Universidade Católica de Brasília PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO Relações Internacionais ESTADO, CAPITALISMO E COOPERAÇÃO INTERNACIONAL NO PROCESSO DE REVERSÃO DO AQUECIMENTO GLOBAL Autora: Priscilla Luz Otoni Orientador: M.Sc. José Romero Pereira Júnior BRASÍLIA 2008 PRISCILLA LUZ OTONI ESTADO, CAPITALISMO E COOPERAÇÃO INTERNACIONAL NO PROCESSO DE REVERSÃO DO AQUECIMENTO GLOBAL Monografia apresentada ao curso de graduação em Relações Internacionais da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Relações Internacionais. Orientador: M.Sc. José Romero Pereira Júnior Brasília 2008 Monografia CAPITALISMO E de autoria de COOPERAÇÃO Priscilla Luz Otoni, INTERNACIONAL intitulada NO “ESTADO, PROCESSO DE REVERSÃO DO AQUECIMENTO GLOBAL”, apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Relações Internacionais da Universidade Católica de Brasília, em 12 de novembro de 2008, pela banca examinadora constituída por: Prof. M.Sc. José Romero Pereira Júnior Orientador Relações Internacionais - UCB Prof. Dr. Rodrigo Pires de Campos Relações Internacionais - UCB Prof. Dr. Egídio Lessinger Relações Internacionais - UCB Brasília 2008 Dedico esta monografia ao meu pai, Otoniel Otoni, orientador integral da minha vida e do meu curso superior, sempre presente ao meu lado em todos os momentos dessa longa trajetória, crescendo junto comigo como internacionalista, mas, acima de tudo, como ser humano. AGRADECIMENTO Agradeço aos meus pais, pelo apoio e paciência, ao Professor Mestre José Romero Pereira Junior, pela presença assídua, indispensável e enriquecedora no meu último ano acadêmico, ao Professor Doutor Rodrigo Pires de Campos, por sua estimulante contribuição à minha formação acadêmica, e a Deus, que me guiou e me deu forças para continuar, mesmo nos momentos mais difíceis. “Eu tenho um sonho [...]” (Martin Luter King) RESUMO Referência: OTONI, Priscilla Luz. Estado, Capitalismo e Cooperação Internacional no Processo de Reversão do Aquecimento Global. 2008. 81. Relações Internacionais-UCB. Brasília. 2008. O presente estudo analisa o diagnóstico do Painel Intergovernamental de Mudança do Clima (IPCC) sobre a atual situação climática do planeta e explora a relação causal entre a dinâmica de funcionamento do Capitalismo e o aquecimento global, bem como seus efeitos adversos para a civilização, para o equilíbrio do sistema climático e para a manutenção da biodiversidade. Dentro desse contexto, analisa o papel do Estado no mundo capitalista globalizado e constata a necessidade do seu fortalecimento, para fazer face aos novos desafios da sociedade, associados à gravidade da crise climática. Além disso, identifica a ameaça representada pela elevação da temperatura do planeta como motivadora da busca por soluções conjuntas para os problemas ambientais. Nesse sentido, considera fundamental a influência da consciência coletiva na reversão da escala de poder entre Estado e Capitalismo e a cooperação internacional no processo de mitigação do aquecimento global. Palavras-chave: Aquecimento Global. Estado. Capitalismo. Cooperação Internacional. Consciência Coletiva. Abstract This study presents a diagnosis of the present climate of the planet and explores the causal relationship between the dynamics of the functioning of capitalism and global warming and its adverse effects on civilization, for the balance of the climate system and to maintain biodiversity. Within this context, examines the role of the state in the globalized capitalist world and notes the need for state strengthening, to meet the new challenges of society, associated with the severity of the climate crisis. Furthermore, it identifies the threat posed by the rise of temperature of the planet as motivating the search for joint solutions to environmental problems. In this sense, considers it essential to influence the collective consciousness in the reversal of the scale of power between the State and Capitalism and international cooperation in the miigation of global warming. Key-words: Global Warming. State. Capitalism. International Cooperation. Collective Consciousness. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Mudança nos Gases de Efeito Estufa a partir de Dados de Testemunho de Gelo e Dados Modernos................................................................................ 33 Figura 2 - Variação de Temperatura de 1850 a 2000..................................................... 34 Figura 3 - Mudanças na Temperatura, no Nível do Mar e na Cobertura de Neve do Hemisfério Norte........................................................................................... 41 Figura 4 - Tempestades no Atlântico Norte................................................................... Figura 5 - Principais Impactos como Função do Aumento da Temperatura Global Média............................................................................................................. 42 Figura 6 - Origem da Energia Elétrica Consumida pela Economia Mundial em 2005.. 50 Figura 7 - Responsabilidade Ambiental Corporativa e Aquecimento Global................ 52 Figura 8 - Mapa Representativo da Projeção de Crescimento Econômico Mundial para 2015....................................................................................................... 62 Figura 9 - Mapa Representativo da Emissão Mundial de Gases de Efeito Estufa......... 63 Figura 10 - Aquecimento Global – Relação de Causa e Efeito........................................ 69 42 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Algumas Extinções em Massa..................................................................... 31 Tabela 2 - Evolução da Concentração de Gases de Efeito Estufa no Planeta.............. 32 Tabela 3 - Principais Países Emissores de CO2......................................................................................... 61 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS AIDS – Síndrome da Imunodeficiência Adquirida CMDMA – Comissão Mundial sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente CNRS – Centro Nacional de Pesquisa Científica da França EUA – Estados Unidos da América IPCC – Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima NOAA – National Oceanic Atmospheric Administration ODMs – Objetivos de Desenvolvimento do Milênio ONG – Organização não Governamental ONU – Organização das Nações Unidas PIB – Produto Interno Bruto PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento ppb – Partes por bilhão ppm – Partes por milhão Unep – Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente UNFCCC – Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima WMO – Organização Meteorológica Mundial SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................12 1.1 O PROBLEMA E SUA IMPORTÂNCIA .....................................................................12 1.2 HIPÓTESE .....................................................................................................................17 1.3 OBJETIVOS...................................................................................................................17 1.3.1 Objetivo Geral .........................................................................................................17 1.3.2 Objetivos Específicos ..............................................................................................17 1.4 METODOLOGIA...........................................................................................................18 2 REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................................................20 2.1 Marco Teórico ................................................................................................................20 2.1.1 Pluralismo................................................................................................................21 2.1.2 Globalismo ..............................................................................................................25 2.1.3 Desenvolvimento Sustentável..................................................................................26 3 DIAGNÓSTICO DO AQUECIMENTO GLOBAL............................................................28 3.1 O MUNDO SOB UMA NOVA REALIDADE GLOBAL – A DISSEMINAÇÃO DO PROBLEMA ..................................................................................................................28 3.2 CÉTICOS X APOCALÍPTICOS - ANÁLISE DAS CORRENTES CIENTÍFICAS E AS EVIDÊNCIAS DO AQUECIMENTO GLOBAL ...................................................31 3.3 A ORIGEM – REVOLUÇÃO INDUSTRIAL, CAPITALISMO E MEIO AMBIENTE ...................................................................................................................37 3.4 INTENSIFICAÇÃO DA CRISE AMBIENTAL E PROJEÇÕES CLIMÁTICAS PARA O SÉCULO XXI ............................................................................................................40 4 O PAPEL DO ESTADO NO MUNDO CAPITALISTA GLOBALIZADO – NECESSIDADE DE AJUSTES ...........................................................................................45 4.1 A REDUÇÃO DO ESTADO E A EXPANSÃO DO CAPITALISMO .........................45 4.2 PRÁTICAS ANTROPOGÊNICAS INDUTORAS DO AQUECIMENTO GLOBAL .48 5 A MITIGAÇÃO DO AQUECIMENTO GLOBAL VIA COOPERAÇÃO INTERNACIONAL ..............................................................................................................57 5.1 O CAMINHO PARA A SOLUÇÃO – INICIATIVAS DE REVERSÃO .....................57 5.1.1 A Fundamental Consciência Coletiva .....................................................................65 6 CONCLUSÃO ......................................................................................................................71 7 RECOMENDAÇÕES ...........................................................................................................77 REFERÊNCIAS.......................................................................................................................78 12 1 INTRODUÇÃO 1.1 O PROBLEMA E SUA IMPORTÂNCIA As mudanças climáticas no planeta e seus efeitos adversos atingem toda a humanidade, em maior ou menor grau, de acordo com o nível de desenvolvimento econômico e a localização geográfica. O agravamento do processo de degradação ambiental tem provocado o aquecimento global e acarretado cenário de incertezas. As distintas interpretações em torno da origem desencadeadora do problema têm dificultado o necessário consenso para a efetivação de acordos sobre o tema, na busca da conciliação entre crescimento econômico e sustentabilidade. Estudos e pesquisas científicas indicam ser o desequilíbrio no meio ambiente impulsionado por atividades humanas inadequadas à preservação ambiental, fundamentadas em um Capitalismo desregulamentado, cuja consolidação, segundo Luttwak (2001), teve início no final da década de 1970. A problemática em torno do aquecimento global e seus riscos sistêmicos assume, hoje, papel de destaque na Agenda Internacional. O tema, complexo e polêmico, tem sido alimentado por diagnósticos científicos, indicativos da intempestividade de qualquer ação de reversão do quadro que não seja imediata. As iniciativas destinadas a despertar a comunidade internacional para a relevância e urgência da busca de soluções tiveram início em 1972 na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, com o objetivo de mostrar a importância de se estabelecer critérios e princípios comuns para proporcionar aos povos do mundo inspiração e guia para preservar e melhorar o ambiente humano (DECLARAÇÃO DE ESTOCOLMO SOBRE O AMBIENTE HUMANO, 1972). Em 1987, na Comissão Mundial sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente (CMDMA), surgiu o conceito de desenvolvimento sustentável – atender as necessidades do presente sem comprometer as necessidades de gerações futuras – cujo objetivo era definir rumos para integrar o desenvolvimento econômico às questões sócio-ambientais. Nesse mesmo ano, já surgiam discussões quanto à relevância de se promover uma convenção mundial sobre o clima. 13 Criou-se, então, em 1988, o Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), marco inicial da definição de mecanismos para a formação de uma consciência ecológica mundial de combate efetivo ao aquecimento global, considerado, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD (2008), a maior ameaça já vivenciada pela humanidade. Do IPCC, emergiu o principal regime internacional sobre as alterações climáticas, assinado em junho de 1992, no Rio de Janeiro, durante a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento. Esse regime está assentado na Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) e no Protocolo de Quioto1. A cada cinco anos, o IPCC lança relatório baseado na revisão de pesquisadores e cientistas dos países membros da ONU. Os cientistas do Painel atribuem à humanidade 90% da responsabilidade pelas alterações do clima no planeta e estimam aumento da temperatura entre 1,8°C e 4°C, ainda neste século, e apresentam evidências sobre alterações do clima, indicadoras da existência de grandes riscos, respaldados em fatos concretos como o derretimento das calotas de gelo na Groelândia e no Oeste da Antártida, a enorme perda de biodiversidade e as mudanças no curso da corrente do Golfo, transformações determinantes de sérias alterações nos padrões climáticos. Todavia, o documento afirma ser possível deter o aquecimento global se o processo de redução das emissões de gases estufa for iniciado antes de 2015 (IPCC, 2007). Após décadas de alertas sobre os efeitos das ações humanas na elevação da temperatura do planeta, as iniciativas de contenção do problema surtiram poucos efeitos positivos na busca por mitigações. O Regime Internacional de Mudança Climática foi criado ao ser reconhecida a importância do estabelecimento de ações de cooperação, nas quais os países envolvidos busquem, por meio de negociações e concessões, ajustes políticos para produzir avanços no combate ao problema da degradação ambiental. 1 A Convenção Quadro das Nações Unidas para Mudança do Clima e o Protocolo de Quioto são os principais instrumentos do Regime Internacional de Mudanças Climáticas, cujo objetivo principal se sustenta na estabilização das concentrações de gases estufa na atmosfera e na necessidade de transformar os modelos de desenvolvimento vigentes, em consonância com a conservação e proteção dos ecossistemas do planeta. O Protocolo é um desdobramento da Convenção, aprovado em 1997 na cidade de Quioto, no Japão. O acordo estabelece metas de redução na emissão de gases causadores do efeito estufa em pelo menos 5,2% em relação aos níveis apresentados em 1990 (REGIME INTERNACIONAL DE MUDANÇA DO CLIMA, 1992; PROTOCOLO DE QUIOTO, 1997). 