COMUNICAÇÃO POTENCIAL ALELOPÁTICO DO FEIJÃO DE PORCO

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COMUNICAÇÃO
POTENCIAL ALELOPÁTICO DO FEIJÃO DE PORCO (Canavalia
ensiformes) E DA MUCUNA PRETA (Stilozobium aterrimum) NO
CONTROLE DA TIRIRICA (Cyperus rotandus)
GABRIEL JOSÉ DE CARVALHO1
ANASTÁCIA FONTANÉTTI2
CHRISTIANO TADEU CANÇADO3
RESUMO – A tiririca é uma das plantas daninhas mais
difíceis de ser controlada pelas práticas culturais convencionais, pois cerca de 20% de seus tubérculos localizam-se entre 15 e 40 cm de profundidade. Uma alternativa que vem sendo estudada a fim de se complementar os
métodos tradicionais de controle de plantas daninhas é a
utilização de plantas que liberam substâncias tóxicas a
outras (alelopatia), reduzindo ou até mesmo inibindo totalmente seu desenvolvimento. Relizou-se este trabalho
com o objetivo de verificar possíveis efeitos alelopáticos da mucuna- preta e do feijão de porco no desenvolvimento da tiririca. O experimento foi conduzido em casade-vegetação no Departamento de Agricultura da Universidade Federal de Lavras, no período de outubro de
1998 a abril de 1999. O delineamento adotado foi o inteiramente casualisado com quatro repetições e esquema
fatorial 2x4, envolvendo duas leguminosas (mucunapreta e feijão-de-porco) e o outro por quatro formas de
aplicação (extrato aquoso de planta inteira, planta inteira
picada incorporada, planta inteira picada em cobertura e
água deionizada). Cada parcela foi composta por um vaso com 2 Kg de terra de subsolo contendo 8 tubérculos
de tiririca. O extrato aquoso da mucuna-preta reduziu a
quantidade de massa verde e matéria seca da parte aérea,
da raiz e o índice de velocidade de emergência, além de
estabilizar o número de tubérculos da tiririca, caracterizando um possível efeito alelopático. Já o extrato aquoso do feijão-de-porco estimulou o crescimento da parte
aérea da tiririca e aumentou o índice de velocidade de
emergência, evidenciando, também, um possível efeito
alelepático, porém, benéfico para a tiririca.
TERMOS PARA A INDEXAÇÃO: Adubação verde, alelopatia, tiririca.
ALLELOPATHIC POTENTIAL OF THE JACK BEAN
(Canavalia ensiformes) AND OF THE BLACK MUCUNA
(Stilozobium aterrimum) FOR SEDGE (Cyperus rotandus) CONTROL
ABSTRACT – The sedge is one of the weeds most
difficult to be controlled by the conventional cultural
practices, for about 20% of its tubers are situated
between 15 and 40 cm below the soil surface. An
alternative which has been studied in order
to
complement the traditional control methods of weeds is
the use of plants releasing toxic substances to others (
allelopathy ), reducing or even inhibiting completely its
development. The objective of this work was to verify
possible allelopathic effects of the black mucuna and of
the jack bean on the development of the sedge. The
experiment was conducted in a greenhouse at the
Department of Agriculture of the “Universidade Federal
de Lavras” in the period of October , 1998 to April, 1999.
The design adopted was the completely randomized with
four replicates in a 2 x 4 factorial scheme, involving
two legumes (black mucuna and jack
1. Professor do Departamento de Agricultura da UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS (UFLA)
2. Mestranda em Fitotecnia ns Universidade Federal de Lavras (UFLA), Caixa Postal 37, 37.200-000 – Lavras - MG
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3. Engenheiro Agrônomo
bean) and four ways of application (aqueous extract of
whole plant, chopped whole plant incorporated,
chopped whole plant in topdressing and deionized
water). Each plot was composed by a pot with 2 kg of
subsoil material containing eight sedge tubers The
aqueous extract of the black mucuna reduced the
amount of green matter and dry matter of the shoot, root
and emergence velocity index , in addition to stabilizing
the number of tubers of the sedge , characterizing a
possible allelopathic effect. The aqueous extract of the
jack bean stimulated the growth of sedge shoots and
increased the emergence velocity index, stressing, also,
a possible allelopathic effect, but beneficial to the sedge
INDEX TERMS: Green manuring , allelopathy , sedge.
