriam primários e primeiros no cerne do sistema constitucional, dele decorrendo outros Princípios, os quais são subPrincípios em relação aos primeiros, e que se podem conter implicitamente nesse sistema; c) dimensão axiológica: da qual os Princípios são imbuídos devido ao conteúdo ético que denotam, porém, sujeitam-se sempre à mutabilidade do meio sócio-político em que atuam, sem formar, portanto, verdades ou juízos absolutos; d) objetividade: são os Princípios Constitucionais objetivos, visto que impedem que seus aplicadores extraiam sentidos distintos de seu teor. Não se cuidam, pois, de conteúdos subjetivos ou aleatórios, a objetividade dosa Princípios Constitucionais e afasta qualquer traço de subjetividade, por terem eles conteúdo próprio e identidade singular apoiados na interpretação e na aplicação que a prática constitucional impõe. Em suma, a objetividade dos Princípios tem por escopo assegurar a eficácia do Direito como veículo possibilitador do que é justo para todos; e) transcendência: verifica-se que o Princípio Constitucional ultrapassa a elaboração normativa constitucional formal e desenvolve-se no ordenamento estatal como a mais possante diretriz política, legislativa, administrativa e jurisdicional, ou seja, vai além do seu conteúdo literal e se aprofunda na constelação de conceitos e opiniões constitucionalmente adequadas, normatizando diversos comportamentos do Estado e dos indivíduos, na busca incessante pela justiça; f) atualidade: que revela a coerência entre os Princípios Constitucionais e as necessidades, aspirações e ideais formulados pelo povo em seu ordenamento jurídico no momento atual; g) poliformia: que permite mudar o sentido dos textos constitucionais sem a alteração de seus enunciados normativos, garantindo-se a eficiência do ordenamento constitucional, que deve se modelar às novas aspirações sociais do povo e conseqüentemente do Direito, desta forma, frisa-se que a poliformia principiológica na Constituição é que permite a variedade de sentidos que se acrescentam e se sucedem, com o intuito de que o sistema tenha permanência, presença e eficácia social e jurídica; h) vinculabilidade: são os Princípios Constitucionais “vinculantes e vinculados”. Rocha salienta que essa vinculabilidade se manifesta no sentido de que todas as Regras e 40 Princípios Constitucionais, bem como as demais Normas infraconstitucionais91, se vinculam à Constituição, ou seja, essa vinculação não acontece apenas no sentido de que os Princípios vinculam as interpretações de outras Normas do ordenamento jurídico – tanto as de escalão constitucional como as ordinárias – mas também que vinculam o sentido da legitimidade constitucional (controle de constitucionalidade) de atos estatais e particulares. Salienta ainda que os Princípios Constitucionais são vinculados entre si, pois nenhum Princípio Constitucional deve ser considerado independente, desconexo ou auto-suficiente, posto que a Constituição é uma lei organizada em um conjunto de Normas que se encadeiam, harmonizam, coordenam, com o intento de adquirir um fim conjunto, cabal, pleno; i) aderência: refere-se a idéia da vinculabilidade, pois nem a produção normativa do Estado, ou mesmo da sociedade, poderão não aderir aos Princípios postos na Constituição, portanto, comportamentos ou normatizações que não acolham a idéia de Direito principiológica e constitucionalmente estabelecida, serão tidas como inválidas, por se oporem às Normas constitucionais. Rocha é taxativa ao ratificar que “não há comportamento que se lhe possa contrariar o preceito”; j) informatividade: pode-se salientar que os Princípios Constitucionais caracterizam-se por serem informativos de todo o Ordenamento Jurídico de um Estado. A informatividade destes Princípios põe em evidência a fundamentabilidade da Constituição como lei maior do ordenamento jurídico, sua ordem primária e primeira, o comparecimento de seu espírito em toda a dimensão que se afeiçoa no sistema de uma sociedade estatal; l) complementariedade: entende-se que, conjugados, os Princípios Constitucionais se mesclam, formando um todo coordenado, uníssono, portanto, são eles, condicionantes uns dos outros e para que haja o entendimento perfeito acerca dos mesmos, é necessário o entrosamento de todos; m) Normatividade jurídica: última característica na classificação da supramencionada jurista, a qual concede aos Princípios a qualidade de Norma de Direito, de juridicidade. Por ela, os Princípios são leis, são preceitos de regulação abstrata e geral, que diferem das Regras, 91 “Se ficou assentada a existência de uma Norma superior, privilegiada, norteadora do Estado e do Ordenamento Jurídico por este e neste produzida, lógico é, que existem Normas jurídicas ‘inferiores’ àquela. A inferioridade aqui destacada não desdenha a validez e a utilidade dessas Normas, mas apenas registra a submissão de tais editos aos limites impostos pelo diploma fundamental (...)”. CARVALHO, Ivan Lira de. A interpretação da Norma jurídica: Constitucional e Infraconstitucional. Disponível: http://www.jfrn.gov.br/docs/doutrina198.doc. Acesso em: 16 mar. 2008. 41 mas que como elas são Normas jurídicas. Essa característica de normatividade foi construída a partir da idéia de que a Constituição é lei, é Norma de direito, e de que seus enunciados têm força normativa, valem como Norma Normarum (Norma das Normas). Em razão da explanação acerca das características dos Princípios Constitucionais, mister se faz aludir neste momento quais as suas funções e como são aplicadas no ordenamento jurídico vigente. Por serem os Princípios, Normas com um espaço de validade muito maior do que qualquer outra Norma servem estes como critério de interpretação do direito posto, concedendo coerência geral ao sistema jurídico92. Destarte, necessário se faz ater-se com especial cuidado aos Princípios Constitucionais, uma vez que estes dão a diretriz axiológica, ou seja, esclarecem quais valores devem ser respeitados, observados, mantidos no processo de interpretação constitucional. Para avaliar a essência, o espírito de uma Norma, imprescindível se torna conhecer o todo normativo, o sistema normativo completo, para que se possa ver, em cada caso concreto, qual é o Princípio, ou os Princípios que orientam a suposta interpretação, a qual chama-se de interpretação principiológica do direito93. Bonavides classifica as três funções das quais são dotados os Princípios, são elas: função fundamentadora, interpretativa e supletiva94. Pela função fundamentadora da ordem jurídica, os Princípios Constitucionais possuem uma eficácia diretiva e fundamental, as quais ocupam abissal importância no Direito Público, sobretudo no Direito Constitucional Contemporâneo. Em razão dessa função, as Normas que se objetarem às irradiações normativas assentadas nos Princípios Constitucionais, perderão sua validade ou sua vigência, em face de contraste normativo com Normas de paradigma constitucional95. No que tange à função interpretativa, cumprem os Princípios Constitucionais o papel de conduzir as soluções jurídicas a serem processadas diante do caso concreto. Os Princípios 92 BESTER, Gisela Maria. Direito constitucional: fundamentos teóricos. São Paulo: Manole, 2005, p. 271. 93 BESTER, Gisela Maria. Direito constitucional, p. 271. 94 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 254. 95 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 255. 42 Constitucionais serão os norteadores da solução a que se pretende chegar, interpretando cada caso concreto a fim de conduzir à melhor decisão. Servem como vetores de sentido jurídico às demais Normas, diante dos fatos que exijam compreensão normativa96. Através da função supletiva, os Princípios Constitucionais desempenham a tarefa de integração do Direito, suprindo o “vácuo” da ordem jurídica ou ausência de sentido regulador constatáveis em Regras ou em Princípios de maior grau de densidade normativa97. De maneira a complementar a principal função dos Princípios Constitucionais, qual seja, a de servir de direcionador para a interpretação, outras funções evidenciam-se, sendo que todas acabam por ratificar a aplicabilidade da Constituição. Deste modo, os Princípios Constitucionais são fundamentais à efetivação da garantia constitucional dos direitos fundamentais e gerais98. 96 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional, p. 255. 97 ESPÍNDOLA, Rui Samuel. Conceito de princípios constitucionais, p. 68. 98 BESTER, Gisela Maria. Direito constitucional, p. 271. 3 PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IMPESSOALIDADE Com a finalidade de imprimir uma seqüência lógica e racional ao presente relatório monográfico, neste capítulo, após ter apresentado ao leitor, na parte anterior deste trabalho, os elementos basilares necessários à correta compreensão dos Princípios no âmbito do ordenamento jurídico, pretende-se agora realçar o Princípio que intitula a presente monografia, ou seja, o Princípio da Impessoalidade, consagrado de forma expressa pelo texto constitucional em vigor. É também objetivo deste capítulo apresentar o conteúdo semântico do Princípio Constitucional da Impessoalidade, assim como fazer cotejá-lo com os demais Princípios Constitucionais da Administração Pública, apresentados no caput do artigo 37 da Constituição da República, com a finalidade de demonstrar os vínculos existentes entre os mesmos e sua importância na concretização da finalidade estatal. 3.1 BREVE ESCORÇO CONCEITUAL Pode-se afirmar que o Princípio da Impessoalidade possui origem remota no conhecido Princípio da imparcialidade administrativa do direito inglês que, por influência do Princípio da imparcialidade judicial, objetivou a neutralidade do administrador. No Ordenamento Jurídico brasileiro, o Princípio da Impessoalidade está inserido no caput do artigo 37 da Constituição da República e, para alguns doutrinadores, possui três sentidos: uns acreditam que seu objetivo é vedar o subjetivismo; outros o compreendem como sendo a própria finalidade pública; e uma terceira corrente doutrinária equipara a impessoalidade à igualdade99. Valendo-se dos ensinamentos de Ferreira, o vocábulo impessoal, do latim impersonale, significa “o que não se refere ou não se dirige a uma pessoa em particular, mas 99 ANDRADE, André Gustavo Corrêa de. A constitucionalização do direito: a constituição como locus da hermenêutica jurídica. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p. 85. 44 às pessoas em geral”. De acordo com o conceito dado pelo referido dicionário, evidencia-se a impessoalidade da lei, visto que a mesma não se direciona a uma ou outra pessoa em especial, mas à todas aquelas que fazem parte de uma mesma sociedade, uma mesma ordem jurídica100. Percebe-se também, noutra passagem do supracitado dicionário, outro conceito precioso, o qual é válido ponderar: “independente ou sobranceiro a qualquer circunstância ou particularidade”. Mais uma vez, resta evidenciada a clareza existente no vocábulo impessoal, o qual se entende por se opor a qualquer situação que seja favorecedora ou detrimentosa a quem quer que seja101. À primeira vista parece ilógico e inconsistente que no manejo da sociedade humana, composta de pessoas, possa exigir-se impessoalidade. Soa também com estranheza, a exigência de impessoalidade na titularidade e no exercício do poder, visto que são conduzidos, não restam dúvidas, por pessoas humanas. Entretanto, a impessoalidade aqui, corresponde para Administração e para os administrados, para a generalidade e à neutralidade, as quais são características próprias da lei. Isto adverte que a Administração não possui uma faceta personificada, identificada com determinada pessoa ou grupo, ela é externa, objetiva, incapaz de qualquer personalização102. Não se depara o direito estrangeiro com nenhum Princípio da administração que seja denominado de impessoalidade, como ocorre em nosso ordenamento jurídico após a Constituição de 1988, porém, em análise e comparação do Direito da Inglaterra e as Constituições da Itália, Espanha e Portugal, encontra-se a indubitável existência do Princípio da impessoalidade como preceito fundamental, apesar de revestido de outras nomenclaturas, como neutralidade e imparcialidade103. Para clarear a permanência da impessoalidade em algumas Constituições estrangeiras, mister se faz salientar o que vem mencionado no artigo 103.1 da Constituição Espanhola, que obriga a administração pública a servir com objetividade os interesses gerais, ou seja, é luzente a prevalência da impessoalidade quando o texto constitucional se refere à objetividade, que nada mais é do que a não-subjetividade exigida pela impessoalidade. As 100 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa, p. 837. 101 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa, p. 837. 102 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 148. 103 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 148. 45 Constituições da Inglaterra, Espanha e Portugal, denominam a impessoalidade de imparcialidade, o que denota o mesmo sentido104. Também se verifica a permanência do Princípio em pauta nas Constituições francesa e alemã, as quais salientam a impessoalidade no que tange ao dever dos funcionários públicos perseguirem o interesse coletivo com exclusividade, desprezando quaisquer interesses privados e ou pessoais, que sejam alheios ao interesse geral105. Meirelles afirma que o Princípio da Impessoalidade, referenciado no caput do artigo 37 da Constituição, nada mais é senão o próprio Princípio da finalidade, que impõe ao administrador público a prática de ato apenas para o seu fim legal. E o fim legal é aquele que a Norma de direito expressa como objetivo do ato, de forma impessoal106. Medauar assinala que o Princípio da Impessoalidade possui como objetivo essencial impedir fatores pessoais, subjetivos, posto que a Constituição visa, com o Princípio da Impessoalidade, obstar atuações geradas por antipatias, simpatias, objetivos de vingança, represálias, nepotismo, favorecimentos diversos, muito comuns nos procedimentos licitatórios107. Busca a Constituição, que predomine o objetivo de função, ou seja, a idéia de que os poderes conferidos visam ao interesse da coletividade, portanto, renegam favorecimentos de cunho pessoal em detrimento do todo. No que tange a situações que invocam interesses coletivos, a impessoalidade visa a ponderar equilibradamente todos os interesses envolvidos, para que não sejam editadas decisões oriundas de preconceitos ou radicalismos de qualquer natureza108. Na mesma linha de idéias, afirma Neto que a primeira acepção veda a Administração de distinguir interesses onde a lei não o fizer; faz-se, neste caso, alusão ao Princípio da Legalidade; na segunda acepção, veda a Administração de prosseguir interesses públicos secundários próprios, desligados dos interesses públicos definidos em lei; destarte, enfatiza-se a idéia de que o Estado não deve atuar em seu exclusivo benefício, mas sempre em benefício 104 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 148. 105 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 148. 106 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 92. 107 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 141. 108 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno, p. 141. 46 da sociedade; na terceira acepção, semelhante à segunda, veda a Administração dar preferência a quaisquer outros interesses que não aqueles em razão de toda a coletividade109. No mesmo diapasão, afirma Gasparini: A atividade administrativa deve ser destinada a todos os administrados, dirigida aos cidadãos em geral, sem determinação de pessoa ou discriminação de qualquer natureza. É o que impõe ao poder público este Princípio. Com ele quer-se quebrar o velho costume do atendimento do administrado em razão de seu prestígio ou porque a ele o agente público deve alguma obrigação110. Desta forma, o ato administrativo da impessoalidade, não deve ser formado tendo como objetivo a pessoa de alguém. Não pode e não deve ser dirigido com o objetivo de beneficiar esta ou aquela pessoa, esta ou aquela empresa111. Di Pietro segue a mesma linha adotada pelos autores mencionados alhures quando afirma que, de acordo com o Princípio da Impessoalidade, a Administração não pode atuar de modo a prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, de forma que é sempre o interesse público que deve guiar o seu comportamento112. Na Lei n. 9.784/99 que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, o Princípio não aparece expressamente mencionado, no entanto, está contido implicitamente no seu artigo 2º, parágrafo único, inciso III, nos dois sentidos que o Princípio encarna113, pois exige “objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades”114. Para Silva, o Princípio da Impessoalidade “significa que os atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao funcionário que os pratica, mas ao órgão ou entidade 109 NETO, Diogo de Figueiredo Moreira. Curso de direito administrativo. