1 A REVOLUÇÃO PERNAMBUCANA E CLERICAL-MAÇÔNICA DE 1817 Caesar Malta Sobreira Doutor em Filosofia (Univ. de Salamanca) Professor de Antropologia - UFRPE No dia 6 de março de 1817 Pernambuco foi epicentro de um fato inusitado: a eclosão inesperada de uma revolução que estava sendo planejada para eclodir no dia 5 de abril de 1817, por ocasião da Páscoa. Entretanto, após receber denúncias do complô, o governador Caetano Pinto de Miranda Montenegro mandou prender onze cidadãos, ação que foi o estopim da revolução quando o Leão Coroado reagiu à prisão e matou o brigadeiro português que fora prendê-lo. Eis a lista dos onze cidadãos que deveriam ser presos (dos quais cinco eram maçons): 1. Domingos José Martins (maçom); 2. Antonio Gonçalves da Cruz, o “Cabugá” (maçom); 3. Padre João Ribeiro (maçom), uma “figura messiânica” na definição de Calvet; 4. José Maria Bourbon; 5. Vicente Ribeiro dos Guimarães Peixoto; 6. Capitão Domingos Teotônio Jorge (maçom); 7. Capitão José de Barros Lima, o “Leão Coroado” (maçom), que deflagrou o movimento ao resistir à prisão e matar o oficial que fora prendê-lo; 2 8. Capitão Pedro da Silva Pedroso; 9. Tenente José Mariano de Albuquerque; 10. Tenente Antonio Henriques Rebelo; e 11. Tenente Manoel de Souza Teixeira. Morivaldo Calvet Fagundes, em “A Maçonaria e as forças secretas da revolução”, no capítulo intitulado “A revolução maçônica dos padres”, analisa a glória e o desastre da Revolução Pernambucana de 1817. O ideário da Revolução de 1817 era fruto dos ensinamentos propalados no Seminário de Olinda, cuja “alma e cérebro” foi o bispo Azeredo Coutinho. Este, em 22 de fevereiro de 1800, fundou o Seminário que, segundo Pedro Calmon, era um “dos núcleos revolucionários mais intensos e influentes desse tempo.” No Seminário o professor de desenho era o padre João Ribeiro Pessoa, que eram maçom e foi “a alma da Revolução de 1817. Pereira Costa afirma que em 1809 foi criada, em Pernambuco, uma loja maçônica com objetivos exclusivamente políticos. Dela faziam parte os padres João Ribeiro Pessoa de Melo Montenegro, Miguel Joaquim de Almeida Castro (“Frei Miguelinho”) e Luiz José Cavalcanti. Os dois primeiros eram professores do Seminário de Olinda, e o último, vigário de Santo Antonio. Devido à participação de muitos sacerdotes no evento insurrecional, Pedro Calmon batizou-a de “Revolução dos Padres”. Foram relacionados 3 sessenta padres e dez frades (entre eles, Frei Caneca), que participaram do movimento, quase todos maçons, sobretudo a liderança do movimento. Na verdade, a maior força psicológica e moral de 1817 foram os padres porque, através da Igreja, eles conseguiram atingir todas as camadas da população, pois nem os intelectuais, nem os comerciantes e nem os militares tinham púlpito e público a seu dispor. O foco irradiador da revolução foi o comerciante capixaba Domingos José Martins, maçom e amigo de Miranda (general de Napoleão), com quem conviveu em Londres. Dentre os civis, destaca-se José Luiz de Mendonça, advogado e “orador brilhante nos clubes e lojas maçônicas”. Além dele, aparece o cirurgião Vicente Ferreira dos Guimarães Peixoto que, após ser anistiado em 1821, voltou a Recife e fundou a Loja 6 de Março de 1817, que existe até hoje. Também o ouvidor de Olinda, Antonio Carlos Ribeiro de Andrada (irmão de José Bonifácio), que fundou em 1816, aqui em Pernambuco, uma “sociedade secreta política” batizada com o nome de Universidade Democrática. Ele aderiu à Revolução de 1817 quase a contra gosto, mas por ser fiel à Maçonaria, da qual era membro ativo e da qual, em 1812, havia sido eleito Grão-Mestre do primeiro Grande Oriente Brasileiro, fundado em Salvador. 4 A presença eclesiástica superou a de militares e civis, daí alguns aplicarem ao movimento de 1817 o título de “Revolução dos Padres” ou “Revolução Maçônica”. Dentre os participantes clericais, destacam-se padre Tenório, padre Fortuna (ambos da Paraíba), padre Antonio de Albuquerque Maranhão (do Maranhão), subdiácono José Martiniano de Alencar, que sublevou o Crato, dentre tantos, inclusive Frei Caneca que foi subsecretário da Junta de Governo, secundando Frei Miguelinho, titular da secretaria de Estado, ambos maçons. Como ensina Oliveira Lima, foi a Revolução de 1817 que a nação aprendeu a combater e morrer por liberdade e independência. Nilo Pereira se refere à 1817 como "a mais bela das nossas revoluções, a mais representativa do nosso instinto republicano". E diz que "o grande pioneirismo de Pernambuco na história nacional é justamente o inconformismo. Diz mais: que 817 "foi a mais cordial das nossas revoluções". Talvez essa definição explique melhor a derrota, do que todas as demais. Caesar Malta Sobreira