Maria de Fátima Almeida Baia Livia Oushiro Ivanete Belém do

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Maria de Fátima Almeida Baia
Livia Oushiro
Ivanete Belém do Nascimento
(organizadoras)
Anais
do XII e XIII Encontros
dos Alunos de Pós-Graduação em Linguı́stica da USP
Anais dos XII e XIII Encontros dos Alunos
de Pós-Graduação em Linguı́stica da USP.
São Paulo: Paulistana, 2012, p. 26–40.
Agentividade e Voz nos Padrões
Nominais do Hebraico
Rafael Dias Minussi∗
Resumo
Este artigo tem como objetivo principal discutir a seleção de argumentos com base nas nominalizações do
hebraico. Como arcabouço teórico para esse estudo, tomamos a Morfologia Distribuı́da (MD) (Cf. Halle
& Marantz 1993; Marantz 1997), a qual afirma que tanto palavras quanto sentenças são formadas durante
a derivação sintática. Assim, por meio da descrição dos dados, notamos a existência de dois padrões de
nominalizações, que possuem diferentes tipos de restrições para os elementos que as acompanham. Além
disso, refletimos sobre as estruturas de um dos padrões vocálicos.
Palavras-chave: Núcleos funcionais; núcleos lexicais; nominalizações; raı́zes abstratas; Morfologia Distribuı́da.
Introdução
Este trabalho, ainda em andamento, tem como objetivo maior estudar a
estrutura argumental nas nominalizações e, por consequência, entender que
tipo de núcleo faz a seleção de argumentos, ou seja, se são núcleos lexicais
(raı́zes) ou núcleos funcionais. A questão de que tipo de núcleo faz a seleção
dos argumentos é colocada, uma vez que tratamos do fenômeno da seleção
argumental numa teoria não lexicalista. Por sua vez, como objetivo especı́fico
dessa pesquisa, estudaremos as nominalizações do hebraico. O estudo da
lı́ngua hebraica nos interessa porque tal lı́ngua apresenta um sistema de
formação de palavras, que envolve raı́zes triconsonantais, que nos permitirão
estudar os chamados núcleos lexicais, e padrões vocálicos, que nos permitirão
estudar os núcleos funcionais, que são os responsáveis pela categorização das
∗
Departamento de Linguı́stica da Universidade de São Paulo. Este trabalho faz parte de pesquisa de
doutorado financiada pelo CNPq. E-mail: [email protected].
Agentividade e Voz nos Padrões Nominais do Hebraico
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raı́zes triconsonantais. O estudo desses padrões vocálicos categorizadores
permitirá entendermos melhor qual a contribuição semântico-sintática dos
núcleos chamados funcionais na formação das sentenças. Dessa forma, por
meio dos estudos desses dois tipos de núcleos, levantamos uma questão
principal neste estudo: a estrutura argumental de uma determinada palavra
mantém-se nos diversos contextos categoriais em que a sua raiz formadora se
encaixa?
√
Observemos uma raiz triconsonantal gdl que pode receber padrões
vocálicos de diversas categoriais:
(1)
√
gdl (Raiz)
Padrão Vocálico Palavra formada
a. CaCaC1 (v)
gadal (crescer)
b. CiCCeC (v)
gidel (elevar, criar, cultivar (padrão causativo))
c. hiCCiC (v)
higdil (aumentar)
d. CaCoC (a)
gadol (grande)
e. CoCeC (n)
godel (tamanho)
f. miCCaC (n)
migdal (torre)
g. CCuCa (n)
gdula (grandiosidade)
h. CCiCa (n)
gidla (crescimento)
Podemos verificar por meio desse paradigma que, de acordo com o padrão
vocálico recebido pela raiz, essa toma um significado único, além de uma
categoria. Desse modo, alguns autores que estudaram o hebraico (Cf. Glinert
1989, Arad 2004, Minussi 2008 etc.) afirmam que as raı́zes do hebraico
possuem um conceito e adquirem um significado próprio de acordo com o
padrão vocálico que as categoriza. Bem, essa ideia pode ser relacionada
à ideia de fases dentro de palavras defendida por Arad (2004) e Marantz
(2001). Ambos os autores desenvolvem suas ideias dentro do quadro teórico
da Morfologia Distribuı́da, teoria que utilizaremos como arcabouço teórico
nesta pesquisa.