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 93. 110 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 8. 111 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo, p. 8. 112 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 85. 113 Cf. REALE, Miguel. Fundamentos do direito. 3. ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 1998, p. 311, “o bem comum, objeto mais alto da virtude justiça, representa, pois, uma ordem proporcional de bens em sociedade, de maneira que o direito não tem a finalidade exclusiva de realizar a coexistência das liberdades individuais, mas sim a finalidade de alcançar a coexistência e a harmonia do bem de cada um com o bem de todos”. 114 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 85. 47 administrativa em nome do qual age o funcionário”. Este é apenas um agente da Administração Pública, de forma que não é ele o autor institucional do ato115. Assim, não se confronta o administrado com o funcionário X ou Y que expediu o ato, mas com a entidade cuja vontade foi manifestada por ele, visto que a primeira Regra da forma de administrar é a objetividade, que se encontra em estreita relação com a impessoalidade116. Salienta Bastos, de maneira interessante, que a impessoalidade está intimamente presa a outros Princípios tais como o da finalidade, o da isonomia e também o da legalidade. O Poder Discricionário do qual o administrador é dotado, é o que prospera o atentado à impessoalidade. Aqui, ao moldar seu comportamento cabe a prática de um ato que melhor atenda a finalidade legal. Nesta situação é que o administrador pode ser tentado a substituir o interesse coletivo por interesse de ordem pessoal, discriminando ou favorecendo sem justificação legal117. Neto assim conceitua o Princípio da Impessoalidade, o qual prefere denominar de Princípio da finalidade: Pode-se conceituar o Princípio da finalidade como a orientação obrigatória da atividade administrativa ao interesse público especificamente explícito ou implícito em lei. Com efeito, ao estabelecer o legislador, qual a finalidade da ação do agente administrativo, proíbe de considerar quaisquer inclinações ou interesses pessoais. Essa é a característica destacada pela Constituição com a designação, que preferiu, de Princípio da Impessoalidade (...)118. A pessoalidade que vincule a ação da Administração Pública ao agente que o praticou, exteriorizando paternalismo, clientelismo ou subjetivismo, torna-se vício que infama o ato administrativo119. A prática do Princípio da Impessoalidade obsta que o administrador público beneficie ou persiga os administrados, tratando-os com desigualdade, portanto, o referido Princípio 115 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo, p. 647. 116 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo, p. 647-648. 117 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 326. 118 NETO, Diogo de Figueiredo Moreira. Curso de direito administrativo, p. 94. 119 ANDRADE, André Gustavo Corrêa de. A constitucionalização do direito, p. 85. 48 assegura ao administrado, a imunidade frente à Administração Pública de atos detrimentosos, que possuam falsa motivação120. Feitas estas considerações, necessário consignar que, para fins deste trabalho, adotarse-á o entendimento de Medauar acerca do Princípio da Impessoalidade, a qual entende que a Constituição visa, através do Princípio supra, obstar ações geradas por antipatias, objetivos de vingança, simpatias, represálias, nepotismo, favorecimentos diversos, comuns em diversos atos da Administração Pública. Busca a Constituição, que predomine a idéia de função, ou seja, os poderes atribuídos à Administração devem visar o interesse da coletividade, impedindo, deste modo, resultados imbuídos de razões pessoais121. Os Princípios, como já mencionado no capítulo anterior, compreendem um grau de importância muito elevado se comparado com as outras espécies normativas, visto que compreendem no seu cerne, além do caráter de Norma posta no mais alto nível hierárquico, o cargo de diretriz, de baluarte para a solidificação e harmonia de um povo, de uma sociedade. São eles Normas jurídicas as quais devem estar submetidas as demais Normas, visto que desta forma, estarão refletindo as aspirações e sentimentos de um Estado, de um povo, de uma nação em determinada época e espaço122. O Princípio Constitucional da Impessoalidade compreende todas as características dos Princípios jurídicos já mencionados, pois possui aspecto ético e político, reflete e corresponde ao anseio de justiça e igualdade, desejados pela sociedade desde os primórdios da civilização. Visa este Princípio, resultar na “boa administração” e fazer parte das Regras do “bom governo”, pois este, sempre foi o ideal dos homens e esteve identificado com a virtude, a probidade e o alcance do bem comum123. Em sua essência, o Princípio da Impessoalidade reveste-se de conteúdo moral e ético, manifestado no anseio do exercício do poder de forma objetiva, imparcial, sem privilégios ou perseguições, com o desígnio de alcançar o bem comum. Antes mesmo de tornar-se obrigação 120 ANDRADE, André Gustavo Corrêa de. A constitucionalização do direito, p. 86. 121 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo moderno, p. 141. 122 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 129. 123 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 129. 49 jurídica, a exigência de impessoalidade no exercício do poder124, impõe-se como mandamento ético e moral125. O Princípio da Impessoalidade encontra abrigo na Constituição da República já em suas disposições preambulares, pois, ao afirmar o Estado Democrático, o qual se destina a garantir o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, demonstra sua acolhida, em sua conotação ética e política126. Com relação aos objetivos fundamentais, a Constituição ratifica a veemência do Princípio da Impessoalidade quando reza em seu artigo 3.º que possui como objetivo fundamental a promoção do bem de todos sem qualquer tipo de discriminação ou preconceito de origem, raça, cor, sexo ou idade. Tais objetivos constituem clara manifestação do Princípio da Impessoalidade, no seu sentido de não-discriminação, de persecução do bem comum sem a influência dos lesivos fatores de ordem pessoal e egoística127. Por ser o Estado, dotado de poder para conduzir os administrados a um objetivo comum, não pode ele olvidar da conduta de neutralidade a qual deve seguir, a fim de fazer valer a igualdade garantida pela Constituição no seu artigo 5º. O Princípio da Impessoalidade reflete esta igualdade conduzindo o Administrador a uma gestão transparente, sem benefícios ou malefícios a quem quer que seja128. Visa o Princípio da Impessoalidade, o alcance da objetividade, da não-subjetividade no exercício do poder, visto que esse é o ideal de governo ensejado por todos e pelo próprio Estado. O governo deve voltar-se ao interesse público, coletivo, isto implica em atos impessoais para a necessária efetivação do Princípio em pauta129. 124 Cf. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 104, “Cada agente administrativo é investido da necessária parcela de poder público para o desempenho de suas atribuições. Esse poder é de ser usado Normalmente, como atributo do cargo ou da função e não como privilégio da pessoa que o exerce. É esse poder que empresta autoridade ao agente público quando recebe da lei competência decisória e força para impor suas decisões aos administrados”. 125 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 129. 126 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 129. 127 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 129. 128 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 135. 129 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 135. 50 Verifica-se a imprescindibilidade do Princípio supra no exercício do poder, como garantia de uma administração límpida, proba e que busca alcançar o bem comum, nunca em detrimento de alguns, mas sempre em benefício de todos. Não se pode falar em interesse público sem enaltecer o Princípio da Impessoalidade, pois o mesmo possui na sua essência caráter moral, por possuir a característica de objetividade, pois o interesse público, como salienta Zago, é próprio e impessoal, portanto, em favor de todos, sem aspirações individualistas e subjetivas130. Apenas sendo impessoal, é possível ao poder, servir e identificar-se com o interesse geral, que é o desígnio e a finalidade do Estado, e, conseqüentemente, da atividade administrativa do mesmo Estado. Alguns autores compreendem o Princípio da Impessoalidade como idêntico ao Princípio da finalidade, justamente pela exigência contida na impessoalidade do agir da administração, em qualquer circunstância, de acordo com o interesse e a finalidade pública, sendo vedada a prática de atos que visem unicamente satisfazer interesses privados, por favoritismo ou perseguição131. Meirelles132 define o Princípio da Impessoalidade e faz menção ao Princípio da finalidade quando versa que: O Princípio da Impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37, caput) nada mais é que o clássico Princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a Norma de direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal. Este Princípio segundo o mesmo autor, “também deve ser entendido para excluir a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos sobre suas realizações administrativas” 133. Desde que o Princípio da Impessoalidade estabelece que o ato seja praticado sempre com finalidade pública, fica o administrador impedido de buscar outro objetivo ou ainda, de 130 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 135. 131 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 136. 132 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 92. 133 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 92. 51 praticá-lo em razão de interesse próprio ou de terceiros. Nada obsta, porém, que o interesse público venha a coincidir com o de particulares, sendo desta forma, lícito conjugar a pretensão do particular com o interesse coletivo134. Destarte, evidencia-se que a finalidade do Estado está imbuída de impessoalidade, a qual se reflete no Princípio, a fim de garantir a todos os administrados, a segurança de um governo para todos, com um objetivo único, qual seja, o de alcançar o bem comum. De acordo com Zago, as instituições políticas devem existir somente em função da liberdade dos indivíduos e do seu bem comum, portanto, a impessoalidade é um direito do administrado e um dever do administrador, visto que este deve agir com transparência e imparcialidade de forma a visar sempre o bem da coletividade e assegurar assim, probidade e eficiência à sociedade administrada135. O direito de concorrer para a formação da vontade geral e o direito da sociedade pedir contas a todo agente público136 pela sua administração, constam da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Corresponde a este direito o dever de cada indivíduo para com a comunidade, dever reconhecido expressamente no artigo XXIX da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, o qual informa que toda pessoa tem deveres perante a sociedade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível137. Ainda por base a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, predispõe seu artigo segundo que toda pessoa está sujeita apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades alheios e de satisfazer às justas exigências da moral, da ordem pública e do bemestar de uma sociedade democrática138. Como explanado em momento anterior, fazem parte do cerne do Estado de Direito, o interesse comum, o interesse público, no qual a impessoalidade garante o direito fundamental do cidadão de ser participante do interesse público, fiscalizando, participando, no qual faz 134 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 92. 135 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 145. 136 Cf. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 499, “Agente Público é toda pessoa física que presta serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da Administração Indireta”. 137 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 145. 138 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 146. 52 valer a democracia e a cidadania das quais é dotado. Este direito fundamental só pode ser alcançado através de uma administração pública impessoal e objetiva, que não privilegia, tampouco persegue e assim, faça valer o direito de eqüidade139. Feitas estas breves considerações, passa-se agora, a identificar o conteúdo atribuído pelo texto constitucional em vigor ao Princípio da Impessoalidade, tema desta monografia. 3.2 CONTEÚDO CONSTITUCIONAL DO PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE Com a finalidade de evitar constante repetição da fonte bibliográfica, nos próximos parágrafos utilizar-se-á os ensinamentos de Rocha, com a finalidade de demonstrar os objetivos e aplicações do Princípio Constitucional da Impessoalidade como coerção da improbidade e como análogo à igualdade140. Como visto anteriormente, tem por escopo o Princípio Constitucional da Impessoalidade, a neutralidade administrativa, fixando como única finalidade o interesse público. A impessoalidade na Administração Pública garante a qualidade gerida pelo Estado, qual seja a condição de ser pública, patrimônio de todos voltado à materialização do bem comum e não de grupos ou pessoas determinadas. Traduz-se o Princípio da Impessoalidade na carência de marcas pessoais e particulares ligadas ao administrador que em determinado momento, esteja no exercício da atividade administrativa, tornando-a, desta forma, moldada à sua conveniência, pensamento ou vontade. O Estado, no sentido que lhe confere Botelho141, é pessoa política, é a sociedade formada sob determinado modelo de Direito constituído e posto à observância obrigatória, com vistas à efetivação do bem público. Portanto, os sujeitos que formam a Administração Pública passam a compor aquela pessoa e nela exercem sua atividade. O contrário seria imaginar o Estado compondo a pessoa particular que participa de sua equipe funcional, enaltecendo assim, a pessoalidade, a qual nega o Direito e destrói a democracia, que faz valer o poder coletivo para não ser de alguém em particular. 139 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 146. 140 Cf. ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública, p. 147 à 157. 141 BOTELHO, Alexandre. Curso de ciência política. Florianópolis: Obra Jurídica, 2005, p. 152. 