uma abordagem behaviorista

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FABRÍCIO EDUARDO JACOB
O USO DO PRINCÍPIO DOS INTERESSES COINCIDENTES NA
MOTIVAÇÃO DE TRABALHADORES DE TELEMARKETING – UMA
ABORDAGEM BEHAVIORISTA
Trabalho apresentado ao Departamento de
Engenharia Elétrica e de Produção da
Universidade Federal de Viçosa como parte
das exigências para a conclusão do curso de
Engenharia de Produção.
Orientador
Prof. Eduardo Simonini Lopes
VIÇOSA
MINAS GERAIS - BRASIL
2006
Sumário
Sumário..............................................................................................................................1
2. Revisão de Literatura.....................................................................................................4
2.1 O estudo do comportamento................................................................................... 4
2.1.2 A modelagem do comportamento.................................................................... 6
2.1.3 Limitações do Behaviorismo ........................................................................... 7
2.2 O princípio dos interesses coincidentes.................................................................. 8
3. Metodologia...................................................................................................................9
3.1 Embasamento metodológico .................................................................................. 9
3.2 Execução metodológica........................................................................................ 10
3.2.1 Entrevistados ................................................................................................. 11
4. Resultados....................................................................................................................11
4.1 Ganho ................................................................................................................... 11
4.2 Sistema de premiação e punições: ........................................................................ 12
4.2.1 Informações gerais......................................................................................... 12
4.2.2 Sistemas de pagamento da empresa .............................................................. 12
4.2.3 Sistema atual.................................................................................................. 13
4.2.3.1 Premiação ................................................................................................... 13
4.2.3.2 Pagamento .................................................................................................. 14
4.2.3.2 Punições...................................................................................................... 15
4.2.4 Outros ............................................................................................................ 17
4.2.5 Dando voz às entrevistadas............................................................................ 18
5. Discussão.....................................................................................................................20
6. Conclusão ....................................................................................................................22
7. Referências bibliográficas ...........................................................................................23
JACOB, Fabrício Eduardo. O uso do Princípio dos Interesses Coincidentes na
motivação de trabalhadores de Telemarketing – uma abordagem Behaviorista.
2006, 23f.. Trabalho de Graduação (Curso de Engenharia de Produção) – Universidade
Federal de Viçosa.
Resumo
Este trabalho teve como objetivo estudar o sistema de motivação de uma
empresa no seu setor de telemarketing passivo, usando como referencial teórico a
psicologia Behaviorista e o princípio denominado “Interesses Coincidentes”.
Foram realizadas entrevistas com trabalhadoras desta empresa, com o objetivo
de se estudar o seu sistema de premiações e punições, ao mesmo tempo que se estudava
o seu impacto sobre o comportamento destas profissionais.
Concluiu-se que, apesar da empresa apresentar alguns aspectos positivos nos
seus sistemas, esta necessita de um melhor embasamento teórico para a formulação
destes, pois eles podem incentivar comportamentos não interessantes para a mesma.
Além disso, mudanças nas regras com o objetivo de diminuir o nível de estresse do
ambiente de trabalho se apresentam urgentes para melhorar a qualidade de vida na
empresa e reduzir a rotatividade de pessoal.
2
1. Introdução
"Fator humano" é a expressão usada por engenheiros e projetistas pra designar o
comportamento de pessoas no trabalho. É frequentemente invocado nas análises de
catastrofes e acidentes. Em geral, está associado a idéia de erro. Prova disso, é a
frequência com que ouvimos o termo “falha humana” quando algo não sai como
deveria. Essa concepção muitas vezes leva a perpectivas de pensar o humano como
sendo um incômodo que deveria ser substituído pela atividade “precisa”das máquinas.
Porém, nada é mais fundamental na atividade produtiva do que o indivíduo, por mais
tecnologicamente apurada que seja a atividade. Máquinas são incapazes de improvisar e
ter um comportamento criativo frente ao imprevisível. Infelizmente, ainda existe um
grande número de empresas que não perceberam a importância do indivíduo para a
realização dos objetivos da organização.
Neste cenário, estudos com o objetivo de auxiliar a implementação de métodos
gerenciais que tenham o indivíduo em foco podem ser de grande importância para o
desenvolvimento das empresas. Muito mais que meras políticas de Recursos Humanos,
a empresa necessita possuir regras e príncipios gerenciais que motivem o indivíduo a
buscar dar o melhor de si no seu trabalho. Para tanto, é necessário muitas vezes que o
trabalhador, quando busca fazer o melhor para si, também esteja buscando o melhor
para a empresa em que trabalha. Esta é a base de um princípio que aqui nomeamos de
princípio dos intesses coincidentes. Baixa produtividade, custos elevados, falhas no
controle de qualidade, muitas vezes são causadas por funcionários que por diversos
motivos (raiva, frustração, baixa auto-estima, etc) não se sentem identificados com a
empresa em que trabalham.
Desta forma, é necessário conhecer as necessidades humanas para melhor
compreender o comportamento dos trabalhadores, e assim, utilizar a motivação como
poderoso meio para melhorar a eficiência das organizações. Do contrário, corre-se o
risco de se criar ações que, ao invés de auxiliar na motivação do funcionário, premiam
um comportamento que não é interessante para a empresa ou punem um que deveria ser
incentivado. Um exemplo disto é quando aquele que se esforça é “punido” com
aumento de encargos em lugar de ser premiado com reconhecimento.Bem depressa, os
trabalhadores daquela empresa poderão concluir que o esforço não compensa.
O objetivo deste trabalho é analisar políticas de pessoal (bonificações,
demissões, participação nos lucros, punições, elogios, atribuição de metas e outros
3
afins) em uma empresa, tendo como principal referencial teórico o trabalho do
psicólogo americano B. F. Skinner, sobre reforçamento humano. A teoria de Skinner é
conhecida como comportamentalismo ou Behaviorismo, e se dedica ao estudo do
comportamento observável, não o encarando como uma ação isolada de um sujeito,
mas, sim, como uma interação entre aquilo que o sujeito faz e o ambiente onde o seu
“fazer” acontece. Portanto, o Behaviorismo dedica-se ao estudo das interações entre o
indivíduo e o ambiente, estudando as ações do indivíduo (suas respostas) a um ambiente
reforçador.
