Vasculite sistêmica associada à infecção Alexandre W. S. de Souza Unifesp-EPM Discussão • Diferenças clínicas entre os sorotipos da hepatite C? • Vasculite associada à hepatite C com dosagens de crioglobulinas negativas • Quando e como tratar a hepatite C? • Terapia imunossupressora em paciente com vasculite severa associada à infecção Vasculites sistêmicas • Grupo heterogêneo de doenças raras • Inflamação e necrose da parede vascular • Manifestações clínicas – – – – – Tamanho do vaso Leito vascular acometido Extensão do acometimento Sinais e sintomas inespecíficos Início subagudo • Superposição de manifestações Sistemas de Classificação • Primárias ou secundárias – – – – Infecções Medicamentos Neoplasias Doenças reumáticas autoimunes • Sistêmicas ou isoladas • Mecanismo fisiopatológico • Vasculites não classificadas Sistemas de Classificação • Classificação de Chapel-Hill Jeanette JC et al. Arthritis Rheum 1994;37:187. Vasculites & Infecção • • • • • • • • Vírus HBV HCV HIV Varicela Eritrovírus B19 CMV HTLV-1 • Bactérias/fungos/protozoários – Imunocomplexos • Eritema nodosum leprosum – Invasão direta da parede do vaso – Vasculite necrotizante • Pseudomonas aeruginosa • Legionella pneumophila • Fusobacterium necrophorum – Aneurismas micóticos Pagnoux C et al. Clin Exp Rheumatol. 2006;24(Suppl 41):S71. Vaculites & Infecção Vírus Vasculite HCV Vasculite crioglobulinêmica PAN HBV PAN Vasculite crioglobulinêmica HIV PAN Vasculite cerebral Aneurismas de aorta Varicela-zóster Vasculite cerebral Vasculite retiniana e cutânea Eritrovírus B19 Vasculite leucocitoclástica cutânea PAN? CMV Vasculite sistêmica – imunossuprimidos HTLV-1 Vasculite retiniana, SNC ou cutânea Pagnoux C et al. Clin Exp Rheumatol. 2006;24(Suppl 41):S71. HCV • • • • • Vírus de fita única de RNA Seis genótipos (30 subtipos) Hepatite aguda assintomática Progressão para hepatite crônica 77-85% Manifestações extra-hepáticas 40-74% HCV – Manifestações extra-hepáticas Antonelli A et al. Clin Exp Rheumatol 2008;26(1 Suppl 48):S39. Fisiopatologia Hepatopatia crônica Hepatócitos HCV Proteína E2 CD81 Linfócito B Manifestações extrahepáticas BLyS Diminuição do limiar de ativação policlonal Autoanticorpos Crioglobulinas Linfoma não Hodgkin Vasculites & HCV • Crioglobulinas: 40-60% dos pacientes com HCV. • Fatores de risco para crioglobulinemia: – – – – – Sexo feminino Consumo > 30g/dia de álcool Fibrose extensa Genótipos II e III HLA: DR11, DR3, DR4, B8+DR3. • Pacientes com HCV e crioglobulinemia + – Artralgias, fadiga e púrpura palpável – Vasculite crioglobulinêmica : 5-10%. • Vasculite crioglobulinêmica HCV + em até 80% dos casos Crioglobulinemia • Tipo I: Ig monoclonal, só uma classe ou subclasse de cadeia pesada ou leve, altos níveis e precipitação rápida. • Tipo II: crioglobulinas mistas policlonais com componente monoclonal com atividade de fator reumatóide. • Tipo III: crioglobulinas mistas policlonais, heterogêneas, várias classes de Igs, baixos níveis e precipitam lentamente. Brouet et al. Am J Med 1974;57:775. Alb Alb Alb Vasculites & HCV • Fatores de risco para vasculite crioglobulinêmica – – – – – Idade avançada Maior duração