1 Rua Dias Adorno, 367 – 6º andar – Santo Agostinho 30190-100 – BELO HORIZONTE – MG Telefone: 3330-9515/33308399 – e-mail: [email protected] PARECER TÉCNICO JURÍDICO Nº 12/2013 Objeto: Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde da Comarca de Poços de Caldas. Centro de Reabilitação em Álcool e Drogas. Unidade Privada. Registros Obrigatórios. Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Portaria MS nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Comunidade Terapêutica. Fiscalização. RDC ANVISA nº 50, de 21 de fevereiro de 2002. RDC ANVISA nº 29, de 30 de junho de 2011. Resolução Conjunta SEDS/SES SEDESE n° 150, de 21 de outubro de 2011.Resolução SES nº 3.206, de 04 de abril de 2012. Lei federal nº 12.868, de 15 de outubro de 2013. Resolução CFM nº 2.057, de 20 de setembro de 2013. 1. Relatório Cuida-se de consulta, elaborada pela Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde da Comarca de Poços de Caldas, cadastrada no Sistema de Registro Único (SRU), como Procedimento de Apoio a Atividade Fim – PAAF sob o nº0024.13.000879-0, em que solicita deste Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde (CAOSAUDE), informações acerca dos registros obrigatórios para “clínicas” que atendem 2 adolescentes dependentes químicos, a exemplo do Centro de Reabilitação em Álcool e Drogas – Clínica Oxford, bem como orientações para fins de fiscalização das Comunidades Terapêuticas. 2. Da Clínica Oxford – Centro de Reabilitação em Álcool e Drogas Em resumo, a consulta visa subsidiar a atuação da Curadoria nos autos do Inquérito Civil nº MPMG-0518.11.000072-7, instaurado para fins de investigar supostos maus tratos contra internos em determinado “Centro de Reabilitação em Álcool e Drogas”, denominado Clínica Oxford. À época, referida unidade contava com a presença de adolescentes, razão pela qual foi determinada sua fiscalização pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente para, dentre outros, averiguar quanto ao seu cadastramento nos registros daquele Órgão de Proteção. Referido Conselho Municipal, através do ofício nº 109/CMDCA/2012, informou que não havia concessão de registro para referida Unidade, por se tratar de entidade empresarial, conforme análise procedida em seu contrato social, razão pela qual sem atribuições (Conselho) para sua atuação, circunscrita às entidades governamentais e do terceiro setor (artigos 44, inciso I e artigo 53 ao 60 do CC/2002 e artigo 91 do ECA). Em consulta ao portal eletrônico dessa unidade (http://www.clinicaoxford.com.br/), verificou-se tratar-se do Grupo denominado Oxford, localizado no município de Poços de Caldas, de natureza privada, que tem como objetivo a recuperação de dependentes químicos (álcool e drogas), através de processo de desintoxicação física, reabilitação psíquica e reinserção social, sob a forma voluntária ou involuntária. São os seguintes perfis de pacientes por ela atendidos: a) Usuário de Álcool ou drogas, intoxicado ou em síndrome de abstinência necessitando de tratamento; b) Usuário de 3 Álcool ou drogas que possuam algum outro transtorno mental associado (comorbidades psiquiátrica) ou em crise (com intenções suicida ou de agressividade); Referida Unidade conta com equipe multiprofissional, com forma de atuação nos seguintes moldes: Unidade 1: Desintoxicação e Tratamento Primário; Unidade 2: Tratamento Especializado para Alcoólatras, Unidade 3: Tratamento Especializado para Adolescentes e Unidade 4: Comunidade Terapêutica. O fato de ser essa unidade de natureza privada não a isenta da fiscalização sanitária, sujeitando à fiscalização própria da Lei federal nº 8.080/90 e da Lei Estadual nº 13.317/99 (Código Estadual de Saúde). Ademais, os serviços de saúde (público ou privado) são considerados de relevância pública pela Constituição Federal. Nesse sentido, perfeitamente possível a requisição, pelo Ministério Público Estadual, junto à Secretaria Municipal de Saúde, de realização de visita técnica, para fins de constatação das adequações e desconformidades, como, exemplos, existência de projeto terapêutico individualizado, equipe de profissionais de saúde, perfis dos usuários, qualidade da prestação das ações de serviço assistenciais de saúde. Perfeitamente possível o recebimento de verbas públicas por essas entidades, mesmo que privadas, como exemplo, as decorrentes do programa estadual denominado “Cartão Aliança Pela Vida”. Trata-se de programa regulamentado através do Decreto nº 45.739/2011, cujo objetivo, nos termos do seu artigo 2º, é o da unificação dos critérios de concessão de auxílio financeiro, em caráter temporário, ao núcleo familiar que assuma as despesas de tratamento de usuário de álcool ou outras drogas, com vistas ao custeio das despesas da internação voluntária do usuário em entidade especializada e credenciada pela Subsecretaria de Políticas sobre Drogas SUPOD da Secretaria de Estado de Defesa Social – SEDS, bem como à complementação subsidiária para despesas conexas. Esse programa, conforme recentes informações da Coordenadoria Estadual de Saúde Mental da SES/MG encontra-se em fase de implantação e revisão, posto que houve a 4 transição da gestão dessa estratégia para a Subsecretaria de Políticas sobre Drogas, atualmente vinculada à Secretaria de Esporte e Juventude para a SES/MG. O papel do programa estadual “Aliança pela Vida” junto às Comunidades Terapêuticas é de suma importância. Esse programa financia permanência do paciente na Comunidade Terapêutica por até 03 (três) meses, podendo ser prorrogado por mais 03 (três) meses, mediante o cumprimento de requisitos com o intuito de viabilizar a necessária avaliação e monitoramento (a cada 45 dias) do usuário por uma equipe de saúde de referência , a saber: a) Adesão formal do município; b) Organização de um fluxo entre o serviço local de saúde e as comunidades terapêuticas, conforme previsão legal. De modo geral, conforme informações da SES/MG, não há regulamentação específica sobre o funcionamento dessas clínicas psiquiátricas. Há apenas normativos concernentes à Política de Saúde Mental e Atenção Psicossocial no âmbito do SUS. