Nós, estudantes, funcionários e docentes da Universidade Estadual de Campinas, que abaixo assinamos, vimos solicitar o estrito cumprimento da Lei Estadual 11.977, de 25 de agosto de 2005, que regulamenta a experimentação animal no Estado de São Paulo, bem como a fiscalização de sua aplicação por comissão independente e externa à universidade, pelas considerações que seguem: 1. A nota datada de 25 de outubro de 2013, abusivamente divulgada como nota oficial da Unicamp, sem que haja sido debatida e votada nas instâncias representativas das unidades e órgãos da universidade, alega que a experimentação animal nesta universidade cumpre as disposições contidas na lei federal 11.794/2008, deixando de prestar os esclarecimentos pelos quais, hoje, clama o público, e que nós, membros da mesma comunidade universitária, subscrevemos. 2. A administração silencia, notadamente, quanto à aplicação da Lei Estadual 11.977/05, em todos os aspectos, que não são poucos, em que a referida lei é suplementar e não colidente com a legislação federal. É o caso candente da comissão de ética – CEUA –, cuja composição a lei estadual prevê multifuncional, com representação docente e discente e, sobretudo, paritária, de modo a assegurar não apenas o direito à diferença no campo acadêmico, mas a representação e os direitos dos animais. A comunidade universitária tem direito a saber porque tal disposição não é cumprida, uma vez que ela sinaliza maior vontade política e inclinação democrática do que a composição prevista pela assim chamada Lei Arouca, incapaz de bem representar os interesses dos animais, por conter apenas um representante de entidade protetora de animais, em meio à presença hegemônica do setor experimental. Ademais, entendemos que, no interesse da transparência de uma instituição pública, as reuniões da CEUA deveriam ser abertas e suas atas, regularmente publicadas. 3. A Lei Estadual 11977/2005, capítulo IV, seção III, dirigindo-se a todos os cidadãos paulistas e residentes em São Paulo, que se opõem à violência contra seres vivos, regulamenta o direito à objeção de consciência, liberdade democrática inscrita no artigo 5o da Constituição Federal, para o caso da experimentação animal. Estabelece que é dever da instituição informar estudantes, funcionários e docentes quanto a seu direito de não participar de experimentos em animais, em virtude de convicção religiosa, filosófica ou política. Demandamos saber por que tal dever institucional não é cumprido, com a devida divulgação no Manual do Aluno ou outro meio utilizado pela Diretoria Acadêmica. 4. A Lei Federal 9.608, de 12 de fevereiro de 1998, criminaliza o experimento científico em animais, na existência de métodos alternativos. É de conhecimento público que instituições nacionais, como Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Faculdade de Medicina do ABC, e estrangeiras – na Inglaterra, nos Estados Unidos e no Canadá - , já aboliram experimentos didáticos, o que é evidência suficiente de que há alternativa para o ensino. Em vista disso, demandamos saber o motivo pelo qual, passados quinze anos da promulgação da referida lei, métodos alternativos ainda não substituíram os experimentos didáticos na Unicamp, situação que nos atira, a toda a comunidade universitária, na ilegalidade. 5. Os setores experimentais desta universidade devem ao público, que nos financia, detalhamento da proporção histórica entre pesquisa básica, com finalidade social, e prestação de serviços a empresas privadas, que envolvem a experimentação animal. Entendemos que a comunidade universitária e a sociedade civil têm o direito de se manifestar, em debate público, quanto à ética do financiamento público da criação de animais em biotério e experimentos com animais, cuja finalidade é o lucro, pela venda dos resultados ao capital privado. 6. Controversa, em termos legais, é também a modificação genética de cobaias com o fim de reproduzir linhagens propensas a doenças graves, como o câncer; o mesmo se aplica à reprodução de animais com doenças crônicas e hereditárias, como a hemofilia, uma vez que a Lei Estadual 1977/2005, em seu artigo 2o, parágrafo I, veda experiências que tragam “sofrimento ou dano aos animais, bem como as que provoquem condições inaceitáveis de existência”. 7. A Lei Estadual 11977/2005, artigo 25, parágrafo II, inciso 6, estabelece como dever da CEUA fiscalizar o bem-estar dos animais utilizados em experimentos, seja em biotério, abrigo e laboratório. A Lei Federal 11794/2008, artigo 5o, por sua vez, estabelece que o CONCEA deve fiscalizar as instituições de pesquisa. Demandamos publicidade imediata de tais relatórios ou as devidas explicações, em sua eventual ausência. 8. A Lei Estadual preconiza salvar a vida de animais submetidos a experimentos, admitindo a eutanásia apenas em casos irrecuperáveis. Estabelece, ainda, a Lei 11977/2005, em seu artigo 34, que um animal submetido a experimento não deva ser objeto de outra intervenção, ambas disposições secundadas pela Lei Arouca. Demandamos, pois, saber, pelo menos desde 2005, quantos animais foram submetidos a experimentos por ano nesta universidade, sua origem, espécie e o destino dado aos mesmos. Quantas vidas, foram, efetivamente, poupadas, desde 2005? Para onde têm sido encaminhados os animais sobreviventes? Estas são questões que, a nosso ver, devem ser respondidas com a transparência e a honestidade intelectual que pautam a ciência na democracia. Para tanto, demandamos que a Unicamp tome providências para a fiscalização independente, por comissão externa, que possa empreender o diagnóstico atual da experimentação animal praticada na instituição e que seus resultados sejam trazidos ao debate público, aberto à comunidade universitária e à sociedade civil, de modo que a sociedade seja profundamente consultada quanto aos limites éticos da ciência, que é feita em seu nome e com os recursos por ela gerados. Assinam este documento: Nádia Farage Professora Doutora, Departamento de Antropologia - IFCH Luiz Marques Professor Livre-Docente, Departamento de História - IFCH Omar Ribeiro Thomaz Professor Doutor, Departamento de Antropologia - IFCH Sidney Chalhoub Professor Titular, Departamento de História – IFCH Diego Amoedo Mestrando em Antropologia Social, PPGAS-IFCH, RA 099769 Silvio Seno Chibeni Professor Livre-Docente, Departamento de Filosofia - IFCH. Fernando Teixeira da Silva Professor Doutor, Departamento de História - IFCH Luísa Victória Pessoa de Oliveira Mestranda em Antropologia Social, PPGAS-IFCH, RA 062539 Paulo Victor Albertoni Lisboa Mestrando em Antropologia Social, PPGAS-IFCH, RA Bruna Rossetti Mendonça Mestranda em Antropologia Social, PPGAS-IFCH, RA Amnéris Maroni Professora Colaboradora, Departamento de Antropologia, IFCH Ângela Maria Carneiro Araújo Professora Doutora, Departamento de Ciência Política, IFCH Ângela Kageyama Professora titular colaboradora, IE Jorge Coli Professor titular, Departamento de História, IFCH Israel Ozanam de Sousa Cunha Doutorando em História, PPGH-IFCH, RA 123880 Sílvia Hunold Lara Professora titular, Departamento de História, IFCH Mauro William Barbosa de Almeida Professor livre-docente, Departamento de Antropologia, IFCH Ricardo de Sampaio Dagnino Doutorando em Demografia – IFCH – RA 040863