da hepatite C Crioglobulinemia mista tipo II Maiores níveis de crioglobulinas Expansão clonal de linfócitos B • Fatores prognósticos da vasculite crioglobulinêmica – Idade > 60 anos – Envolvimento renal – Maior extensão da vasculite Sene D et al. J Rheumatol 2004;31:2199. Ferri C et al. Arthritis Rheum 2004;33:355. Vasculite crioglobulinêmica – Manifestações • • • • Púrpura palpável Ulceras dolorosas de MMII Artrite Glomerulonefrite – GN membranoproliferativa • Polineuropatia periférica – Distal – Sensitiva – MMII > MMSS • Síndrome seca •Polineuropatia periférica sensitivomotora e axonal •Púrpura de MMII e glúteos •FRy •Livedo reticular •Infecção pelo HCV (F1A0) •Polineuropatia periférica sensitivomotora e axonal •Púrpura de MMII e glúteos •FRy •Livedo reticular •Genótipo 1A •Vasculite leucocitoclástica •FR positivo (350UI/mL) •Ausências •Crioglobulinas •Consumo de Complemento •Gamopatia •Nefrite Dúvidas em relação ao caso clínico • Quais as condições de coleta do sangue para a pesquisa de crioglobulinas? – Grande variabilidade inter-laboratorial – Pequenos níveis (tipo III) também se associam a manifestações graves – Resultados falso negativos por perda de criopreciptado no transporte e armazenamento – Há certeza que o soro foi mantido a 37°C até o resfriamento? Sargur R et al. Ann Clin Biochem. 2010;47:1. Crioglobulinas • Imunoglobulinas que precipitam em temperatura abaixo da corpórea. • Ressolubilizam quando reaquecidas a 37°C. • Variação: 50μg/mL a 10mg/mL. • Coleta correta: – Sangue 10-20mL em seringa pré-aquecida a 37°C. – Manter a 37°C 30 a 60 minutos antes de centrifugar. – Centrifugar por 10 minutos a 2.500 RPM. • Manter soro a 4°C por até 7 dias criopreciptado. • Reaquecer a 37°C • Quantificação das crioglobulinas Kallemuchikkal U & Gorevic PD. Arch Pathol Lab Med 1999:123:119. Consequências da coleta inadequada • • • • Falso negativo de crioglobulinas Perda da atividade de fator reumatóide Perda de imunoglobulina monoclonal Dosagem de imunoglobulinas falsamente normal ou baixa Dúvidas em relação ao caso clínico • Qual a profundidade da biópsia? – Biópsia incisional ou por punch? – Artéria vs. vênula pós-capilar? – Há destruição da camada elástica interna? – Há necrose fibrinóide? – IF direta foi realizada? • Há co-infecção pelo HIV? Diagnóstico? • Vasculite necrotizante secundária à infecção pelo HCV (semelhante à PAN?) • Vasculite crioglobulinêmica com resultado falso negativo para crioglobulinas • Vasculite leucocitoclástica cutânea secundária à infecção pelo HCV Vasculite necrotizante & HCV • Associação entre HCV e PAN Cacoub P. Ann Intern Med 1992;116:605. • Pacientes com PAN – Anti-HCV positivo em 5-12% – Maioria com crioglobulinemia Quint L et al. Clin Exp Rheumatol 1991;57:482. Carson CW et al. J Rheumatol 1993;20:304. • Pacientes com hepatite C e vasculite semelhante à PAN < 1%. Cacoub P et al. Arthritis Rheum 1999;42:2204. Vasculite pelo HCV tipo PAN vs. Crioglobulinêmica HCV-PAN (10 pacientes) HCV-MC (7 pacientes) Vasculite sistêmica grave 10 0 Envolvimento neurológico Mononeurite múltipla 4 membros (> motor) Polineuropatia distal sensitiva 10 0 Artérias médias > 70mm Capilares, vênulas, arteríolas e peq artérias 5/5 0/0 Púrpura-livedo 7 5 Fator Reumatóide 7 5 Crioglobulinas II/III 9/1 6/1 Complemento consumido 8 7 Genótipo 1b 3 6 Variáveis Vasculite necrotizante Vaso envolvido HAS maligna/insuficiência renal Cacoub P et al. J Rheumatol. 