BOLETIM MÉDICO edição 1 – ano 1 – junho de 2014 prática clínica Como confirmar o diagnóstico da dengue As pesquisas de anticorpos e de antígenos se complementam e têm maior ou menor indicação conforme o tempo de infecção. Todo ano, no primeiro semestre, a cena se repete: o paciente chega ao serviço médico com sintomas clássicos, a história reforça a suspeita e o hemograma aponta a plaquetopenia. Diagnóstico clínico: dengue. Muitas vezes, porém, o indivíduo volta para casa com uma lista de cuidados, mas sem ter feito um exame para confirmar a hipótese, seja pela indisponibilidade de recursos, seja por não estar no momento ideal para a pesquisa de anticorpos, ainda o principal teste utilizado para essa finalidade. Por isso mesmo, o uso do NS1 não diminui a utilidade das sorologias tradicionais para a detecção de anticorpos contra o vírus da dengue. Os biomarcadores da classe IgM são flagrados de seis a sete dias após as manifestações clínicas terem começado, razão pela qual não se recomenda solicitar sua pesquisa antes desse período, pelo risco de obter resultados falso-negativos. Ademais, na reinfecção por outro sorotipo viral, a sensibilidade diagnóstica da IgM diminui em relação à observada na doença primária. Além da sorologia, porém, a confirmação diagnóstica da doença pode ser realizada pela pesquisa do antígeno NS1, uma glicoproteína altamente conservada, que se encontra em altas concentrações no soro dos pacientes com dengue. É possível detectar esse marcador logo após os sintomas terem surgido e, portanto, antes do aparecimento dos anticorpos específicos contra o agente infeccioso. Com isso, o diagnóstico laboratorial da infecção pode ser mais precoce. Contudo, a sensibilidade desse teste só é máxima até o terceiro dia depois do início do quadro sintomático, tornando-se decrescente a partir de então, com redução significativa do quinto dia em diante. Os anticorpos da classe IgG, por sua vez, são observados de sete a dez dias após o início do quadro clínico. Em geral, quando se colhe a amostra no sexto dia e a IgG já está presente, simultaneamente à IgM, suspeita-se de um segundo episódio de dengue. Por outro lado, a positividade isolada da IgG deve suscitar a hipótese de infecção pregressa e até mesmo a possibilidade de que a febre tenha outra etiologia. Na prática, portanto, a pesquisa de NS1 e as sorologias se complementam, tendo, cada qual, sua aplicabilidade ideal dependente do momento evolutivo da doença em que se encontra o paciente. Testes disponíveis no Weinmann Exame Momento ideal para coleta Antígeno NS1 (Elisa) Do primeiro ao terceiro dia após o início da febre Sorologias Classes IgG e IgM Do sexto ao décimo quarto dia após o início da febre Os resultados ficam prontos em até três dias úteis. Sensibilidade Especificidade 71% 100% IgM: 80% IgM: 90% IgG: 60% IgG: 90% fatos e números Um panorama da dengue no Brasil Conheça os aspectos epidemiológicos e os novos critérios de classificação clínica de casos, propostos pela OMS. Arbovírus do gênero Flavivírus e transmitido ao homem pela picada do mosquito Aedes aegypti, o vírus da dengue é responsável por uma doença infecciosa de rápida disseminação, com incidência que aumentou cerca de 30 vezes, nos últimos 50 anos, no mundo. Segundo a Organização Mundial da Saúde, estima-se que ocorram 50 milhões de casos por ano e cerca de 2,5 bilhões de pessoas vivem em países endêmicos para a dengue. No Brasil, a doença também configura um grave problema de saúde pública e, desde 2010, os quatro sorotipos do vírus – DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4 – circulam em nosso território. No ano passado, houve um surto de dengue em nível nacional, mas que afetou especialmente a Região Centro-Oeste, com registro de cerca de 1,5 milhão de casos. Municípios infestados por Aedes aegypti nos últimos 12 meses – Rio Grande do Sul, 16 de maio de 2014 No Rio Grande do Sul, os dados da Secretaria Estadual de Saúde apontaram 2.383 notificações em 2013, com 242 casos confirmados. Até a semana epidemiológica 19/2014, que compreende o período de 29/12/2013 a 10/5/2014, 481 casos suspeitos de dengue haviam sido notificados, dos quais 62 confirmados (18 importados e 44 autóctones). Entre os municípios infestados no Estado, os principais incluem Canoas, Esteio, Novo Hamburgo, São Leopoldo e Sapucaia do Sul. Mesmo com a aparente queda no número de casos em comparação a 2013, tanto no Rio Grande do Sul quanto no restante do País, é preciso ficar alerta para o diagnóstico acurado dos casos suspeitos. Fonte: SISFAD/RS Nova classificação da OMS Caso suspeito de dengue Pessoa residente em área com transmissão da doença ou com presença de A. aegypti ou, ainda, que tenha viajado