GEOGRAFIA EM MÚLTIPLAS ESCALAS DO LOCAL AO GLOBAL AUTORA: MARCORI, Sandra Juraci Professora de Geografia da rede pública do Estado Paraná, participante do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE-2007) E-MAIL: [email protected] RESUMO A necessidade de produção de um material didático que viabilizasse a disseminação de conhecimentos geográficos sobre o local, dada a inexistência do mesmo na maioria dos municípios do estado do Paraná, motivou um grupo de professores da rede estadual de ensino, participantes do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), a desenvolver um trabalho intitulado Geografia em múltiplas escalas do local ao global. Esse trabalho foi realizado em parceria com a Universidade Estadual de Londrina (UEL). O objetivo principal da produção do material didático-pedagógico foi o atendimento das demandas educacionais do ensino de Geografia, nos níveis fundamental e médio, tendo como foco a escala local de análise geográfica. O material foi elaborado a partir de três eixos estruturantes: limites, arranjos territoriais e dinâmica populacional. Assim, os docentes de cada um dos nove municípios do estado do Paraná (Borrazópolis, Cambé, Cambira, Califórnia, Ibiporã, Londrina, Sertanópolis, Porecatu e Uraí) elaboraram o material didático que, têm em comum o tema e os eixos, diferenciando-se quanto aos conteúdos. Vale salientar que o referido material pretende subsidiar o ensino de geografia na escala local, servindo como material complementar ao livro didático para os professores da rede estadual de ensino. Palavras-chave: Geografia, Material Didático, Município, Local. ABSTRACT The necessity for producing didactical material for the viable dissemination geographic understanding of the local, this information does not exist in most of the municipalties in the state of Paraná, motivated a group of professors from various state institutions of learning to participate in the Developmental Educational Program. To begin working to initiate Geography in multiple levels from local to global. This work came to be by working in partnership with the Universidade Estadual de Londrina (UEL) (The State University of Londrina) . The principal objective for the project of the didactic-pedagogic material was created to meet the education demands for teaching Geography at the fundamental and intermediate levels being focused the geographic analysis at local level. The material was created to begin from three structural axes: limits, territorial features and population dynamics. 2 Therefore the professors of each of the nine municipalities of the State of Paraná (Borrazópolis, Cambé, Cambira, Califórnia, Ibiporã, Londrina, Sertanópolis, Porecatu and Uraí) elaborating on didactical material that is in common with the axes issue, being different related to the contents. Is good to remember that the referred to material will be used to reinforce the teaching of geography at the local level, serving as complementary material of didactical book for the professors of many state institutions of learning. Key words: Geography, Didactical material, Municipality, Local. INTRODUÇÃO Este texto é resultado de estudos e reflexões de um grupo de professores de geografia da rede pública de ensino do estado do Paraná, participantes do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE. Por meio do referido programa, pudemos desenvolver um material didático-pedagógico a partir de reflexões sobre a própria prática pedagógica. O mesmo foi elaborado para atender as necessidades de ensino e aprendizagem de conteúdos geográficos, respectivamente, de professores e alunos do ensino básico. Esclarecemos que optamos por elaborar o material didático focado na escala local, tendo em vista a sua quase total inexistência. Além disso, compreendemos que, no trabalho com os saberes geográficos dos estudantes, há que se partir da escala local para, em seguida, dependendo da abrangência geográfica do fenômeno, ampliar os níveis de análise escalar e, dessa maneira, dialogar com as escalas regional, nacional e mundial, geralmente apresentadas nos livros didáticos adotados pelas escolas públicas. Na elaboração do referido material tivemos como base três eixos estruturantes: limites, arranjos territoriais e dinâmica populacional. A opção pelos mesmos se deu em função de que se constituem em elementos fundamentais para a compreensão do espaço hodierno. Leituras e discussões sobre diversos teóricos, que investigam e apontam encaminhamentos e discussões para as possíveis superações das dificuldades encontradas por professores e alunos em sala de aula, fundamentaram as reflexões sobre: como 3 contribuir para que os últimos possam formar autonomamente seus próprios conceitos, como trabalhar com conteúdos geográficos apresentados de maneira abstrata e descontextualizada, a