2001;28:109. Estratificação pré-tratamento • Doença de leve a moderada – Artralgias, púrpura, neuropatia e/ou proteinúria • Doença grave – Mononeurite múltipla, perda de função renal, doença cutânea extensa (úlceras e necrose distais) • Doença fulminante – Necrose de extremidades, hiperviscosidade, GN rapidamente progressiva, envolvimento GI, do SNC e/ou pulmonar graves. Saadoun D et al. Curr Opin Rheumatol 2008;20:23. Tratamento – Agentes anti-virais • Interferon alfa + ribavirina • Estudos abertos (47 pacientes) • Eficácia: – Manifestações cutâneas (100%) – Renais (50%) – Neurológicas (25-75%) Zuckerman E et al. J Rheumatol 2000;27:2172. Naarendorp M et al. J Rheumatol 2001;28:2466. Cacoub P et al. Arthritis Rheum 2002;46:3317. Tratamento – Agentes anti-virais • Interferon peguilado + ribavirina – 18 pacientes com Peg-INFα 2b 1μg/kg/semana + ribavirina 1000mg/dia por 12 meses. – RNA indetectável em 83% em 12 meses. – Melhora dos sintomas clínicos na maioria. – Recidiva em 44% após suspensão do tratamento. Mazzaro C et al . J Hepatol 2005;42:632. Tratamento - Agentes anti-virais • INFα2b 3 milhões de UI x3/semana + ribavirina (32 pacientes) • Peg-INF α2b 1,5μg/kg/semana + ribavirina (40 pacientes) • Tempo mínimo de tratamento: 6 meses. Resposta completa INF tradicional PegINF Clínica 56,2% 67,5% Virológica 53,1% 62,5% Imunológica 31,2% 57,5% Saadoun D et al. Arthritis Rheum 2006;54:3696. Tratamento - Imunossupressores • Pacientes com doença grave/fulminante – Mononeurite múltipla, perda de função renal, doença cutânea extensa (úlceras e necrose distais) • CE e imunossupressores (80%) • Plasmaferese (67%) – Ciclofosfamida – Azatioprina – Micofenolato mofetil Ramos-Casals M & Font J. Lupus 2005;14(Suppl 1):s64. Tarantino A et al. Kidney Int 1995;47:618. Tratamento – Rituximabe • Publicações: 13 artigos. • 57 pacientes avaliados. • Indicação principal: – Ausência de resposta ao INFα/CE • Dose do RTX • Resposta – Vasculite cutânea (84,2%) – Artralgias (61,4%) – Neuropatia periférica (54,4%) – Glomerulonefrite (31,6%) – 375mg2 semanal em 4 infusões. Saadoun D et al. Curr Opin Rheumatol. 2008;20:23. Tratamento - Rituximabe • Associação: – Peg-INFα + ribavirina + rituximab (22 pacientes) – Peg-INFα + ribavirina (15 pacientes) Variáveis PegINF+Ribavirina+ RTX PegINF+Ribavirina Resposta completa 54,5% 33,3% Clearence do RNA viral e conversão de linf B mono para policlonal em 3 anos 83,3% 40,0% Persistência de crioglobulinas 22,7% 33,0% Dammaco F et al. Blood. 2010 Mar 22. [Epub ahead of print] Tratamento Saadoun D et al. Curr Opin Rheumatol 2008;20:23. Tratamento de nossa paciente? • Diagnóstico – Vasculite associada ao HCV com crio negativa? – HIV??? • Gravidade – Neuropatia periférica • Indicação de INFα e ribavirina? – RNA + qualitativo – Qualitativo? – Bx hepática F1A0 • Prednisona e imunossupressores? • Rituximabe?