PADRÕES DE VARIABILIDADE TEMPORAL DAS COMPONENTES DO VENTO À SUPERFÍCIE NO NORDESTE DO BRASIL Adelmo Antonio Correia e-mail: [email protected] Maria Regina da Silva Aragão e-mail: [email protected] Célia Campos Braga e-mail: [email protected] Departamento de Ciências Atmosféricas – DCA/CCT/UFPB Av. Aprígio Veloso, 882, Bodocongó, Campina Grande-PB, 58109-970 ABSTRACT Surface wind data covering the period 1977-1981 for 77 stations located in Northeast Brazil were used in this study. Factorial analysis based on principal components was applied to mean decadal values of the surface wind components in order to identify patterns of their time variability. The most significant factor loadings of the zonal and meridional wind components (explaining 93.8% and 91.0% of the variance, respectively) were retained. A combined analysis of the temporal patterns and the monthly mean wind fields allowed to identify orographic and large and mesoscale atmospheric influences upon the surface wind components in Northeast Brazil. INTRODUÇÃO Situada entre as latitudes de 1º e 18º sul e as longitudes de 34º e 48º oeste, a Região Nordeste do Brasil se limita a oeste com a Floresta Amazônica e a leste com o Oceano Atlântico. É considerada como uma região anômala nos continentes tropicais quando comparada com outras áreas nesta faixa latitudinal, já que apresenta um clima semi-árido que é devido aos valores relativamente baixos de precipitação observados sobre a maior parte da região. A topografia da Região Nordeste do Brasil pode ser subdividida em três regiões morfologicamente definidas (Fig. 1) segundo a classificação do relevo brasileiro de Aziz N. AB’Sáber (1993): a) Planalto Maranhão-Piauí que abrange quase toda a área desses estados, com exceção da faixa litorânea. b) Planalto Nordestino bastante extenso mas com altitudes modestas, onde sobressaem ora serras ora chapadas (Borborema, Araripe, Diamantina). c) Planícies e terras costeiras que se estendem por todo o litoral nordestino ora faixas mais largas, ora mais estreitas e, às vezes, interrompidas. O tempo e o clima do Nordeste são influenciados por fenômenos pertencentes às várias escalas, desde a planetária até a pequena escala representada pela convecção isolada. Pertence à escala planetária a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), amplamente conhecida como o principal sistema gerador de precipitação sobre o norte do Nordeste. Esse fato é facilmente compreendido quando se observa que o máximo de precipitação no semi-árido do Nordeste (março-abril) ocorre exatamente na época em que a ZCIT atinge sua posição mais ao sul. A ZCIT pode ser monitorada através da posição de vários fenômenos meteorológicos com ela relacionados, tal como a Zona de Convergência dos Alísios (ZCA) que, embora não coincidindo exatamente com a ZCIT, apresenta deslocamento muito bem relacionado com ela (Uvo, 1989). Outros sistemas pertencentes a escala planetária que também influenciam o tempo e clima do Nordeste são as circulações geradas por anomalias no campo da temperatura da superfície do mar, os anticiclones subtropicais do Atlântico e a oscilação de 30-60 dias, sendo que esta última tem escala de tempo diferente dos demais. Na escala sinótica estão os sistemas frontais ou zonas de convergência deles remanescentes, a Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS), os vórtices ciclônicos da alta troposfera e os distúrbios ondulatórios de leste. Fenômenos de mesoescala também atuam no Nordeste tais como sistemas associados a ZCIT (aglomerados convectivos de mesoescala), linhas de instabilidade formadas na costa norte do Nordeste e circulações geradas por contraste térmico entre superfícies sólidas e líquidas e entre áreas não-elevadas e elevadas, sendo que estas últimas também podem agir como uma forçante mecânica (Silva, 1996). Vários desses fenômenos que influenciam o tempo e o clima da Região Nordeste do Brasil podem ser diagnosticados pelo escoamento superficial já que os sistemas atmosféricos