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) expediu Regulamentos Técnicos atinentes aos aspectos estruturais de estabelecimentos de assistência à saúde, que devem ser obedecidos, indistintamente, por entidades privadas e públicas, quais sejam: Resolução nº 63, de 25 de novembro de 2011; Resolução nº 50, de 21 de fevereiro de 2002 e Resolução nº 29, de 30 de junho de 2011. 3. Da Rede de Atenção Psicossocial prevista no âmbito do SUS – Papel complementar das Comunidades Terapêuticas Primeiramente, destacamos a existência do Parecer Técnico Jurídico nº 06/2010, elaborado por este Centro de Apoio Operacional (CAOSAUDE), disponível em nosso sítio eletrônico www.mp.mg.gov.br (clicar portal saúde – material de apoio jurídico – pareceres 5 técnicos – jurídico), que trata da matéria de saúde mental de forma ampla, com as legislações pertinentes, bem como os vários tipos de instituições especializadas no tratamento psicossocial. Dentre essas instituições, destacam-se as Comunidades Terapêuticas cujo trabalho operacional tem visado o suporte e tratamento dos dependentes químicos num ambiente protegido, em regime de residência, com permanência voluntária, através de um programa terapêutico voltado para a convivência entre os pares, com vistas a reinserção social desses indivíduos. Esses serviços prestados pelas Comunidades Terapêuticas, conforme ressaltado pela Coordenação Estadual de Saúde Mental da SES/MG, são complementares da Rede de Atenção Psicossocial, caracterizadas como de interesse da saúde e não serviços de saúde. A partir da obtenção de seu credenciamento, estão aptas a receber recursos públicos dos órgãos do SUS e SENAD – Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça. Na definição dada pelo Código Estadual de Saúde (Lei Estadual nº 13.317/99), no seu artigo 80, § 2º, estabelecimento de serviço de interesse da saúde é aquele que exerce atividade que, direta ou indiretamente, possa provocar danos ou agravos à saúde da população. Assim, tanto o Ministério da Saúde (MS), Ministério da Justiça (MJ) quanto a Secretaria Estadual de Saúde do Estado de Minas Gerais (SES/MG) vêm reconhecendo e legitimando a atuação das Comunidades Terapêuticas, com a previsão de novos credenciamentos e investimentos, demonstrando a fase atual de transição e redefinição dos componentes da Rede de Atenção Psicossocial1. A esse respeito, cumpre destacar a Portaria MS nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011 que instituiu a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) pelo Ministério da Saúde, no âmbito 1 Vide notícia constante do sítio eletrônico da SES/MG – link: http://www.saude.mg.gov.br/noticias_e_eventos/ses-vai-reforcar-capacitacao-e-tratamento-nascomunidades-terapeuticas-do-estado/ 6 do SUS. Visa a criação, articulação e ampliação dos pontos de atenção à saúde no trato das pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas. Dentre os componentes de atenção previstos, com abrangência em todos os níveis de complexidade (atenção básica, psicossocial especializada, hospitalar e de desinstitucionalização e reinserção social), constam também os Serviços de Atenção Residencial de Caráter Transitório, em que se inserem as Comunidades Terapêuticas: Art. 9º São pontos de atenção na Rede de Atenção Psicossocial na atenção residencial de caráter transitório os seguintes serviços: I - Unidade de Acolhimento: oferece cuidados contínuos de saúde, com funcionamento de vinte e quatro horas, em ambiente residencial, para pessoas com necessidade decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, de ambos os sexos, que apresentem acentuada vulnerabilidade social e/ou familiar e demandem acompanhamento terapêutico e protetivo de caráter transitório cujo tempo de permanência é de até seis meses; e II - Serviços de Atenção em Regime Residencial, entre os quais Comunidades Terapêuticas: serviço de saúde destinado a oferecer cuidados contínuos de saúde, de caráter residencial transitório por até nove meses para adultos com necessidades clínicas estáveis decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas. “§ 1º O acolhimento na Unidade de Acolhimento será definido exclusivamente pela equipe do Centro de Atenção Psicossocial de referência que será responsável pela elaboração do projeto terapêutico singular do usuário, considerando a hierarquização 7 do cuidado, priorizando a atenção em serviços comunitários de saúde. § 2º As Unidades de Acolhimento estão organizadas nas seguintes modalidades: I - Unidade de Acolhimento Adulto, destinados a pessoas que fazem uso do crack, álcool e outras drogas, maiores de dezoito anos; e II - Unidade de Acolhimento Infanto-Juvenil, destinadas a adolescentes e jovens (de doze até dezoito anos completos). § 3º Os serviços de que trata o inciso II deste artigo funcionam de forma articulada com: I - a atenção básica, que apoia e reforça o cuidado clínico geral dos seus usuários; e II - o Centro de Atenção Psicossocial, que é responsável pela indicação do acolhimento, pelo acompanhamento especializado durante este período, pelo planejamento da saída e pelo seguimento do cuidado, bem como pela participação de forma ativa da articulação intersetorial para promover a reinserção do usuário na comunidade.” O Ministério da Saúde preconiza, expressamente, o papel subsidiário/complementar de atuação dos serviços