Atualmente existe, por parte de diversos países,
uma grande preocupação com o uso indiscriminado de
defensivos agrícolas, tanto pelas conseqüências amb ientais, quanto pela contaminação dos alimentos. Entre
esses defensivos, encontram-se os herbicidas, os quais,
em muitos casos, têm-se apresentado como única alternativa no controle de algumas espécies de plantas daninhas. A tiririca, segundo Magalhães & Franco (1962), é
uma dessas espécies de plantas daninhas, pois cerca de
20% de seus tubérculos localizam-se entre 15 e 40 cm de
profundidade, dificultando o uso de práticas culturais
convencionais.
Uma alternativa que vem sendo estudada, com
o propósito de se complementar os métodos tradicionais de controle de plantas daninhas, minimizando o uso
de herbicidas, é a utilização de plantas que liberam
substâncias tóxicas a outras (alelopatia), reduzindo ou
até mesmo inibindo totalmente seu desenvolvimento
(Gomide, 1993).
Os efeitos alelopáticos de uma planta são aceitos, segundo Silva (1978), desde que seja demonstrado
que um inibidor químico efetivo esteja sendo produzido
e ocorrendo numa concentração potencialmente efetiva
no solo, e que a inibição não seja efeito de competição
da planta por luz, água e nutrientes, nem por uma atividade animal.
No entanto, segundo Lorenzi (1984), a ação alelopática é mais ou menos específica, ou seja, cada planta, tanto viva quanto em decomposição, exerce inibição
apenas sobre determinadas espécies de plantas daninhas ou plantas cultivadas. Algumas leguminosas, por
serem utilizadas como adubos verdes, têm sido objeto de
estudo no que diz respeito ao controle alelopático de
plantas daninhas. Fontanétti & Carvalho (1999), avaliando o potencial alelopático de feijão-de-porco (Canavalia
ensiformes) e de mucuna-preta(Stilozobium aterrimum), verificaram que esses adubos verdes apresentaram efeitos alelopáticos significativos na germinação de
sementes de alface (planta-teste).
Ciênc. agrotec., Lavras, v.26, n.3, p.647-651, mai./jun., 2002
Com o objetivo de verificar possíveis efeitos alelopáticos da mucuna-preta e do feijão-de-porco na germinação e desenvolvimento da tiririca, foram semeadas
duas áreas de 50 m, uma com feijão-de-porco e a outra
com mucuna-preta, com a finalidade de se produzir plantas para obtenção de extratos e massa verde utilizados
na segunda fase do experimento. A mucuna preta foi
semeada em outubro de 1998 e o feijão-de-porco cerca
de 40 dias após, visando à coincidência de floração e estádio de desenvolvimento em que foram obtidos os extratos.
O experimento foi instalado em casa-devegetação do Departamento de Agricultura da UFLA em
fevereiro de 1999.
O delineamento experimental adotado foi o inteiramente casualizado com quatro repetições e esquema
fatorial 2 x4, sendo um dos fatores constituído pelas duas leguminosas (feijão-de-porco e mucuna-preta) e quatro formas de aplicação (extrato aquoso de planta inteira,
planta inteira picada e incorporada , planta inteira picada
em cobertura e água deionizada). Cada parcela foi composta por um vaso plástico com capacidade de 2 Kg,
onde foram plantados 8 tubérculos de tiririca. O substrato adotado foi terra de subsolo, visando evitar contaminação por exudatos de raízes e lixiviados de folhas, além
de metabólitos originados da flora microbiana, que poderiam mascarar os resultados.