Pretende-se ainda pesquisar formas de melhoria das políticas encontradas e
estudar o efeito de tais modificações sobre o comportamento dos empregados e suas
consequências sobre o desempenho da empresa.
2. Revisão de Literatura
2.1 O estudo do comportamento
Muito antes de ser o psicólogo mais influente dos Estados Unidos, Burrhus
Frederic Skinner (1904 – 1990) decidiu ser escritor. Formou-se no Hamilton College em
Inglês, e, após a formatura, passou um ano infeliz, tentando imaginar o que fazer de sua
vida, enfrentando uma crise de identidade. Descobriu, então, o behaviorismo, o qual
relatou mais tarde em sua autobiografia:
“O behaviorismo ofereceu-me outra saída: Não era eu, mas minha
história que falhara... Aprendi a aceitar meus erros remetendo-os a
uma história pessoal não criada por mim e que não poderia ser
mudada”. (Skinner, 1983: 407)
O que Skinner disse com essa afirmação foi que o ambiente interfere diretamente
nas ações do indivíduo, ou seja, as suas ações não foram baseadas apenas nas suas
próprias decisões, como também na influência de todo o meio a sua volta.
No cotidiano, não se nega a importância do mundo que nos cerca. Podemos
discordar quanto à natureza ou à extensão do controle que o ambiente mantém sobre
nós, mas que existe algum controle, é evidente. Quando numa situação corriqueira uma
pessoa diz para outra: “-Fique quieto, aqui não é lugar disso”, está claramente evocando
este pensamento.
Ora, mas se realmente o ambiente condiciona o comportamento, então
poderemos interferir no comportamento, através da ação sob o ambiente.
4
Frequentemente, estamos mudando o ambiente com o objetivo de alterar um
determinado comportamento, como quando desligamos a TV para a criança dormir, ou
quando se proíbe o consumo de alcóol em determinados ambientes para se evitar certos
“desvios de conduta”. Todavia, essas ações se baseiam apenas na experiência prévia e
não possuem nenhum tipo de rigor científico. Mesmo a ciência as vezes ignora esse
poder do ambiente sobre o comportamento:
“Muitas teorias do comportamento humano, não obstante,
menoscabam ou ignoram a ação do ambiente. O contato entre o
organismo e o seu mundo fica totalmente desprezado ou, quando
muito, descrito casualmente.” (SKINNER, 1994: 132).
O Behaviorismo de Skinner tem influenciado muitos psicólogos americanos e de
vários países onde a psicologia americana tem grande penetração, como o Brasil. A base
desta corrente é o comportamento operante. Este e outros termos estão discriminados
abaixo:
Comportamento operante: é comportamento voluntário e abrange uma
quantidade muito maior da atividade humana. Desde os comportamentos do
bebê de balbuciar e agarrar objetos, até os comportamentos mais sofisticados de
um adulto. Inclui todas as ações de um organismo dos quais se possa dizer que
têm um efeito sobre o mundo ao redor.
Estímulo: qualquer evento que atua sobre um organismo.
Resposta: qualquer comportamento emitido pelo organismo devido a um
estímulo.
Comportamento reflexo: é o comportamento não voluntário e inclui as
respostas que são eliciadas por modificações de estímulos do ambiente. Por
exemplo, a contração das pupilas, quando uma luz forte incide sobre os olhos; o
arrepio da pele, quando um ar frio nos atinge, etc.
Extinção é a remoção do comportamento de um indivíduo. Ocorre na ausência
do reforço adequado. Exemplo cotidiano é quando se deixa de telefonar a
alguém após várias chamadas, se o telefone não atende.
Punição: consiste na aplicação de estímulos aversivos imediatamente após o
comportamento indesejável. Eventualmente, a retirada do reforço positivo pode
se constituir como punição.
Fuga: diante de uma estimulação aversiva, o indivíduo tenta desligar-se da vida
real, para não encarar tal estímulo.
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Esquiva: comportar-se de forma a evitar um estímulo aversivo, como obedecer
a ordens para não ser castigado.
Reforço: Os comportamentos são fortalecidos ou enfraquecidos de modo a
aumentar ou diminuir a probabilidade de sua ocorrência. As conseqüências que
fortaleceram o comportamento são chamadas reforço. O papel do reforço é
tornar freqüente uma resposta no comportamento do indivíduo, garantir a
manutenção dessa resposta, ou evitar a extinção da mesma.
O reforço é o aspecto mais importante na modelagem de comportamento, para
usá-lo de forma eficiente, é necessário se trabalhar com questões como a quantidade de
reforço para cada reação, o número de reforços, a demora do reforço, entre outros. Para
um condicionamento ideal, o reforço deve ocorrer imediatamente após as respostas.
2.1.2 A modelagem do comportamento
Através da manipulação de reforços, é possível modelar comportamentos. Longe
de ser uma coisa distante da realidade, é algo que acontece em maior ou menor grau no
dia a dia. Quando se diz que uma criança é “muito mimada”, claramente se está
afirmando uma modelagem de comportamento, neste caso devido a uma educação com
excessivo reforço positivo e pouca frustação. Com o uso de conhecimentos de
psicologia, planejamento e objetivos claros é possível se conseguir no controle do uso
de reforços, resultados eficientes. Para Skinner:
“O condicionamento operante modela o comportamento como o
escultor modela a argila. Ainda que algumas vezes o escultor pareça
ter produzido um objeto inteiramente novo, é sempre possível seguir o
processo retroativamente até a massa original indiferenciada e fazer
que os estágios sucessivos, através dos quais retornamos a essa
condição sejam tão pequenos quanto quisermos. Em nenhum ponto
emerge algo que seja muito diferente do que o precedeu. O produto
final parece ter uma especial unidade ou integridade de
planejamento, mas não se pode encontrar o ponto em que ela
repentinamente apareça. No mesmo sentido, um operante não é algo
que surja totalmente desenvolvido no comportamento do organismo.
É o resultado de um contínuo processo de modelagem.” (SKINNER,
1994:98).
O
processo
de
modelagem
basicamente
se
constitui
nos
seguintes
procedimentos:
•
Determinar objetivamente o comportamento a ser condicionado.
6
•
Observar quantas vezes o comportamento a ser condicionado é emitido
pelo indivíduo, em determinado espaço de tempo definido pelo
experimentador.
•
Escolher o tipo de reforço e os esquemas de reforços a serem utilizados
na modelagem.