importância de ter como ponto de partida do processo de ensino e aprendizagem o cotidiano dos estudantes. Estas reflexões conduziram os estudos e investigações sobre o município. É importante esclarecer que não se trata de um material elaborado visando a substituição do livro didático. Pretendemos com o mesmo auxiliar e enriquecer as aulas de geografia, contribuir com uma educação voltada ao entendimento do espaço geográfico vivenciado pelos nossos alunos, atuando, dessa maneira, no processo de ensino e aprendizagem na perspectiva da construção de conceitos e noções tendo como ponto de partida o diálogo com o espaço de vivência do estudante. Porque ensinar geografia em múltiplas escalas? Um dos fundamentos teóricos e metodológicos da ciência geográfica e do seu ensino é o uso de conceitos e categorias para analisar e fazer a leitura dos elementos responsáveis pela produção dos espaços geográficos em múltiplas escalas. Contudo, é necessário refletir sobre como os conceitos podem estar a serviço da comunicação, do entendimento e da solução dos problemas nas diferentes fases de atividade dos processos intelectivos dos estudantes, a fim de alcançar os objetivos pedagógicos do ensino de geografia. Dessa maneira, faz-se necessário, “[...] o estabelecimento da tensão dialética entre os conhecimentos nãoformais e os científicos (a geografia da vida na escola).” (KATUTA, 2007, p. 3). É por meio do diálogo entre os conhecimentos cotidianos e os conceitos científicos que ocorre a compreensão dos arranjos espaciais. Alcançar esta compreensão pressupõe o desenvolvimento de um conjunto de saberes, noções e habilidades que visam auxiliar o estudante a compreender a lógica da ordenação das paisagens: 1 Observação do entorno identificando a ordenação territorial da distribuição dos fenômenos; 2 Descrição dos fenômenos observados em sua ordenação territorial; 3 Identificação qualitativa do significado da ordenação territorial dos fenômenos; 4 Reconhecimento da ordenação espacial, isto é, o desvendamento do jogo de determinações que definem a construção das paisagens; 5 Associação dialética entre: forma e 4 conteúdo, tempo e espaço, qualidade e quantidade, localização e significado; 6 Identificação topológica e toponímica enquanto ferramentas analíticas e sintéticas. (Adaptado de: Proposta Curricular do Amapá, s.d., p. 58). A reflexão sobre a contribuição que a geografia pode dar na formação do aluno e em sua compreensão da realidade e do mundo, assim como para o seu posicionamento crítico diante dos acontecimentos ocorridos e os elementos presentes na formação das paisagens, está relacionada com os objetivos pedagógicos e educacionais da área em questão. Se quisermos que o aluno entenda e atue na sociedade em uma perspectiva de sua democratização, é preciso respeitar e considerar saberes, experiências e significados já vivenciados e, entre estes, quais são pertinentes para a formação de conceitos e a construção de conhecimentos geográficos. Acreditamos que tendo como ponto de partida o cotidiano, o local, para em seguida, transitar por outras escalas como a nacional e/ou global, dependendo do fenômeno, é possível desenvolver o raciocínio geográfico e o senso crítico, proporcionando aos nossos alunos uma melhor compreensão da espacialidade e temporalidade dos fenômenos geográficos em suas dinâmicas, interações e contradições. “A escolarização auxilia no processo de construção de conceitos científicos que altera significativamente o conteúdo e a estrutura dos conceitos cotidianos” (KATUTA, 2007, p. 1). Com este intuito elaboramos o material didático considerando o processo de formação de conceitos: “Movimento do pensamento que oscila entre duas direções: do particular para o geral – do geral para o particular.” (KATUTA, 2007, p. 1). Compreender e explicar as mudanças atuais do espaço geográfico, o processo de globalização nas suas manifestações espaciais e contradições, levando em conta as especificidades históricas e geográficas de cada lugar, são temas constantemente abordados pela geografia. Cavalcanti, ao analisar a discussão teórico-metodológica sobre o lugar na concepção histórico-dialética, faz as seguintes considerações: [...] a compreensão da globalização requer a análise das particularidades dos lugares, que permanecem mas não podem ser entendidas nelas mesmas. O que há de específico nas particularidades deve ser encarado na mundialidade, ou seja, o problema local deve ser analisado como problema global, pois há na atualidade um 'deslocamento' (no sentido de des-locar) das relações sociais. (CAVALCANTI ,1998, p. 90). 