53 O Princípio da impessoalidade visa obstar o subjetivismo na Administração Pública, já que a objetividade não admite que prevaleça a alma do administrador, tampouco suas vontades. A fim de evitar repetições em razão da referência da fonte bibliográfica empregada nas próximas páginas desta pesquisa, utilizar-se-á os ensinamentos de Rocha142, por serem os mais plausíveis na aplicação dos tópicos subseqüentes. Rocha salienta que o Princípio da Impessoalidade possui conteúdo positivo e negativo. Ele é positivo quando assegura que a objetividade e a neutralidade devem predominar em todos os comportamentos da Administração Pública. Neste sentido, indica um preceito positivo, enfatizando o que deve conter nas ações da Administração. Ele é negativo quando determina que a Administração deve obedecer a certos limites, quais sejam, os de praticar atos desvirtuados de sua finalidade. No sentido negativo a que se propõe a impessoalidade administrativa, além de assegurar a objetividade no trato com os administrados, impedindo relações beneficiárias ou detrimentosas, veda também o comportamento administrativo motivado pelo partidarismo. É o Princípio da Impessoalidade que impede que as vinculações partidárias das pessoas que chegam aos cargos públicos, valham-se do cargo que ocupam para realizar interesses partidários do grupo. Rocha enfatiza que um dos maiores perigos do não acatamento do Princípio da Impessoalidade é a condução dos administradores ao partidarismo no desempenho administrativo, pois nele está o “coração do Estado”. É no desempenho da atividade administrativa que a lei torna-se realidade para cada administrado e para toda a cidade política que forma o Estado, portanto, sem o respeito a este Princípio, facilitada estaria a tomada de decisões políticas e governamentais que pudessem favorecer o interesse de quem se encontra no poder e do seu partido. Desta forma, verifica-se que, a não relevância do Princípio em questão, levaria a Administração Pública por vias corrompidas que abririam espaço para a minoria, ou para aqueles que compusessem o quadro dos partidos vencedores. É a Administração Pública política, porém, não deve ser jamais partidária, visto que se dedica a toda a sociedade, não 142 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública, p. 147. 54 apenas às tendências que detenham o poder decisório pela maioria do povo em determinado momento histórico. A finalidade pública vincula a Administração, porém não se confunde com a impessoalidade administrativa garantida pela Constituição como Princípio. É o Princípio da Impessoalidade consolidado para garantir que a entidade estatal realize os fins aos quais se destina; mas a impessoalidade possui como fundamento jurídico o intento de afastar o agente público de agir conforme seus próprios interesses, visto que agindo desta forma, jamais alcançaria a finalidade a que se propõe, qual seja, objetiva, genérica e pública. A Norma constitucional na qual se encontra inserido o Princípio da Impessoalidade (artigo 37 da Constituição da República), não se destina apenas ao administrador, mas também e igualmente ao legislador. Do contrário, o legislador poderia dotar as Normas de interesses partidários e subjetivos, e conseqüentemente obrigaria o administrador público, rompendo assim, toda a construção democrática do Estado de Direito. A impessoalidade administrativa é dever do Estado e direito do cidadão. Sendo assim, a ofensa a este Princípio que resulte em ônus para a sociedade é de responsabilidade de quem lhe tenha dado causa. Se alguma contrariedade à Constituição sustenta-se em lei, nem por isso é menos hostil ao sistema normativo fundamental e nem por isso, pode sobreviver. Necessário, neste momento da pesquisa, explicitar o Princípio da Impessoalidade como Princípio da Igualdade, visto que ambos possuem o mesmo objetivo e necessário se faz aludi-los. Neste item, verificar-se-á a concomitância existente entre a impessoalidade e a igualdade por possuírem, ambas, o mesmo escopo, qual seja, de suprir o interesse público. Tem como objetivo o Princípio da igualdade, não discriminar, não distinguir, pois não se pode aceitar o preconceito contra uma pessoa que participe de uma determinada sociedade estatal; porém, vê-se que nesta busca de evitar a discriminação que prejudica, está incluída aquela que privilegia, pois a vantagem de um é o detrimento de outro em determinado grupo social. A relação jurídica fixada no Princípio da igualdade é a dos cidadãos na dinâmica da sociedade e entre estes e o Estado. Visa o Princípio da Impessoalidade administrativa não dar chances ao administrador de privilegiar determinada pessoa ou grupo social, visto que desse privilégio, resultaria dano à toda sociedade. Verifica-se neste caso que a principal relação é a do agente administrativo com a Administração Pública e o poder público, no exercício do qual as vantagens podem ser 55 alcançadas por agentes de má-fé. Desta forma, ressalta-se que tanto o Princípio da igualdade como o Princípio da Impessoalidade devem ser obrigatoriamente observados pela Administração Pública, porém, a impessoalidade deve ter caráter específico, sendo que não se desvirtua da esfera estatal. Pode-se afirmar de acordo com o entendimento supra que o Princípio da igualdade possui maior amplitude e abrangência, portanto, se desdobra, dentre outros, no Princípio da Impessoalidade administrativa. A razão de dar-se ênfase ao Princípio da Impessoalidade na sociedade contemporânea se faz pelo fato de que se percebe facilidade de realizar projetos pessoais, de grupos ou partidos políticos que têm acesso aos cargos que formam a Administração Pública, portanto, necessário se faz ater-se com decoro à impessoalidade, a fim de evitar tais comportamentos hostis. A igualdade jurídica veda discriminações fundadas em preconceitos ou conceitos subjetivos sobre as pessoas, inaceitável é o prejuízo provocado pela discriminação socialmente injusta, não se admite, em razão de tal Princípio, comportamentos que desigualem quando inexistam razões jurídicas de desigualdade. Na impessoalidade, dá-se ênfase à ausência de subjetividade e voluntarismo do administrador público, para que ele cumpra sua função com vistas ao interesse coletivo, ou seja, de todo o povo, voltando-se à finalidade pública. Busca-se através da impessoalidade obstar o benefício adquirido pela condição pessoal privilegiada política e administrativamente, em detrimento de toda a sociedade. A vantagem mais facilmente adquirida pelo administrador público para si ou para seus “parentes e amigos” em razão de seu cargo ou sua proximidade do poder é injusto socialmente e inválido juridicamente. “A Administração personalizada não é pública, não é democrática, não é justa”. Evidenciado está que ambos os Princípios aqui discutidos estão entrelaçados um ao outro no Direito, visto que são dois fios de uma mesma meada, pois ambos tecem a democracia no Estado de Direito. A igualdade é o direito e o seu titular é o cidadão ou o indivíduo. A impessoalidade é dever titular da Administração Pública. Ambas obrigam. Aquela obriga todas as pessoas públicas e privadas, físicas ou jurídicas. Esta obriga o Estado a agir com neutralidade, objetividade e imparcialidade em todos os seus comportamentos. 56 Necessário destacar alguns vícios de pessoalidade na nos atos e ações administrativos, a fim de demonstrar como a impessoalidade é imprescindível para o alcance do bem comum. Por esta razão, destacar-se-á a seguir, alguns tópicos inerentes a atos administrativos eivados de pessoalidade administrativa. Da mesma forma que ocorre quando a Administração Pública ofende a Norma jurídica à qual deve observância plena, também anula o seu comportamento a contrariedade ao Princípio da Impessoalidade. A pessoalidade ou o personalismo no exercício da atividade administrativa denigre o ato que dela surge e que, corrompido do vício, mostra-se inválido para o direito. A distorção do comportamento administrativo por inobservância ao Princípio Constitucional da Impessoalidade alcança dois elementos externos do ato administrativo, quais são: o motivo e a finalidade. Afetando esses dois elementos pela falha da pessoalidade ou do personalismo na conduta administrativa acaba por comprometer juridicamente o próprio conteúdo do ato dela nascido, e é naqueles elementos que reside a ausência comprometedora de sua validade jurídica. O agente administrativo que pratica o ato incorreto juridicamente eivado de pessoalidade é competente para o desempenho, mas não o poderia praticar avaliando somente suas opiniões e interesses subjetivos. A competência administrativa formal não corresponde com a competência administrativa material, ou seja, o agente pode ter competência para uma determinada nomeação, porém, não poderá fazê-la por ser seu parente ou amigo, visto que o cargo público deve ser preenchido de acordo com os interesses e conveniências públicas e não particulares ou pessoais. Desta forma, ratifica Rocha: O ato da Administração Pública, naquele exemplo, é praticado por agente formalmente competente, vale dizer, a lei lhe confere a atribuição de nomear servidor para determinado cargo, mas não para fazê-lo considerando-se não o interesse público, mas o seu interesse em oferecer ocupação a seu filho, ou amigo, etc. A competência materialmente indicada pela lei tem que coincidir com a competência formalmente definida por ela, a fim de que esta seja considerada válida e não haja antijuridicidade do ato. A impessoalidade administrativa é infringida quando o motivo que acarreta uma prática pela entidade pública não é uma razão jurídica fundamentada no interesse público, mas no interesse pessoal de quem o pratica. O agente é, então, motivado pelo interesse em 57 auxiliar ou beneficiar parentes, amigos, pessoas que mereçam, segundo particular vinculação que os aproxima, favores e benesses que o poder facilita ou, até mesmo, em prejudicar pessoas que não são do seu círculo de relacionamentos pessoais e pelos quais alimente o agente público particular desafeto e desprazer. Observa-se que a pessoalidade nas ações administrativas pode ocorrer mesmo quando o beneficiado esteja munido das condições descritas pela lei para o recebimento do agrado conferido, porém, os motivos que poderiam determinar tal concessão não acontecem pelas razões e situações de fato e direito descritas que fariam com que sua obtenção fosse de ordem pública. Por exemplo, se um engenheiro habilitado técnica e profissionalmente é indicado para atuar como fiscal de uma obra pública pela Administração por ser filho do diretor ou presidente da entidade que o indica, derrotado está o Princípio da Impessoalidade administrativa, visto que o real motivo que deveria conduzir o indicado ao cargo não foi satisfeito, e sim houve a prevalência de um ato pessoal do administrador em detrimento do interesse público. Em seguida verificar-se-á de que forma o Princípio da Impessoalidade pode obstar a improbidade, tão freqüente nos atos administrativos. Pretende-se destacar a atuação deste Princípio no que tange ao impedimento de vícios na Administração Pública. Como visto anteriormente, ao determinar o Princípio da Impessoalidade que a Administração Pública deve agir sempre de acordo com o interesse público, punindo com nulidade a prática de atos que dele se desvirtue, seja por motivo de ordem pessoal, política, religiosa, seja propiciando favoritismos, perseguições, ou aquisição de vantagens por parte do administrador, do particular ou de ambos, defende uma Administração objetiva, imparcial e, conseqüentemente, proba143. Neste sentido, a impessoalidade caminha em consonância com a moralidade, visto que ambas exigem comportamentos honestos, límpidos, transparentes e, portanto, condizentes com o interesse público. É a moralidade administrativa, própria do servidor e do 143 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 190. 58 administrador, pois precisam eles agir de acordo com as melhores Regras de administração, por estarem administrando coisa alheia, comum, pertencente à toda a sociedade144. A moralidade e a probidade estão fortemente entrelaçadas ao Princípio da Impessoalidade. Percebe-se ser a probidade, gênero do qual a moralidade é espécie, ou, de outra forma, pode-se considerar a moralidade como gênero do qual a probidade é espécie, visto que a probidade constitui-se em um dever, decorrente do Princípio da moralidade. Ambas podem ser consideradas sinônimas, pelo grau de semelhança que exalam145. O termo ímprobo provém de in e probus, e quer dizer mau, perverso, corrupto, devasso, desonesto, falso, enganador. É atribuída a toda pessoa que atenta contra os Princípios ou Regras da lei, da moral e dos bons costumes, com objetivos maldosos ou desonestos. Já a improbidade, deriva do latim improbitas, que designa má qualidade, imoralidade, malícia, pode ser ligado juridicamente ao sentido de desonestidade, má conduta, má índole146. Atribui-se à palavra improbidade, o sentido de desonestidade, revela a qualidade do homem que não age com boa intenção, que não procede bem, por ser dotado de desonestidade, por agir indignamente, por ser mau caráter, por atuar com indecência, por ser imoral. Tem-se a improbidade como a qualidade do ímprobo, ou seja, aquele que transgride as leis e os bons costumes, aquele que derroca os Princípios do bem viver147. Julga-se necessário aludir a impessoalidade à improbidade, visto que possuem conexão, pois o Princípio da Impessoalidade provém da indisponibilidade do interesse coletivo, no sentido de que o agente procede de acordo com a lei e atento à finalidade administrativa, sem relevar sua vontade própria. Deve, o administrador, atuar sem subjetivismos, alheio a ideologias, tendências, preconceitos, ainda que deva sempre interpretar a lei, para melhor aplicá-la ao caso concreto148. A impessoalidade pode ser também, aspecto considerável da probidade administrativa, mesmo que não o único a ter relevância. A atuação administrativa deve ser essencialmente 144 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 192. 145 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 192. 146 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 193. 147 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 193. 148 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 194. 59 livre de subjetivismos. A impessoalidade guarda a moralidade e tem o poder de suprimir a improbidade nos casos em que não se dispense a verificação do elemento subjetivo149. De acordo com a Lei n. 8.429/92, que versa sobre a improbidade administrativa, os atos de improbidade administrativa são de três espécies, quais sejam: os que implicam enriquecimento ilícito, os que trazem prejuízo ao erário e os que se opõem aos Princípios da Administração Pública150. O Princípio da Impessoalidade em consonância com o Princípio da moralidade conduz e justifica as razões que ensejaram a edição da lei de improbidade administrativa, a qual se volta inteiramente à coibição da prática de atos praticados pelo administrador, com desvio de finalidade pública, com ou sem aquisição de vantagem pecuniária151. Cumpre destacar o artigo 11 da Lei n. 8.429/92, com o intuito de demonstrar onde se encontra caracterizado o Princípio da Impessoalidade como óbice da improbidade: Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os Princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na Regra de competência; II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício; III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo; IV - negar publicidade aos atos oficiais; V - frustrar a licitude de concurso público; VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo; VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço152. Tem o Princípio da Impessoalidade significado de coibição à improbidade pelo fato de que atua no campo dos valores, ideais e anseios da sociedade, portanto, obriga a comportamentos corretos e probos, voltados exclusivamente ao interesse da coletividade. 149 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 194. 150 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 195. 151 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 195. 152 BRASIL. Lei 8.429 de 2 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências. 60 Interessante observar também, que o poder de legislar conferido ao legislador pela outorga do povo não confere a ele a discricionariedade de legislar sem se ater aos Princípios Constitucionais imbuídos na Constituição, tampouco às demais Normas de igual valor nela contidas, visto que admite-se a atividade legislativa de forma que o legislador tem a tarefa de executar ou aplicar a Constituição da mesma forma que a Administração tem o poder e o dever de executar a lei153. A pessoalidade administrativa não tem aparecido apenas no comportamento dos agentes que prestam serviços públicos, mas também tem tido início nas condutas legislativas. A produção normativa que determina a atividade administrativa personalizada e privilegiadora dos agentes integrantes do poder público é exemplo de derrocada ao Princípio da Impessoalidade154. O artigo 37 da Constituição Federal quando se refere à Impessoalidade, menciona sua influência à Administração Pública, ou seja, aos membros e atividades de qualquer dos poderes do Estado e não apenas do executivo, que possui como função peculiar, administrar. O Princípio em pauta obriga todo o Estado, e não um ou alguns de seus poderes, do contrário, estaria o mesmo Princípio extremamente fragilizado, se a lei possibilitasse que a Administração Pública agisse de forma pessoal de acordo com o texto contido nela155. 