•
Verificar, após o processo de modelagem, se o comportamento desejável
passou a ser ocorrer numa freqüência maior, se comparada a freqüência
observada no início do condicionamento.
2.1.3 Limitações do Behaviorismo
A teoria comportamentalista reflete uma concepção empírica do comportamento,
uma vez que seu pressuposto básico é o de que forças externas ao indivíduo são os
determinantes principais de seu comportamento, sendo este reduzido apenas aos seus
aspectos observáveis. Nessa concepção, qualquer comportamento pode ser previsto,
desde que se estabeleçam relações funcionais com o meio. O ser humano seria fruto de
uma modelagem, resultante de associações entre estímulos e respostas ocorridas ao
longo de sua existência. Tais associações implementam comportamentos, geram
atitudes, conceitos, preconceitos e valores. A teoria comportamentalista, não esclarece
processos mais amplos, como a formação das funções psicológicas superiores do
homem, tampouco trabalha com qualquer aspecto do inconsciente humano. Todavia, se
adapta perfeitamente aos objetivos deste trabalho, que tem como intuito trabalhar
apenas sobre o comportamento observável dos funcionários em seu ambiente de
trabalho.
Por outro lado, até que ponto é possível conseguir se modelar o comportamento?
Evidentemente, é muito difícil conseguir efetuar grandes alterações no ambiente para se
conseguir grandes mudanças do comportamento das pessoas. É isto que o governo tenta
fazer, quando cria uma nova lei para coibir ou incentivar uma certa prática da população
ou de parte dela. Por exemplo, quando aumenta os impostos sobre o Cigarro para
diminuir o consumo do mesmo. Todavia, nas empresas tem-se um ambiente
relativamente fechado, onde se pode definir valores e regras próprias. Assim, pode-se
lançar mão de diversos recursos para se obter um certo grau de controle sobre o
ambiente e sobre o comportamento dos indivíduos inseridos no mesmo.
7
2.2 O princípio dos interesses coincidentes
Neste ponto, chegamos à seguinte questão: Como definir quais as ações a serem
executadas sobre o ambiente? Chalegre esclarece que:
“Conduzir seres humanos significa dar a eles objetivos comuns.
Desencorajar as lutas internas. Premiar as condutas adequadas,
punir as prejudiciais aos objetivos”. Em outras palavras, devemos
trabalhar com o princípio dos interesses coincidentes. Este é “um
princípio do gerenciamento humano, que diz que as pessoas só agem
na mesma direção se os seus interessem coincidem. Portanto,
interesses divergentes geram comportamento conflitante. Interesses
convergentes geram espírito de equipe, esforços focados, resultados
muito melhores”. (CHALEGRE, 2001: 8)
Este ainda afirma:
“Sua aplicação inteligente pode melhorar muito a rentabilidade da
empresa e, com ela, a satisfação daqueles que ali se encontram.”
(CHALEGRE, 2001: 9).
Assim, antes de mais nada, o autor acima apresentado defende que a empresa
deve definir claramente quais são os seus objetivos (e assim definir os objetivos da
modelagem, a primeira etapa para a execução desta). Em seguida, as políticas internas
devem ser elaboradas de forma que não produza interesses divergentes entre entre ela e
os trabalhadores (em outras palavras, escolher o tipo de reforço e os esquemas de
reforços a serem usados). Apesar desta questão parecer relativamente simples, muitas
empresas na prática não se encontram sensíveis a questão. O caso comentado abaixo
ilustra essa questão:
“Em uma grande indústria, foi criado, pela logística, um modelo
econômico de entrega. Ele partia do princípio de que um lote único de
mercadoria saindo diretamente da fábrica e destinado a um varejista,
evitaria que fosse descarregado em um depósito de filial. Se
descarregado, manipulado novamente e reembarcado, seriam
acrescentados custos de operação e de armazenagem. A entrega
direta, ou com um único transbordo na doca, sem adentrar ao
estoque, significava poder cobrar um preço mais baixo do varejista.
O conceito era do interesse de todos. Entretanto, alguém teve a idéia
de reduzir também os custos de venda. Assim, a comissão foi reduzida
para 1/3 do normal sobre essas operações. Ocorreu que o pessoal de
vendas, embora treinado e incentivado verbalmente, passou
imediatamente a evitar qualquer negócio desse tipo. Predominou a
idéia de que se o pessoal vendesse parcelado, passando pelo estoque,
cobrando mais do cliente, ganharia três vezes mais. Como diria um
deles:
- Por que vou trabalhar contra mim mesmo? Minha família está
esperando em casa pelo dinheiro que eu ganho.” (CHALEGRE, 2001:
29).
8
Este é um típico caso onde o criador da regra de remuneração esquece-se do
princípio dos interesses coincidentes. O que ele criou foi um sistema sob medida para
desestimular a venda que a logística havia concebido. Estava tudo certo, menos a regra
de pagamento para os responsáveis por fazer com que os negócios tivessem êxito.
Analisando este caso sob a ótica behaviorista, percebemos que não houve uma
modelagem adequada, ou seja, o comportamento reforçado era o prejudicial a empresa,
onde o reforço era a comissão integral e o comportamento reforçado foi o de vender
parcelado, justamente o que era menos vantajoso para a empresa.
Para o estabelecimento de metas, é preciso que a empresa se faça algumas
perguntas. O interesse da empresa é exatamente igual ao comportamento que será
incentivado? Outros departamentos da empresa têm metas que conflitam com essas que
estão sendo criadas? Do contrário, pode-se provocar comportamentos de disputa, onde
para um ganhar outro tem de perder. Serão criadas forças destruidoras e conflitos
internos infindáveis. Quando isto acontece, a administração muitas vezes alega que são
os funcionários que não pensam no bem último da empresa, mas na verdade, são eles, a
administração, os criadores das regras conflituosas os responsáveis pelo comportamento
predatório.
Basicamente, o que deve ser feito é buscar estratégias gerenciais que consigam
gerar um esquema de reforço mútuo, e assim integrar funcionário e empresa nas ações
do dia-a-dia. Vem daí o imperativo de se conhecer as necessidades humanas para o bom
gerenciamento das empresas. Como nos ensina Skinner:
“Um esquema de reforço não só aumenta produtividade, mas também
aumenta interesse, moral e bem-estar do trabalhador. Qualquer
decisão concernente a uma escolha de esquemas se complica por este
fato. De qualquer modo poderemos agir inteligentemente nesta área
somente se possuirmos informação clara com relação à natureza e ao
efeito dos artifícios responsáveis pela manutenção do
comportamento.” (SKINNER, 1994: 112).