para tais locais nos últimos 14 dias, com febre de dois a sete dias mais, pelo menos, dois dos seguintes sinais ou sintomas: • Náuseas e/ou vômitos • Exantema • Mialgias, artralgias • Cefaleia, dor retro-orbitária • Petéquias ou prova do laço positiva • Leucopenia Criança proveniente de área com transmissão de dengue, ou residente nesses locais, e que tenha quadro febril agudo, geralmente entre dois e sete dias, mas sem foco de infecção aparente, também pode ser considerada caso suspeito. Fases da doença A dengue é uma doença sistêmica e dinâmica, visto que pode se apresentar de forma assintomática ou com um espectro clínico amplo, com formas graves e não graves e com evolução e desfecho clínico imprevisíveis. O período de incubação varia de três a quinze dias, ficando, em média, entre cinco e seis dias. A transmissão ocorre durante o período de viremia, que se inicia um dia antes do aparecimento da febre e termina até o sexto dia da infecção. Após a incubação, a doença começa de modo repentino e é seguida por três fases – febril, crítica e de recuperação. Os pacientes desenvolvem abruptamente febre elevada, com duração de dois a sete dias e acompanhada por rubor facial, eritema cutâneo, dor generalizada no corpo, mialgia, artralgia e cefaleia. Na fase inicial, é difícil distinguir a dengue de outras moléstias febris. O início da fase crítica, que dura cerca de 24 a 48 horas, caracteriza-se pelo aumento da permeabilidade capilar, paralelamente à elevação dos níveis de hematócrito, que ocorre após a queda da temperatura para d38°C. Alguns pacientes podem se deteriorar e apresentar sinais de alarme ou mesmo evolução para a dengue grave. Se o indivíduo sobrevive à fase crítica, nas 48 a 72 horas seguintes, começa a reabsorção gradual do líquido presente no compartimento extravascular e clinicamente observa-se melhora do bem-estar geral e dos sintomas gastrointestinais, bem como retorno do apetite e estabilização da condição hemodinâmica. As diferentes características clínicas da dengue são utilizadas para a definição dos tipos de doença. Essa classificação foi revista pela Organização Mundial da Saúde (OMS), visto que a antiga apresentava várias limitações, entre elas a possibilidade de ser feita apenas no fim da infecção, sem ajudar o manejo clínico do paciente. O Brasil começou a adotar essa nova classificação desde janeiro de 2014, na qual os casos suspeitos são definidos como dengue, dengue com sinais de alarme e dengue grave. Caso suspeito de dengue com sinais de alarme Todo caso que, no período de defervescência da febre, apresente uma ou mais das seguintes manifestações: • Dor abdominal intensa e contínua ou dor à palpação do abdome • Vômitos persistentes • Acúmulo de líquidos (ascite e derrame pleural ou pericárdico) • Sangramento de mucosas • Letargia ou irritabilidade • Hipotensão postural (lipotimia) • Hepatomegalia >2 cm • Aumento progressivo do hematócrito Dias de doença Temperatura Eventos clínicos potenciais Alterações laboratoriais Sorologia e virologia Fases da doença Febril Crítica Recuperação Fonte: WHO. Dengue. Guidelines for diagnosis, treatment, prevention, and control. 2009. Adapted from Yip 1980. Confirmado ou descartado? Um caso confirmado de dengue é todo aquele que foi laboratorialmente acusado pelos diferentes métodos disponíveis, entre eles a sorologia IgM e o antígeno NS1. A dengue grave, preferencialmente, deve ser ratificada por exames laboratoriais. Se isso não for possível, recomenda-se considerar a confirmação por vínculo epidemiológico com um caso positivo no laboratório. Descartam-se os casos em situações de teste negativo, de ausência de critério de vínculo clínico e epidemiológico, de diagnóstico laboratorial de outra entidade clínica e de compatibilidade da investigação clínica e epidemiológica com outras doenças. Caso suspeito de dengue grave Todo caso com um ou mais dos seguintes sintomas: • Extravasamento grave de plasma, levando a choque e acúmulo de líquidos, com insuficiência respiratória • Sangramento grave, segundo a avaliação do médico • Comprometimento grave de órgãos: fígado (AST ou ALT t1.000), sistema nervoso central (alteração da consciência), coração (miocardite) ou outros órgãos diagnóstico diferencial Diante de sintomas semelhantes, em que mais pensar? Dentre outras doenças febris, saiba como a Chikungunya, em particular, pode ser confundida com a dengue. Considerada uma doença emergente e transmitida também pelo Aedes aegypti, a febre causada pelo vírus Chikungunya pode ser confundida com a dengue por apresentar sintomas semelhantes, porém com curso mais arrastado. A enfermidade atinge igualmente ambos os sexos e todas as faixas etárias e, após um período de incubação