3.3 O PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE EM CONSONÂNCIA COM OS DEMAIS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS EXPRESSOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Uma das características dos Princípios Constitucionais apontadas anteriormente é o seu caráter de vinculabilidade, visto que são vinculados e vinculantes, ou seja, se relacionam, se entrosam, se complementam e harmonizam entre si, vinculando também as demais Normas, de tal sorte que sua perfeita harmonia está na dependência e no entrosamento com os demais Princípios Constitucionais. 153 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 267. 154 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública, p. 167. 155 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública, p. 167. 61 Nada mais compreensível que a conexão do Princípio da Impessoalidade com o Princípio da legalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência, visto que possuem todos o mesmo objetivo, qual seja, o bem comum através do interesse público156. Apesar de seu caráter de vinculabilidade, o Princípio Constitucional da Impessoalidade, bem como os demais Princípios já mencionados, possuem cada qual sua individualidade e traços específicos, característicos. Cada um destes Princípios traz em seu âmago, preceitos distintos, porém todos eles possuem o mesmo escopo. Interessante comparar os demais Princípios da Administração Pública com o Princípio da Impessoalidade, pois desta comparação será retirada a característica e peculiaridade de cada um deles157. Definido anteriormente o Princípio da Impessoalidade, mister se faz, ainda que de forma sucinta, conceituar o Princípio da legalidade a fim de fazer uma alusão sobre a vinculabilidade existente entre ambos. Carvalho Filho explica que o Princípio da legalidade é certamente a diretriz básica da conduta dos agentes da Administração. Significa que toda e qualquer atividade administrativa deve ser autorizada por lei. Não o sendo, a atividade é ilícita158. A mesma impessoalidade que é característica da lei é característica do atuar da Administração, com a distinção de serem todos os atos administrativos subordinados à lei. Esta subordinação pode ser entendida como a flexibilidade ao interesse público, que busca a concretização do bem de todos. Neste sentido afirma Zago: Ambos os Princípios se entrosam de maneira forte na atividade administrativa, em decorrência da qual o Princípio da legalidade estrita foi abrandado para dar mais eficiência e eficácia à função administrativa, impossível de ser alcançada sem a discricionariedade159, já que a lei, por seu 156 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 346. 157 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 346. 158 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 5. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1999, p. 12. 159 Sobre a discricionariedade ou Poder Discricionário ensina ROSA, Márcio Fernando Elias. Direito administrativo. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 63, que “a atividade administrativa está sempre vinculada ao fim a que se destina e a eleição de opções somente decorre de concessão legal. Como resultante desse poder, o agente elege a opção que melhor atende ao interesse público no caso concreto, e somente assim agirá se a lei expressamente contemplar mais de uma possibilidade de ação”. 62 lado, é impossível disciplinar concretamente todas as hipóteses fáticas, em especial as situações emergenciais. No entanto, o poder discricionário não pode extrapolar os limites e a competência atribuídos pela lei, sob pena de desvio ou abuso de poder. Consistindo num dos significados do Princípio da Impessoalidade em corolário da teoria do desvio da finalidade ou do excesso de poder, e estando a atividade do administrador vinculada ao Princípio da legalidade, este é um dos pontos de conexão entre os Princípios160. Porém, aplica-se o Princípio da Impessoalidade na Administração Pública em todos os seus atos, sempre com a mesma eficácia e em qualquer dos seus sentidos, o que não ocorre com o Princípio da legalidade, visto que este não é aplicado com tanta assiduidade quanto o primeiro. Ambos os Princípios guardam estreitas relações no que tange à objetividade; a lei é por natureza impessoal. Desta forma, compreende-se que o Princípio da Impessoalidade é mais abrangente, mormente pela extensão de sua vinculação, e tem uma variedade de sentidos e múltiplas aplicações que são seu traço acentuado e distintivo161. Quanto ao cotejamento com o Princípio da moralidade, tem-se, nas palavras de Figueiredo, que este Princípio “vai corresponder ao conjunto de Regras de conduta da Administração que, em determinado ordenamento jurídico, são consideradas os standards comportamentais que a sociedade deseja e espera”. Salienta ainda a mesma autora que, “para exame das condutas administrativas realizadas, tendo como suporte parcela de discricionariedade, a atenção deverá ser maior para aferição do cumprimento do Princípio”162. Como Princípio opositor da improbidade, na busca pela impessoalidade, de uma Administração Pública proba, objetiva, livre de inclinações, o Princípio da Impessoalidade encontra seu ponto em comum com o Princípio da moralidade. A moralidade administrativa está intimamente ligada à impessoalidade, visto que ambas as diretrizes estão calcadas na boafé do administrador público quando pratica ações decorrentes do poder do qual é dotado163. Desta forma, entende-se que a moralidade administrativa, o conceito do bom administrador como o que atua de modo objetivo, de maneira a obter uma Administração 160 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 348. 161 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 350. 162 FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 57. 163 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 354. 63 competente e voltada para o interesse público, é também o objetivo e a conseqüência do Princípio da Impessoalidade164. Pelo Princípio da moralidade, o administrador público não deve escusar os preceitos éticos que devem estar sempre presentes em suas ações. Além de verificar os critérios de oportunidade e justiça em seus atos, deve também distinguir o que é probo do que é ímprobo165. Cabe verificar a conexão havida entre ambos os Princípios, pois ao agir de forma ética, proba, sem manifestações favorecedoras ou danosas, o administrador público respeita em suas ações a impessoalidade e a moralidade, visto que agindo de forma impessoal, estará agindo de acordo com o Princípio da moralidade, e percebe-se ser a recíproca verdadeira166. A impessoalidade administrativa, como Princípio que rege as ações administrativas, veda o poder oculto, obscuro, portanto, a proibição de atos encobertos implica, necessariamente, em transparência, limpidez, publicidade de todos os atos que, por serem públicos, devem ser divulgados e alcançáveis por todos os cidadãos167. Carvalho filho, ao lecionar sobre o Princípio da publicidade salienta que: Indica que os atos da administração devem merecer a mais ampla divulgação possível entre os administrados, e isso porque constitui fundamento do Princípio propiciar-lhes a possibilidade de controlar a legitimidade da conduta dos agentes administrativos. Só com a transparência dessa conduta é que poderão os indivíduos aquilatar a legalidade ou não dos atos e o grau de eficiência de que se revestem. É para observar esse Princípio que os atos administrativos são publicados em órgãos de imprensa ou afixados em determinado local das repartições administrativas168. Assim, com a publicidade de cada ato efetuado pela Administração Pública, mais fácil se torna ao administrado fiscalizar se houve o respeito ao Princípio da Impessoalidade, ou se o administrador valeu-se do poder que dispõe para burlar o mesmo Princípio169. 164 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 354. 165 CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 14. 166 CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 15. 167 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 354. 168 CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 15. 169 CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 15. 64 As palavras de Ferreira complementam o entendimento acerca do Princípio da publicidade quando dispõe: A publicidade se faz pela inserção do ato no jornal oficial ou por edital afixado no lugar de divulgação dos atos públicos, para conhecimento do público em geral e início de produção de seus efeitos. A publicação é exigência da executoriedade do ato que tenha que produzir efeitos externos. Em alguns casos a forma de publicidade exigida é a notificação pessoal ao interessado no ato ou a quem o ato beneficia ou prejudica170. Verifica-se a importância do Princípio em tela para a inspeção do povo às ações cometidas pela administração, as quais devem possuir caráter de limpidez, transparência e probidade como requisitos basilares para a validez do ato constituído171. Foi a partir da Emenda Constitucional n. 19/98 que a eficiência no serviço foi assentada em Princípio Constitucional obrigatório para a Administração Pública, destarte, a ineficiência da Administração passa a ser insulto à Constituição. Tem como parâmetro o Princípio da eficiência no direito estrangeiro, a reivindicação do bom andamento do serviço, exigência esta, que consta da constituição italiana172. Carvalho Filho frisa de forma interessante o Princípio em tela quando explica: Incluído em mandamento constitucional, o Princípio pelo menos prevê para o futuro maior oportunidade para os indivíduos exercerem sua real cidadania contra tantas falhas e omissões do Estado. Trata-se, na verdade, de dever constitucional da Administração, que não poderá desrespeitá-lo, sob pena de serem responsabilizados os agentes que derem causa à violação. Diga-se, entretanto, que de nada adiantará a menção a tal Princípio se não houver uma disciplina precisa e definida sobre os meios de assegurar os direitos dos usuários, a qual, diga-se por oportuno, já há muito deveria ter sido instituída se tivesse sido regulamentado o artigo 37, § 3º da Constituição Federal, que, mesmo antes da alteração introduzida pela mencionada Emenda Constitucional, previa expressamente a edição de lei para regular as reclamações relativas à prestação de serviços públicos. Fora daí, o Princípio, tanto quanto tem sido esse último mandamento, tornar-se-á letra morta173. 170 FERREIRA, Wolgran Junqueira. Princípios da administração pública: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade. São Paulo: Edipro, 1995, p. 92. 171 FERREIRA, Wolgran Junqueira. Princípios da administração pública, p. 92. 172 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 355. 173 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 16. 65 A eficiência é resultado de uma Administração objetiva, neutra, competente e como não poderia deixar de ser, impessoal. Tão forte passou a ser a necessidade dos administrados pela eficiência da Administração Pública, que esta, transformou-se em texto constitucional, melhor dizendo, em Princípio Constitucional174. O Princípio da eficiência é o que norteia toda a atuação da Administração Pública. O vocábulo está ligado à idéia de ação, para produzir efeitos de modo célere e eficaz. Determina este Princípio que a Administração Pública deve agir, de modo rápido e preciso a fim de obter resultados que satisfaçam os anseios e necessidades da população. A eficiência opõe-se à morosidade, ao descaso, à negligência e à omissão, características típicas da Administração Pública, salvo raras exceções175. Após ter aludido os demais Princípios da Administração Pública com o Princípio da Impessoalidade, passar-se-á neste momento, ao terceiro capítulo desta pesquisa, que pretende demonstrar a aplicação ou não, do Princípio evidenciado à Licitação na modalidade Convite. Para tanto, pretende-se estudar anteriormente, a licitação, procedimento administrativo, a fim de demonstrar com maior minúcia, a importância existente em respeitar o Princípio da Impessoalidade ao aplicá-la. 174 ZAGO, Lívia Maria Armentano Koenigstein. O Princípio da impessoalidade, p. 355. 175 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno, p. 145. 4 O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IMPESSOALIDADE SOB O PRISMA DA LICITAÇÃO NA MODALIDADE CONVITE Antes de adentrar ao tema que é objeto deste capítulo, verifica-se ser indispensável destacar alguns aspectos da Administração Pública, que tem como única finalidade promover o bem comum e o interesse público, de modo a permitir uma exata compreensão do alcance do Princípio da Impessoalidade dentro do propósito deste trabalho. Após, estudar-se-á o instituto da Licitação bem como seu procedimento, a fim de verificar a aplicabilidade, ou não, do Princípio Constitucional da Impessoalidade em uma de suas modalidades, qual seja, o Convite. Como visto nas explanações supra, o Princípio em tela é basilar para garantir a boa administração e a transparência nos procedimentos licitatórios, visto que seu objetivo é satisfazer, não interesses subjetivos, mas apenas o interesse da coletividade, por esta razão, a importância de verificar se ele se aplica ou não à Licitação na modalidade Convite. 3.1 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA A expressão Administração Pública é de certo modo duvidosa, visto que exprime mais de um sentido. A ampla gama de tarefas e atividades que compõem o desígnio do Estado é uma das razões para este fato. Outra razão é o número de órgãos e agentes públicos encarregados de seu cumprimento. Por este motivo, é que se faz necessário dividir o sentido da expressão sob a óptica dos executores da atividade pública de um lado, e da própria atividade de outro176. Em sentido objetivo consiste na própria atividade administrativa exercida pelo Estado através de seus órgãos e agentes, caracterizando a função administrativa. 176 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 6. 67 Carvalho Filho assim define a Administração Pública no seu sentido objetivo: Trata-se da própria gestão dos interesses públicos executada pelo Estado, seja através da prestação de serviços públicos, seja por sua organização interna, ou ainda pela intervenção no campo privado, algumas vezes até de forma restritiva (poder de polícia). Seja qual for a hipótese da administração da coisa pública, é inafastável a conclusão de que a destinatária última dessa gestão há de ser a própria sociedade, ainda que a atividade beneficie, de forma imediata, o Estado. É que não se pode conceber o destino da função pública que não seja voltado aos indivíduos, com vistas a sua proteção, segurança e bem-estar177. Para Meirelles o sentido objetivo do qual menciona Carvalho Filho nada mais é senão o sentido material, o qual se caracteriza pelo conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral. É o desempenho sistemático, legal e técnico exercido pelo Estado em favor da coletividade178. Entende-se, desta forma, que o sentido objetivo da Administração Pública corresponde aos atos praticados por ela, visando sempre satisfazer as aspirações da coletividade, agindo sempre de acordo com a lei, e em consonância com os Princípios inerentes à boa administração179. Pode também a expressão Administração Pública exprimir o conjunto de agentes, órgãos e pessoas jurídicas que tenham o encargo de realizar as atividades administrativas. Desta forma, leva-se em consideração, o sujeito que exerce de fato a função administrativa180. Meirelles prefere denominá-lo sentido formal, que afirma ser “o conjunto de órgãos instituídos para a consecução dos objetivos do governo”. Vale destacar a acepção de Carvalho Filho ao mencionar o sentido subjetivo da expressão “Administração Pública”: A Administração Pública sob o ângulo subjetivo não deve ser confundida com qualquer dos poderes estruturais do Estado, sobretudo o Poder Executivo, ao qual se atribui usualmente a função administrativa. Para a perfeita noção de sua extensão é necessário pôr em relevo a função administrativa em si, e não o Poder em que é ela exercida. Embora seja o 177 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 6. 