3. Metodologia
3.1 Embasamento metodológico
A execução do trabalho foi realizada por meio de estudo de caso. A escolha
desta estratégia de desenvolvimento de trabalho se deve ao fato de as características do
estudo de caso se encaixarem às características do objeto de pesquisa. Para Yin:
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“Estudo de caso é uma investigação empírica que investiga um
fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto inserido na vida
real, especialmente quando os limites entre os fenômenos e o contexto
não são claramente definidos.” (Yin, 1994:49).
Na tentativa de se evitar os excessos da quantificação nas ciências humanas,
desenvolveu-se a perspectiva de pesquisa chamada de qualitativa. Tal perspectiva é a
que será usado neste trabalho. É importante salientar que o termo “pesquisa qualitativa”
não possui um significado único e não pode ser entendido, de uma maneira simplista,
como sendo o oposto de quantitativo. A investigação qualitativa se estrutura na forma
de um diálogo entre o investigador e o sujeito.
A análise qualitativa tende a ser descritiva, não reduzindo a símbolos numéricos
as narrativas que são produzidas no contexto investigativo.
Para acompanhar tais
processos, o investigador não estaria munido de conclusões a priori a respeito do
observado, necessitando estar disponível para se envolver no imprevisível dos
encontros. Para Bogdan & Biklen, na dinâmica da pesquisa qualitativa:
“Não se trata de montar um quebra cabeças cuja forma final
conhecemos de antemão. Está-se a construir um quadro que vai
ganhando forma à medida que se recolhem e examinam as partes. O
processo de análise dos dados é como um funil: as coisas estão
abertas no início (ou no topo) e vão se tornando mais fechadas e
específicas no extremo. O investigador qualitativo (...) não presume
que sabe o suficiente para reconhecer as questões importantes antes
de efetuar a investigação” (Bogdan & Biklen, 1994:50).
Nessa perspectiva, a pesquisa qualitativa, privando-se de oferecer uma visão
unificadora e final da dinâmica das relações estudadas, pretende construir questões que
favoreçam o surgimento de outras formas de pensar não apenas os indivíduos, mas a
dinâmica das relações nas quais eles se engendram e se significam.
3.2 Execução metodológica
A empresa abordada trata-se de uma empresa que fabrica e vende seus produtos
para todo o país, através principalmente do telemarketing. Sendo assim, foram
analisados os métodos de motivação do sistema de venda por telemarketing passivo da
mesma, fundamental para a conquista de clientes. Inicialmente, foi estudada a estrutura
funcional nas suas divisões organizacionais e de funções. Esta análise englobou:
-
Organograma da empresa
-
Planos de carreira internos
-
Sistemas de pagamento (salários, bonificações, comissões, etc)
-
Sistemas de punição
10
-
Atribuições de metas
-
Regras e normas internas
-
Outros aspectos relevantes que surgiram no decorrer do trabalho
Estas informações foram obtidas através das entrevistas, onde ao mesmo tempo
que se perguntava sobre as regras, buscava-se perceber como estas impactavam no
comportamento do entrevistado e dos demais funcionários.
Por fim, todas as informações coletadas foram estudadas sob a luz da psicologia
Behaviorista e comparada com os postulados do príncipio dos interesses coincidentes,
para se avaliar se os comportamentos incentivados são realmente os que interessam à
empresa.
3.2.1 Entrevistados
Além do gerente do setor, foram entrevistadas duas atendentes, cujos perfis
seguem abaixo:
Atendente (a): Possui mais de 10 anos de casa, viu a empresa crescer e se
transformar. Não possui curso superior. Apresentou claros sintomas de stress físico e
psicológico, chegando a se queixar até mesmo de surdez de um ouvido. Disse várias
vezes, em entrevista, que o trabalho é extremamente estressante e muitas vezes se
mostrou receosa de fornecer alguma informação. Pretende sair da empresa assim que
puder.
Atendente (b): Está na empresa há alguns meses, é aluna da UFV da área de
humanas. Forneceu todas as informações sem nenhum receio. Pretende sair depois que
se formar.
4. Resultados
4.1 Ganho
Para efeito de padronização, denomina-se aqui por ganho o total financeiro recebido
por cada trabalhadora ao término de cada mês. É pago um valor fixo e uma comissão
porcentual fixa (1,5%) para cada produto vendido. Além disso, existem diversos prêmios e
punições, que serão discutidos no decorrer do trabalho. Nos primeiros meses é pago nada
mais que o salário de R$ 350,00, período considerado de experiência. Decorrido este tempo,
o salário fixo cai para R$ 280,00, que passa a ser complementado com as comissões e as
bonificações provenientes das vendas.
11
Como as comissões são recebidas apenas com o pagamento da ultima parcela, o
ganho mensal pode cair neste período. Além disso, alterações no valor do ganho mensal são
comuns em função de férias, feriados, etc.
4.2 Sistema de premiação e punições:
4.2.1 Informações gerais
Os prêmios são distribuídos em função do “gráfico de vendas”. Este se trata do
registro de todas as vendas dentro de determinado período. A atendente pode a qualquer
momento entrar na intranet da empresa e ver o gráfico de vendas seu e das demais. No dia 19
de cada mês fecha-se o gráfico daquele mês, e no dia 20 já se conta os pontos para o mês
seguinte. Cada produto vale um ponto no gráfico.
Existe um sistema de fila no atendimento, quando um telefonema é recebido, este vai
para a primeira trabalhadora da fila. Esta, após atender a ligação, automaticamente vai para o
fim da fila.
A diferença de preço entre os produtos é insignificante, tanto a entrevistada (a) quanto
a entrevistada (b) não souberam afirmar se existe diferença significativa de lucratividade
entre os produtos, mas o mais provável é que não haja, pois todos os produtos seguem uma
metodologia semelhante de produção. Assim, todos os critérios de premiação são em função
do número de produtos, não em função do valor destes.
4.2.2 Sistemas de pagamento da empresa
É a gerente quem define todos os sistemas de premiação, incluindo valores, reajustes,
etc. As metas em geral são impostas, mas a gerente se diz sempre aberta a sugestões.
