Comunicado 155 Técnico ISSN 9192-0099 Brasília, DF Dezembro, 2006 OCORRÊNCIA DE ALBINISMO EM EMBRIOGÊNESE SOMÁTICA REPETITIVA EM Brachiaria brizantha. G. B. Cabral1 C.G. Santana2 V.T.C. Carneiro1 D.M.A. Dusi1 K.Matsumoto1 Palavras-chave: Albinismo, Braquiária, Embriogênese somática Repetitiva, 1 2 Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia. [email protected] Universidade de Brasília. Introdução O gênero Brachiaria possui cerca de 100 espécies forrageiras e é originário da África Tropical. No Brasil, essas espécies demonstraram uma grande capacidade de adaptação às mais variadas condições de ambientes, ocupando atualmente uma área de pastagens de cerca de 50 milhões de hectares. Este gênero é extremamente importante pois viabilizou a pecuária de corte nos solos ácidos e de baixa fertilidade, constituindo a base das pastagens cultivadas em solos brasileiros, tendo desencadeado o desenvolvimento da indústria de sementes e levado o Brasil a ser o maior exportador desse insumo para o mundo tropical (VALLE et al., 2000). A braquiária apresenta dois modos de reprodução, um sexual e outro apomítico facultativo, sendo este último o mais freqüente. Enquanto a reprodução sexual gera variabilidade genética na progênie pela fusão de gametas reduzidos (n), na apomixia ou agamospermia ocorre a produção de embriões e sementes viáveis originários de oosfera não reduzida (2n), originando clones da planta-mãe. Em Brachiaria a apomixia é do tipo aposporia, na qual o saco embrionário não reduzido é originado de células somáticas do óvulo, as células do nucelo que se diferenciam em “iniciais apospóricas” (ARAÚJO et al., 2000; ALVES et al., 2001; DUSI et al., 2004). Em B. brizantha, dos 275 acessos naturais já caracterizados, apenas um foi classificado como sexual, sendo o mesmo diplóide (BRA002747) e o restante classificado como apomíticos apospóricos facultativos. Em gramíneas a apomixia está associada à poliploidia (VALLE e SAVIDAN, 1996). A EMBRAPA tem um programa de melhoramento genético de Brachiaria, sendo uma das principais demandas a melhoria da qualidade nutricional das forrageiras e a resistência a pragas e doenças. Entretanto os melhoristas enfrentam restrições devido às plantas apomíticas serem poliplóides, mais comumente tetraplóides, e às plantas sexuais serem diplóides. Além da barreira da diferença de ploidia, e da reprodução apomítica não gerar variabilidade genética, as plantas apomíticas podem ser utilizadas apenas como doadoras de pólen, ou seja, como progenitor masculino. As espécies de maior importância como forrageira são as apomíticas tetraplóides, B. brizantha cv. Marandu e B. decumbens cv. Basilisk (VALLE et al., 1994). As técnicas de biologia molecular e celular - cultura de tecidos - são ferramentas poderosas para introduzir por transformação genética características desejáveis em plantas como braquiária, que apresentam as limitações supracitadas, auxiliando o melhoramento genético clássico. O sucesso da transformação estável depende da capacidade de regeneração in vitro da espécie em estudo. A regeneração de plantas pode ocorrer por embriogênese somática ou organogênese. No caso de Brachiaria brizantha a via de regeneração mais estudada tem sido a embriogênese somática. Lenis em 1998, desenvolveu uma metodologia de regeneração de plantas por embriogênese somática usando embriões isolados de sementes maduras de B. brizantha. A eficiência de formação de calos embriogênicos no meio M1 relatada por Lenis foi de 76%, considerando o número de embriões apomíticos isolados e inoculados no meio de cultura, e o número de embriões apomíticos isolados que formaram calos. Quanto à obtenção de brotos, a modificação dos meios de cultura M1.2/MS2 em lugar de M1/MS1 definidos por Lenis, levaram a um aumento de 54% de número de brotos obtidos em relação ao número de embriões plaqueados. A porcentagem de obtenção de brotos chegou a 67% com a modificação dos meios de cultura (SILVEIRA et al., 2003). Neste estudo foram utilizadas sementes maduras, ao contrário dos trabalhos anteriores, nos quais eram usados como explantes os embriões isolados das sementes maduras, e a combinação de meios MSCLind/MSCLreg para indução de calos embriogênicos e manutenção desses calos em embriogênese somática repetitiva. Este trabalho teve como objetivo tornar a indução da embriogênese somática mais homogênea e