Outubro / Novembro / Dezembro

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anacosta
revista médica
outubro | novembro | dezembro
Revista Trimestral do Hospital Ana Costa - 2016
21.4
Revista Médica
ISSN 1677-194X
ANA COSTA
Órgão Científico Oficial do Hospital Ana Costa
Editor
Prof. Dr. Rogério Aparecido Dedivitis, Santos - SP - Brasil
Conselho Editorial Revista Médica
Dr. Airton Zogaib Rodrigues, Santos - SP - Brasil
Dr. André Vicente Guimarães, Santos - SP - Brasil
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Dr. Luiz Alberto Oliveira Dallan, São Paulo - SP - Brasil
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Dr. Woite Antônio Bertoni Meloni, Santos - SP - Brasil
Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa
Rua Pedro Américo, 60 - Campo Grande, Santos/SP, Brasil
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Periodicidade: trimestral
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Jornalista Responsável: Lucinaira Souza (Mtb: 40.248)
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A Revista Médica Ana Costa é distribuída gratuitamente para os membros do Corpo Clínico do Hospital Ana Costa,
para bibliotecas e faculdades das áreas de saúde cadastradas.
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Revista Médica Ana Costa / Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa S.A.
v. 21, n. 4 (outubro / novembro / dezembro 2016). Santos: Divisão de Ensino do Hospital Ana
Costa S.A., 2016. 50 p. :il.
Periodicidade trimestral
ISSN 1677 194X
1.Ciências Médicas. 2. Medicina
CDD 610
CDU 616
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e análise crítica da literatura levantada e não pode ser
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para determinada especialidade, uma nova técnica ou
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situação médica especialmente rara, descrevendo
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realizado em humano ou animal.
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correspondência (nome completo, endereço, telefones
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pesquisa;
g) se extraído de dissertação ou tese, indicar título, ano
e instituição onde foi apresentada;
EXEMPLOS
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do evento, local e data de realização.
Livros
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resumo em português e em inglês, com um mínimo de
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originais os resumos devem ser estruturados
destacando: objetivos, métodos básicos adotados
(informando local, população e amostragem da
pesquisa), resultados e conclusões mais relevantes,
considerando os objetivos do trabalho, e indicar formas
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o formato dos resumos deve ser o narrativo, mas com
as mesmas informações.
Capítulo de Livros
APRESENTAÇÃO DO MANUSCRITO
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b) nome completo de todos os autores;
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 3, p. 84 - 119, jul / ago / set 2016
Meltzer PS, Kallioniemi A, Trent JM. Chromosome
alterations in human solid tumors. In: Vogelstein B,
Kinzler KW, editors. The genetic basis of human cancer.
New York: McGraw-Hill; 2002. p.93-113.
Dissertações e Teses
Silva LCB. Aspectos da fotoestimulação intermitente
em pacientes com epilepsia: Teófilo Otoni [dissertação]. Campinas: Pontifícia Universidade Católica de
Campinas; 2000.
Attenhofer Jost CH, Connolly HM, O'Leary PW, Warnes
CA, Tajik AJ, Seward JB. Left heart lesions in patients
with Ebstein anomaly. Mayo Clin Proc. 2005; 80(3):3618.
Trabalhos de Congressos, Simpósios, Encontros,
Seminários e outros
Discussão: deve explorar adequada e objetivamente
os resultados, discutidos à luz de outras observações já
registradas na literatura.
a) título do artigo (em português e em inglês);
Adolfi M. A terapia familiar. Lisboa: Editorial Veja; 1982.
Artigos de periódicos
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elaboradas de forma a serem auto-explicativas, e com
análise estatística. Evitar repetir dados no texto.
Tabelas, quadros e figuras devem ser limitadas a 5 no
conjunto e numerados consecutiva e independentemente, com algarismos arábicos de acordo com a
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Modelo da carta de submissão
Título do Artigo:
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artigo mencionado, sendo vedada qualquer
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Data:
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em espaço duplo, com fonte Times New Roman,
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via impressa e em disquete 3 ½” ou em CD-ROM. Os
originais não serão devolvidos.
primeiros autores seguido de et al. As abreviaturas dos
títulos dos periódicos citados deverão estar de acordo
com o Index Medicus.
ESTRUTURA DO TEXTO
Introdução: deve conter revisão da literatura
atualizada e pertinente ao tema, adequada à
apresentação do problema e que destaque sua
relevância. Não deve ser extensa, a não ser em
manuscritos submetidos como Artigo de Revisão.
Metodologia: deve conter descrição clara e sucinta,
acompanhada da correspondente citação bibliográfica,
dos seguintes itens:
·
procedimentos adotados;
Harnden P, Joffe JK, Jones WG, editors. Germ cell
tumours V. Proceedings of the 5th Gern Cell Tumour
Conference; 2001 Sep 13-15; Leeds, UK. New York:
Springer; 2002.
Material eletrônico
Periódicos eletrônicos, artigos
Sabbatini RME. A história da terapia por choque em
psiquiatria. Cérebro & Mente [periódico online] dez.
1997/fev. 1998 [Acesso em 12 ago. 2000]; (4).
Disponível em:
·
universo e amostra;
http://www.epub.org.br/cm/n04/historia/shock.htm
·
instrumentos de medida e, se aplicável, método de
validação,
Monografia em um meio eletrônico
·
tratamento estatístico.
Conclusão: apresentar as conclusões relevantes,
considerando os objetivos do trabalho, e indicar formas
de continuidade do estudo. Se incluídas na seção
Discussão, não devem ser repetidas.
Agradecimentos: podem ser registrados agradecimentos, em parágrafo não superior a três linhas,
dirigidos a instituições ou indivíduos que prestaram
efetiva colaboração para o trabalho.
Referências: devem ser numeradas consecutivamente
na ordem em que foram mencionadas a primeira vez no
texto, baseadas no estilo Vancouver. A ordem de
citação no texto obedecerá esta numeração. Nas
referências com 2 até o limite de 6 autores, citam-se
todos os autores; acima de 6 autores, citam-se os 6
São Paulo (Estado). Secretaria do Meio Ambiente.
Entendendo o meio ambiente [monografia online]. São
Paulo; 1999. [Acesso em: 8 mar. 1999]; v.1. Disponível
em: http://www.bdt.org.br/sma/entendendo/atual.htm
Anexos e/ou Apêndices: incluir apenas quando
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Abreviaturas e Siglas: deverão ser utilizadas de forma
padronizada, restringindo-se apenas àquelas usadas
convencionalmente ou sancionadas pelo uso,
acompanhadas do significado por extenso quando da
primeira citação no texto. Não devem ser usadas no
título e no resumo.
Índice / Contents
ARTIGO ORIGINAL
Perfil dos pacientes portadores de obesidade candidatos à cirurgia bariátrica:
Aspectos clínicos e metabólicos....................................................................................................................................120
Profile of obesity patients candidates to bariatric surgery: Clinical and metabolic aspects
Gabriela Braz Leite e Priscila Oiring do Vale
Série de casos de explante de lente intra-ocular por sintomas visuais......................................................................123
Case series of intra-ocular lens exchange for visual symptoms
Romano Ramalho de Vasconcelos, Marcos Alonso Garcia, Celso Afonso Gonçalves, Rodolpho Sueiro Felippe e Roberto Pineda
Hábitos alimentares em pacientes com diabetes mellitus...........................................................................................126
Eating behaviors of patients with diabetes mellitus
Carolina Yamaguti Chaud, Marina Carrara Camillo, Nicole Camargo Sega, Vitor Monezzi, Paulo Maccagnan e Eliane Marta Quiñones Braz
RELATO DE CASO
Hérnia diafragmática estrangulada em gestante...........................................................................................................131
Strangled diaphragmatic hernia in pregnancy
Carolina Manna Santos, Isabel Vaz Romani, Lucas Ferraz Amaral e Messias Elias Neto
Exérese de pterígio recidivado por transplante autólogo de conjuntiva....................................................................134
Recurrent pterygium excision under conjunctival autograft transplantation
Christianne Ruschi Neves, Erika Alessandra Silvino Rodrigues e Celso Afonso Gonçalves
Abordagem de anemia por doença crônica...................................................................................................................136
The management of a anemia due to chronic disease
Dayanne Lima Veiga, Letícia Medeiros, José Carlos Medina Carvalho
Hipoglicemia neonatal persistente.................................................................................................................................138
Persistent neonatal hypoglycemia
Hugo Belavenuta Pinto e José Mário da Rocha Britto
Diagnóstico primário de linfoma não-Hodgkin pós-esplenectomia na urgência.......................................................140
Primary diagnosis of non-Hodgkin lymphoma post splenectomy on urgency
Isabel Vaz Romani, Messias Elias Neto, Airton Zogaib Rodrigues, Carolina Manna Santos e Lucas Ferraz Amaral
Uso do pessário em pacientes com incompetência istmo-cervical............................................................................142
Pessary in patients with cervical incompetence
Julia Francato Chiaradia e João Henrique de Araújo Fernandes
Atresia esofágica..............................................................................................................................................................144
Esophageal atresia
Natália Marques Rodrigues e Mariana Rodrigues Guelli
Farmacodermia por Carbamazepina..............................................................................................................................146
Pharmacodermia by Carbamazepine
Orlando Trevisan Neto e Regiane Oyole Frederico Relva
Coroidoretinopatia serosa central..................................................................................................................................148
Central serous chorioretinopathy
Renata Angelini Moraes, Christianne Ruschi Neves, Marcos Alonso Garcia e Celso Afonso Gonçalves
Fístula biliocolocutânea. Uma rara complicação cirúrgica tratada por endoscopia.................................................151
Biliocolocutaneus fistula. A rare surgical complication treated by endoscopy
Tiago Franco Vilela Filho, Gabriel Marques Favaro, Diego Soares Coca, Messias Elias Neto e Everson Luis Almeida Artifon
Síndrome do desconforto respiratório agudo secundária à infecção por influenza A H1N1...................................153
Acute respiratory distress syndrome secundary to influenza A H1N1 infection
Vinicius Santos Teixeira e Regiane Oyole Frederico Relva
ARTIGO DE REVISÃO
Bevacizumabe como medicação para o tratamento da radionecrose do sistema nervoso central........................156
Bevacizumab as treatment for radionecrosis of central nervous system
Vinicius Santos Teixeira e Regiane Oyole Frederico Relva
Zika Vírus..........................................................................................................................................................................159
Zika Virus
Filipe Benetti Rocha, Lucas Salviano de Abreu, Rodrigo Pizzolante Diniz e Yara Dadalti Fragoso
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, out / nov / dez 2016
Artigo Original
Perfil dos pacientes portadores de obesidade
candidatos à cirurgia bariátrica:
Aspectos clínicos e metabólicos
Profile of obesity patients candidates to bariatric surgery:
Clinical and metabolic aspects
Gabriela Braz Leite1
Priscila Oiring do Vale2
RESUMO
Introdução: Diante da epidemia de obesidade e dos
resultados insatisfatórios do tratamento clínico convencional
na perda ponderal e melhora do risco cardiometabólico, a
cirurgia bariátrica vem sendo apontada como terapêutica
eficaz. Objetivo: Avaliar o perfil clínico e metabólico de
pacientes portadores de obesidade candidatos à cirurgia
bariátrica. Métodos: Estudo transversal realizado no
Ambulatório Multidisciplinar de Obesidade e Cirurgia
Metabólica do Hospital Ana Costa de Santos. Foram coletadas
informações e resultados de exames laboratoriais dos
prontuários de 113 pacientes atendidos neste ambulatório no
ano de 2015. Resultados: Encontramos 31 portadores de
obesidade grau 2, 27,4% da amostra, nestes indivíduos foi
encontrada prevalência de 32,2% de DM2 e 45,1% de HAS. A
prevalência encontrada de hipercolesterolemia foi de 29,20% e
a de deficiência de 25-hidroxivitamina D foi de 55,7%.
Conclusão: A prevalência de hipertensão arterial sistêmica e
diabetes mellitus encontrada foi elevada, 50,44% e 28,31%,
respectivamente. O perfil de pacientes avaliados é compatível
com a população que mais se beneficia do tratamento cirúrgico
da obesidade, já que este leva a melhora importante da
qualidade de vida, perda ponderal sustentada, possibilidade
de reversão de Diabetes Mellitus tipo 2, melhora dos
componentes do risco cardiometabólico e aumento na
expectativa de vida.
ABSTRACT
Introduction: Given the epidemic of obesity and poor results
from conventional medical treatment for weight loss and
improvement in cardiometabolic risk, bariatric surgery has been
found to be effective therapy. Objective: To evaluate the clinical
and metabolic profile of patients with obesity candidates to
bariatric surgery. Methods: Cross-sectional study at
Multidisciplinary Clinic of Obesity and Metabolic Surgery,
Hospital Ana Costa Santos. Information and laboratory test
results from the medical records of 113 patients at our clinic
were collected in 2015. Results: We found 31 obese patients
grade 2, 27.4% of the sample, these individuals found
prevalence of 32.2% of DM2 and 45.1% of hypertension. The
prevalence of hypercholesterolemia was 29.20% and
deficiency of 25-hydroxyvitamin D was 55.7%. Conclusion:
The prevalence of high blood pressure and diabetes mellitus
found was high , 50.44 % and 28.31 %, respectively. The profile
of patients evaluated is compatible with the people who benefit
most from surgical treatment of obesity, since this leads to
significant improvement in quality of life , sustained weight loss,
possibility of reversal of Type 2 Diabetes Mellitus improves the
components of cardiometabolic risk and increase in life
expectancy.
Key words: Bariatric Surgery. Obesity. Diabetes Mellitus.
Descritores: Cirurgia Bariátrica. Obesidade. Diabetes
Mellitus. Perfil Clínico.
Introdução
A obesidade é uma doença crônica, que tem avançado em
proporções epidêmicas e é definida como um índice de massa
corpórea igual ou superior a 30kg/m2. Segundo dados da
Organização Mundial da Saúde, estima-se que mais de um bilhão
de adultos estão acima do peso e em torno de 300 milhões são
clinicamente obesos. Nos Estados Unidos, a prevalência de
mulheres com sobrepeso e obesidade é de 72,6% e 41,8%,
respectivamente1. No Brasil, o quadro foi exposto recentemente
com a publicação dos dados que mostra como cresceu o número
de pessoas em excesso de peso no país, com 52,5% dos
brasileiros dentro desse grupo, em 2006 o índice era de 43%. O
resultado apontou que 17.9% da população está obesa, os homens
lideram os números, com 56,5%, e as mulheres somam 49,1%. Em
relação à prevalência de excesso de peso e obesidade por
escolaridade, a pesquisa apontou que quanto menor a
2
escolaridade, maior o índice de obesidade .
A obesidade está associada a um aumento na mortalidade total e a
um risco mais elevado de desenvolver diabetes mellitus tipo 2,
hipertensão arterial sistêmica (HAS), dislipidemia, apneia do sono,
doença da vesícula biliar, doença coronariana, hipertensão,
distúrbios músculo-esqueléticos, neoplasias, demência e
3
distúrbios psicossociais .
O mais recente levantamento da Federação Internacional de
Diabetes (IDF) estima que existam 415 milhões de pessoas com
1) Residente de Clínica Medica, Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2) Assistente do Grupo Multidisciplinar Para Tratamento Cirúrgico Da Obesidade, Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Instituição: Serviço de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Gabriela Braz Leite, Rua Pedro Américo, 60 - 11075-400- Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 18/04/2016; publicado online em 20/12/16
120
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 120 - 122, out / nov / dez 2016
diabetes atualmente no mundo e 318 milhões de indivíduos em alto
risco para o desenvolvimento da doença e que, em 2040, teremos
4
642 milhões de pessoas portadores de diabetes .
A obesidade e suas comorbidades têm alcançado prevalências
alarmantes, tornando-se problema de saúde pública em todo o
mundo. Diante dos resultados insatisfatórios do tratamento
convencional na perda ponderal e na sua sustentabilidade em
longo prazo, a cirurgia bariátrica vem sendo apontada como
terapêutica eficaz, determinando perda ponderal sustentável,
possibilidade de reversão de Diabetes Mellitus tipo 2 e outros
componentes do risco cardiometabólico, melhora da qualidade e
expectativa de vida5. Indivíduos submetidos à cirurgia bariátrica
mediante assistência nutricional podem alcançar perda de peso de
40-50% do peso inicial em período curto de tempo, sendo possível
a manutenção em longo prazo4.
A cirurgia bariátrica também apresenta efeitos metabólicos
independentes da perda de peso. Ocorrem modificações funcionais e hormonais do tubo digestório, com efeitos benéficos adicionais
sobre o controle ou reversão das comorbidades metabólicas, em
especial sobre o diabetes tipo 26.
As complicações nutricionais mais freqüentes após a cirurgia são a
deficiência de vitamina B12, folato, zinco, ferro, vitamina D (25-OH)
e de cálcio, devido a restrição quantitativa de alimentos e principalmente a má absorção. Algumas deficiências podem estar presentes mesmo antes da realização da cirurgia em indivíduos obesos,
como no caso da deficiência de vitamina D já que há uma relação
inversa entre as concentrações séricas de vitamina D e o índice de
7
massa corporal (IMC) .
A cirurgia bariátrica está indicada nos indivíduos com IMC igual ou
superior a 40kg/m2 ou com IMC igual ou superior a 35 kg/m2 quando
associado a uma ou mais comorbidades relacionadas a obesidade,
que apresentam refratariedade a tratamento clínico / dietético
convencional por período superior há 2 anos8. Após o procedimento bariátrico, a redução do peso é claramente visível, com consequente melhora das comorbidades e da qualidade de vida. Uma
perda de peso que se traduz como sucesso cirúrgico deve atingir
ao menos 50% do peso excedente no momento da cirurgia. Alguns
autores estabelecem classificação para sucesso de pós-operatório
de acordo com os resultados sobre o índice de massa corporal,
sendo o IMC < 30kg/m2 considerado excelente resultado, entre 30 e
35kg/m2, bom resultado e > 35kg/m2, falha ou insucesso9.
A epidemia da obesidade, em conjunto com frustrantes resultados
das terapias tradicionais, levou a um aumento do número de
indivíduos que são submetidos à cirurgia bariátrica, uma vez que
este provou ser a mais eficaz opção de tratamento para redução de
peso, melhora da qualidade de vida e redução da mortalidade entre
os obeso10.
O objetivo é avaliar o perfil clínico e metabólico de população de
pacientes portadores de obesidade do ambulatório candidatos à
cirurgia bariátrica.
Métodos
Resultados
As características da amostra estudada estão descritas nas
Tabelas 1 e 2.
Tabela 1 - Características da amostra.
Dentre os 113 pacientes avaliados, encontramos 31 portadores de
obesidade grau 2, 27,4% da amostra, nestes indivíduos foi
encontrada prevalência de 32,2% de DM2 e 45,1% de HAS. Já os
portadores de obesidade grau 3 foram 82 indivíduos, representando 72,6% da amostra com prevalências semelhantes de DM2 e
HAS, sendo que destes, 17 tinham IMC superior a 50kg/m2 (Gráfico
1).
Gráfico 1- Distribuição de IMC da amostra.
No estudo das análises laboratoriais, foram encontrados seis
pacientes sem diagnóstico prévio de DM2, porém, com níveis de
hemoglobina glicada (HBA1C) superiores a 6,5 e uma alta prevalência de pré-diabetes, 40 indivíduos com valores de HBA1C, entre
5,7 e 6,4, representando 35,3% da amostra - Gráfico 2.
Gráfico 2 - Prevalência de pacientes portadores de DM2 e pré-diabetes.
Trata-se de um estudo observacional descritivo transversal
realizado no Ambulatório Multidisciplinar de Obesidade e Cirurgia
Metabólica do Hospital Ana Costa de Santos. A população
estudada abrangeu 113 pacientes atendidos neste ambulatório no
ano de 2015.
A coleta de dados foi realizada por meio de levantamento de
prontuário e resultados de exames referentes às consultas da
equipe multidisciplinar. Foram coletados dados sociodemográficos, índice de massa corpórea, tempo de obesidade, antecedentes
patológicos (hipertensão arterial sistêmica - HAS e diabetes
mellitus tipo 2 - DM2), uso de hipoglicemiantes orais e/ou insulinoterapia; e foram avaliados os níveis séricos de hemoglobina
glicada (HBA1C), HDL- Colesterol, LDL-Colesterol, triglicérideos e
25-hidroxivitamina D (25-OHD).
O dados colhidos foram então tabulados para avaliação do perfil da
amostra e foi realizada análise de regressão e correlação linear.
121
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 120 - 122, out / nov / dez 2016
Gráfico 3 - Correlação entre hemoglobina glicada e IMC da amostra.
Em relação a terapêutica para o DM2, 24 indivíduos estavam em
uso apenas de hipoglicemiantes orais, cinco indivíduos em terapia
associada com insulina e um indivíduo em tratamento exclusivo
com insulina. Dentre os portadores de DM2 previamente diagnosticados, 41,9% encontravam-se fora da meta terapêutica de controle
(HBA1C superior a 7%).
Tabela 2 – Média de HBA1C, HDL, LDL, triglicerídeos e 25-OHD da
amostra.
A prevalência de hipercolesterolemia (LDL > 130mg/dl) foi de
29,2% e a de deficiência de 25-hidroxivitamina D (25-OHD <
30ng/ml) foi de 55,7%, sendo que seis indivíduos apresentavam
níveis < 10ng/ml, associados a quadros mais graves de alterações
músculo-esqueléticas como defeitos de mineralização óssea e
quadro clínico-radiológico de osteomalácia.
Gráfico 4- Correlação da Vitamina D(OH-25) e IMC da amostra.
com a literatura. Já em relação à distribuição por sexo, percebemos
que mais mulheres procuraram atendimento especializado
contabilizando 72,56% dos pacientes avaliados, dado que
evidencia que apesar da prevalência similar de obesidade entre
homens e mulheres no Brasil, os homens procuraram atendimento
em menor proporção.
Outra informação relevante foi em relação aos níveis séricos de
vitamina D, 55,7% dos pacientes apresentavam deficiência,
corroborando que há uma relação inversa entre níveis de vitamina
D e índice de massa corpórea, mesmo para os indivíduos de nossa
amostra, residentes em regiões tropicais.
Sabemos que a obesidade é uma condição crônica grave, que leva
ao desenvolvimento de comorbidades cardiometabólicas e
consequente aumento na mortalidade total e piora da qualidade de
vida.
Atualmente, dentro das terapias disponíveis a cirurgia bariátrica é
considerada a intervenção mais eficaz. Em vista disso, concluímos
que o perfil de pacientes avaliados é compatível com a população
que mais se beneficia do tratamento cirúrgico da obesidade, já que
este leva a melhora importante da qualidade de vida, perda
ponderal sustentada, possibilidade de reversão de Diabetes
Mellitus tipo 2, melhora dos componentes do risco cardiometabólico
e aumento na expectativa de vida.
Referências
1.Novais PFS, Rasera IJ, Leite CVS, Oliveira MRM. Evolução e classificação do peso corporal em relação aos resultados da cirurgia bariátrica –
derivação gástrica em Y de Roux. Arq Bras Endocrinol Metab. 2010;54
(3):303-10.
2. Distrito Federal (Estado). Relatório do Vigitel Brasil. Vigilância de Fatores
de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico –
Estimativas sobre frequência e distribuição sociodemografica de fatores de
risco e proteção para doenças crônicas nas 26 capitais dos estados
brasileiros e no Distrito Federal [periódico online]. Distrito Federal; 2014.
[Acesso em: 15 jan. 2016]. Disponível em:
http://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2015/abril/15/PPT-Vigitel2014-.pdf
3. Mancini MC. Bariatric surgery – An update for the endocrinologist Arq Bras
Endocrinol Metab. 2014;58(9): 875-8.
4. International Diabetes Federation- Atlas. [periódico online] 2015; 7.
Disponível em: http://www.diabetesatlas.org/
5. Jones DB, Garvey WT, Hurley DL, McMahon MM, Heinberg LJ, Kushner R
et al. Clinical Practice Guidelines for the Perioperative Nutritional, Metabolic,
and Nonsurgical Support of the Bariatric Surgery Patient. Bariatric Surgery
Clinical Practice Guidelines. Endocr Pract. 2013;19(2):1-36.
6. Milech A, Forti AC, Halpern A, Santomauro AT, Lerário AC, Chacra AR et
al. Diagnostico e classificação do Diabetes Mellitus e tratamento do Diabete
Mellitus tipo 2. Consenso Sociedade Brasileira de Diabetes. 2000;4(5):1-73.
7. Dixon JB, Zimmet P, Alberti KG, Rubino F. Cirurgia bariátrica: uma
comunicação da IDF sobre o diabetes tipo 2 em obesos. Arq Bras Endocrinol
Metab. 2011;55(6):367-82.
