Morungaba Quântica – encontro 5: Quem é Eu? Qual o Caminho do Fóton? Todos sabemos quem somos: um corpo animado de pensamento, sentimento, vontades, etc. Há dez anos cada um de nós era bem diferente do que é hoje, mas a maioria concorda que somos o mesmo indivíduo, mantemos nossa identidade. Há, porém, alguns problemas com essa concepção: em certas doenças neurológicas, podemos agir como se tivéssemos duas mentes separadas. E o que aconteceria se uma cópia perfeitamente semelhante de você fosse gerada agora: você aceitaria sua própria morte? E o paradoxo da cerveja: se seus pais tivessem tomado uma cervejinha a mais naquela noite em que você foi concebido, quem estaria aqui agora? Um experimento psicológico foi recentemente veiculado da mídia, em que um sujeito passa a agir como se o seu corpo estivesse em outro lugar. Ver matéria em português em: http://www.agencia.fapesp.br/boletim_dentro.php?id=7648, e uma versão em inglês em: http://news.bbc.co.uk/2/hi/health/6960612.stm. Discutimos este experimento, e fizemos em nossa reunião uma versão simplificada dele, em que sentimos nosso próprio nariz longe do corpo! (Este experimento foi extraído do livro de Vilayanur Ramachandran, Fantasmas no Cérebro.) Essas constatações indicam que a nossa noção de “eu” [self, em inglês] é construída pelo cérebro, e que tal representação do “eu” pode ser alterada em condições especiais. Um dos primeiros a salientar isso foi o filósofo escocês David Hume, em um trecho que pode ser consultado no saite http://www.fflch.usp.br/df/opessoa/Hume-Tratado-I-iv-vi-1a7.pdf. Hume adota uma posição conhecida como fenomenalismo, que defende que a única realidade da qual podemos partir são as percepções sensoriais. Assim, ele discorda do materialismo, pois a noção de “matéria” seria uma construção metafísica que vai além dos fenômenos observados; ele também não aceita que faça sentido dizer que existe uma mente ou uma alma, a não ser por força do hábito. A rigor, só faz sentido dizer que existem sensações. Outro pensador que defendeu esta posição foi Ernst Mach, com seu “monismo neutro”, e uma visão semelhante se encontra no budismo. Na arte, essa visão metafísica lembra o impressionismo. Um ponto de vista próximo do fenomenalismo é adotado pela interpretação ortodoxa da teoria quântica, que começamos a estudar. No Encontro 4, estudamos o “interferômetro de Mach-Zehnder”, que faz toda luz incidente ser detectada em um único detector. Porém, já vimos que se a fonte de luz for bem fraca, e o detector bem sensível, a luz aparecerá em quantidades discretas de energia, chamadas “fótons”. A pergunta agora é: enquanto o fóton estava dentro do interferômetro, onde ele estava? Supondo que o fóton segue uma trajetória bem definida, ele poderia ir ou pelo caminho A ou pelo caminho B. Se o fóton segue pelo caminho A (ver item a da figura abaixo), ele incide no espelho semi-refletor S2 e pode ser detectado ou em D1 (50% de probabilidade) ou em D2 (50%). Se o fóton segue por B (item b da figura), também teríamos 50% de chance de detectá-lo em D2. Agora, se o fóton estivesse ou em A ou em B, continuaríamos a ter uma probabilidade de 50% de detectar o fóton em D2. Isso segue da própria definição do conectivo lógico “ou”: se em A é 50% e em B é 50%, então em “A ou B” tem que ser 50%. No entanto, vimos que no 8 experimento do encontro passado, para um único fóton, a probabilidade de o fóton atingir D2 não é 50%, é 0%! Assim, somos obrigados a concluir que é falsa a afirmação de que o fóton está ou em A ou em B! Isso é incrível! A luz é detectada na forma de partículas, e esperaríamos que tais partículas existissem durante a propagação da luz, seguindo trajetórias bem definidas (mesmo que desconhecidas). No entanto, parece que chegamos à conclusão de que os fótons não seguem trajetórias bem definidas. Como sair desse impasse? Diferentes respostas a essa questão serão dadas pelas diferentes interpretações da teoria quântica... Encontro realizado na Associação Morungaba em 19 de setembro de 2007. 9