14 Na prática, o êxito da cooperação esbarra na conveniência política dos Estados em prover interesses economicamente vantajosos, em consonância com o princípio capitalista de maximização de lucros. Para Viola (2002, p. 19), diminuir as emissões de carbono teria custos significativos no curto prazo. Entre o medo de uma mudança climática incerta e num futuro distante e a perspectiva imediata de queda no padrão de vida material, a maioria dos países inclinou-se, então, em favor da manutenção de seu padrão. Por isso, a resistência em adotar as medidas necessárias para reverter o aquecimento da Terra tem gerado lentidão estrutural nos processos de negociação de acordos, a exemplo do Protocolo de Quioto. Um dos problemas fundamentais da viabilidade desse Protocolo deriva do fato de ele ter sido aprovado no interior de uma negociação extremamente difícil e emergencial. Além disso, vários artigos-chaves ficaram em suspenso, devendo ser discutidos em uma conferência posterior. (VIOLA, 2002, p. 26). Diante do preocupante cenário exposto, se torna fundamental reduzir a concentração de gases estufa na atmosfera para reverter o aquecimento e tornar o modelo de desenvolvimento aderente a práticas adequadas de conservação e proteção dos ecossistemas do planeta. Conciliar os ajustes nesse modelo com a preservação ambiental é um grande desafio, potencializado pela dinâmica de funcionamento do Capitalismo, indutora de ações humanas, livres, mas por vezes comprometedoras da estabilidade climática. As preocupações quanto a esse padrão desenvolvimentista, considerado por Santos (2006) perverso e totalitário, surgiram ainda na década de 1930, em obras literárias, a exemplo de “Admirável Mundo Novo” de Aldous Huxley, na qual o autor apresenta reflexão sobre os caminhos da civilização sob o modelo fordista de produção, ainda incipiente em seu tempo, em que os indivíduos são meros produtos do sistema. Essa reflexão de Huxley (1932) relaciona-se à teoria de Marx em que o homem é produzido e reproduzido pelo sistema no qual está inserido. Assim, a referida obra, relata todo o processo de castração e domesticação de uma sociedade totalitária, desumanizada e de excessiva ordem, na qual todos os homens, em busca da eficiência gerada pela coletividade da produção em massa, perdem totalmente a individualidade e o livre arbítrio. Dessa forma, as massas têm seus gostos e costumes modificados por mecanismos e estratégias que visam despertar o desejo ao consumo intransitivo e 15 criam necessidades, muitas vezes supérfluas, nos indivíduos dominados pelo sistema, em prol de uma aparente harmonia na sociedade. Os resultados disso criam, para Lïdi (1994 apud HAESBAERT, 2001, p. 23), um [...] mundo “sem sentido” onde os valores da modernidade racionalista e tecnicista são cada vez mais questionados, sem que um novo conjunto de valores esteja sendo formulado e/ou aprofundado e difundido. O mundo estaria vivenciando um gap brutal entre uma débil produção de sentido (para a vida humana) e uma potência tecnológica e de destruição nunca tão fortalecida. Mesmo com toda a sua eficácia econômica, o capitalismo não é capaz de dar um sentido à vida coletiva, propor um projeto social efetivo, a não ser o “evangelho da competitividade” e a lógica da mercadoria e do consumismo. Esse novo mundo emerge da globalização, ou globaritarismo, como prefere Santos (2006), com a flexibilização dos circuitos produtivos, no molde pós-fordista de produção, cuja difusão de subcontratações, de terceirizações e de empregos temporários é característica principal. Paralelamente a esse processo de flexibilização e inovação dos modos de produção, a intensa competitividade gerada pelo livre mercado acarreta diminuição dos preços e aumento na demanda por bens e serviços. Inovadores produtos surgem no mercado com velocidade surpreendente, despertando novos desejos nos indivíduos, cujas propensões a consumir crescem consideravelmente. Para Haesbaert (2001, p. 13), A globalização contemporânea é vista antes de tudo como um produto da expansão cada vez mais ampliada do capitalismo e da sociedade de consumo, acarretando uma crescente mercantilização da vida humana, que teria atingido níveis inéditos na história. Numa sociedade moldada pelo fetichismo da mercadoria, dominada pela lógica contábil, em que tudo é transformado em grandezas abstratas, passível de ser comprado e vendido, fica difícil imaginar a manifestação de outras culturas ou “civilizações” com distintos padrões de organização e sociabilidade. A definição desse autor para globalização evidencia um período de grandes contradições, complexidade e fluidez. O binômio Capitalismo-Globalização modificou profundamente a composição do sistema internacional e os valores da sociedade. A estruturação dessa nova lógica, global e transformadora, delineada pela desregulamentação do Capitalismo e pela defesa do livre mercado, proporcionou, de acordo com Matias (2005), o surgimento do ciberespaço e a crescente influência do mercado e das empresas transnacionais nas ações dos Estados, a reduzirem, significativamente, sua autonomia e poder. Assim, eles estão cada vez mais expostos às pressões dos mercados mundiais e são forçados a se adaptarem e 16 agirem de acordo com políticas liberalizantes (maior mobilidade de capital financeiro, produção, investimentos globais, expansão do comércio) (SCHIRM, 1999). Como resultado desse processo, as grandes corporações apátridas e o fluxo de capitais circulam livremente pelo espaço mundial, intensificam a concorrência e reduzem a margem de ação do Estado, percebido, segundo Pio (2002), como instrumento de poder de grupos particulares, em prol de interesses específicos. Dessa forma, se encontra, a cada dia, mais ausente da sua função de assegurar o bem-estar dos seus cidadãos. Portanto, tendo presente a realidade do desequilíbrio climático e do conseqüente e preocupante aquecimento global, bem como o contexto complexo em que se dão as tentativas de entendimentos para a busca da mitigação do problema, a ausência de iniciativas concretas para a sua reversão ainda não permite vislumbrar perspectiva de solução. A negligência em relação ao tema por parte de países com potencial para liderar o processo deveria, em princípio, produzir expectativa inversa quanto à solução necessária. Entretanto, a Academia e seus instrumentos, como armas na guerra da informação e do conhecimento, protagonista em outras crises, poderá, agora, fazer a diferença na formação da consciência coletiva como fator básico para a mudança necessária. Este estudo pretende, então, oferecer uma parcela de contribuição para o que pode vir e se tornar uma grande cruzada acadêmica contra as causas antropogênicas do aquecimento global, cuja adequação é imprescindível para a solução do problema climático. O internacionalista, cujo caráter universal permite atuação em um vasto campo de conhecimento e o credencia à vanguarda desse processo, deverá exercer considerável influência tanto na formação da opinião pública quanto nos processos decisórios de formulação de políticas de Estado e nas negociações internacionais. 17 1.2 HIPÓTESE A dinâmica de funcionamento do Capitalismo é fator causal importante do aquecimento global e requer ajustes para os quais é necessário o fortalecimento do Estado, mediante o estabelecimento de novo arcabouço regulamentar, propício à transformação da atual insuficiência das iniciativas de mitigação em caminho viável e imprescindível para a solução do problema, dentro de um contexto de cooperação internacional. 1.3 OBJETIVOS 1.3.1 Objetivo Geral Analisar a relação causal entre a dinâmica de funcionamento do Capitalismo e o Aquecimento Global, bem como verificar a forma e a importância da atuação do Estado e da cooperação internacional para induzir e viabilizar iniciativas de reversão do desequilíbrio climático do planeta. 1.3.2 Objetivos Específicos • Analisar o diagnóstico do IPCC sobre o aquecimento global, identificar sua origem e causas e analisar cenários prováveis de conseqüências e riscos. • Aprofundar o entendimento do papel do Estado no mundo capitalista globalizado, com vista a identificar melhores formas para sua atuação diante do problema. 18 • Avaliar o grau de importância da cooperação internacional e da participação da consciência coletiva, na busca de caminhos para a reversão do aquecimento global. 1.4 METODOLOGIA O presente estudo partirá do diagnóstico do IPCC sobre a atual condição climática do planeta, por meio de análise minuciosa do sistema climático e do processo de aquecimento global e suas causas físicas (fenômenos climáticos) e estruturais (dinâmica de funcionamento do Capitalismo), bem como das projeções de riscos e conseqüências (intensificação de secas e tempestades, ondas de calor, perda de biodiversidade, etc.), para verificar a necessidade e a urgência de se empreender ações para mitigação do problema e avaliar a suficiência das iniciativas existentes. Para isso, serão abordados os conceitos de desenvolvimento sustentável, de interdependência complexa, de cooperação internacional e de comunidades epistêmicas e, também, serão analisados documentos e relatórios sobre o tema, com destaque para relatórios do Painel Intergovernamental de Mudança do Clima (IPCC) e do Regime Internacional de Mudança Climática e o Protocolo de Quioto. Como fontes secundárias, serão analisadas, revistas, artigos científicos, livros e publicações em sítios da Internet. Será apresenta análise das transformações acarretadas pelo sistema internacional vigente, moldado pelo binômio Capitalismo-Globalização, e seu impacto sobre a atuação do Estado, frente ao surgimento de novos atores na arena internacional e ao avanço das empresas transnacionais pelo mundo. Procurar-se-á demonstrar a inadequação desse modelo para a preservação do meio ambiente natural e humano, bem como identificar a influência das práticas antropogênicas, responsáveis pelo agravamento do desequilíbrio climático. Para tanto, as obras de Santos (2006), Haesbaert (2001), Souza (2008), Luttwak (2001), Matias (2005), Pio (2002) e Schirm (1999) servirão de base. Será exposta a controvérsia entre as duas correntes existentes em torno do assunto e fundamentada a adoção da interpretação da corrente antropogênica no presente trabalho. 19 As informações serão organizadas de forma a demonstrar a relação causal entre Capitalismo e aquecimento global, assim como a importância de ações bem orientadas do Estado, dentro de um cenário de cooperação internacional, para o combate ao problema das mudanças climáticas e seus riscos sistêmicos para o futuro da humanidade. 20 2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 MARCO TEÓRICO Compreender a realidade e a complexidade das relações internacionais é um grande desafio em um mundo heterogêneo e em contínuas transformações. Os choques de posicionamentos, percepções e interesses entre Estados e outros atores, bem como as distintas visões de mundo das grandes civilizações, são fatores indicativos de uma realidade em permanente mutação. Por isso, originaram-se, no decorrer do tempo, grandes debates teóricos, mediante os quais estudiosos e pesquisadores da disciplina buscaram explicar o contexto internacional da maneira mais adequada possível. Na medida em que ocorriam mudanças na estrutura e no funcionamento do sistema, outras circunstâncias e realidades globais surgiam, abrindo caminhos para desenvolver novos conhecimentos e consolidá-los em teorias mais precisas sobre a realidade das relações internacionais. O presente estudo pretende compreender a realidade e as causas físicas e estruturais do aquecimento global, bem como identificar, objetivamente, os reflexos e o grau de influência do processo de expansão do Capitalismo sobre esse fenômeno climático e sobre o poder e a participação do Estado no sistema internacional. Para tanto, será fundamental a utilização de determinadas abordagens teóricas do campo das relações internacionais, como, Pluralismo e Globalismo (VIOTTI; KAUPPI, 1998), além de fundamentos de Desenvolvimento Sustentável (NOSSO FUTURO COMUM, 1987). A visão pluralista das relações internacionais será útil para aprofundar a compreensão das modificações acarretadas pelo Capitalismo e perceber como atores transnacionais, a exemplo das Organizações Internacionais e não governamentais, das corporações multinacionais e dos grupos ambientalistas, exercem pressão sobre os governos e influenciam a política estatal. Tal abordagem fornecerá os elementos necessários para entender qual o papel exercido pelo Estado no atual sistema internacional. 21 Ainda dentro dessa perspectiva, serão utilizados fundamentos de interdependência complexa, cooperação internacional, comunidades epistêmicas e do conceito de Regime Internacional (KEOHANE,1984; VIOTTI; KAUPPI, 1998). A ótica globalista das relações internacionais, por seu turno, será a base para compreender o funcionamento e o processo de expansão do Capitalismo, bem como contribuir para perceber como a globalização modificou os modos de produção, os valores da sociedade, o papel do Estado e as relações homem-natureza, com vistas a associar o grau de participação do Capitalismo nas causas do aquecimento global. Nessa abordagem teórica, a disposição para cooperar é quase inexistente. O presente estudo pretende verificar o grau de capacidade e interesse dos atores envolvidos nas questões ambientais, para converterem iniciativas de cooperação em ações viáveis para a solução do problema. Para tanto, será fundamental analisar alguns aspectos da realidade sob a perspectiva globalista das relações internacionais. Nessa visão, são destacadas as relações de exploração impostas pelo sistema, fazendo da desigualdade parte intrínseca da realidade internacional, de tal modo que as relações de interdependência assumem um sentido de controle das economias desenvolvidas sobre as emergentes e periféricas e acentuam a discrepância entre ricos e pobres. Por fim, os fundamentos do desenvolvimento sustentável servirão de alicerce para justificar e advertir sobre a necessidade de adaptação do sistema capitalista e do modelo de desenvolvimento vigente a novas realidades e circunstâncias globais, agravadas pelo desequilíbrio climático. Portanto, as vertentes pluralista e globalista, bem como as noções de desenvolvimento sustentável, se complementarão na análise deste trabalho, com vistas a construir uma visão macro da realidade para compreender, com mais precisão, as complexas relações internacionais. 2.1.1 Pluralismo O Pluralismo se contrapõe a teoria realista das relações internacionais e, segundo Viotti e Kauppi (1998, p. 199-200), é fundamentado em quatro premissas: 22 1. Os atores não estatais têm grande importância na política mundial, equiparando-se ao Estado em determinadas situações. 2. O Estado não pode ser considerado um ator unitário, por ser composto por diversos segmentos da sociedade e da política, como burocracias e grupos de interesse. 3. O Estado não é um ator racional. 4. A interdependência crescente entre Estados e sociedades criou uma agenda internacional a transcender temas de segurança nacional, pois, inclui também, questões econômicas, ecológicas, sociais e culturais. A partir desses pressupostos, percebe-se como o surgimento e a ascensão de atores transnacionais a uma posição de destaque na arena internacional modificaram profundamente o papel do Estado na arena internacional. Por isso, os pluralistas reiteram a crescente importância das relações de cooperação, com vistas a captar as relações de interdependência e interações estabelecidas entre todos os atores envolvidos na política mundial. Além disso, negam a tese realista da hierarquia do sistema internacional, embasada nas questões de segurança nacional. Insistem, então, na importância relativa das questões internacionais, cuja proeminência varia segundo a conjuntura e os diferentes foros de atuação dos atores. Assim, a imagem pluralista das relações internacionais é predominantemente a de uma teia de aranha, na qual todos os elementos estão interligados e um ponto afetará os demais ao seu redor. Em resumo, os teóricos dessa abordagem destacam mudanças na realidade do sistema internacional, como resultado da transferência de parte da soberania estatal aos atores transnacionais, os quais passam a adquirir características supranacionais. 2.1.1.1 Cooperação Internacional, Regimes Internacionais e Interdependência Complexa Nesse contexto, é relevante olhar a realidade sob o ponto de vista da teoria da cooperação internacional, para entender a importância dos regimes internacionais e a atuação das comunidades espistêmicas, como manifestações inequívocas do fenômeno da interdependência acunhado por Keohane (1984). 23 Essa teoria parte do pressuposto da existência de interesses comuns e examina as condições sob as quais esses interesses conduzem os Estados a situações de cooperação. A crescente interdependência econômica torna essencial a cooperação, haja vista interesses comuns criarem demanda significativa por instituições internacionais e regras. Cooperação internacional pode ser definida, então, como “ajustes mútuos nas políticas de governo por meio de um processo de coordenação política” (MARTIN, 1993, p. 435). Krasner (1983 apud KEOHANE, 1984, p. 57) conceitua regime internacional como “um conjunto de princípios, normas, regras e procedimentos decisórios, explícitos e implícitos, em torno dos quais as expectativas dos atores convergem em uma dada área das relações internacionais”. Nesse conceito, os princípios são crenças de fato, as normas são padrões de comportamento definidos como certos e errados, as regras são prescrições específicas ou prognósticos para ações, e, por fim, os procedimentos decisórios são práticas prevalecentes para fazer e implementar escolhas coletivas. Assim, para o autor, os interesses comuns dos Estados capitalistas, fortalecidos pelos efeitos de regimes internacionais existentes, implicam maior possibilidade de ocorrer cooperação internacional. As transformações acarretadas pelo binômio Globalização-Capitalismo delinearam novas realidades no mundo contemporâneo e o fenômeno da transnacionalização, abordado pelo pluralismo, serviu para abandonar a falsa imagem de um mundo imerso em comportamentos beligerantes por parte dos países e para abordar essa dimensão mais cooperativa das relações internacionais. Com os avanços científicos e tecnológicos e a revolução das comunicações, bem como com a intensificação das transações econômicas e o esgotamento dos recursos naturais surge, cada vez mais, a necessidade de cooperar e coordenar políticas entre as distintas unidades do sistema, a fim de fornecer uma resposta mais eficaz às novas realidades globais. Nesse sentido, os regimes internacionais indicam as situações existentes em campos concretos da atividade internacional. É importante ressaltar que cooperação não implica ausência de conflitos. Para Keohane (1984), a discórdia é parte intrínseca da possibilidade de ações cooperativas. Sem discórdia se estabelece uma situação de harmonia, na qual as políticas dos atores automaticamente facilitam a consecução dos objetivos dos outros. Harmonia difere de cooperação, pois esta, necessariamente, envolve discórdia para estimular ajustes mútuos. 24 Dessa forma, a cooperação existe quando as políticas seguidas por um governo são percebidas por seus parceiros como facilitadoras da realização de seus próprios interesses, como resultado de um processo de coordenação política. Os regimes internacionais, nesse processo, são mecanismos formalizadores de uma situação de cooperação, na qual os Estados pautam suas discussões e negociações na busca de entendimento e convergência sobre questões determinadas. 