5 A questão que se impõe, assinalada por diversos geógrafos, é a necessidade de entender a importância da escala local no mundo atual, por isso, ganha destaque a consideração da dimensão do cotidiano nos estudos de geografia. Diante das complexidades mundiais, dos sistemas que podem ser apropriados pela lógica do capital para atingir seus objetivos de acumulação e reestruração econômica, a compreensão da espacialidade dos fenômenos exige uma análise em múltiplas escalas. Em função de tantas informações que nos chegam por diversos meios de comunicação que ampliaram a nossa possibilidade de saber o que está acontecendo no mundo por meio de imagens e sons, não é possível ensinar e aprender geografia desconsiderando as condições atuais do processo de globalização. No entanto, a principal preocupação reside na anuência sobre como abordar o conteúdo geográfico de forma tal que a compreensão do mesmo possa fazer com que os alunos consigam, utilizando várias formas de linguagem, expressar e representar as dimensões geográficas dos fenômenos em diferentes tempos e escalas, entendendo que é no espaço geográfico que as sociedades constroem as paisagens. Assim, é importante a utilização de diversas linguagens que podem auxiliar na leitura das paisagens que nos cercam e na compreensão das geograficidades dos lugares para, a partir daí, estabelecer as relações entre os espaços regionais, nacionais e mundiais. Este foi um aspecto importante de nossas reflexões para a elaboração do material didático. Segundo KATUTA (2005, p. 01): A paisagem é apreendida por meio de diferentes linguagens que, cada qual a seu modo, em função de suas malhas e teceduras específicas, apreendem, ordenam e apresentam os elementos paisagísticos. Tais linguagens, por sua vez, podem e devem ser utilizadas pelos geógrafos nos seus infinitos processos de construção discursiva em torno da questão da ordenação dos territórios. Para compreender como a espacialidade do mundo interfere nos mais variados aspectos, sejam eles de ordem política, econômica, social ou cultural, os quais são apresentados pelos livros didáticos de geografia, é fundamental que se estabeleça um diálogo com a dimensão espacial do cotidiano. Segundo Santos (1996, p. 257): 6 Com o papel que a informação e a comunicação alcançaram em todos os aspectos da vida social, o cotidiano de todas as pessoas assim se enriquece de novas dimensões. Entre estas, ganha relevo a sua dimensão espacial, ao mesmo tempo em que esse cotidiano enriquecido se impõe como uma espécie de quinta dimensão do espaço banal, o espaço dos geógrafos. Através da compreensão da dimensão geográfica de aspectos do cotidiano podemos, talvez, contribuir para o necessário entendimento da relação entre espaço e movimentos sociais, enxergando na materialidade, componente imprescindível do espaço geográfico, que é, ao mesmo tempo, uma condição para a ação, uma estrutura de controle, um limite e convite à ação. Nada fazemos hoje que não seja a partir dos objetos que nos cercam. Cada lugar hoje, mesmo que guardadas suas especificidades geográficas, deve ser analisado e interpretado com vistas à sua relação com o espaço global. Para o aluno, é importante que os conteúdos geográficos lhes dê possibilidades de reconhecer no local, no seu espaço de vivência os aspectos da modernização, da mundialização atual, que podem estar presentes nas diferentes esferas espaciais da sociedade local. O estudo da geografia em múltiplas escalas, do local ao global, em um movimento pendular infinito, é uma proposta que busca compreender os fenômenos geográficos e dar significado ao que se ensina nas escolas, de maneira tal que os conteúdos possam ser apreendidos com mais facilidade porque se encontram vinculados ao cotidiano dos nossos alunos e por eles podem ser reconhecidos, analisados e discutidos contribuindo com a construção do conhecimento e dos conceitos geográficos. Cada tema trabalhado no material sobre a geografia em múltiplas escalas inclui uma variedade de dados e informações sobre o município. Estão apresentados em diversas linguagens, na forma de textos, tabelas, mapas e gráficos que se consubstanciam com um dos objetivos: o de ampliar a visão e a interpretação dos fenômenos geográficos e auxiliar os alunos a compreenderem a lógica da ordenação das paisagens, o que permitirá a compreensão das geograficidades, ou a efetivação da alfabetização geográfica, o que significa reconhecer o significado da localização dos fenômenos nos lugares (KATUTA, 2007). O conceito de geograficidade, que Moreira (2004) define como o combinado ser-espaço-tempo, indica que: “Todo ente para ser geográfico tem que estar localizado, donde a geograficidade começar na localização no espaço. A 7 localização espacial é essencial e a paisagem um seu pressuposto” (MOREIRA, 2004, p. 193). O espaço é compreendido aqui como substrato da existência e sobrevivência humana. Pelo trabalho, o Homem estabelece suas relações com o meio, cujo produto é a paisagem, que manifesta essa relação e a condição do serestar-espacial-do-homem-no-mundo. Por