A Morfologia Distribuı́da (MD) (Cf. Halle & Marantz 1993, Marantz
1997, Halle 1997) não prevê a existência de um léxico gerativo e um de
seus pressupostos é o de que tanto palavras quanto sentenças são formadas
28
Rafael Dias Minussi
durante a derivação sintática, ou seja, estão sujeitas aos mesmos princı́pios
e às mesmas operações como merge, move, copy etc. Sendo assim, não
há entradas lexicais formadas ao inı́cio da derivação. Essa teoria postula
ainda a existência de três Listas: Lista A, que contém as raı́zes abstratas2
e os morfemas abstratos; a Lista B, localizada no caminho para PF, que
contém o material fonológico para as raı́zes e morfemas, de forma que a
união entre o feixe de traços abstratos e o som se dá por meio de regras,
também chamadas de Itens de Vocabulário; a Lista C, também chamada de
Enciclopédia, que contém os significados especiais dados contextualmente
para as raı́zes e o conhecimento de mundo do falante. A sintaxe busca na
Lista A os elementos primitivos para serem manipulados. Pode-se, portanto,
colocar como questão para uma teoria não-lexicalista: onde se encontram as
informações, por exemplo, sobre a estrutura argumental, que em um quadro
teórico como a GB, estavam localizadas nas entradas lexicais?
Ainda de acordo com o paradigma em (1), percebemos que uma raiz
√
gdl pode entrar em padrões vocálicos verbais, nominais e adjetivais e que
essa pode entrar em mais de um padrão de mesma categoria, por exemplo,
se considerarmos apenas a formação de nomes. Preliminarmente, se nossas
observações estão corretas, o fato de a mesma raiz se enquadrar em mais
de um padrão de mesma categoria pode sugerir que tais padrões devam se
comportar de modo diferente, que possuam restrições sintáticas e aspectos
semânticos diversos.
Para verificar a hipótese lançada acima, além de olharmos com mais
atenção para a seleção de argumentos, tomemos os dados de um verbo e suas
nominalizações em (2).
(2)
a.
b.
c.
d.
2
ha-‘ikarim
gidlu
‘et ha-‘agvaniot
DEF-fazendeiros cultivaram MO DEF-tomates
‘Os fazendeiros cultivaram os tomates’
gidul
ha-‘agvaniyot (‘al yedey ha-‘ikarim)
cultivo.CS.m.sg DEF-tomates (por DEF-fazendeiros)
‘O cultivo dos tomates pelos fazendeiros’
ha-‘agvaniot gadlu
DEF-tomates cresceram
‘Os tomates cresceram’
gdilat
ha-‘agvaniot
crescimento.CS.fem.sg DEF-tomates
Consideramos que tanto as raı́zes quanto os morfemas abstratos não possuem conteúdo fonológico, de
forma que ambos estarão condicionados ao princı́pio de Inserção Tardia (Cf. Harley & Noyer 1999).
Agentividade e Voz nos Padrões Nominais do Hebraico
29
‘O crescimento dos tomates’
√
Em (2a), temos uma sentença transitiva, na qual temos a raiz gdl
inserida em um padrão vocálico verbal causativo, que permite, portanto, a
presença de um agente. Já em (2b), temos uma nominalização correspondente
ao padrão verbal causativo e que permite, como observamos no padrão
vocálico verbal, a presença de um agente. Por sua vez, em (2c), temos uma
√
sentença com a mesma raiz gdl inserida em um padrão vocálico verbal,
mas não causativo, de modo que não se projeta a posição de agente. De
modo paralelo, temos, em (2d), uma nominalização correspondente ao padrão
verbal não causativo. Ora, por meio desses dados, podemos começar a
hipotetizar que, se temos uma mudança na estrutura argumental de nomes e
verbos, quando inserimos a raiz em diferentes padrões vocálicos de nome ou
verbo, a informação sobre a estrutura argumental desses nomes e verbos deve
estar contida na parte dessas palavras em que ocorre a alteração, ou seja, a
parte correspondente aos núcleos funcionais, aqui expressos pelo conjunto
vocálico e não pelas raı́zes.
