Periodicidade: semanal Temática: Cultura Avante Classe: Informação Geral Dimensão: 1493 03­12­2015 Âmbito: nacional Imagem: S/Cor Tiragem: 50000 Página (s): 27 Companhia de Teatro de Almada estreia amanhã A Tragédia Optimista Adifícil do Novo criação ATragédia Optimista passa se olhos até à morte se for preciso Nos primeiros meses do poder soviético como no momento em que Vichnievsky escreveu A Tragédia Optimista os bolcheviques durante a Guerra Civil Russa 1918 21 e tem como pano de fundo um regimento de marinheiros que pela uma jovem comissária bolchevique procura atrair para a linha política do Partido — confrontaram se com desafios imensos e inéditos para os quais não existiam respostas fáceis Tal qual garante vai «até onde for preciso» como aconteceria nos anos 30 com Longe de ser uma peça histórica a obra de Vsevolod Vichnievsky põe em confronto o individual e o colectivo a abnegação revolucionária e o niilismo abstencionista a transformação da realidade concreta e o idealismo utopista Carneiro Gustavo a industrialização e a colectivização da agricultura também o «comunismo de guerra» e a reintrodução da disciplina militar impostos pouco depois da Revolução de Outubro para fazer face à agressão estrangeira e à reacção interna suscitaram divisões em sectores políticos e sociais mais fazer com esta vida Para Queo Rodrigo Francisco esta encenador é a grande questão que perpassa pel A Tragédia Optimista que vacilantes e mesmo entre bolcheviques Vichnievsky trata magistralmente o assunto nos debates que retrata estará em cena no Teatro Municipal Joaquim Benite em Almada entre 4 e 13 de Dezembro Na opinião daquele que é também director da Companhia de Teatro de Almada a entre a comissária e os marinheiros De um lado está a jovem comunista que não sem dúvidas e inquietações compreende que o caminho para a sociedade sem obra de Vichinievsky responde sem classes não se faz sem obstáculos e ambiguidades mas também sem recuos do outro estão os moralismos inseri la em algo maior num movimento de luta pela transformação revolucionária da sociedade A Tragédia Optimista passa se a bordo de um navio soviético da frota de Cronstadt em plena Guerra Civil que opôs os bolcheviques à reacção interna conluiada com a «Santa Aliança» de países capitalistas que os comunistas acabariam por vencer em 1921 E para aí que segue uma jovem comissária enviada pelo governo soviético com a missão de ganhar a tripulação para a causa da revolução socialista e para o combate aos «brancos» A fim de concretizar estes objectivos a jovem comunista terá que acabar com a paralisante influência anarquista que predominava entre os marinheiros transformar a tripulação num verdadeiro regimento porventura de combate e reintroduzir sob apertada vigilância o comando do antigo oficial em prol da eficiência militar O conflito permanente entre o interesse individual e o bem comum o é um dos temas que atravessa toda a peça até ao triunfo do segundo sobre o primeiro consumado na cena final Aqui os marinheiros avançam para o fuzilamento certos de que «a morte não existe» pois «enquanto houver um marinheiro vivo toda a frota está viva» A própria comissária seguindo à frente dos homens para o trágico fim enfrentou o com coragem «Bem sabemos que a liberdade tem um preço Foi um preço que aceitámos e não vai ser o medo da morte que nos fará recuar A bravura da comissária e dos marinheiros está longe de ser uma mera cena teatral heróica antes expressa uma realidade tantas vezes repetida no processo da revolução soviética Vichnievsky foi ele próprio um combatente esteve nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial participou nos combates revolucionários de Fevereiro e Outubro de 1917 e foi parte activa na criação do Exército Vermelho mais tarde estará como correspondente do Pravda na heróica Leninegrado durante o cerco nazi Quer nos campos de batalha quer nas imensas tarefas de edificação do socialismo o autor presenciou — e protagonizou exemplos de entrega e abnegação sem limites à causa da emancipação dos trabalhadores e dos povos Longe de ser exclusivo dos bolcheviques russos este heroísmo é marca distintiva dos comunistas de todo o mundo Na guerra civil espanhola ou durante a ocupação nazi de França por exemplo militantes comunistas enfrentaram o pelotão de fuzilamento com punhos cerrados e cantando A Internacional em Portugal ou no Chile vários morreram na tortura para não denunciarem os seus camaradas em vários países asiáticos africanos e americanos muitos tombaram com armas na mão a lutar pela independência e a liberdade dos seus povos Muitos não tiveram que pagar tão elevado preço pela sua luta mas estavam dispostos a isso se tal opção tivesse sido colocada Não há caminhos fáceis A dedicação da comissária para quem vale a pena morrer para «salvar os homens da miséria e da escravatura» choca com a postura do marinheiro Alexei consciente da realidade mas assumindo perante ela uma atitude passiva Uma conversa entre ambos revela as diferentes posições que evoluem com o texto o marinheiro que já antes garantira que «o meu partido é não ter partido» assume que «querer mudar os homens é marrar contra uma parede» pois «continuamos aferrados ao que é nosso» a comissária confronta o «E tu vês isso tudo e não queres saber E preciso gritar aos ouvidos de cada um Estás a ficar sem a tua parte Estás a ser roubado E se mesmo assim ele ainda não entender é preciso agarrá lo pelo toutiço a esse piolhoso levantar lhe a cara da lama e dizer lhe levanta a cabeça porra Enfrenta o inimigo olhos nos marinheiros anarquistas inicialmente indisponíveis para tudo o que não fosse o usufruto total e imediato da uberdade conquistada mesmo que o preço a pagar fosse a perda completa dessa mesma liberdade que ocorreria caso os «brancos» saíssem vitoriosos da guerra A história deu razão à comissária o percurso para a nova sociedade e para o novo homem foi mais conturbado do que se poderia imaginar mas nada apaga o facto de os bolcheviques terem dirigido a mais profunda de todas as revoluções que abriu as portas a conquistas políticas económicas sociais e culturais sem precedentes na Rússia e no mundo A Tragédia Optimista é uma estreia absoluta em Portugal A peça original escrita em 1932 e representada no início do ano seguinte venceu um concurso de teatro comemorativo dos 15 anos do Exército Vermelho Ela seria reescrita por duas vezes em 1937 por sugestão de dramaturgos como Máximo Gorki e a segunda em 1945 para integrar alterações inspiradas nos acontecimentos da Segunda Guerra Mundial A versão que subirá ao palco almadense é no essencial a original — que para encenador é a «mais interessante e complexa» Mas ela acolhe também alguns elementos das variantes posteriores e diversas referências sonoras e visuais à nossa Revolução de Abril