isso, os fenômenos podem ser compreendidos a partir da sua organização, localização e distribuição no espaço. É preciso ainda esclarecer que adotamos o conceito de geograficidade como um conceito necessário para a compreensão e contextualização das diferentes relações que as sociedades estabelecem no tempo e no espaço. Sobre isso Moreira (2004, p. 193) chama-nos a atenção ao apontar a geograficidade como sendo: [...] o produto mais acabado do movimento mediante o que o trabalho traz a dimensão natural e a dimensão social para unidade integral do ente-nomundo, dimensionando-a como a sua totalidade. O que faz da geograficidade um outro modo de dizer dos recortes reais de espaço das sociedades diferencialmente localizadas na superfície terrestre, a sociabilidade que vai dar ao ente seu sentido e significado de ser-nomundo. Estamos habituados a tratar os conteúdos geográficos a partir da mesma abordagem que fazem os autores dos livros didáticos que, geralmente, têm como ponto de partida uma geografia nas escalas regionais, nacionais e mundiais, o que, não raro, compromete a compreensão e o interesse dos alunos que não se vêem inseridos nesses espaços, por não terem desenvolvido habilidades para observar, descrever, identificar, reconhecer e associar os elementos responsáveis pela produção dos espaços em múltiplas escalas e as determinações que definem a construção das paisagens, principalmente daquelas que os cercam. Portanto, acreditamos que a utilização do material didático em questão permitirá apoiar o processo de aprendizagem, a fim de que ele se realize de forma mais satisfatória para professores e alunos. Eixos estruturantes Os eixos estruturantes do material elaborado definiram-se a partir de discussões em torno do objeto de estudo da ciência geográfica, ou seja, a organização e produção do espaço geográfico, por meio de reflexões sobre a própria prática pedagógica e os conhecimentos, conceitos ou práticas que 8 identificam e organizam o campo de estudo da geografia, tendo como horizonte as Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Paraná (2006). Toda a elaboração do material didático, da construção do roteiro que conduziu o levantamento de dados, a ordenação das idéias e a fase final do trabalho, foi orientada a partir de três eixos estruturantes: limites, arranjos territoriais e dinâmica populacional e, a partir deles, procurou-se abordar aspectos da geografia local, fundamentais para a compreensão dos arranjos espaciais locais. Estes temas foram escolhidos pela abrangência, possibilidades de análise e articulação com os conteúdos presentes nos livros didáticos, com os saberes e conteúdos previstos pelas Diretrizes Curriculares do estado, elementos fundamentais na definição da linha de desenvolvimento do material didático. A referência inicial para análise e desenvolvimento dos eixos estruturantes, partiu do entendimento de que a geografia desenvolveu uma linguagem própria, e conceitos específicos que precisam ser apreendidos e trabalhados no ensino, no processo de aprendizagem, para tanto, é preciso também considerar os conceitos cotidianos, representações já formadas, aos quais se têm atribuído grande importância. Cavalcanti (1998, p. 88) afirma: Seja como ciência, seja como matéria de ensino, a Geografia desenvolveu uma linguagem, um corpo conceitual que acabou por constituir-se numa linguagem geográfica. Essa linguagem está permeada por conceitos que são requisitos para a análise dos fenômenos do ponto de vista geográfico. É importante salientar que no trabalho com cada tema buscamos informações locais sobre diversos aspectos: Limites – apresentamos subsídios para a construção de conceitos de divisas, fronteiras, extensões do município e de sua caracterização física (Clima, relevo, hidrografia, vegetação) relacionando tais informações com outros espaços. Arranjos Territoriais – neste item enfatizamos a estrutura fundiária, a estrutura urbana, o uso do solo rural e urbano, considerando a dimensão da realidade local como significativa e necessária para a efetiva compreensão do espaço geográfico, isto é, a partir do estudo do local, pode-se construir uma visão mais crítica e ampla do mundo. Dinâmica Populacional – este item traz o diagnóstico das características do povoamento, as migrações e a estrutura populacional que imprimiram marcas no município, produzindo novas 9 territorialidades e relacionando com as mudanças políticas e econômicas ocorridas em escala nacional e mundial. Limites A compreensão dos limites do município, da sua divisão políticoadministrativa e caracterização física (clima, relevo, hidrografia, vegetação), conduziram as reflexões sobre este tema, no qual foi imprescindível o uso e interpretação da linguagem cartográfica. Os objetivos principais e específicos desse eixo foram