Dessa forma, na próxima seção, investigaremos a natureza desses itens
funcionais: (i) quantos são?; (ii) que tipo de informação sintático-semântica
eles possuem?; e (iii) verificar se há um paralelo entre os padrões verbais e
suas nominalizações: seriam os padrões de nominalização originados a partir
dos padrões verbais? Há resquı́cios morfológicos dos padrões verbais nos
padrões nominais?
Os padrões vocálicos do hebraico
Como já dissemos brevemente na seção anterior, o hebraico é uma lı́ngua em
que a estrutura das palavras pode ser decomposta em raı́zes consonantais e
padrões vocálicos. Segundo Arad (2004), a maioria das raı́zes contém três
√
consoantes, aqui representadas como CCC. Esses padrões vocálicos são
combinações de vogais e, segundo os estudiosos do hebraico, são atômicos,
ou seja, indivisı́veis. Há combinações de vogais que dão origem a verbos,
a nomes e a adjetivos. Nas próximas seções, iremos discutir dois tipos de
padrões que o hebraico apresenta: os padrões para verbos e os padrões para
nomes.
30
Rafael Dias Minussi
Os padrões verbais do hebraico
De acordo com alguns especialistas (Cf. Arad 2004, Glinert 1989, Bat-El
1994, 2001, Doron 2003), o hebraico possui exatos sete padrões de combinação
vocálica para os verbos. Tais padrões são chamados em hebraico de binyanim.
Na tabela 1, podemos observar os padrões, algumas raı́zes em que eles são
inseridos e o significado do verbo formado.
Tabela 1 Padrões verbais do hebraicoa
RAIZ
√
lmd
√
lmd
√
spr
√
spr
√
qlt
√
qlt
√
pll
a Tabela
Forma morfo-fonológica do padrão
1 CaCaC
2 niCCaC
3 CiCeC
4 CuCaC
5 hiCCiC
6 huCCaC
7 hitCaCeC
lamad
nilmad
siper
supar
hiqlit
huqlat
hitpalel
Verbo
estudar
ser estudado
dizer/narrar
ser dito/narrado
gravar
ser gravado
rezar
adaptada de Arad (2004:47).
O padrão verbal 1 é um padrão de voz ativa. Já o padrão 2 é um
padrão de voz passiva que está relacionado ao padrão 1, isto é, as raı́zes que
podem ser inseridas no padrão 1 são inseridas no padrão 2, quando ocorrem
na voz passiva.3 Por sua vez, o padrão 3 é um padrão de voz ativa e é
considerado causativo por alguns autores como Glinert (1989). Já o padrão
4 está relacionado ao padrão 3, porém seu significado é de voz passiva. O
padrão 5 é um padrão de voz ativa e o padrão 6 é sua contraparte na voz
passiva. Por fim, o padrão 7 é um padrão que forma verbos com significado
reflexivo e também um padrão utilizado com o significado de voz média.
Como pudemos observar, os padrões verbais, além de contribuir para o
significado das raı́zes, trazem informações sobre a voz dos verbos formados.
Na próxima subseção, descreveremos os padrões de nominalização.
3
Segundo Arad (2004), o padrão 2 não é um padrão exclusivamente passivo, ele pode hospedar verbos
inacusativos, inergativos e verbos com complemento oblı́quo.
Agentividade e Voz nos Padrões Nominais do Hebraico
31
Os padrões nominais do hebraico
Ao falar dos padrões vocálicos nominais, chamados em hebraico de mishqalim,
Arad (2004) defende que existe uma assimetria nome-verbo no hebraico. A
autora afirma que os nomes devem ser separados em dois grupos: os que
podem ser alocados em um mishqal (um padrão vocálico nominal) e os que
não podem ser alocados em um mishqal. A fim de mostrar que esses dois tipos
de padrão são diversos, a autora ressalta que existe uma diferença quanto
ao número de padrões nominais e verbais: enquanto os padrões verbais são
limitados a sete, os padrões nominais são numerosos.
O gramático Glinert (1989) faz uma descrição detalhada e pormenorizada
dos padrões nominais. O autor, por exemplo, cita cerca de trinta tipos de
combinação de vogais, com e sem afixos e, diferentemente de Arad (2004),
faz algumas generalizações quanto ao significado desses padrões.
Ao observarmos os dados de nominalizações eventivas, como em (2d) e
(2b), notamos que essas se enquadram nos dois primeiros padrões descritos
por Glinert (1989).