caracterizados como Comunidades Terapêuticas que, uma vez em parceria com o SUS, devem estabelecer uma articulação com os serviços consolidados na Rede – Atenção Básica e CAPS, e destinada ao trato do público adulto. No âmbito do Estado de Minas Gerais, com parâmetro nessa Portaria, a Secretaria Estadual de Saúde estabeleceu a sua própria Rede de Atenção Psicossocial, inserida no fluxo do SUS, através da Resolução SES nº 3.206, de 04 de abril de 2012, com os pontos de atenção já existentes e previstos para implantação nos municípios das Micro e Macrorregiões. Recentemente, por meio da Portaria MS nº 664, de 2013, o Ministério da Saúde homologou, 8 como Plano de Ação, essa rede estadual, destinando-lhe recursos financeiros de R$ 400 milhões para prestação de serviços de saúde mental no Estado e nos Municípios. Portanto, no tocante aos componentes disponíveis e previstos para a Macro Região Sul, da qual faz parte o município de Poços de Caldas, também sede Microrregião de Saúde, destacamos, dentro dos Serviços de Atenção Residencial Terapêutico, as seguintes políticas públicas: (01) Comunidade Terapêutica modulo I; (02) Comunidades terapêuticas Modulo II; (01) Unidade de Acolhimento – adulto e (02) Unidades de Acolhimento – infanto juvenil. Recentemente, a Portaria MS nº 131, de 26 de janeiro de 2012 previu incentivo financeiro de custeio aos Estados, Municípios e Distrito Federal, para fins de apoio de serviços de atenção em regime residencial, incluindo as Comunidades Terapêuticas, no atendimento dos dependentes químicos. Os denominados Serviços de Atenção em Regime Residencial são definidos como “...serviços de saúde de atenção residencial transitória que oferecem cuidados para adultos com necessidades clínicas estáveis decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas.” A respeito dos critérios de financiamento, essa mesma Portaria Ministerial, destaca, dentre outros, os seguintes: Art. 2º (..) § 1º O número total de residentes na entidade beneficiária não pode ultrapassar 30 (trinta); § 2º O valor do recurso financeiro de que trata o caput desse artigo será incorporado ao Limite Financeiro de Média e Alta Complexidade Ambulatorial e Hospitalar dos respectivos Estados, Municípios e do Distrito Federal, e destina-se a apoiar 9 o custeio de entidade pública ou parceria com entidade sem fins lucrativos. § 3º O recurso financeiro de que trata este artigo deverá ser utilizado exclusivamente para atividades que visem o cuidado em saúde para os usuários das entidades. Art. 3º O deferimento do incentivo financeiro de que trata esta Portaria ocorrerá na seguinte proporção: I - ente federado que possua CAPS AD III poderá solicitar incentivo financeiro para apoio a um Serviço de Atenção em Regime Residencial, com até 2 (dois) módulos de 15 (quinze) vagas, para cada CAPS AD existente; e II - ente federado que possua apenas CAPS do tipo I ou II, que acompanhe de forma sistemática pessoas com necessidades de saúde decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas, poderá solicitar incentivo financeiro para apoio a um Serviço de Atenção em Regime Residencial, com 1 (um) módulo de 15 (quinze) vagas, para cada CAPS I ou II existente. Art. 4º Os entes interessados no recebimento do incentivo instituído no art. 1º deverão integrar Região de Saúde que conte com os seguintes componentes em sua Rede de Atenção Psicossocial: I - pelo menos 1 (um) Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), preferencialmente Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e Outras Drogas III (CAPS AD III); II - pelo menos 1 (uma) Unidade de Acolhimento Adulto; III - serviço hospitalar de referência para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas; e 10 IV - retaguarda de atendimento de urgência (SAMU e Prontosocorro ou Pronto-atendimento ou Unidade de Pronto Atendimento). O recurso financeiro previsto no referido diploma não é, portanto, destinado diretamente ao serviço em si de regime de residência terapêutico. É deferido na forma de incentivo financeiro solicitado pelo ente federado interessado integrante de Rede de Saúde que, por sua vez, direciona esse custeio do serviço complementar localizado em seu território. Para tanto, se faz necessário dispor de uma rede de atenção psicossocial determinada, como suporte ao trabalho desenvolvido em parceria. Salientamos que o conceito de Região de Saúde foi preconizado pelo Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011, ao regulamentar a Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/90). Constitui, portanto, referência para as transferências de recursos dos entes federativos, e deve conter, no mínimo, os seguintes serviços e ações: atenção primária; urgência e emergência; atenção psicossocial; atenção ambulatorial especializada e hospitalar e vigilância em saúde (Decreto nº 7.508, artigos 2º, 4º, 5º e 6º). Aquela Portaria Ministerial traz, ainda, disposições acerca do projeto técnico terapêutico, a forma de funcionamento, estrutura e equipe multiprofissional da Rede de Atenção Psicossocial. Quanto ao Regime Residencial no trato da dependência química, no âmbito do SUS, a Portaria MS/SAS nº 856, de 22 de agosto de 2012 incluiu na Tabela do SCNES – Sistema de Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde a modalidade Unidade de Atenção em Regime Residencial – código 78, estabelecendo os procedimentos autorizados para as Comunidades Terapêuticas cadastradas no âmbito da RAPS, que são assim definidas: 11 03.01.08.036-4 ACOMPANHAMENTO DE PESSOAS COM NECESSIDADES DECORRENTES DO USO DE ÁLCOOL, Procedimento: CRACK E OUTRAS DROGAS EM SERVIÇO RESIDENCIAL DE CARÁTER TRANSITÓRIO (COMUNIDADES TERAPÊUTICAS) CONJUNTO DE ATIVIDADES DE CARÁTER TERAPÊUTICO E