Algumas vezes, uma nova regra é imposta. As funcionárias, mesmo sabendo que a
nova regra não irá funcionar, não se manifestam, esperando o resultado. Segundo (a):
“-Na empresa X, nada é negociado.”
Os sistemas de premiação são mudados freqüentemente e essa alteração, segundo a
entrevistada (a), causa cansaço, stress, etc. As mudanças são anunciadas com cerca de um
mês de antecedência. Segundo ela, a chefia diz:
“-Se você não é capaz de se adaptar as mudanças da empresa, você não serve para
ela.” Ou segundo a própria (a):
“- Não dizem que se a empresa não mudar, quebra? Então, temos que nos adaptar as
mudanças.”
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O sistema de bonificação já se alterou de coletivo para individual, depois voltou para
coletivo. Um dos problemas do coletivo era que umas vendiam muito mais do que as outras,
o que provocava frustração e atritos. Ao voltar a ser coletivo, a rotatividade dos membros
entre os grupos foi implantada para tentar se amenizar o problema.
Não existem metas fixas em termo de produtividade, pois existe uma sazonalidade
muito grande da demanda, principalmente em função da época do ano. Antes havia prêmios
para a atendente que mais vendeu na semana, e até mesmo para a que mais vendeu no dia,
mas tais prêmios foram retirados porque eram sempre as mesmas que ganhavam. Segundo a
entrevistada (a), o fator sorte interfere muito nas vendas, e um período tão pequeno de tempo
pode provocar distorções. Todavia, quando interrogada se só era uma questão de sorte,
porque sempre as mesmas ganhavam, ela insistiu que era apenas sorte, e que “falta de
capacidade não era”.
Havia também uma meta de que pelo menos 88% das ligações tinham que resultar em
uma venda. Sendo alcançado este valor, era concedida uma premiação em dinheiro.
Aparentemente, este número foi imposto. Essa premiação foi abolida porque a empresa tem
investido mais na venda ativa, e tem diminuído os ganhos dos trabalhadores da venda passiva
para forçar a migração do pessoal para este setor.
4.2.3 Sistema atual
4.2.3.1 Premiação
As atendentes foram divididas em três grupos distintos, cada um com
aproximadamente cinco pessoas (este número já foi maior, mas atualmente está ocorrendo
uma certa “migração” das trabalhadoras para o telemarketing ativo, por determinação da
gerência). Os grupos competem entre si e cada um dos grupos possui uma líder, que além das
funções normais, supervisiona as demais.
A líder é escolhida pela gerente do setor. Em geral é alguém com muito tempo de
serviço e que se destaca no trabalho. Segundo a entrevistada (b), as líderes têm sido sempre
as três que mais vendem, alternando-se entre si de um mês para o outro, mas a entrevistada
não soube informar se isso é coincidência ou não. Não há questionamento aparente das
demais quanto a seleção para esta função. Segundo a entrevistada (a), a líder ganha uma
porcentagem maior do prêmio que as demais, todavia a entrevistada (b) não pôde confirmar,
por nunca ter sido líder. A líder não tem nenhuma função a mais, além de ter de coordenar as
outras.
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Não existem metas impostas pela gerência para cada grupo, mas cada um deles define
“informalmente” metas individuais e metas diárias e/ou semanais. As líderes de cada grupo,
por conta própria, freqüentemente dão pequenos prêmios (bombom, pirulitos e afins) para
quem se destaca no grupo dentro de determinado período.
O grupo que vence o mês geralmente obtém a marca de pouco mais de 300 pontos. A
atendente que fica em primeiro lugar geralmente faz acima de 200 pontos, no geral. Há quem
faça 50, 100, 80, etc. Este recebe uma soma em dinheiro de R$ 160,00 que é dividida entre os
membros. Segundo a entrevistada (a), esse sistema é melhor que os anteriores por ser mais
completo, dentro do que se precisa na empresa. Mas ela diz não saber avaliar se este é o
melhor que poderia haver. De acordo com a entrevistada (b), existe muito questionamento
informal das atendentes quanto à divisão do bônus, pois elas acreditam que deveria ser mais
“linear” a relação contribuição nas vendas /bonificação. Além disso, existem prêmios
individuais, sendo que as cinco primeiras no gráfico de vendas ganham R$50,00 extras,
independente de em que grupo estão.
As atendentes que não ficam entre as cinco primeiras e não fazem parte do grupo
vencedor, não recebem nada pelos pontos obtidos. A entrevistada (a) diz que isto é justo; já a
entrevistada (b) acha que não.
Quando se trata de ligação de revendedores dos produtos (empresas que revendem os
produtos da empresa), em geral não se ganha ponto no gráfico, mas se ganha a comissão
(1,5% fixos) da mesma forma. As atendentes ficam felizes quando atendem esses
telefonemas, porque, em geral, são volumes maiores de venda, que, por sua vez, rendem uma
boa comissão.
4.2.3.2 Pagamento
Todas as premiações são pagas junto com o salário, não existindo forma de ser
realizada antes. Sendo que quando o cliente compra parcelado, a atendente recebe a comissão
apenas quando este quita a ultima parcela da compra. Estas têm autonomia para negociar o
número de parcelas (o valor total não muda de acordo o parcelamento), todavia são
orientadas ao valor mínimo das parcelas ser de R$40,00. Quando o cliente deixa de quitar
alguma parcela, não há o pagamento da comissão. A atendente pode saber que existem
débitos verificando o cadastro do cliente, mas em geral não há tempo para isso. A
inadimplência ocorre com certa freqüência. Evidentemente, os pontos no gráfico não são
afetados pela inadimplência dos clientes, visto que quando ocorre a inadimplência as
premiações já foram distribuídas. Devido a reclamações, tentou-se mudar este sistema, para
14
que se recebesse a comissão em cima de cada parcela paga, mas segundo a entrevistada (a), a
direção da empresa disse que “o programa de computador não aceitou”.
As atendentes que obtêm uma melhor remuneração recebem aproximadamente
R$800,00 por mês. A distribuição das remunerações segue apresentada na tabela 1.