(3)
(4)
CCiCa
a. mexina
b. harisat
c. sgira
d. štifa
e. pšita
f. bxira
g. gdila
CiCuC
a. ibud
b. gidul
c. sikum
‘apagamento’
‘destruição’
‘fechamento’
‘enxágue’
‘esticação’
‘seleção’
‘crescimento’
‘processamento’
‘crescimento/cultivo’
‘reabilitação’
Os padrões em (3) e (4), segundo Glinert (1989), contêm um grande número
de nomes e são padrões atualmente produtivos, sendo o padrão em (3) ainda
mais produtivo. Na classificação feita por Glinert (1989), podemos encontrar
os nomes de ‘ação’ ou ‘resultado (concreto ou abstrato) da ação’ localizados
em cinco mishqalim, descritos abaixo:
(5)
CCiCa é mais comum com raı́zes que podem entrar no padrão 1 de verbos.
bHina ‘exame’, ‘examinação’
(6)
hiCaCCut é mais comum com raı́zes que podem entrar no padrão 2 de verbos.
32
Rafael Dias Minussi
hidabrut ‘diálogo’
(7)
CiCuC é mais comum com raı́zes que podem entrar no padrão 3 de verbos.
tipul ‘tratamento’
(8)
hitCaCCut é mais comum com raı́zes que podem entrar no padrão 7 de verbos.
hitbagrut ‘maturação’, ‘amadurecimento’
(9)
haCCaCa é mais comum com raı́zes que podem entrar no padrão 5 de verbos.
hagrala ‘rifa’, ‘sorteio’
Percebemos pelo trabalho de Glinert (1989) que o autor sugere que exista
uma correspondência entre os padrões verbais e as nominalizações formadas
a partir de um determinado padrão verbal, porém o autor não aprofunda
sua análise, de modo a mostrar que tal correspondência possui evidências
sintáticas, semânticas ou morfológicas.
Ainda sobre os padrões vocálicos, podemos citar o trabalho de Bat-El
(2001), o qual faz uma defesa das raı́zes e dos padrões vocálicos, seja de
verbos ou de nomes, como morfemas separados. A sugestão de distinção
morfêmica entre as raı́zes e os padrões é bastante interessante para este
trabalho, uma vez que podemos traçar um paralelo entre as raı́zes hebraicas e
as raı́zes abstratas propostas pela MD4 (Cf. Halle & Marantz 1993, Marantz
1997, Arad 2004) de um lado, e podemos aproximar os padrões vocálicos aos
núcleos funcionais categorizadores presentes na Lista A, por outro lado.
Na seção a seguir, mostraremos que o uso de um ou de outro padrão
nominal pode provocar algumas diferenças na modificação do sintagma
nominal, além de restrições em relação ao movimento dos nomes. Dessa
forma, defendemos que os padrões nominais, primeiramente, podem ser
estudados do mesmo modo que os padrões verbais o são; em segundo lugar,
que os padrões nominais, assim como os verbais, contêm traços semânticosintáticos e não são apenas meros categorizadores.
Efeitos e restrições dos padrões nominais
Esta seção possui como ponto principal defender que os diferentes mishqalim interferem nos aspectos semânticos e sintáticos do sintagma nominal,
contra Arad (2004), a qual argumenta em favor do fato de os mishqalim
4
O fato de defender que as raı́zes abstratas equivalham às raı́zes hebraicas não implica dizer que, para
cada raiz abstrata da Lista A, exista uma raiz hebraica equivalente (Cf. Minussi 2008), mas que as
raı́zes hebraicas equivalem a certa raiz abstrata da Lista A.
Agentividade e Voz nos Padrões Nominais do Hebraico
33
não colocarem nenhuma restrição sobre os nomes em que aparecem. Para
tanto, traremos uma discussão sobre a modificação adverbial e adjetival nos
sintagmas nominais.
Os argumentos das nominalizações do hebraico podem aparecer de duas
formas. Em (10a), temos uma nominalização em um Construct State (CS),
com seu argumento interno marcado pela Marca Diferencial de Objeto ‘et
(MO), também considerada por alguns autores como Caso acusativo (Cf.
Borer 1999; Danon 2001, 2002). Já em (10b), temos a mesma nominalização
em um CS, com seu argumento na posição de segundo membro do construto
(posição do membro associado) e com o sujeito da nominalização introduzido
por uma by-phrase.