podem ser identificados pelo vento a eles associados (Aragão et al., 1997). O presente estudo tem como objetivo analisar as componentes (zonal e meridional) do vento à superfície utilizando um método de análise multivariada (análise de componentes 812 principais) visando determinar padrões temporais de sua variabilidade associando-os com os sistemas atmosféricos que atuam na região. Fig. 1 - Mapa do relevo da Região Nordeste do Brasil (Fonte: Simielli, 1991) 813 MATERIAIS E MÉTODOS MATERIAIS Os dados utilizados nesta pesquisa são observações horárias de direção e velocidade de vento para um período de 5 anos (1977-1981) coletadas em 77 estações meteorológicas de superfície da Rede Climatológica do Nordeste operada pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET). Os dados provêm de anemógrafos universais Fuess, cujos sensores se encontram a 10 metros de altura (Bastos et al., 1987). A Figura 2 ilustra a localização das estações. 0 198 -2 PA Oceano Atlântico 280 288 376 392 382 460 -4 476 578 594 598 596 686 696 698 791 795 798 765 784 789 792 797 756 900 882 879 879 886 TO 893 975 976 970 986 983 992 979 994 97 098 0 090 096 076 179 186 182 190 249 236 242 244 229 286 288 Oceano Atlântico 295 339 408 GO 348 344 678 771 -8 Latitude 493 586 588 590 583 669 676 -6 397 487 480 571 564 294 -10 -12 -14 780 -16 446 MG 498 -18 ES -20 -50 -48 -46 -44 -42 -40 -38 -36 -34 Longitude Fig. 2 - Distribuição espacial das estações meteorológicas de superfície da Rede Climatológica do Nordeste operada pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET). Foi omitido o número de bloco das estações (83 para estações situadas ao sul de 10°S e 82 para as demais). MÉTODOS As técnicas de análise multivariada, a exemplo da análise em componentes principais (ACP), são ferramentas poderosas quando se trabalha com um número grande de variáveis. Elas permitem reduzir a dimensão da matriz de observações sem perder as informações importantes dos dados originais, investigar o comportamento espaço-temporal das variáveis envolvidas no problema, assim como detectar grupos de variáveis que apresentem comportamento homogêneo. Esse método tem por objetivo a descrição dos dados contidos numa matriz indivíduoscaracteres numéricos: p caracteres são medidos em n indivíduos. Trabalhando com dois caracteres x1 e x2 apenas, é possível representá-los facilmente num gráfico plano. Nesse caso, o simples exame visual do comportamento da nuvem de pontos permite avaliar o nível de ligação entre x1 e x2 e identificar os indivíduos ou grupos de indivíduos que apresentam características similares (Bouroche & Saporta, 1982). Mas, trabalhando com um número p de caracteres igual ou maior que quatro, esse tipo de análise passa a ser impossível. 814 Considerando um espaço vetorial Γ de dimensão P, o i-ésimo indivíduo é representado nesse espaço por um ponto cujas coordenadas são: [X(i,1), X(i,2), ......, X(i,p)] Se p corresponde ao número total de indivíduos da população, estes podem ser representados sob a forma matricial: . x1p x11 x12 . x x . x2p 21 22 . . . . . Xnxp = . . . . . . xn1 xn 2 . . xnp onde as linhas correspondem aos indivíduos (estações i) e as colunas representam as j informações observadas sobre os n indivíduos. A partir de uma matriz de dados X ( n indivíduos x p caracteres), é possível obter a matriz de variância e covariância S através de: S= 1 X.X t n onde Xt é a transposta de X e n é o número de indivíduos ou estações. Normalizando os elementos da matriz variância e covariância através da média e do desvio padrão, é obtida a matriz correlação R: S=R = 1 X.X t n Sabendo que R é uma matriz simétrica e positiva de dimensão (p x p), ela é diagonalizável por uma matriz A de mudança de base, chamada de matriz de autovetores. A matriz diagonal D, cujos elementos diagonais são os autovalores de R, é dada por: D = A-1.R.A -1 onde A é a inversa da matriz A. As CP’s U1, U2,..., Up, são obtidas por combinações lineares entre a transposta dos autovetores de At e a matriz de observações X, isto é: U = At.X Os valores Xm do n-ésimo local podem ser estimados pela seguinte expressão: Xm=am1U1 + am2U2 +........