PROTETIVO, REALIZADO EM ESPAÇO DE REGIME RESIDENCIAL DE CARÁTER TRANSITÓRIO, DESTINADO À PESSOAS ADULTAS COM NECESSIDADES DECORRENTES DO USO DE ÁLCOOL, CRACK E OUTRAS DROGAS. TAIS Descrição: ATIVIDADES (INDIVIDUAIS E COLETIVAS) DEVEM ESTIMULAR O CONVÍVIO SOCIAL E ENFOCAR LAZER, CULTURA, ESPORTE, ALIMENTAÇÃO E OUTROS, DENTRO E FORA DA ENTIDADE, COM PROMOÇÃO DE REUNIÕES, ASSEMBLÉIAS, ORIENTAÇÃO E PREVENÇÃO DO USO DE ÁLCOOL, CRACK E OUTRAS DROGAS E SOBRE OS DIREITOS DOS USUÁRIOS DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. Ressalte-se que a demanda a ser acolhida pelo Serviço de Atenção em Regime Residencial, de caráter transitório, deve ser regulada pelo CAPS do território em que está inserido e o período de acolhimento deverá ser pautado pelo projeto terapêutico singular de cada pessoa, construído em parceria com a equipe do CAPS de referência e conforme diretrizes estabelecidas na Portaria GM/MS nº 131/2012. Especificamente quanto às Unidades de Acolhimento, dentro do ponto de atenção residencial de caráter transitório, destacamos a Portaria Nº 121, de 25 de janeiro de 2012, que institui a referida modalidade para o trato de pessoas com necessidades decorrentes do uso do Crack, Álcool e outras drogas. 12 Mister destacar as diferenças entre os Serviços de Atenção em Regime Residencial, de caráter transitório, compreendidos pelas supracitadas Unidades de Acolhimento e Comunidades Terapêuticas, e os denominados Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT). Referidos serviços (SRT), também denominados de Residências Terapêuticas, constituem componente da estratégia de desinstitucionalização, assim definida pela Portaria Ministerial nº 3.088/2011, anteriormente abordada, caracterizadas como moradias inseridas na comunidade, destinadas a acolher pessoas egressas de internação de longa permanência (dois anos ou mais ininterruptos), egressas de hospitais psiquiátricos e hospitais de custódia, entre outros. Em geral, os moradores não possuem vínculos familiares, podendo variar desde um indivíduo até um pequeno grupo de oito pessoas e devem ser acompanhados pela rede extrahospitalar (CAPS, ambulatórios, atenção básica, entre outros). O processo de reabilitação psicossocial deve buscar de modo especial a inserção do usuário na rede de serviços, organizações e relações sociais da comunidade. A inserção em um SRT é o início de longo processo de reabilitação que deverá buscar a progressiva inclusão social do morador. Ressaltamos que essas residências também não constituem serviços de saúde, mas espaços de habitação, que devem possibilitar à pessoa em sofrimento mental o retorno à vida social. As residências são espaços de reconstrução de laços sociais e afetivos para aqueles cujas vidas encontravam-se confinadas ao universo hospitalar. A Portaria MS nº 106, de 11 de fevereiro de 2000, redefinida pela Portaria nº 3.090, de 23 de dezembro de 2011, dá melhores detalhamentos dessa modalidade de serviço. A Portaria Ministerial nº 148, de 31 de janeiro de 2012 define as normas de funcionamento e habilitação do Serviço Hospitalar de Referência para atenção a pessoas com sofrimento mental e com necessidades de saúde decorrentes do uso de álcool, crack e outras 13 drogas, do Componente Hospitalar da Rede de Atenção Psicossocial, e institui incentivos financeiros de investimentos e de custeio. No âmbito do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, recentemente houve a publicação da Resolução Nº 71 de 13 de setembro de 2012, que instituiu o FÓRUM Permanente de Resultados para a Sociedade, tendo por finalidade orientar, articular, integrar e acompanhar as ações das Procuradorias de Justiça, dos Centros de Apoio Operacional, do Programa Estadual de Proteção a Defesa do Consumidor (PROCON-MG) e das Coordenadorias Especializadas, bem como subsidiar a tomada de decisões do Conselho de Gestão Estratégica( CGE) por meio de análise, da proposição da priorização e do acompanhamento de planos, programas e projetos relacionados aos Resultados para a Sociedade do Mapa estratégico de Minas Gerais. Por meio da Deliberação FPRS Nº 02/2013, o FORUM Permanente de Resultados para a Sociedade-FPRS instituiu a Comissão de Enfrentamento às Drogas, sob a presidência do Procurador Geral de Justiça Adjunto Institucional, com a finalidade de elaborar e propor ao Fórum Permanente de Resultados para a sociedade- FPRS estratégias de atuação do Ministério Público de Minas Gerais no enfrentamento ao uso de substância psicoativa. Destaca-se, ainda, a recente Resolução CFM nº 2.057, de 20 de setembro de 2013, que consolida as diversas resoluções da área da Psiquiatria e reitera os princípios universais de proteção ao ser humano, à defesa do ato médico privativo de psiquiatras e aos critérios mínimos de segurança para os estabelecimentos hospitalares ou de assistência psiquiátrica de quaisquer naturezas, definindo também o modelo de anamnese e roteiro pericial em psiquiatria. Esse normativo do CFM traz todo um detalhamento técnico acerca dos serviços considerados psiquiátricos, de natureza médica, podendo, inclusive, abarcar comunidades terapêuticas que se enquadrem nessa categoria. 14 A relevante matéria legislada pelo CFM será objeto de estudo próprio pelo CAOSAUDE, com divulgação posterior para cada uma das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde, na forma de Ofício Circular/Nota Técnica. 