(10)
a.
b.
sgirat
ha-mankal ‘et ha-misrad
fechamento.CS.f.sg DEF-diretor MO DEF-escritório
‘O fechamento do escritório pelo diretor’
sgirat
ha-misrad
(alyedey ha-mankal)
fechamento.CS.f.sg DEF-escritório prep
DEF-diretor
‘O fechamento do escritório pelo diretor’
No que se refere à modificação adverbial, Hazout sugere que os advérbios
que ocorrem nas construções com nominalizações não são licenciados simplesmente pela interpretação de processo ou de ação associada a tais construções,
mas são condicionados sintaticamente. Isso quer dizer que um advérbio só
pode aparecer se ele estiver de acordo com todo o sistema requerido pelo
verbo correspondente ao nome que ele modifica. Em (11b), a nominalização
aparece sem um argumento.
(11)
a.
b.
ha-harisa
nimšexa šaatayim
DEF-destruição durou duas horas
‘a destruição durou duas horas’
ha-harisa
be-axzariyut
DEF-destruição em-crueldade (=cruelmente)
Se considerarmos os tipos de advérbios que são admitidos, observaremos que
advérbios sentenciais são excluı́dos, como vemos em (12).
(12)
‘et ha-avoda
Dan katav
lelo safek
duvidosamente Dan escreveu ACC DEF-trabalho
‘Duvidosamente Dan escreveu o trabalho’
b. *ktivat
Dan ‘et ha-avoda
lelo safek
escrita.CS Dan ACC DEF-trabalho duvidosamente
a.
34
Rafael Dias Minussi
A afirmação de que a distribuição dos advérbios nas nominalizações do
hebraico é sintática, em vez de semanticamente determinada, apóia-se, em
primeiro lugar, no fato de que adjetivos podem seguir o núcleo em construções
genitivas com a preposição, porém advérbios não podem seguir o nome.
(13)
a.
axilat-o
ha-menumeset šel Dan ‘et ha-uga
comida-seu DEF-polida de Dan ACC DEF-bolo
‘a “começão” polida de Dan do bolo’
šel Dan ‘et ha-uga
b. *axilat-o
be-nimus
comida-seu em-polidez(=polidamente) de Dan ACC DEF-bolo
Outro fato que chama a atenção é que adjetivos, ao contrário de advérbios,
são ruins em posição final.
(14)
a.
ktivat
Dan ‘et ha-avoda
bi-mehirut
escrita.CS Dan ACC DEF-trabalho em-rapidez
‘a escrita do trabalho por Dan rapidamente’
ha-mehira
b. *ktivat
Dan ‘et ha-avoda
escrita.CS Dan ACC DEF-trabalho DEF-rápida
Resumindo, para Hazout, os fatos observados indicam que a configuração
subjacente destas construções envolve a distinção entre um domı́nio verbal,
que permite a ocorrência de advérbios e exclui adjetivos e, controversamente,
um domı́nio nominal que permite a ocorrência de adjetivos e exclui advérbios.
Assim sendo, Hazout (1995) postula um nı́vel verbal para todas as nominalizações. Contudo, para uma teoria como a MD, a postulação de um nı́vel
verbal anterior a um nı́vel nominal não é necessária, embora ainda muito
utilizada (Cf. Harley 2008).
Voltemos um pouco a discussão para o ponto em que fizemos a distinção
das duas formas em que podem aparecer os argumentos das nominalizações.
No que diz respeito à modificação por advérbios e adjetivos, a construção
com by-phrase é possı́vel com ambos, porém a construção em que a MO
ocorre, a modificação por advérbios não é possı́vel, como vemos em (15b).
(15)
a.
mexikat
ha-maxšev
‘et ha-kvacim
apagamento.CS.fem.sg DEF-computador MO DEF-arquivos
bi-mhirut
em-rapidez
‘O apagamento dos arquivos pelo computador com rapidez’
b. *mexikat
ha-maxšev
‘et ha-kvacim
apagamento.CS.fem.sg DEF-computador MO DEF-arquivos
Agentividade e Voz nos Padrões Nominais do Hebraico
35
maher
rapidamente
Como notou Siloni (1997), bi-mhitut (literalmente: em-rapidez) deve ser
analisado como um sintagma preposicional em vez de um advérbio. Advérbios
verdadeiros, como maher ‘rapidamente’, não podem ocorrer com os nominais
numa construção com ‘et (MO). Esse fato leva Siloni (1997) a defender a
análise de que os nominais de ação são nomes puros, sem uma camada verbal.