+ amkUk + + amMUm As variáveis U1, U2, Ui, Um são as componentes principais que formam as séries temporais associadas aos autovetores de X, ordenados por ordem decrescente dos autovalores escolhidos de ak em A, em que: n U k = ∑ a ki X i i =1 onde Uk é o somatório das componentes com maior contribuição para variância total da série de dados. RESULTADOS E DISCUSSÃO CAMPOS MÉDIOS MENSAIS DO VENTO À SUPERFÍCIE Os campos do vetor vento médio à superfície foram obtidos através da rotina Grads (Grid Analysis and Display System) (Doty, 1992), fornecida pelo COLA (Center for Ocean-Land-Atmosphere Interactions). O método de BARNES (1964) foi usado na interpolação dos campos com uma grade (42x51) com espaçamento de 0,353x0,353 graus nos limites de 34° a 49° de longitude oeste e 1° a 19° de latitude sul. Esses campos médios foram elaborados com o objetivo de estudar o comportamento do vento médio mensal no Nordeste do Brasil. A discussão a seguir está estruturada por trimestre do ano, sendo mostrado apenas o campo do último mês de cada trimestre. No decorrer do primeiro trimestre (janeiro-fevereiro-março) (Fig. 3a) há, de maneira geral, uma desintensificação do vento do Ceará até Sergipe. Há desintensificação, também, nas faixas litorâneas do Maranhão, Piauí e Bahia , sendo que nesse último estado o vento, que é inicialmente fraco, se torna ainda mais fraco no 815 transcorrer do trimestre. A desintensificação do vento é provocada pela migração da ZCIT para a sua posição mais ao sul, aproximadamente 2°S em março-abril, e pela desintensificação do anticiclone subtropical do Atlântico Sul. O vento também é fraco no restante da Bahia, com exceção do vale do sub-médio São Francisco e sul da Chapada Diamantina. Também é evidente o vento muito fraco no restante do Maranhão e Piauí, durante todo o trimestre. O vento é de nordeste nas faixas litorâneas do Maranhão e Piauí e de leste-nordeste no Ceará e oeste do Rio Grande do Norte e Paraíba. O vento é de leste em Alagoas e Sergipe e de leste-sudeste em Pernambuco e na metade oriental do Rio Grande do Norte e Paraíba. Na Bahia, a leste do meridiano de 43°W, o vento é de leste-sudeste ao norte de 12°S, enquanto que ao sul dessa latitude ele é de nordeste em janeiro (não mostrado), passando a lestenordeste no restante do trimestre. A oeste do meridiano de 43°W, o vento é de leste-nordeste nos três meses. A mudança mais evidente no decorrer do segundo trimestre (abril-maio-junho) (Fig. 3b) é a intensificação do vento no vale do sub-médio São Francisco, no sul da Chapada Diamantina e no centro-leste do Piauí. É evidente também intensificação na faixa litorânea da Bahia e a mudança de direção que ocorre do mês de março (lestenordeste) (Fig. 3a) para o mês de abril (sudeste) (não mostrado). Tal mudança no sinal da componente meridional do vento é provocada pela mudança de posição e intensificação do anticiclone subtropical do Atlântico Sul e pela penetração de sistemas frontais austrais, uma hipótese que é fortalecida pelas mudanças ocorridas ao longo do trimestre, conforme será visto mais adiante. O vento é de nordeste nas faixas litorâneas do Maranhão e Piauí. No Ceará, oeste do Rio Grande do Norte e Paraíba, o vento é de leste, passando a sudeste no final do trimestre (junho). O vento é de sudeste em Pernambuco, Alagoas, Sergipe, centro-leste do Piauí e na metade oriental do Rio Grande do Norte e Paraíba. Na Bahia, a leste do meridiano de 43°W, o vento é de sul-sudeste, enquanto que a oeste dessa longitude ele é de nordeste em abril (não mostrado), passando a sul no vale do médio São Francisco em junho. Prossegue no terceiro trimestre (julho-agosto-setembro) (Fig. 3c) a intensificação do vento no vale do submédio São Francisco, no sul da Chapada Diamantina e no centro-leste do Piauí. Setembro é o mês em que o vento atinge máxima intensidade nessas