delimitar divisas e fronteiras, áreas e extensões do município, identificar as características físicas do município e distinguir seus aspectos ambientais em sua inter-relação com as atividades humanas. Para desenvolvê-lo foi necessário retomar alguns conceitos, noções e conteúdos, entre eles, limites, perímetro urbano, vegetação, relevo, solo, hidrografia e clima do município, assim como foi importante o levantamento de várias questões que permitissem a compreensão, análise e interpretação dos dados, figuras, mapas e outros recursos que pudessem ser trabalhados nas salas de aula. Como afirma Pereira (2003, p. 15): “O papel fundamental da Geografia no ensino básico é o de proporcionar aos alunos os códigos que os permitam decifrar a realidade por meio da espacialidade dos fenômenos, ou seja, alfabetizar geograficamente.” Cada um dos temas trabalhados neste eixo contou com a análise de material já existente, produzido por profissionais que atuam na área da ciência geográfica, no ensino da geografia e por órgãos e secretarias públicas (Prefeitura Municipal de Londrina, Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Londrina, Instituto Agronômico do Paraná, Paranacidade, Sanepar, Comurb, entre outros). Estes materiais ricos em informações e dados sobre o município, foram levantados em diversas pesquisas e visitas aos locais citados e, posteriormente analisados e organizados. Vários mapas, tabelas e gráficos foram levantados e, quando necessário, reorganizados de maneira tal que pudessem facilitar a compreensão a fim de serem aproveitados como material de apoio em sala de aula. Dada a relevância dos conhecimentos e representações cartográficas para a análise dos conteúdos e conceitos geográficos abordados neste eixo, e o interesse que o mapa geralmente desperta em nossos alunos, 10 consideramos a possibilidade de potencializar esse interesse a fim de utilizá-lo como suporte na construção do conhecimento. Isso para que o aluno, ao estudar o ambiente em que vive, aprenda, com o auxílio dos mapas, a fazer a leitura das geograficidade dos fenômenos do ambiente a fim de associá-las às transformações provocadas pela ação do ser humano na sua relação com o meio ao longo dos tempos. Entendemos que os mapas e cartas geográficas são instrumentos fundamentais da linguagem e análise geográfica. Por isso, algumas atividades foram elaboradas considerando que a compreensão dos mesmos deve ser um processo de decodificação que envolve elementos essenciais como o título, a escala, as coordenadas geográfica e a legenda, para que a leitura e a interpretação dos fenômenos representados possa se realizar. As múltiplas possibilidades de conhecimento do local com as atividades propostas e a leitura dos mapas apresentados foi uma forma de ampliar a utilização desta linguagem bem como a visão da cartografia pois reconhecemos que, em sua maior parte, os mapas são utilizados como mero recurso ilustrativo. Cabe aqui uma referência à Moreira citado por Katuta (2007, s.p.), em seus estudos sobre a importância das imagens na geografia, em que ele afirma: O mapa é o repertório do vocabulário geográfico. E trata-se da melhor representação do olhar geográfico. O mapa é a própria expressão da verdade de que todo fenômeno obedece a um princípio de organizar-se no espaço. [...] O mapa é o fiel da sua identidade. [...] as nervuras do mapa são as categorias mais elementares do espaço: a localização, a distribuição, a extensão, a latitude, a longitude, a distância, e a escala, palavras do fazer geográfico. Os textos que foram elaborados e que precedem as representações cartográficas foram organizados para fornecer informações sobre os aspectos físicos da realidade local a fim de articulá-las com os conhecimentos geográficos construídos e apreendidos no cotidiano. Espera-se ainda que a escolha desses temas e o tratamento dado aos mesmos nesta proposta auxilie professores e alunos, a refletir e reconhecer suas próprias práticas sócio espaciais, uma vez que, as práticas sociais cotidianas, como argumenta Cavalcanti (1998, p. 135), são repletas de espacialidade: Se as práticas sociais cotidianas são carregadas de espacialidade, de geografia, sua realização não ocorre sem o conhecimento dela. [...] a qualidade dessas práticas, rumo a uma prática reflexiva e crítica, pode se alterar quando se altera o conhecimento da espacialidade. [...] o ensino de 11 geografia tem a função de lidar com a espacialidade e com o conhecimento geográfico de cada um para provocar neles alterações no sentido de uma ampliação. Isso é possível pela reflexão e pelo exercício de abstração propiciado com o tratamento de conhecimento científicos. O ensino da geografia pode ser facilitado quando o aluno percebe-se como parte do contexto estudado, isto é, quando se dá uma aprendizagem das geograficidades do seu espaço