Tabela 1 – Distribuição do ganho mensal recebido pelas atendentes que obtém melhor remuneração
Fonte
Salário fixo
Bônus individual
Bônus coletivo
comissões
Total
Valor
R$280,00
R$50,00
R$30,00
R$440,00
R$800,00
Contribuição
35%
6%
4%
55%
100%
4.2.3.2 Punições
O sistema de punição prevê um grande número de erros, todos passíveis de punição, e
geralmente se baseia na retirada de pontos do gráfico de vendas, o pessoal ainda ganhando as
comissões (% fixa). Segundo a entrevistada (a), caso aconteça algo não previsto, a gerente se
reúne com as demais e discutem qual a punição adequada à situação, mas a decisão final cabe
apenas a esta. Segue abaixo alguns exemplos da lista.
•
Se uma atendente não fecha um pedido por algum motivo, esta fica responsável de
ligar para o cliente para pegar os dados que faltam para fechar a venda. Caso ele ligue
primeiro e outra pessoa o atenda, a comissão e os pontos vão para a primeira, desde
que ainda não tenha vencido o período determinado para ela ligar (alguns dias) e que
o pedido já esteja pronto. Do contrario, quem atende receberá os pontos e a comissão.
•
Se tiver um pedido em não autorizado (pedido não concluído) ou orçamento
(fornecido ao cliente, que ainda não fechou a compra), a atendente tem que entrar em
contato num prazo máximo de 1 dia útil. Se a atendente não der nenhuma ligação para
o cliente em dois dias e o cliente ligar no terceiro dia, ela perde um produto no gráfico
de vendas. A partir de 3 dias a atendente perde 2 produtos no gráfico de vendas. Se o
cliente nunca mais ligar, o caso é analisado e pode ocorrer uma perda de pontos ainda
maior. Basicamente, a atendente tem que resolver todos os assuntos antes de sair de
férias, ou deixar alguém responsável. Se a responsável não ligar a primeira perde a
pontuação.
•
Se um cliente ligar dizendo que foi enviado produto errado e o erro for da atendente,
ela perde o produto que foi enviado errado mais 5 produtos no gráfico de vendas. É
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obrigação da funcionária conferir com o cliente o que está sendo comprado, logo, se
há falhas, a atendente nem se preocupa em se defender.
•
Se um cliente ligar reclamando que foi boleto errado ou desconto errado, perde-se 3
produtos.
•
Se uma atendente atender um cliente e não resolver o pedido, e por esse motivo o
mesmo não for enviado, perde-se perde 3 produtos no gráfico.
•
Se um pedido já foi concretizado e por algum motivo agarrou em cartão ou análise de
crédito perde-se 5 produtos no gráfico.
•
Se por engano um pedido contar para uma atendente num mês e a atendente ganhou
prêmio devido esses produtos, assim que detectar o erro, será tirado o mesmo número
de produtos que foi contado indevidamente e mais 10 pontos de punição, e o prêmio
será devolvido para a atendente que ganhou de fato. A única forma disto acontecer é
se for realizado um novo cadastro do mesmo cliente, a única pessoa a qual pode ser
atribuída à culpa é a própria atendente.
•
Se a atendente tiver consultado o cadastro do cliente no SPC e não registrar a consulta
no cadastro da empresa, e por isso for feita uma nova consulta, a atendente perde 1
produto no gráfico. Mesmo que seja pedido para pagamento na retirada do correio. Se
ela autorizar sem consultar ou se o cadastro não estiver ok e ela colocar ok, perde de 1
a 5 produtos no gráfico. Todas as consultas ao SPC ficam registradas, só não se
registra quem a fez, mas é possível se descobrir procurando quem realizou a venda
para o cliente que foi pesquisado.
•
Quem der desconto em produtos de promoção ou que é revenda, perderá 5 produtos
no gráfico de vendas. O grau de liberdade da atendente para dar descontos é sempre o
mesmo, se trata dos descontos promocionais que são anunciados desde o início, e
estão sempre disponíveis a todas. Quando o cliente deseja forçar uma negociação, a
atendente passa o cliente para a gerente, que tem um poder maior.
•
As atendentes que chegarem primeiro à empresa tem que testar o telefone assim que
chegar. Se não “cair na mensagem” (gravação informando pra onde a pessoa ligou e o
horário de funcionamento, a última a sair deve ligá-la e a primeira a chegar desligala), perde ponto as atendentes do período anterior. Caso deixar para testar mais tarde
(a partir de 10 minutos depois que chegar) e cair na mensagem, perdem ponto
também as atendentes que chegaram e não testaram o telefone. Perderá 5 pontos cada
atendente que trabalhou nos horários. Quando isto acontece, o pessoal sempre se
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preocupa em saber quem é a responsável. Quando as atendentes chegam e testam o
telefone e há problemas, elas acabam sempre denunciando, quer porque precisam de
ajuda de alguém pra religar, ou porque se perde tempo, etc.
•
A atendente que cometer erro e causar prejuízo maior a empresa perde no mínimo 10
produtos no gráfico ou não participará da premiação no mês que o erro for localizado.
•
Se uma atendente não conseguir de forma alguma localizar um cadastro de cliente
devido nome, endereço estiver errado, a atendente que fez o cadastro anteriormente
perderá 2 produtos no gráfico.
•
A atendente que não marcar pedido de revenda como tal (ou seja, não conta ponto no
gráfico de vendas) perde 10 (dez) produtos no gráfico independente da justificativa.
Essa medida foi adotada para evitar que se aja de má fé, pois uma atendente que por
sorte atenda um telefonema destes pode vender um grande volume de uma única vez,
distorcendo o resultado final do gráfico de vendas.
•
Quem esquecer de bloquear o telefone no horário de café, perde um ponto no gráfico.
O café não é obrigatório, mas raramente alguma deixa de ir. O tempo estabelecido é
de 10 min, vão sempre de três em três.
•
Se uma atendente ficar entre os três últimos lugares por três meses consecutivos ela
recebe aviso prévio. Durante este mês, ela tem uma ultima chance de melhorar o
desempenho, se não conseguir é demitida.
4.2.4 Outros
Existe um médico do trabalho que dá acompanhamento às atendentes. Ele sugere que
elas façam 10 min de descanso a cada hora, mas em geral não param pela competição
acirrada. É procedimento padrão de telemarketing, ao se afastar da cabine, desligar o telefone
(orientação até da gerente). Todavia, quando o telefone é desligado automaticamente se vai
para o fim da fila, então devido ao medo de perder vendas elas não desligam, e tem atitudes
como encher a garrafa d´água e voltar para o seu posto, esperar o telefone tocar para ir ao
banheiro e voltar correndo, etc.