áreas. Ocorre intensificação também nas faixas litorâneas do Maranhão, Piauí e noroeste do Ceará. A direção do vento para o terceiro trimestre sobre quase todo Nordeste do Brasil é de leste-sudeste, à exceção do vale do médio São Francisco (Bahia), Maranhão e na faixa litorânea do Piauí, onde o vento é de nordeste. No último trimestre (outubro-novembro-dezembro) (Fig. 3d) há desintensificação do vento nas faixas litorâneas do Maranhão, Piauí e noroeste do Ceará. Ocorre também desintensificação no oeste de Pernambuco e no centro-leste do Piauí. No vale do sub-médio São Francisco e sul da Chapada Diamantina o vento também desintensifica no transcorrer do trimestre. O vento é muito fraco no restante do Maranhão, Piauí e oeste da Bahia no mês de dezembro (Fig. 3d). Há intensificação do vento em Alagoas e Sergipe do mês de setembro (Fig. 3c) para o mês de outubro (não mostrado). Novembro é o mês em que o vento atinge máxima intensidade nesses estados. O vento permanece de nordeste nas faixas litorâneas do Maranhão e Piauí. Ele é de leste-nordeste no Ceará e oeste do Rio Grande do Norte e Paraíba. Nas faixas litorâneas do Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco o vento é de sudeste. O vento é de leste em Alagoas e Sergipe. É evidente a mudança de direção que ocorre do mês de outubro (sudeste) para o mês de dezembro (leste), no centro-leste do Piauí e oeste de Pernambuco. Na Bahia, a leste do meridiano de 43°W, o vento é de leste-sudeste ao norte de 12°S, enquanto que ao sul dessa latitude ele é de leste em outubro, passando a nordeste no restante do trimestre, com exceção da parte sul da Chapada Diamantina, onde o vento é de sudeste em outubro, passando a leste em dezembro. A oeste do meridiano de 43°W, o vento é de nordeste nos três meses. O comportamento do vento apresentado neste trabalho na costa do Nordeste, durante todo o ano, é semelhante aos resultados obtidos por SERVAIN & LUKAS (1990) na área oceânica próxima à Região, exceto no Maranhão e Piauí, no período maio-dezembro. Esse fato sugere que os resultados mostrados podem ser representativos de uma média de longo prazo, já que as médias de Servain e Lukas foram obtidas com base em dados do período 1964-1989. A maior intensidade do vento, durante todo o ano, ocorre na faixa litorânea do Piauí e noroeste do Ceará no período setembro-novembro. A fisiografia no vale do sub-médio São Francisco e no vale do Rio das Contas (sul da Chapada Diamantina) influencia na intensidade e direção do vento, no período de maio a setembro. A intensificação do vento nessas áreas (vale do sub-médio São Francisco e vale do Rio das Contas), no período maiosetembro, é associada à circulação do anticiclone subtropical do Atlântico Sul combinada com circulações locais (ventos de vale) geradas pelo contraste térmico entre as áreas altas e baixas dos vales (Stull, 1997). 816 Fig. 3 - Vetor vento médio à superfície no Nordeste do Brasil (período 1977-1981) para o mês de: (a) março, (b) junho, (c) setembro, (d) dezembro. A escala utilizada (m/s) é vista abaixo de (c) e (d) (Fonte dos dados: INMET) 817 PADRÕES DE VARIABILIDADE TEMPORAL DAS COMPONENTES DO VENTO À SUPERFÍCIE A partir dos resultados da análise fatorial pelo método das componentes principais (CP´s), foram retidos os fatores comuns temporais mais significativos para as componentes zonal (u) e meridional (v) do vento à superfície. Os padrões temporais foram calculados a partir de dados médios decendiais das componentes u e v em 77 localidades para um período de 5 anos (1977-1981). Os resultados obtidos permitiram determinar os padrões (modos) temporais do vento no Nordeste do Brasil. ANÁLISE TEMPORAL DA COMPONENTE ZONAL A Figura 4 ilustra as correlações temporais decendiais das três primeiras CP´s da componente zonal do vento (CZV) que explicam 93,8% da variância total das médias decendiais. O primeiro fator comum temporal, que explica 82,5% da variância, tem correlações elevadas, superiores a 0,8, o ano inteiro. O padrão espacial