3. Da Fiscalização das Comunidades Terapêuticas. Inicialmente, interessante contextualizar a vocação e história das Comunidades Terapêuticas (CT) ao longo dos anos para melhor compreensão de seu âmbito de atuação e abordagem na área da saúde. De acordo com a Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas (FEBRACT), as origens das comunidades terapêuticas remontam há mais de dois mil anos de existência. Neste contexto, em consulta ao sítio eletrônico do Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas, verificou-se o histórico do Movimento das Comunidades Terapêuticas, conforme fragmento do texto abaixo: “Em 1860 foi fundada uma organização religiosa chamada Oxford. Esta organização era uma crítica à Igreja da Inglaterra e seu objetivo era o renascimento espiritual da humanidade. Este grupo, conhecido como Grupo de Oxford, buscava um estilo de vida mais fiel aos ideais cristãos: se encontravam várias vezes por semana para ler e comentar a Bíblia e se comprometiam reciprocamente a serem honestos. Nos Estados Unidos, participantes deste grupo se reuniam para partilhar o empenho e esforço que faziam para permanecer sóbrios; desta maneira nasceu o primeiro grupo de Alcoólicos Anônimos (AA – fundado em Akron – Ohio, 15 pelo cirurgião Bob e o Corretor de New York Bill, em 1935) que com o passar dos anos se tornou o maior grupo de AutoAjuda do mundo. Após 10-15 anos, constataram que 25% dos seus participantes eram alcoolistas em recuperação. Este tipo de alternativa terapêutica se consolidou e deu origem a outras CTs que, conservando os conceitos básicos, aperfeiçoaram o modelo proposto pela primeira CT fundada em 1.958.” 2 Concomitantemente, na década de 50 surge a proposta revolucionária do psiquiatra Maxwell Jones de rompimento da estrutura rigidamente hierarquizada e autocrática dos hospitais psiquiátricos existentes para o estímulo da “comunicação entre todos os membros, incluindo todos (inclusive o ambiente) no processo terapêutico, fazendo com que os internos participassem da condução do dia-a-dia da Comunidade.” 3 Nesse sentido, em 1997, Elena Goti ressalta que “ a CT não se destina a todo tipo de dependente; que o tratamento deve ser voluntário e que o residente é o principal ator de sua cura, ficando a equipe com o papel de proporcionar apoio e ajuda.” 4 Ademais, em 2000, George de Leon reforça que “ CT é uma abordagem de autoajuda, fora das correntes psiquiátricas, psicológicas e médica. Fala sobre a natureza terapêutica de todo o ambiente, sobre sua grande flexibilidade, no enfoque da pessoa como um todo e diz que é um processo a longo prazo, que deve resultar em mudança pessoal e no estilo de vida. Finalmente, adverte sobre o perigo de serem introduzidas práticas que contrariem a essência da proposta da CT. “ 5 2 Disponível em: http://www.obid.senad.gov.br/portais/OBID/conteudo/index.php?id_conteudo=11420&rastro=TRATAMENTO%2F Modelos/Comunidade+Terap%C3%Aautica. Acesso em 15/05/2013 3 http://www.febract.org.br/?navega=comunidades 4 http://www.febract.org.br/?navega=comunidades 5 http://www.febract.org.br/?navega=comunidades 16 Atualmente, importante ressaltar sobre a existência do Código de Ética da Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas, destacando-se os seguintes pontos, a saber: ... I- Princípios Fundamentais... 2. A permanência na Comunidade Terapêutica deve ser voluntária e decidida após o interno ser informado sobre a orientação seguida e as normas em vigor. ... II. DA COMUNIDADE TERAPÊUTICA 1. A Comunidade Terapêutica deve apresentar uma proposta de recuperação coerente, da qual constem: a) adoção de critérios de admissão; b) o programa terapêutico com fases distintas: c) o estabelecimento de critérios que caracterizem a reinserção social como objetivo final. 2. A Comunidade Terapêutica deve apresentar um programa de capacitação e treinamento de seu pessoal, em cursos credenciados pela Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD). ... III. DO INTERNO O interno da Comunidade Terapêutica deve: 1. Receber, por escrito, a orientação e os objetivos do Programa de Atendimento, e as regras existentes na 17 Comunidade Terapêutica, declarando, de modo explicito, sua concordância com eles. Qualquer modificação nas determinações acima deverá ser comunicada com a necessária antecedência. ... Assim, percebe-se ser da vocação das Comunidades Terapêuticas o respeito à vontade do indivíduo no acesso ao tratamento plenamente consciente. Deverá ser assistido por equipe de profissionais aptos e capacitados para a realização dos trabalhos, assumindo como objetivo final a reinserção social dos internos. Nesta seara, importante mencionar a Resolução ANVISA nº 50, de 21 de fevereiro de 2002, que dispõe sobre o Regulamento Técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimentos assistenciais de saúde. Referida RDC atua como norteador para projetos e adequações relativos a estruturação física dos serviços, inclusive com disponibilização de manual orientador para elaboração de projetos físicos para estabelecimentos assistenciais de saúde. Especificamente, a Resolução ANVISA nº 29, de 30 de junho de 2011 regulamentou os cuidados da dependência química, dispondo sobre os requisitos de segurança sanitária para o funcionamento de instituições que prestem serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de substâncias psicoativas, enquadradas as Comunidades Terapêuticas, bem como quaisquer outras, urbanas ou rurais, públicas ou privadas, comunitárias, confessionais ou filantrópicas. Referido normativo, inclusive, revogou a Resolução ANVISA RDC nº 101/2001, que estabelecia, de forma mais detalhada, o Regulamento Técnico com os requisitos mínimos para o funcionamento desses serviços. 