sincronizada quanto ao aumento do número de células competentes para regeneração e transformação genética, utilizando a embriogênese somática repetitiva. O aprimoramento das técnicas de cultura de tecidos de Brachiaria proporcionará o domínio de metodologias biotecnológicas que auxiliarão o melhoramento genético, fornecendo meios para a caracterização da função de genes envolvidos com a reprodução apomítica, e para a introdução de genes de interesse agronômico. Material e Métodos Cultura de tecidos Material vegetal Sementes de Brachiaria brizantha cultivar Marandu (acesso BRA000591), apomítica tetraplóide (2n=4x=32) foram cedidas pela Dr. Cacilda Borges do Valle – EMBRAPA Gado de Corte. Indução de embriogênese somática Após a retirada da pálea, as sementes foram desinfestadas por 5 minutos em álcool comercial 70% e por 40 minutos em hipoclorito de sódio 5%, em seguida foram lavadas três vezes com água destilada esterilizada. Logo após as sementes foram inoculadas (10 sementes por placa de Petri) em meio de indução de embriogênese somática – MSCLind - tendo sido incubadas em câmara de crescimento no escuro a 27±2ºC por 30 dias. Embriogênese somática repetitiva Calos embriogênicos foram subcultivados em meio de indução – MSCLind - por um período de 5 meses no escuro a 27±2ºC. Ao longo deste período, a cada trinta dias, calos de aspecto friável granular foram selecionados e subcultivados em meio MSCLind. A partir do quarto mês de subcultura, alguns desses calos foram transferidos para o meio de regeneração - MSCLreg. RESULTADOS E DISCUSSÃO Indução de embriogênese somática Calos embriogênicos tiveram origem no escutelo do embrião da semente apomítica após 15 dias de cultura na presença da auxina 2,4-D. Este sistema de embriogênese somática utilizando sementes maduras de B. brizantha demonstrou maior praticidade em relação ao sistema descrito por Lenis (1998) e Silveira et al. (2003), visto que o isolamento de embriões além de ser bastante laborioso, pode favorecer a contaminação. A indução de calos embriogênicos ocorre de forma bastante heterogênea, havendo diversos tipos de calos e diferentes estágios de desenvolvimento dos embriões somáticos, o que implica uma não sincronização das células com potencial embriogenético, dificultando o processo de transformação. Embriogênese somática repetitiva Calos subcultivados por um período de cinco meses formaram calos friáveis que originaram escutelo do embrião somático (EES) isolados, ou seja, um escutelo formando um embrião, distribuídos ao longo dos calos de forma homogênea (Figura 1A). Os EES apresentavam coloração branca opaca, enquanto os embriões somáticos propriamente ditos eram de cor creme brilhante, com aspecto perolado (Figura 1B). Esses calos quando transferidos para meio de regeneração apresentaram anormalidades e retardamento na elongação e germinação dos embriões somáticos, levando cerca de 80 dias (Figura 1C), quando normalmente a formação dos brotos pela germinação dos ES leva em média 15 dias. Os embriões que mantiveram a capacidade de germinação produziram brotos albinos numa freqüência de 100% (Figura 1D). A ocorrência de albinismo em embriogênese somática repetitiva de B. brizantha pode ser devida (1) à concentração da auxina 2,4-D na concentração 3mg/L ou (2) ao longo período aos quais os calos foram submetidos à auxina, inibindo a diferenciação de pro-plastídeos ou etioplastos em cloroplastos. Visando reduzir a concentração do 2,4-D no meio de manutenção dos calos embriogênicos, alguns calos foram induzidos e subcultivados em meio MSCLind suplementado com 1 ou 2mg/L de 2,4-D por um período de 4 meses. Estes calos desenvolveram uma grande quantidade de raízes, produziram calos friáveis que não formaram embriões e não regeneraram brotos, e apresentaram 70% de oxidação. Estes resultados indicam que a redução do 2,4-D em meio indutor desfavorece a produção de calos embriogênicos em B. brizantha. Apesar da obtenção de calos embriogênicos homogêneos e sincronizados, a manutenção desses calos em meio de indução por apenas quatro meses foi determinante na redução da capacidade de germinação dos embriões. Quando ocorreu germinação dos embriões somáticos todos os brotos eram albinos, indicando a inviabilidade de utilização do sistema de embriogênese repetitiva para B. brizantha devido à impossibilidade de manutenção das culturas a longo termo. Segmentos