da primeira CP associado a esse fator (Fig. 5a) indica uma quase homogeneidade do vento no Nordeste, com exceção de alguns pequenos núcleos no nordeste do Maranhão, nas faixas litorâneas do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, no leste da Paraíba, sul de Sergipe e no sul da Chapada Diamantina com contribuições inferiores a -1,5. Há um núcleo de contribuição positiva (>1,5) no vale do médio São Francisco. As áreas com contribuições negativas podem estar relacionadas com ventos moderados de sudeste no mês de junho (Fig. 3b) e as positivas com ventos de sul no mesmo mês. O segundo fator comum temporal (Fig. 4), explicando 11,3% da variância total dos dados, define o ciclo anual da CZV com correlações positivas superiores a 0,4 nos meses de junho e julho e correlações negativas da ordem de –0,4 em dezembro e janeiro. O padrão espacial associado a este fator comum (Fig. 5b) apresenta núcleos bem definidos com contribuições negativas (<–1,5) no vale do sub-médio São Francisco, sul da Chapada Diamantina e centro-leste do Piauí. Há também núcleos de contribuições positivas na faixa litorânea dos estados da Paraíba e Pernambuco e norte do estado de Sergipe. Esta componente indica que existe um contraste entre as áreas dominadas por núcleos positivos e negativos, no inverno e verão. As áreas que apresentam contribuições < -2,5 (> 1,5) estão associadas a uma forte (fraca) CZV nos meses de junho (Fig. 3b) e julho e uma fraca (forte) CZV nos meses de janeiro e dezembro (Fig. 3d). A Figura 3.2 ilustra ainda as correlações temporais da terceira CP. O terceiro fator comum, que explica 2,9% da variância e apresenta baixas correlações, pode ser interpretado como ruído, no caso desprezado. Assim, o padrão espacial deste fator comum não é mostrado por apresentar pequena contribuição à variância. Fig. 4 - Três primeiros fatores comuns temporais (correlações) da componente zonal do vento à superfície que explicam 93,8% da variância total das médias decendiais (82,5%; 11,3%; 2,9%) no Nordeste do Brasil. 818 Fig. 5 - Padrões de variabilidade espacial do (a) primeiro e (b) segundo fatores comuns temporais, da componente zonal do vento à superfície no Nordeste do Brasil. ANÁLISE TEMPORAL DA COMPONENTE MERIDIONAL A Figura 6 apresenta as correlações temporais decendiais das duas primeiras CP´s da componente meridional do vento (CMV) que explicam 91% da variância total das médias decendiais. O primeiro fator comum temporal, que explica 79,9% da variância, tem correlações superiores ou em torno de 0,8 em todos os decêndios, com exceção do terceiro decêndio de novembro, onde é um pouco inferior a 0,8. O padrão espacial deste fator (Fig. 7a) mostra contribuições positivas (>1,5) nas faixas litorâneas do Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. Este fator também apresenta contribuições positivas elevadas no vale do sub-médio São Francisco. Há contribuições negativas (<-1,5) nas faixas litorâneas do Piauí, centro-leste do Maranhão e noroeste do Ceará. As contribuições positivas estão associadas a ventos moderados de sudeste nos meses de janeiro, abril e novembro (não mostrados) enquanto que as contribuições negativas estão associadas a ventos de nordeste nos mesmos meses. O segundo fator comum, explicando 11,1% da variância total (Fig. 6), define o ciclo anual da CMV com correlações baixas, embora significativas, superiores a 0,4 em dezembro e janeiro e inferiores a -0,4 em julho. O padrão espacial associado a este fator comum (Fig. 7b) apresenta contribuições (escores) máximas superiores a 1,5 na parte superior do vale do baixo São Francisco. Escores negativos elevados (<-1,5) são encontrados no norte do Rio Grande do Norte, centro-sul do Ceará, área limítrofe do Ceará, Paraíba e Pernambuco (Chapada do Araripe/Serra dos Cariris Velhos) e área limítrofe do Piauí e Pernambuco (Serra Dois Irmãos). Este segundo fator evidencia áreas específicas nas quais a interação entre a circulação atmosférica e a fisiografia local deve ser um fator determinante para a variabilidade da CMV. Há, ainda, um núcleo com contribuições negativas no sul da Bahia (Fig. 7b) que pode ser associado à penetração de sistemas frontais austrais, uma hipótese que é fortalecida pela CMV positiva no período abril-agosto. Segundo KOUSKY (1979), março-dezembro é o período em que os sistemas frontais atingem o sul da Bahia com maior freqüência. 