18 De acordo com a Nota Técnica nº 01/2011 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a atualização desse regramento representou passo pioneiro da ANVISA diante da necessidade de se qualificar serviços prestados por entidades da sociedade civil, que cresceram em resposta à ausência de tradição mais forte da saúde pública em lidar com o tema da drogadição. Referida Nota informa, ainda, que “uma vez que a normativa-RDC nº 29/11 é aplicada pela autoridade sanitária de estados e municípios, esta deve considerar que tais instituições têm caráter social, não se tratando de estabelecimento de saúde e, por consequência, em geral, não devem seguir os rigores da legislação sanitária que é aplicada a clínicas e hospitais, por exemplo. Somente nos casos em que houver prestação de“serviços assistenciais de saúde” ou execução de “procedimentos de natureza clínica”, conforme prevê o parágrafo único do art. 2º da norma, deve-se, cumulativamente, aplicar os requisitos específicos de estabelecimentos de saúde.”(grifo nosso) A Nota Técnica ANVISA nº 055, de 16 de agosto de 2013 presta esclarecimentos quanto à aplicabilidade da RDC nº 29/2011, especialmente no tocante a gestão de pessoal, responsável técnico e processo de admissão nas instituições conhecidas como Comunidades Terapêuticas, entidades abrangidas pela norma, podendo servir de referência para avaliação de entidades afins. Desta forma, no tocante à fiscalização das denominadas Comunidades Terapêuticas, os critérios são os exigidos pela RDC ANVISA nº 29/2011, enquanto estabelecimento de interesse à saúde e pela RDC ANVISA nº 50/2002 e legislação sanitária pertinente nos casos em que oferecer serviços de assistência à saúde ou procedimentos de natureza clínica, utilizando-se como parâmetros a Tabela de Procedimentos, Medicamentos e Órteses, Próteses e Materiais Especiais (OPM) do Sistema Único de Saúde (SUS/MG), disponível no endereço eletrônico: sigtap.datasus.gov.br. 19 No tocante à documentação necessária para essas instituições que prestem serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de substâncias psicoativas, a RDC ANVISA nº 29/2011 discorre sobre a temática, especialmente nos seus artigos 3º ao 7º, verbis: ... Art. 3º As instituições objeto desta Resolução devem possuir licença atualizada de acordo com a legislação sanitária local, afixada em local visível ao público. Art. 4º As instituições devem possuir documento atualizado que descreva suas finalidades e atividades administrativas, técnicas e assistenciais. Art. 5º As instituições abrangidas por esta Resolução deverão manter responsável técnico de nível superior legalmente habilitado, bem como um substituto com a mesma qualificação. Art. 6º As instituições devem possuir profissional que responda pelas questões operacionais durante o seu período de funcionamento, podendo ser o próprio responsável técnico ou pessoa designada para tal fim. Art. 7º Cada residente das instituições abrangidas por esta Resolução deverá possuir ficha individual em que se registre periodicamente o atendimento dispensado, bem como as eventuais intercorrências clínicas observadas. Destacamos a Resolução Conjunta SEDS/SES/SEDESE n° 150, de 21 de outubro de 2011, que dispõe acerca do Registro, Certificação e Credenciamento de Entidades que atuem 20 na prevenção, tratamento, reinserção social e ocupacional ou redução de danos sociais, no campo do uso e abuso de álcool e outras drogas, no âmbito do Programa Social de Rede Complementar de Suporte Social na Atenção ao dependente químico, perante a Secretaria de Estado de Defesa Social - SEDS e dá outras providências. O Edital SES/MG nº 26/2013 dispõe sobre o Credenciamento e Habilitação de Comunidades Terapêuticas para execução das ações do Cartão Aliança Pela Vida. Encontram-se bem definidas as responsabilidades, quanto a essa temática, da Secretaria Estadual de Saúde (SES/MG) e Secretaria Estadual de Esportes e Juventude (SEEJ). Os trâmites relativos ao credenciamento e habilitação das Comunidades Terapêuticas são de responsabilidade da SES/MG, através de sua Coordenação Estadual de Saúde Mental, enquanto que o registro e a certificação dessas unidades ficam a cargo da Subsecretaria de Políticas sobre Drogas (SUPOD)/SEEJ. O denominado Instrumento de Qualidade e Gestão de Serviços possui o objetivo de aferir a qualidade da prestação de serviço pelas Comunidades Terapêuticas em processo de Certificação e Credenciamento, avaliando-se a gestão nas seguintes áreas: Gestão Corporativa; Estratégica; de Processos; de Recursos Humanos; Patrimonial e de Suprimentos; da Informação; Contábil e Financeira; Tributária; da Comunicação; do Espaço Físico Externo e Interno e da Gestão e Organização dos Serviços. A recente Lei nº 12.868, de 15 de outubro de 2013 que, dentre outras, altera disposições constantes da Lei nº 12.101/2009, passou a permitir a certificação de instituições reconhecidas como serviços de atenção em regime residencial e transitório, incluídas as comunidades terapêuticas que prestem ao SUS serviços de atendimento e acolhimento a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de substância psicoativa. A esse respeito: 21 Art. 7º-A. As instituições reconhecidas nos termos da legislação como serviços de atenção em regime residencial e transitório, incluídas as comunidades terapêuticas que prestem ao SUS serviços de atendimento e acolhimento, a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de substância psicoativa poderão ser certificadas, desde que: I - sejam qualificadas como entidades de saúde; e II - comprovem a prestação de serviços de que trata o caput. § 1º O cumprimento dos requisitos estabelecidos nos incisos I e II do caput deverá observar os critérios definidos pelo Ministério da Saúde. § 2º A prestação dos serviços prevista no caput será pactuada com o gestor local do SUS por meio de contrato, convênio ou instrumento congênere. § 3º O atendimento dos requisitos previstos neste artigo dispensa a observância das exigências previstas no art. 4º." Art. 8º -B. Excepcionalmente, será admitida a certificação