2.1.1.2 Comunidades Epistêmicas É interessante perceber, nesse contexto, como atuam as comunidades epistêmicas e qual o grau de importância desses grupos na formulação de políticas estatais e na formação de regimes internacionais. Comunidades epistêmicas são redes de cientistas, especialistas e profissionais com reconhecido prestígio em uma determinada área de conhecimento (HAAS, 1992). Segundo Haas (1992), esses grupos são agentes cruciais na coordenação política internacional, na medida em que detêm grande poder de influência e pressão, por difundirem novas idéias e informações, as quais podem interferir diretamente nas decisões estatais em um processo de negociação. Desse modo, essas comunidades são atores transnacionais com papel preponderante não só para elaborar e administrar informações, mas, também, para aconselhar Estados sobre as relações de causa e efeito de determinadas políticas. Nesse sentindo, esses grupos de conhecimento podem exercer significativa influência no processo de configuração das agendas dos governos. Portanto, contribuem de forma concreta para o desenvolvimento da política internacional e para a criação de instituições condutoras do comportamento do Estado, para reduzir os problemas de ação coletiva. 25 2.1.2 Globalismo Na abordagem de Viotti e Kauppi (1998, p. 341-343), a teoria globalista das relações internacionais está fundamentada em quatro pressupostos: 1. É necessário compreender o contexto global dentro do qual cada Estado ou outras entidades interagem. Para isso, todos os níveis de análise são considerados (individual, burocrático, social, entre Estados ou entre sociedades.). O comportamento de atores é explicado por um sistema que lhes constrange ou dá oportunidades. 2. A análise histórica é relevante para compreender a estrutura do sistema internacional, seus mecanismos de dominação e as causas da desigualdade, etc. 3. Há determinados mecanismos de dominação para impedir o desenvolvimento homogêneo do mundo. 4. Fatores econômicos são absolutamente determinantes. Os demais fatores (políticos, sociais) são totalmente dependentes da economia, e não um domínio autônomo como acreditam os realistas e pluralistas. Essa abordagem teórica enfatiza a divisão Norte-Sul do mundo, mesmo para explicar períodos como a Guerra Fria, quando o globo dividiu-se em Leste-Oeste, pois, para os globalistas, os países socialistas também estavam inseridos em uma lógica econômica global capitalista impositiva. Evita-se utilizar o termo marxismo para o paradigma globalista, uma vez que, tanto marxistas quanto não-marxistas, desenvolvem suas análises sob o ponto de vista do globalismo. Partem do pressuposto de que a análise das relações internacionais está intrinsecamente arraigada ao sistema capitalista mundial ou às relações de dependência da economia política global. Os teóricos dessa corrente são pessimistas quanto ao caráter pacífico das relações internacionais baseado na cooperação como forma de reverter o quadro dos países menos desenvolvidos. Para eles, a natureza hierarquizada do sistema internacional capitalista dificulta concessões de nações desenvolvidas às nações subdesenvolvidas. Por isso, propõem uma passagem revolucionária da ordem mundial atual (de divisão internacional do trabalho e imperialismo reciclado) para uma nova ordem mundial. Os globalistas reconhecem a anarquia do sistema internacional, assim como os realistas. Contudo, se para os realistas é necessário estabelecer a ordem no sistema internacional através do equilíbrio de poder ou do exercício de poder hegemônico (estabilidade ou guerra), para os globalistas é a própria economia 26 capitalista de mercado que ordena o relacionamento dos atores do sistema internacional. Então, de acordo com essa vertente teórica das relações internacionais, a cooperação é mais um mecanismo para legitimação e manutenção do sistema capitalista. 2.1.3 Desenvolvimento Sustentável Desenvolvimento Sustentável é aquele capaz de suprir as necessidades da geração atual sem comprometer a capacidade de atender as necessidades de futuras gerações (NOSSO FUTURO COMUM, 1987). Esse conceito foi apresentado em 1987 pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, ou Comissão Brundtland, criada pelas Nações Unidas (ONU) para discutir e propor novos rumos para o desenvolvimento da humanidade e do planeta Terra, pautados no equilíbrio entre desenvolvimento econômico e conservação ambiental. Os ideais do desenvolvimento sustentável transcendem preocupações específicas como: a racionalização do uso da energia, o desenvolvimento de técnicas substitutivas do uso de bens não-renováveis, o adequado manejo de resíduos, dentre outros. Na verdade, os fundamentos da sustentabilidade consideram, principalmente, o reconhecimento de que a pobreza, a desigualdade, a deterioração do meio ambiente e o crescimento populacional estão indiscutivelmente interligados e não podem ser analisados de forma isolada. O grande desafio é tornar o modelo de desenvolvimento econômico pósfordista vigente favorável a práticas adequadas de conservação e proteção do meio ambiente. A dificuldade em conciliar os ajustes necessários é potencializada pela dinâmica de funcionamento do Capitalismo, indutora de ações humanas livres, mas, por vezes, comprometedoras da estabilidade climática. Para ser sustentável, qualquer empreendimento humano deve ser ecologicamente correto, economicamente viável, socialmente justo e culturalmente aceito. A conciliação entre esses fatores e o engajamento de todos os atores (empresas transnacionais, ONGs, governos, sociedade civil, etc.) envolvidos para 27 formular um novo modelo para o desenvolvimento, são necessários para garantir a eficácia das práticas sustentáveis. Entretanto, após duas décadas da sua criação, o processo de aplicação do conceito ainda avança lenta e inconstantemente. Esse fato é potencializado pelo caráter multidisciplinar do processo, devido à necessidade de envolver uma diversidade de atores e promover mudanças políticas, econômicas e sociais, a afetarem opiniões e decisões em diferentes setores de diversas partes do mundo. Tudo isso dificulta o comprometimento necessário para fomentar o alcance das adaptações para o novo modelo de desenvolvimento. A falta de clareza do conceito também reflete negativamente na sua dinâmica de aplicação, devido à exigência de grande esforço para a construção de ferramentas, modelos e um arcabouço institucional capaz de apoiar e estimular todos os atores do processo a aderirem aos novos princípios, fundamentados na utilização racional dos recursos naturais do planeta, na governança responsável e na ética empresarial. Portanto, para equilibrar eficiência econômica e conservação ambiental é necessário adotar técnicas para garantir mudanças no padrão de consumo da sociedade capitalista e reduzir a produção não sustentável, na tentativa de estabelecer um sistema econômico consciente da questão ambiental. Sendo assim, para alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção ambiental deve constituirse parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada isoladamente deste. O agravamento dos problemas climáticos contribuiu para a constatação de que os recursos naturais são finitos e elevou as questões ambientais à posição de destaque tanto na agenda internacional quanto nas mais diversas esferas das políticas de governo. Assim, o presente estudo utilizará os fundamentos de desenvolvimento sustentável com vistas a identificar os instrumentos que possibilitem a transformação do modelo de desenvolvimento vigente e do padrão civilizatório, moldando valores e costumes para proporcionar o surgimento de uma nova fase do Capitalismo, na qual seja resgatado o poder do Estado e sejam estabelecidas as bases para as iniciativas e os comportamentos necessários à reversão do aquecimento global. 28 3 DIAGNÓSTICO DO AQUECIMENTO GLOBAL 3.1 O MUNDO SOB UMA NOVA REALIDADE GLOBAL – A DISSEMINAÇÃO DO PROBLEMA As catástrofes ambientais, de ocorrência freqüente nas últimas décadas, vêm sendo potencializadas pelo agravamento da crise ambiental global no século XXI, cuja causa decorre de variações no equilíbrio do sistema climático, determinantes para a elevação da temperatura média na superfície da Terra (IPCC, 2007). O fenômeno do aquecimento global tem sido continuamente explorado e debatido pelos cientistas. Seus efeitos adversos, tais como a elevação do nível do mar, secas prolongadas e a intensificação de tempestades geram preocupações e sinalizam a necessidade de adaptações gradativas a uma nova realidade. Com a constatação da gravidade e dos riscos inerentes ao problema, a partir de observações e diagnósticos técnicos2, as questões ambientais, antes limitadas a nichos acadêmicos, atravessaram as fronteiras da ciência e se disseminaram por todas as esferas das sociedades e dos governos, bem como por todas as áreas de conhecimento. Esse contexto, aliado à expansão do Capitalismo e ao surgimento do império da informação, motivou importantes transformações nas relações internacionais e proporcionou, a partir da década de 1970, a inserção do tema ambiental na agenda internacional com maior importância (VIOLA, 2005). A crescente preocupação com as conseqüências do aquecimento do planeta e a inquietação sobre suas causas (naturais ou antropogênicas3), ensejaram iniciativas globais como o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), fundado em 1988 pela Organização Meteorológica Mundial (WMO) e pela Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Unep) (OLIVEIRA, 2008). O Órgão, ao reunir renomados estudiosos e cientistas engajados no monitoramento e análise das variações do clima, contribuiu significativamente para a disseminação do 2 3 Diagnósticos técnicos fundamentados em relatório do IPCC. O termo antropogênico está associado essencialmente a atividades humanas. 29 assunto e para o abrangente reconhecimento, por parte da comunidade internacional, da gravidade e urgência do problema. Desde a década de 1990, o IPCC produziu quatro relatórios4 com informações e diagnósticos sobre as mudanças no clima. Suas previsões científicas projetam cenários devastadores e indicam elevado grau de incerteza para o futuro da civilização. A crescente degradação ambiental associada à elevação da temperatura do planeta potencializou o fenômeno e resultou no conceito de que as mudanças climáticas são o maior desafio já enfrentado pela humanidade (PNUD, 2008). O tema tornou-se pauta freqüente nos meios de comunicação e nos discursos governamentais. O agravamento da crise ambiental fez o assunto transcender o ativismo de grupos ambientalistas para abranger questões de segurança nacional, de direitos humanos, bem como de desenvolvimento e de crescimento econômico, indicativos do caráter de urgência na criação de mecanismos para reversão do problema. Nesse sentido, o PNUD (2008) chama a atenção para a ameaça dos efeitos do aquecimento global para o desenvolvimento humano, com impacto negativo direto nos esforços internacionais de combate à pobreza, na concretização dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs)5, bem como na liberdade humana e no poder de escolha, principalmente nos países mais pobres, devido à maior vulnerabilidade aos choques climáticos. Fatores como a produção agrícola, a segurança alimentar, a disponibilidade dos recursos hídricos, o nível dos oceanos, os fenômenos naturais e o equilíbrio dos ecossistemas e da biodiversidade, serão diretamente afetados pela elevação da temperatura global (IPCC, 2007). Como resultado, de acordo com o PNUD (2008), 4 5 O primeiro relatório do IPCC foi finalizado em 1990 e motivou o estabelecimento da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC), em 1992. O segundo relatório, publicado em 1995, foi fundamental para as negociações que culminaram na criação do Protocolo de Quioto, em 1997. Em 2001 foi divulgado o terceiro relatório, consagrado como referência no fornecimento de informações relevantes para o entendimento das variações ocorridas no sistema climático. O quarto e último relatório foi publicado em 2007. Esse documento fortaleceu o embasamento científico, bem como aprofundou o conhecimento das influências antropogênicas sobre o problema. Portanto, para realizar o diagnóstico do Aquecimento Global, o presente estudo tem como base o relatório de 2007, haja vista a grande quantidade de dados novos, o aprimoramento das técnicas utilizadas e o aprofundamento no conhecimento e na simulação dos processos físicos envolvidos nas mudanças climáticas (OLIVEIRA, 2008). Os oito objetivos do milênio foram estabelecidos pela Organização das Nações Unidas em 2000, após identificação e análise dos principais problemas mundiais. São eles: 1. Erradicação da fome e da miséria; 2. Educação de qualidade para todos; 3. Equidade de sexos e valorização da mulher; 4. Redução da mortalidade infantil; 5. Melhoria da saúde das gestantes; 6. Combate à AIDS, à malária e a outras doenças; 7. Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente; 8. Estabelecimento de uma parceria mundial para o Desenvolvimento. 30 surgirá um novo contingente de pessoas, os refugiados ambientais, a compor novos aglomerados de exclusão e a exacerbar as disparidades e a injustiça social. O desemprego estrutural e a escassez de alimentos e de água implicarão inevitável aumento da fome, da pobreza e da miséria. Assim, a falta de iniciativas oficiais imediatas para o desenvolvimento de ações coordenadas, propícias ao controle do clima, poderá levar as sociedades à busca instintiva de soluções improvisadas, com risco de desordem e instabilidade social. Diante disso, as conseqüências esperadas irão da estagnação ao retrocesso no desenvolvimento humano, com comprometimento das capacidades técnicas, a evidenciar a necessidade de adaptação da civilização a novos limites impostos pela natureza. Para evitar o agravamento do problema e tentar neutralizar as indesejáveis conseqüências previstas, o IPCC tem buscado o aprofundamento de seus estudos e a formulação de diagnóstico com o máximo possível de objetividade. Nesse sentido, divulgou, no relatório de 2007, evidências científicas do aquecimento global motivado por ações humanas, indicativo da necessidade de transformações estruturais nos modelos de desenvolvimento dos países e no modelo atual de civilização, a afetar diretamente o palco das relações internacionais em um mundo globalizado capitalista. Conforme indicado no PNUD (2008. p. 2), como respaldo a essa necessidade, O modo como o mundo lida hoje com as alterações climáticas envolve conseqüências diretas nas perspectivas de desenvolvimento humano para uma grande parte da humanidade. O insucesso irá consignar os 40% mais pobres da população mundial - cerca de 2,6 bilhões de pessoas - a um futuro de possibilidades diminutas. Irá exacerbar desigualdades profundas no seio dos países e minar os esforços para construir um padrão de globalização mais inclusivo, reforçando as enormes disparidades entre os que “têm” e os que não “têm”. Em contraponto às iniciativas de ajustes vislumbradas, o caráter expansionista e impositivo do sistema capitalista subordina a natureza ao homem. Porém, a insuficiência dos recursos naturais para fazer face ao consumo intransitivo já começa a ser percebida. As mudanças compreendidas como necessárias requerem a quebra do atual paradigma capitalista, do ganho máximo com o custo mínimo, com meios nem sempre adequados social e ambientalmente. E o internacionalista deverá buscar papel importante nesse processo. 31 3.2 CÉTICOS X APOCALÍPTICOS - ANÁLISE DAS CORRENTES CIENTÍFICAS E AS EVIDÊNCIAS DO AQUECIMENTO GLOBAL A crise ambiental, impulsionada pela elevação da temperatura do planeta, é um fato. Contudo, há divergências quanto à origem desencadeadora do processo de aquecimento. Identificam-se duas correntes distintas: os cientistas e estudiosos do IPCC, adeptos da visão antropogênica do problema, representam o grupo conhecido como apocalíptico, e os chamados céticos, contestadores da ação humana como causa significativa, com visão acomodada em causas naturais e cíclicas. A corrente cética não nega a existência de um aquecimento em curso no planeta. Embora admitam a influencia das atividades humanas sobre o meio natural e dos gases de efeito estufa sobre a temperatura, negam a relação causal direta entre esses fatores e relacionam o aquecimento global a um ciclo natural de aquecimento e resfriamento do globo, determinado por fatores como a radiação solar, o magnetismo do núcleo da Terra e a órbita do planeta (THE GREAT..., 2007). A se considerar causas naturais e cíclicas para o fenômeno, bem como sua reversão sem maiores conseqüências, não se pode esquecer as inúmeras vezes em que esse ciclo pode ter sido quebrado, com conseqüências catastróficas, determinantes de profundas transformações na condição de vida do planeta e da extinção de muitas espécies, conforme Tabela 1, a seguir. Extinção Tempo Espécies Extintas Cambriana 488 ma Conodontes e Equinodermos Glaciação Ordovícico 444 ma Braquiópodes, Crinóides e Equinóides Glaciação Devônico Superior 360 ma Placodermos Meteoros PermoTriássica 251 ma Trilobites e 96% dos gêneros marinhos Formação da Pangéia e dos Oceanos K-T 65,5 ma Dinossauros Asteróide ma = milhões de anos Tabela 1 – Algumas Extinções em Massa Fonte: Discovery Channel, 2007 Causas 32 Em contrapartida, os cientistas do IPCC, em seu último relatório publicado, atribuem à humanidade 90% da responsabilidade pelas alterações do clima no planeta e estimam aumento da temperatura entre 1,8°C e 4°C, ainda nesse século. Na visão desses estudiosos, o aumento da temperatura decorre, principalmente, da crescente concentração de gases de efeito estufa na atmosfera. Como mostra a Tabela 2, há registros de aumento acentuado na concentração desses gases, observados desde a década de 1750 até 2005: Gases Faixa natural últimos 650 mil anos Concentração pré Revolução Industrial Concentração 2005 Dióxido de carbono (CO2) 180 a 300 ppm 280 ppm 379 ppm Metano (CH4) 320 a 790 ppb 715 ppb 1.774 ppb 270 ppb 319 ppb Óxido nitroso (N2O) ppm- partes por milhão 6 ppb - partes por bilhão Tabela 2- Evolução da Concentração de Gases de Efeito Estufa no Planeta Fonte: IPCC (2007). Estudos recentes afirmam ser a concentração do CO2 a mais elevada dos últimos 800 mil anos e, atualmente, já supera a marca de 380 ppm, quando, há 667 mil anos registrava o mínimo de 172 ppm. Esses dados são o resultado de testes realizados com amostras de gelo retiradas de uma profundidade de até 3,27 km (testemunho de gelo) por cientistas franceses. A análise das gotas de gases atmosféricos de tempos remotos contidas nas amostras de gelo confirmou a correlação entre a evolução da temperatura do planeta e o ciclo do carbono (CNRS, 2008). A Figura 1 apresenta gráficos que mostram a evolução da concentração dos três principais gases estufa ao longo dos últimos 10 mil anos (painéis grandes) e desde 1750 (painéis inseridos). Ao analisar uma amplitude temporal de 10 mil anos percebe-se com clareza a variação desproporcional da concentração de gases estufa a partir do ano de 1750, a evidenciar a contribuição da revolução industrial 6 ppm (partes por milhão) ou ppb (partes por bilhão, 1 bilhão = 1.000 milhões) é a razão do número de moléculas de gases de efeito estufa em relação ao número total de moléculas de ar seco. Por exemplo, 300 ppm significam 300 moléculas de um gás de efeito estufa por milhão de moléculas de ar seco (IPCC, 2007). 