8. Viegas M, Vasconcelos RS, Neves AP, Diniz ET, Bandeira F. Cirurgia
bariátrica e metabolismo ósseo: uma revisão sistemática. Arq Bras
Endocrinol Metab. 2010;54(2):158-63.
9. Silva Neto EF, Vazquez CMP, Soares FM, Silva DG, Souza MFC, Barbosa
KBF. Cirurgia bariátrica reverte risco metabólico em pacientes assistidos em
nível ambulatorial. Arq Bras Cir Dig. 2014;27(1):38-42.
10. Maeda SS, Borba VZC, Camargo MBR, Silva DMW, Borges JLC,
Bandeira F et al. Recomendações da Sociedade Brasileira de
Endocrinologia e Metabologia (SBEM) para o diagnóstico e tratamento da
hipovitaminose D. Arq Bras Endocrinol Metab. 2014;58(5):411-33.
Discussão
Dentro da população estudada, pudemos perceber que a prevalência de hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus foi bastante
elevada, 50,44% e 28,31%, respectivamente, dados condizentes
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 120 - 122, out / nov / dez 2016
122
Artigo Original
Série de casos de explante
de lente intraocular por sintomas visuais
Case series of intraocular lens exchange for visual symptoms
Romano Ramalho de Vasconcelos1
Marcos Alonso Garcia2
Celso Afonso Gonçalves2,3
Rodolpho Sueiro Felippe2,4
Roberto Pineda5
RESUMO
Objetivo: Avaliar sintoma visual e associar ao tipo de lente
explantada, além de verificar se a troca foi eficaz para melhora
do quadro. Métodos: Foi realizada uma revisão dos últimos 24
meses de casos de explante de lente intraocular somente por
queixas visuais, de um único cirurgião, a qual evidenciou um
total de 28 pacientes e 31 olhos. Foram feitos cinco grupos em
função de suas queixas visuais: grupo A (astenopia): 11 olhos;
grupo B (disfotopsia): 11 olhos; grupo C (erro Refracional): seis
olhos; grupo D (anisometropia): três olhos; grupo E (diplopia):
um olho. Todos os pacientes foram submetidos a explante de
lente intra-ocular e tiveram uma nova lente implantada no saco
capsular. Resultados: No grupo A, seis (54,54%) LIO's eram
multifocais, uma (9%) multifocal tórica, uma (9%) tórica, uma
(9%) esférica, uma (9%) pseudoacomodativa e uma (9%)
indeterminada. No grupo B, duas (18,18%) eram multifocais,
três (27,27%) multifocais tóricas, uma (9%) tórica, uma (9%)
esférica, duas (18,18%) esféricas, duas (18,18%)
pseudoacomodativas. No grupo C, duas (40%) eram tóricas,
uma (20%) esférica, uma (20%) asférica e uma (20%)
indeterminada. No grupo D, uma (33,33%) era tórica e duas
(66,66%) indeterminadas. No grupo E, uma (100%) era tórica.
Foi realizada também estatística de lentes intra-oculares
implantadas em cada grupo. No grupo A, três (27,27%) foram
esféricas e oito (72,72%) eram asféricas. No grupo B, uma
(9%) era tórica, duas (18,18%) esféricas, oito (72,72%)
asféricas. No grupo C, uma (20%) tórica, uma esférica (20%),
três asféricas (60%). No grupo D, uma (33,33%) era tórica e
duas asféricas (66,66%). No grupo E, uma (100%) era esférica.
Conclusão: A maior taxa de sintoma visual foi atribuída ao
implante de LIO multifocal, sendo este eliminado por lentes
asféricas.
ABSTRACT
Aim: To associate the visual symptom to the exchanged IOL,
besides verifying how efficacious it was. Methods: The revision
of intraocular lens exchange of the last 24 months from one
single surgeon was performed considering the visual
symptoms, revealing an amount of 28 patients and 31 eyes.
There were made 5 groups related to the visual symptoms.
Group A (asthenopia): 11 eyes; Group B (dysphothopsia): 11
eyes; Group C (refractive error): 6 eyes; Group D
(anisometropia): 3 eyes; Group E (diplopia): 1 eye. All patients
underwent IOL exchange. Results: Group A, 6 (54,54%) IOL
were multifocal, 1 (9%) toric multifocal, 1 (9%) toric, 1 (9%)
spherical, 1 (9%) accommodative and 1 (9%) undetermined.
Group B, 2 (18,18%) were multifocal, 3 (27,27%) toric
multifocal, 1 (9%) toric, 1 (9%) spherical, 2 (18,18%) spherical,
2 (18,18%) accommodative. Group C, 2 (40%) were toric, 1
(20%) spherical, 1 (20%) aspherical and 1 (20%) undetermined.
Group D, 1 (33,33%) were toric and 2 (66,66%) undetermined.
Group E, 1 (100%) was toric. It was created a implanted IOL
statistic in each group. In group A, 3 (27,27%) were spherical
and 8 (72,72%) were aspherical. In group B, 1 (9%) was toric, 2
(18,18%) spherical, 8 (72,72%) aspherical. In group C, 1 (20%)
toric, 1 spherical (20%), 3 aspherical (60%). In group D, 1
(33,33%) was toric and 2 aspherical(66,66%). In group E, 1
(100%) was spherical. Conclusion: The largest rate of visual
symptoms was related to multifocal IOL, which being
exchanged for aspherical IOL, could solve the photic
phenomena.
Key words: Pseudophakic. Visual Symptoms. Exchange. IntraOcular Lens. Spherical Aberration.
Descritores: Pseudofacia. Sintomas Visuais. Explante. Lente
1) Residente de Oftamologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
2) Médico Preceptor do Serviço de Oftalmologia Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
3) Chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
4) Médico Assistente da Eye Clinic, São Paulo/SP, Brasil.
5) Chefe do Setor de Córnea, Catarata e Cirurgia Refrativa do Massachussets Eye and Ear Infirmary, Boston/MA, Estados Unidos.
Instituição: Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Rua José Caballero, 60 ap. 2103 –11055-300 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 18/04/2016; publicado online em 20/12/2016
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Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 123 - 125, out / nov / dez 2016
Introdução
Hoje é fácil realizar uma faco-emulsificação com implante de lente
intra-ocular em pequena incisão com baixa incidência de
complicações e recuperação rápida, tudo isso com alta taxa de
satisfação do paciente. O cirurgião é capaz de corrigir erros
refracionais, às vezes grandes, por meio de cálculo da lente. Isso
tudo fez com que a indicação da cirurgia de catarata aumentasse
nas últimas décadas em mais de 200% em muitos países, inclusive
no Brasil. Com as novas técnicas e alto índice de sucesso da
cirurgia, a indicação mudou e não é mais para curar ou prevenir a
cegueira, mas sim para melhorar a visão do profissional cuja
atividade está sendo prejudicada pela opacidade do cristalino, seja
ela qual for. Para que o sucesso seja completo, o paciente deve
estar bem orientado a respeito das possíveis complicações a que
está exposto1.
Existem lentes intraoculares de diversos materiais e desenhos
como polimetilmetacrilato (PMMA), silicone, acrílico hidrofóbico e
hidrofílico, bem como lentes intra-oculares de uma ou três peças,
tóricas, com filtros para raios azuis de espectro luminoso,
esféricas, asféricas, acomodativas, multifocais refrativas e
difrativas e até lentes para pacientes fácicos1.
apresentou OCP. Em dois pacientes, sendo um do grupo A e outro
do grupo C, houve necessidade de incisão relaxante limbar (LRI).
Em todos os grupos, houve melhora dos sintomas visuais, exceto
um paciente do grupo B.
Foi verificada a distribuição entre os sintomas visuais e as lentes
intra-oculares explantadas, onde pudemos avaliar que no grupo A,
seis (54,54%) LIO's eram multifocais, uma (9%) multifocal tórica,
uma (9%) tórica, uma (9%) esférica, uma (9%) pseudoacomodativa
e uma (9%) indeterminada. No grupo, B duas (18,18%) eram
multifocais, três (27,27%) multifocais tóricas, uma (9%) tórica, uma
(9%) esférica, duas (18,18%) esféricas, duas (18,18%) pseudoacomodativas. No grupo C, duas (40%) eram tóricas, uma (20%)
esférica, uma (20%) asférica e uma (20%) indeterminada. No grupo
D, uma (33,33%) era tórica e duas (66,66%) indeterminadas. No
grupo E, uma (100%) era tórica. Foi verificada também a
distribuição de lentes intra-oculares implantadas em cada grupo.
No grupo A, três (27,27%) foram esféricas e oito (72,72%) eram
asféricas. No grupo B, uma (9%) era tórica, duas (18,18%)
esféricas, oito (72,72%) asféricas. No grupo C, uma (20%) tórica,
uma esférica (20%), três asféricas (60%). No grupo D, uma
(33,33%) era tórica e duas asféricas (66,66%). No grupo E, uma
(100%) era esférica.
Métodos
Discussão
Foi realizada uma revisão dos últimos 24 meses de casos de
explante de lente intraocular somente por queixas visuais, de um
único cirurgião, a qual evidenciou um total de 28 pacientes e 31
olhos. Foram feitos cinco grupos em função de suas queixas
visuais. Grupo A (astenopia): 11 olhos; grupo B (disfotopsia): 11
olhos; grupo C (erro refracional): 6 olhos; grupo D (anisometropia):
3 olhos; grupo E (diplopia): 1 olho. Todos os pacientes foram
submetidos a explante de lente intra-ocular e tiveram uma nova
lente implantada no saco capsular.
O grupo A foi responsável por 35,4% do total de olhos operados,
sendo, destes, 20% do gênero masculino e 80% do feminino e, do
total de olhos operados, 7,1% do gênero masculino e 28,5% do
feminino. O grupo B foi responsável, também, por 35,4% do total de
olhos, sendo 55,5% do gênero masculino e 44,4% do feminino e,
do total de olhos, 17,8% masculino e 14,2% feminino. O grupo C foi
responsável por 16,12%, sendo 60% masculino e 40% feminino e,
do total de olhos, 10,7% do gênero masculino e 7,1% do feminino.
O grupo D foi responsável por 9,6% dos olhos, sendo 100% do
gênero feminino e, do total 10,7% do feminino. O grupo E foi
responsável por 3,1% sendo 100% do gênero feminino e, do total
de olhos, 3,5% do feminino. Tratamos como particularidades
aqueles pacientes que tinham cirurgia prévia e/ou doença ocular
que pudesse influenciar na queixa relacionada após a cirurgia de
catarata.
Avaliamos acuidade visual pré e pós, complicações relacionadas
ao procedimento, lentes intra-oculares explantadas e queixas
relacionadas àquela lente e, se houve melhora do quadro visual
pós implante da nova LIO. Todos as LIO's foram explantadas pela
Técnica de Redobrar e Remover (Refold and Remove Technique),
sendo necessário um gancho de sinskey e uma pinça Mcpherson
longa.
Existem três tipos de lentes intraoculares monofocais: esféricas,
asféricas e tóricas. Utilizam o princípio da refração, ou seja,
direciona os raios de luz até um ponto focal. Apresentam visão
nítida apenas para uma única distância. O lente esférica é o sistema
óptico constituído de três meios homogêneos e transparentes,
sendo que as fronteiras entre cada par são duas superfícies
esféricas ou uma superfície esférica e uma superfície plana, que
chamamos de faces da lente. Podem ser biconvexas ou planoconvexas, ambas com a periferia mais fina que a região central. As
LIOs esféricas possuem aberração esférica positiva e a superfície
corneana também possui aberração positiva. As aberrações
esféricas ocorrem quando os raios de luz são refratados na periferia
do sistema de lentes, resultando em uma zona de luz desfocada
que pode reduzir a qualidade de imagem. Devido à presença das
aberrações, surgiram as lentes com superfície asférica para
compensar a aberração esférica positiva da córnea, resultando em
melhor qualidade imagem2. As LIO's tóricas são alternativas para
correção dos astigmatismo corneano para pacientes com catarata.
A principal complicação inerente ao implante é a rotação no pósoperatório, onde pode perder o poder ou induzir astigmatismo, se
rotação maior que 30 graus2-4.
Existem alternativas para solucionar problema de correção da
presbiopia na vigência de catarata, como LIOs multifocais e
acomodativas2,5, ambas com efeitos fóticos relevantes e as
primeiras, sendo a maior taxa de explante neste trabalho e
corroborado pela literatura. Esses fenômenos são causados pelas
zonas anelares concêntricas com duas distâncias focais (longe e
perto), além de ser dependente do tamanho pupilar para se
alcançar boa eficácia2,6-8.
Já o princípio das lentes intra-oculares asféricas é “neutralizar” ou
equilibrar a aberração esférica do olho humano, levando em conta a
aberração esférica positiva da córnea e realizando o implante de
LIOs com aberração esférica neutra ou negativa (por meio da
alteração de uma de suas superfícies, anterior ou posterior – a
depender do fabricante)2,9,10.
Resultados
Do grupo A, um paciente passou por cirurgia refrativa, Lasik, précirurgia de catarata. Do grupo B, nenhuma particularidade foi
inclusa. Do grupo C, houve um paciente com ceratocone, dois com
cirurgias refrativas prévias, sendo um Lasik e um, Ceratotomia
Radial (RK). Do grupo D, um paciente tinha cirurgia refrativa prévia
e outro havia passado por cirurgia de reparo de buraco macular. Do
grupo E, nenhum paciente tinha particularidades.
Avaliamos também a associação de sintomas, onde um paciente
tinha astenopia e diplopia e quatro tinham astenopia e disfotopsia.
Foram avaliadas complicações relacionadas ao procedimento. Do
grupo A, uma paciente apresentou opacidade capsular posterior e
um apresentou edema macular cistoide. Do grupo B, um paciente
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 123 - 125 out / nov / dez 2016
Conclusão
O sistema óptico do olho é um sistema de duas lentes, onde a
simples troca do cristalino por uma lente intra-ocular(facectomia
com implante de LIO) não deve ser banalizada. Deve-se levar em
conta a existência de cirurgia ocular prévia (ceratectomia
fotorefrativa), tamanho pupilar e status retiniano para escolha
adequada. Pudemos observar que a maior taxa de sintoma visual
foi atribuída ao implante de LIO multifocal, sendo este eliminado por
lentes asféricas. Portanto, o desempenho óptico e visual destas
124
LIO's deverá ser, na pior das hipóteses, igual ao atingido por LIO's
esféricas na maioria dos pacientes. Assim, os cirurgiões devem
sempre considerar o implante de LIO's asféricas, levando em conta
as particularidades de cada caso na busca da melhor qualidade e
desempenho visual.
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125
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 123 - 125, out / nov / dez 2016
Artigo Original
Hábitos alimentares em pacientes
com diabetes mellitus
Eating behaviors of patients with diabetes mellitus
Carolina Yamaguti Chaud1
Marina Carrara Camillo1
Nicole Camargo Sega1
Vitor Monezzi1
Paulo Maccagnan2
Eliane Marta Quiñones Braz2
RESUMO
Introdução: O diabetes melittus encontra-se entre as
principais causas de óbitos no Brasil. Estima-se que 11% da
população brasileira com mais de 40 anos seja portadora
dessa doença. A ingestão de uma alimentação adequada é
importante para que o controle do diabetes seja atingido,
sendo necessárias mudanças dos hábitos alimentares,
favorecendo um melhor controle metabólico e do peso
corporal. Objetivo: Avaliar o estado nutricional e clínico de
pacientes diabéticos. Métodos: Esta pesquisa recrutou uma
amostra de 50 pacientes diabéticos, escolhidos ao acaso, que
frequentam o ambulatório da UNIMES. Aos pacientes foi
aplicado questionário com perguntas objetivas sobre sua
alimentação, anexo à um termo de consentimento. Os dados
foram apresentados de forma descritiva, utilizando estudo de
coortes transversal. Resultados: Foi verificado que os
pacientes são bem informados e instruídos sobre o diabetes. A
maioria dos entrevistados estava ciente de suas respostas e
optou pelas alternativas corretas. Abrangiam bom
conhecimento sobre perguntas da doença em si, órgãos
afetados e do hábito alimentar adequado para o controle da
doença.
ABSTRACT
Introduction: Diabetes mellitus is among the main root causes
of deaths in Brazil. It is estimated that 11% of the Brazilian
population over 40 years old has this disease. Adequate food
intake is important for diabetes control, being necessary
changes in dietary, favoring a better metabolic and weight
control. Objective: To assess the nutritional status and clinical
of diabetic patients. Methods: This research recruited a
randomized sample of 50 diabetic patients, who attend the
UNIMES clinic. A questionnaire was applied to them with
questions about their diet, attached to a consent form. The data
were presented in descriptive form, using cross-sectional
cohort study. Results: It was found that patients are well
informed and educated about diabetes. Most respondents were
aware of their responses and chose the correct alternative,
covering good knowledge about disease questions themselves,
affected organs and proper eating habits to control the disease.
Key words: Diabetes. Eating Habits. Patients.
Descritores: Diabetes. Hábitos Alimentares. Pacientes.
Introdução
O crescimento epidêmico das doenças crônicas não
transmissíveis (DCNT), principalmente doenças cardiovasculares
e diabetes mellitus (DM) do tipo 2, pode ser atribuído ao aumento
da exposição aos principais fatores de risco para essas doenças e
às mudanças na pirâmide demográfica, com o aumento da
longevidade da população. Além disso, a maioria dos países em
desenvolvimento passa por uma transição nutricional, acarretando
o aumento expressivo da obesidade, o que também explica o
crescimento da incidência das DCNT1.
Em 2003, estimava-se que havia, aproximadamente, 150 milhões
de diabéticos no mundo, sendo previsto o dobro do número de
portadores dessa doença para o ano de 20252. De acordo com o
estudo multicêntrico realizado em nove capitais brasileiras sobre a
prevalência do DM3, existem no País 7,6% de indivíduos diabéticos
na faixa etária de 30 a 69 anos de idade. No Brasil, a mortalidade
por doenças crônicas aumentou significantemente, sendo
considerada a principal causa de morte em vários estados. Nesse
contexto, o diabetes encontra-se entre as 10 causas principais de
óbitos no País4. Estima-se que 11% da população brasileira com
mais de 40 anos seja portadora de DM. Tal coeficiente de
prevalência traduz a gravidade do problema e fornece subsídios
para o planejamento das ações de saúde que visem à prevenção ou
ao controle da doença5.
O Ministério da Saúde desenvolveu uma campanha por meio do
Plano Nacional de Reorganização da Atenção à Hipertensão
Arterial e ao Diabetes mellitus (PRAHD), objetivando, em sua
primeira fase (realizada no período de março a abril de 2001),
promover um rastreamento na comunidade com pessoas
apresentando idade de 40 anos ou mais e com usuários do Sistema
Único de Saúde (SUS), para a detecção daqueles indivíduos
suspeitos de portarem DM e hipertensão arterial (HA)6.
Ao analisarem os dados do rastreamento nacional (valores
glicêmicos e itens relacionados à saúde, obtidos por meio de
inquéritos)7 , identificaram um número provável de novos casos de
1) Aluno do Curso de Medicina da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Metropolitana de Santos UNIMES, Santos/SP, Brasil.
2) Docente do Curso de Medicina da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Metropolitana de Santos UNIMES, Santos/SP, Brasil.
Instituição: Disciplina de Endocrinologia do Curso de Medicina da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Metropolitana de Santos UNIMES, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Dra. Eliane Marta Quiñones Braz, Av. Conselheiro Nébias, 536 - 11045-002, Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 20/05/2016; publicado online em 20/12/2016
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Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 126 - 130, out / nov / dez 2016
DM equivalente a 1.350.255. Pressupondo que um terço dos
participantes que apresentaram testes positivos fizeram a
confirmação do diagnóstico posteriormente, esse número passaria
para, aproximadamente, 518.579 indivíduos.
Em Minas Gerais, foram realizados 2.874.377 exames,
representando uma cobertura de 84,5%. Desses, 418.621
apresentaram resposta glicêmica alterada, valor este que
corresponde a três vezes o número de portadores que eram
cadastrados no Programa de Diabetes até o ano de 2001, em todo
o Estado. Esses resultados demonstram que a maior parte dos
diabéticos encontrava-se sem diagnóstico, o que é esperado pela
história natural da doença, que pode ser oligossintomática por
vários anos8.
Ao receberem o diagnóstico de DM do tipo 2, muitos indivíduos já
apresentam alguma complicação crônica da doença, que, além de
onerar o sistema de saúde, compromete a sua qualidade de vida.
Assim, o diagnóstico precoce da doença é fundamental para que o
controle glicêmico seja atingido e a manifestação de complicações,
como a hipertensão arterial e dislipidemia, seja prevenida9.
Destaca-se que a ingestão de uma alimentação adequada é
importante para que o controle do diabetes e da hipertensão seja
atingido. São necessárias mudanças dos hábitos alimentares,
favorecendo um melhor controle metabólico, do peso corporal e da
pressão arterial10. No entanto, como esses hábitos têm geralmente
suas bases fixadas dentro do núcleo familiar, ainda na infância, os
mesmos são difíceis de ser modificado, o que torna a intervenção
do nutricionista importante, com vistas à conscientização da
população, considerando os aspectos psicológicos, socioculturais,
educacionais e econômico7.
É importante destacar que as DCNT são de etiologia multifatorial e
compartilham de vários fatores de riscos modificáveis, como o
tabagismo, a obesidade, a dislipidemia, a inatividade física e a
alimentação inadequada. Estudos epidemiológicos ressaltam que
as doenças cardiovasculares (DCV) seriam, por exemplo, uma
causa relativamente rara de morte na ausência destes principais
fatores de risco1,11.
Cerca de 75% dos casos novos de doenças ocorridos em países
desenvolvidos nas décadas de 70 e 80, poderiam ser explicados
pela ingestão de dieta inadequada e pela inatividade física12.
A transição epidemiológica, demográfica e nutricional no País deve
servir de incentivo para o desenvolvimento de estratégias de
promoção da saúde, de prevenção e controle dos principais fatores
de riscos comuns1,11. Partindo do pressuposto de que as medidas
de educação em saúde não devem ser autoritárias e normativas,
mas sim dialógicas13, destaca-se a Estratégia Saúde da Família
(ESF), como locus para trabalhar essas questões junto à
comunidade. Na ESF, os profissionais de saúde devem estar
capacitados para prestar assistência integral à população. O
cuidado em saúde deve ser participativo e humanizado, visto que é
imprescindível integrar o saber técnico ao saber popular para
melhor direcionar as ações de saúde, intervir de forma mais efetiva,
ao envolver a população e/ou os grupos populacionais no processo
de cuidado, proporcionar mudança no estilo de vida e melhoria na
qualidade de vida dos indivíduos e famílias. O conhecimento
técnico-científico nem sempre deverá ser transmitido a todos que
dele necessitam da mesma forma; é importante adaptá-lo à
realidade de cada indivíduo e dos grupos populacionais de maneira
que este possa ser aplicado em conformidade à realidade
socioeconômica e educacional e, dessa forma, associado a algum
aspecto da vida e da família desses indivíduos13,14.
As estratégias que envolvem a alimentação e nutrição, como
formas de intervenção, tornam-se imprescindíveis a qualquer
programa que vise, a partir do princípio da integralidade das ações,
elevar a qualidade de vida da população15. A efetividade de políticas
de promoção de vida saudável requer a participação dos diversos
setores e atores sociais responsáveis e comprometidos com a
saúde e qualidade de vida da população brasileira1.
O DM é uma doença metabólica relacionada com o aumento dos
valores de glicemia plasmática devido a ausência, deficiência e
resistência à ação do hormônio sintetizado pelas células beta
pancreáticas, a insulina. No DM tipo 1, a hiperglicemia é resultado
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 126 - 130, out / nov / dez 2016
da deficiência na secreção de insulina que progride para a ausência
absoluta deste hormônio. No DM tipo 2, a hiperglicemia ocorre tanto
por resistência à ação da insulina como por deficiência na secreção
deste hormônio. A insulina é um hormônio anabólico que está
envolvido no metabolismo dos carboidratos, proteínas e lipídeos16.
A incapacidade do organismo de utilizar a glicose como fonte
energética preferencial, por ausência da insulina, leva a
catabolismo orgânico intenso, com quebra de proteínas e de
gorduras para utilização como fonte energética. Essa alteração
metabólica cursa frequentemente com perda de peso e
comprometimento do estado nutricional e pode culminar em quadro
de hiperglicemia grave, cetose e coma.
Já a resistência dos tecidos periféricos à ação da insulina provoca
estado de hiperinsulinismo, aumento do glucagon com estímulo à
proteólise e à lipólise, tendo como consequência, também, a
hiperglicemia. Entretanto, a cetose raramente é encontrada e o
estado nutricional está mantido na faixa de sobrepeso e
obesidade17.
Os carboidratos, embora elevem a glicemia pós-prandial de forma
mais acentuada do que as proteínas e lipídeos, devem fazer parte
da composição nutricional de qualquer que seja a terapia nutricional
instituída. Os ácidos graxos monoinsaturados devem ser os
lipídeos preferencialmente utilizados nas formulações enterais, isto
porque estes atuam na fluidez das membranas celulares e na
redução da resistência à insulina18.