178 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 64. 179 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 6. 180 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 7. 68 Poder Executivo o administrador por excelência, nos Poderes Legislativo e Judiciário há numerosas tarefas que constituem atividade administrativa, como é o caso, por exemplo, das que se referem à organização interna dos seus serviços e dos seus servidores. Desse modo, todos os órgãos e agentes que, em qualquer desses Poderes, estejam exercendo função administrativa serão integrantes da Administração Pública181. Desta forma, o sentido subjetivo traduz-se nos órgãos que exercem a atividade administrativa do Estado, o conjunto de pessoas jurídicas, agentes e órgãos incumbidos de executarem a função administrativa182. É possível conceituar a Administração Pública como sendo “o conjunto de todas as entidades criadas para a execução dos serviços públicos ou para o alcance de objetivos governamentais” 183. Trata-se de um conceito denominado orgânico, eis que se refere à Administração Pública, direta ou indireta, de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios184. Tavares salienta que existe também um sentido funcional empregado para indicar a própria atividade administrativa, exercida pelos entes anteriormente mencionados. Este sentido se vincula ao dispositivo constitucional quando subordina a Administração Pública aos Princípios inseridos no art. 37, caput, da Constituição da República185. Demonstra-se assim, que a Administração Pública é o conjunto de órgãos incumbidos de executar atos administrativos através dos serviços públicos com o fim de alcançar um interesse único, coletivo, objetivo. A respeito do regime jurídico da Administração Pública é certo afirmar que desde o surgimento da sociedade, verifica-se que as coisas que são comuns a todos, o que se denomina coisa pública, merecem uma atenção especial, um regime jurídico característico, peculiar. Uma instituição privada, ao executar um ato jurídico, expõe a subjetividade de suas intenções. De acordo com as Normas sociais, ela tem a liberdade de fazer tudo aquilo o que pretende sua 181 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 7. 182 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 7. 183 TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 1148. 184 TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional, p. 1148. 185 TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional, p. 1148. 69 vontade. Não existem atos preestabelecidos, visto que seus atos só interessam a ela mesma. Portanto, numa empresa privada, os atos serão guiados pelo fito de alcançar um lucro186. Por sua vez, quem representa e zela pela coisa pública, tem como objeto a coisa que pertence a todos e, sob esse ponto de vista, são conduzidos pelo interesse comum do todo, denominado, interesse público. Desta forma, criou-se a Administração Pública, que deve amparar-se e efetivar-se unicamente no interesse público187. Não é de fácil conceituação o que vem a ser o interesse público, porém, para que atinja sua finalidade, o correto é relacioná-lo ao bem comum que, como explica Reale, é “a coexistência e a harmonia do bem de cada um com o bem de todos”188. A atividade administrativa possui metas a serem cumpridas, visto que a Administração Pública não constitui um fim em sim mesma, senão à realização dos valores impostos pela sociedade como expressão da justiça, prestando assim, serviços que são correspondentes ao interesse público. Os parâmetros a serem seguidos pela Administração estão incorporados aos Princípios que servem de diretriz ao exercício administrativo, não podendo, destarte, ficarem a critério do administrador189. Para manter a lógica aplicada a este trabalho, necessário se faz, no item subseqüente, analisar a Licitação como procedimento administrativo voltado ao interesse público, para posteriormente adentrar-se ao objeto de estudo deste capítulo, qual seja, a Licitação na modalidade Convite sob o prisma do Princípio da Impessoalidade. 3.2 LICITAÇÃO Como visto, a Administração Pública exerce atividade sempre com olhos voltados ao interesse público, ao interesse da coletividade. Para alcançar este fim, necessita valer-se de bens e serviços fornecidos por terceiros, razão pela qual é obrigada a firmar contratos para a realização de obras, fornecimento de bens, prestação de serviços etc.190. 186 NIEBUHR, Joel de Menezes. Princípio da isonomia na licitação pública, p. 65. 187 NIEBUHR, Joel de Menezes. Princípio da isonomia na licitação pública, p. 65. 188 REALE, Miguel. Fundamentos do direito, p. 311. 189 NIEBUHR, Joel de Menezes. Princípio da isonomia na licitação pública, p. 66. 190 CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 175. 70 O Ordenamento Jurídico não poderia deixar a critério do administrador a escolha das pessoas a serem contratadas, visto que não é difícil presumir que essa liberdade daria margens à escolhas pessoais, impróprias, prejudicando desta forma a sociedade e ferindo o interesse público. A Licitação objetiva inibir tais riscos, visto que é procedimento anterior ao próprio contrato e, desta forma, permite que várias pessoas apresentem suas propostas a fim de serem analisadas pela Administração, que escolherá a mais vantajosa191. O vocábulo Licitação provém do latim licitatio: “venda por lances”. Inicialmente o termo utilizado para Licitação era “arrematação”, posteriormente foi denominada “concorrência pública” e, mais tarde, utilizou-se pela primeira vez o vocábulo Licitação192. Diferente dos particulares, que possuem a faculdade de contratar da forma como bem entender, a Administração Pública está sujeita a realização de Licitação para contratações em geral, compras, prestações de serviços etc. Trata-se de um pré-requisito indispensável que, em razão da complexidade da atividade administrativa, permite ao ente Administrativo contratar com particulares para prover suas necessidades e conveniências193. Verifica-se a obrigação de licitar no artigo 37, XXI da Constituição da República: Art. 37 XXI – ressalvados os casos específicos na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações194; Com o intuito de regulamentar o artigo 37, XXI, da Constituição, a Lei n. 8.666/93 procurou disciplinar de maneira uniforme toda a atividade contratual da Administração Pública, atrelando os três poderes, seja no âmbito federal, estadual ou municipal. 191 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 175. 192 GELBCKE, Séfora Cristina Schubert. O papel dos princípios constitucionais na licitação pública, f. 59. 193 GELBCKE, Séfora Cristina Schubert. O papel dos princípios constitucionais na licitação pública, f. 59. 194 BRASIL, Constituição (1988). Artigo 37, XXI. 71 O artigo 2º da referida lei, disciplina que “as obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratada com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação” 195. De acordo com Di Pietro, pode-se definir a Licitação como: O procedimento administrativo pelo qual um ente público no exercício da função administrativa196, abre a todos os interessados, que se sujeitem às condições fixadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas dentre as quais selecionará e aceitará a mais conveniente197. Carvalho Filho entende que para se conceituar a Licitação, necessário se faz analisar dois elementos importantes dos quais ela é dotada. São eles, a natureza jurídica do instituto e o objetivo a que se propõe, o que constitui a sua própria ratio essendi (razão de ser). Apoiados em tais elementos, afirma o autor supra que a Licitação é o procedimento administrativo por meio do qual os entes da Administração Pública e aqueles por ela controlados selecionam a melhor proposta entre as oferecidas pelos inúmeros interessados, com dois objetivos, quais sejam, a celebração de contrato, ou a obtenção de melhor trabalho técnico, artístico ou científico198. Niebuhr afirma num primeiro momento que “a Licitação pública é o critério legalmente vinculado pelo qual a Administração oferta a sua proposta e recebe a dos interessados”. A Licitação não é apenas um procedimento que deve ser realizado para a concretização de um contrato administrativo, ela possui escopos definidos, que traduzem sua essência e estes elementos possuem relação direta com a tensão entre privilégios e garantias que regem a atividade administrativa, o que se demonstra no domínio da eficiência e da isonomia199. 195 GELBCKE, Séfora Cristina Schubert. O papel dos princípios constitucionais na licitação pública, f. 59. 196 Cf. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 348, a expressão “ente público no exercício da função administrativa”, justifica-se pelo fato de que mesmo as entidades privadas que estejam no exercício de função pública, ainda que tenham personalidade jurídica de direito privado, submetem-se à licitação”. 197 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 348. 198 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 176. 199 NIEBUHR, Joel de Menezes. Princípio da isonomia na licitação pública, p. 70. 72 Um dos objetivos da Licitação é conseguir condições negociais satisfatórias ao bem comum, ou seja, a aquisição do melhor preço, do melhor produto, e do melhor fornecedor200. Para Figueiredo, a Licitação é o “procedimento administrativo, formal, nominado, que tem por finalidade selecionar o melhor contratante para a Administração, o qual deverá prestar serviços, fornecer-lhe ou adquirir-lhe bens” 201. No mesmo diapasão, Meirelles afirma ser a Licitação “o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse” 202. Bandeira de Mello define a Licitação como: Um certame que as entidades governamentais devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas. Estriba-se na idéia de competição, a ser travada isonomicamente entre os que preencham os atributos e aptidões necessários ao bom cumprimento das obrigações que se propõem assumir. Percebe-se não haver entre os doutrinadores supra, divergência no que tange ao conceito de Licitação, visto que todos seguem a mesma vertente ao defini-la. Dallari afirma que existem sérias divergências doutrinárias quanto à natureza jurídica da Licitação. Salienta que existem três correntes a serem analisadas, que são: a primeira delas considera a Licitação instituto de direito financeiro; as outras duas concordam com sua inserção no direito administrativo. Porém, enquanto uma considera a Licitação um atocondição, a outra classifica como procedimento administrativo203. Há no direito positivo brasileiro, uma separação notória no que tange ao direito financeiro e ao direito administrativo, dado que os assuntos pertencentes a um não colidem com os assuntos inerentes ao outro, visto que ambos recebem da Constituição da República tratamento distinto204. 200 NIEBUHR, Joel de Menezes. Princípio da isonomia na licitação pública, p. 70. 201 FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo, p. 459. 202 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo, p. 269. 203 DALLARI, Abreu Adilson. Aspectos jurídicos da licitação. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 15. 204 DALLARI, Abreu Adilson. Aspectos jurídicos da licitação, p. 18. 73 Dallari afirma que para saber se a Licitação cabe no campo do direito administrativo necessário se faz fazer os seguintes questionamentos: para que serve a Licitação? qual o seu escopo? Tem-se, desta forma, a resposta aos referidos questionamentos, quais são: para a primeira pergunta, responde-se que a Licitação serve para selecionar pessoas para um possível, futuro e ocasional contrato com o poder público. Como resposta ao segundo questionamento, salienta-se que o procedimento licitatório visa angariar a melhor proposta para a Administração Pública, através de bens, de serviços, realização de obras etc., prestados por terceiros205. Dallari afirma que a Licitação não causa despesas para a Administração, visto que é um procedimento preliminar a um contrato, e este é que vai acarretar um comprometimento orçamentário. Do contrato, resultará uma movimentação econômica, financeira, no entanto, a Licitação se resolve com a escolha de alguém com quem a Administração pretende contratar206. A Licitação para Dallari, nunca foi objeto de direito financeiro, porém, essa pseudo controvérsia permaneceu por muito tempo somente para que se pudesse sustentar que as Normas federais sobre licitações eram de prática obrigatória dos Estados e Municípios, dado que a Constituição anterior não dispunha de uma previsão específica da edição de Normas gerais de Licitação, como existe no texto constitucional em vigor207. Com o texto constitucional vigente, conseguiu-se pôr termo a idéia de que a Licitação seria objeto de direito financeiro, pois a Constituição de 1988, no seu artigo 24, I, explicita que compete à União emitir Normas de direito financeiro. No artigo 22, XXVII, está inserido texto que diz que compete à União expedir Normas gerais de Licitação. Desta forma, percebese evidenciado que a Licitação não pertence ao direito financeiro, do contrário, não necessitaria haver uma Norma específica, e a Licitação estaria inserida na Norma de direito financeiro. Licitação, portanto, é matéria específica de direito administrativo208. No mesmo diapasão, Carvalho Filho afirma que a Licitação possui natureza de direito administrativo, porque, como registra Entrena Cuesta, o procedimento constitui um “conjunto 205 DALLARI, Abreu Adilson. Aspectos jurídicos da licitação, p. 18. 206 DALLARI, Abreu Adilson. Aspectos jurídicos da licitação, p. 18. 207 DALLARI, Abreu Adilson. Aspectos jurídicos da licitação, p. 19. 208 DALLARI, Abreu Adilson. Aspectos jurídicos da licitação, p. 19. 74 ordenado de documentos e atuações que servem de antecedente e fundamento a uma decisão administrativa, assim como às providências necessárias para executá-la” 209. Desta forma, verifica-se notório o entendimento dos doutrinadores estudados no que tange à natureza da Licitação, dado que se aplica ao direito administrativo por estar Regrada pela Constituição e por tratar-se de procedimento administrativo. Como visto, a finalidade primordial da Licitação será sempre a aquisição de seu objeto nas melhores condições para a Administração, e, para tanto, esse objeto deverá ser favoravelmente definido no edital ou no convite, de modo que os licitantes possam atender de forma integral ao anseio do poder público. A Licitação sem a devida especificação do seu objeto é nula, porquanto, embaraça a exposição das propostas e compromete a boa fé do julgamento e o implemento do contrato subseqüente210. Martins dos Anjos explica que o objeto da Licitação vem a ser “o seu conteúdo para o qual a Administração pretende selecionar a proposta mais vantajosa, ou seja, é o bem da vida para o qual a Administração pretende estabelecer um negócio jurídico”. Assim, nenhuma Licitação será realizada sem a devida caracterização de seu objeto e o indicativo dos recursos orçamentários para seu pagamento, sob pena de nulidade do ato211. Para Bandeira de Mello, “são licitáveis unicamente objetos que possam ser fornecidos por mais de uma pessoa”, visto que a Licitação supõe concorrência entre quem oferta212. O objeto da Licitação apresenta duas vertentes, segundo Carvalho Filho. O objeto imediato consiste na seleção da proposta mais vantajosa ao interesse público. Na verdade, todas as atividades licitatórias acarretam essa escolha, feita entre vários proponentes213. A outra vertente a qual menciona o autor supra, traduz-se no objeto mediato, que consiste na obtenção de certa obra, serviço, compra, alienação, locação ou prestação de serviços públicos, a serem efetuados por terceiros através de contratações formais. A 209 ENTRENA CUESTA, Rafael. Curso de derecho administrativo. 2. ed. Madri, 1981. apud CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 176. 210 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 273. 