de entidades que prestam serviços de atenção em regime residencial e transitório, incluídas as comunidades terapêuticas, que executem exclusivamente ações de promoção da saúde voltadas para pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de drogas, desde que comprovem a aplicação de, no mínimo, 20% (vinte por cento) de sua receita bruta em ações de gratuidade. § 1º Para fins do cálculo de que trata o caput, as receitas provenientes de subvenção pública e as despesas decorrentes não devem incorporar a receita bruta e o percentual aplicado em ações de gratuidade. § 2º A execução das ações de gratuidade em promoção da saúde será previamente pactuada com o gestor local do SUS, por meio de contrato, convênio ou instrumento congênere. § 3º O atendimento dos requisitos previstos neste artigo dispensa a observância das exigências previstas no art. 4º ." 22 Portanto, para os fins de enquadramento na categoria de entidades beneficentes, as Comunidades Terapêuticas foram dispensadas do cumprimento dos requisitos exigidos para as demais instituições de saúde. Ficam, também, as comunidades terapêuticas submetidas à vistoria do grupo gestor (Saúde - Subsecretaria de Políticas sobre Drogas - Assistência Social) para avaliação relacionada a apresentação de alvará sanitário, número de leitos, equipe mínima, condições terapêuticas para acolhimento do usuário, dentre outras. O Município deverá contar com os serviços do Conselho Municipal Antidrogas, pressuposto básico da Política Nacional Antidrogas, responsável por assistir aos usuários no que se refere à prevenção, tratamento, reinserção social, repressão e fiscalização na área das drogas. A base normativa para exigência de sua criação encontra-se na Lei Federal nº 11.343/06, Decreto nº 5.912/06 e Resolução nº 3/GSIPR/CH/CONAD, de 27 de outubro de 2005. Destaca-se, também, a existência dos resultados da auditoria operacional nº 021.180/2010-5 e TC 033.434/2010-7, competência 2010, pelo Tribunal de Contas da União (TCU), sobre a avaliação das ações do governo federal relativas ao tratamento, prevenção e reinserção social do dependente de álcool e de outras drogas. Dentre outras desconformidades apuradas, o fato da ausência da licença sanitária em torno de 55% das comunidades terapêuticas que participaram do processo seletivo para apoio financeiro a projetos de acolhimento de usuários de drogas. O Ministério da Saúde, através da Secretaria de Atenção à Saúde (SAS) e a SENAD – Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (MJ) foram RECOMENDADOS pelo TCU a condicionar a destinação de recursos federais a Comunidades Terapêuticas e entidades afins à realização de efetivo controle, acompanhamento, fiscalização e avaliação dessas entidades. Deverão, também, nos editais de financiamento federal para comunidades terapêuticas, estabelecer mecanismos de orientação sobre como deve ser feita a prestação de contas. Além disso, nos futuros editais, a licença sanitária deverá ser exigida como requisito para as comunidades terapêuticas receberem recursos federais. 23 Esse mesmo Órgão ainda lhes Recomendou a vinculação do apoio federal ao compromisso dessas entidades de participarem de processo avaliativo conduzido pelo Ministério da Saúde (MS), com o objetivo de verificar a efetividade dos tratamentos oferecidos. Não obstante o reconhecimento do papel assistencial desses serviços privados, sob a forma complementar no âmbito da saúde, há que se registrar a importância e necessidade do fortalecimento da rede assistencial de saúde mental para que a integralidade da assistência ao usuário possa realizar-se na rede própria de ações e serviços de saúde do Sistema Único de Saúde. ESPECIFICAMENTE ao caso concreto do município de Poços de Caldas, em consulta a SES/SUPOD não foi localizado registro ou credenciamento da Comunidade Terapêutica existente na Clínica Oxford. 4. CONCLUSÃO Em face dos argumentos técnico-jurídicos acima esposados, este Centro de Apoio Operacional (CAOSAUDE) apresenta as seguintes conclusões/sugestões para a Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde da comarca de Poços de Caldas, ora consulente, sem prejuízo da adoção, como regra de orientação institucional às demais Promotorias de Justiça, a saber: (a) Requisição de vistoria técnica junto à Secretaria Municipal de Saúde de Poços de Caldas, de forma que possam ser levantadas eventuais desconformidades em face da Resolução RDC ANVISA nº 29/2011; RDC ANVISA nº 50/2012 e legislação pertinente, com vista ao seu saneamento. Posteriormente, havendo interesse, possa referida entidade, na forma da Resolução Conjunta SEDS/SES nº 150, de 21 de outubro de 2011, providenciar seu credenciamento naqueles órgãos 24 governamentais, bem como pactuar com o Gestor SUS local, constituindo-se, destarte, em ponto de atenção retaguarda inserido na Rede de Atenção Psicossocial da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (Resolução SES nº 3.206, de 04 de abril de 2012). (b) Instauração de Procedimento Preparatório ou, se for o caso, de Inquérito Civil Público, com registro no SRU, para se apurar, dentre outros, sob os aspectos epidemiológicos, sanitários, socioeconômicos, demográficos, quanto à existência de adequada política pública em saúde mental no município, sobretudo pelos pontos de atenção já definidos para o município de Poços de Caldas pela Resolução SES nº 3.206, de 2012 Deverá ser entendida como adequada política pública em saúde mental a existência de uma rede de atenção integral, composta por diversos pontos/equipamentos de saúde, que seja capaz de efetivamente controlar e garantir o acesso dos usuários à porta de entrada do sistema. Para facilitação desse amplo diagnóstico, poderão ser (i) requisitadas informações