É uma doença de prevalência crescente que, frequentemente, é
responsável por uma série de complicações19 que comprometem a
produtividade, qualidade de vida e sobrevida dos indivíduos, além
de envolver altos custos no seu tratamento, constituindo assim um
dos maiores problemas de saúde pública deste século20.
A falta de controle clínico do paciente com DM leva à alteração da
homeostase metabólica, podendo ocorrer aumento das
necessidades de calorias e proteínas induzido pelo catabolismo.
Ademais, modificações na medição ou a supressão do apetite
podem levar à descompensação da doença21.
A hiperglicemia pode levar ao comprometimento do sistema
imunológico e risco aumentado para infecções, com incremento da
morbidade e mortalidade destes pacientes21.
Estudos envolvendo pacientes com DM tipo 1 e 2 demonstraram
que um dos fatores primordiais para evitarem-se as complicações
microvasculares nesses pacientes é manter o controle intensivo da
glicemia21 . Existe também relação entre hiperglicemia e aumento
do risco para o desenvolvimento de doença cardiovascular22.
Assim, a glicemia de pacientes com DM, tanto em nível ambulatorial
quando em nível hospitalar, deve ser mantida sob controle.
Perda de peso, mudança de estilo de vida, com prática de atividade
física regular e mudanças dietéticas, com redução energética e do
consumo de gorduras saturadas, podem reduzir a prevalência de
DM tipo 2. Se necessária, terapia medicamentosa deve ser
utilizada23,24. A intervenção dietética associada à prática de atividade
física regular pode levar à redução da incidência de DM de 58% a
91%24.
O tratamento nutricional é essencial para controle do DM em
pacientes internados ou ambulatoriais. Ele inclui a avaliação, o
diagnóstico, a escolha e a implementação da terapia nutricional
adequada, além do aconselhamento sobre o tratamento geral da
doença.
O objetivo primordial durante a aplicação da terapia nutricional oral,
enteral ou parenteral, em pacientes com DM, é manter a glicemia
dentro dos níveis da normalidade e manter o estado nutricional
adequado dos pacientes21,25-27.
No ano de 2003, somavam mais de 170 milhões de pessoas
diabéticas no mundo. No Brasil, aproximadamente 10 milhões de
pessoas são portadoras da doença28. Estimativas mostram que
esse número pode aumentar devido ao aumento da população,
aumento da expectativa de vida, padrão alimentar pouco saudável,
obesidade e estilo de vida sedentário29.
O objetivo deste estudo foi avaliar entres os pacientes diabéticos do
ambulatório da Unimes os hábitos alimentares e o conhecimento
sobre a própria doença.
127
Métodos
Figura 3: Consumo de doces pelos pacientes diabéticos.
Após submissão ao Comitê de Ética em Pesquisa, foi aprovado o
questionário cujo número do parecer é 670.815, de 26/05/2014.
Esta pesquisa recrutou uma amostra de 42 pacientes diabéticos,
que frequentaram o ambulatório da UNIMES, no período de maio a
setembro de 2014.
Aos pacientes, foi aplicado um questionário com perguntas
objetivas sobre sua alimentação, anexo a um Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O questionário
aplicado encontra-se em anexo.
Resultados
A população é muito bem instruída sobre a DM. Assim, 88% dos
entrevistados têm a consciência de que ela pode aparecer em
qualquer pessoa, independente da hereditariedade. Também
sabiam como reagir em caso de hipoglicemia e apenas 12% dos
pacientes desconheciam os sintomas. Além disso, os pacientes
conhecedores dos sintomas da hipoglicemia também sabiam
como reverter a situação com a ingestão de alimentos ou bebidas
com açúcar.
A insulina é utilizada por grande parte de pacientes portadores de
DM, principalmente tipo 1, porém, 76% dos participantes sabiam
que ela não é o único meio para o controle da doença, pois são
necessárias mudanças nos padrões alimentares e introdução de
novos hábitos alimentares. Devido ao fato de o portador da DM
precisar ter uma alimentação muito regrada, o que faz uma grande
diferença no controle da doença, torna-se de extrema importância
um acompanhamento com um nutricionista, sendo que 97,5%
concordaram e relataram a importância desta informação. As
pessoas são orientadas a realizarem refeições a cada três horas,
evitando a hipoglicemia originada da falta de glicose no sangue. O
jejum não é a forma mais indicada para perda de peso e, nessa
pesquisa, foi verificado que 81% dos pacientes estavam
conscientes de que pular a refeição do almoço não traz benefício
no emagrecimento.
Essa doença, quando não tratada e controlada, produz, em longo
prazo, lesões graves e, às vezes, fatais, dentre elas o déficit de
visão.
Seguem alguns gráficos elaborados a partir dos resultados obtidos
dos questionários referentes ao consumo de alimentos e bebidas –
Figuras 1 a 5.
Figura 1: Consumo de arroz e feijão e massas pelos pacientes diabéticos
Figura 2: Consumo de fibras pelos pacientes diabéticos.
128
Figura 4: Consumo de carnes, leite e derivados pelos pacientes diabéticos.
Figura 5: Consumo de bebidas naturais e de bebidas artificiais pelos
diabéticos
Discussão
O questionário demonstrou que 28,5% não tinham a consciência da
necessidade do cuidado com os olhos. Em torno de 95% estavam
cientes de que tal doença poderia levar à amputação dos membros,
devido à má cicatrização. Como todos eles sabiam da necessidade
de um acompanhamento nutricional, 95% disseram que os hábitos
alimentares de toda a família precisam ser controlados, dando uma
importância especial a uma dieta balanceada.
Quando questionados sobre o acompanhamento de um
nutricionista, mais da metade dos pacientes verificaram a
importância deste profissional. Destes, 63% procuraram o
nutricionista em virtude de um ganho de peso, 11% por perda de
peso e 18,5% para uma reeducação alimentar. Esse dado é
significativo visto que o ganho de peso dificulta o controle do
diabético.
Noventa e dois por cento dos pacientes não fracionam suas
refeições em seis vezes ao dia, conforme o recomendado para os
diabéticos. As pessoas diabéticas precisam ser melhores
informadas e orientadas no sentido de que a alimentação deve ser
fracionada em desjejum, colação, almoço, lanche da tarde, jantar e
ceia, adequando assim às refeições30.
Setenta por cento dos entrevistados referiam comer arroz e feijão
todos os dias (Figura 1), que constituem os carboidratos
complexos. Como mostra a Figura 2, 85% dos diabéticos
entrevistados comem verduras todos os dias, 78,5% legumes e
80% frutas. Já em relação aos doces, 40,5% dos entrevistados
comem às vezes ou nunca - Figura 3, um resultado significativo,
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 126 - 130, out / nov / dez 2016
visto que os pacientes são portadores de DM. A Organização
Mundial da Saúde considera que a dieta do diabético é um dos
fatores responsáveis para manter os níveis glicêmicos dentro de
limites desejáveis31. Enquanto 80% dos diabéticos comem todos os
dias legumes, frutas e verduras, apenas 27% comem massa todos
os dias. De modo geral, foi um resultado satisfatório, pois os
carboidratos, dependendo do tipo e da quantidade ingerida, podem
promover picos de glicemia insatisfatórios na busca do bom
controle metabólico. Já alimentos como verduras, legumes e
frutas, ajudam no sentido de retardar a absorção da glicose e assim
manter um índice glicêmico favorável tanto ao controle da doença
como na perda de peso, que são os objetivos do tratamento da
diabetes tipo 2.
Embora existam controvérsias sobre a quantidade e tipos de
carboidratos recomendados, a orientação atual preconiza que uma
dieta com alto conteúdo de carboidratos complexos e ricos em
fibras, tais como frutas inteiras, legumes, verduras, grãos e
cereais, melhora o controle glicêmico e lipídico, a sensibilidade à
ação da insulina, além de favorecer a perda de peso32.
Quanto ao consumo de carnes, 64,5% dos pacientes consomem
carnes todos os dias – Figura 4. A carne representa uma excelente
fonte de proteínas, no entanto, o consumo deve ser controlado
para que não haja sobrecarga proteica e aumento do risco de
nefropatia diabética.
Em relação ao consumo de leite e derivados, 43% dos diabéticos
fazem uso desses alimentos todos os dias – Figura 4. De acordo
com estudos recentes, isso é muito benéfico para os pacientes.
Evidências recentes sugerem que o leite de vaca e produtos
lácteos estão associados a menor risco de DM tipo 2, hipertensão e
intolerância à glicose.
Observa-se, na Figura 5, que 43% dos pacientes entrevistados
nunca consomem bebidas artificiais e que 47,5% preferem fazer o
uso de bebidas naturais todos os dias. A ingestão de sucos naturais
pode ser prejudicial para o diabético, pois essas bebidas têm
menos fibras do que a fruta inteira, elevando a velocidade da
absorção do açúcar e gerando picos glicêmicos que podem ser
prejudiciais para o organismo. Todos os pacientes que referiram à
ingestão de bebida artificial (refrigerante), disseram que
consomem a versão dietética.
Conclusão
Apesar de ser um ambulatório o qual atende preferencialmente
pessoas com escolaridade incompleta, pôde-se verificar que estas
são bem informadas e instruídas sobre o diabetes. A maioria dos
entrevistados estava ciente de suas respostas e optou pelas
alternativas corretas. Abrangiam bom conhecimento sobre
perguntas da doença em si, órgãos afetados e do hábito alimentar
adequado para o controle da doença.
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129
QUESTIONÁRIO: HÁBITOS ALIMENTARES DE PACIENTES
DIABÉTICOS
Nome: _____________________ Prontuário: ______ Idade: ____ Data
Nasc: ___________ Sexo: _____ Profissão: __________ Escolaridade:
_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ Te l : _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ E n d e r e ç o :
________________________________________________________
Para cada uma das perguntas abaixo, assinale com um X o item correto.
1) O diabetes é uma doença que pode aparecer em qualquer pessoa,
mesmo que não tenha ninguém da família com a doença.
CERTO ( )
ERRADO ( )
2) Quando um diabético de repente começa a sentir: suor frio,
tremura ou sente o coração “disparar”, pode estar com açúcar baixo no
sangue.
CERTO ( )
ERRADO ( )
3) Basta tomar a insulina para que eu me sinta bem. As outras
orientações não são importantes.
CERTO ( )
ERRADO ( )
4) É importante o diabético ter uma acompanhamento com profissional
nutricionista.
CERTO ( )
ERRADO ( )
5) Quando o almoço for mais tarde do que de costume, o diabético deve
aproveitar para não almoçar porque fazer jejum é bom para emagrecer.
CERTO ( )
ERRADO ( )
6) O diabético não precisa ter cuidado especial com os olhos.
CERTO ( )
ERRADO ( )
7) A diabetes pode levar a amputação.
CERTO ( )
ERRADO ( )
8) Para evitar que outras pessoas de sua família tenham diabetes, é
importante a família fazer uma dieta balanceada em carboidratos,
gorduras e açúcares.
CERTO ( )
ERRADO ( )
9) Quantas refeições você faz ao dia?
( )1a2
(
)2a3
(
)3a4
(
) mais que 6
(
)4a5
10) Você já fez acompanhamento com nutricionista?
(
) SIM
(
) NÃO
11) Se sim, qual foi o motivo?
( ) perda de peso ( ) ganho de peso (
( ) outros
) reeducação alimentar
12) O que é mais importante para controle do Diabetes mellitus?
(
) medicamento ( ) Insulina ( ) Alimentação
( ) Todos os itens
13) Questionário de frequência alimentar:
130
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 126 - 130, out / nov / dez 2016
Relato de Caso
Hérnia diafragmática estrangulada em gestante
Strangled diaphragmatic hernia in pregnancy
Carolina Manna Santos1
Isabel Vaz Romani1
Lucas Ferraz Amaral1
Messias Elias Neto2
RESUMO
Introdução: Hérnias diafragmáticas (HD) são definidas como
a passagem de conteúdo abdominal para dentro da cavidade
torácica através de um defeito do diafragma. Este pode ser
congênito (Morgani ou Bochdalek) ou adquirido (traumático). O
traumatismo perfurante normalmente causa lesões bem
menores, o que pode levar a um retardo, de anos, no
diagnóstico da lesão. Relato de Caso: Paciente de 32 anos,
feminino, gestante de 27 semanas e 3 dias, relata dor tipo
cólica com início em hipogástrio e irradiação para hipocôndrio
esquerdo acompanhado de parada de eliminação de gases e
fezes e vômitos biliosos há oito dias. Apresentava como
cirurgia prévia uma gastroplastia redutora à Scopinaro e
drenagem torácica esquerda com pleurodese seis anos antes.
À radiografia simples de tórax com proteção abdominal, foi
identificada a presença de cólon em hemitórax esquerdo,
acompanhada de distensão de alças de delgado e níveis hidroaéreos. Realizou-se parto cesareana seguido de laparotomia
exploradora, em que foram evidenciados grande distensão de
retossigmoide, líquido entérico livre na cavidade abdominal e
presença de alças estranguladas em região subdiafragmática
invadindo tórax.
ABSTRACT
Introduction: Diaphragmatic hernia (HD) is characterized
when one of abdominal organs moves upward into chest cavity
through a defect in the diaphragm. This event can be congenital
(Morgagni or Bochdalek) or acquired (traumatic). The
penetrating trauma usually cause small injuries that can be
unrecognized and retard the diagnosis. Case report: A 32year-old female patient, at 27 weeks and three days of
pregnancy complained of abdominal pain referred to as colic in
epigastric that spreaded to hypochondrium associated with an
important constipation followed by vomit 8 days before. As prior
history, she underwent a Scopinaro bariatric surgery and left
thoracic drainage with pleurodesis 6 years before. By X-ray with
abdominal protection, part of the colon in the left thoracic cavity
and bowel distension were identified. A cesarean was made
followed by a exploratory laparotomy. At the procedure, a
sigmoid distention, enteric fluid and strangled bowel that moved
upward into chest cavity were observed.
Key words: Diaphragmatic Hernia. Pregnancy. Strangled
Colon. Diaphragmatic Injury. Diaphragm.
Descritores: Hérnia Diafragmática. Gestação. Cólon
Estrangulado. Injúria Diafragmática. Diafragma.
Introdução
As hérnias diafragmáticas definem-se como a passagem do
conteúdo abdominal para a cavidade torácica através de um
defeito no diafragma. Dividem-se em congênitas (anteriores ou de
Morgagni e póstero-laterais ou de Bochdalek) e adquiridas
(traumáticas) 1. Hérnia diafragmática foi primeiramente relatada por
Sennertus, em 1541, enquanto hérnia diafragmática traumática foi
relatada pela primeira vez por Ambroise Paré, em 1579. No caso
relatado por Paré, o paciente, um capitão de artilharia francesa,
sobreviveu à hérnia, mas morreu oito meses mais tarde a partir de
uma porção do intestino necrosada que havia herniado através do
pequeno defeito. Essa hérnia foi seguida de ruptura diafragmática
e o fechamento espontâneo não ocorreu, embora um fechamento
temporário pudesse ocorrer pela contração muscular ou
interposição omental2.
A hérnia diafragmática pode passar despercebida até o estágio
mais avançado da gravidez, quando pode ser desencadeada por
situações que envolvem o aumento da pressão intra-abdominal.
Esta, por sua vez, pode ser determinada pelo aumento do tamanho
do útero. Mais de 90% das hérnias diafragma maternas que
ocorrem durante a gravidez são localizados no lado esquerdo do
diafragma. Os sintomas são geralmente vagos (dor abdominal,
náuseas e/ou vómitos, dor no peito e dificuldade para respirar),
ainda que, em ocasiões muito raras, a situação clínica de repente
pode agravar-se devido à obstrução, torção ou infarto das vísceras
herniadas3.
Há um consenso de que as hérnias que se apresentam com
evidência de estrangulamento, representam uma emergência
cirúrgica, independentemente da maturidade fetal. O tratamento
eletivo de hérnias assintomática é mais controverso e ambas as
abordagens conservadoras e cirúrgicas têm sido controversos.
1) Residente de Cirurgia Geral do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2) Preceptor de Cirurgia Geral do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Instituição: Serviço de Cirurgia Geral do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60- 10° andar – 11075-905 Santos/SP, Brasil.
E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 28/03/2016; publicado online em 20/12/2016
Conflito de interesse: Nenhum. Fonte de Fomento: Nenhuma
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 131 - 133, out / nov / dez 2016
131
Hérnia diafragmática pode causar complicações com risco de vida
à gestante. Deve-se considerar reparação cirúrgica no segundo
trimestre se hérnias assintomáticos são identificados durante a
gravidez4.
Relato de caso
Paciente de 32 anos, natural de Santos, com antecedente de pósoperatório tardio de gastroplastia redutora (Scopinaro) há seis
anos com drenagem pleural esquerda e pleurodese no pósoperatório imediato, procurou o pronto-socorro de Ginecologia e
Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos, apresentando gestação
tópica de 27 semanas e 3 dias com queixa de parada de eliminação
de gases e fezes há oito dias. Referia também dor tipo cólica com
início em hipogástrio e irradiação para hipocôndrio esquerdo
acompanhado de vômitos biliosos, sem fatores de melhora ou
piora. Ao exame físico, estava em regular estado geral,
descorada+/4+, desidratada++/4+ e dispneica. À ausculta
pulmonar: murmúrio vesicular presente sem ruídos adventícios à
direita e abolido em base esquerda. Abdome: gravídico, altura
uterina: 28,0cm, batimento cardíaco fetal: 140bpm, movimento
fetal presente, dinâmica uterina ausente, distendido, ruído
hidroaéreo diminuído, doloroso à palpação superficial e profunda
difusa, descompressão brusca positiva. O toque retal revelou
ausência de fezes em ampola. Toque vaginal: colo grosso,
posteriorizado e impérvio. À ultra-sonografia obstétrica, identificouse feto único, vivo, cefálico, dorso a esquerda, peso fetal de
aproximadamente 980g +ou- 15%; placenta anterior grau 1,
medindo 5,0cm. Índice de Líquido Amniótico: zero. Observou-se
distensão de alças de delgado com conteúdo, paréticas e líquido
livre associado. A radiografia simples de tórax identificou hérnia
diafragmática à esquerda, imagem sugestiva de cólon em
cavidade torácica esquerda, grande distensão de cólon e intestino
delgado associado a níveis hidroaéreos (Figura 1).
Figura 1- Radiografia simples de tórax realizada no pronto-socorro, com a
presença de alça intestinal com nível hidro-aéreo na cavidade torácica.
No mesmo dia, foi realizada intervenção cirúrgica com equipe
multidisciplinar envolvendo obstetra, cirurgião geral e cirurgião
torácico. Realizada cesariana com incisão à Pfannestiel, o recémnascido estava vivo, sexo feminino, com 975 gramas. Após o
término da cesariana, realizou-se laparotomia exploradora +
toracotomia esquerda, com evidência de grande distensão de
retossigmóide, líquido entérico livre na cavidade abdominal,
presença de alças estranguladas em região subdiafragmática
invadindo tórax. Foi feita a enterectomia + colectomia
(transversectomia) + entero-enteroanastomose
+ colocoloanastomose + rafia diafragmática + colostomia em alça em
hipocôndrio direito + drenagem torácica esquerda . Evoluiu para
choque séptico em U.T.I., com severa instabilidade hemodinâmica,
nutrição parenteral e traqueostomia. No vigésimo primeiro dia de
internação, recebeu alta à enfermaria, sem febre e em bom estado
geral, com melhora do padrão respiratório. Após nove dias, alta
hospitalar, com cuidados de home care.
132
Discussão
Hérnias diafragmáticas são definidas como a passagem de
conteúdo abdominal para dentro da cavidade torácica através de
um defeito do diafragma. Este pode ser congênito (Morgani ou
Bochdalek) ou adquirido (traumático)1.
Grimes descreveu três fases clínicas das lesões diafragmáticas: a
primeira, fase aguda e adequadamente identificada na primeira
avaliação do paciente; a segunda, quando o diagnóstico passa
despercebido na fase aguda, chamou de fase “latente”, na grande
maioria das vezes totalmente assintomática, mas que poderá
evoluir, com a progressão da herniação, para dispneia, dor ou outro
sintoma relacionado à progressão da lesão; e a terceira, a que
chamou de obstrutiva, caracteriza-se por complicação associada,
com encarceramento e possível ruptura de alça intestinal ou do
estômago, dentro da cavidade torácica. Concomitantemente, pode
ocorrer hipertensão da cavidade torácica afetada ou até
tamponamento cardíaco, se houver comunicação com o saco
pericárdico5.
Hérnia diafragmática assintomática na gestante deve ser reparada
durante o terceiro trimestre, quando a organogênese fetal é
completa, a fim de evitar o agravamento da herniação pelo aumento
do volume uterino e o risco de estrangulamento da hérnia6. Trabalho
de parto deve ser evitado. Se surgirem sintomas de obstrução, esta
lesão representa uma verdadeira emergência cirúrgica e a
intervenção cirúrgica deve ser realizada independentemente da
idade gestacional7.
Ruptura de uma hérnia diafragmática materna durante a gravidez é
uma complicação rara, mas significativa. Gestantes com hérnia
diafragmática, muitas vezes, apresentam emergência na definição
da conduta no periparto, pois um atraso ou diagnóstico equivocado
podem chegar a uma taxa de 10% de mortalidade materna e 13%
fetais6.
O diagnóstico baseia-se principalmente na radiografia de tórax
demonstrando conteúdo abdominal intratorácicos.
Especificamente, a radiografia de tórax pode demonstrar níveis
hidro-aéreos significando conteúdo do estômago ou do intestino ou
haustrações indicativos de cólon ou intratorácica ou ambos6. Neste
caso, foram identificadas alças sugestivas de cólon na cavidade
torácica que, associado aos sinais e sintomas clínicos, definiu a
conduta cirúrgica.
A conduta bem sucedida requer uma abordagem multidisciplinar
envolvendo obstetras experientes, radiologistas e cirurgiões
torácicos. Apresentamos um caso de abdome agudo perfurativo em
gestante com hérnia diafragmática estrangulada, que exigiu
correção cirúrgica de urgência, sendo realizada por uma equipe
multidisciplinar.
A primeira decisão a ser tomada nos casos em que é realizado o
diagnóstico pré-operatório é quanto à incisão utilizada para acesso
cirúrgico. Na fase aguda, devido à grande porcentagem de lesões
intra-abdominais associadas, a maioria dos cirurgiões tende a optar
pela laparotomia mediana, enquanto pequena parte deles opta,
inicialmente, pela toracotomia. Muitas vezes, é necessário lançar
mão da ampliação da incisão (toracofrenolaparotomias). Pela
maior morbidade dessa incisão combinada, de preferência,
utilizamos incisões em separado no tórax e abdome, para melhor
abordagem em casos de lesões complexas, particularmente em
lesões do lado direito, em que algumas revisões mostram que em
até 50% dos casos é necessária uma toracotomia complementar2.
Na presença de lesões de vísceras ocas associadas,
principalmente nos extravasamentos colônicos, devido à maior
carga de bactérias, deve-se proceder à drenagem pleural logo após
o controle da hemostasia e sutura das perfurações, lavando-se,
exaustivamente, tanto a cavidade abdominal, quanto a torácica,
permitindo o escoamento do líquido de lavagem pelo dreno pleural,
tentando-se minimizar o risco de empiema pleural, uma temida
complicação de difícil e prolongado tratamento pós-operatório.
Alguns autores advogam a realização de toracotomia ântero-lateral
para se visualizar toda a cavidade pleural e permitir a evacuação de
todo o material contaminante, por meio de lavagem copiosa com
solução salina e a colocação de dois drenos pleurais8.
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 131 - 133, out / nov / dez 2016
A literatura médica não mostra diferenças de resultados quanto ao
fechamento das lesões diafragmáticas em termos de suturas
contínuas ou com pontos separados, recomendando, apenas, que
seja utilizado fio inabsorvível (polipropileno)9.
No caso de estrangulamento de vísceras intra-abdominais
herniadas, a mortalidade aumenta dramaticamente, podendo
chegar a 88%9.
A paciente em questão, após diagnóstico de abdome agudo
perfurativo por hérnia hiatal estrangulada, foi submetida a
tratamento cirúrgico de urgência pela equipe multidisciplinar,
sendo realizada cesareana de urgência seguida de laparotomia
exploradora + toracotomia esquerda. Identificaram-se alça de
colon transverso perfurada em região torácica esquerda
acompanhado de conteúdo fecaloide livre em hemitórax esquerdo
em moderada quantidade e alça de delgado perfurada com
extravazamento de líquido entérico para cavidade abdominal, o
que aumenta a taxa de morbi-mortalidade no pós-operatório. Foi
realizada a enterectomia + colectomia (transversectomia) + enteroenteroanastomose + colo-coloanastomose + rafia diafragmática +
colostomia em alça em hipocôndrio direito + drenagem torácica
esquerda.Houve complicações pós-operatórias, como choque
séptico, que necessitou de internação em UTI, uso de
antibioticoterapia de amplo espectro e compensação
hemodinâmica, recebendo alta para enfermaria e, posteriormente
alta hospitalar com home care.