O material picado e incorporado teve como objetivo verificar possíveis efeitos alelopáticos de alguma
substância eliminada pela decomposição, e absorvidos
pela raiz, ao passo que o material em cobertura testou a
possibilidade de alguma substância ser lixiviada pela irrigação com água deionizada.
Como no tratamento com material incorporado
poderia haver influência de imobilização de nitrogênio e,
na cobertura, efeito físico, utilizou-se o tratamento com
extrato aquoso, eliminando-se essas interferências.
Para obtenção dos extratos aquosos, as plantas
foram colhidas na floração, trituradas em picadeiras de
forragem e colocadas em água deionizada numa con-
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centração em peso por volume de 12% de matéria seca,
por um período de 2 horas. Posteriormente, o material foi
coado em peneira de malha fina e conservado em geladeira, para aplicação durante três dias. Utilizou-se o teor
de matéria seca de 12%, em razão de esse valor corresponder ao maior volume de matéria fresca que se conseguiu diluir em água deionizada, conforme Carvalho
(1996). Essa operação foi repetida até a estabilização na
germinação dos tubérculos da t iririca, quando efetuaramse as avaliações.
Durante o período de condução do experimento, ocorreram irrigações com água deionizada ou extrato,
conforme o tratamento, sempre que a umidade dos vasos
fosse menor que 70% de água disponível (Carvalho,
1996).
Foram feitas contagens diárias do número de
plantas de tiririca germinadas até a estabilização,para a
determinação do índice de velocidade de emergência
(IVE), segundo Maguire (1962).
As avaliações para determinação do número de
tubérculos, do peso fresco e matéria seca das partes aéreas e da raiz foram feitas após o arranquio das plantas
de tiririca .As raízes foram cortadas com tesoura de poda
e após procedeu-se à contagem dos tubérculos, considerando para análise estatística apenas o diferencial entre
o número de tubérculos plantados e o número final após
a estabilização. Esses números foram transformados em
porcentagem e, para análise estatística, os dados foram
transformados utilizando (log X+1)
As raízes foram lavadas separadamente em água corrente e com auxílio de uma peneira de malha fina,
evitando-se, dessa forma, perdas dos materiais. Após
secagem natural, efetuou-se o peso de todas as plantas
de tiririca para obtenção do peso fresco e, em seguida,
colocou-se o material em sacos de papel, os quais foram
levados à estufa de ventilação forçada á temperatura de
60 °C, até atingir peso constante, para determinação da
matéria seca.
A análise de variância revelou que houve significância da interação leguminosas x forma de aplicação
para todas as variáveis estudadas, exceto para peso
fresco da raiz, que apresentou diferença significativa apenas entre tratamentos.
Pelos dados constantes da Tabela 1, verifica-se
que quando se utilizou extrato aquoso (EA) de mucunapreta, as produções de massa verde e matéria seca da tiririca foram inferiores às produções resultantes da aplicação de água deionizada (T) e demais tratamentos. Pelos dados da mesma Tabela, observa-se que, ao contrário do que ocorreu com a mucuna-preta, quando se aplicou extrato aquoso do feijão-de-porco, as produções de
massa verde e matéria seca da parte aérea da tiririca foram superiores às da testemunha e demais tratamentos.
Esse fato demonstra que provavelmente alguma substância química existente na mucuna-preta inibiu o crescimento da parte aérea da tiririca, ao passo que, no feijão-de-porco, algum provável aleloquímico estimulou o
crescimento, caracterizando, em ambos os casos, efeitos
alelopáticos. Esses resultados discordam daqueles encontrados por Magalhães & Franco (1962) e Magalhães
(1964), que testando extrato da parte aérea do feijão-deporco no controle da tiririca, verificaram efeitos prejudiciais a essa.