Ocorre bastante rotatividade na empresa, mas cerca de 50% das atendentes estão no
quadro de funcionários há muito tempo. Os motivos de demissão geralmente são o perfil da
pessoa não agradar a empresa ou pelo baixo desempenho. Existem casos de profissionais que
trabalham apenas uma manhã e nunca mais voltam.
A empresa tem convênio com diversos pontos comerciais na cidade, onde o
empregado pode comprar para pagar com débito automático no salário.
17
Não existem reuniões das profissionais com a gerente para discutir o trabalho. O
próprio ambiente estressante faz com que não se queira ficar na empresa mais que o
necessário.
Repassar ligações de namorado, parentes, etc. são proibidas, a exceção das dos pais e
dos filhos. O uso de celular é proibido, o único tempo que elas têm para telefonar é no
horário do café, que não pode passar de 10 min, então segundo a entrevistada (a) “ou você
telefona, ou você toma café”.
A gerente ameaçou que vai elaborar um “termo de responsabilidade” para as
funcionárias assinarem, se comprometendo a não deixar sair nenhuma informação sobre a
empresa, e, caso isso acontecesse, elas seriam punidas.
Os erros são repreendidos não diretamente a quem os cometeu, mas ditos para todo o
grupo, sem se indicar quem é o culpado. Eventualmente, os grandes acertos são
parabenizados em público, mas isso segundo a entrevistada (a) “depende da pessoa, do dia,
etc”.
O único treinamento recebido pelas novatas consiste em acompanhar as que têm mais
experiência.
4.2.5 Dando voz às entrevistadas
•
As trabalhadoras não vêem uma chance de carreira no seu trabalho, pois não há
possibilidade de ascensão hierárquica:
“-Não tem como crescer, não enxergo como carreira, ninguém pretende ficar
pra sempre.” (entrevistada a).
•
Também não há um sentimento de reciprocidade de interesses entre a empresa e os
profissionais, por parte dos últimos:
“-A empresa (e as colegas de trabalho) presta atenção tanto nos esforços
quanto nos erros das atendentes, pois todo mundo observa todo mundo, e se
uma ver a outra errar, conta para a gerente”. (entrevistada b).
“- Você faz pra si”. (entrevistada a).
•
O estresse causado pelo trabalho é uma constante:
“-Trabalhar por produtividade é a coisa mais estressante que existe. As vezes
preferia trabalhar por salário mínimo e ter um trabalho tranqüilo. Não
adianta ganhar mais e gastar com médico e farmácia.” (entrevistada a).
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-> “-Se você entrevistar quem entrou agora, a pessoa vai estar muito mais
motivada que eu. Depois de dois ou três anos se começa a cansar.”
(entrevistada a).
“-Existe rivalidade, uma já chegou a chamar a outra de lesma, mas em geral
o clima é amistoso, a própria gerente pede isso.” (entrevistada a).
“Tem noites que eu nem consigo dormir, fico com o serviço na cabeça o
tempo todo. A gente é punida por muitas coisas, mas são punições pequenas,
e são coisas que causam transtorno ou prejuízo para a empresa. Tem que
pensar que a gente vai vender bem e não vai errar nada.” (entrevistada a).
“O que desmotiva é o estresse, não o prêmio.” (entrevistada b).
“-A opinião geral é que o sistema de punição é injusto, pois o número de
informações com o qual se trabalha é muito grande e erros acabam
acontecendo”. (entrevistada b).
“Você tem que conseguir vencer o cliente pelo cansaço, porque não sabe
quando vai atender outro telefonema.” (entrevistada b).
•
Quando a entrevistada (a) foi perguntada a respeito do fato de o ambiente ter sido
menos estressante no passado, inicialmente a resposta foi:
“-Não, porque diminuíram o numero de funcionários no setor”.
Mas logo em seguida:
“-Tá bom, vou te falar, ficou muito mais estressante sim, ficou muito mais
concorrido lá dentro.”
•
Outras observações interessantes foram:
“-Dá certo status trabalhar nesta empresa, quando você chega numa loja e
diz que trabalha lá, te olham com outros olhos.” (entrevistada b).
“-Quando tinha prêmios diários era bom, teve uma vez que ganhei R$ 120,00
em um dia e comprei uma bota que eu queria e que custava isso.”
(entrevistada a).
“-É, esta empresa é só nome mesmo... Quer dizer, não é não, lá é muito bom
pra trabalhar sim.” (entrevistada a).
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5. Discussão
Chalegre (2001) afirma que o sistema ideal deve ser baseado no trinômio fixo + metas
+ prêmios, idéia similar ao encontrado na empresa atualmente. Também afirma que o
pagamento por comissão é especialmente interessante para uma empresa no caso de
operadores de telemarketing, pois devido as suas limitações de tempo e ao valor
razoavelmente estável das vendas, podemos prever com razoável precisão o número de
negócios que se pode fechar e saber a variação que as comissões podem atingir. Todavia, a
parte que diz respeito às metas e aos prêmios poderiam ser reformuladas de forma a se
alinharem mais ao princípio dos interesses coincidentes.
A própria existência da extensa lista de erros e punições previstas demonstra que o
foco da empresa é muito mais em cima da punição do que no reforço, estratégia não
recomendada pelos Behavioristas. Enquanto a produtividade tem um teto de premiações, a
improdutividade pode gerar a punição máxima, que é a demissão. Uma sugestão é que ao
invés de se perder pontos no gráfico de vendas ao se cometer algum erro, as atendentes
poderiam ganhar algum pequeno prêmio ou até mesmo pontos no gráfico, se não cometessem
erros dentro de determinado período, como por exemplo, uma semana. Essa mudança,
aparentemente pequena, poderia diminuir muito o estresse psicológico associado aos erros
muitas vezes inevitáveis e acabar com o sentimento de perda de algo conquistado.
O sistema atual de prêmios, que para um grupo (um terço das profissionais) ganhar,
outros dois grupos (ou seja, dois terços das trabalhadoras) tem que perder, gera um clima
competitivo, aumentando o clima de rivalidade entre os grupos, ao mesmo tempo em que
potencializa os atritos internos, a medida que todas não produzirão igual. Além disso, o
prêmio tem um valor fixo e imposto, não associado à produtividade, e sim associado à vitória
sobre os outros grupos.