Finalmente, sabe-se que gestantes com diagnósticos de hérnia
diafragmática com sinal de obstrução deve ser submetida à
tratamento cirúrgico de urgência, pois apresentam taxa de
mortalidade fetal e materna significativa.
Referências
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Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 131 - 133, out / nov / dez 2016
133
Relato de Caso
Exérese de pterígio recidivado
por transplante autólogo de conjuntiva
Recurrent pterygium excision under conjunctival autograft transplantation
Christianne Ruschi Neves1
Erika Alessandra Silvino Rodrigues2
Celso Afonso Gonçalves3
RESUMO
Introdução: O pterígio é caracterizado por um crescimento de
tecido fibrovascular da conjuntiva bulbar sobre a córnea. É
uma doença com maior frequência em indivíduos de países de
clima tropical. Os pterígios sintomáticos podem ser
ressecados de maneira simples, porém, a taxa de recorrência
é bastante alta, variando de 40 a 89%. Relato de caso: Relatase o caso de pterígio operado após três episódios de recidiva
em um paciente do gênero masculino, de 47 anos, com baixa
acuidade visual com classificação de pterígio grau III. Foi
utilizada no intra-operatório injeção subconjuntival de
triancinolona. Foi acompanhado após um ano e meio da
cirurgia, com melhora considerável de visão e sem recidiva até
então.
ABSTRACT
Introduction: The pterygium is characterized by growth of
fibrovascular tissue of the bulbar conjunctiva on the cornea. It is
a more frequently disease among people from tropical
countries. Symptomatic pterygium can be resected in a simple
way, however, the recurrence rate is quite high, ranging from 40
to 89%. Case report: This is the report of a case of pterygium
surgery after 3 episodes of relapse in a 47-year-old man, with
low visual acuity with pterygium rating grade III. Subconjunctival
injection of triamcinolone was used in the operation. He was
followed up for 1.5 year, with considerable improvement in
vision and no recurrence up to now.
Key words: Pterygium. Recurrence. Autolougus Transplant.
Conjunctive/Transplant.
Descritores: Pterígio. Recidiva. Transplante Autólogo.
Conjuntiva/Transplante.
Introdução
O pterígio é caracterizado por um crescimento de tecido fibrovascular da conjuntiva bulbar sobre a córnea. É uma doença com
maior frequência em indivíduos de países de clima tropical,
geralmente próximos ao Equador, acometendo predominantemente indivíduos do sexo masculino e acima dos 30 anos de idade1.
A etiologia é de origem ainda bastante discutida e incerta, aventando-se a hipótese de influência multifatorial, decorrente da associação entre a exposição à radiação ultravioleta, microtraumas
produzidos por pó e areia em indivíduos susceptíveis, entre
outras2.
Os pterígios sintomáticos podem ser ressecados de maneira
simples, porém, a taxa de recorrência é bastante alta, variando de
40 a 89%. Diversos tratamentos têm sido recomendados na
tentativa de diminuir a sua recorrência: betaterapia, esclera nua,
rotação de retalho conjuntival, transplante autólogo de conjuntiva,
enxerto de membrana amniótica, entre outras3.
Relato de caso
te de Santos/SP, compareceu à consulta oftalmológica no Setor de
Córnea do Hospital Ana Costa, em Santos, para avaliação de
pterígio recidivado em olho direito após três abordagens cirúrgicas.
Apresentava queixa da baixa acuidade visual e irritação ocular em
olho direito. Ao exame oftalmológico: acuidade visual sem correção
de conta dedos em olho direito e 20/30 em olho esquerdo. À
ectoscopia, movimentação ocular extrínseca preservada. À
biomicroscopia em olho direito, apresentava pterígio recidivado
grau III, corpo do pterígio invadindo eixo visual e com início de
formação de simbléfaro inferior, não possível visualizar pupila
completamente, tarso superior livre (Figura 1). Foi realizada cirurgia
com exérese de pterígio, realização de transplante autólogo de
conjuntiva, utilização de cola de fibrina e realização de injeção
subconjuntival de triancinolona em porção inferior de conjuntiva.
Fez uso de colírio e pomada oftalmológica de antibiótico e corticoide associado por 15 dias com esquema de regressão. Após um ano
e meio de acompanhamento, apresenta-se com acuidade visual de
20/80 com correção de olho direito, córnea com discreta nubécula
central, transplante aderido, bem posicionado e vascularizado
(Figura 2).
Paciente do gênero masculino, de 47 anos, caucasiano, proceden-
1) Residente do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2) Médica oftalmologista do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
3) Chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Instituição: Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Christianne Neves Ruschi - Rua José Caballero 60 – 11055-300 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 08/04/2016; publicado online em 20/12/2016
134
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 134 - 135, out / nov / dez 2016
Figura 1. Pterígio recidivado grau III, corpo do pterígio invadindo eixo visual
e com início de formação de simbléfaro inferior, não sendo possível
visualizar a pupila completamente.
taxa de recidiva de 62% contra 13% nos submetidos ao transplante
autólogo de conjuntiva em pacientes com pterígio primário e 7%
para pacientes com pterígio recorrente7.
No relato em questão, o paciente não havia realizado as cirurgias
anteriores no nosso serviço, não sendo possível afirmar qual
técnica cirúrgica foi utilizada. Justifica-se o número de recidivas
caso tenha sido realizado esclera nua, uma vez que o transplante
autólogo de conjuntiva é atualmente a alternativa mais eficaz para o
tratamento do pterígio. O uso da cola de fibrina na cirurgia de
pterígio representa um avanço inquestionável, por tornar o
procedimento mais rápido para o cirurgião e a recuperação mais
confortável para o paciente. O uso da cola de fibrina é seguro e
eficaz, traz bons resultados cirúrgicos e pequena incidência de
complicações e recidiva. Apesar da acuidade visual do paciente
não ter sido recuperada por completo, devido ao sofrimento da
córnea causada pelas várias abordagens cirúrgicas, o paciente
ficou muito satisfeito com o resultado, visto que anteriormente
estava com uma visão muito ruim que alterava sua qualidade de
vida.
Referências
Figura 2. Após um ano e meio de acompanhamento paciente apresenta-se
com acuidade visual de 20/80 com correção de olho direito, córnea com
discreta nubécula central, transplante aderido, bem posicionado e
vascularizado.
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Discussão
As várias técnicas disponíveis para o tratamento do pterígio devem
ser avaliadas com referência a dois critérios principais: segurança
(ausência de complicações que comprometam a visão) e eficácia
(ausência de recidiva). A taxa de recidiva pode ser influenciada por:
fatores relacionados com a resposta do hospedeiro, variações da
técnica empregada, uso de terapia adjuvante, diferentes medicações utilizadas no pós-operatório, localização geográfica da
população estudada, a duração do período de seguimento e pela
definição de recorrência empregada4.
Encontrou-se, em portadores de pterígio primário e recorrente,
taxa de recidiva de 4,16%, sendo observada apenas entre os
portadores de pterígios já recidivados5. Em estudo de portadores
de pterígio primário e recidivado, não se observou nenhum caso de
recidiva6. Em outro estudo, encontro-se taxa de recidiva de 6,8%,
com apenas um caso e que ocorreu entre os pterígios primários4.
Em pacientes operados pela técnica da “esclera nua”, relatou-se
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 134 - 135, out / nov / dez 2016
135
Relato de Caso
Abordagem de anemia por doença crônica
The management of a anemia due to chronic disease
Dayanne Lima Veiga1
Letícia Medeiros2
José Carlos Medina Carvalho3
RESUMO
ABSTRACT
Anemia de doença crônica (ADC), antigamente denominada
como anemia da inflamação crônica, é usualmente
relacionada com pacientes que apresentam distúrbios
inflamatórios, infecciosos (fúngicos, bacterianos e virais) ou
neoplásicos. É considerada a comorbidade mais comum em
paciente internados. Apresenta-se com hipoferremia, apesar
de observar-se abundante quantidade de ferro nos
macrófagos. A anemia de doença crônica corresponde à
anemia normocítica e nomocrômica do tipo hipoproliferativa,
podendo ocorrer hipocromia em 20-30% dos pacientes. Relato
de caso: Descrevem-se dois casos de anemia encaminhados
para o ambulatório de hematologia após múltiplos tratamentos
sem melhora. O primeiro caso apresenta um homem de 50
anos portador de diabetes mellitus e doença reumatológica em
atividade com anemia normocrômica e normocítica em
investigação há mais de 1 ano, sem sucesso. O segundo caso
relata uma mulher de 32 anos portadora de doença
inflamatória intestinal em tratamento irregular que evoluiu com
piora da anemia, sendo encaminhada pelo gastroenterologista
devido à não identificação da causa da anemia.
Introduction: Anemia of chronic disease, in old days called
anemia of inflammation, has been usually related to patients
with inflammatory disturbs, infections (fungal, bacteria or
viruses) or cancer. It is the most common comorbidity in
hospitalized patients. It is featured as hypoferremia, although
the big amount of iron into the macrophage. This disease
corresponds to normocytic and normochromic anemia with low
reticulocyte count, occurring hypochromia in 20-30% of the
patients. Case report: We describe two anemia cases
forwarded to the hematology ambulatory after multiples
treatments without improvement. The first case presents a 50
year-old man, diabetic and with active rheumatologic disease,
with normochromic e normocytic anemia, being investigate for a
year without success. The second case, a 32 year-old women,
on irregular treatment of inflammatory bowel disease, evolving
with aggravation of anemia, being forwarded from the
gastroenterologist that couldn´t identify a cause for it.
Key words: Anemia of Chronic Disease. Hepcidin. Iron
Metabolism.
Descritores: Anemia de Doença Crônica. Hepcedina.
Metabolismo do Ferro.
Introdução
Relato de Casos
O termo anemia de doença crônica (ADC) utiliza-se para definir
uma condição clinica associada a lesão tecidual crônica, que
resulta no desenvolvimento de anemia hipoproliferativa em
pacientes que apresentam doenças inflamatória crônicas,
infecciosas crônicas (bacterianas, fúngicas ou virais) ou
neoplásicas. As condições patológicas mais associadas com ADC
são tuberculose, pneumonia, endocardite, doenças inflamatórias
pélvicas e intestinais, artrite reumatoide, lúpus eritematoso
sistêmico, mieloma múltiplo e carcinomas1-3.
É considerada a comorbidade mais comum em pacientes
internados, especialmente superiores a 60 anos e a segunda
causa mais frequente de anemia investigadas em ambiente
ambulatorial3-5, perdendo somente para anemia por deficiência de
ferro.
Caso 1. Paciente de 50 anos , masculino, com antecedentes de
diabetes melittus tipo 2 e gota, sem devido tratamento, veio
encaminhado para o Ambulatório de Hematologia no Hospital Ana
Costa, Santos, devido ao diagnóstico anemia sem causa aparente.
Apresentava intensa dor em hálux direito, em uso de analgésico.
Encontrava-se com exames recente que evidenciava uma Hb = 11,
8g/dL; anemia normocromica e normocitica, sem anisoscitose, com
glicemia de 265mg/dL e proteína C reativa 87mg/dL (valor de
referência [VR] < 5mg/dL) e velocidade de hemossedimentação
(VHS) de 102mm/h (VR < 30mm/h), ausência de alteração
laboratorial de ferro sérico, saturação de transferina e feritina. Foi
iniciado o manejo da anemia de doença crônica com tratamento da
doença inflamatória crônica e do diabetes descompensado.
Retornou após cinco meses em uso de medicamentos para
diabetes e para gota apresentando resolução da anemia, níveis de
1) Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2) Hematologista do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
3) Chefe do Serviço de Hematologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
Instituição: Serviço de Hematologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
Correspondência: Rua Nabuco de Araujo, 240 ap. 76, Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 15/04/2016; publicado online em 20/12/2016
136
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 136 - 137, out / nov / dez 2016
glicemia em jejum de 127mg/dl , PCR de 4,7 e VHS de 15.
Caso 2. Paciente feminina, 32 anos, caucasiana, com história de
doença de Crohn havia 15 anos, sem comorbidades, procurou o
Serviço de Hematologia para investigação de anemia de três anos,
com piora progressiva. Apresentava pesquisa de sangue oculto
negativo e colonoscopia sem evidência de sangramento.
Apresentava anemia normocítica e normocrômica, com PCR > 45.
Informava tratamento irregular da doença inflamatória intestinal.
Nesse caso , optou-se pelo retorno ao tratamento da doença de
Chron de forma adequada. Retornou após cinco meses com
melhora dos níveis de hemoglobina, Hb 12,6g/dL.
Discussão
Entre os mecanismos patogênicos responsáveis pelo
aparecimento da ADC, os três principais são: diminuição da
sobrevida das hemácias, eritropoiese ineficaz e alteração do
metabolismo de ferro, sendo este último o mais importante. Todos
esses mecanismos são desencadeados pela lesão tecidual
crônica, que resulta em uma resposta imunológica com liberação
de citocinas inflamatórias levando ao aparecimento da anemia3,5.
A diminuição da sobrevida eritrocitária está relacionada ao
aumento de interleucina-1, que leva ao aumento da atividade
fagocitária de macrófagos, resultando em uma sobrevida de 70-90
dias6,7.
A eritropoiese ineficiente está diretamente relacionada à liberação
de citocinas inflamatórias, principalmente ainterleucina-1 e
interleucina-6 (IL-1 e IL-6), fator de necrose tumoral (TNF á) e
interferon gama (INF ã), que atuam inibindo a proliferação de
percursores eritrocitários e, assim, inibindo a eritropoese8,9 .
O distúrbio do metabolismo de ferro está diretamente relacionado
com a maior produção de hepcidina, sendo esse um propeptídeo
sintetizado no fígado, em resposta ao aumento de níveis séricos de
ferro na circulação ou à presença de um estado inflamatório10.
A hepcidina possui um receptor na ferroportina. Essa interação de
hepcidina-ferroportina controla os níveis de ferro nos enterócitos,
hepatócitos e macrófagos. Na ADC, resulta da ativação do sistema
imunológico com liberação de citocinas inflamatórias,
principamente IL-6, que estimula a produção de hepcidina pelos
hepatócitos. O aumento destes leva a maior interação de
hepcidina-ferroportina, que resulta na diminuição da absorção de
ferro nos enterócitos, inibe a mobilização do ferro dos enterócitos
para plasma e promove o estoque de ferro dentro dos macrófagos,
resultando em hipoferremia e, assim, em menor disponibilidade de
ferro para eritropoiese, levando à anemia1,10,11.
A apresentação clínica da ADC geralmente está relacionada à
doença de base, sendo a anemia um achado. A característica
laboratorial consiste em uma anemia de intensidade leve a
moderada (hemoglobina entre 9 e 12g/dL), normocrômica e
normocítica. De 30 a 50% dos pacientes podem apresentar
eritrócitos hipocrômicos com presença de estoques de ferro
adequadas, contudo, com hipoferremia10,11.
O principal dado laboratorial dessa anemia é a diminuição da
concentração do ferro sérico. O índice de saturação de transferrina
e o índice da capacidade total de fixação do ferro (TIBC)
encontram-se diminuídos.
Os níveis de ferritina, que refletem os depósitos de ferro,
encontram-se normais ou aumentados. Entretanto, a mesma é
uma proteína de fase aguda, que pode aumentar na presença de
doença inflamatórias ou neoplásicas, não expressando de forma
correta os níveis reais de ferro no organismo3. Encontram-se outras
alterações bioquímicas, tais como aumento da velocidade de
hemossedimentação (VHS), proteína C reativa (PCR), fibrinogênio
e do cobre sérico, diminuição da albumina e da haptoglobina9,10,11.
Alterações nesses parâmetros têm relação direta com severidade
da fase aguda doença, podendo ser utilizada para monitorar a
resposta ao tratamento instituído3.
Depois de excluídas outras causas de anemia, o tratamento da
ADC é essencialmente o tratamento da doença de base. Esse tipo
de anemia não responde à terapia com ferro, ácido fólico ou
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 136 - 137, out / nov / dez 2016
vitamina B12.
Em casos em que a anemia é sintomática ou em que os doentes
apresentam doenças cardiovasculares, são indicados reposição de
ferro intravenoso, administração de eritropoietina e transfusões
sanguíneas.
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137
Relato de Caso
Hipoglicemia neonatal persistente
Persistent neonatal hypoglycemia
Hugo Belavenuta Pinto¹
José Mário da Rocha Britto²
RESUMO
Introdução: Hipoglicemia é a ocorrência de oferta inadequada
de glicose a partir de níveis séricos abaixo dos valores normais
para idade. Esses valores normais são diferentes no período
neonatal e após o período neonatal. A incidência de
hipoglicemia neonatal é 1,3 a 4,4 casos para cada 100 recémnascidos a termo, aumentando ainda mais em prematuros.
Relato de caso: O paciente é um recém-nascido prematuro,
nascido de mãe portadora de doença hipertensiva específica
da gravidez. Nasceu de parto cesárea por centralização
placentária, porém, sem intercorrências, evoluindo no primeiro
dia de vida com cianose e queda de saturação. Apresentou, no
terceiro dia de vida, quadro de hipoglicemia persistente, de
difícil controle, mesmo com uso de medicações.
Descritores: Hipoglicemia. Prematuridade. Hipoglicemia
Persistente.
Introdução
Hipoglicemia é a ocorrência de oferta inadequada de glicose a
partir de níveis séricos abaixo dos valores normais para idade.
Esses valores normais são diferentes no período neonatal e após o
período neonatal. No período neonatal os limites de 30mg/dL para
prematuros e de 40mg/dL para recém-nascidos a termo tem sido
substituídos pelo limite de 50mg/dL, independentemente da idade
gestacional, após o relato de deficiências cognitivas em crianças
que apresentaram episódios de euglicemia com valores abaixo de
50mg/dL¹.
Os bebês pré-termos não têm muito glicogênio em seus corações,
especialmente aqueles que estão com dificuldade respiratória.
Estes vão necessitar de maiores níveis sanguíneos de glicose para
compensar a falta de oxigênio (aumenta o consumo cardíaco).
Alguns órgãos são especificamente mais dependentes da glicose e
vão necessitar que se mantenha o nível glicêmico mais alto para
ser protetor². Cerca de 50% das hipoglicemias em período
neonatal são assintomáticas e detectadas por haver fatores
predisponentes, como prematuridade ou desnutrição intrauterina
ou mesmo agravos perinatais importantes, como anóxia ou retardo
na introdução alimentar. Muitas dessas crianças recuperam-se
espontaneamente, mas 10 a 20% podem necessitar infusão de
glicose intravenosa. Aproximadamente 15% das hipoglicemias em
período neonatal pertencem ao grupo das hipoglicemias
transitórias do neonato, que são sintomáticas e requerem infusão
de glicose endovenosa. Em geral, são crianças pequenas para a
ABSTRACT
Introduction: Hypoglycemia is the occurrence of inadequate
supply of glucose from blood levels below normal for age. These
normal values ?
are different in the neonatal period and after the
neonatal period. The incidence of neonatal hypoglycemia is
from 1.3 to 4.4 cases per 100 newborn terms, further increasing
in preterm infants. Case report: The reported patient is a
premature newborn, whose mother presented hypertensive
disorders of pregnancy. Birth child borned by cesarean
placental centralization, however, uneventful, evolving on the
first day of life with cyanosis and fall saturation. The patient
presented persistent hypoglycemia difficult to control on the
third day of life, even with the medication employed.
Key words: Hypoglycemia. Prematurity. Persistent
Hypoglycemia.
idade gestacional e ocorre uma predominância do sexo masculino
(2,5:1)³.
Relato de caso
Paciente nascido de parto cesárea obteve escore de Apgar 9 de
primeiro minuto e 10 no quinto minuto de vida. A realização da
cesárea foi indicada por centralização placentária. A criança, do
sexo feminino, foi classificada como recém-nascida prematura (36
semanas e um dia de idade gestacional), com baixo peso ao
nascimento (2090 gramas) e com uma estatura de 46 centímetros.
A mãe era tercigesta, com um parto cesárea anterior e um aborto,
sendo portadora de doença hipertensiva específica da gravidez
(DHEG). Fazia uso de Aldomet 250mg ao dia. No primeiro dia de
vida, o recém-nascido (RN), apresentou quadro de cianose
generalizada e queda de saturação de O2 no berçário, sendo
encaminhado para UTI neonatal. Foi intubado, necessitando de
ventilação pulmonar mecânica por dois dias. Evoluiu com
hipoglicemia no terceiro dia de vida, necessitando de glicose
parenteral com velocidade de infusão de glicose (VIG) aumentada
progressivamente até 12, necessitando de associação de
corticoide (hidrocortisona) e ainda persistindo com episódios de
hipoglicemia. No décimo segundo dia de vida, foi associado
Glucagon, utilizado por seis dias até a normalização da glicemia.
Em seguida, foi reduzido gradativamente a VIG e suspenso o
corticoide. Apresentou evidências laboratoriais de sepse neonatal
precoce, sendo utilizado Penicilina Cristalina (4 dias), Gentamicina
1) Residente de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2) Preceptor do Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Instituição: Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Hugo Belavenuta Pinto, Rua Dr. Arnaldo de Carvalho n°40, Apto 23 – Santos – SP / email: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 02/05/2016; publicado online em 20/12/2016
138
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 138 - 139, out / nov / dez 2016
(5 dias), Cefepime (14 dias) e Vancomicina (21 dias). Devido ao
episódio de persistente de hipoglicemia, foi realizado pesquisa de
erros inatos do metabolismo, com resultados normais.
Permaneceu internado por 22 dias em UTI neonatal e por mais
cinco dias em enfermaria, onde permaneceu estável, sem mais
episódios de hipoglicemia, recebendo alta com 27 dias de vida.
Discussão
A incidência de hipoglicemia neonatal é 1,3 a 4,4 casos para cada
100 recém-nascidos a termo, aumentando ainda mais em
prematuros³, como no caso relatado.
Definições clínicas, epidemiológicas e fisiológicas são
encontradas na literatura e os sintomas da hipoglicemia são
inespecíficos, apresentando manifestações generalizadas
comuns aos neonatos doentes. Assim, recomenda-se que valores
baixos de glicose sanguínea e sintomas consistentes de
hipoglicemia para os neonatos sejam considerados. Portanto,
confirma-se o diagnóstico de hipoglicemia quando se encontram
valores baixos de glicemia capilar com observação de sintomas4.
No caso relatado, o recém-nascido apresentou glicemia de
28mg/dL e sintomas como cianose e hipoatividade, confirmando,
assim, o diagnóstico de hipoglicemia.
Em relação ao tratamento, se confirmado conforme descrito, devese aplicar 200mg/Kg de glicose (2 ml/Kg de glicose a 10%) e
manter infusão intravenosa continua de glicose (8mg/Kg//min). Se
a hipoglicemia persistir por 24-36 horas, usar o corticosteroide
(hidrocortisona na dose de 5-15mg/Kg/dia ou prednisona:
2mg/Kg/dia) O corticosteroide diminui a utilização de glicose e
aumenta a gluconeogênese². O uso de Glucagon é controverso e
não recomendado por alguns autores3,4, pois a glicose sobe muito
rapidamente, com aumento da produção de insulina e o problema
não se resolve.
Se a hipoglicemia persistir por 3-4 dias, usar-se o diazóxido5. Este
inibe o canal de potássio e a ativação da secreção de insulina pelas
células beta pancreáticas. Se não responder, agrega-se
somatostatina de ação prolongada. Apesar da persistência da
hipoglicemia do neonato aqui descrito, a associação dessas
medicações não foi utilizada e pode justificar o prolongamento do
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 138 - 139, out / nov / dez 2016
caso de hipoglicemia tratada somente com corticoide e glucagon.
Outra constatação descrita na literatura é sobre a prescrição o mais
precoce possível da nutrição parenteral como dieta6.
A dosagem da insulina deve ser realizada para descartar
hiperinsulinismo persistente, o que normalmente acarreta em
pacreatectomia parcial ou total5. Neste relato, a insulina
encontrava-se com valores normais, o que descartaria essa
hipótese.
O maior risco da hipoglicemia está relacionado à lesão cerebral. Se
a hipoglicemia for acentuada, recorrente e durou horas, os recémnascidos podem ter dificuldades de aprendizado e alterações
precoces, mas não consistentes no eletroencefalograma6. Todos os
exames para pesquisa de lesão cerebral (ultra-som transfontanela,
eletroencefalograma, tomografia de crânio) no caso relatado foram
normais e não demonstraram alterações.