211 MARTINS DOS ANJOS, Luís Henrique. Manual de direito administrativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 157. 212 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 483. 213 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 176 75 contratação consiste num objetivo perseguido pela Administração, porém, a Licitação pretende, primordialmente, obter a melhor proposta dos serviços que carece214. O objeto da Licitação além de ser a seleção da melhor proposta para a Administração, incute também em garantir a isonomia entre os ofertantes, ressaltando sempre os Princípios da Administração Pública, apresentados pelo artigo 37 da Constituição, quais sejam, o da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência215. No que diz respeito as modalidades de Licitação, o artigo 22 da Lei n. 8.666/93, menciona as cinco modalidades de Licitação. Há modalidades que se pode dizer comuns, as quais abrangem os incisos I a III, e as modalidades elencadas nos incisos IV e V, denominamse especiais. Essa diferenciação, afirma Justen Filho, decorre de que as modalidades elencadas nos incisos IV e V são designadas a fins específicos. Nas duas modalidades especiais, os procedimentos licitatórios são estruturados de acordo com as peculiaridades e especificidades do futuro contrato216. Bandeira de Mello salienta que as três primeiras modalidades designadas pelo artigo 22 da lei 8.666/93 são, “de longe, as mais importantes”, dado que a adoção de uma ou outra delas, está sujeita ao valor que a Administração provavelmente despenderá com a relação jurídica que as sucederá217. As modalidades de Licitação comuns são regulamentadas de modo bastante amplo, competindo à Administração instituir critérios compatíveis com a contratação que visa realizar. Essas modalidades possuem “procedimento mais flexível e abrangente”. Cada modalidade de Licitação comum possui um procedimento a ser relevado, por isso são distintas entre si. Concorrência, tomada de preços e convite apresentam estruturação diversa quanto às fases de divulgação, proposição e habilitação218. Para Dallari, a concorrência é: 214 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 180. 215 GELBCKE, Séfora Cristina Schubert. O papel dos princípios constitucionais na licitação pública, f. 65. 216 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 11. ed. São Paulo: Dialética, 2005, p. 195. 217 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 510. 218 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitação e contratos administrativos, p. 195. 76 A modalidade de procedimento licitatório efetuada mediante convocação genérica a um número indeterminado de pessoas, cuja idoneidade se verificará no curso do procedimento e que, em função da máxima amplitude do chamamento, exige grande publicidade219. Na concorrência, qualquer interessado tem a possibilidade de participar da Licitação, sem a necessidade de atendimento a requisitos exigidos na tomada de preços ou no convite, entretanto, essa amplitude na participação dos interessados, causa reflexos sobre a etapa da habilitação220. Bandeira de Mello diz ser a concorrência, a modalidade de Licitação genérica, que se destina a realizar transações de maior potencial econômico221, precedida de ampla publicidade, à qual podem valer-se quaisquer interessados que cumpram os requisitos estabelecidos222. Na fase da habilitação o procedimento se dá através do exame dos documentos prestados pelo interessado e exigidos no edital. Tais documentos revelarão se o interessado possui idoneidade para ter sua proposta apreciada. A fase de habilitação é comum a todas as modalidades de Licitação, porém, a concorrência diferencia-se pela maior participação dos interessados223. Deverá transcorrer na concorrência um prazo normalmente fixado de trinta dias no mínimo entre a sua publicidade e a data fixada para o recebimento das propostas224. Para licitações de médio vulto utiliza-se a modalidade tomada de preços que tem como finalidade tornar a Licitação mais concisa e rápida. Dallari assim a define: Tomada de preços é a modalidade de procedimento licitatório efetuado mediante convocação genérica e um grupo determinado de pessoas cuja idoneidade já foi devidamente comprovada, e que, em função da relativa 219 DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação, p. 81. 220 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitação e contratos administrativos, p. 195. 221 A lei n. 8.666 de 21 de junho de 1993, no seu artigo 23, inciso I, alínea c, e inciso II, alínea c, dispõe que, necessariamente deverá ser utilizada a modalidade de concorrência se o valor ultrapassar a quantia de R$ 650.000,00 para compra, serviço, alienação ou locação, e o valor de R$ 1.500.000,00 para obras de engenharia. 222 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 512. 223 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitação e contratos administrativos, p. 196. 224 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 513. 77 amplitude do chamamento, exige publicidade suficiente para atingir o grupo de pessoas ao qual se destina225. O prévio cadastramento corresponde à fase de habilitação. No cadastramento, a habilitação precede a Licitação. Ao invés de os requisitos de idoneidade e de capacitação serem analisados no decorrer da licitação e com efeitos para o caso concreto, são verificados antecipadamente, e com efeitos gerais. Independentemente de uma Licitação específica, na tomada de preços a Administração verifica se estão presentes os pressupostos de idoneidade necessários para que uma pessoa firme contrato com ela226. Quando se inicia o procedimento licitatório da tomada de preços, a Administração não precisa promover uma fase de habilitação específica, visto que já possui os interessados habilitados cadastrados, e, portanto, a Licitação torna-se mais sumária e rápida, em razão de um dos procedimentos correspondentes à Licitação, já ter sido efetivado anteriormente. Havendo interessados não cadastrados, estes deverão preencher os pressupostos essenciais à participação até três dias antes da data da apresentação dos envelopes227. Quanto à modalidade Convite, far-se-á neste tópico apenas menção ao que vem a ser, visto que por ser objeto deste estudo, terá maior abrangência no item subseqüente que tratará especificamente da modalidade mencionada. Dallari assim o define: Convite é a modalidade de procedimento licitatório efetuada mediante convocação específica a pessoas determinadas, cuja idoneidade é presumida, e que, em função da estreiteza do chamamento, exige um mínimo de publicidade indispensável para a observância ao Princípio da isonomia228. O Convite, conforme explanado por Dallari é o chamamento dirigido a eventuais contratantes individualizadamente, que foram escolhidos pela Administração Pública em razão de sua considerada idoneidade e cujas propostas serão feitas através de uma simples carta-convite229. 225 DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação, p. 81. 226 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitação e contratos administrativos, p. 196. 227 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitação e contratos administrativos, p. 196. 228 DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação, p. 81. 229 DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação, p. 81. 78 Em relação às modalidades especiais, de acordo com Justen Filho a lei não dispõe acerca do procedimento do concurso e do leilão, ela apenas prevê genericamente as Regras que dispõem sobre a concorrência. Porém, isso não quer dizer que a Administração Pública deva seguir para o concurso e o leilão, o mesmo procedimento adotado pela concorrência, tampouco estaria a Administração Pública possibilitada de adotar o procedimento que melhor lhe conviesse230. Para solucionar este impasse, deve a Administração adequar as Regras legais à peculiaridade de cada uma das modalidades especiais, quais sejam, o leilão e o concurso, para tanto, deve ser observada cada fase de desdobramento do procedimento licitatório das modalidades supra, exaltando sempre a seleção da melhor proposta para a Administração e respeitando os Princípios fundamentais231. São duas as modalidades de Licitação especiais, o concurso e o leilão. O primeiro é definido por Bandeira de Mello da seguinte forma: Concurso é uma disputa entre quaisquer interessados que possuam a qualificação exigida, para a escolha de trabalho técnico ou artístico, com a instituição de prêmio ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial232. Existem distinções marcantes entre as modalidades comuns de licitação e o concurso, visto que nas modalidades comuns o cumprimento da prestação por parte de terceiro resolvese depois da Licitação. Após a proposta feita pelos interessados, o vencedor será contratado para realizar a prestação a que se propôs. No concurso, apresentar o trabalho artístico ou técnico já pronto. Não existe seleção entre propostas para futuro cumprimento, pois os interessados apresentam seu trabalho e o submetem a exame da Administração233. O leilão, a segunda modalidade de Licitação especial mencionada anteriormente, é definida por Martins dos Anjos da seguinte forma: Leilão é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para venda a quem oferecer o maior lance, igual ou superior ao valor da avaliação, de 230 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 201. 231 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 201. 232 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 515. 233 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 202. 79 bens móveis inservíveis para a Administração ou de produtos legalmente apreendidos ou penhorados, ou para a alienação de bens imóveis da Administração Pública, cuja aquisição haja derivado de procedimentos judiciais ou de dação em pagamento234. No leilão os interessados apresentam-se em data determinada para o ato, onde fazem verbalmente suas propostas, ou seja, a Regra desta modalidade de Licitação é a inexistência de segredo quanto ao teor da proposta. Os proponentes ficam vinculados por sua proposta até que outra, de maior monta, seja feita. Após ter-se explanado a respeito das modalidades de Licitação, iniciar-se-á no item a seguir, um estudo mais completo acerca da modalidade Convite. 3.3 O CONVITE Por ser um dos objetos desta pesquisa, verifica-se imprescindível estudar a modalidade Convite de forma mais profunda em relação às outras já mencionadas, visto que se pretende demonstrar a aplicação (ou não) do Princípio Constitucional da Impessoalidade ao mesmo. O convite, modalidade de Licitação de que trata o artigo 22, da Lei n. 8.666 de 21 de junho de 1993, é a modalidade realizada para negócios de pequeno vulto, ou seja, no que tange às obras e serviços de engenharia, a contratação poderá ser de até R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais), e em se tratando de compras e serviços, até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais). Consiste em um procedimento mais simplificado, para o qual serão convidadas no mínimo três empresas, cadastradas ou não, caracterizando-se pela agilidade concernente a ela, em busca da eficiência do serviço público235. Assim dispõe a Lei n. 8.666/93 a respeito do Convite: Art. 22 (...) § 3º. Convite é a modalidade de licitação entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu 234 MARTINS DOS ANJOS, Luís Henrique. Manual de direito administrativo, p. 166. 235 GELBCKE, Séfora Cristina Schubert. O papel dos princípios constitucionais na licitação pública, f. 68. 80 interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas. Para Bandeira de Mello, o Convite é a modalidade licitatória utilizada diante de licitações que envolverão valores de pequena monta, na qual a Administração Pública solicita a participação de pelo menos três pessoas do ramo pertinente ao objeto desejado, que sejam cadastradas ou não, e afixa em local apropriado a cópia do instrumento de convocação. Havendo manifestação de outros cadastrados do ramo até vinte e quatro horas antes da apresentação das propostas, a unidade administrativa deverá estender o convite aos manifestantes236. No que tange ao Convite, Dallari, em sentido um pouco distinto de Bandeira de Mello, assim o define: Convite é a modalidade de procedimento licitatório efetuada mediante convocação específica a pessoas determinadas, cuja idoneidade é presumida, e que, em função da estreiteza do chamamento, exige um mínimo de publicidade indispensável para a observância ao Princípio da isonomia237. Dallari afirma ainda que, o Convite é a convocação dirigida a eventuais contratantes individualizadamente, os quais foram escolhidos pela Administração em razão de sua considerada idoneidade e cujas propostas serão feitas através de uma simples carta-convite, cujo modelo-padrão será afixado em local visível, juntamente com a relação dos convidados238. O Convite é a modalidade licitatória que comporta menos formalismo, visto que se destina a contratações de pequena monta, conforme artigo 23, I, “a” e II, “a”. Não há o uso do edital nesta modalidade, dado que o instrumento convocatório chama-se carta-convite, e é nela que são impostas as Regras da Licitação. As cartas-convite são enviadas a três interessados do ramo no mínimo, os quais são livremente escolhidos pelo administrador, dentre empresas cadastradas ou não239. 236 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 514. 237 DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação, p. 81. 238 DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação, p. 82. 239 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 199. 81 O formalismo no Convite é sutil, não só é bastante mitigada a requisição de documentos para a habilitação, como também basta o prazo máximo de cinco dias entre o envio da carta-convite e o recebimento das propostas ou a realização do evento. Cabe destacar a afirmação de Carvalho Filho quando enfatiza: O modus procedendi do Convite, sem a menor dúvida, rende maior ensejo a atos de improbidade de alguns maus administradores. Por isso, alguns órgãos têm exercido maior controle sobre essa modalidade, quando não a substituem pela tomada de preços, na qual a publicidade é mais ampla e menos dirigida240(...). Justen Filho entende que o Convite é o procedimento administrativo que exige menos burocratização. Nele, a Administração Pública tem a faculdade de escolher eventuais interessados em participar do certame sem o requisito de estarem previamente cadastrados. Entretanto, admite-se a participação de quaisquer outros interessados, desde que manifestem seu interesse até vinte e quatro horas antes da apresentação das propostas e que estejam cadastrados. Para Justen Filho, “essa disciplina propicia dúvidas e exige algum aprofundamento”241. No mesmo diapasão, Meirelles estabelece que o Convite seja a modalidade de Licitação mais simplificada, que visa contratações de pequeno valor e que consiste na solicitação escrita a pelo menos três interessados do ramo pertinente, cadastrados ou não, a fim de que apresentem suas propostas no prazo mínimo de cinco dias. O Convite não exige a publicação, dado que é feito diretamente aos indicados pela Administração por meio de cartaconvite. A lei, porém, exige que seja a cópia do instrumento convocatório afixada em local apropriado, para que, havendo mais interessados em participar da Licitação, desde que cadastrados, possam manifestar seu interesse até vinte e quatro horas antes da apresentação das propostas242. Di Pietro ratifica o entendimento supra ao mencionar que o Convite é a modalidade licitatória entre, no mínimo, três interessados do ramo pertinente, que sejam ou não cadastrados, os quais serão convidados e escolhidos pela Administração Pública. Podem participar da Licitação também, aqueles que, estando cadastrados na correspondente 240 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 199. 241 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 198. 242 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 315. 