33 nesse processo, principalmente, pela intensificação da queima de combustíveis fósseis. Figura 1 – Mudança nos Gases de Efeito Estufa a partir de Dados de Testemunho de Gelo e Dados Modernos Fonte: IPCC (2007) O aumento global da concentração de dióxido de carbono, gás de efeito estufa mais influente na variação da temperatura, decorre principalmente da utilização de combustíveis fósseis e da mudança no uso da terra. A elevação da concentração do metano e do óxido nitroso ocorreu devido a atividades antrópicas, predominantemente a agricultura. A comunidade científica tem se dedicado a explorar e estudar as variações climáticas no planeta, ocorridas e registradas nos últimos 157 anos e tem também buscado identificar variações de temperatura em períodos mais remotos, por meio de novos métodos de pesquisa e análise, a exemplo do testemunho do gelo7, cuja 7 Um testemunho do gelo é uma amostra da acumulação de neve e gelo durante diversos anos que recristalizou e aprisionou bolhas de ar de vários períodos diferentes. A composição destes testemunhos, especialmente a presença de isótopos de hidrogênio e oxigênio, e também dos gases dióxido de carbono e metano, permite investigar as variações climáticas com o tempo (OLIVEIRA, 2008). 34 técnica permitiu retroceder o conhecimento da concentração de gases estufa e da temperatura do planeta em 800 mil anos (CRSN, 2008). A Figura 2 mostra a variação da temperatura do planeta a partir de 1850, condizente com o aumento da atividade industrial e da queima de combustíveis fósseis. Figura 2 – Variação de Temperatura de 1850 a 2000 Fonte: IPCC (2007) Além disso, os anos mais quentes da série considerada foram os de 1998 e 2005 e onze dos doze anos mais quentes ocorreram entre 1995 e 2006, a indicar avanço do aquecimento nesse período. A ocorrência de mais dias excepcionalmente quentes e menos dias excepcionalmente frios se tornou comum e as ondas de calor aumentaram em duração e freqüência na segunda metade do século XX (IPCC, 2007). Em que pesem os pontos de divergência entre céticos e apocalípticos, as evidências do aquecimento global são visíveis. Observa-se a já mencionada concentração de gases de efeito estufa, a elevação da temperatura e do nível dos oceanos, o derretimento de gelo e neve em larga escala, as alterações nos padrões dos ventos e das chuvas e o comprometimento de parte das espécies vegetais e animais do planeta (IPCC, 2007). Assim, as controvérsias entre as duas correntes se restringem, basicamente, à amplitude das causas do aquecimento, cujas inferências céticas não devem prevalecer sobre o trabalho do IPCC, seus modelos e projeções de risco e propostas para solução. A questão é crucial e duas alternativas se apresentam para escolha. A primeira, exortada pelo IPCC, recomenda mudança comportamental positiva com 35 adoção de melhores práticas humanas e melhores processos produtivos, em benefício do planeta e dos ecossistemas que nos mantém a vida. A segunda, embandeirada pelos céticos e embasada em foco contestador subjetivo das posições antropogênicas, reduz a escala de importância da contribuição humana para o problema e, em favorecimento indireto à estrutura econômica e de poder predominante no mundo, negligencia riscos prováveis e apregoa uma improvável ausência de riscos, no intuito da manutenção do status quo e da continuidade dos atuais comportamentos humanos e dos processos produtivos, ainda que nocivos ao planeta. Apesar dessa dualidade interpretativa, entre a calmaria e a catástrofe, a visão antropogênica encontra-se melhor estruturada, pois advém de uma forte comunidade epistêmica, o IPCC, respaldada na ONU, com seus relatórios, consolidados sob o crivo de todos os países membros, tornando-se peças científicas com arestas diplomáticas minimizadas, prestando-se, assim, a embasar propostas de ações emanadas de conferências, fóruns e documentos sobre o tema. Ao elaborarem e administrarem informações, os estudiosos do IPCC aconselham os Estados sobre a relação causal entre a concentração de gases estufa na atmosfera e a elevação da temperatura. Dessa forma, exercem significativa influência no processo de configuração das agendas dos governos, contribuem para a criação de instituições condutoras do comportamento do Estado, bem como para a formação de regimes internacionais sobre o tema, com vistas a reduzir os problemas da ação coletiva no contexto do aquecimento global. Portanto, a aparente tranqüilidade dos céticos não deve embasar suposições de que o problema seja menor, pois é preferível a adoção responsável do pior cenário, conforme preconizado pelos apocalípticos, na busca da reversão do aquecimento global, do que dar tratamento ao problema com base em um cenário ameno, conforme posição cética, cuja não confirmação poderá resultar nas catástrofes prováveis. A adoção das ações propostas pelo IPCC implicaria melhora na qualidade de vida no planeta e preservação do remanescente do meio ambiente natural e humano ainda não afetado pelo aquecimento global. As medidas viabilizadoras da contenção do problema proporcionariam as condições necessárias para a continuidade do desenvolvimento da civilização humana e acarretariam aspectos positivos inegáveis tanto para apocalípticos quanto para céticos. 36 O resultado da ausência de iniciativas pode ser apresentado em dois caminhos possíveis. O primeiro, na visão cética, com o retorno natural dos fenômenos à esfera da normalidade, sem necessidade de eliminar as prováveis causas antropogênicas. O segundo, na visão apocalíptica, apresentaria como conseqüência, profundas transformações climáticas em níveis comprometedores às condições de manutenção da vida na Terra, com imprevisibilidade quanto à reversão do desequilíbrio climático. A alternativa apocalíptica acarretaria elevados custos financeiros, de difícil assimilação por parte das corporações e da estrutura capitalista. Em que pesem esses custos, todos os seus aspectos conseqüentes seriam positivos e livrariam o planeta dos prováveis riscos catastróficos de um engano cético. Por isso e pelo respaldo oficial da ONU, a visão do IPCC conta com maior aceitação internacional e apresenta-se mais confiável e mais responsável para com o planeta e as gerações futuras. Ao considerar toda a amplitude do problema do aquecimento global, verificase ser imperioso que as autoridades políticas e os detentores do conhecimento técnico-científico, apoiados e induzidos por um elevado grau de consciência coletiva, tenham o necessário discernimento e tomem as decisões acertadas na escolha entre o elevado custo das ações corretivas ou o risco de confirmação da visão do IPCC e suas graves conseqüências para a civilização. Foram necessários milhões de anos para o planeta atingir o equilíbrio climático adequado ao surgimento e manutenção da vida na sua superfície. Entretanto, em apenas algumas décadas, o comportamento humano transformou o meio ambiente natural e interferiu nesse equilíbrio em prol do progresso e do crescimento econômico. Resta saber quanto tempo a Terra levará para se recuperar dos danos provocados pelas ações humanas e retomar a força e a biodiversidade em todas as suas formas, cores e sons. 37 3.3 A ORIGEM – REVOLUÇÃO INDUSTRIAL, CAPITALISMO E MEIO AMBIENTE O advento da era industrial contribuiu significativamente para as alterações na composição da atmosfera, intensificadas a partir do fim do século XVIII com o aumento da concentração de gases de efeito estufa, produzidos pelas atividades humanas, dentre elas os processos industriais. Houve registros científicos de variações mais acentuadas e de tendência crescente da temperatura média do planeta nos últimos 157 anos. O início dessa tendência de aquecimento coincidiu com a difusão da Revolução Industrial pelo mundo (IPCC, 2007). A proliferação das indústrias transformou a realidade global e representou o embrião da consolidação e mundialização do Capitalismo como sistema sócioeconômico predominante. A partir do início do século XX, alterações importantes foram introduzidas nos processos produtivos, nas relações homem-natureza e nas relações homem-trabalho. Essas transformações, intimamente relacionadas ao modelo fordista8 de produção, criaram valores embasados na modernidade racionalista e tecnicista, a contribuir para o surgimento de uma sociedade de excessiva ordem, controlada e condicionada pelo sistema, na busca da eficiência gerada pela coletividade da produção em massa Souza (2008, p. 16) assinala que A Revolução Industrial, apesar da denominação que carrega, foi muito mais um fenômeno de natureza social do que técnico. O ritmo do desenvolvimento tecnológico provocou profundas mudanças nos costumes e hábitos de vida da população, fazendo crescer as cidades e os investimentos públicos em infra-estrutura básica de transportes, saúde, saneamento, esgotamento sanitário e energia. Como pontos centrais, registremos que a Revolução Industrial rompeu com o ritmo lento das mudanças e com as relações de proximidade e de vida coletiva da população. Descobrir, criar, inovar e produzir com eficiência, bem como acumular riquezas, são importantes elementos da prática capitalista, cujo projeto de modernidade e progresso é moldado a partir do crescimento econômico ilimitado e de um modelo desenvolvimentista ecologicamente depredador e socialmente 8 O fordismo, idealizado pelo empresário Henry Ford, é um modelo rígido de produção em massa e teve seu ápice no período posterior à Segunda Guerra Mundial. Teve como objetivo produzir com maior eficiência e menor custo (MAIA, 2002). Esse modelo entrou em declínio em 1970, com a desregulamentação do capitalismo, e cedeu lugar ao pós-fordismo (HAESBAERT, 2001). 38 perverso (SANTOS, 2006). O fordismo e o pós-fordismo9 nasceram desse modelo e impuseram às sociedades industriais ritmos alucinantes em prol da lógica da produção em massa, do crescimento e da maximização do lucro. Nessa nova lógica de produção e industrialização, o homem é visto como um ser racional e, por isso, a natureza deve ser ordenada (civilizada) pela razão humana. De acordo com Boff (2000, p. 3), a natureza era percebida como objeto e lugar da ação livre do ser humano. Em face dela não há que se alimentar respeito e veneração. Antes, pelo contrário, como dizia Francis Bacon, um dos pais fundadores do paradigma moderno, ela deve ser submetida à cama de Procusto. Deve ser torturada, à moda do inquisidor, até que entregue todos os seus segredos. Assim, há uma relação de causa e efeito entre a Revolução Industrial e o surgimento da crise ambiental e seu agravamento no século XXI. Com o avanço dos processos industriais o meio natural foi gradativamente substituído pelo meio urbano, quando não abandonado após depredação por iniciativas extrativistas desregradas. Rios foram canalizados, solos foram cobertos por asfalto, vegetações nativas foram devastadas. A crescente intervenção humana no meio natural acarretou crescimento desordenado dos aglomerados urbanos, com conseqüentes e graves problemas ao meio ambiente. O nível de poluição ascendeu com o acúmulo crescente do lixo, com o aumento do volume de esgotos e com a expressiva queima de combustíveis fósseis pelos meios de transporte. Em que pese o boom Industrial ter contribuído para o desencadeamento de uma série de problemas, principalmente sociais e ambientais, são inegáveis os benefícios proporcionados pelas criações tecnológicas. A partir da mudança estrutural acelerada e da sensível melhora na eficiência acarretada pelo aperfeiçoamento dos processos produtivos, surgiram marcantes paradoxos, produzidos pela Revolução Industrial e, conseqüentemente, incorporados pelo Capitalismo, tais como mais criação e mais destruição, integração e fragmentação, inclusão e exclusão, eficiência e desigualdade (LUTWAK, 2001). Avanços nos processos industriais conduziram a civilização a um progresso técnico e científico nunca imaginado, bem como consolidou o Capitalismo como o 9 No pós fordismo são criadas estratégias de flexibilização do circuito produtivo, por meio da difusão de subcontratações, de empregos temporários e de terceirização. Essa prática enfraquece o movimento trabalhista e incorpora inovações tecnológicas transformadoras dos processos produtivos (HAESBAERT, 2001). 39 sistema mais adequado à continuidade das criações inovadoras de uma humanidade em busca constante de evolução. Nesse contexto, o modelo capitalista torna-se uma necessidade fundamental da civilização, principalmente pelos progressos científicos e tecnológicos proporcionados. Como exemplos de avanços tecnológicos incorporados de forma definitiva ao dia-a-dia das pessoas e associados a setores essenciais, têm-se: a) Transportes: automóvel, navio, trem, metrô, etc, essenciais para proporcionar o dinamismo e a mobilidade de pessoas, bens e serviços. É fator fundamental para as relações internacionais de comércio e para o processo de globalização; b) Saúde: os progressos nessa área proporcionaram aumento na expectativa de vida do homem. Equipamentos de alta tecnologia favorecem a realização de exames mais precisos e a descoberta das causas de inúmeras doenças. c) Segurança: Equipamentos de comunicação, câmeras de monitoramento, armamento moderno e processos informatizados são algumas das inovações utilizadas na segurança pública. d) Educação: o surgimento do ciberespaço possibilitou a criação de novos métodos de ensino, como a educação à distância, de crescente utilização em cursos de graduação. O aperfeiçoamento dos equipamentos audiovisuais e a utilização de critérios técnicos na adequação da infra-estrutura aprimoraram o ensino e a internet inovou as formas de realização de pesquisas. Em que pesem os inúmeros benefícios proporcionados pela Revolução Industrial, os impactos dessa nova era sobre o meio natural são graves. Ações humanas comprometedoras da estabilidade climática e inadequadas à preservação do meio ambiente são impulsionadas pelo modelo produtivista induzido pelo Capitalismo. Assim, há a necessidade de importantes mudanças para conciliar as práticas perversas do sistema capitalista ao meio natural10. 10 Conciliar as práticas perversas do capitalismo à preservação ambiental é o grande desafio ao qual a humanidade está exposta. A proposta do presente estudo é que essa conciliação aconteça por meio de ações estatais acertadas, de forma a induzir o capitalismo a uma nova fase, mediante regulamentações e regras específicas. Esse assunto será abordado detalhadamente na próxima seção desse trabalho. 40 3.4 INTENSIFICAÇÃO DA CRISE AMBIENTAL E PROJEÇÕES CLIMÁTICAS PARA O SÉCULO XXI Desde a realização da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento – Rio 92, da qual se originou o principal Regime Internacional de Mudança do Clima, observa-se significativas evidências de acentuado agravamento da crise ambiental e não as mitigações propostas naquela conferência. Segundo relatório produzido pela fundação OXFAM (2007), os desastres ambientais praticamente quadruplicaram nas duas últimas décadas. Essa elevação em quase 400% é atribuída ao aumento da imprevisibilidade das condições meteorológicas devido ao aquecimento global. A análise do período compreendido entre a década de 1980 e os dias atuais indica aumento médio nas catástrofes naturais, em quantidade, de 120 para mais de 500 por ano, com o conseqüente aumento em cerca de 68% no número de pessoas afetadas, cuja quantidade de 174 milhões entre 1985 e 1994, passou para 254 milhões entre 1995 e 2004. Segundo o IPCC (2007), como resultado dos desequilíbrios no meio ambiente natural e humano, por causas antropogênicas, observou-se, freqüentemente, nos últimos anos, secas mais prolongadas e intensas, ondas de calor e tempestades mais freqüentes, derretimento das geleiras em larga escala, elevação do nível do mar, extinção e migração de espécies, escassez de água, dentre outras conseqüências adversas. Ainda, a temperatura dos oceanos tem aumentado como resultado tanto da absorção de parte do calor acrescido ao sistema climático, quanto do derretimento das geleiras e da neve das montanhas. Tal aquecimento resultou na elevação do nível dos mares e oceanos, cuja taxa média foi de 1,8 mm por ano no período entre 1961 e 2003. No período mais recente, de 1993 a 2003 essa taxa foi de 3.1 mm por ano. A Figura 3 demonstra a evolução da elevação do nível do mar e a intensificação do derretimento das geleiras, condizentes com o processo de aquecimento global. 