de três a sete dias, há o desenvolvimento agudo de febre superior a 38,5°C, em geral acompanhada por artralgia, principalmente nos tornozelos, punhos e articulações da mão, e pela manhã, bem como por poliartrite lombar, cefaleia e erupção cutânea. Outros sintomas potenciais incluem estomatite, úlceras orais, hiperpigmentação, dermatite esfoliativa (em crianças), mialgias, fotofobia, dor retro-orbitária, vômitos, diarreia e síndrome meníngea. Na maioria dos casos, os sintomas desaparecem em uma a três semanas, mas pode haver reaparecimento das manifestações reumatológicas nos meses seguintes à doença aguda. Pacientes mais velhos ou com doença articular reumática e traumática são mais vulneráveis a desenvolver sintomas articulares crônicos. A mortalidade é rara. Além da dengue, o diagnóstico diferencial é feito com leptospirose, malária, meningite, artrite pós-infecção e infecção por outros vírus, como parvovírus, enterovírus e os da rubéola e do sarampo. Devem-se levar em conta aspectos epidemiológicos, como residir em regiões epidêmicas com transmissão notificada 15 dias antes do início dos sintomas ou, então, ter visitado tais locais. A confirmação depende de testes laboratoriais, ainda em fase de desenvolvimento no Brasil. Dengue versus febre de Chikungunya: compare o quadro clínico Características Dengue Chikungunya Febre Mialgias Artralgias Erupção cutânea Discrasia sanguínea Choque Leucopenia Linfopenia Neutropenia Trombocitopenia Fonte: OPAS/OMS. Febre de Chikungunya – Informações para profissionais de saúde, 2014. BOLETIM MÉDICO edição 1 – ano 1 – junho de 2014 Publicação trimestral do Weinmann Laboratório prática clínica Como confirmar o diagnóstico da dengue As pesquisas de anticorpos e de antígenos se complementam e têm maior ou menor indicação conforme o tempo de infecção. Todo ano, no primeiro semestre, a cena se repete: o paciente chega ao serviço médico com sintomas clássicos, a história reforça a suspeita e o hemograma aponta a plaquetopenia. Diagnóstico clínico: dengue. Muitas vezes, porém, o indivíduo volta para casa com uma lista de cuidados, mas sem ter feito um exame para confirmar a hipótese, seja pela indisponibilidade de recursos, seja por não estar no momento ideal para a pesquisa de anticorpos, ainda o principal exame utilizado para essa finalidade. Por isso mesmo, o uso do NS1 não diminui a utilidade das sorologias tradicionais para a detecção de anticorpos contra os vírus da dengue. Os biomarcadores da classe IgM são flagrados de seis a sete dias após as manifestações clínicas terem começado, razão pela qual não se recomenda solicitar sua pesquisa antes desse período, pelo risco de obter resultados falso-negativos. Além disso, na reinfecção por outro sorotipo viral, a sensibilidade diagnóstica da IgM diminui em relação à observada na doença primária. Além da sorologia, porém, a confirmação diagnóstica da doença pode ser feita pela pesquisa do antígeno NS1, uma glicoproteína altamente conservada que está presente em altas concentrações no soro dos pacientes com dengue. É possível detectar esse marcador logo após os sintomas terem surgido e, portanto, antes do aparecimento dos anticorpos específicos contra o agente infeccioso. Com isso, o diagnóstico laboratorial da infecção pode ser mais precoce. Contudo, a sensibilidade desse teste só é máxima até o terceiro dia depois do início do quadro sintomático, tornando-se decrescente a partir de então, com redução significativa do quinto dia em diante. Os anticorpos da classe IgG, por sua vez, são encontrados de sete a dez dias após o início do quadro clínico. Em geral, quando se colhe a amostra no sexto dia e a IgG já está presente, simultaneamente à IgM, suspeita-se de um segundo episódio da infecção. Por outro lado, a positividade isolada da IgG deve suscitar a hipótese de infecção pregressa e até mesmo a possibilidade de que a febre tenha outra etiologia. Na prática, portanto, a pesquisa de NS1 e as sorologias se complementam, tendo, cada qual, sua aplicabilidade ideal dependente do momento evolutivo da doença em que se encontra o paciente. Testes disponíveis no Weinmann Exame Momento ideal para coleta Antígeno NS1 (Elisa) Do primeiro ao terceiro dia após o início da febre Sorologias Classes IgG e IgM Do sexto ao décimo quarto dia após o início da febre Os resultados ficam prontos em até três dias úteis. Sensibilidade Especificidade 71% 100% IgM: 80% IgM: 90% IgG: 60% IgG: 90% • Responsável técnica: Dra. Kátia Zanotelli Fassina (CRM-RS 23.034) • Editora científica: Dra. Ana Carolina Silva Chuery • Editora executiva: Solange Arruda • Produção gráfica: Solange Mattenhauer Candido • Impressão: Flor de Acácia • Assessoria médica: [email protected]