82 especialidade manifestarem seu interesse com antecedência de vinte e quatro horas da apresentação das propostas243. Di Pietro salienta ainda que a única modalidade em que a lei não exige publicação é o Convite, visto que a convocação é feita cinco dias antes da apresentação das propostas através da carta-convite. Com a lei 8.666/93 permite-se que participem do certame outros interessados, desde que cadastrados no ramo pertinente e que manifestem seu interesse com antecedência de vinte e quatro horas da apresentação das propostas. Referida medida colabora para aumentar o número de licitantes, entretanto, torna mais complexo um procedimento que tem como característica a simplicidade, pelo fato de ter por objeto contratos de pequeno valor. Para contribuir com a participação de outros interessados, o artigo 22, §3º dispõe que deve constar em lugar apropriado a cópia do instrumento convocatório244. No que diz respeito à discricionariedade na seleção dos convidados, tem-se que a Administração Pública, na modalidade Convite, possui a faculdade de escolha dos destinatários que participarão do certame. Entretanto, este poder deve ser praticado com cautela diante dos riscos de ofensa aos Princípios da Administração Pública, tais como da moralidade, isonomia, impessoalidade. Se a Administração fizer escolhas ou exclusões de determinados licitantes por prioridades pessoais, estará caracterizado desvio de finalidade e o ato deverá ser anulado245. Como anteriormente explanado por Carvalho Filho, o procedimento da modalidade Convite, “sem a menor dúvida”, permite de forma mais facilitada à propensão à improbidade administrativa por parte de maus administradores246. A lei não estabelece um limite máximo de convidados, apenas um limite mínimo, qual seja, o de três interessados. Existindo um número considerável de possíveis interessados, todos eles precisarão ser convidados pela Administração para participar do certame. A lei 243 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 379. 244 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 379. 245 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 198. 246 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 198. 83 faculta ao administrador, escolher e convidar pessoas cadastradas ou não, e o fato de não serem cadastradas aponta problemas247. O primeiro problema encontra-se na ausência de cadastramento espontâneo por parte do convidado, visto que por este fato, presume-se a falta de interesse do sujeito em participar de licitações. O segundo problema evidencia-se no fato de que não havendo cadastramento, não existem informações para julgar sequer a capacidade jurídica do indivíduo para ser contratado. O cadastramento possibilita à Administração Pública, verificar a existência ou não de preceitos básicos de idoneidade necessários para possíveis contratações248. Ao remeter o convite ao interessado não cadastrado, a unidade administrativa não necessita fazer constar na correspondência as causas que a levaram a convidá-lo, entretanto, tais motivos deverão estar registrados nos autos do procedimento administrativo da Licitação, pois a falta de motivação da escolha de um sujeito não cadastrado para receber o convite permite impugnação. Qualquer um dos participantes cadastrados pode contrariar a decisão da Administração, dado que a ausência de motivação presumirá desvio de finalidade249. A Lei n. 8.666/93 disciplina o prazo para extensão do convite aos não cadastrados, isto é, o prazo de vinte e quatro horas destinado aos não convidados cadastrados para que ofereçam sua proposta, limita-se a verificar a idoneidade do sujeito para que participe do certame. Assim, a Administração realiza uma seleção prévia dos eventuais licitantes, onde verifica a existência de condições ou não para participar da Licitação. O interessado que não foi convidado, deverá ter suas condições examinadas antes de adentrar ao certame250. Em razão da escassez do tempo, não é necessário nenhum ato formal por parte da Administração que estenda o convite aos outros interessados, porém, haverá ato explícito quando o interessado não suprir os requisitos exigidos pela Administração necessários à participação do procedimento251. É defeso ao interessado apresentar sua proposta antes de solicitar a extensão do convite, visto que, agindo desta forma, não poderá simplesmente apresentá-la, mesmo que 247 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 199. 248 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 199. 249 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 199. 250 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 199. 251 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 199. 84 esteja cadastrado, sob pena de alterar-se a sistemática do Convite e transformá-lo numa forma de tomada de preços (onde todos os cadastrados poderiam participar sem qualquer restrição)252. Não poderá o terceiro não convidado, porém cadastrado, ser impedido de participar do certame por ter tido desempenho não satisfatório na execução de contrato anterior. Tendo o sujeito apresentado mau desempenho na execução de um contrato, deverá ser aplicada a ele a sanção cabível e, se for o caso, poderá ser excluído do cadastro, em razão da falta de requisitos necessários à participação de Licitações. Do contrário, presumem-se aptos e habilitados para licitar todos os indivíduos devidamente cadastrados. É vedada a discriminação de sujeito cadastrado, desde que manifeste seu interesse dentro do prazo previsto para participar da Licitação253. Carvalho Filho salienta que existem duas Regras importantes a serem relevadas. Uma delas é em razão do desinteresse dos convidados ou à limitação do mercado. Diante disto, pode acontecer de a Administração não conseguir reunir o número mínimo de três convidados exigidos para esta modalidade de Licitação. Caso isto ocorra, reputa-se válido celebrar o confronto entre apenas duas propostas, ou, tendo sido apresentada apenas uma, celebrar diretamente o contrato. Entretanto, para validar este ato, a Administração deverá justificar detalhadamente os motivos e o fato que a levaram a proceder de tal forma, do contrário, o convite terá que ser repetido254. De acordo com o §6º do artigo 22 da Lei n. 8.666/93, se existir na praça mais de três eventuais interessados, a cada novo Convite realizado para objeto idêntico ou assemelhado, o Convite é obrigatório a mais um interessado no mínimo, enquanto houverem interessados cadastrados não convidados nas últimas licitações. Tal dispositivo procurou impedir o favorecimento de somente determinadas empresas e possibilitar que outras, estando cadastradas, participem255. Justen Filho discorre que não constitui causa de invalidação do procedimento licitatório a inexistência de três convidados no mínimo. Porém, deverá haver justificação 252 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 199. 253 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 200. 254 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 199. 255 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p. 199. 85 expressa da Administração que justifique o motivo da ocorrência. A referência ao Convite exposta pelo artigo 48, §3º, atribui o raciocínio de que a Licitação deverá prosseguir normalmente quando existir ao menos “uma proposta válida e formalmente aceitável” 256. Como visto num momento anterior, tem o Princípio da Impessoalidade o escopo de garantir a imparcialidade da Administração Pública no que concerne aos seus atos e ações perante os administrados, bem como alcançar a finalidade pública que é o bem comum. Tal Princípio visa garantir a probidade administrativa através dos preceitos que institui os quais devem ser refletidos pelos administradores e agentes públicos no decorrer de seus atos257. A Licitação na modalidade Convite, como também já se pôde verificar anteriormente, tem como finalidade a agilidade e a simplicidade do processo licitatório. Tem como característica acelerar e dinamizar o processo de Licitação, em razão da necessidade de resposta rápida e desburocratizada por parte da Administração Pública no que tange à eventuais contratações com terceiros258. De acordo com Justen Filho, o convite é a modalidade de Licitação mais normatizada por Princípios, visto que possui como características a celeridade e a simplicidade. Verifica-se imprescindível a probidade para a lisura do certame. Afirma ainda que o Convite gera dúvidas e por este motivo, deve ser elaborado com cautela259. De fato, não existe modalidade de Licitação isenta à prática de atos de improbidade administrativa260, visto que a improbidade administrativa é vício que historicamente desgasta a Administração Pública no Brasil. A Licitação Pública visa dificultar a realização de atos de 256 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 200. 257 BARBI, Lety Maria. A transparência da administração pública brasileira. 1991. 163 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Direito, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1991, f. 52. 258 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro, p. 315. 259 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 198. 260 Cf. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 228, “não é fácil estabelecer distinção entre moralidade administrativa e probidade administrativa. A rigor, pode-se dizer que são expressões que significam a mesma coisa, tendo em vista que ambas se relacionam com a idéia de honestidade na Administração Pública. Quando se exige probidade ou moralidade administrativa, isso significa que não basta a legalidade formal, restrita, da atuação administrativa, com observância da lei; é preciso também a observância de Princípios éticos, de lealdade, de boa-fé, de Regras que assegurem a boa administração e a disciplina interna na Administração Pública”. 86 improbidade administrativa, pois força o administrador público a agir de acordo com o seu procedimento antes de contratar261. Por ter característica de celeridade e simplicidade conforme visto anteriormente, o convite permite maior utilização do poder discricionário por parte do administrador público. Essa discricionariedade causa inevitavelmente um aumento nos casos de improbidade. No que concerne ao poder discricionário, Di Pietro Afirma que pode ocorrer desvio de poder decorrente de uso do poder discricionário para atingir fim distinto daquele que a lei autoriza262. O legislador ao estabelecer a lei, inseriu valores de pequeno vulto para o Convite, visto que se preocupou com o possível desvio de poder a ser realizado através desta modalidade de Licitação. Verifica-se que os casos de Improbidade Administrativa na Licitação Pública não se resumem unicamente a infrações às Regras, às leis. A legalidade263 dos atos Normalmente é respeitada na Administração, porém, em contrapartida, os Princípios basilares da boa Administração são freqüentemente feridos. Por serem os Princípios interpretativos, intrínsecos e não delineados como as leis, muitas vezes eles acabam não sendo obedecidos264. A inobservância dos Princípios da boa Administração, especialmente no que tange à Licitação, gera a prática de lesão aos administrados, dado que esta prática constitui violação tão grave quanto à violação às leis, além disso, no caso de descumprimento dos Princípios, haverá simultaneamente o descumprimento das leis, visto que as leis são ordenamentos gerados por meio dos Princípios265. De acordo com Wahlbrinck, se analisada friamente, a modalidade de Licitação do Convite “possui na sua essência um condição particular de afronta aos Princípios básicos da boa Administração”. Porém, esta condição é acolhida pela legislação, levando-se em conta 261 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa. Disponível em: <http://ensino.univates.br/~direito/artigo52.pdf>. Acesso em: 26 abr. 2008, p. 3. 262 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 228. 263 A legalidade de que se trata é em referência à observância do Princípio da legalidade o qual versa que o administrador público só poderá agir de acordo com a lei, conforme observado em item anterior. 264 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa, p. 3. 265 CRETELLA JÚNIOR, José. Das licitações públicas. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense. 1993, p. 87. 87 que o legislador assim entende e prevê - o ato de convidar -, observando desta forma o Princípio da legalidade em detrimento de outros Princípios da Administração Pública266. A Licitação na modalidade Convite permite que interessados não convidados participem do procedimento licitatório como verificado em um momento anterior, entretanto, apesar de verdadeira, esta afirmação é pouco usual. Para clarear esta afirmativa, interessante fazer uma analogia com uma situação bastante comum: dificilmente alguém participa de um evento onde existem pessoas convidadas, sem ter sido convidado também. Este fato acaba criando certo constrangimento ao participante não convidado e, em conseqüência disto, ele não participará267. Menciona-se agora, outro fator importante a ser relevado: não sendo convidado para participar do evento, geralmente o sujeito não toma conhecimento da concretização do mesmo. Apesar de ser o Convite afixado em local apropriado no quadro de avisos do órgão a qual o promove, não se constata eficaz este ato, pela carência de divulgação268. Percebe-se nítido que uma das características que mais afronta aos Princípios da boa administração, em especial à Impessoalidade, vem lavrada na sua própria nomenclatura “Convite”. O participante é convidado a participar do certame, e a Administração Pública possui a discricionariedade para a escolha destes participantes. Esta possibilidade da Administração resulta na confrontação direta ao Princípio da Impessoalidade, pois como ensina Bandeira de Mello: “todos são iguais perante a Lei” (art. 5º, caput), a fortiori teriam de sê-lo perante a administração”269. Para que impere o interesse público, a discricionariedade exercida pelo administrador, não pode ser eivada de vícios, do contrário, comprometeria a finalidade da Administração Pública. No convite, o administrador, utilizando de seu poder discricionário, escolhe quem vai participar do certame, porém, tal escolha deverá ser objetiva, impessoal e transparente: 266 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa, p. 4. 267 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa, p. 4. 268 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa, p. 4. 269 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 104. 88 A faculdade de escolha pela Administração dos destinatários do convite deve ser exercida com cautela diante dos riscos de ofensa à moralidade e à isonomia. Se a Administração escolher ou excluir determinados licitantes por preferências meramente subjetivas, será caracterizado desvio de finalidade e o ato terá de ser invalidado. A seleção prévia dos participantes faz-se no interesse da Administração para consecução do interesse público270. Entretanto, no que concerne à jurisprudência, conclui-se que a finalidade administrativa freqüentemente é posta em risco. Verifica-se que o Convite é meio simples de burlar os Princípios inseridos na Constituição em decisão declarada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina: ADMINISTRATIVO - LICITAÇÃO PÚBLICA - PROCESSO LICITATÓRIO PARA CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE ADVOCACIA - EVIDÊNCIAS DE FAVORECIMENTO DE ALGUNS LICITANTES EM DETRIMENTO DOS DEMAIS - QUEBRA DOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E DA IMPESSOALIDADE - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - LIMINAR SUSPENDENDO O CONTRATO271. Ainda, em outra decisão do mesmo tribunal: AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LICITAÇÃO. IRREGULARIDADES COMPROVADAS. CONDUTA DO ADMINISTRADOR ATENTATÓRIA AOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE E DA LEGALIDADE. AUSÊNCIA, TODAVIA, DE LESÃO AOS COFRES PÚBLICOS. CIRCUNSTÂNCIA QUE TEM DIRETA INFLUÊNCIA NA FIXAÇÃO DAS PENALIDADES. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. PROVIMENTO PARCIAL272. AÇÃO CIVIL PUBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRA TIVA. LICITAÇÃO INOBSERVÂNCIA DA LEI 8.666/93. I - Pacifica a jurisprudência de ser objeto da ação civil pública a prática de ato de improbidade administrativa segundo a melhor ratio legis. Possível também a cumulação de pedidos de natureza condenatória, declaratória e constitutiva, porque previsto na Lei n.8 429/92. II ? "O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa do patrimônio público " Verbete n° 329 da súmula de jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça III - Licitações realizadas sem a observância da Lei 8.666/93. Atos administrativos que eivados pelo desleixo com o trato do dinheiro público, afrontam Princípios basilares da Administração e causam prejuízos à 270 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, p. 198. 271 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Agravo de Instrumento n. 2005.020853-9, da 2º Vara Cível do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Indaial, SC, 27 de setembro de 2005. 272 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Apelação Cível n. 2003.014070-0, da Vara única do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Santa Terezinha, SC, 27 de maio de 2004. 89 Municipalidade. Punição dos réus concordante com os preceitos da Lei 8429/93, IV. O aspecto fático do convite a outras empresas para a participação do certame demonstra a existência de múltiplos fornecedores de peças para o maquinário da Municipalidade Ademais, os procedimentos licitatórios devem ter caráter universal e aberto, possibilitando a participação de todos aqueles em condições de fornecer o produto. V - As irregularidades apontadas impossibilitaram a seleção transparente da melhor proposta, debilitando o certame. Prejuízo à Municipalidade evidenciado Aplicação ao caso do disposto no inciso VIII do art. 10 da Lei 8.429/92273. Como se verificou nas jurisprudências supramencionadas é comum a prática de danos ao erário público através da Licitação na modalidade Convite, na qual os Princípios da boa Administração são afrontados com clareza, causando assim, sanções aos que cometeram tal ato e anulando o processo licitatório. A lei que dispõe sobre o Convite, exige que sejam escolhidos e convidados pelo menos três empresas do ramo do objeto a que a Licitação se propõe, assim, esta exigência pode se tornar um obstáculo para a Administração, visto que as empresas convidadas podem convencionar entre si com a intenção de burlar a finalidade pública. Podem as empresas favorecerem-se mutuamente sem que o administrador público possa fazer algo274. Com relação à discricionariedade do administrador em fazer o convite a determinadas pessoas, como verificado nas jurisprudências supra, percebe-se comum a conduta do administrador com relação a quem será convidado a participar do processo da Licitação. Como visto anteriormente, será convidado quem é conhecido e possui direta ou indiretamente alguma ligação ou afinidade com o administrador público. Porém, o Convite possibilita aos não convidados, que participem do certame se demonstrarem interesse vinte e quatro horas antes da abertura das propostas. Entretanto, verifica-se nesta afirmativa, outra questão que merece ser refletida, qual seja, a publicidade do Convite. Sobre a publicidade adverte Moraes: A Administração jamais maneja interesses, poderes ou direitos pessoais seus, surge o dever da absoluta transparência. “Todo o poder emana do povo e em seu nome será exercido” (CF, art. 1º, §1º). É óbvio, então, que o povo, titular 273 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Apelação com revisão n. 3031845600, 7º Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Guararapes, SP, 25 de fevereiro de 2008. 274 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa, p. 5. 90 do poder, tem direito e conhecer tudo o que concerne à Administração, de controlar passo a passo o exercício do poder275. Verifica-se que a publicidade constitui dever da Administração e direito fundamental dos administrados, visto que é essencial para todo e qualquer ato cometido pela Administração Pública. Contudo, corrobora-se nesse aspecto a carência do Convite em suprir o dever constitucional de publicidade por parte da Administração, pois a única forma de divulgação exigida é a afixação de cópia da carta-convite em local apropriado276. A publicidade visa a transparência da Administração Pública, já que tem como escopo levar aos administrados a informação de todos os atos praticados pela Administração. Di Pietro assevera que a publicidade é maior conforme a competição propiciada pela modalidade de Licitação, ela é a mais ampla possível na modalidade da concorrência, onde há interesse da Administração em atrair maior número de participantes, “e se reduz ao mínimo no Convite, em que o valor do contrato dispensa maior divulgação” 277. Entretanto, a falta de divulgação na modalidade Convite como expôs Di Pietro, tem sido ensejo de grande desvio de finalidade pública por parte dos administradores, que usam desta prerrogativa para agirem de má-fé ocasionando prejuízos à coletividade. A lei não estabelece o que vem a ser o local apropriado, porém, subentende-se que este deve conferir aos administrados a maior publicidade possível ao Convite, e facilitar o acesso aos interessados278. Por não haver na lei a delimitação do que vem a ser o local apropriado exigido pela própria lei, muitas vezes a publicação ocorre de forma precária, dificultando assim, o acesso aos demais eventuais interessados. A publicidade que tem por intento a total transparência dos atos administrativos, no Convite acaba sendo utilizada em desfavor da comunidade, tendo em vista interesses subjetivos279. 275 SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e contrato administrativo. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1995 apud MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 808. 276 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa, p. 5. 277 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo, p. 356. 278 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa, p. 6. 279 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa, p. 8. 91 No Convite, conforme entendimento de Figueiredo impera o interesse público, pois se torna desinteressante procedimento mais complexo e demorado, em razão da pequena dimensão do valor envolvido. “É a forma mais singela e coadunável com o futuro contrato”. Coadunando todas as afirmações explanadas anteriormente a respeito das fraudes no Convite, verifica-se que os Princípios Constitucionais exigidos pelo artigo 37 da Constituição estão sendo claramente afetados280. Wahlbrinck ensina que: Pode-se dizer que, de um lado, de acordo com a lei, o convite obriga a participação de mais de um concorrente, mais de uma serão as propostas obtidas, e conseqüentemente, maiores as chances de se alcançar um valor melhor para aquilo que está sendo licitado. De outro lado, se houver qualquer deslize na condução do processo, qualquer infração a lei ou Princípio, quer seja pela própria administração, quer seja pelos participantes, se alcançará um resultado pior do que se pudesse ter havido uma negociação direta entre a Administração e um terceiro particular. Não apenas o Convite, mas toda e qualquer modalidade de Licitação restará fracassada se não forem observados os Princípios da boa administração, porém, o Convite por ser mais simples, necessita que a observância a estes Princípios seja maior, para que possa alcançar o fim a que propõe, qual seja, o de conseguir a melhor proposta281. Resta evidente que, observadas as Regras que envolvem o procedimento licitatório do Convite, ter-se-á um processo administrativo em conformidade com a lei. Contudo, não se busca com as Regras de qualquer procedimento apenas um processo perfeito, mas sim buscase algo maior, ou seja, a proposta mais vantajosa, célere e eficaz, e esta só era obtida se os Princípios elencados no artigo 37 da Constituição, ressalte-se o Princípio da Impessoalidade, forem postos em prática no decorrer do processo282. Destarte, verifica-se que a Licitação na modalidade Convite de forma concreta, não alcança os fins a que se destina, pois, ainda que seja legal, fere diversos outros Princípios da Administração Pública. Como visto, tais Princípios são o baluarte da boa Administração e imprescindíveis para o alcance das aspirações coletivas. 280 FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo, p. 471. 281 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa, p. 10. 282 WAHLBRINCK, Marco Luciano. A modalidade de licitação pública do convite e a (im)probidade administrativa, p. 10. 92 É a Licitação na modalidade Convite, eivada de falhas, pois, conforme explanado anteriormente, não evita que o administrador utilize dela para fraudar e violar os Princípios fundamentais aos quais deve se ater a Administração Pública. É fácil agir de forma ímproba nestes casos; percebe-se que a discricionariedade do qual o Administrador é dotado é utilizada de forma a ferir diretamente o Princípio Constitucional da Impessoalidade no caso concreto, colocando em risco a integridade administrativa e fazendo com que se esvaia a essência do escopo da Administração, que é o bem comum. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Verificou-se no primeiro capítulo da presente pesquisa que os Princípios Constitucionais são dotados de Normatividade e postos no mais alto nível hierárquico Normativo, por serem imbuídos de valores que exprimem um deve ser. Manifestam-se como o mandamento basilar de um sistema, verdadeiro alicerce dele, aos quais todas as demais Normasdevem estar subordinadas a fim de manter a harmonia do Estado. Os Princípios Constitucionais concedem logicidade e racionalidade ao sistema, dandolhe sentido harmônico, funcionando como a base fundamental de todo o ordenamento jurídico. O sistema de Normasde um Estado não pode ir de encontro aos Princípios, pois estes consistem no tronco ou no pilar de sustentação do ordenamento e sua inobservância poderá acarretar a rachadura, a envergadura ou, quem sabe, a ruína de todo o sistema que neles está apoiado. Possuem os Princípios características distintas das Regras, as quais denotam sua natureza singular enquanto Normasconstitucionais. São dotados de três funções, quais sejam: fundamentadora, interpretativa e supletiva que fazem com que as garantias constitucionais sejam efetivadas. Em decorrência da Normatividade dos Princípios, três foram as fases que antecederam tal acontecimento. Na fase jusnaturalista os Princípios eram tidos apenas como fonte secundária de Direito existentes apenas para preencher supostas lacunas da lei; com a chegada do positivismo jurídico eles passaram a fazer parte dos Códigos como fonte Normativa, porém apenas subsidiária, visto que eram tidos como derivados da própria lei e não precursores dela; foi com o advento da fase pós-positivista que os Princípios passam a ser tratados como Direito, e como Norma jurídica. No que tange às Regras, verificou-se que tanto os Princípios como as Regras possuem o mesmo caráter Normativo, porém, apresentam formas Normativas diferentes. Os Princípios são precursores das Regras, ou seja, estas vêm depois, são submetidas à essência dos Princípios, a fim de que não venham a afrontá-los. A distinção entre as duas espécies Normativas deve se resumir ao seu modo de aplicação, pois havendo conflito entre Princípios, estes podem ser elementos de ponderação, de harmonização, pois eles contêm apenas declarações ou padrões que devem ser alcançados; já as Regras contêm definições Normativas definitivas, sendo insustentável a validade e aplicabilidade concomitante de Regras contraditórias. No segundo capítulo da pesquisa, tratou-se do Princípio Constitucional da Impessoalidade, que constitui preceito fundamental à boa administração e ao alcance da finalidade pública, que nada mais é que o bem comum. Verificou-se que em origem o Princípio da Impessoalidade estava embutido no conhecido Princípio da imparcialidade administrativa do direito inglês que, por influência do Princípio da imparcialidade judicial, objetivou a neutralidade do administrador. No ordenamento jurídico brasileiro ele está expressamente inserido no artigo 37 da Constituição da República. Possui o Princípio da Impessoalidade como objetivo essencial impedir fatores pessoais, subjetivos, visto que a Constituição pretende obstar atuações geradas por antipatias, simpatias, objetivos de vingança, represálias, nepotismo, favorecimentos diversos, muito comuns nas licitações. Busca a Constituição que predomine o objetivo de função, ou seja, a idéia de que os poderes conferidos visam ao interesse da coletividade, portanto, renegam favorecimentos de cunho pessoal em detrimento do todo. No que tange a situações que invocam interesses coletivos, a impessoalidade visa a ponderar equilibradamente todos os interesses envolvidos, para que não sejam editadas decisões provindas de preconceitos ou radicalismos de qualquer natureza. É Princípio de importância imensurável no que tange ao alcance da finalidade administrativa, visto que permite igualdade no trato com os administrados e desta forma procura impedir favorecimentos ou benefícios a pessoas determinadas, em razão de motivos ou razões subjetivas do administrador. No terceiro e último capítulo procurou-se enfatizar a Licitação Pública, para posteriormente entender a modalidade Convite. Verificou-se que a Licitação é o procedimento administrativo por meio do qual os entes da Administração Pública selecionam a melhor proposta entre as oferecidas pelos inúmeros interessados, com dois objetivos, quais sejam, a celebração de contrato, e a obtenção de melhor trabalho técnico, artístico ou científico. Este procedimento visa buscar a melhor proposta para o interesse público, a proposta mais vantajosa e a que melhor se encaixa na necessidade da Administração, fazendo valer a eficiência e a isonomia. O Convite é uma modalidade de Licitação utilizada diante de licitações que envolvem valores de pequena monta, na qual a Administração Pública solicita a participação de, pelo menos, três pessoas do ramo pertinente ao objeto desejado, que sejam cadastradas ou não, e afixa em local apropriado a cópia do instrumento de convocação. Havendo manifestação de outros cadastrados do ramo até vinte e quatro horas antes da apresentação das propostas, a unidade administrativa deverá estender o convite aos manifestantes. É a modalidade mais simplificada e tem como objetivos a celeridade e a eficácia. Verificou-se, porém, que o Convite, ao invés de tornar o procedimento licitatório mais célere e eficaz, acaba sendo eivado de falhas que podem ser prejudiciais à Administração Pública de maneira gravosa. Nos casos concretos desta modalidade de Licitação, a prática de atos que ferem diretamente o Princípio Constitucional da Impessoalidade é corriqueira, visto que mesmo sendo suportado pela legislação, o Convite nos casos concretos, facilita e possibilita a violação de Princípios basilares da boa administração por parte dos maus administradores, que pretendem favorecer-se ou beneficiar determinadas pessoas por razões subjetivas. Apesar de não ferir o Princípio da legalidade, o Convite viola outros Princípios básicos da Administração Pública. Entretanto, quando se fala em probidade ou moralidade administrativa, isso significa que não basta a observância restrita à lei, é preciso também observar os Princípios éticos, de boa-fé que assegurem a boa Administração na busca do interesse público e, especialmente, no contexto deste trabalho, o Princípio da Impessoalidade. Desta forma, verificou-se que a hipótese considerada na introdução da presente pesquisa foi confirmada, pois no que tange à escolha e convite de pessoas para a prática do procedimento licitatório de forma concreta, o Princípio Constitucional da Impessoalidade está sendo violado, já que através do poder discricionário o administrador público tem a faculdade de escolher e convidar pessoas determinadas para tal ato, estando elas cadastradas ou não; Ainda, as características da Licitação na modalidade Convite facilitam a infração dos administradores ao Princípio da Impessoalidade e aos demais Princípios da Administração Pública, visto que promovem atos ímprobos em razão de sua simplicidade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, André Gustavo Corrêa de. A constitucionalização do direito: a constituição como locus da hermenêutica jurídica. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos Princípios jurídicos. 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