Referências
1. Campos D. Tratado de Pediatria. 3a. ed. Barueri: Manole; 2014.
2. Wajchenberg B. Tratado de endocrinologia clínica- Sociedade Brasileira
de Endocrinologia. 2a ed. São Paulo: ABDR; 2014.
3. Damiani D. Hipoglicemia na infância – ainda um desafio. J Pediatria.
1997;73(4):231-8.
4. Margotto PR. Assistência ao recém-nascido de risco - Distúrbios
metabólicos no recém-nascido. 2ª ed. Brasília: Pórfiro; 2005.
5. Lord K, De León D. Monogenic hyperinsulinemic hypoglycemia: current
insights into the pathogenesis and management. Int J Pediatr Endocrinol.
2013;2013(1):3.
6. Josefson J, Zimmerman D. Hypoglycemia in the emergency department
Clin Pediatr Emerg Med. 2009;10:285-291.
139
Relato de Caso
Diagnóstico primário de linfoma não-Hodgkin
pós-esplenectomia na urgência
Primary diagnosis of non-Hodgkin lymphoma post splenectomy on urgency
Isabel Vaz Romani1
Messias Elias Neto2
Airton Zogaib Rodrigues3
Carolina Manna Santos1
Lucas Ferraz Amaral1
RESUMO
Introdução: Os linfomas são tumores sólidos do sistema
imunológico. A taxa de incidência aumenta drasticamente com
a idade e é superior nos brancos em relação aos outros grupos
étnicos. Relato de caso: Paciente de 60 anos, feminino,
apresentou dor em flanco direito e posterior migração para
hipocôndrio e flanco esquerdos há 8 dias, associada a
náuseas, dispnéia e anorexia com perda ponderal de 5 quilos
em 2 meses. Apresentou-se com dispneia (+2/+4), com
dimuição do murmúrio vesicular em base esquerda, abdômen
doloroso em repouso e à palpação em hipocôndrio e flanco
esquerdos. A tomografia computadorizada de abdômen
revelou esplenomegalia com uma massa expansiva intraesplênica de 10,5 x 10,0 cm e derrame pleural volumoso à
esquerda. Procedeu-se à esplenectomia total e toracostomia à
esquerda, sem intercorrências. O anatomopatológico
evidenciou linfoma não-Hodgkin difuso de grandes células B e
a paciente foi encaminhada para realizar a quimioterapia
adequada.
Descritores: Linfoma não-Hodgkin/Diagnóstico. Linfoma nãoHodgkin/Complicações. Esplenectomia/Indicações. Doenças
do Baço.
Introdução
Linfomas são transformações neoplásicas de células linfoides
normais que residem predominantemente em tecidos linfóides.
São morfologicamente divididos em linfomas de Hodgkin (LH) e
não-Hodgkin (LNH). Os trabalhos atuais mostram que o LNH é a
quarta neoplasia mais incidente nos Estados Unidos, excluindo o
câncer de pele não melanoma, sendo responsável por 4% de todas
as malignidades. É também a nona causa de morte por câncer no
sexo masculino e a sétima no sexo feminino, envolvido em 5% das
mortes por câncer1-2. Estudos recentes apontam que os linfomas
não-Hodgkin correspondem a 4% dos novos tumores e a taxa de
incidência ajustada pela idade é cerca de 23.4 por 100.000 homens
e 15.6 por 100.000 nas mulheres.
A incidência vem aumentando nas últimas quatro décadas,
principalmente os linfomas agressivos, o que parece ser apenas
parcialmente explicado pela maior incidência de síndrome da
imunodeficiência adquirida e pela exposição a fatores ambientais.
A maioria dos casos não possui etiologia definida, porém, sugerese que fatores hereditários, ambientais, ocupacionais e dietéticos
possam estar envolvidos3.
ABSTRACT
Introduction: Lymphomas are solid tumors found in the body's
immune system. The incidence rate grows significantly with age
and is higher among whites compared to others ethnicities.
Case report: A 60-year-old demale patient reported pain in the
right flank and posterior migration to left hypochondrium and
flank for 8 days, associated to nausea, dyspnea and anorexia
with weight loss of 5 kilograms within 2 months. She presented
with dyspnea (+2/+4), diminished vesicular breath sounds in the
left base, painful abdomen at rest and on palpation in left
hypochondrium and flank. CT scan revealed splenomegaly with
intrasplenic expansive mass measuring 10.5 x 10.0 cm in
diameter. A total splenectomy and left thoracostomy were
proceeded with no complications. The anatomopathological
examination showed a diffuse large B-cell non-Hodgkin
lymphoma (NHL). Patient was then referred to a hematologist
for adequate chemotherapy.
Key words: Non-Hodgkin's Lymphoma/Diagnosis. Lymphoma
Non-Hodgkin/Complications. Splenectomy/Indications.
Diseases of the Spleen.
Além desses fatores, alguns agentes infecciosos têm sido
implicados na gênese do LNH, incluindo o vírus do Epstein-Barr,
vírus linfotrópico de células T humano tipo 17, herpes vírus tipo 88,
vírus da hepatite C9-10, vírus simiano 4011 e a bactéria
Helicobacter pylori1,2.
Os linfomas de alto grau apresentam alto índice de proliferação
celular, células grandes, linfonodomegalias localizadas, porém com
alta agressividade, cursando com sobrevida de semanas a meses
se não tratados. São considerados linfomas de alto grau o linfoma
não-Hodgkin difuso de grandes células B (LNHDGCB), o linfoma
folicular pouco diferenciado, o linfoma de células do manto, o
linfoma de células T periférico, o linfoma de grandes células
anaplásico e o linfoma de Burkitt1,3,4,5.
Atualmente, a classificação mais utilizada para linfomas é a da
Organização Mundial da Saúde (OMS). Tal classificação baseia-se
em dados de morfologia, imunofenotipagem, genética e
informações clínica e divide os vários tipos de neoplasias linfóides
em três grandes grupos: neoplasias de células B, neoplasias de
células T/NK e linfoma de Hodgkin. O LNHDGCB é o linfoma mais
comum em adultos, responsável por 30% a 40% dos casos1,4.
Os exames de estadiamento incluem hemograma completo, função
1) Residente de Cirurgia Geral do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2) Chefe do Serviço de Cirurgia Geral do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
3) Assistente do Serviço de Cirurgia Geral do Hospital Ana Costa, Santos/SP
Instituição: Serviço de Cirurgia Geral do Hospital Ana Costa, Santos/SP
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 10° andar – 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 23/03/2016; publicado online em 20/12/2016
Conflito de interesse: Nenhum. Fonte de Fomento: Nenhuma
140
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 140 - 141, out / nov / dez 2016
renal e hepática, desidrogenase lática (LDH), beta-2
microglobulina, cálcio, ácido úrico, eletroforese de proteínas,
sorologias virais, tomografia computadorizada (TC) de tórax,
abdome e pelve e biópsia de medula óssea (BMO)1.
O diagnóstico deve ser feito no tecido nodal ou extranodal de
preferência obtido por biópsia excisional1,4.
Relato de caso
Paciente de 60 anos, do gênero feminino, queixava-se de dor em
hipocôndrio direito com posterior migração para hipocôndrio e
flanco esquerdos há oito dias. A característica da dor era contínua,
com intensidade crescente que melhorava parcialmente após uso
de analgésicos e não havia fatores de piora. Também era
associada há náuseas, dispnéia e anorexia com perda ponderal de
5Kg em dois meses. Negava febre, vômitos, icterícia ou outros
sintomas. Ao exame físico, encontrava-se em regular estado geral,
eutrófica, hidratada, dispneica (+2/+4) com diminuição do
murmúrio vesicular em base esquerda, abdômen doloroso em
repouso e à palpação em hipocôndrio e flanco esquerdos, sem
sinais de peritonite ou tumor palpável, com normalidade do
restante do exame clínico. A TV de abdômen total revelou
esplenomegalia com uma massa expansiva intra-esplênica de
10,5 x 10,0cm de diâmetro, com áreas de liquefação e necrose
central em seu interior associada a um derrame pleural volumoso a
esquerda (Figura 1). A laparotomia subcostal esquerda na urgência
identificou esplenomegalia volumosa no intra-operatório.
Procedeu-se à esplenectomia total sem intercorrências,
subsequente sutura da parede abdominal por planos e
toracostomia à esquerda. À abertura do espécime operatório,
encontramos tumoração de aspecto friável e com áreas de necrose
(Figura 2). Evoluiu com melhora clínica e sem intercorrências. O
anatomopatológico evidenciou linfoma não-Hodgkin difuso de
grandes células B. Foi transferida ao Serviço de Hematologia para
realização da quimioterapia com esquema R-CHOP. Foram
realizadas sorologias para hepatites virais e anti-HIV, todas
negativas. Além disso, no estadiamento desta paciente pela
tomografia computadorizada por emissão de pósitrons (PET) não
foi visualizado outros sítios de linfoma (somente em linfonodos
peri-esplênicos) e a biópsia da medula óssea não apresentou
células tumorais.
Figura – Imagem de massa intra-esplênica com necrose central.
Discussão
A avaliação do paciente com LNH inclui anamnese e exame físico.
Mais de dois terços dos pacientes apresentam-se com
linfadenopatia e sintomas B (febre, sudorese noturna e
emagrecimento) são observados em cerca de 40%, indicando
doença agressiva. No entanto, a paciente do relato não apresentou
linfadenopatia ou sintomas B, o que dificultou o diagnóstico2,3,5.
Aproximadamente 20% dos pacientes têm massa mediastinal e
cerca de 3% a 8% podem cursar com síndrome de veia cava
superior. Além disso, doença extranodal (outros sítios, exceto
linfonodos, baço ou medula óssea) é observada em 10% a 35% dos
casos, acometendo principalmente o trato gastrintestinal. A medula
óssea (MO) está infiltrada em 30% a 50% dos pacientes, mais
comumente nos linfomas indolentes 1-3,5 . No entanto, no
estadiamento da paciente, não foi visualizada doença extranodal
ou acometimento da medula óssea.
O LNH é o terceiro tipo de câncer que apresentou o maior aumento
na incidência, somente após o melanoma, primeiro lugar e o câncer
de pulmão, segundo1. Evidenciou-se que, no LNH, o baço é
geralmente afetado (50% a 80%) no decorrer das autópsias de
mortes por este linfoma5. O termo linfoma esplênico primário (LEP)
refere-se a uma variedade de linfomas em que a doença começa no
baço, o que é uma forma rara de apresentação de linfomas (<1%).
O LEP apresenta sítio único no baço (esplenomegalia) e ausência
de linfadenopatia periféricas3-5, sendo este o caso da paciente e sua
incidência é raríssima entre os linfomas.
O diagnóstico do LEP é realizado se houver isoladamente
esplenomegalia na ausência de qualquer outra linfadenopatia,
especialmente nos linfonodos peri-hepáticos, para-aórticos ou
mesentéricos. O mais interessante mostrado nos trabalhos é que o
diagnóstico de LEP só é fechado após 6 meses de tratamento, sem
recidivas após a remoção do baço. Além disso, a idade média de
início da LEP é de 36 anos, com um intervalo entre 22 e 48 anos, no
entanto, a paciente descrita acima encontrava-se fora desse
intervalo de maior incidência. A incidência do LEP é mais comum
em mulheres com uma proporção de 4:1, neste quesito a paciente
em questão, como era do sexo feminino, fazia jus a literatura3-5.
Os métodos mais comumente utilizados ?
para diagnosticar esta
doença são a TC ou o PET-CT, que proporcionam fácil detecção
tumoral. No entanto, o diagnóstico definitivo requer a
esplenectomia e posterior estudo histopatológico do espécime
cirúrgico1,3,5.
Referências
Figura – Baço com tumor central.
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 140 - 141, out / nov / dez 2016
1. Harris NL, Jaffe ES, Diebold J, Flandrin G, Muller Hermelink K, Varkiman
J, Lister TA, Bloomfield CD. World Health Organization classification of
neoplastic diseases of the hematopoietic and lymphoid tissues: report of the
Clinical Advisory Commitee Meeting - Airlie House, Virginia, November
1997. J Clin Oncol. 1999;17(12):3835-49.
2. Araújo LHL, Victorino APAS, Melo AS, Assad DX, Lima DS, Alencar DR,
Moreira MML, Filho OM, Coelho RFS, Asmar SB, Pereira BSV, Scheliga A.
Linfoma não Hodgkin de alto grau: revisão da literatura. Rev Bras Cancerol.
2008;54(2):175-83.
3. Milito CB, Morais JC, Nucci M, Pulcheri W, Spector N. Classificação dos
linfomas não-Hodgkin: estudo morfológico e imunoistoquímico de 145
casos. J Bras Patol Med Labor. 2002;38(4):315-24.
4. Miller TP, Dahlberg S, Cassady JR, Adelstein DJ, Spier CM, Grogan TM,
LeBlanc M, Carlin S, Chase E, Fisher RI. Chemotherapy alone compared
with chemotherappy plus radiotherapy for localized intermediate and highgrade non-Hodgkin´s lymphoma. N Engl J Med. 1998;339:21-6.
5. Medina CT, Cotran RS, Vinay K, Tueker C. Patología Estructural y
Funcional 6a ed. Madrid: McGraw-Hill Interamericana; 2000.p.682.
141
Relato de Caso
Uso do pessário em pacientes
com incompetência istmo-cervical
Pessary in patients with cervical incompetence
Julia Francato Chiaradia1
João Henrique de Araújo Fernandes2
RESUMO
Introdução: A incompetência istmo-cervical é uma condição
caracterizada pelo apagamento do colo uterino, sendo
diagnosticado por meio de anamnese e exames ultrasonográficos durante o segundo trimestre da gravidez. Após o
diagnóstico, existem vários tipos de práticas preventivas para
evitar o trabalho de parto prematuro, dentre eles o uso do
pessário. Relato de caso: Gestante de 31 anos, com 23
semanas e 4 dias de gestação, procura o serviço, com
alterações em seus exame ultra-sonográfico, com diagnóstico
de colo curto. Optou-se pela introdução do pessário, com
sucesso, já que o seu diagnóstico foi realizado tardiamente.
ABSTRACT
Introduction: The cervical incompetence is a condition
characterized by the deletion of the cervix and is diagnosed
through a careful medical history and ultrasound exams during
the second trimester of pregnancy. After the diagnosis, there
are several types of preventive practices in order to avoid
premature labor, including the use of pessary. Case report: A
pregnant 31, at 23 weeks and 4 days gestation, requesting the
service, with changes in their sonographic examination, was
diagnosed with short cervix. We opted for the introduction of the
pessary successfully since its diagnosis was made late.
Key words: Pregnancy. Cervical Incompetence. Pessary.
Descritores: Gestante. Incompetência Istmo-Cervical.
Pessário.
Introdução
A incompetência cervical é uma condição que se caracteriza pela
perda fetal recorrente no segundo trimestre da gravidez, em
consequência da insuficiência do sistema de oclusão do colo
uterino. Essa inabilidade do colo uterino em manter-se
convenientemente ocluído pode ser consequente a um defeito
estrutural ou funcional. Geralmente, ocorre dilatação cervical
indolor, ausência de sangramento, protrusão das membranas
ovulares na vagina e posterior rotura de membranas, seguida de
expulsão fetal, na maioria das vezes com produto conceptual ainda
vivo. A incompetência cervical é responsável por 10 a 20 % dos
abortamentos de repetição¹.
O diagnóstico clínico de incompetência cervical é baseado
fundamentalmente na historia obstétrica de perdas fetais
recorrentes no segundo trimestre da gravidez (entre 12 e 20
semanas) ou partos prematuros extremos (entre 21 e 32 semanas
de gestação)².
A ultra-sonografia transvaginal, por ser exame de fácil execução e
não invasivo, tem sido utilizada no diagnóstico de incompetência
cervical durante a gestação. Avaliam-se, para esse diagnóstico, o
comprimento da cérvix, a forma do canal cervical e a presença da
protrusão das membranas amnióticas através do canal cervical³.
O comprimento do colo apresenta uma distribuição normal na
população e o percentil 10 entre 22-20 semanas é de 25mm.
Apesar de existir alguma variação, na definição de colo curto, é
este valor comumente considerado como ponto de corte³.
Durante as últimas décadas, várias intervenções foram estudadas
na tentativa de prevenir o trabalho de parto prematuro em mulheres
com fatores de risco ou comprimento do colo curto. As intervenções
mas estudadas são a prescrição de progesterona, realização de
ciclorrafia ou colocação de pessário vaginal¹.
O pessário vaginal é um dispositivo de silicone que é colocado no
fundo do saco vaginal ao redor do colo uterino. Promove um
reajustamento do ângulo formado entre o maior eixo do colo e o
pavimento pélvico, fazendo com que o peso do saco gestacional
seja distribuído mais para o seguimento anterior do útero e não
tanto para o colo uterino².
Relato de caso
Paciente de 31 anos, 23 semanas e 4 dias, secundigesta, com
parto cesárea anterior, procurou o ambulatório de alto risco, do
Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, com
ultra-sonografia obstétrica recente com o diagnóstico de
encurtamento de colo uterino (1,6cm) associado a bolsa protrusa e
presença de sluge. A paciente relata que, em gestação anterior,
apresentou amniorrexe prematura com 29 semanas, associada a
cervicodilatação precoce. Foi realizado, na época, parto cesárea
devido ao feto estar em posição pélvica. Devido ao diagnóstico
tardio de incompetência istmo cervical em gestação atual, foi
sugerido a implantação do pessário, já que não há indicação de
circlagem do colo uterino, devido à idade gestacional mais
avançada e presença de sluge. O pessário foi introduzido via
vaginal com sucesso. Seu pré-natal ocorreu normalmente. Com 28
semanas, foi realizado um ciclo de Celestone Soluspan para
gravidez. Com 38 semanas, a paciente deu entrada no serviço com
diagnóstico de amniorrexe. Foi retirado o pessário com sucesso e
realizado parto cesárea, devido à cesárea anterior.
1) Residente de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2) Chefe do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Instituição: Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Júlia Francato Chiaradia, Rua Pará, 90, apto. 43, 11075-410 Santos/SP, Brasil
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 23/03/2016; publicado online em 20/12/2016
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
142
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 142 - 143, out / nov / dez 2016
Discussão
A incompetência cervical é uma das principais causas de trabalho
de parto prematuro que pode ser evitada por meio de uma boa
anamnese, exames ultra-sonográficos e diagnóstico prévio¹.
Entre os fatores etiológicos da incompetência cervical, destacamse as causas traumáticas, como dilatação e curetagem; laceração
cervical pós-parto traumático ou pós-abortamento; amputação ou
conização do colo uterino. Pode ser ainda de origem congênita, por
alteração do colágeno ou em consequência à exposição intrauterina ao dietilestilbestrol¹.
Normalmente, o comprimento do colo uterino permanece
praticamente estável até o início do terceiro trimestre da gravidez,
quando se encurta progressivamente. Vários estudos envolvendo
a ultra-sonografia transvaginal no segundo trimestre da gravidez
têm demonstrado a acurácia desse exame na predição de parto
prematuro em pacientes de risco para tal evento, especialmente
nos casos de comprimento cervical inferior a 25mm, quando
associado à antecedente de incompetência cervical ou abaixo de
20mm como fator isolado². Nos casos iniciais, observam-se
dilatação do orifício interno do colo e protrusão das membranas
para o interior do colo (sluge – sinal de dedo de luva)4.
Quando o diagnóstico é realizado, existem algumas intervenções a
serem realizadas para a sua prevenção, tais como, uso de
progesterona, cerclagem e a introdução do pessário³.
A realização da cerclagem do colo uterino deve ser realizada entre
14-16 semanas de gestação, do contrário, deve-se pensar em
outra opção, tal como o pessário.
Quando o diagnóstico da incompetência istmo cervical é tardio, a
melhor opção para prevenção de trabalho de parto prematuro, é a
introdução do pessário³.
Referências
1. Zugaib M. Obstetrícia. 2ª ed. Barueri: Manole; 2012. pp.568-77.
2. Cubal A, Pereira S. Parto pré-termo: rastreio e prevenção. Acta Obstet
Ginecol Port. 2014;8(3):276-82.
3. Bittar RE, Francisco RPV, Zugaib M. Prematuridade: quando é possível
evitar? Rev Bras Ginecol Obstet. 2013;35(10):433-5.
4. Briquet R. Obstetrícia Normal. 2ª Ed. Barueri: Manole; 2011.pp.338.
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 142 - 143, out / nov / dez 2016
143
Relato de Caso
Atresia esofágica
Esophageal atresia
Natália Marques Rodrigues¹
Mariana Rodrigues Guelli²
RESUMO
Introdução: A atresia de esôfago (AE) é uma malformação
congênita caracterizada pela formação incompleta do esôfago
que geralmente está associada a outras malformações.
Suspeita-se de AE quando há poli-hidrâmnio materno no prénatal, interrupção da progressão da sonda de alimentação em
sala de parto e salivação excessiva e espumosa pela boca
após nascimento, entre outros sinais e sintomas clínicos. Feito
o diagnóstico, a estabilização clínica, pulmonar e de anomalias
associadas, a correção cirúrgica é indicada. Relato de caso:
Trata-se de recém-nascido cuja mãe, durante gestação,
apresentou poli-hidrâmnio com aumento do ILA e da altura
uterina, já sugerindo atresia de esôfago. Após o nascimento, a
salivação excessiva e duas tentativas de passagem de sonda
nasogástrica sem sucesso confirmaram a hipótese
diagnóstica. Considerações: Trata-se do caso de um récemnascido com uma hipótese diagnóstica de atresia esofágica
desde o pré-natal que se confirmou ao nascimento com o
quadro clínico e com exames complementares. Apesar do
diagnóstico ter sido feito precocemente, o caso não teve uma
boa evolução.
ABSTRACT
Introduction: Esophageal atresia (EA) is a congenital disease
that is characterized by the absence of a segment of the
esophagus, which is commonly associated with other
congenital anomalies. EA is suspected when patients have
polyhydramnios in the prenatal care, abundant salivation after
birth and a failed gastric poll. After the diagnosis is established
and having reached clinical stabilization, the surgical treatment
can then be indicated. Case report: A new born baby during the
pregnancy developed polyhydramnios, with an increase in
amniotic fluid. This suggested EA. After the baby was born, the
salivation and the failed attempts of passing the gastric probe
confirmed the diagnosis. Considerations: This case report
describe a newborn with a possible diagnosis intrauterine which
was confirmed after birth with clinical condition and sample
tests. Despite early diagnosis the case had not a good outcome.
Key words: Atresia. Esophageal. Congenital Malformations.
Tracheoesophageal Fistula.
Descritores: Atresia. Esôfago. Malformações Congênitas.
Fístula Traqueo-Esofágica.
Introdução
A atresia de esôfago (AE) é a malformação congênita mais comum
do esôfago, tendo sido descrita inicialmente por Durston (1670) e
Gibson (1969) em sua forma de apresentação mais comum,
associada à fístula traqueo-esofágica distal (FTE)¹. É um defeito
congênito relativamente comum de etiologia desconhecida, que
consiste em uma falta de continuidade do esôfago com ou sem
comunicação com a via áerea2. Mais de 50% dos casos
apresentam outras anomalias congênitas associadas, sendo mais
comuns as cardíacas, as urinárias e as do trato gastrointestinal¹.
O manejo da AE é ainda um grande desafio. O índice de sobrevida
está na dependência da prematuridade, malformações congênitas
associadas e atraso no diagnóstico, o que acarreta complicações
pulmonares, daí a importância fundamental do diagnóstico
precoce3.
Relato de caso
Trata-se de recém-nascido (RN) do gênero masculino nascido de
parto cesárea a termo (38 semanas e 3 dias), apgar de 6 no
primeiro minuto, 7 no quinto minuto e 8 no décimo minuto, peso de
nascimento: 2575g (pequeno para idade gestacional). A mãe
apresentou poli-hidrâmnio durante gestação, sendo necessária a
retirada de aproximadamente 1 litro e meio de líquido amniótico no
terceiro trimestre. A último ultra-sonografia gestacional
apresentava um ILA = 28,1cm e a altura uterina estava aumentada
(38cm). Na sala de parto, foi necessária estimulação externa,
máscara aberta com oxigênio e passagem de sonda nasogástrica,
sem progressão. Ao exame físico, apresentava-se em regular
estado geral, sem alteração do aparelho respiratório e cardíaco. Foi
encaminhado para a UTI neonatal para melhor suporte
hemodinâmico e investigação de AE. Na UTI, ao exame físico,
evoluiu com salivação excessiva, sendo realizada nova tentativa de
passagem da sonda nasogástrica sem sucesso. Notou-se a
presença de sons semelhantes a borbulhamento em estômago,
sugerindo fístula, fácies sindrômicas, malformação de pavilhão
auricular bilateral, assimetria facial e retrognatia. Foi mantido em
decúbito elevado, com sistema de aspiração de esôfago (Venturi),
intubação orotraqueal em ventilação mecânica, jejum, iniciado
antibioticoterapia (ampicilina + sulbactam e gentamicina). A
radiografia tóraco-abdominal confirmou o diagnóstico de AE com
fístula; o ecocardiograma mostrou uma comunicação
1. Residente de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2. Médica Pediatra do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Instituição: Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Natália Marques Rodrigues, Rua Frei Francisco Sampaio, 122, apto 51 – 11040-220 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 23/03/2016; publicado online em 20/12/2016
Conflito de interesse: Nenhum. Fonte de Fomento: Nenhuma
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Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 144 - 145, out / nov / dez 2016
interventricular muscular média (aproximadamente 2mm) e uma
comunicação interatrial do tipo óstium secundum
(aproximadamente 2mm); a ultra-sonografia transfontanela e de
rins e vias urinárias não mostrou alterações. Com 48 horas de vida,
foi submetido à cirurgia para correção da AE com fístula distal, no
qual foi realizado esofagoplastia com tratamento de fístula. Após a
operação, apresentou hipertensão pulmonar, insuficiência renal
aguda e choque, evoluindo a óbito com 12 dias de vida.