41 Figura 3 - Mudanças na Temperatura, no Nível do Mar e na Cobertura de Neve do Hemisfério Norte Fonte: IPCC(2007) O primeiro furacão brasileiro, no litoral de Santa Catarina, em 2004, e o conjunto de desastres ambientais ocorridos em 2005, tais como a intensa seca na Amazônia, o poder destrutivo do furacão Katrina que arrasou Nova Orleans, nos Estados Unidos, e a intensa onda de calor na Europa, são fatos concretos a fortalecer as projeções de conseqüências do IPCC, decorrentes do aquecimento global. O IPCC (2007) destacou evidências de aumento na intensidade da atividade dos ciclones tropicais no Atlântico norte, desde 1970. A intensificação desse fenômeno está relacionada com o aumento da temperatura da superfície do mar tropical. A Figura 4 mostra um cenário de seis grandes tempestades simultâneas, dentre elas os furacões Hanna, Ike e Josephine, fotografado por satélite geoestacionário11 no dia 5 de setembro de 2008 no Atlântico Norte. 11 Os satélites geoestacionários são satélites que se encontram parados relativamente a um ponto fixo sobre a Terra, geralmente sobre a linha do equador (OLIVEIRA, 2008). 42 Figura 4 – Tempestades no Atlântico Norte Fonte: NOAA (2008) A elevação da temperatura média da superfície da Terra em 0,7°C no século XX já provocou acontecimentos preocupantes e de significativos impactos para os ecossistemas e todos os seres vivos do planeta, inclusive o homem. Nos últimos 50 anos, inúmeras mudanças têm sido observadas em continentes, regiões e oceanos. Alterações na temperatura do gelo do Ártico, na quantidade de precipitação em todo o globo, na salinidade e acidez dos oceanos e nos padrões dos ventos. Observam-se, também, inúmeras espécies, animais e vegetais, em risco de extinção, além de outras já extintas. Outro fator preocupante é a acentuada degradação da principal cadeia de corais do bioma marinho, na Austrália, evidenciada pelo seu branqueamento. Importa observar a fragilidade dos corais, sujeitos à completa extinção caso a elevação da temperatura ultrapasse 3°C. A Figura 5 indica os principais impactos prováveis nos ecossistemas, como resultado do aquecimento global. Figura 5 – Principais Impactos com o Função do Aumento da Temperatura Global Média Fonte: IPCC (2007) 43 Além disso, observou-se elevação da temperatura do Ártico em quase o dobro da taxa média global nos últimos 100 anos. As temperaturas nas camadas permanentemente congeladas dessa região polar têm sofrido consideráveis elevações desde a década de 1980 (em até 3°C) e a área total coberta pelo congelamento sazonal do solo diminuiu em cerca de 7% no hemisfério norte desde 1900. Informações paleoclimáticas12 sustentam a interpretação de que o aquecimento da última metade do século passado foi atípico e fugiu ao padrão de variação de temperatura dos últimos 1300 anos. Além disso, o último registro de temperatura superior à atual, na região polar, foi em um período extenso, cerca de 125.000 anos atrás, com aumento conseqüente de 4 a 6 metros no nível do mar (IPCC, 2007). Os cientistas do IPCC ressaltam a grande probabilidade da concentração de gases estufa antropogênicos na atmosfera estarem diretamente relacionados aos aumentos das temperaturas médias globais observadas desde a metade do século 20. As alterações repentinas e cada vez mais freqüentes no sistema climático do mundo podem determinar o advento ponto crítico do problema, haja vista mudanças mínimas de temperaturas poderem alavancar colapsos em inúmeros ecossistemas. As projeções indicam um cenário devastador para os principais impactos do aquecimento global no meio ambiente e na economia, caso não surjam iniciativas concretas e imediatas para reverter o aumento da temperatura do planeta. Estudos científicos apontam a probabilidade de os eventos climáticos extremos já citados se tornarem cada vez mais freqüentes. Prevêem, ainda, o derretimento do Pólo Norte até 2100, com projeção de aumento de 59 centímetros no nível dos oceanos. Também, como conseqüência do aquecimento global, as populações da Índia e da China poderão estar submetidas a situações críticas, provocadas pelo declínio na produção de alimentos e pela fome. Migração e extinção de espécies serão comuns e os mananciais de água doce, fonte de abastecimento de água potável, já em risco, 12 A Paleoclimatologia realiza reconstrução do clima do passado, utilizando dados instrumentais e de indicadores indiretos (OLIVEIRA, 2008). 44 poderão ficar cada vez mais comprometidos e insuficientes para o suprimento às populações (IPCC, 2007). No Brasil, há previsão de impactos significativos na Amazônia, no semiárido nordestino e nas regiões litorâneas. Na região Amazônica, as pessoas podem ser afetadas por temperaturas mais altas e por secas intensas, a exemplo da ocorrida em 2005. Também há grande risco de transformação da floresta em uma vegetação muito mais aberta, semelhante ao cerrado. No nordeste do país, as temperaturas deverão subir ainda mais e transformarão o clima semi-árido em árido, com comprometimento da recarga dos lençóis freáticos. No sudeste haverá, muito provavelmente, aumento da precipitação com impacto direto na agricultura, além da intensificação de inundações e deslizamentos de terras. Todos esses prováveis eventos poderão prejudicar o desenvolvimento econômico e social das nações, especialmente as em desenvolvimento, cuja infra-estrutura precária não proporciona as condições de adaptação requeridas pelo problema. Por isso, as projeções científicas prevêem maiores impactos negativos nesses países, cuja contribuição nas emissões de gases de efeito estufa, em muitos casos, é ínfima. Para evitar alterações climáticas perigosas o PNUD (2008) projeta a necessidade de redução na emissão de gases estufa, até o ano 2050, em pelo menos 80% para os países ricos, com meta parcial de 30% em 2020, e em 20% para os países em vias de desenvolvimento. Certamente, alguns impactos das mudanças climáticas são inevitáveis, mas a civilização não deve medir esforços na busca pelos melhores meios para minimizar a crise ambiental, potencializada pelo aquecimento global, e viabilizar as adaptações necessárias para transformar a relação homemnatureza e conciliar a preservação ambiental desenvolvimento requerido pelo Capitalismo moderno. com o modelo de 45 4 O PAPEL DO ESTADO NO MUNDO CAPITALISTA GLOBALIZADO – NECESSIDADE DE AJUSTES 4.1 A REDUÇÃO DO ESTADO E A EXPANSÃO DO CAPITALISMO Analisar a evolução e a dinâmica de funcionamento do Capitalismo no mundo globalizado, contraposta ao papel do Estado, é fundamental para compreender sua relação causal com a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera e o aquecimento global. Nesse sentido, o presente estudo aborda nesta seção a importante mudança ocorrida na relação entre Estado e Capitalismo ao longo das últimas décadas. Do período pós Segunda Guerra Mundial até o final da década de 1970 o Estado atuava como mediador entre as necessidades das populações e o Capitalismo, por meio de mecanismos viabilizadores de ajustes às distorções causadas pelo funcionamento do mercado (MATIAS, 2005). O Estado detinha escala de poder suficiente para promover intervenções conciliatórias entre interesses econômicos e sociais. Para o entendimento da perda do poder do Estado é importante observar o paralelismo entre a sua evolução e a do Capitalismo, com elevado grau de interdependência, inclusive quanto ao compartilhamento do exercício do poder, por terem espaços de atuação coincidentes, com a abrangência global do mercado em superposição a atuação local do Estado. Nesse rastro evolutivo, a força do liberalismo econômico com a onda de privatizações e a desregulamentação dos mercados criaram um “antiestatismo” (MATIAS, 2005). O caráter expansionista do Capitalismo produziu uma ideologia na qual o Estado passou a representar um “empecilho ao desenvolvimento econômico, com a alocação de recursos sendo mais eficaz quando deixada por conta dos mecanismos de mercado” (MATIAS, 2005, p. 147). Assim, a propagação do comércio internacional, resultado da expansão das empresas transnacionais, da liberalização das economias e da formação de blocos regionais de comércio impulsionou o fluxo de capitais pelo espaço mundial e estimulou a competição. Essa nova configuração do mercado, associada ao “antiestatismo” liberal, 46 reduziu as margens de atuação do Estado, por meio da sua retração em diversos setores, inclusive estratégicos, a exemplo do setor energético e o de telecomunicações. O Estado deixou de ser o único ator relevante do sistema internacional (MATIAS, 2005; SCHIRM, 1999). Quanto aos efeitos dos mercados globais e sua influência sobre o poder do Estado, afirma Schirm (1999, p. 6): Em primeiro lugar, é provável uma crise da política econômica intervencionista orientada internamente, pois esta não está voltada para as expectativas e mecanismos da atividade econômica global que se tornaram mais relevantes. Além disso, o intervencionismo baseia-se na capacidade do Estado de controlar a economia nacional – uma capacidade que pode diminuir com a desnacionalização da economia. Em segundo lugar, é provável uma mudança dos interesses de grupos relevantes na política interna, pois a crescente inserção de setores da economia nos mercados globais enfraquece sua orientação pelo espaço interno nacional e fortalece um direcionamento em função das exigências competitivas da economia transnacional. Nessa perspectiva, o Estado passa a ser percebido, conforme destacam Matias (2005) e Pio (2002), como um mero instrumento de poder, influenciado e pressionado por indivíduos e grupos sociais, políticos e econômicos, na busca pela satisfação de interesses particulares. Com essa visão, Matias (2005, p. 154-155) afirma que Tais fenômenos têm conseqüências sobre o poder estatal. Os acordos de livre comércio podem limitar a autonomia dos Estados. As transnacionais surgem como um novo poder, minando a efetividade do poder estatal. E a globalização financeira tem por contrapartida o aumento na volatilidade do capital, que causa crescente instabilidade. O medo de afastar o capital obriga os governos a satisfazer as demandas daqueles que o detêm, em detrimento de outras considerações. Essa constatação leva parte da doutrina a crer que os Estados se teriam tornado reféns das grandes empresas e a defender que a globalização em curso é comandada por e realiza-se no interesse das corporações e conglomerados transnacionais. Dessa forma, o Estado teve seu papel de promotor das garantias sociais comprometido e suas ações foram limitadas, devido à incapacidade de resistir às pressões dos grupos detentores de poder, os quais forçam os decisores públicos a promover maior abertura em seus mercados. Assim, o processo de globalização e a expansão do Capitalismo, reestruturado sob um arcabouço de desregulamentação, acarretaram alterações importantes no mundo contemporâneo. Essa nova dinâmica global transformou a geografia do espaço mundial, sob o predomínio da lógica do livre mercado e conseqüências globais indesejáveis, sociais e ambientais, passaram 47 a exigir, cada vez mais, aprofundamento na compreensão do papel do Estado nacional e suas fronteiras, nos moldes do Capitalismo e do modelo pós-fordista de produção, que, para Haesbaert (2001, p. 18), debilitaram a organização dos trabalhadores via incremento dos empregos temporários e da terceirização (com a difusão dos sistemas de subcontratação, por exemplo). Dentro dessa mesma lógica de maior fluidez do capital e do incremento do lucro e da especulação aumenta brutalmente a destruição do meio ambiente e surgem problemáticas também efetivamente, como o efeito estufa, a destruição da camada de ozônio e o fenômeno das chuvas ácidas, além da rápida difusão de velhas e novas epidemias como o cólera e a AIDS. Além disso, dentro da lógica capitalista, os avanços tecnológicos proporcionaram o surgimento de grandes redes e a interconexão dos mercados mundiais para além das fronteiras políticas, intensificaram relações bilaterais entre as diversas nações do globo, bem como viabilizaram a consolidação de blocos econômicos para blindar e desenvolver os interesses comuns de seus grupos de países (HAESBAERT, 2001). Assim, observou-se crescimento da interdependência entre os Estados e a disseminação dos processos de cooperação internacional, cuja associação com fatores como a pobreza e as diferenças culturais evidenciam a complexidade dessa nova modelagem sistêmica. A essência desse sistema está na busca por acumulação de riquezas, com sua conseqüente concentração, e seu objetivo principal é criar mecanismos para viabilizar a obtenção de maiores lucros com o menor custo. Para Santos (2006), a forma como o Capitalismo vem se estruturando transforma a globalização em perversidade, proveniente da concentração da riqueza e do aumento da pobreza, da segmentação dos mercados e da degradação ambiental. O paradigma da modernidade surge juntamente com a separação do homem da natureza, na medida em que a busca pelo progresso ascendeu a interferência humana no meio natural (BOFF, 2000). Daí provém a vinculação entre a estrutura econômica do Capitalismo e a destruição do meio ambiente, associada ao novo estilo de vida e comportamento de consumo da sociedade moderna, impulsionado pelos avanços tecnológicos e pela formação de centros urbanos. 48 A proliferação das atividades fabris e a rápida urbanização, por exemplo, levaram ao aumento da concentração do lixo como decorrência do descarte de resíduos sólidos por parte de pessoas e organizações, bem como evidenciaram o desperdício, visto por Giacomini Filho (2008) como sinal do consumo intransitivo, arraigado a novos valores sociais, moldados, segundo Haesbaert (2001), pelo fetichismo da mercadoria e pela mercantilização da vida humana. Em suma, a dinâmica atual do Capitalismo globalizado, motivadora de comportamentos e práticas inadequadas à manutenção do equilíbrio climático, bem como de padrões insustentáveis de vida das populações capitalistas, associada à redução do poder público, conforme já abordado neste capítulo, tornou o Estado extremamente permeável frente ao controle e dominação do mundo pelo fundamentalismo de mercado e pelas empresas transnacionais (MATIAS, 2005). Esse cenário constitui a base da complexidade do contexto no qual o problema do aquecimento global e a busca por mitigações estão inseridos. 4.2 PRÁTICAS ANTROPOGÊNICAS INDUTORAS DO AQUECIMENTO GLOBAL O modelo de crescimento e desenvolvimento atual, baseado na exploração e extração de recursos naturais para expandir a lógica industrial capitalista impulsionou práticas comprometedoras do equilíbrio climático do planeta. A elevação acentuada da concentração de gases de efeito estufa, como resultado das atividades humanas, principal causa do aumento da temperatura global, teve início na Revolução Industrial (IPCC, 2007). O progresso técnico e científico produziu um novo modelo civilizatório e introduziu novos valores e princípios na sociedade. As pessoas, em busca de oportunidades, migraram do campo para as cidades e intensificaram a formação de grandes aglomerados urbanos. A euforia produzida pelas criações e inovações fez surgir novas necessidades e 49 impulsionou as atividades fabris sob um modelo de produção baseado na eficiência e na maximização do lucro. Assim, os aglomerados urbanos foram palcos fundamentais para efetivar a consolidação do Capitalismo, bem como para promover a absorção de novos valores sociais embasados no consumo exacerbado. A Revolução Industrial, com seu legado representado pela evolução tecnológica, pelo aperfeiçoamento dos processos e o conseqüente crescimento escalar da produção, foi o embrião da atual sociedade de consumo, intimamente associada à crescente interferência inadequada do homem no meio natural, em prol do paradigma da modernidade fundamentado na busca constante por progresso. Na fase inicial da industrialização, a ausência de limites na utilização de recursos naturais para sustentar as práticas industriais pode ser explicada pelo desconhecimento da gravidade dos impactos negativos da interferência humana no meio ambiente. A intervenção não era percebida na sua dimensão de risco sistêmico. Assim, o Capitalismo se estruturou em bases predatórias e criou um modelo de desenvolvimento insustentável à manutenção do equilíbrio dos ecossistemas e do meio natural. A devastação das florestas para proporcionar a expansão das atividades pecuárias e agrícolas desenvolvimento e, ao agro-industrial, mesmo tempo, acarretou oferecer mudanças suporte ao estruturais na estabilidade do meio ambiente. A biodiversidade foi comprometida levando quantidade significativa de espécies vegetais e animais a risco iminente de extinção e os padrões dos ventos e das chuvas foram diretamente afetados por desequilíbrios nos principais biomas13 do planeta (IPCC, 2007). O setor agroindustrial detém, portanto, importante parcela de responsabilidade pelo aquecimento global, decorrente principalmente da emissão de CO2 pela prática das queimadas e pela destruição das florestas. Outro setor importante é o energético, cuja matriz mundial tem como fonte principal a queima de combustíveis fósseis (Figura 6). 