Contudo, Engelhardt (1998) traz exemplos em que os chamados advérbios
“verdadeiros” ocorrem em construções com ‘et. Observemos o exemplo em
(16):
(16)
a.
ibud
ha-mumxim ‘et ha-kolot
processamento.CS.masc.sg DEF-peritos MO DEF-votos
yadanit
manualmente
‘o processamento manual dos votos pelos peritos’
O que nenhum autor notou ainda é o fato de que o padrão vocálico é diferente
nas nominalizações em (15) e (16). Em (15), temos uma nominalização no
padrão CCiCa, já citado anteriormente no trabalho, que não permite a modificação por advérbios “verdadeiros” e, em (16), temos uma nominalização
com o padrão CiCuC, que permite a modificação por advérbios ditos “verdadeiros”. Outras diferenças precisam ser averiguadas em relação a esses dois
padrões, porém é fatal dizer que certas restrições existem, contrariamente ao
que Arad (2004) defende.
Uma análise preliminar para os nominais CCiCa
Nesta seção, exporemos uma análise preliminar para os nominais com o
padrão CCiCa. Nessa análise, em primeiro lugar, defendemos que os padrões
vocálicos do hebraico, sejam eles verbais ou nominais, são a realização de
núcleos funcionais que possuem em si: sabores diversos (aspecto, seleção de
argumentos, voz), diferentes restrições (quanto ao movimento dos sintagmas,
quanto à modificação adjetival ou adverbial), entre outras caracterı́sticas.
Em segundo lugar, argumentamos que esses núcleos são os responsáveis pelo
licenciamento argumental. Voltemos aos dados.
36
Rafael Dias Minussi
(17)
a.
b.
gidul
ha-‘agvaniyot (‘al yedey ha-‘ikarim)
cultivo.CS.m.sg DEF-tomates (por DEF-fazendeiros)
‘O cultivo dos tomates pelos fazendeiros’
gdilat
ha-‘agvaniot
crescimento.CS.fem.sg DEF-tomates
‘O crescimento dos tomates’
Propomos que na estrutura de formação para as nominalizações com o padrão
CCiCa não haja uma camada verbal, contrariando Hazout (1995). Desse
fato decorre que tal padrão: (i) não permite modificação por advérbios
verdadeiros; (ii) não permite alçamento. Contudo, há dois tipos de estrutura
para essas nominalizações, levando em consideração o ambiente de Construct
State 5 (CS). A estrutura em (18a) tem o argumento interno da nominalização
marcado com a Marca Diferencial de Objeto (MO) e o agente está dentro do
CS. Já em (18b), temos o argumento interno da nominalização dentro do CS,
enquanto o outro elemento é precedido de uma preposição šel ‘de’.
(18)
a.
b.
harisat
Picasso ´et yerušalayim
destruição Picasso MO Jerusalém
‘a destruição de Jerusalém por Picasso’
harisat
yerušalayim šel Picasso
destruição Jerusalém prep Picasso
‘a destruição de Jerusalém de Picasso’
Assumimos que é o licenciamento dos elementos na estrutura sintática pelo
núcleo funcional ou por preposições que provoca uma determinada ordem dos
constituintes na sentença. Assim sendo, na estrutura, temos o padrão CCiCa
ocupando o lugar de um núcleo categorizador n que, por sua vez, sempre
projeta duas posições: uma de complemento e outra de especificador. Tais
posições carregam em si os traços de [+tema] e [+agente] respectivamente.
O padrão vocálico não é derivado de um padrão verbal, ou seja, não
encontramos resquı́cios morfológicos de um padrão verbal, tal como encontramos em outros padrões nominais, como, por exemplo, histalek ‘deixar-se’,
cujo padrão verbal é hitCaCeC e histalkut ‘demição’, cujo padrão nominal é
hitCaCCut. Em ambos, podemos notar uma parte comum: hitCa.
5
Sobre o Construct State conferir Minussi 2008, Borer 1999.