Discussão
A AE consiste na interrupção da luz esofágica na sua porção
torácica acompanhada da falta de um segmento; em 90% dos
casos, existe uma fístula que comunica o segmento esofágico
distal com a traquéia, próximo de sua bifurcação. Nos demais
casos não existe trajeto fistuloso (8%) ou existe fístula traqueoesofágica com o segmento proximal ou com os 2 segmentos (2%)4.
É a causa mais frequente de cirurgia torácica no recém-nascido,
com uma incidência de 1:3.000 nascidos. Tem discreta
predominância pelo gênero masculino e por caucasianos5.
A causa exata desse complexo é desconhecida; supõe-se que
ocorra um distúrbio do desenvolvimento na formação e separação
do intestino anterior primitivo em traqueia e esôfago. Durante a vida
fetal precoce, o esôfago e a traquéia consistem em um tubo único,
que mais tarde se dividem em duas estruturas, por meio de uma
dobra na parede lateral do intestino anterior. Se esse processo for
incompleto e as paredes laterais do mesoderma deixarem de
encontrar-se em algum ponto, ocorrerá o aparecimento da fístula
esofagotraqueal. Se os folhetos laterais girarem dorsalmente
durante o desenvolvimento das duas estruturas, interrompendo a
passagem do lúmen esofágico, resultará atresia. Além disso,
anoxia intra-uterina ou estresse levando ao comprometimento
vascular poderá causar necrose focal do esôfago, tendo como
resultado atresia ou comunicação esofagotraqueal6.
Cerca de 50% dos bebês com atresia esofágica têm anomalias
associadas.³
As anomalias mais comumente associadas são:
· Cardíacas (ducto arterioso patente, comunicação interatrial e
interventricular, defeitos complexos): são as mais frequentes e
responsáveis, em parte, pela mortalidade desses RN;
· Gastrintestinais: anomalia anorretal e obstruções duodenais,
incluindo más rotações intestinais, são as mais comuns;
· Geniturinária: malformações renais e ureterais;
· Neurológicas: neurocristopatias cefálicas – anomalia de
diferenciação da crista neural; têm relação com a AE isolada e
anomalias cardiovasculares;
· Esqueléticas: vertebrais.
Existe uma associação de malformações particularmente comum,
conhecida pela sigla VACTERL (V - anomalias vertebral, A arroretal, C - cardíaca, TE - fístula traqueo-esofágica, R - renais e
do osso rádio, L – extremidades)¹.
A suspeita deve ser feita já no período pré-natal, diante de polihidrâmnio, que pode ser diagnosticado pelo exame físico da
gestante ou pela ultra-sonografia¹. Se houver suspeita, uma sonda
alimentar de maior calibre deve ser passada e verificada para
estabelecer se alcança o estômago.
Se não for diagnosticada ao nascimento, a manifestação clínica é
de salivação e baba persistente da boca depois do nascimento,
associadas a episódio de cianose e choque. Se o diagnóstico não
for realizado nesse estágio, a criança pode tossir e se sufocar
durante a alimentação. Pode haver aspiração para o interior dos
pulmões de saliva (ou leite), de secreção de vias aéreas ou ácidas
do estômago7, predominando o quadro respiratório, com
aparecimento de pneumonias aspirativas e atelectasias. O
abdome pode estar distendido (pela fístula) ou escavado (sem
fístula)¹.
Para confirmação radiológica, após colocação da sonda injeta-se
de 10 – 20 ml de ar e realiza-se radiografia de tórax e abdome para
analisar:
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 144 - 145, out / nov / dez 2016
· Presença de coto superior do esôfago atrésico cheio de ar;
Campos pulmonares: atelectasias, pneumonias;
· Tamanho da silhueta cardíaca;
· Presença de ar no abdome indicativo de atresia com fístula. Na
atresia sem fístula, o abdome é vazio. Adicionalmente, o
diagnóstico de qualquer obstrução ou atresia intestinal poderá ser
feito;
Analise da imagem dos ossos, principalmente vértebras8.
Uma vez levantada a hipótese diagnóstica de AE, esta deverá ser
confirmada seguida do reconhecimento do tipo de anomalia6. O
tamanho do coto proximal, a altura da fístula e a distância entre os
cotos são fatores que determinam o grau de dificuldade da correção
cirúrgica¹.
Antes da cirurgia, mantém-se o paciente em decúbito ventral para
diminuir qualquer tendência do conteúdo gástrico atingir os
pulmões. A bolsa esofágica deve ser mantida vazia por sucção
constante para evitar aspiração das secreções. Deve-se dar
atenção especial ao controle de temperatura, função respiratória e
tratamento das anomalias associadas³.
A antibioticoterapia deve ser instituída precocemente com
penicilina e amicacina, além da vitamina K, na dose de 1mg
intramuscular6.
O tratamento cirúrgico da AE não é indicado de emergência, mas a
cirurgia corretiva deve ser realizada assim que a investigação
laboratorial e por exames de imagem tenham sido concluídas¹.
A cirurgia em questão vai depender das condições clínicas da
criança e do tipo da atresia. Em atresia com fístula, indica-se a
esofagoplastia, realizada através de toracotomia extrapleural à
direita, com ou sem gastrostomia simultânea6. Atresia sem fístula
existe uma separação grande entre os cotos esofágicos, portanto,
não é possível realizar de primeira intenção uma anastomose T-T².
Com os avanços do tratamento, a mortalidade diminuiu
drasticamente, havendo sobrevida próxima de 95% nos dias de
hoje. A criança portadora de AE tem alta possibilidade de cura com
uma boa qualidade de vida, porém, ainda é uma afecção fatal se
não diagnosticada e tratada precocemente5.
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residente de pediatria. 2ª ed. São Paulo: Editora Atheneu; 2004.
145
Relato de Caso
Farmacodermia por Carbamazepina
Pharmacodermia by Carbamazepine
Orlando Trevisan Neto1
Regiane Oyole Frederico Relva2
RESUMO
Introdução: a farmacodermia é considerada uma reação
adversa a medicamentos que altera a composição da pele,
mucosas ou mesmo leva a alterações sistêmicas, apresenta
um amplo espectro de manifestações clínicas. Devem ser
diferenciadas tais adversidades das reações esperadas de
cada droga. Em torno de 5 a 15% da população geral vai
desenvolver durante a vida algum tipo de reação cutânea
medicamentosa, daí a importância do tema. Relato de caso:
Trata-se de paciente do gênmro feminino, que apresentava
lesões urticariformes, após o aumento da dose de seu
anticonvulsivante, a Carbamazepina, apresentando melhora
clínica, após a suspensão da droga, associada a introdução de
corticosteroides e anti-histamínicos-H1. Comentários: O
manejo da farmacodermia é iniciado com a suspeita clínica de
que alguma medicação possa estar ocasionando as lesões
dermatológicas, sendo o tratamento baseado na suspensão da
droga, além de outras medicações indicadas de acordo com a
gravidade das lesões.
ABSTRACT
Introduction: Drug's adverse is considered an adverse
reaction to medication that alters the skin composition, mucous
or even presents systemic changes, with a broad spectrum of
clinical manifestation. Such changes should be differentiated
from those which can be expected of each drug reaction.
Around 5-15% of the general population will develop some kind
of drug skin reaction during the lifetime, so the importance of the
issue. Case report: A female patient presented urticaria injuries
after increasing the dose of the anticonvulsant Carbamazepine.
Improvement occurred after the discontinuation of the drug,
associated with the introduction of corticosteroids and AntiHystaminics-H1. Comments: The management of an adverse
drug starts with the clinical suspicion that some medication may
be causing the skin lesion and the treatment should be based on
the suspension of the drug and other medication given according to the severity of the injuries.
Key words: Pharmacodermia. Carbamazepine.
Hypersensitivity.
Descritores: Farmacodermia. Carbamazepina.
Hipersensibilidade.
Introdução
A farmacodermia é considerada uma reação adversa a
medicamentos que alteram a composição natural da pele, das
mucosas ou levam a alterações sistêmicas1. Dentre suas
manifestações clínicas, merecem destaque: exantema, urticária,
eritema pigmentar fixo, fotossensibilidade, quadros liquenoides,
acneiformes, porfirias, pigmentações e discromias, exantema
pustuloso generalizado agudo, eritrodermia, vasculites e quadros
vesico-bolhosos2.
Tais reações podem ser consideradas previsíveis ou não. Em
relação às reações previsíveis, incluem-se os efeitos colaterais e
secundários, toxicidades e interações medicamentosas. Já as
imprevisíveis estão associadas à suscetibilidade individual.
Estudos demonstram que as reações de hipersensibilidade podem
influenciar nas situações alérgicas ou não, dependendo do
mecanismo desencadeante, o qual pode ter origem imunológica
apesar da maior parte desses desencadeadores não estarem
ligados às reações imunológicas3.
Medicamentos são utilizados tanto no diagnóstico, quanto no
tratamento e na prevenção de enfermidades4. O uso de drogas
cresce progressivamente e é estimado que cerca de 5% a 15% dos
pacientes desenvolvem durante a vida alguma reação cutânea
medicamentosa5. As medicações que costumam causar um maior
número de farmacodermias são: os antibióticos (principalmente
penicilinas e outros â-lactâmicos), os inibidores da enzima
conversora da angiotensina (IECA), a insulina, os antinflamatórios
não esteroidais (AINES), os diuréticos, os anticonvulsivantes e os
anestésicos6-8.
O objetivo deste estudo é apresentar o caso de uma paciente com
uma farmacodermia tipo urticariforme por Carbamazepina.
Relato de caso
Paciente do gênero feminino, de 67 anos, caucasiana, proveniente
de Santos/SP, deu entrada no Pronto-Socorro do Hospital Ana
Costa com quadro de exantema em tronco, membros inferiores,
membros superiores e região cervical, acompanhados de prurido
urticariforme (Figuras 1 e 2). Havia dois meses, iniciou uso de
Carbamazepina por quadro convulsivo de ausência,
diagnosticados havia aproximadamente 20 anos. Nos últimos dias,
foi recomendada a aumentar a dose da medicação, fazendo uso de
1) Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP
2) Chefe da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP
Instituição: Serviço de Terapia Intensiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Dr. Orlando Trevisan Neto, Av. Mal. Floriano Peixoto, 123, ap. 302, Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 30/03/2016; publicado online em 20/12/2016
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Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 146 - 147, out / nov / dez 2016
200mg de doze em doze horas. Além da Carbamazepina, fazia uso
de fenobarbital 100mg uma vez ao dia, porém, por vários anos. Foi
internada sem alterações nos exames laboratoriais, apresentando
placas eritematosas de bordos irregulares confluentes,
pruriginosas. Foi medicada com Hidrocortisona 1,6g por dia,
inravenoso durante 4 dias, Maleato de Dexclorfeniramina 16mg por
dia, via oral ao longo de 4 dias. A Carbamazepina foi substituída
pelo Ácido Valpróico. Evoluiu com melhora clínica, recebendo alta
cinco dias após.
Figura 1 – Placas eritematosas com bordos irregulares no dorso da
paciente.
Figura 2 - Membro inferior esquerdo com lesões pruriginosas.
de imediato. Um dado importante condizente com o diagnóstico é a
observação de melhora da reação após a suspensão da droga3. A
paciente obteve melhora significativa das manifestações cutâneas
ao interromper o tratamento com a Carbamazepina, comprovando
a suspeita diagnóstica. Algumas alternativas são utilizadas na
comprovação da enfermidade, como testes de provocação, testes
reintrodução da droga e testes de contato10, todavia, os riscos e
custos desses testes não se justificaram na paciente descrita.
A primeira medida a ser tomada em qualquer tratamento de
farmacodermia é a suspensão da medicação e substituição por
outra alternativa3. Se o doente fizer uso de mais de uma medicação,
a indicação é de retirar-se uma droga por vez, sendo que a primeira
deve ser a mais provável e assim sucessivamente. No relato, a
droga anticonvulsivante Carbamazepina foi alterada para o Ácido
Valpróico, que atua como inibidor de potenciais de ação GABA, no
bloqueio dos canais de sódio e indicado em convulsões tônico
clônicas generalizadas, parciais, mioclonias menores e acinéticas.
É especialmente útil em crises de ausência9, como no nosso caso.
O tratamento farmacológico em reações mais brandas, como
urticárias não extensas ou angioedema palpebral, geralmente
responde bem apenas com anti-histamínicos-H1 orais. Já reações
mais graves requerem tratamento com urgência. Nesses casos,
são empregadas medicações de acordo com a necessidade clínica
como: adrenalina intramuscular, anti-histamínicos-H1 e anti-H2,
drogas beta-adrenérgicas e corticosteroides11. A paciente foi
medicada com corticosteroides intravenoso e anti-histamínico-H1
oral, pela extensão das lesões urticariformes.
A dessensibilização a determinadas drogas deve ser indicada
quando não há alternativas terapêuticas à droga que causou a
reação. Os protocolos variam de acordo com o fármaco envolvido
na reação, não sendo pertinente ao caso, uma vez que a droga
pode ser substituída12 sem prejudicar a saúde da paciente.
O relato apresentado versa sobre uma paciente com quadro
urticariforme após aumento da dose de Carbamazepina, que
apresentou melhora clínica, após a substituição da droga por outro
anticonvulsivante, evidenciando tratar-se de uma farmacodermia.
Novos estudos devem ser elaborados para maior compreensão
desta enfermidade de alta prevalência na prática clínica.
Referências
Discussão
A Carbamazepina age bloqueando os canais de sódio voltagemdependentes. É indicada em crises convulsivas parciais com ou
sem crises generalizadas secundárias. Os principais efeitos
adversos notados são: náuseas, vertigem, diplopia, sedação,
cefaleia, insônia, tremores, alterações no comportamento, ganho
de peso, reações cutâneas, entre outros9. No caso relatado, a
paciente apresentou um quadro urticariforme desencadeado pelo
aumento da dose da medicação, sendo o eritema fixo, como no
caso descrito, a principal manifestação cutânea relacionada a
anticonvulsivantes3.
O diagnóstico tem como ponto de partida a suspeita clínica, a
relação do aparecimento das lesões com o início da medicação ou
mudanças na dose3. De maneira geral, os sintomas não aparecem
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 146 - 147, out / nov / dez 2016
1. Antonio RJ, Antonio RC. Farmacodermias. Dermatologia IberoAmericano Online. 2010 Disponível em: <http://piel-l.org/libreria/item/921>.
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147
Relato de Caso
Coroidoretinopatia serosa central
Central serous chorioretinopathy
Renata Angelini Moraes1
Christianne Ruschi Neves1
Marcos Alonso Garcia2
Celso Afonso Gonçalves3
RESUMO
Introdução: Introdução: Coroidoretinopatia serosa central é
uma doença comum, principalmente entre homens na faixa
etária de 20-45 anos que apresentam altos níveis de
ansiedade, estresse emocional e personalidade tipo A. A
doença é diagnosticada por meio de exame clínico, podendo
ser confirmada com os exames complementares como a
angiofluoresceinografia, angiografia com indocianina verde e
pela tomografia de coerência óptica (OCT). O tratamento com
fotocoagulação a laser é realizada somente após quatro
meses do diagnóstico, caso o paciente não apresente melhora
espontânea. Relato de caso: Relatamos um caso de um
adulto jovem que deu entrada no pronto-socorro com queda da
visão de olho esquerdo há 3 dias e após 2 meses o paciente
apresentou melhora não necessitando de tratamentos.
ABSTRACT
Introduction: Central serous chorioretinopathy is a disease
common mainly among men aged 20-45 years that present high
levels of anxiety, emotional stress and type A personality. The
disease is diagnosed through clinical examination and can be
confirmed with the complementary examinations like the
angiofluoresceinography, indocianine green angiography and
optical coherence tomography (OCT). Laser photocoagulation
treatment is performed only after 4 months of diagnosis, if the
patient does not present spontaneous improvement. Case
report: We report a case of a young adult who was admitted to
the hospital with fall of vision of left eye for 3 days and after 2
months the patient improves not requiring treatment.
Key words: Central Serous. Emotional Stress.
Descritores: Serosa Central. Estresse Emocional.
Introdução
Coroidoretinopatia serosa central é um distúrbio esporádico da
barreira hematorretiniana externa, caracterizado por um descolamento localizado da retina sensorial na mácula, secundário a
efeitos focais do EPR. A doença atinge preferencialmente indivíduos do gênero masculino1-2 (em 85% dos casos), na faixa etária de
20 a 45 anos3-4 e está associada com alguns fatores de risco, como
tensão emocional, gravidez e estresse cortisônico. O principal
sintoma é a diminuição de acuidade visual3. O diagnóstico clínico é
feito por meio da biomicroscopia da região macular e confirmado
com exames complementares como a angiofluoresceinografia,
tomografia de coerência óptica (OCT) e angiografia com indocianina verde.
resceinografia nos dois olhos. No olho direito não apresentou
alteração. No esquerdo, apresentou descolamento seroso na área
macular com ponto de vazamento do contraste no EPR responsável pelo descolamento. O vazamento foi na forma de “fumaça de
chaminé” característico da doença. As figuras de 1 a 5 mostram
imagens das etapas da retinografia e angiofluoresceinografia
demonstrando o vazamento em forma de “fumaça de chaminé".
Figura 1. Retinografia mostrando descolamento seroso da região macular.
Relato de caso
Paciente de 32 anos, empresário, com personalidade tipo A, deu
entrada no pronto-socorro do Hospital Ana Costa, com queixa de
baixa de visão de olho esquerdo havia três dias. Referia embaçamento e metamorfopsia nesse olho. Ao exame: acuidade visual de
OD = 20/20 sem correção e OE= 20/100 sem correção. Apresentou
melhora da acuidade de olho esquerdo com correção de lente
corretiva de +1.50 esférico. À biomicrospia, não apresentou
alteração, mas, na região macular, mostrava elevação bem
delimitada da retina nessa área assim como na retinografia. Para
complementar e confirmar o diagnóstico, foi realizada angiofluo1- Médica Residente do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa , Santos/SP
2- Médico oftalmologista, Preceptor de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
3- Doutor pela Universidade Italiana de Rosário. Chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos
Instituição: Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Renata Angelini Moraes, Av. General Francisco Glicério, 121, Cep 11065401, Santos/SP. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 30/03/2016; publicado online em 20/12/2016
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
148
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 148 - 150, out / nov / dez 2016
Figura 2. Enchimento dos vasos da coróide com contraste de flúor.
Após a confirmação do diagnóstico, orientamos o paciente a
aguardar três meses para ver se apresentava melhora da doença
sem tratamento ou se haveria necessidade de realizar fotocoagulação a laser. Assim que completou o tempo estimado, o paciente
retornou ao hospital, realizando novo exame de acuidade visual,
onde apresentou acuidade visual de 20/20 em olho direito e 20/20
em olho esquerdo sem necessidade de uso de lentes corretivas.
Logo, não precisou de tratamento complementar.
Discussão
Figura 3. Completo enchimento dos vasos da coroide e um ponto de
começo de vazamento em região inferior da mácula.
Figura 4. Demonstra vazamento do contraste em região inferior da mácula.
Figura 5. Aumento do vazamento do contraste semelhante a “sinal de
chaminé" em região macular quando comparado a foto anterior aos 55
segundos que confirma o diagnóstico da doença.
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 148 - 150, out / nov / dez 2016
A CRSC é uma doença classicamente relacionada ao sexo
masculino e ao estresse psicológico. A doença atinge preferencialmente indivíduos do gênero masculino1,2 (em 85% dos casos), na
faixa etária de 20 a 45 anos3. As razões pelas quais ocorre uma
maior incidência nos homens são desconhecidas. Especula-se que
fatores genéticos poderiam torná-los mais susceptíveis ou as
mulheres mais protegidas, porém, sem nenhuma comprovação até
o momento5. Outros fatores relatados que induzem ou agravam a
CRSC, além do estresse emocional, tem-se hipertensão não
tratada, consumo de álcool, administração de corticoesteróides e
gestação6.
É uma doença idiopática caracterizada pelo acúmulo de fluido na
área macular, causando descolamento seroso circunscrito da retina
neurossensorial, do epitélio pigmentário da retina (EPR) ou de
ambos7.
O principal sintoma é o embaçamento visual associado a um
escotoma, micropsia, metamorfopsia e, ocasionalmente, macropsia. A acuidade visual reduzida é frequentemente corrigível com
lentes positivas devido o principal sinal da doença5. O sinal
característico é a elevação da retina neurossensorial na região
macular com acúmulo de líquido transparente (90% dos casos) ou
turvo (10% dos casos) no espaço sub-retiniano8. Essa elevação
apresenta-se geralmente plana, bem delimitada e de pequenas
dimensões dificultando a observação em alguns casos.
O diagnóstico clínico é feito por meio da biomicroscopia da região
macular, utilizando lente de Goldmann, que possibilita observar
área elevada em polo posterior. Pode ser confirmado por meio de
exames complementares, como: angiofluoresceinografia, angiografia com indocianina verde e pela tomografia de coerência óptica
(OCT)5.
A angiofluoresceinografia (AF) tem papel importante na avaliação
e confirmação da CRSC, uma vez que pode excluir doenças que
levam ao descolamento neurossensorial de retina9. A AF demonstra
o ponto de vazamento do contraste no EPR responsável pelo
descolamento da retina neurossensorial (DNS). Esse vazamento
apresenta-se em “mancha de tinta”(MT), quando a expansão do
contraste acontece de uma maneira uniforme e simétrica a partir do
ponto inicial; ou na forma de “fumaça de chaminé” (FC), quando o
contraste ascende verticalmente até o limite superior do DNS, para
então expandir-se lateralmente10.
Outra exame, menos frequente, que ajuda no diagnostico é a
angiografia com indocianina verde, onde observa o atraso no
enchimento arterial seguido pela congestão capilar e venosa em
determinadas áreas11. Os principais achados são os múltiplos
pontos de vazamento na coriocapilar encontrados nas fases média
e tardia do exame. Esses pontos ocorrem nas áreas de congestão
vascular e diferem do exame de AFG, no qual o vazamento
geralmente é único12,13.
O exame de tomografia óptica de coerência (OCT) na CCS permite
a observação da retina neurossensorial elevada na região da fóvea
e, em alguns casos, do desprendimento do EPR. O espaço subretiniano apresenta baixa refletividade, podendo estar ocupado por
massas de alta refletividade correspondentes a exsudatos
fibrinosos14.
A falta de conhecimento da gênese da CCS dificulta o tratamento do
fator causal da doença15. A maioria dos casos não necessita de
tratamento. É aconselhável esperar por quatro meses antes de
considerar algum tratamento no primeiro ataque e 1-2 meses para
as recorrências5.
Caso não apresente melhora nesses períodos, a fotocoagulação
149
com laser de argônio pode ajudar a uma resolução mais rápida e
diminuir o índice de recorrências5. Tratamento com o laser é contraindicado se o vazamento estiver próximo ou dentro da zona
avascular da fóvea.
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150
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 148 - 150, out / nov / dez 2016
Relato de Caso
Fístula biliocolocutânea.
Uma rara complicação cirúrgica
tratada por endoscopia
Biliocolocutaneus fistula. A rare surgical complication treated by endoscopy
Tiago Franco Vilela Filho1
Gabriel Marques Favaro2
Diego Soares Coca1
Messias Elias Neto3
Everson Luis Almeida Artifon4
RESUMO
Introdução: A lesão iatrogênica de via biliar póscolecistectomia é uma complicação grave, porém, com uma
baixa incidência. Dentre elas, a fístula bilio-colônica apresenta
apenas alguns relatos descritos. Inicialmente, a conduta é
cirúrgica. Com o advento das técnicas endoscópicas, esta se
tornou uma terapêutica efetiva e alternativa à intervenção
radiológica ou cirúrgica. Relato de caso: Paciente de 53 anos,
feminina, diabética, com antecedente de cirurgia abdominal,
submetida à colecistectomia laparoscópica eletiva, evoluiu 2º
dia de pós-operatório com coleperitôneo, sendo necessária a
reabordagem laparoscópica para drenagem do leito vesicular.