TABELA 1 - Valores médios do peso fresco e matéria seca da parte aérea da Tiririca. UFLA, 2000*
Peso fresco (g)/parcela
Matéria seca (g)/parcela
Tratamentos
Mucuna-preta
Feijão-de-porco
Mucuna-preta
Feijão-de-porco
EA
1,37 B
5,37 A
0,95 B
4,91 A
PTC
3,51 A
5,15 AB
3,01 A
4,67 AB
PTI
2,87 A
3,50 BC
2,57 A
3,16 BC
T
3,51 A
3,32 C
2,06 A
2,75 C
*Médias seguidas das mesmas letras nas colunas não diferem entre si pelo teste de Tuckey a 5%. EA: extrato aquoso; PTC: planta inteira triturada em cobertura; PTI: planta inteira triturada incorporada; T: água deionizada.
Quanto ao peso fresco e matéria seca da raiz, as
duas leguminosas testadas apresentaram resultados se-
melhantes, havendo um maior desenvolvimento das raízes no tratamento em que se deixou a massa verde em
Ciênc. agrotec., Lavras, v.26, n.3, p.647-651, mai./jun., 2002
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cobertura, o que provavelmente ocorreu pela manutenção de maior umidade nos vasos (Tabela 2).
Pelos dados constantes da Tabela 3, verifica-se
que apenas quando se aplicou extrato aquoso da
mucuna-preta houve estabilização no número de
tubérculos da tiririca (0.0%) e redução na velocidade de
emergência da planta daninha, caracterizando-se, mais
uma vez, efeito alelopático inibidor da mucuna-preta
sobre a tiririca.
TABELA 2 - Valores médios do peso fresco e matéria seca da raiz da Tiririca. UFLA, 2000*
Peso fresco (g)/parcela
Matéria seca (g)/parcela
Tratamentos
Mucuna-preta
Feijão-de-porco
Mucuna-preta
Feijão-de-porco
EA
12,34 B
11,93 C
10,70 B
9,30 C
PTC
19,03 A
27,92 A
16,11 AB
24,37 A
PTI
17,97 AB
18,82 B
15,26 AB
15,69 B
T
16,33 AB
16,33 BC
13,07 B
13,07 BC
*Médias seguidas pelas mesma letras nas colunas não diferem entre si pelo teste de Tuckey a 5%. EA: extrato aquoso; PTC: planta inteira triturada em cobertura; PTI: planta inteira triturada e incorporada; T: água deionizada.
TABELA 3 – Valores médios da porcentagem de aumento do número de tubérculos e índice de
dade de emergência da Tiririca (%). UFLA -2000*
Tubérculos
Tratamentos
Mucuna-preta
veloci-
IVE
Feijão-de-porco
Mucuna-preta
Feijão-de-porco
%
EA
0,00 B
22,06 A
0,88 B
1,57 A
PTC
25,00 A
34,37 A
1,17 AB
1,19 AB
PTI
28,12 A
28,12 A
1,02 AB
1,10 B
T
46,87 A
46,87 A
1,27 A
1,27 AB
*Médias seguidas das mesmas letras nas colunas não diferem entre si pelo teste de Tukey, a 5%. EA: extrato aquoso; PTC: planta inteira triturada em cobertura; PTI: planta inteira triturada e incorporada; T: água deionizada
Pelos resultados observados, conclui-se que o
extrato aquoso da parte aérea da mucuna-preta proporcionou redução no crescimento, estabilização na multiplicação de tubérculos e menor índice de velocidade de
Ciênc. agrotec., Lavras, v.26, n.3, p.647-651, mai./jun., 2002
emergência da tiririca, caracterizando efeito alelopático.
O extrato aquoso da parte aérea do feijão-de-porco estimulou o crescimento da tiririca, caracterizando efeito alelopático benéfico.
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FONTANÉTTI,
A.;
CARVALHO,G.
J.
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Potencialidades
alelopáticas
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(Stizolobium aterrimum) e do feijão-de-porco
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Ciênc. agrotec., Lavras, v.26, n.3, p.647-651, mai./jun., 2002
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