13 Bioma: conjunto de vida, vegetal e animal, especificado pelo agrupamento de tipos de vegetação e identificável em escala regional, com condições geográficas e de clima similares e uma história compartilhada de mudanças cujo resultado é uma diversidade biológica própria (EMBRAPA). 50 Figura 6 - Origem da energia elétrica consumida pela economia mundial em 2005 Fonte: Agência Internacional de Energia, 2007 Alguns países, a exemplo do Brasil, são favorecidos em suas condições de relevo e hidrografia, propícias à instalação de usinas hidrelétricas, cujos impactos ambientais decorrentes de inundações para formação de represas contam com o fator compensatório representado pela produção de energia limpa. Entretanto, com as recentes descobertas das mega reservas de petróleo na camada pré sal, a participação dos combustíveis fósseis na matriz energética brasileira tende a se elevar significativamente e aumentar a já expressiva parcela de responsabilidade pelo aquecimento global. Embora exista em abundância, o petróleo tem suas reservas concentradas em poucos países e o seu potencial para gerar valores significativos por meio de subprodutos como plásticos, tecidos sintéticos, acrílico, naftalina, além dos combustíveis utilizados em larga escala no mundo todo, transformou esse recurso em um verdadeiro ouro negro, a ponto de ser utilizado como objeto de barganha na busca de poder político pelos países detentores dessa riqueza. O surgimento de novos atores globais e a intensificação da produção de bens de capital e de consumo, além de avanços nas relações de comércio e no setor de serviços, proporcionados pela evolução nas telecomunicações e nos processos de logística, transformou o sistema internacional e contribuiu para modificar comportamentos sociais, a partir de então pautados em um consumismo agravado pelo desperdício e pela inconseqüência. Para compreender melhor essas mudanças, importa analisar a função das corporações no mundo moderno, bem como sua relação e influência sobre 51 o poder estatal e os reflexos de sua atuação sobre o meio ambiente natural e humano, na medida em que representam o motor dinâmico do Capitalismo, principal fator indutor das práticas inadequadas à preservação ambiental. Originárias da Revolução Industrial, as corporações eram, inicialmente, licenciadas pelo Estado para o exercício de tarefas específicas, com o objetivo de servir ao bem público (THE CORPORATION, 2004). Sua evolução marcou a transição de um modo de vida centrado em atividades estáveis, na agricultura e no comércio, para outro centrado na velocidade das descobertas mecânicas e no emprego de máquinas complexas em amplas instalações fabris, submetendo o campo à cidade (SOUZA, 2008). O avanço das atividades corporativas levou ao estabelecimento de limites de atuação, por meio da definição de regras estatais, para conciliar os interesses corporativos com os das populações. Contudo, a regulamentação emanada pelo Estado não era bem aceita pelos grupos empresariais, cuja atuação, a transcender as fronteiras de seus países, passava a requerer mais poder e liberdade de ação para garantir a satisfação de seus interesses, centrados na maximização do lucro, e, também, dos interesses dos detentores do seu capital (THE CORPORATION, 2004). Observou-se, então, a exclusão gradativa da promoção do bem estar social dos seus objetivos primordiais, com reflexos diretos na sustentabilidade sócio-ambiental. Como resultado dos esforços para aumentar poder, as corporações foram reconhecidas como pessoas jurídicas14, fato que contribuiu para minar a tutela estatal sobre suas ações e promover a transição do rígido controle legal para a ausência de controle público (desregulamentação). Assim, os Estados cederam espaços às corporações, as quais, por sua vez, se disseminaram e estabeleceram presença em todo o mundo (THE CORPORATION, 2004). Essa abrangência internacional potencializa sua capacidade produtiva, cujos benefícios para a sociedade, representados pela promoção do bem estar associado ao atendimento às necessidades de consumo, contrastam com sua 14 Em 1886, o condado de Santa Clara, nos EUA, enfrentou nos tribunais a Southern Pacific Railroad, poderosa companhia de estradas de ferro. No veredicto, o juiz responsável pelo caso declarou, em sua argumentação, que a corporação ré é um indivíduo que goza das premissas da 14ª Emenda da Constituição dos Estados Unidos, que proíbe ao Estado que este negue, a qualquer pessoa sob sua jurisdição, igual proteção perante a lei. Isso significa que, a partir daquele momento, era estabelecida uma jurisprudência através da qual, perante as leis norte-americanas, corporações poderiam considerarse indivíduos (SOARES, 2004). 52 capacidade destrutiva, representada por práticas produtivas nocivas ao planeta. Esse paradoxo se relaciona à adoção de comportamento pautado na maximização dos lucros e qualifica as corporações como verdadeiras máquinas externalizadoras15, resistentes a assumirem responsabilidades por danos políticos, sociais, ambientais ou culturais (THE CORPORATION, 2004). Para minimizar a imagem negativa associada às práticas ecologicamente insustentáveis, potencializada pelo crescente espaço dedicado pela mídia às questões ambientais e pelo recrudescimento das manifestações sociais coletivas motivadas pelo tema, as corporações têm adotado discurso e estratégia de marketing ecologicamente corretos. Porém, essa imagem de responsabilidade ambiental pode não refletir a realidade e ser conseqüência de imposição mercadológica, por exigência de diversos atores, dentre eles o consumidor consciente. Assim, com a possibilidade dessa visível consciência ambiental destinar-se a distorcer o absolutismo de verdades inconvenientes, é oportuno se testar a aparente realidade com o raciocínio simples e lógico demonstrado na Figura 7, a seguir: Figura 7 – Responsabilidade Ambiental Corporativa e Aquecimento Global Fonte: elaborado pela autora A figura apresenta uma situação de causa e efeito, na qual o aumento da responsabilidade ambiental (o que se diz) traria melhoras para a crise climática do planeta (o que se espera). Entretanto, a nítida piora dos aspectos ambientais (o que se vê), cujas perspectivas de reversão ainda não são visíveis, coloca em cheque a imagem positiva externada pelas corporações, pois a equação apresenta-se inconsistente e, para tornar-se verdadeira, expõe 15 Uma externalidade surge quando uma pessoa se dedica a uma ação que provoca impacto no bem- estar de um terceiro que não participa dessa ação, sem pagar nem receber nenhuma compensação por esse impacto (MANKIW, 2001). 53 uma realidade provável de ausência de comprometimento corporativo em relação ao tema. Segundo Sam Gibara, presidente da Goodyear, “o dano ao ambiente é uma função do próprio processo industrial”, por isso, não há como eliminar a emissão de gases de efeito estufa, por exemplo. A alternativa para reduzir o impacto dessa prática seria estabelecer limites para a emissão de gases estufa e criar permissões para que seja negociada (THE CORPORATION, 2004). Se, por um lado, as corporações, com sua capacidade extraordinária de descobrir, criar e inovar, estabeleceram, para si e perante a sociedade, um conceito de indispensável eficiência associada ao progresso e à qualidade de vida, por outro, promoveram a flexibilização dos processos produtivos, com impacto negativo direto no nível de emprego a oportunizar subcontratações e empregos temporários, sempre com vistas a viabilizar o aumento de seus lucros (HAESBAERT, 2001; MATIAS, 2005). Além disso, as atividades das corporações passaram a exercer impacto direto na saúde das populações, como resultado da degradação do meio ambiente, por meio da produção acentuada de lixo tóxico e detritos industriais, do aumento da poluição em suas várias formas, bem como da emissão de gases de efeito estufa, do extrativismo insustentável, do desperdício, da devastação das florestas e da criação, em larga escala, de novos produtos químicos, dentre outras práticas nocivas sob o ponto de vista ambiental. Tudo isso contribuiu para acarretar o declínio de todo o sistema de suporte à vida e, conseqüentemente, para desencadear a crise ambiental global e o conseqüente aquecimento. Nesse contexto, a própria fragilidade do poder estatal frente à significativa influência das corporações sobre a política e os políticos, dificulta o resgate do poder do Estado, considerado, neste estudo, fundamental para a reversão da crise climática e da elevação da temperatura do planeta. O inconformismo com a supremacia dos aspectos capitais sobre os sociais e ambientais já se fazia presente no século XVIII, em meio à Revolução Industrial, nas teorias e iniciativas dos chamados Socialistas Utópicos, dentre os quais se destacou Robert Owen (SOUZA, 2008). 54 Empresário bem sucedido, Owen recriminou as condições gerais de trabalho na época e desenvolveu, em suas empresas, ações de proteção sócio-ambientais abrangendo, conforme Souza (2008), as seguintes iniciativas: • Cooperação da classe privilegiada ao bem-estar da população; • filantropia e caridade; • controle do trabalho infantil (idade mínima); • urbanização; • atenção à saúde coletiva; • sistemas nacionais de emprego e de educação; • lazer e descanso semanal; • educação de jovens e adultos; • trabalho voluntário; • saúde preventiva; • fundo previdenciário; • fundo moradia; • desenvolvimento comunitário; e • política pública de combate à miséria e de proteção do trabalhador. Também, apresentou diagnóstico sobre as condições de vida e de trabalho da classe operária como subsídio à regulamentação e postulou sobre a importância da intervenção do Estado na economia. Posteriormente, no início do século XX, o modelo fordista de produção, embasado na produção em massa e na especialização operária, passou a ser alvo de preocupações pelas possíveis conseqüências para o futuro da civilização. Na década de 1930, em sua obra literária “Admirável Mundo Novo”, Aldous Huxley descreve, em alusão ao modelo fordista, uma sociedade cega, domesticada e condicionada pelo sistema estabelecido. Essa reflexão de Huxley (1932) mostra o homem como um mero produto, controlado rigidamente pelos donos do poder. Se na década de 1930 “Admirável Mundo Novo” era uma obra de ficção, para muitos sem fundamento, hoje se percebe interessante similaridade entre a ficção futurista do passado e a realidade da sociedade atual, com o Capitalismo globalizado e desregulamentado a impor processos produtivos, regras de comércio e a criar e fomentar a sociedade consumista. 55 Na lógica contemporânea da desregulamentação do Capitalismo, a intensa competitividade gerada pelo livre mercado acarreta diminuição dos preços e aumento na demanda por bens e serviços. Assim, as corporações precisam se diferenciar no mercado e, para isso, buscam conquistar a confiança dos clientes, de forma a tornar mais fácil conduzir a sociedade no rumo do consumismo, da filosofia da futilidade e transformar seus cidadãos em consumidores inconscientes, desarticulados, cuja concepção de si mesmos e o senso de valor estão diretamente relacionados à quantidade de desejos que conseguem satisfazer. A esse respeito e como exemplo cultural popular dessas preocupações, em paráfrase à obra de Huxley (1932), Zé Ramalho (1990), na letra de sua música Admirável Gado Novo, reforça o conceito de domínio do sistema sobre o indivíduo ao referir-se à “vida de gado, povo marcado, povo feliz”. Nesse admirável mundo artificializado os novos e inovadores produtos surgem no mercado com velocidade surpreendente e contribuem para despertar desejos nos indivíduos, cujas propensões a consumir crescem significativamente. Isso decorre da atuação das corporações em induzirem novas necessidades de consumo, por meio de marketings disfarçados, espécies de merchandising na vida real, impregnados de armadilhas moldadas por mensagens subliminares, as quais condicionam, manipulam e seduzem o consumidor constantemente (THE CORPORATION, 2004). Assim, as corporações criam uma sociedade de consumo, moldada pelo fetichismo da mercadoria e pela crescente mercantilização da vida humana, para a qual tudo é passível de ser comprado e vendido (HAESBAERT, 2001). Toda essa estratégia corporativa torna-se instrumento de dominação e impede a percepção coletiva da gravidade de uma série de problemas, dentre eles a degradação ambiental e sua conseqüência direta representada pelo aquecimento global. Manifestações populares com motivações ambientais têm contribuído para a necessária manutenção da publicidade sobre o assunto. Entretanto, longe de prenunciarem o surgimento de uma consciência coletiva sobre o tema, indicam, principalmente, comportamentos reativos a situações pontuais, insuficientes para influenciar e induzir as mudanças necessárias na relação de poder entre o Estado e a estrutura capitalista, imprescindíveis ao 56 realinhamento das práticas corporativas e dos processos produtivos, tudo isso sob a perspectiva de uma nova regulamentação para o Capitalismo. Esses são exemplos de comportamentos e práticas indutoras da exploração insustentável dos recursos naturais, na perspectiva capitalista de maior produção e acumulação de riqueza, caracterizada pela ausência de critérios para um manejo ecológico, cujos desdobramentos contribuem para o desequilíbrio climático, com reflexos diretos no aumento da concentração de CO2 na atmosfera e, conseqüentemente, na elevação da temperatura do planeta. 57 5 A MITIGAÇÃO DO AQUECIMENTO GLOBAL VIA COOPERAÇÃO INTERNACIONAL 5.1 O CAMINHO PARA A SOLUÇÃO – INICIATIVAS DE REVERSÃO No capítulo anterior constatou-se que a interferência humana no meio ambiente contribui de forma significativa para o aquecimento global e para a intensificação das catástrofes naturais. A gravidade da crise gerou preocupações, predominantes no meio científico, e motivou a busca de soluções para os problemas ambientais globais, comuns a toda a humanidade. Entretanto, a situação prevalecente impõe desequilíbrio de força entre os principais atores, refletido pela influência internacional do mercado global frente à abrangência local da atuação do Estado, situação inviabilizadora de iniciativas estatais isoladas e responsável por sérias dificuldades para o estabelecimento de entendimentos acerca de assuntos de interesse global, a exemplo do Protocolo de Quioto, com origem em 1997 e cujo ciclo, a se encerrar em 2012, já não permite mais a realização de seus propósitos, tendo em vista a negligência de alguns signatários de peso, dentre eles os Estados Unidos, com relação aos seus objetivos e metas. Esforços direcionados à reversão da crise ambiental, mediante regulamentações determinantes de uma nova relação de poder entre Capitalismo e Estado, por meio da qual um maior poder público permita o sucesso de ações estatais melhor direcionadas, esbarram no fato de o Capitalismo e os centros de acumulação de capital, muitas vezes, oferecerem resistência deliberada à ampliação do poder do Estado (ARRIGHI, 1996 apud MATIAS, 2005), cuja situação de fragilidade atual torna ainda mais complicado realizar a transferência de poder necessária do Capitalismo para os Estados, como propõe este estudo. Assim, na atual conjuntura de crise ambiental, a cooperação deverá conduzir a comunidade internacional no caminho de grandes mudanças para a mitigação do aquecimento global, as quais deverão redefinir como os Estados e os demais atores devem compartilhar poder. Nesse contexto, vale recordar o 58 caráter anárquico do sistema internacional, em que Estados e outros atores, mesmo dentro da anarquia, buscam a cooperação como forma de ajustar interesses e viabilizar resolução de conflitos nas mais diversas áreas das relações internacionais. Diante da gravidade do problema e da falta de entendimento para a busca de solução, emerge a necessidade urgente de se estabelecer ações conjuntas entre os diversos atores do globo, facilitadoras da realização deste interesse comum: a manutenção do equilíbrio climático do planeta Terra para o não comprometimento da vida, em todas as suas formas. Para tanto, a comunidade internacional deve direcionar esforços rumo a um processo de coordenação política para evitar as ameaças sem precedentes, originadas nas alterações climáticas, mediante exercício coletivo, via cooperação internacional (PNUD, 2008). O reconhecimento da necessidade da coordenação política no processo é resultado da constatação da existência de comunidades humanas ecologicamente interdependentes, cuja convergência para a solução do problema requer, necessariamente, o caminho da cooperação. Se a