Após 35 dias, queixou-se de saída de secreção biliosa
alternada com secreção entérica pelo trajeto fistuloso do
dreno. A fistulografia demonstrou contraste de alças intestinais
e da árvore biliar. Realizou-se CPRE com identificação de
fistula bilio-colônica e passagem de prótese plástica. Após dois
meses, em nova CPRE de controle, a prótese biliar foi
removida, demonstrando resolução completa da fistula bíliocolônica.
Descritores: Fistula Bílio-Colônica. Pós-Operatório.
Tratamento Endoscópico.
ABSTRACT
Introdution: The iatrogenic biliary duct injury by
cholecistectomy laparoscopic is a serious complication,
however, it has a low incidence. Among them, the biliary colonic
fistula has only a few reported cases worldwide. Initially, the
conduct is surgical. With the advent of endoscopic techniques,
this has become an alternative and effective therapy to the
radiological or surgical intervention. Case report: A diabetic 53
year-old female patient, with a history of abdominal surgery,
underwent an elective laparoscopic cholecistectomy, evolving
with coliperitoneum in the 2nd postoperative, being necessary a
laparoscopic approach for the drainage of the galldbladder bed.
After 35 days, she complained of alternating bilious secretion
with enteric secretion output by fistula drain path. The
fistulography showed staining of bowel and biliary tree. ERCP
was done with identification of biliary-colonic fistula and placed
a plastic biliary stent. After 2 months, in a new ERCP control, the
plastic biliary stent was removed, demonstrating complete
resolution of biliary-colonic fistula.
Key words: Biliary-Colonic Fistula. Postoperative. Endoscopic
Treatment.
Introdução
tografia retrógrada endoscópica (CPRE).
A lesão iatrogênica de via biliar pós-colecistectomia videolaparoscópica é uma complicação grave e potencialmente com risco de
vida, porém, apresenta uma baixa incidência de 0,1 – 2 %1 e apenas
30% destas são reconhecidas durante a cirurgia2. Em tais lesões,
menos de 1% leva a fístula biliar interna, a maioria das quais são
fístulas colédoco-duodenal1. Estas correspondem a aproximadamente 70 % dos casos3. As fístulas bilio-colônicas apresentam
menos de cinco casos descritos em todo o mundo1. Inicialmente, a
conduta nestes casos é tratamento cirúrgico1. Com o advento das
técnicas endoscópicas, esta se tornou uma terapêutica efetiva e
alternativa à intervenção radiológica ou cirúrgica2, além de ser
menos invasiva, sendo o tratamento de escolha para aqueles
pacientes idosos e de alto risco3.
O objetivo é relatar um caso raro de fístula biliocolocutânea pós
colecistectomia videolaparoscópica tratada por colangiopancrea-
Relato de caso
Paciente de 53 anos, feminina, diabética, com antecedente de
cirurgia em andar inferior do abdômen por histerectomia e duas
cesáreas, foi submetida à colecistectomia laparoscópica eletiva,
tendo alta hospitalar no mesmo dia. No segundo dia de pósoperatório, retornou ao pronto-socorro com queixas de náuseas e
vômitos, associada a dor abdominal difusa de forte intensidade. Ao
exame físico geral, encontrava-se em regular estado geral,
descorada +/4+, desidratada 2+/4+, anictérica, afebril. O abdômen
estava distendido, doloroso à palpação difusa, com ruídos hidroaéreos diminuídos, DB positivo. Com isso, foi realizado uma laparoscopia diagnóstica de urgência, sendo evidenciado coleperitôneo e
efetuado drenagem do leito vesicular. Após 35 dias, durante
acompanhamento ambulatorial, queixou-se de saída de secreção
biliosa alternada com secreção entérica pelo trajeto fistuloso do
1. Estagiário do Serviço de Endoscopia Digestiva Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2. Residente do Serviço de Endoscopia Digestiva Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
3. Preceptor de Cirurgia Geral do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
4.Chefe do Serviço de Endoscopia Digestiva Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Instituição: Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 10° andar – 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 07/05/2016; publicado online em 20/12/2016
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 151 - 152, out / nov / dez 2016
151
dreno - Figura 1. Negava febre, dor abdominal ou alteração do
hábito intestinal. Ao exame físico, o abdômen apresentava-se
globoso, flácido, indolor à palpação superficial e profunda, ruídos
hidroaéreos presentes e DB negativo. A fistulografia demonstrou
contraste de alças intestinais e da árvore biliar - Figura 2. Realizouse CPRE com identificação de fistula bilio-colônica - Figura 3.
Optou-se por papilotomia e passagem de prótese plástica em
ducto hepático direito - Figura 4. Após dois meses, referia ausência
de secreção pelo orifício de dreno - Figura 5. Efetuada nova CPRE,
evidenciou-se a contrastação da árvore biliar, com resolução
completa da fístula bilio-colônica. Com isso, foi possível a retirada
da prótese biliar plástica.
Figura 5: Cicatrização do trajeto fistuloso
Figura 1: Trajeto fistuloso do dreno com eliminação de secreção biliar e
entérica.
Discussão
Figura 2: Fistulografia evidenciando contrastação da árvore biliar e alças
intestinais.
Figura 3: Colangiografia com identificação da fístula bilio-colônica em
ducto hepático direito
As fístulas biliares entéricas são complicações raras, encontradas
em menos de 1% dos pacientes com afecções biliares. Geralmente
são observadas em pacientes com colelitíase de longa data, úlcera
duodenal. A principal causa é a colecistite aguda. As fístulas biliares
pós-operatórias são descritas pós-transplante hepático, hepaticojejunostomia e, mais raramente, pós-colecistectomia. Destas
fístulas, a colédoco-duodenal é a mais comum, correspondendo a
aproximadamente 70% dos casos1,3,4,5. As fístulas bilio-colônicas
não são tão comuns. Podem ocorrer espontaneamente, secundário
à coledocolitíase e diverticulite. Após colecistectomia, há menos de
cinco casos relatados em todo o mundo1,5.
O quadro clínico da doença é inespecífico e inclui náuseas,
vômitos, dor abdominal em quadrante superior direito associada ou
não a sinais de peritonite, diarreia e sepse1,3,4,5. No caso apresentado, a paciente encontrava-se assintomática.
O diagnóstico pode ser feito com fistulografia, ultra-sonografia,
tomografia computadorizada, ressonância magnética e CPRE.
Neste caso, utilizou-se a fistulografia, que evidenciou contraste da
árvore biliar e alças intestinais. Com isso, foi realizado CPRE que
apesar de ser um método invasivo e ter complicações, possibilita a
terapêutica.
O tratamento para os casos de fístulas bilio-colônicas é geralmente
cirúrgico1,4,5, sendo o tratamento endoscópico reservado para os
pacientes idosos e de alto risco3. Apesar de a paciente não apresentar altas comorbidades, efetuou-se o tratamento endoscópico como
primeira escolha por ser menos invasivo e, consequentemente,
apresentar uma menor morbimortalidade.
Este caso demonstra a factibilidade do tratamento endoscópico de
uma rara e grave complicação pós-cirúrgica.
Referências
Figura 4: Tratamento de fístula bilio-colônica com passagem de prótese
biliar plástica em ducto hepático direito
152
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Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 151 - 152, out / nov / dez 2016
Relato de Caso
Síndrome do desconforto respiratório agudo
secundária à infecção por influenza A H1N1
Acute respiratory distress syndrome secundary to influenza A H1N1 infection
Vinicius Santos Teixeira1
Regiane Oyole Frederico Relva2
RESUMO
Introdução: Desde o seu descobrimento, em 2009, a
pneumonia viral relacionada ao influenza A H1N1 tornou-se
uma importante e reconhecida causa de insuficiência
respiratória hipoxêmica em todo o mundo. O imediato
reconhecimento da SDRA secundária ao H1N1 e sua imediata
terapia ventilatória acarretam melhor prognóstico. Relato de
caso: Trata-se de um paciente de 56 anos sem fatores de
risco importantes, apresentando quadro de síndrome
respiratória aguda grave
decorrente ao influenza A
H1N1.Evoluiu com insuficiência respiratória aguda, síndrome
do desconforto respiratório agudo, insuficiência renal aguda,
choque refratário ,indo ao óbito no 13º dia de internação.
Descritores: Vírus da Influenza A Subtipo H1N1. Síndrome
Desconforto Respiratório Agudo. Respiração Artificial.
Introdução
Em 2009, uma pandemia disseminada por influenza A H1N1
registrou, até abril de 2010, pelo menos 17.483 óbitos no mundo
inteiro¹. Dados do Ministério da Saúde, resultantes da avaliação de
47 semanas epidemiológicas (SEs), revelaram que a infecção por
H1N1 caracterizava-se por febre, tosse e dispneia e estava
presente em todas as regiões do país². O diagnóstico é feito
principalmente pela pesquisa rápida em swab de nasofaringe por
meio de real-time polymerase chain reaction (real-time PCR;
reação em cadeia da polimerase em tempo real)². Os achados de
tomografia computadorizada alta resolução (TCAR) de tórax mais
comuns foram opacidades em vidro fosco (85%), consolidação
(64%) ou a combinação de ambos (58%). Outros achados foram
nódulos do espaço aéreo (25%), espessamento das paredes
brônquicas (25%), espessamento de septos interlobulares (21%),
padrão de pavimentação em mosaico (15%), espessamento
perilobular (3%) e aprisionamento aéreo (3%). As alterações foram
frequentemente bilaterais (89%), com distribuição não específica
(68%)³. A maioria dos pacientes com Síndrome do Desconforto
Respiratório Agudo (SDRA) secundária à influenza H1N1 apresentava macroscopicamente pulmões “pesados”, com edema difuso,
áreas de consolidação e hemorragia. A doença revela dano
alveolar difuso, eventualmente com hemorragia e bronquiolite
necrotizante. Observam-se microtrombos em mais de 30% dos
ABSTRACT
Introduction: Since its discovery in 2009, the viral pneumonia
related to influenza A H1N1 has become an important and
recognized cause of hypoxic respiratory failure worldwide. The
immediate recognition of ARDS secondary to H1N1 and its
immediate ventilatory therapy carry a better prognosis. Case
report: This is a patient of 56 years without major risk factors,
presenting severe acute respiratory syndrome frame due to
influenza A H1N1. He evolved with acute respiratory failure,
acute respiratory distress syndrome, acute renal failure,
refractory shock going to death on the 13th day of
hospitalization.
Key words: Influenza A Virus Subtype H1N1. Acute
Respiratory Distress Syndrome. Artificial Breath.
casos². A pesquisa tecidual do vírus é quase sempre positiva por
meio de real-time PCR. Evidências de infecção bacteriana
associada são vistas em 38% dos casos.
A gravidade é dividida em três grupos: leve: quando não ocorre
dispneia ou maiores alterações no estado geral; progressiva:
quando, além dos sintomas usuais, ocorrem dor torácica, piora da
oxigenação, hipotensão, confusão mental, desidratação e exacerbação de doenças crônicas, como asma, doença pulmonar
obstrutiva crônica, insuficiência renal, diabetes, entre outras; e
grave: quando ocorre hipoxemia que demanda oxigênio suplementar ou ventilação mecânica, radiografia de tórax alterada, encefalite,
choque, miocardite, rabdomiólise ou superinfecção bacteriana.
Achados laboratoriais incluíam elevação da desidrogenase lática,
creatinofosfoquinase e linfopenia².
Relato de caso
Paciente do sexo masculino, 56 anos, apresentava queixa de tosse
seca, febre de 39°C, dispneia, mialgia, sudorese e náusea por 7
dias. Referia uso prévio de amoxicilina e, no momento, de avalox.
Procurou serviço de pronto-atendimento algumas vezes, sem
remissão do quadro. Os exames laboratoriais demonstraram:
hemoglobina, 12,9 g/dL; hematócrito, 39%; leucócitos, 3.700/mm3;
linfócitos 14% (0-0-82-1-0-14-3); plaquetas, 154.000/mm3; Proteína
C Reativa 163,2 mg/mL; uréia: 8mg/dL; creatinina: 0,8mg/dL; Sódio
1) Estagiário de Medicina Intensiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2) Médica Chefe da Unidade de Medicina Intensiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Instituição: Unidade de Medicina Intensiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 4° andar – 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 29/03/2016; publicado online em 20/12/2016
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 153 - 155, out / nov / dez 2016
153
133 mEq/L; Potássio 3,7 mEq/L; CPK 1239 U/L. A radiografia
simples de tórax (Figura 1) demonstrava infiltrado intersticial
difuso. A tomografia de tórax (figura 2) revelou áreas de consolidação e opacidades em vidro fosco, espessamento de paredes
brônquicas e aprisionamento aéreo. Ao exame físico, mostrava-se
em regular estado geral, temperatura, 37,8°C. À ausculta pulmonar, apresentava estertores crepitantes difusos em ambos os
pulmões, frequência respiratória 35 irpm. SpO2 = 79% sob
máscara de Venturi 50% 10L/min . A gasometria arterial apresentou: pH: 7,47; PO2: 49,8 mmHg; PCO2: 32,5 mmHg; HCO3: 23,2
mmol/l; TCO2: 24,2 mmol/l; BE: 0,4 mmol/l ; SO2:87,7%. Foi
encaminhado paciente a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) com
APACHE II de 12 pontos. À admissão, optou-se pela ventilação não
invasiva - CPAP; corticoterapia; isolamento respiratório; início
empirico de cobertura antimicrobiana, antiviral e antifúngica
(Vancomicina 2 g/dia + Meronem 3g/dia + Bactrim
240mg/1200mg/dia + Osetalmivir 300mg/dia + Fluconazol
400mg/dia). Foram colhidas culturas (hemocultura, urocultura e
cultura de secreção traqueal), swab orofaríngeo para pesquisa de
H1N1, sorologias para legionela, micoplasma, citomegalovírus e
teste rápido para HIV; ecocardiograma transtorácico dentro da
normalidade. Em 12 horas, apresentou piora da dispneia, sendo
submetido à intubação orotraqueal. Desenvolveu, em 72 horas de
infecção, piora das opacidades radiológicas difusas pulmonares
com área cardíaca normal (Figura 3), retenção de escórias
sanguíneas, relação PO2/FiO2 < 100 mmHg e aumento de enzimas
musculares. No 4°dia, foi necessária terapia de substituição renal
pela hemodiálise e realizada biópsia pulmonar aberta. Dentre os
exames colhidos na admissão, a única positividade foi para
influenza A (linhagem suína pdm09) H1N1 e o anatomopatológico
da biópsia pulmonar aberta revelou trombose vascular pulmonar,
enfisema pulmonar com regiões de membrana hialina e pneumonia intersticial inespecífica. A ventilação mecânica requereu
parâmetros caracterizados por PEFP entre 15 a 25 cmH2O, FiO2 de
100%, Pressão Platô de 30 cmH2O e I:E de 1:2; Insuflação Traqueal
de Gás (ITG) a 8L/min, com infusão contínua de bloqueador
neuromuscular atracúrio 0,4 mg/Kg . Evoluiu com mais de 20
pontos da escala APACHE II. Desenvolveu instabilidade hemodinâmica refratária pela infusão de volume e de vasopressores. A
evolução clínica seguiu uma ordem de acometimento inicial das
vias aéreas superiores e inferiores, seguida de insuficiência
nefropulmonar aguda, associada com a síndrome do desconforto
respiratório agudo, rabdomiólise, insuficiência renal aguda, indo a
óbito no 13° dia de internação.
Figura 2. TC de tórax³. Áreas de consolidação opacidades em vidro fosco,
espessamento de paredes brônquicas e aprisionamento aéreo
Figura 3. Radiografia simples de tórax após 72h de evolução
Figura 1. Rx de tórax de admissão
Discussão
A influenza é considerada uma doença que causa morbimortalidade no mundo inteiro¹. A gravidade da afecção está relacionada com
alguns fatores como agressividade do vírus, características
inerentes ao hospedeiro, retardo no diagnóstico e, consequentemente, no tratamento da doença, além da identificação inapropriada das possíveis complicações¹. Após o diagnóstico da evolução da
IRpA para SDRA, o tratamento da síndrome deve ser rápido e
prontamente iniciado, com utilização de ventilação mecânica
invasiva (VMI)¹. No início (primeiras 48 a 72 horas) do ajuste da
ventilação mecânica em pacientes com SDRA (todas as categorias
de gravidade - leve, moderada e grave), são recomendados modos
controlados: Ventilação Controlada a Volume (VCV) ou Ventilação
Controlada a Pressão (PCV). Se SDRA leve, sob ventilação
assistida, Volume Corrente (VC) deve ser ajustado em 6mL/kg
154
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 153 - 155, out / nov / dez 2016
(considerando-se peso predito). Na SDRA moderada ou grave, sob
ventilação assistida ou controlada, VC deve ser ajustado entre 3 e
6mL/kg (considerando-se peso predito). Deve-se usar a menor
FiO2 possível para garantir SpO2 >92% em todos as categorias de
gravidade SDRA. Buscar manter pressão de platô (Pplatô) =
30cmH2O. Em casos de SDRA moderada e grave, quando a PEEP
usada for elevada (geralmente >15cmH2O), pode-se tolerar Platô
de, no máximo, 40cmH2O, desde que necessariamente a pressão
de distensão seja mantida =15cmH2O. Recomenda-se iniciar com
f=20rpm e, caso necessário, aumentar até 35rpm, desde que não
ocasione auto-PEEP, de acordo com a PaCO2 almejada (manter
<80mmHg). Em casos de SDRA moderada ou grave, submetidos a
estratégia de hipercapnia permissiva com VC = 6mL/kg de peso
predito, a frequência pode ser ajustada até 45rpm, desde que não
ocasione auto-PEEP. Nos casos de SDRA com relação pO2/FiO2
<120mmHg sob sedação profunda, utiliza-se cisatracúrio nas
primeiras 48 horas de suporte ventilatório. Deve-se usar a
ventilação mecânica em posição prona em pacientes com SDRA
com relação PaO2/FIO2 <150 por pelo menos 16 horas por sessão.
Recomenda-se óxido nítrico (NO) inalatório em pacientes com
SDRA grave com hipertensão pulmonar aguda e falência de VD,
monitorizando-se a resposta, e titular a dosagem de partes por
milhão (ppm).Nos casos de hipoxemia refratária definida como
uma relação P/F < 80mmHg, com FiO2 >80%, após realização das
manobras adjuvantes e de resgate para SDRA grave por pelo
menos 3 horas, usar oxigenação por membrana extracorpórea
(ECMO) veno-venosa nos centros com essa tecnologia disponível.
No caso em questão, evidencia-se a evolução desfavorável
relacionado ao diagnóstico tardio, mesmo após inicio de terapia de
amplo espectro (antibiótico, antiviral, antifúngico) e suporte
ventilatório invasivo de acordo com os protocolos para síndrome do
desconforto respiratório agudo5.
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Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 153 - 155, out / nov / dez 2016
155
Artigo de Revisão
Bevacizumabe como medicação
para o tratamento da radionecrose
do sistema nervoso central
Bevacizumab as treatment for radionecrosis of central nervous system
Vinicius Santos Teixeira1
Regiane Oyole Frederico Relva2
RESUMO
A radionecrose é uma das sequelas mais graves do tratamento
radioterápico no sistema nervoso central, devido a
comprometimento neurológico e limitações funcionais que seu
desenvolvimento impõe ao paciente. Sua ocorrência deve-se a
mecanismos ainda não totalmente conhecidos, que incluem
desestabilização de células endoteliais, gerando hipóxia e
necrose tecidual com ativação de citocinas e fator de
crescimento vascular endotelial, que gera formação de
neovascularização, instabilidade vascular e edema.
Atualmente, a primeira opção de tratamento é o uso de
corticoterapia, porém, seu uso crônico gera efeitos colaterais
que limitam qualidade de vida. Este estudo mostra a eficácia do
Bevacizumabe no tratamento da radionecrose, evidenciando
redução de edema e do uso de corticoide e melhora de função
neurocognitiva nos pacientes submetidos a este tratamento.
Entretanto, o nível de evidência para sua utilização na prática
clínica ainda é fraco. Necessita-se da realização de grandes
estudos randomizados, duplo cego, placebo controlado com
número mais expressivo de participantes, para confirmação de
tais benefícios.
ABSTRACT
The radionecrosis is the most serious complications of
radiotherapy in the central nervous system due to neurological
changes and functional limitations that may occur. Its
occurrence is due to not yet understood mechanisms including
destabilization of endothelial cells causing tissue hypoxia and
necrosis with activation of cytokines and vascular endothelial
growth factor, which generates the formation of
neovascularization, vascular instability and swelling. The first
choice of treatment is corticosteroid therapy, whose chronic use
generates side effects that limit the quality of life. This review
highlights the efficacy of Bevacizumab in the treatment of
radionecrosis showing edema and use of corticosteroids
reduction and improved neurocognitive function in patients
undergoing this treatment. However, the level of evidence for
the use in clinical practice is still weak. It is necessary more
studies randomized, double blind, controlled, with more
significant number of participants to confirm such benefits.
Key words: Radionecrosis. Central Nervous System.
Bevacizumab.
Descritores: Radionecrose. Sistema Nervoso Central.
Bevacizumabe.
Introdução
A radioterapia baseia-se no uso de radiação ionizante para
tratamento de tumores malignos e doenças benignas. Em 1896, foi
tratado o primeiro paciente com radiação e em 1899 o primeiro
caso de câncer1. O avanço da Física e Engenharia Nuclear permitiu
o desenvolvimento de novas formas de direcionamento desta
energia, propiciando melhor concentração em volume-alvo e maior
proteção a tecidos normais. Entretanto, efeitos colaterais
secundários à radioterapia são inerentes ao tratamento2,3.
As lesões do sistema nervoso central secundárias ao tratamento
radioterápico podem ser classificadas em três categorias: aguda,
que se inicia em semanas; tardia precoce, com início em semanas
até três meses; e tardia remota, que se manifesta após três meses
do início do tratamento2,4,5.
A radionecrose é uma das toxicidades mais limitantes decorrentes
do tratamento radioterápico do sistema nervoso central, já que sua
ocorrência pode gerar sequelas neurológicas e limitação funcional.
Ocorre, em média, em 5% dos pacientes tratados, como uma
complicação tardia remota com instalação geralmente, após três
meses do tratamento, sendo fatores determinantes de sua
ocorrência: o volume a ser tratado, a dose ofertada durante o
tratamento, fracionamento da dose e a associação com
quimioterapia4,6,7.
Histologicamente, em tecidos de radionecrose, observa-se necrose
coagulativa do parênquima cerebral associado à fibrose de vasos,
áreas de desmielinização, morte de oligodendrócitos, edema
axonal, gliose reativa e quebra de barreira hemato-encefálica8.
Estudos pré-clínicos puderam definir que doses de radiação acima
de 18Gy induzem a hipóxia tecidual e, com isso, a aumento de
1) Residente de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
2) Médica Oncologista do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
3) Médica Oncologista Chefe do Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
Instituição: Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60, 10º andar - 11075-400 Santos/SP, Brasil. E- mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 19/09/2016; publicado online em 20/12/2016
156
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 156 - 158, out / nov / dez 2016
expressão de fator de crescimento vascular endotelial por
astrócitos, induzindo formação de neovascularização com
fragilidade capilar, quebra de barreira hematoencefálica e edema9.
O tratamento das lesões causadas ?
pela radiação, em especial a
radionecrose, continua a ser problemática, pois existem poucos
dados de ensaios clínicos para informar as decisões de tratamento,
além das dificuldades em obter-se diagnóstico por meio de exames
de imagem de alto custo e difícil acesso6,10.
Atualmente, o uso de corticóide é a primeira medida instituída para
o controle sintomático por meio de redução de edema, porém, com
seu uso crônico, iniciam-se efeitos colaterais limitantes à qualidade
de vida do paciente8,11.
Outras medidas como uso de anticoagulantes, antiplaquetários,
vitaminas e oxigênio hiperbárico, apresentam resultados
conflitantes e, por vezes, desanimadores. Em último caso, a
abordagem cirúrgica como tentativa de controle de hipertensão
intracraniana e déficit neurológico passa a ser também um
tratamento factível11,12.
Diante desse cenário, vem sendo avaliado o uso do
Bevacizumabe, um anticorpo monoclonal murino humanizado,
aprovado para tratamento de câncer de cólon metastático, câncer
de mama, tumores de pulmão não pequena células, tumores de
ovário e na terapia de segunda linha para tratamento do
glioblastoma, agindo sobre o fator de crescimento vascular
endotelial, inibindo a neovascularização e, assim, promovendo
controle de permeabilidade vascular e redução de edema6,8,11,12.