819 Fig. 6 - Dois primeiros fatores comuns temporais (correlações) da componente meridional do vento à superfície que explicam 91% da variância total das médias decendiais (79,9%; 11,1%) no Nordeste do Brasil. Fig. 7 - Padrões de variabilidade espacial do (a) primeiro e (b) segundo fatores comuns temporais, da componente meridional do vento à superfície no Nordeste do Brasil. CONCLUSÕES A aplicação da análise fatorial em componentes principais às componentes do vento à superfície mostrou que os três primeiros fatores comuns temporais da componente zonal do vento explicam 93,8% da variância total das médias decendiais, enquanto que os dois primeiros fatores comuns temporais da componente meridional explicam 91,0%. 820 O primeiro fator comum temporal da componente zonal (explicando 82,5% da variância) tem correlações elevadas o ano inteiro. Este fator mostra contribuições (escores) positivas no mês de junho que estão associadas com ventos de sul no vale do médio São Francisco. As áreas com contribuições (escores) negativas podem estar relacionadas com ventos moderados de sudeste no mês de junho no nordeste do Maranhão, nas faixas litorâneas do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, no leste da Paraíba , sul de Sergipe e no sul da Chapada Diamantina. Já o segundo fator comum temporal da componente zonal (explicando 11,3% da variância) apresenta variabilidade, o ciclo anual é bem definido com correlações positivas nos meses de junho e julho e correlações negativas em dezembro e janeiro. Este fator mostra contribuições negativas no vale do sub-médio São Francisco, sul da Chapada Diamantina e centro-leste do Piauí. Há contribuições positivas na faixa litorânea dos estados da Paraíba e Pernambuco e norte do estado de Sergipe. Esta componente indica que existe um contraste entre as áreas dominadas por núcleos positivos e negativos, no inverno e verão O primeiro fator comum temporal da componente meridional (explicando 79,9% da variância) tem altas correlações o ano inteiro. Este fator comum mostra contribuições positivas nos meses de janeiro, abril e novembro que estão associadas a ventos moderados de sudeste nas faixas litorâneas do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e no vale do sub-médio São Francisco. As contribuições negativas (escores) estão associadas a ventos de nordeste nas faixas litorâneas do Piauí, centro-leste do Maranhão e noroeste do Ceará. O segundo fator comum da componente meridional apresenta ciclo anual bem definido com correlações positivas em dezembro e janeiro e negativas em julho. Este segundo fator está relacionado com os sistemas frontais que atingem o sul da Bahia, e também com áreas específicas nas quais a interação entre a circulação atmosférica e a fisiografia local deve ser um fator determinante para a variabilidade da CMV. REFERÊNCIAS AB’SÁBER, A.N. Geografia do Brasil. São Paulo: Editora Moderna , 1993. p.53-60. ARAGÃO, M.R.S., CORREIA, M.F., SOBRAL, Z.R. Vento à superfície e chuva em anos contrastantes no submédio São Francisco. Boletim Climatológico. Presidente Prudente-SP, ano 2, n.3, p.213-217, jul.1997. BARNES, S.L. A technique for maximizing detail in numerical weather maps analysis. Journal of Applied Meteorology. v.3, p.396-400, 1964. BASTOS, E.J.B., CEBALLOS, J.C., SOBRAL, Z.R., SIMÕES, F. Distribuição Estatística da Energia Eólica no Nordeste. Fontes Energéticas Brasileiras, 1: p.29-33, 1987. BOUROCHE, J.M., SAPORTA, G. Análise de dados. Trad. Marcos Penchel. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1982. 116p. DOTY, B.E. 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