basais de brotos albinos oriundos de embriogênese somática repetitiva foram cultivados em meio LS, que é suplementado com altas concentrações de citocininas, visando à reversão do albinismo pelo favorecimento da diferenciação de proplastídeos em cloroplastos funcionais. Os segmentos basais desenvolveram multibrotações albinas, indicando que as citocininas foram eficientes na indução de brotação de gemas pré-existentes na região meristemática, mas não sendo eficiente para diferenciação dos proplastídeos. Em cevada foi reportada a presença de plântulas albinas nos cultivares de primavera pela presença da auxina 2,4-D (CHO et al., 1998). Enquanto quem em cultivares de arroz a freqüência de albinismo pode variar de cinco a 100% dependendo das condições de cultura e do tempo de permanência no 2,4-D. Plantas regeneradas de calos de um mês em cultura eram verdes, enquanto aquelas regeneradas de calos induzidos por 11 meses eram 100% albinas (KAWATA et al., 1995), indicando que as monocotiledôneas são mais sensíveis ao efeito de 2,4-D em períodos mais longos de cultura. Apesar da obtenção de um sistema sincronizado de regeneração, este sistema demonstrou-se inviável devido à produção de plântulas albinas. Conclusão O sistema de embriogênese repetitiva foi testado para B. brizantha e demonstrou ser bastante homogêneo e sincronizado quanto à formação de embriões somáticos. No entanto, uma vez que a manutenção dos calos em subcultivos de apenas cinco meses resultou em 100% de plântulas albinas, a utilização deste sistema para transformação genética fica inviabilizada. Figura 1. A) Calos embriogênicos oriundos de embriogênese repetitiva bastante homogêneos após 4 subcultivos em MSCLind. B) EES com coloração branca opaco e os embriões somáticos de cor creme brilhante, com aspecto perolado. C) ES em meio de regeneração apresentando anormalidades e retardamento na elongação e germinação. D) Multibrotação de plântulas albinas em meio LS. Referências Bibliográficas ALVES, E. R.; CARNEIRO, V.; ARAUJO, A. Direct evidence of pseudogamy in an apomictic Brachiaria brizantha (Poaceae). Sexual Plant Reproduction, New York, v. 14, n. 4, p. 207-212, 2001. ARAUJO, A. C. G.; MUKHAMBETZHANOV, S.; POZZOBON, M. T.; SANTANA, E. F.; CARNEIRO, V. T. C. Female gametophyte development in apomictic and sexual Brachiaria brizantha (Poaceae). 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Dissertação (Mestrado em Ciência Animal e Pastagens) - Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (EZALQ), Piracicaba, SP. SILVEIRA, E. D.; RODRIGUES, J. C. M.; CABRAL, G. B.; LEITE, J. A.; COSTA, S. S.; CARNEIRO, V. T. C. Evaluation of exogenous promoters for use in Brachiaria brizantha transformation. Journal of Plant Biotechnology, v. 5, n. 2, p. 87-93, 2003. VALLE, C. B. do; EUCLIDES, V. P. B.; MACEDO, M. C. M. Características das plantas forrageiras do gênero Brachiaria. In: SIMPÓSIO SOBRE MANEJO DE PASTAGEM, 17., 2000, Piracicaba. Anais... Piracicaba: FEALQ, 2000. p. 2164. VALLE, C. B. do; GLIENKE, C.; LEGUIZAMON, G. O. C. Inheritance of apomixis in Brachiaria, a tropical forage grass. Apomixis Newsletter, v. 7, p. 4243, 1994. VALLE, C. B. do.; SAVIDAN, Y. H. LENIS, S. J. Desenvolvimento de um método de transformação genética de Brachiaria spp, por bombardeamento de partículas. 1998. 131 p. Dissertação (Mestrado) - Departamento de Biologia Celular, Universidade de Brasília, Brasília. Genetics, sutogenetics and reproductive RODRIGUES, D. C. Produção de forragem de cultivares de Brachiaria EMBRAPA-CNPGC, 1996. p. 147-163. biology of Brachiaria. In: MILES, J. W.; MAASS, B. L.; VALLE, C. B. do. (Eds). Brachiaria: improvement. Biology, Cali: Agronomy, CIAT; and Brasília: Comunicado Técnico, 155 Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento Exemplares desta edição podem ser adquiridos na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia Serviço de Atendimento ao Cidadão Parque Estação Biológica, Av. W/5 Norte (Final) – Brasília, DF CEP 70770-900 – Caixa Postal 02372 PABX: (61) 34484673 Fax: (61) 3340-3624 http://www.cenargen.embrapa.br e.mail:[email protected] 1ª edição 1ª impressão (2006): Comitê de Publicações Expediente Presidente: Sergio Mauro Folle Secretário-Executivo: Maria da Graça Simões Pires Negrão Membros: Arthur da Silva Mariante Maria da Graça S. P. 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