diretamente à Superintendência Regional de Saúde ou Gerência Regional de Saúde da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais, conforme o caso, bem como ao Setor de Avaliação, Auditoria e Controle do município; (ii) requisição de informações diretamente ao Gestor SUS municipal quanto à inserção dessa política na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), Orçamentária Anual (LOA), no Plano Municipal de Saúde e na Programação Anual de Saúde (PAS), forma de sua execução, aprovação pelo Conselho Municipal de Saúde, articulação em face da rede municipal, projeto terapêutico e, ainda (iii) informações sobre esses resultados da saúde mental no município em face do Relatório Anual de Gestão em Saúde – RGA, cujas informações deverão estar inseridas, obrigatoriamente, no SARGSUS – Sistema de Acompanhamento do Relatório Anual de Gestão. 25 No caso de existência da Rede de Saúde Mental Municipal ou Microrregional, poderá, ainda, ser verificada sua qualidade técnica, configuração e fluxos assistenciais, podendo ser feitas seguintes diligências: a) existência quanto à rede integral, com protocolos assistenciais definidores de fluxos e referências, integrado, a partir da ordenação pela atenção básica; projeto terapêutico; elaboração de prontuários médicos; definição de retaguarda para emergências médicas; definição de retaguarda para emergências psiquiátricas; definição de retaguarda para internação psiquiátrica; articulação com recursos comunitários para a reintegração profissional; capacitação das equipes de atenção básica; definição de supervisão técnica e de responsável médico; registro no Conselho Regional de Medicina; adequação e suficiência de quadro de pessoal, etc. (c) Reconhecimento, em face do modelo atual instituído pela Reforma Psiquiátrica, a responsabilidade dos CAPS ou da Referência Técnica Municipal em Saúde Mental, como eixo regulador das ações e serviços em saúde mental (portas de entrada), de forma que possam assumir todas as demandas – mesmo as de maior grau de complexidade ou em situações de emergência – fazendo o acolhimento, definição dos fluxos e tratamento, conforme projeto terapêutico individual.. d) Adoção de providências, diretamente junto ao prefeito municipal e ao Gestor SUS local, no sentido da criação do Conselho Municipal Antidrogas, no caso de sua inexistência. e) Recomendação ao Gestor SUS local para que insira nos processos de discussão coletiva da Comissão Intergestores Regional (CIR), o fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial, em níveis de complexidade crescente, sob a ótica da descentralização e da regionalização, preconizadas pelo Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011 e pelos pontos de atenção definidos pela Resolução SES/MG nº 3.206, de 2012). 26 f) O diagnóstico de doença mental deve ser feito por médico, de acordo com os padrões aceitos internacionalmente, sem considerar status econômico, político ou social, orientação sexual, pertinência a grupo cultural, racial ou religioso, ou por qualquer razão não relacionada ao estado de saúde mental da pessoa. Os médicos que atuam em estabelecimentos ou serviços de assistência psiquiátrica são responsáveis pela indicação, aplicação e continuidade dos programas terapêuticos e reabilitadores em seu âmbito de competência. É da competência exclusiva de médico a realização de diagnósticos nosológicos, indicação de conduta terapêutica e admissões, licenças e altas dos pacientes sob sua responsabilidade. g) Tratando-se de serviço destinado a cuidados médicos intensivos ou semiintensivos, incluindo internações breves para desintoxicação, deve preencher os requisitos hospitalares gerais no que se refere a recursos humanos (equipe profissional) e a infraestrutura de suporte à vida, conforme definido nestas normas e no Manual de Vistoria e Fiscalização da Medicina no Brasil. As Comunidades Terapêuticas de natureza médica deverão ser dotadas das mesmas condições que os demais estabelecimentos de hospitalização, garantindo plantão médico presencial durante todo o seu horário de funcionamento, presença de médicos assistentes e equipe completa de pessoal de acordo com a Lei nº 10.216/01 e as presentes normas e o Manual de Vistoria e Fiscalização da Medicina no Brasil. h) Nenhum tratamento será administrado à pessoa com doença mental sem consentimento esclarecido, salvo quando as condições clínicas não permitirem sua obtenção ou em situações de emergência, caracterizadas e justificadas em prontuário, para evitar danos imediatos ou iminentes ao paciente ou a terceiro. Na impossibilidade de se obter o consentimento esclarecido do paciente, deve-se buscar o consentimento do responsável legal. As modalidades de atenção psiquiátrica extra-hospitalar devem ser prioritárias e, na hipótese da necessidade de internação, esta se dará pelo tempo necessário à recuperação do paciente. i) É admissível a contenção física de paciente, à semelhança da contenção efetuada em leitos de UTI, nos serviços que prestem assistência psiquiátrica, desde que 27 prescrita por médico, registrada em prontuário e quando for o meio mais adequado para prevenir dano imediato ou iminente ao próprio paciente ou a terceiro. O paciente que estiver contido deve permanecer sob cuidado e supervisão imediata e regular de membro da equipe, não devendo a contenção se prolongar além do período necessário a seu propósito. Quando da contenção física, o representante legal ou a família do paciente devem ser informados tão logo possível. É o presente Parecer Técnico. Belo Horizonte, 20 de novembro de 2013. Cláudia Luiza S. Felício ANALISTA MP MAMP 4336 Nêmora Brant D. Cenachi ANALISTA MP MAMP 5033 GILMAR DE ASSIS Promotor de Justiça Coordenador do CAOSAUDE