Um sistema de metas devidamente negociado (como, por exemplo, se o total das
vendas ultrapassar certa marca definida na negociação dos grupos com a gerência, todas
venham a ganhar um bônus) poderia ajudar a canalizar todas as energias nas vendas. Ao
mesmo tempo, mantendo-se o prêmio individual para as melhores vendedoras, poder-se-ia
evitar que as estas se sentissem trabalhando pelas demais.
Um sistema mais complexo de diferentes premiações para diferentes metas
alcançadas também poderia ser estudado, como a matemática de pagar sobre a raiz quadrada
de um determinado excedente de uma meta. Este método permite uma forte correção de
proporcionalidade entre o crescimento e os valores pagos em percentuais.
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Essas modificações também poderiam ter impacto positivo no treinamento das
novatas, pois certamente as veteranas teriam mais interesse em passar as suas experiências a
todas, (quer seja por treinamento formal ou informalmente) e não apenas para as que fazem
parte do seu grupo, o que se torna, evidentemente, um fator de igual interesse para a empresa.
O próprio fato de sempre as mesmas ganharem o prêmio individual levanta a suspeita a
respeito da possível existência de certas técnicas de venda desenvolvidas por algumas
atendentes e não transmitidas às demais, ao mesmo tempo em que pode gerar desmotivação
para as outras.
A definição de metas não poderá ser de forma alguma empurrada pela gerência.
Chalegre (2001) não apenas afirma que isto jamais deve acontecer, como também lembra que
as metas devem ser em função de algo controlável pelos trabalhadores envolvidos. Num
sistema de vendas, evidentemente, grande parte do poder de decisão vem do cliente,
principalmente num sistema de venda passiva, mais um motivo, então, para as metas serem
negociadas com atenção. As metas devem ter credibilidade e factibilidade, ou seja, terem um
embasamento correto e ser alcançável. Além disso, é fundamental que as profissionais
possam saber dos seus resultados e das demais. Assim, o gráfico de vendas existente na
empresa é o que Chalegre (2001) chama de “estado da arte” no campo de controle do
funcionário dos seus próprios resultados, sendo um aspecto muito positivo.
As premiações diárias e semanais, que foram tiradas por determinação da gerência,
certamente são benéficas. Não apenas Chalegre (2001) afirma que a premiação deve ocorrer
o mais rápido possível após a ação (ou o reforço ocorrer o mais rápido possível após o
comportamento operante a ser reforçado segundo os Behavioristas), como a própria criação
de premiações deste tipo informalmente pelas líderes mostra essa carência.
Ainda nesta questão do intervalo de tempo entre o comportamento e o prêmio, o
sistema de comissionamento em função da quitação da última parcela faz com que o prêmio
seja mais distante no horizonte do tempo (vai receber apenas dali a meses e ainda correndo o
risco de nem chegar a receber) podendo fazer com que se diminua o interesse nas vendas, por
parte das atendentes, em muitas parcelas, estratégia que para a empresa provavelmente é
viável.
Além disso, deve-se buscar um sistema estável de regras, em que as mudanças sejam
implantadas levando em consideração a solicitação dos próprios trabalhadores e avisadas
com a máxima antecedência possível, sendo tanto as mudanças quanto a data destas
negociadas.
21
A transparência da administração também deve ser buscada, e desculpas do tipo “o
computador não aceitou” certamente podem provocar frustrações nos trabalhadores.
Consideramos, também, que a remuneração psicológica, que trata do reconhecimento
do esforço dos trabalhadores poderia ser melhor utilizada. Apesar do gráfico de vendas
mostrar a todo o momento quem são as melhores, reforços positivos como o nome da melhor
do mês numa placa, premiação em público, ou pequenos brindes para se levar para casa e
mostrar para a família poderiam contribuir muito para o desempenho. Atualmente, o
reconhecimento público aparenta ser subjetivo, pois segundo a entrevistada (a) “depende da
pessoa, do dia, etc”.
Um aspecto positivo da remuneração psicológica percebido é que a empresa, sendo
tradicional e respeitada na cidade, faz com que as trabalhadoras se sintam importantes e
diferenciadas. Para se participar de uma empresa eficiente, deve-se ser funcionária eficiente.
A empresa oferece status, algo que tem grande potencial motivador.
Mesmo com as mudanças sugeridas, o ambiente ainda seria estressante, visto que esta
é uma característica inerente ao telemarketing e fator responsável pelo alto índice de
rotatividade na empresa. Como as admissões e demissões implicam em custos, um pequeno
bônus por tempo de contrato, poderia funcionar como um reforço positivo sobre a
permanência dos profissionais na empresa.
6. Conclusão
A empresa apresenta um sistema de premiações e punições de grande complexidade,
cujo resultado indubitavelmente interfere no comportamento dos seus trabalhadores. Apesar
de apresentar alguns pontos positivos, como o gráfico de vendas, premiações e comissões
além de um fixo, dá pouca abertura a negociações, sendo os sistemas de pagamentos
freqüentes mudados pelo método de “tentativa e erro”. Percebe-se claramente que este se
baseia muito mais nas punições do que em premiações (reforços), técnica desaconselhada por
todas as referencias bibliográficas utilizadas neste trabalho.
É de fundamental importância se trabalhar nos fatores causadores de estresses destas
profissionais, pois, mesmo sendo inerente a tal atividade, deve se buscar mantê-lo em níveis
controláveis. O próprio fato de o trabalho ser tão estressante dificultou o seu estudo, pois as
atendentes preferem não falar do trabalho fora dele, às vezes não querendo aprofundar em
alguns pontos. Este foi principalmente o comportamento de (a), possivelmente por estar a
muitos anos na empresa.
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Certamente alterações previamente estudadas, planejadas e discutidas com as
trabalhadoras poderiam trazer benefícios para ambas as partes, como diminuição da
rotatividade, do absenteísmo e aumento da produção, objetivo final deste trabalho.
7. Referências bibliográficas
BOGDAN, R. & BIKLEN, S. – Investigação qualitativa em educação.
Porto/Portugal: Porto Editora, 1994.
SKINNER, B. F. - Ciência e comportamento humano. São Paulo: Martins
Fontes, 1978.
CHALEGRE, P. - O principio do interesses coincidentes. Livro virtual.
(http://www.cesat.br/biblioteca/web/Administracao/livro.pdf,
2001),
capturado
em
05/04/2004.
YIN, R. K. - Estudo de caso, Planejamento e métodos. 2a ed. Porto Alegre:
Bookman. 1994.
23
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