Relatos e séries de casos sugerem benefícios do tratamento com
antiangiogênico para controle de radionecrose em pacientes com
tumores primários e metastáticos do sistema nervoso central,
como redução do uso de corticóide e melhora cognitiva, após uso
de bevacizumabe4,5,6.
Embora a literatura evidencie casos de benefício com uso de
Bevacizumabe, não existe consenso sobre sua indição, dose a ser
utilizada, tempo de uso, tempo de controle de resposta obtido e
efeitos colaterais11,13.
O objetivo deste estudo é avaliar estudos clínicos, em que se fez
uso de Bevacizumabe para tratamento de radionecrose em
pacientes com tumores primários e metastáticos do sistema
nervoso central, buscando traçar critérios de indicação, dose
utilizada, tempo de uso, desfecho clínico e ocorrência de efeitos
colaterais.
Métodos
Foi realizada revisão da literatura nas bases de dados Lilacs,
IBECS, MEDLINE, Biblioteca Cochrane, Scielo, Pubmed, estudos
clínicos tendo como descritores: “radiation”, “necrosis”, “brain”,
“bevacizumab” e selecionados estudos de interesse em que se fez
uso do Bevacizumabe para tratamento da radionecrose.
Resultados
Foram obtidos 13 estudos clínicos, sendo sete relatos de casos,
cinco séries de casos e um único ensaio clínico randomizado,
duplo-cego, placebo-controlado.
Estes estudos envolveram tumores primários de sistema nervoso
central, tumores metastáticos, sendo os principais sítios primários:
pulmão, mama e melanoma e radionecrose de sistema nervoso
central secundário a tratamento radioterápico de tumores de
nasofaringe.
Como critérios de indicação de Bevacizumabe em todos os
estudos foram relatados piora de déficit cognitivo ou alterações
neurológicas variadas, persistentes após uso de terapia com
corticóide em altas doses ou com início concomitante com
corticoide.
Quanto à dose utilizada, os estudos variaram de 5mg/kg cada duas
semanas a 10mg/kg cada duas semanas, com tempo de uso da
medicação variando de três semanas a 17 meses, conforme
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 156 - 158, out / nov / dez 2016
discriminado pela Tabela 1.
Tabela 1 - Estudos demonstrando dose e tempo de uso do Bevacizumaabe
utilizados para o tratamento da radionecrose.
Para a avaliação de resposta ao tratamento com Bevacizumabe, a
maioria dos estudos buscou como critérios: redução de edema em
exames de imagem, redução da dose de corticóide e melhora de
função cognitiva e déficits neurológicos.
Dos treze estudos, doze avaliaram redução da dose de corticoide.
Todos mostraram redução da dose necessária para controle
sintomático dos pacientes, sendo que, em dois estudos, obteve-se
interrupção da corticoterapia.
Doze estudos avaliaram melhora de cognição, melhora do índice de
performance status e redução de déficits neurológicos instalados.
Todos evidenciaram melhora dos parâmetros supracitados,
todavia, em dois relatos de casos, as respostas foram transientes.
A resposta em relação ao edema foi evidenciada em todos os
estudos que mostraram redução importante, com taxa variando de
54% a 79%, o que foi evidenciado por exame de ressonância
magnética e, em dois estudos, também correlacionado com exame
de PET-CT.
Não foram relatados efeitos colaterais em seis estudos, nos
demais, a maioria dos efeitos colaterais foram leves: hipertensão e
proteinúria. Dentre as complicações com maior gravidade, foram
relatados três casos de pneumonia, um infarto agudo do miocárdio,
uma trombose de seio sagital, um tromboembolismo pulmonar e um
sangramento em sistema nervoso central.
Discussão
A radionecrose é uma complicação tardia do tratamento
radioterápico que se apresenta tipicamente de três a 12 meses
após término de tratamento radioterápico14,15.
Sua ocorrência varia de 2 a 19%, tendo como fatores determinantes
o volume de tratamento, dose ofertada, fracionamento e uso de
quimioterapia associada, podendo em alguns estudos pode chegar
a 35%15,16.
Vários tratamentos são aplicados na tentativa de controle
sintomático, sendo o tratamento-padrão o uso de corticoide, porém,
o uso prolongado de corticoterapia gera efeitos colaterais limitantes
para seu uso. Outras formas de tratamento também utilizadas,
como oxigênio hiperbárico, antiplaquetários, cirurgia e laserterapia
também apresentam respostas limitadas17,18.
O mecanismo de desenvolvimento da radionecrose não é
157
completamente conhecido, envolvendo disfunção do endotélio
vascular, levando a hipóxia e necrose tecidual, o que induz
ativação de citocinas e fator de crescimento vascular endotelial,
gerando neovascularização, fragilidade capilar e desestabilização
da barreira hemato-encefálica, gerando edema e, com isso, déficit
neurológico e comprometimento da qualidade de vida19-20.
O Bevacizumabe é um anticorpo monoclonal que age bloqueando
o receptor do fator de crescimento vascular endotelial. Foi utilizado
a primeira vez para tratamento de radionecrose por Gonzalez et. al,
em estudo retrospectivo de oito pacientes com radionecrose que,
após o uso, apresentaram redução de 44% do edema em exames
de ressonância magnética, compatível com estudos previamente
levantados16,19.
A redução do uso de corticoide ocorre nas semanas iniciais após o
uso de Bevacizumabe, com redução de 8,6mg em média, o que se
deve a estabilização da barreira hemato-encefálica e bloqueio a
neovascularização16,21
Série chinesa relata 17 pacientes diagnosticados com
radionecrose sintomática em uso de corticóide com controle
ineficaz, sendo submetidos a tratamento com Bevacizumabe
7,5mg/kg a cada duas semanas e seguimento por 12 meses.
Observou-se melhora clínica em 10 pacientes e redução do uso de
corticoide em todos eles após quatro semanas do início de
tratamento8.
Estudo duplo-cego randomizado, placebo-controlado com 14
pacientes também evidenciando esse benefício, na dose de
7,5mg/kgcada duas semanas. Nos pacientes do grupo de
tratamento, a melhora de edema ocorreu em 59% dos casos, com
redução do uso de corticoide em 83% dos pacientes11.
Doses mais baixas de 5mg a cada duas semanas, conforme estudo
com 11 pacientes com diagnóstico de radionecrose, também
evidenciou redução do uso de corticoide em todos os pacientes
após uso de anti-angiogênico, contudo, apenas um paciente
manteve esse benefício após suspensão do anti-angiogênico6.
Associado ´`a redução de edema e da dose de corticóide, estudos
mostram melhora importante de performance status, melhora de
padrão congnitivo e redução de déficits cognitivos já instalados10,19.
Quanto a efeitos colaterais, a maioria dos estudos relata alterações
leves como hipertensão arterial que variaram de 12 a 35%,
proteinúria com risco relativo de ocorrência variando de 2,2 a 1,4
dependendo da dose utilizada17. Outros efeitos colaterais de maior
gravidade como tromboembolismo pulmonar, hemorragia
intracraniana variaram de 23,9 a 7,9% dos casos11,22.
Considerações finais
O uso do Bevacizumabe no tratamento da radionecrose evidenciou
resposta sintomática importante em todos os estudos, com
redução do uso de corticoide, melhora cognitiva e melhora de
edema em ressonância mangética ou PET-CT. Na maioria dos
estudos, os efeitos colaterais foram leves e manejáveis.
Entretanto, muitas dúvidas ainda cercam esse tratamento, como a
dose a ser utilizada, tempo de uso e recorrência após a suspensão.
Esta revisão foi baseada em estudos de casos e séries de casos,
com apenas um ensaio clinico randomizado, logo, seu poder é
baixo. Faz-se necessária a realização de estudos clínicos,
randomizados, duplo-cego, placebo-controlados e com número
maior de pacientes, para definir os reais benefícios do uso do
Bevacizumabe no cenário do tratamento da radionecrose e, assim,
futuramente, possibilitar sua inclusão em protocolos de
tratamentos.
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158
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 156 - 158, out / nov / dez 2016
Artigo de Revisão
Zika Vírus
Zika Virus
VFilipe Benetti Rocha ¹
Lucas Salviano de Abreu ¹
Rodrigo Pizzolante Diniz ¹
Yara Dadalti Fragoso ²
RESUMO
Apesar de já ser conhecido há décadas, o Zika vírus ganhou
destaque mundial em 2015 ao ser introduzido no Brasil, onde
foi responsável por uma grande epidemia. Ao propagar-se para
mais de outros 30 países do continente americano, levou a
Organização Mundial da Saúde a declará-lo como Emergência
em Saúde Pública de Interesse Internacional. Além de sua
rápida disseminação, o aumento do número de crianças
nascidas com microcefalia nas mesmas áreas onde o vírus
havia sido reportado gerou enorme repercussão pela mídia
mundial. Sua relação com a microcefalia e associação de
contato de gestantes com o vírus e o vetor em diferentes
trimestres da gestação ainda é pouco compreendida, porém, é
responsável por grande preocupação e receio por parte das
autoridades e da população. Medidas ineficazes de combate
ao vetor Aedes aegypt desde o final dos anos 1980 apenas
reforçam a preocupação do Brasil estar despreparado para
enfrentar tanto vetor quanto a doença.
ABSTRACT
Although known for decades, Zika virus has gained worldwide
prominence in 2015 when introduced in Brazil where it was
responsible for a large epidemic. It has spread to more than 30
other countries of the American continent leading the World
Health Organization to declare it as a Public Health Emergency
of International Concern. In addition to its rapid spread, the
increasing number of children born with microcephaly in the
same areas where the virus had been reported created
enormous repercussions in the world media. Its relation with
microcephaly and contact association of pregnant women with
the virus and the vector in different trimesters of pregnancy is
still poorly understood, but responsible for great concern and
fear by the authorities and the population. Ineffective measures
to fight Aedes aegypti since the late 1980s only reinforce
Brazil's concern of being unprepared to face the vector and the
disease.
Key words: Zika Virus. Microcephaly. Virus.
Descritores: Zika Vírus. Microcefalia. Vírus.
Introdução
Em 1947, um estudo sobre febre amarela obteve o primeiro
isolamento de um novo vírus, do sangue de um macaco rhesus na
Floresta Zika, em Uganda. O Zika vírus permaneceu em relativa
obscuridade por aproximadamente 70 anos. Então, dentro de
apenas um ano, foi introduzido no Brasil a partir das ilhas do
Pacífico e espalhou-se rapidamente pelas Américas. Tornou-se a
primeira grande doença infeciosa ligada a uma anomalia congênita
descoberta em mais de um século e criou uma preocupação global
que fez com que a Organização Mundial da Saúde a declarasse
uma Emergência em Saúde Pública de Preocupação
Internacional1.
Este trabalho é um artigo de revisão sobre o Zika vírus.
Epidemiologia
O Zika vírus é um arbovírus da família Flaviviridae. Desde sua
identificação, as ocorrências de infecções humanas foram
reportadas de maneira isolada e esporádica, com muitos
indivíduos assintomáticos2. O vírus ganhou atenção significativa
apenas em 2007, depois de um surto nas ilhas de Yap, onde
aproximadamente três quartos dos residentes foram infectados
com Zika vírus. Antes disso, apenas 14 casos de infecções em
humanos haviam sido reportados3,4. Em 2013, um surto de Zika
vírus ocorreu na Polinésia Francesa e, pela primeira vez,
microcefalia e Síndrome de Guillain-Barré foram reportados nos
pacientes5.
O surto atual no Brasil teve início em abril de 2015. Em Natal, no Rio
Grande do Norte, foi reportado o primeiro caso de infecção por Zika
3
vírus. Logo após, o vírus disseminou-se pelo país . Em outubro, o
vírus tinha-se espalhado para pelo menos 14 estados brasileiros e,
em dezembro de 2015, o Ministério da Saúde estimou que 1,3
milhão de casos suspeitos haviam ocorrido. Em março de 2016, o
vírus havia se espalhado para, no mínimo, 33 países e territórios
americanos. Em setembro de 2015, investigadores no Brasil
notaram um aumento no número de crianças nascidas com
microcefalia nas mesmas áreas onde o Zika vírus tinha sido
reportado1. Até o início de junho de 2016, 7830 casos suspeitos de
microcefalia foram reportados para o Ministério da Saúde no Brasil5.
Posteriormente, investigadores analisaram dados do surto de Zika
vírus na Polinésia Francesa, o maior documentado até o surto das
américas, identificando anormalidades fetais, incluindo
microcefalia, dando forte apoio a associação proposta entre Zika
vírus e microcefalia6.
Transmissão do Zika Vírus
Transmissão por mosquito. Em ambientes urbanos e
suburbanos, o Zika vírus é transmitido em um ciclo humano-
1- Acadêmico de Medicina, Liga de Neurologia e Neurociências, Universidade Metropolitana de Santos
2- Chefe do Departamento de Neurologia, Universidade Metropolitana de Santos
Correspondência: Filipe Benetti Rocha, Av. Bartolomeu de Gusmão, 120. Bloco 2 – Apto 1307 - 11045-401 Santos, SP. E-mail: [email protected]
Recebido em 30/10/205; aceito para publicação em 23/09/2016; publicado online em 20/12/2016
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 159 - 161, out / nov / dez 2016
159
mosquito-humano. Duas espécies do subgênero stegomyia –
Aedes aegypti e em menor grau Aedes albopictus – foram
relacionados com praticamente todos os surtos de Zika vírus.1
Outros tipos de transmissão. Evidência substancial agora indica
que o Zika vírus pode ser transmitido da mãe para o feto durante a
gravidez. RNA de Zika vírus foi identificado no fluido amniótico de
mães cujos fetos tiveram anormalidade cerebrais detectadas pela
ultrassonografia e antígenos virais e RNA têm sido identificados no
tecido cerebral e na placenta de crianças que nasceram com
microcefalia. A frequência e os fatores de risco para transmissão
são desconhecidos7. Transmissão sexual já foi descrita, porém, os
fatores de risco e a duração de risco para a transmissão sexual
ainda não foram determinados. Apesar de a transmissão do Zika
vírus por transfusão sanguínea ainda não ter sido reportada, é
provável que ocorra, dado a transmissibilidade de outros flavivirus
dessa maneira. Transmissão pelo leite materno ainda não foi
documentada, contudo, leite materno de uma mulher que se tornou
sintomática com o Zika vírus no dia do parto continha partículas
virais de Zika infecciosas em altos títulos1.
de praticamente nenhum déficit cognitivo até grave incapacidade
física. Apesar de os mecanismos pelos quais o vírus possa causar
microcefalia ainda serem desconhecidos, diversas agências de
saúde mundiais têm recomendado que mulheres grávidas ou
planejando engravidar evitem viagens para áreas onde o Zika vírus
está circulando11.
Anomalias oculares. Também têm sido relatadas em lactentes
com microcefalia no Brasil1. No Recife, foram realizadas avaliações
oftalmológicas em recém-nascidos com microcefalia, que se
acreditava ser relacionada ao Zika vírus. Quatro pacientes
apresentaram miopia, diferente da hipermetropia normalmente
observada em lactentes. 75% tiveram alterações maculares, que
não haviam sido relatadas em outros surtos do vírus no mundo.
Ademais, foram observadas alterações do nervo óptico pela
primeira vez. A hipótese é que Zika vírus possa causar alterações
oculares mais graves quando a infecção ocorrer no primeiro ou
segundo trimestre de gravidez, seguindo o raciocínio de outras
infecções verticais, tais como toxoplasmose, rubéola e
citomegalovírus12.
Aspectos clínicos
Diagnóstico
Doença febril aguda. A doença associada ao Zika vírus
caracteriza-se por um período de incubação de 3 a 12 dias. A
maioria dos pacientes, todavia, permanece assintomática depois
de contrair o vírus8. Viremia foi detectada quando os sintomas
estavam presentes, mas não depois1. Quando sintomática, a
apresentação clínica é, geralmente, leve e consiste em uma
doença febril autolimitada que dura cerca de 2 a 7 dias. Entre as
manifestações clínicas mais comuns estão febre, artralgia,
conjuntivite, mialgia, cefaleia e rash macupapular. As taxas de
hospitalização e de complicações são baixas, com fatalidades
sendo extremamente raras8.
Complicações neurológicas. A relação temporal e geográfica
entre a síndrome de Guillain-Barré (SGB) e surtos de vírus Zika tem
sido observada no Pacífico e nas Américas1. A incidência de SGB
no Brasil tem claramente aumentado depois da epidemia de Zika
vírus. No entanto, não está claro, neste momento, o real impacto do
Zika vírus na ocorrência de novos casos de SGB, uma vez que
essa síndrome pode ser secundária a outras ocorrências
infecciosas ou imunológicas, assim como outras arboviroses
endêmicas, tais como dengue9.
Resultados fetais adversos. O espectro completo de resultados
fetais provenientes da infecção fetal por Zika vírus em seres
humanos ainda não foi determinado. Microcefalia é um achado
clínico comumente definido como uma redução significativa da
circunferência da cabeça para a idade e sexo10 e é indicativo de um
problema subjacente com o crescimento do cérebro. A falta de
definições de casos consistentes e padronizadas tem desafiado
um controle exato da microcefalia durante o surto atual de Zika
vírus. Microcefalia pode ocorrer como resultado da sequência de
perturbações do cérebro fetal, um processo em que, após o
desenvolvimento relativamente normal do cérebro no início da
gravidez, há um colapso do crânio fetal seguido de destruição de
tecido do cerebral. Algumas evidências indicam que esse dano
pode ocorrer tardiamente durante o segundo trimestre ou até
mesmo no início do terceiro trimestre1.
Apesar de outros vírus poderem cruzar a barreira placentária e
causar microcefalia, esta apresentação nunca antes havia sido
associada com flavivirus11. As observações do RNA do Zika vírus no
líquido amniótico de fetos com microcefalia e no tecido cerebral de
fetos e recém-nascidos com microcefalia, bem como as altas taxas
de microcefalia entre as crianças nascidas de mães com
comprovada infecção prévia pelo Zika vírus, fornecem fortes
evidências ligando microcefalia à saúde materna e infecção. O
calendário dos vírus e microcefalia epidêmicas no Brasil e na
Polinésia Francesa indicam que o maior risco de microcefalia está
no primeiro trimestre. Um relatório preliminar do Brasil indicou que
anormalidades fetais detectadas por ultrassonografia estavam
presentes em 29% das mulheres com infecção pelo vírus1. Os
efeitos em longo prazo da microcefalia podem variar grandemente,
Os pilares do diagnóstico da infecção pelo Zika vírus são: a
detecção de ácido nucleico viral, por RT-PCR e a detecção de
anticorpos IgM por IgM de captura em ensaio imunossorvente
ligado a enzima (MAC-ELISA). A detecção de ácido nucleico viral no
soro fornece um diagnóstico definitivo; no entanto, na maioria dos
casos, a viremia é transitória e diagnóstico por RT-PCR tem sido
mais bem-sucedido dentro de uma semana após o aparecimento
da doença clínica. Em contraste, o RNA viral foi detectado no soro
de aproximadamente 10 semanas após a infecção. Além disso, a
viremia é geralmente baixa, o que torna o isolamento do vírus a
partir de amostras clínicas difícil. A extensa experiência com outros
flavivírus, relacionados sugere que a IgM aparece conforme a
viremia diminui na primeira semana após o início dos sintomas e vai
persistir durante vários meses1.
A reatividade cruzada de anticorpos flavivírus apresenta grandes
desafios. Uma infecção recente pelo Zika vírus também pode
evocar um resultado positivo MAC-ELISA para a dengue. O maior
desafio sorológico de reatividade cruzada decorre o fenômeno
"pecado antigênico original": para os pacientes que tenham sido
previamente expostos a um flavivírus heterólogo por infecção
natural ou vacinação, a resposta de anticorpos para os flavivírus
prévios será mais vigorosa do que a resposta para o atual. Isto é
particularmente problemático em áreas em que a dengue é
endêmica. Regimes de teste confiáveis para o diagnóstico pré-natal
e infecção pré-natal do vírus Zika não foram estabelecidas1.
160
Virologia
Há uma forte conservação entre todos os tipos de Zika vírus
presentes no mundo, com menos de 12% de divergência
relacionada a nível de nucleotídeo. Isso é importante para o exame
diagnóstico, que depende das sequências e epítopos específicos,
tão bem quanto para o desenvolvimento de tratamentos e vacinas.
As semelhanças dos dados atuais sugerem que qualquer vacina
desenvolvida para combater qualquer cepa do Zika vírus deveria
ser protetora contra todas as demais. A verdadeira natureza do
parentesco próximo entre os flavivirus é responsável pelos desafios
no desenvolvimento de algoritmos diagnósticos, para a distinção
dos mesmos1.
Tratamento, prevenção e controle
Em vista da dificuldade em controlar o mosquito vetor e a ausência
de outras formas de tratamento e de prevenção, o desenvolvimento
de uma vacina parece ser essencial para o controle em longo prazo
da doença. Entretanto, informação insuficiente sobre os
mecanismos imunológicos envolvidos na infecção pelo vírus Zika e
experiência anterior com o vírus da dengue são razões para
ceticismo sobre a probabilidade de uma vacina ser desenvolvida
Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 159 - 161, out / nov / dez 2016
em breve. Dessa maneira, as medidas cabíveis, no atual momento,
focam em evitar a picada do mosquito, reduzir a transmissão
sexual e controle do mosquito vetor, além do manejo clínico
correto13. Métodos de proteção potencialmente eficazes, que estão
focados na redução das infecções entre mulheres grávidas,
incluem evitar viagens desnecessárias para as áreas de
prevalência de transmissão11. O manejo depende de relatos de
outras epidemias (asiáticas e africanas) e da experiência adquirida
na abordagem de outras arboviroses, como dengue e inclui,
basicamente, repouso, hidratação e tratamento sintomático. O uso
de anti-inflamatórios não hormonais é contraindicado, devendo ser
reavaliado naqueles que se utilizam com frequência, desses
medicamentos para doenças reumatológicas. Os casos de SGB
deverão ser imediatamente tratados, em ambiente hospitalar,
sendo às vezes necessário suporte de terapia intensiva14.
O governo brasileiro decidiu que medidas para eliminação do
mosquito vetor A. aegypti devem ser agressivamente
implementadas. A estratégia para eliminar o mosquito é baseada
em pesticidas que têm sido aplicados desde o surto de dengue em
1986, sendo que diferentes inseticidas e larvicidas foram utilizados
sucessivamente devido a crescente resistência do vetor. A
abordagem governamental, até agora, utiliza grandes recursos em
métodos de controle de vetores que são ineficientes ou inseguros,
ao invés de melhorar a infraestrutura urbana e saneamento básico,
com fornecimento de água potável. Uma guerra química contra o
vetor tende a pacificar a população com falsa segurança, enquanto
um amplo programa de melhoria das condições urbanas sanitárias
poderia gerar mobilização social e maior participação
populacional. O controle mais efetivo dos vetores do A. aegypti
depende de uma abordagem integrada, que envolve a eliminação
dos sítios de reprodução. São recomendados uma abordagem de
prevenção e controle de vetores combinado a detecção a tempo da
doença, comunicação de notificações na hora certa, informações
corretas e atualizadas e desenvolvimento de uma resposta rápida,
que envolva a comunidade15.
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Diretrizes e perspectivas futuras
A atual incidência de infecção nas Américas é de difícil avaliação
porque os sintomas são geralmente leves, inespecíficos e o
diagnóstico laboratorial não está prontamente disponível e, ainda,
a reatividade cruzada do anticorpo contra o flavivírus complica a
avaliação sorológica em áreas que a dengue é endêmica.
Aumentos globais recentes na incidência e proliferação da dengue,
chikungunya e, atualmente, Zika vírus (todos com A.aegypti como
único vetor) sugerem mecanismos subjacentes comuns para o seu
surgimento, tais como a globalização e urbanização. Outras
possíveis explicações incluem as mutações virais, afetando a
transmissão a virulência e a afecção viral às populações não
expostas anteriormente desencadeando a proliferação epidêmica.
Pesquisas posteriores serão necessárias para determinar se as
associações observadas recentemente, com resultados adversos
ao nascimento e a SGB simplesmente refletem uma incidência
aumentada da infecção ou se elas resultam de uma alteração na
virulência viral1.
A perspectiva em longo prazo é incerta. A imunidade
suficientemente adquirida, sem dúvida, ocorrerá para diminuir as
futuras transmissões. É necessário um entendimento completo da
frequência e espectro total dos parâmetros clínicos resultantes da
infecção fetal e dos fatores ambientais, que influenciam seu
aparecimento, tão bem quanto o desenvolvimento de ferramentas
diagnósticas discriminatórias para o flavivirus, modelos animais
para os efeitos do desenvolvimento fetal, devido à infecção viral,
novas estratégias e produtos de controle do vetor, terapêuticas
eficazes e vacinas que protejam os humanos contra a doença1.
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Revista Médica Ana Costa, v. 21, n. 4, p. 159 - 161, out / nov / dez 2016
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