Agentividade e Voz nos Padrões Nominais do Hebraico
37
O fato de não haver resquı́cios morfológicos de um padrão verbal em
CCiCa pode ser comprovado olhando para as vogais do padrão verbal ao
qual ele corresponde, isto é, o padrão CaCaC. A primeira vogal do padrão
nominal, que corresponderia a uma primeira fase verbal, não é idêntica a
do padrão verbal. No padrão nominal temos a vogal i, enquanto no padrão
verbal temos a. Observemos, assim, a estrutura em (19):
(19)
DP
D0
nP
-t
nP
AP
n
NP
(+agente)
Picasso
n
PP
CiCaC
√
hrs
´et yerušalayim
Na estrutura, postulamos que o sintagma que ocupa a posição de especificador da projeção nominal possui o papel temático de agente da nominalização, o que explica a única possibilidade de interpretação que Picasso tem
em harisat Picasso et yerušalaim ‘A destruição de Jerusalém por Picasso’,
mesmo que o falante saiba que Picasso é um pintor.
Ainda podemos prever que nessa estrutura haja duas posições de modificação por adjetivo, uma posição depois do CS formado e outra depois de
todo o sintagma determinante, com o adjetivo adjungido no DP.
Quanto à atribuição/checagem de Caso, o DP yerušalayim recebe Caso
não do nome harisat ‘destruição’, mas de uma preposição ´et, que só aparece
quando temos um DP com o traço de [+DEF] na posição de complemento,
seja quando temos um complemento de um nome ou o complemento de
um verbo. Tal argumentação vai contra autores que defendem que ‘et seja
38
Rafael Dias Minussi
uma marca de Caso acusativo morfológico (Cf. Minussi 2008). Já o DP
Picasso está checando seu Caso dentro do CS e recebe Caso também de uma
preposição -t, a qual só aparece em um contexto de CS.
A análise para harisat yerušlayim šel Picasso ‘A destruição de Jerusalém
de Picasso’ é a de que, novamente, CCiCa projete duas posições: uma
posição para o complemento, esse sempre licenciado pelo núcleo funcional, e
uma posição de especificador, a qual pode ser ocupada ou não. Vejamos a
estrutura em (20):
(20)
DP
DP
PP
D0
šel Picasso (+possessivo)
nP
-t
nP
AP
n
n
DP
CiCaC
√
hrs
yerušalayim
Não há papéis temáticos fixos, prontos, e que são atribuı́dos por um ou
outro núcleo, mas a interpretação da expressão é dada de acordo com o
preenchimento das posições pelos elementos na estrutura (Cf. Borer 2005).
O DP Picasso na posição de adjunto possui uma gama de interpretações
maior do que quando se encontra na posição de segundo membro do CS.
Ambas as estruturas possuem dois fatos em comum: (i) o primeiro está
ligado à natureza do padrão vocálico CCiCa que não se liga a um nı́vel
verbal anterior, de modo que ambas as estruturas não possuem um nı́vel
verbal anterior ao nı́vel nominal; (ii) o segundo fato diz respeito à atribuição
de Caso dentro do Construct State. Na estrutura em (20), o DP yerušalayim
Agentividade e Voz nos Padrões Nominais do Hebraico
39
recebe Caso dentro do CS. O Caso oblı́quo é atribuı́do por um atribuidor, no
caso dos dados acima é -t, que ocupa a posição do núcleo Do , o que provoca
como consequência a não ocorrência do ha-, realização fonológica do traço
[+DEF], provocando o fenômeno da Definitude Espraiada e a operação de
Agree entre o núcleo Do e Especificador da projeção n na estrutura em (19),
e entre Do e o alvo mais próximo, no caso, o complemento do núcleo n na
estrutura em (20).
Abstract
This paper aims at discussing the selection of arguments, based on Hebrew nominalizations.
The theoretical background of this study is the Distributed Morphology (DM) (cf. Halle
& Marantz 1993, Marantz 1997), which claims that both sentences and words are formed
during the syntactic derivation. Thus, through the description of the data, we note the
existence of two nominalization patterns, which have different types of restriction to the
elements that accompany them. Furthermore, we reflect on a type of possible structure for
vocalic patterns.
Keywords: Functional heads; lexical heads, nominalizations; abstract roots; Distributed
Morphology.
Referências
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