crescente interdependência econômica torna essenciais ajustes mútuos de políticas de governos (cooperação internacional), tendo em vista interesses compartilhados criarem demanda significativa por instituições internacionais e regras, a interdependência ecológica não deve ser diferente, pois “as alterações climáticas, recordam-nos vivamente aquilo que todos nós temos em comum: chama-se planeta Terra. Todas as nações e todos os povos partilham a mesma atmosfera” (PNUD, 2008, p. 2). Importa, portanto, agora, examinar as condições sob as quais esse interesse conduzirá os Estados a situações de cooperação. A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo no ano de 1972, deflagrou um conjunto de iniciativas destinadas a despertar a comunidade internacional e a humanidade para a ameaça representada pela crise ambiental identificada, cuja ausência de medidas ousadas para reverter o problema poderia acarretar sérios problemas sócio-ambientais, muitos deles potencialmente irreversíveis. O objetivo inicial da Conferência foi estabelecer critérios e princípios de preservação do meio 59 humano. (DECLARAÇÃO DE ESTOCOLMO SOBRE O AMBIENTE HUMANO, 1972). Em 1985, após a descoberta do buraco na camada de ozônio sobre a Antártida, realizou-se a Convenção de Viena sobre a Proteção da Camada de Ozônio. Em 1987, foi estabelecido o Protocolo de Montreal sobre substâncias que destroem a camada de ozônio. Nesse mesmo ano, criou-se a Comissão Mundial sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente (CMDMA) para discutir a necessidade de conciliar preservação ambiental e desenvolvimento econômico. Essa comissão produziu o Relatório “Nosso Futuro Comum”, conhecido, também, como Relatório Brundtland, do qual surgiu o conceito de desenvolvimento sustentável16. Na medida em que as discussões sobre a crise ambiental global se elevavam a patamares de relevância nos foros internacionais, tornava-se mais objetiva a constatação da gravidade dos riscos aos quais a humanidade estava exposta. Nesse contexto, a criação do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), em 1988, marcou o início do processo de análise e avaliação, com base científica, dos efeitos da mudança climática. Assim, Durante toda a década de 1990, o IPCC forneceu subsídios fundamentais para a condução das negociações internacionais e tem assumido papel de referência na formação da opinião pública sobre a questão da mudança do clima. (VIOLA, 2005, p. 189). Do IPCC nasceu o primeiro Regime Internacional de Mudança Climática, assentado na Convenção “Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima”, assinado em 1992 na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro. Os Estados ali representados pautaram suas discussões e negociações na busca de entendimento e convergência sobre as questões ambientais. Para tanto, se propuseram a trilhar de forma conjunta os melhores caminhos, com vistas a criar mecanismos viabilizadores da reversão do processo de aquecimento global. Em 1997, criou-se o Protocolo de Quioto, documento vinculado ao Regime e cujo objetivo foi estabelecer medidas de redução da emissão de 16 Desenvolvimento sustentável: atender as necessidades do presente sem comprometer as necessidades de gerações futuras. (NOSSO FUTURO COMUM, 1987). 60 gases de efeito estufa nos países desenvolvidos, em pelo menos 5,2% até 2012, em relação aos níveis de 1990 (PROTOCOLO DE QUIOTO, 1997). As metas tímidas do Regime e seu Protocolo não foram suficientes para agilizar os processos de negociação, haja vista a falta de iniciativa dos países quanto aos ajustes em suas políticas, na busca de um novo modelo de desenvolvimento e de novos padrões de conduta, adequados à preservação ambiental. O temor de um impacto negativo no modelo hegemônico capitalista e no padrão de vida material fez os países inclinarem-se em favor da manutenção do status quo. A não ratificação do acordo, por parte dos Estados Unidos, responsáveis por um quarto das emissões globais de gases estufa, contribuiu para gerar grandes incertezas quanto ao futuro do Protocolo de Quioto, haja vista sua eficácia para a mitigação do problema depender de consenso global e da mobilização de todos os atores que sustentam o modelo capitalista (Estados, grupos empresariais, organismos internacionais e não governamentais, mercado global e sociedade civil), em prol do comprometimento com metas rígidas de redução das emissões, do investimento em novas tecnologias e da busca por fontes de energia limpas e renováveis (VIOLA, 2002). Os processos de negociação sobre acordos e regimes internacionais continuam mergulhados em uma lentidão estrutural (RICUPERO, 2007). Por esse motivo Viola (2002, p. 28) assinala que O regime internacional de mudança climática não se restringe aos acordos estabelecidos na Convenção do Rio de Janeiro e no Protocolo de Kyoto, mas prevê também a necessidade de uma consciência pública favorável a estabilizar o clima e de um vetor tecnológico que favoreça o investimento em tecnologias não intensivas de carbono. Ainda, o PNUD (2008,p. 13) afirma que Em muitas áreas das relações internacionais, a inatividade ou os atrasos nos acordos têm custos limitados. O comércio internacional é um exemplo. Esta é uma área em que as negociações podem ser interrompidas e reiniciadas de novo, sem prejudicar o sistema subjacente a longo prazo como testemunhado pela infeliz história da Agenda de Desenvolvimento de Doha. No que se refere às alterações climáticas, por cada ano que demoramos a chegar a um consenso para reduzir as emissões estamos a aumentar os stocks de gases com efeito estufa, determinando uma mais elevada temperatura para o futuro. Por isso, diante das incertezas e dos riscos existentes, a sociedade não pode continuar a aceitar a complacência e a prevaricação, características das 61 negociações internacionais relativas ao clima (PNUD, 2008). “Ao mundo não faltam recursos financeiros nem capacidade tecnológica para agir. Se o mundo falhar na resolução do problema será devido à incapacidade de fomentar a vontade política de cooperar” (PNUD, 2008, p. 18). E essa vontade política começa com a opinião pública. Nesse ponto, interessa ressaltar que O regime de mudança climática exige sempre a presença de pelo menos um ator que impulsione o processo e que seja capaz de liderar e sustentar o regime. Pela sua importância na economia e no ambiente global e pela eficiência de sua governabilidade, apenas três países apresentam este potencial em primeira instância (Estados Unidos, União Européia e Japão). Países como a China, Índia, Rússia, Canadá, Indonésia e Brasil têm se relevado muito importantes em todo o processo de decisão, apesar de não constituírem um potencial de liderança (VIOLA, 2002, p. 30). Para compreender, então, o cenário internacional da mitigação do aquecimento global, interessa observar a Tabela 3, com informações comparativas dos principais países emissores de CO2, sobre população, produto interno bruto (PIB), PIB per capita, participação nas emissões globais e nas áreas florestais mundiais e desmatamento médio anual. País População Mundial (1999) PIB Mundial (por poder de compra em 1999) PIB per Capta (por poder de compra em 1999) Emissões Mundiais de Carbono (1999) Área Florestal Mundial (1995) Desmatamento Médio Anual (1990-1998) Estados Unidos 4,6% 21,3% US$ 29.200 24,5% 6% 0% União Européia 6,3% 20,5% US$ 24.000 14,5% 2% 0% China 21% 10,2% US$ 3.100 13,5% 4% 0,1% Japão 2,1% 8% US$ 23.600 6% 0,7% 0% Índia 16,5% 5,4% US$ 2.100 4,5% 2% 0,05% Brasil 2,8% 2,9% US$ 6.500 2,5% 16% 0,5% Rússia 2,4% 2,4% US$ 6.200 5% 22% 0,1% Canadá 0,5% 2,3% US$ 31.000 2,5% 5% 0% Indonésia 3,5% 1,3% US$ 2.400 1,5% 3% 1,1% Tabela 3 – Principais Países Emissores de CO2 Fonte: Viola (2005) 62 É interessante observar, a relação de proporcionalidade entre o crescimento econômico dos países considerados e suas respectivas emissões de CO2. A combinação dessas dimensões é fundamental para avaliar o peso da responsabilidade de cada um para a gravidade do aquecimento global, bem como para analisar os requisitos que garantem êxito nas iniciativas de reversão, com destaque para a formação de um regime internacional de mitigação, que supere a baixa eficácia e as significativas distorções do Protocolo de Quioto, previsto para entrar em vigor no ano de 2012 (VIOLA, 2008). As Figuras 8 e 9 mostram, a partir da distorção dos mapas, efeito visual interessante, representativo da relação direta entre o crescimento do PIB mundial (com projeção para 2015) e a elevação das emissões de CO2. Figura 8 – Mapa Representativo da Projeção de Crescimento Econômico Mundial para 2015 Fonte – ICONE (2007) 63 Figura 9 – Mapa Representativo da Emissão Mundial de Gases de Efeito Estufa Fonte – ICONE (2007) Os avanços e os entendimentos necessários requerem seriedade e clareza de objetivos de todos os envolvidos. Para tanto, a condução do assunto nos foros internacionais deverá produzir o comprometimento dos países em: • criar um modelo de desenvolvimento sustentável, em que todos os projetos de investimentos e os processos produtivos sejam condicionados a analise de impactos ambientais, por meio de critérios internacionalmente aceitos; • implementar medidas para minimizar as causas do problema e mitigar seus efeitos prejudiciais, tais como investimentos em uma matriz energética mais limpa e renovável; • desenvolver políticas públicas para evitar o desflorestamento e as queimadas; e 64 • desenvolver políticas sociais de conscientização ambiental para encorajar participação mais ampla e ativa da sociedade e do terceiro setor no enfrentamento do aquecimento global. Os princípios norteadores das ações dos países devem destinar-se a alcançar os objetivos do regime, pautados na estabilização da concentração de gases de efeito estufa na atmosfera a um nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático, de forma a permitir aos ecossistemas adaptarem-se naturalmente à mudança do clima, a assegurar a suficiência da produção de alimentos e a viabilizar o desenvolvimento econômico sustentável. Nesse sentido, as partes contratantes devem, conforme estabelecido no Regime Internacional de Mudança do Clima (1992): • proteger o sistema climático para benefício das gerações presentes e futuras, sob a liderança das nações desenvolvidas; • considerar e reconhecer as necessidades específicas e as circunstâncias especiais das partes constituídas por países em desenvolvimento, cujas dificuldades intrínsecas os tornam mais vulneráveis e, por isso, mais expostos aos riscos inerentes ao problema; • antecipar, evitar ou minimizar as causas das alterações climáticas; e • promover o crescimento e desenvolvimento sustentável por meio da cooperação internacional. Em que pesem os esforços científicos para oferecer diagnóstico mais objetivo, bem como a definição de princípios de conduta a serem assimilados pelos países e as sucessivas rodadas de negociação em torno do Protocolo de Quioto, observa-se, dezesseis anos depois da criação do Regime, agravamento acentuado das causas do problema, e não mitigações, a evidenciar ineficácia no cumprimento das ações propostas para sua reversão, situação representativa não mais de tendências ou cenários possíveis, mas de fatos em um palco de incertezas sobre o futuro da humanidade, no que se refere à sua condição de sobrevivência no planeta. O Regime Internacional de Mudança do Clima constitui, em tese, um sistema de normas, regras e procedimentos decisórios capaz de impor restrições à soberania estatal e deveria regular as relações entre os países 65 signatários, bem como viabilizar ajustes políticos mútuos em prol do interesse comum (VIOLA, 2002; VIOLA, 2005). Entretanto, fragilizado pela indiferença e inércia dos principais atores do processo, cujas conveniências em favor do Capitalismo de mercado superaram as preocupações com a saúde do planeta, funcionou de forma precária. Portanto, a reversão da crise ambiental só será possível com a participação de todos os setores da sociedade e com o comprometimento de todos os países em torno do cumprimento dos princípios, das normas e das ações estabelecidas nos acordos e regimes internacionais. Porém, a fragilidade do Estado frente ao poder do capital dificulta uma eficaz atuação do poder público para fazer face aos desafios que as mudanças climáticas impõem. A eficácia das iniciativas depende e necessita, então, de ações estatais acertadas, convergentes mundialmente e aderentes às melhores práticas de preservação ambiental. Para evitar mais um insucesso e a possibilidade de exaustão das alternativas de solução, tendo em vista o fator tempo, a eficácia das iniciativas passa, necessariamente, por um processo de inversão na relação de poder entre Estado e Capital, pois somente um Estado forte poderá produzir uma adequada regulamentação, determinante para uma nova fase do Capitalismo, na qual as práticas produtivas se mantenham em bases sustentáveis e favoreçam o restabelecimento do equilíbrio climático do planeta. 5.1.1 A Fundamental Consciência Coletiva A orientação capitalista produz comportamentos e processos produtivos incompatíveis com a preservação da natureza. A auto-regulação do mercado, associada à perda da autonomia do Estado, bem como ao surgimento de uma sociedade de consumo controlada e condicionada pelos donos do poder (meios de comunicação em massa, corporações) moldou um mundo puramente mercadológico e desprovido de sensibilidade, respeito e sintonia para com a natureza, determinante de práticas responsáveis pelo desequilíbrio climático do planeta. Isso gera situação de risco iminente de fenômenos climáticos 66 catastróficos, resultado do processo de aquecimento global e seus efeitos adversos, a evidenciar a imperatividade da realização de grandes mudanças para reverter o problema. As transformações e adaptações necessárias recomendam a formação de um novo modelo civilizatório, com o resgate do poder do Estado, juntamente com a quebra do paradigma capitalista, por meio de um arcabouço regulamentar calibrado para esse fim, pois, se sob um arcabouço de desregulamentação o Capitalismo não conseguiu conciliar a sua ânsia por expansão à utilização sustentável dos recursos naturais do planeta, torna-se necessária a retomada do caminho inverso, como alternativa básica de solução. O exercício da autoridade do Estado nessa nova proporcionalidade de compartilhamento do poder requererá o desenvolvimento de uma estrutura multilateral forte para abrigar o futuro regime internacional de mudança do clima e para proporcionar o estabelecimento de políticas públicas eficazes, comuns a todos os seus signatários, para fazer face aos desafios climáticos. Certamente essa regulamentação não se dará espontaneamente. O foco do Capitalismo no ganho e acumulação de riqueza gera uma insensibilidade às questões climáticas. Assim, vislumbra-se um processo de mudança induzido por riscos representados pelo agravamento de eventos catastróficos. Corrigir as imperfeições do Capitalismo e buscar alternativas conciliatórias entre desenvolvimento e sustentabilidade é vital para tentar reverter o processo de aquecimento global, assim como para lidar com as conseqüentes ameaças para o planeta. Nesse sentido, o Estado, única entidade capaz de alterar a lógica de auto-regulação do mercado e de estabelecer regras restritivas às práticas humanas perversas em favor do Capitalismo de mercado, surge como ator fundamental, tornando-se imprescindível o resgate do seu poder. Esse resgate de poder representa a reversão de um processo em que o próprio Estado foi o promotor da expansão do capital, na medida em que optou por transferir seu poder para o mercado e para os atores transnacionais. Nesse sentido, Strange (1996 apud MATIAS, 2005, p. 148) afirma que A mudança da autoridade do Estado para a autoridade do mercado resultou em grande parte de políticas estatais. Não é que as transnacionais tenham roubado ou furtado dos governos estatais o 67 poder. Este lhes foi dado de bandeja e, além do mais, por razões de Estado. Por isso, ações estatais objetivas e bem orientadas também não serão espontâneas. A intervenção dos Estados no mercado geralmente vem acompanhada de uma situação de crise, a exemplo da atual crise financeira mundial, cuja solução depende de medidas e ações estatais para evitar maiores impactos nos países e seus mercados. A busca de solução para a crise financeira tem sinalizado algumas mudanças rumo a uma carga regulamentar para o mercado, mediante restrições de atuação e a instituição de melhores mecanismos de fiscalização, cujas perspectivas já fazem parte dos discursos das principais lideranças mundiais e representam a quebra do paradigma capitalista da desregulamentação e do livre mercado. Assim, essa quebra de paradigma, possível apenas em situação de crise indutora de graves impactos diretos ao Capitalismo, pode favorecer o avanço da nova regulamentação para os aspectos ambientais, não menos importantes, porém, menos sensíveis ao senso capitalista da acumulação de riquezas. Nesse contexto, em entrevista concedida a Globo News, a economista Clarisse Messer chama a atenção para a necessidade de um esforço conjunto da comunidade internacional na busca de mecanismos acertivos para solucionar o problema. Para ela a civilização precisa ser conduzida sob novos caminhos e os Estados, ao limitarem a expansão, até então ilimitada do Capitalismo, devem buscar uma taxa de crescimento que não interfira na saúde do planeta, considerando a questão ambiental, nem na saúde e no equilíbrio financeiro do mundo. Há uma diferença importante entre a recessão econômica mundial e a crise ambiental. A primeira reflete diretamente no coração do Capitalismo: o mercado financeiro. Por esse motivo, os Estados se mobilizam e interferem, objetivamente, para reverter a crise, garantir a estabilidade do capital e, assim, evitar conseqüências maiores nos países e seus mercados. A segunda, embora comprometa o equilíbrio do sistema climático do planeta, a princípio, favorece as pretensões capitalistas de geração de riqueza e maximização do lucro, enquanto a adoção das medidas necessárias para equacionar a crise impacta inversamente a dinâmica de funcionamento desse sistema. 68 Por isso, a atuação fortalecida dos Estados para reverter a crise ambiental não virá da vontade política, mas dependerá de um clamor popular para que o tema entre na pauta das discussões das agendas públicas e dos foros internacionais com mais seriedade e objetividade. A constatação da gravidade dos efeitos do aquecimento global, bem como a ausência de resultados positivos suficientes para frear sua evolução, acarretou a popularização dos assuntos ambientais, disseminados em todos os campos de conhecimento e em todas as esferas da sociedade. A intensificação de fenômenos naturais atípicos, a exemplo da seca na Amazônia, maior floresta tropical do mundo, do gradativo branqueamento dos bancos de corais da Austrália, e dos alertas de documentos oficiais quanto aos riscos das mudanças climáticas para o desenvolvimento humano e, até, para a manutenção da vida no planeta, gera inquietações nas populações, temerosas em relação aos impactos dessa grande tragédia humana em curso (IPCC, 2007; PNUD, 2008). O risco de intensificação de catástrofes naturais causa ansiedade na população e propicia o surgimento de movimentos ideológicos, motivadores de apelos emocionais populares, resultado do incômodo das populações com fatores como a poluição, os efeitos maléficos da industrialização, o desemprego e a própria exploração do trabalhador (MAGALHÃES, 2007 apud MOULATLET, 2007). Essas manifestações, embora não representem necessariamente uma consciência ambiental das populações, indicam uma perspectiva de evolução da consciência coletiva, cujo resultado pode culminar em mudança de comportamento de consumo que, por sua vez, pode produzir um movimento de pressão a favor do posicionamento forte dos governos e induzir as corporações a melhores práticas, compatíveis com a sustentabilidade requerida pelo planeta. Portanto, a opinião pública desempenha papel crucial para desencadear as mudanças necessárias à solução da crise ambiental, pois, apesar de os governos reconhecerem a realidade do aquecimento global, a ação política rumo à cooperação internacional continua aquém do mínimo necessário para resolver o problema (PNUD, 2008). 69 A análise da relação causal entre os fatores indutores do aquecimento global e os fatores vislumbrados para a sua mitigação, dentre eles a fundamental consciência coletiva, demonstra a natureza sistêmica do problema e evidencia o grau de dificuldade para a solução necessária e desejada. Assim, o encadeamento seqüencial desses fatores, conforme observado no lado esquerdo da Figura 10, permite perceber o conformismo popular (Inércia social) com a redução do poder público (Estado fraco) sobreposto à dinâmica de funcionamento do sistema (Capitalismo forte), indutora de práticas antropogênicas (Comportamento), as quais resultam na emissão e na elevação da concentração de CO2 (Gases estufa) na atmosfera e provocam o desequilíbrio climático do planeta e o aquecimento global (Ameaça). Figura 10 – Aquecimento Global – Relação de Causa e Efeito Fonte: elaborado pela autora. Para a seqüência de fatores causadores do problema, fazem-se necessárias fortes articulações no palco da Cooperação Internacional, para a contraposição de um caminho para o resgate das condições favoráveis à sua mitigação. Assim, conforme o lado direito da mesma figura, o equacionamento vislumbrado, a partir de induções catastróficas (Fatores supervenientes), deverá contemplar a reversão da atual inércia social (Consciência coletiva) 70 para proporcionar uma nova escala de poder entre a fraqueza do Estado (Estado forte) e a força do Capitalismo (Regulamentação), de forma a possibilitar a adequação das práticas antropogênicas (Mudança comportamento) e a conseqüente redução na emissão de CO2 (Redução gases estufa) em níveis suficientes à mitigação do problema (Solução). 71 6 CONCLUSÃO O desequilíbrio climático e o aquecimento global indicam preocupante cenário para o meio ambiente e para o futuro da civilização, cujos efeitos colocam em risco os biomas existentes no planeta e evidenciam a inadequação do atual modelo de desenvolvimento, fundamentado na desregulamentação do Capitalismo, à preservação ambiental. O problema requer solução urgente com a participação ativa de todos os atores relevantes do sistema internacional (Estado, mercado, empresas transnacionais, terceiro setor, sociedade civil). Entretanto, as distintas interpretações em torno do assunto dificultam o necessário consenso e, conseqüentemente, comprometem a eficácia das iniciativas de solução e das rodadas de negociação já empreendidas. Com a identificação da relação causal entre o sistema capitalista e o aquecimento global, vislumbrou-se o fortalecimento do Estado, mediante nova regulamentação para o Capitalismo, para atuar na reversão da crise climática, via cooperação internacional. Para testar a hipótese, foi identificada a origem do problema, associada aos avanços tecnológicos e aos processos produtivos introduzidos pela Revolução Industrial. Além disso, foi verificada a relevância e a forma de atuação do Estado, nacional (regras do jogo) e internacionalmente (cooperação internacional), na definição de caminhos viáveis a mitigação das mudanças climáticas. A análise foi desenvolvida a partir das abordagens teóricas do campo das relações internacionais, Pluralismo e Globalismo, além de fundamentos de Desenvolvimento Sustentável. A visão pluralista foi útil para aprofundar a compreensão das modificações acarretadas pelo Capitalismo e perceber como atores transnacionais exercem pressão sobre os governos e influenciam a política estatal. Tal abordagem forneceu os elementos necessários para entender o papel exercido pelo Estado no atual sistema internacional. Dentro dessa perspectiva, foram utilizados elementos de interdependência complexa, de 72 cooperação internacional, de comunidades epistêmicas e do conceito de regime internacional. A ótica globalista das relações internacionais, por sua vez, foi base para compreender o funcionamento e o processo de expansão do Capitalismo e sua influência sobre as causas do aquecimento global, bem como contribuiu para a percepção das modificações acarretadas pela Globalização nos modos de produção, nos valores da sociedade, no papel do Estado e nas relações homem-natureza. Por fim, os fundamentos do desenvolvimento sustentável serviram de alicerce para justificar e advertir sobre a necessidade de adaptação do sistema capitalista e do modelo de desenvolvimento vigente, a novas realidades e circunstâncias globais, agravadas pelo desequilíbrio climático. A partir desse embasamento teórico a análise permitiu constatar: • o mundo está submerso em uma nova realidade global; • as controvérsias existentes na comunidade científica (Céticos x Apocalípticos) não invalidam a realidade; • as controvérsias entre as duas correntes se restringem, basicamente, à amplitude das causas do aquecimento; • a aparente tranqüilidade dos céticos não deve embasar suposições de que o problema seja menor; • é preferível a adoção responsável do pior cenário, conforme preconizado pelos apocalípticos; • a adoção das ações propostas pelo IPCC implicaria melhora na qualidade de vida no planeta e preservação do remanescente do meio ambiente natural e humano ainda não afetado pelo aquecimento global; • as medidas viabilizadoras da contenção do problema proporcionariam as condições necessárias para a continuidade do desenvolvimento da civilização humana e acarretariam aspectos positivos inegáveis tanto para apocalípticos quanto para céticos; • é imperioso que as autoridades políticas e os detentores do conhecimento técnico-científico, apoiados e induzidos por um elevado grau de consciência coletiva, tenham o necessário 73 discernimento e tomem as decisões acertadas na escolha entre o elevado custo das ações corretivas e o risco de confirmação da visão do IPCC, com suas graves conseqüências para a civilização; • os cenários científicos já começaram a se confirmar; • o processo de aquecimento global é um fato e seu agravamento é determinado, principalmente, por fatores antropogênicos; • a necessidade de ajustes no Capitalismo, em prol do desenvolvimento sustentável; • a importância da cooperação internacional no processo de reversão do problema; • o difícil resgate de poder do Estado, diante da forte presença das corporações no mundo; • a insuficiência da consciência coletiva, cuja participação é fundamental para pressionar e induzir o Estado a desempenhar papel de regulador do Capitalismo; • a incapacidade do Estado de responder, sozinho, aos desafios do aquecimento global; • a solução depende de uma conjunção de fatores associados (consciência coletiva, Estado forte, regulamentação do Capitalismo, mudança de comportamento, redução de gases estufa); • a responsabilidade das empresas transnacionais no processo de agravamento do aquecimento global, associado ao fato de o setor privado ainda não ter incorporado a idéia de sustentabilidade e manterem suas iniciativas restritas a uma perspectiva mercadológica; • um processo de desregulamentação cujo avanço se deu de forma paulatina, Estado a Estado, impulsionado por aderência aos interesses corporativos, apresenta perspectivas débeis de reversão, pois, para uma nova regulamentação, o caminho deverá ser inverso ao desregulamentação; poder econômico, potencializado pela 74 • a necessidade de mudanças paradigmáticas na atual conjuntura do mundo globalizado capitalista tornou-se urgente e imperativa; e • a adequação das concentrações de gases estufa na atmosfera para a necessária reversão do aquecimento e a transformação dos modelos de desenvolvimento em consonância com a conservação e proteção dos ecossistemas do globo são grandes desafios a se vencer. Pela análise realizada, considera-se que a hipótese foi comprovada, a partir da constatação da relação causal entre o sistema capitalista e aquecimento global e da fragilidade do poder do Estado frente ao Capitalismo desregulamentado, fato que requer uma nova regulamentação para inverter essa relação de poder e permitir que a atuação estatal fortalecida e integrada internacionalmente proporcione um ambiente de cooperação e viabilize os caminhos necessários para a solução do problema. As pesquisas levadas a termo para a realização deste estudo, desde o início, indicavam sérias dificuldades para a proposta de solução embasada na atuação de um Estado forte, chegando a ser percebida como utópica diante do poder e da inflexibilidade do paradigma capitalista, incompatível com a necessária reversão na escala de poder entre Capital e Estado, como diagnosticado no presente trabalho. Entretanto, novidades planetárias surgidas no bojo da atual crise financeira mundial, ainda que indesejáveis, induziram transformações nos pensamentos dos principais líderes mundiais, na busca de alternativas para amenizar os impactos sobre suas economias nacionais. Assim, passou a fazer parte do discurso cotidiano de todos eles a intervenção estatal como via de solução, cuja viabilidade passa, necessariamente, pelo fortalecimento do Estado frente ao poder capitalista. A primeira ação dentro desse contexto foi o direcionamento de esforços e recursos rumo a uma maior participação do Estado no setor financeiro, por meio da estatização de bancos. O despertar dos governos para a necessidade de fortalecimento do Estado não se desassocia da quebra do paradigma capitalista e está plenamente refletido em declaração do Presidente em 75 exercício da União Européia, Nicolas Sarkozy, publicada no sítio Euronews (2008): A Europa deve ser portadora de uma idéia de refundação do capitalismo mundial porque o que se passou foi uma traição aos valores do capitalismo e isso não serve à economia de mercado. Não há regras, é a recompensa dos especuladores, em detrimento das empresas. Devemos ser portadores da idéia de uma nova regulação. Dessa forma, o presente estudo, na busca da identificação de caminho para a solução da crise climática, iniciado sob perspectivas utópicas quanto à fundamental necessidade de fortalecimento do Estado por meio de nova regulamentação para o Capitalismo, se conclui em meio a uma mudança sensível no cenário mundial, provocada pela forte crise financeira, cujos movimentos para solução intensificaram iniciativas de cooperação internacional, na busca de uma nova escala de poder entre Capitalismo e Estado, movimento que pode oferecer a perspectiva real do processo de mudança requerido para a reversão do aquecimento global. Em síntese, de todas as análises realizadas, conclui-se ser o aquecimento global um fato. Quanto a isso não há controvérsias. As divergências entre céticos e apocalípticos se restringem às causas do problema. Então, por uma questão de responsabilidade para com o planeta e a para com a humanidade e, até mesmo, dentro de uma coletividade, perceberse o exercício do instinto da precaução, a busca da reversão do fenômeno deve ser priorizada. Entretanto, a busca de solução envolve questões de elevada complexidade. Complexidade essa, bem caracterizada quando se necessita de cooperação internacional para produzir avanços sobre o tema, porque nenhum Estado tem o poder de prover a solução individualmente. E essa cooperação está, hoje, comprometida pela fragilidade do Estado diante do Capitalismo globalizado e desregulamentado. Assim, como já abordado, o caminho para a solução passa, necessariamente, por uma inversão na escala de poder entre o Capitalismo e o Estado, que permita maior êxito na cooperação internacional para se atingir os objetivos de mitigação do aquecimento global. E para induzir todo o processo é fundamental a participação da sociedade. E a sociedade só consegue ter peso nas soluções por meio de uma consciência coletiva, determinante do tratamento do problema nas agendas 76 oficiais com mais seriedade e objetividade. Para a formação dessa consciência coletiva, uma força estimulante torna-se necessária. Nesse sentido, a Academia pode e deve assumir o papel dessa força estimulante e, assim, exercer a responsabilidade de formar e informar a sociedade sobre a realidade do aquecimento global e seus efeitos adversos, com vistas a produzir essa consciência e proporcionar o início do processo de mudança viabilizador da reversão da crise climática planetária. E na atuação da Academia, a participação do internacionalista é necessária e fundamental devido ao fato de adquirir, na sua vivência acadêmica, amplo arcabouço de conhecimento e, por isso, deter considerável responsabilidade para com o problema. As dificuldades para solução são grandes, as perspectivas são imprevisíveis, o processo de reversão ainda não se iniciou e, embora existam importantes iniciativas de reversão das mudanças climáticas, como o Regime Internacional de Mudança do Clima e o Protocolo de Quioto, essas se mostram insuficientes para fazer face aos desafios do aquecimento global. É necessário, então, que o meio acadêmico seja o motor da formação de uma sociedade consciente, ator chave para desencadear as mudanças necessárias, rumo a um futuro de menos riscos e melhor para toda a vida existente no planeta. 77 7 RECOMENDAÇÕES A necessidade imperativa de coesão e consenso, frente à falta de engajamento dos principais atores às propostas para reverter a crise climática e o aquecimento global indica, dentre outros fatores, a inviabilidade de solução por meio de iniciativas isoladas. Portanto, fica evidenciada a incapacidade de qualquer Estado responder sozinho aos desafios do aquecimento global. Assim, apresenta-se como fator fundamental e como única alternativa capaz de iniciar o processo de mudança, a consciência coletiva em torno do assunto. Entretanto, atingir um nível de consciência suficiente requer um grande trabalho de formação e informação junto à sociedade. Nesse contexto, a Academia é detentora dos melhores instrumentos para disseminar conhecimento e consciência. Recomenda-se, então, conforme já abordado neste trabalho, o empreendimento de uma grande cruzada acadêmica contra as causas antropogênicas do aquecimento global, por meio da disseminação do adequado conhecimento do problema, a contribuir para a formação da consciência coletiva desejada e necessária. 78 REFERÊNCIAS BOFF, Leonardo. Ethos mundial: um consenso mínimo entre os humanos. Brasília: Letraviva, 2000. CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE O MEIO AMBIENTE HUMANO, Declaração de Estocolmo sobre o Ambiente Humano. Estocolmo, 1972. CONVENÇÃO Quadro das Nações Unidas sobre mudança do clima. 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