de vivência. Partindo do singular, do local, é possível estabelecer um diálogo entre as escalas estadual, regional, nacional e mundial para, a partir destas, novamente retornar ao local. Bertanini (1985, p. 118), escreve: “Estudar o espaço vivido significa superar a dimensão do espaço extensão, ou espaço suporte das atividades, para acolher a noção de representação do espaço, como espaço construído através do olhar das pessoas que o vivem-habitam.” A aplicação dos conteúdos e do material didático referente aos estudos dos limites do município e dos demais conhecimentos associados a este eixo, em sala de aula, nos fez perceber um maior envolvimento e interesse dos alunos que participam das aulas expondo idéias e conhecimentos relacionados ao bairro onde moram, aos locais que freqüentam e às observações do cotidiano sobre a vegetação, o clima, o solo, o relevo etc. Demonstraram mais entusiasmo, enriquecendo as aulas com informações que obtiveram por meio do diálogo com os familiares, as fotos de família, os registros, as experiências e conhecimentos que antes eram desprezados e que passam a ser valorizados pelos alunos, dada a importância que, pouco a pouco, vão sendo reconhecidas. Isso porque a utilização do referido material tornou possível a compreensão da relação entre os conhecimentos geográficos não formais e os científicos. Foi interessante notar como os alunos assumem uma postura mais crítica, perdem o constrangimento e sentem-se inseridos na realidade. Ao expor suas próprias opiniões, às defendem e, sem dúvida, praticam um dos princípios e exercícios básicos da cidadania. Neste sentido, Diamantino Pereira (2003, p. 10) afirma: A alfabetização, para a geografia, somente pode significar que existe a possibilidade do espaço geográfico ser lido e, conseqüentemente, entendido. Pode transformar-se, portanto, a partir disso, em instrumento concreto do conhecimento, em uma janela a mais para possibilitar o desvendamento da realidade pelo aluno. 12 Sob essa perspectiva, o conteúdo apresentado neste eixo poderá ser abordado como um conhecimento necessário para o desdobramento de outros temas, enfatizando que o espaço geográfico deve ser compreendido como resultado da relação Homem X Meio. A elaboração do material didático foi uma forma de apresentar contribuições que possibilitem a análise e o diálogo entre os diferentes níveis de escalas (local, regional, nacional e global) com o objetivo de utilizar a linguagem geográfica para mostrar como e por que os fenômenos se distribuem e se relacionam no espaço. As abordagens dos conteúdos deste eixo, assim como dos demais, devem considerar o princípio da complexidade com um tratamento relacional dos conteúdos, respeitando a maior ou menor capacidade de abstração do aluno, bem como sua capacidade de trabalhar com conceitos científicos. Caberá ao professor, nos diferentes níveis de ensino, fundamental e médio, abordar os conteúdos de maneira a articular as geograficidades dos aspectos naturais, econômicos, sociais, políticos e culturais, nas diversas escalas geográficas e nas relações urbano-rurais. O eixo intitulado “Limites” traz conhecimentos que permitem analisar os fenômenos na escala local e que podem e devem ser articulados e relacionados, quando possível, às escalas mais amplas que estimulem reflexões sobre os arranjos espaciais de maneira contextualizada e não isolada. Arranjos Territoriais O tema Arranjos Territoriais teve como propósito auxiliar o aluno a observar o entorno e a identificar a ordenação territorial dos fenômenos, para que possa compreender seus significados. Para tanto, enfatizamos a estrutura fundiária e urbana, o uso do solo rural e urbano, considerando a dimensão da realidade local e a importância desses temas e outros a eles relacionados, na compreensão de uma ampla gama de aspectos que constituem o espaço geográfico, que auxiliem a construir os conceitos básicos da geografia (paisagem, região, lugar, território, natureza, sociedade), fundamentais na compreensão das relações sócio espaciais nas diversas escalas geográficas. Parte-se de uma realidade local, delimitada pelas fronteiras do município, com a finalidade de investigar sua constituição espacial a fim de que se 13 possa compará-la com outros lugares, distantes ou próximos e tornar possível a leitura dos seus arranjos territoriais. Ao se fazer a leitura dos arranjos territoriais do município foi necessário recorrer a um referencial teórico, bem como a conceitos geográficos que sustentassem nossas reflexões e interpretações. Em se tratando da composição conceitual da ciência geográfica, é importante esclarecer que, historicamente, sempre esteve marcada por interpretações diversas, vinculadas a uma determinada visão dos fatos e fenômenos e assumindo, consequentemente, posições filosóficas e políticas distintas. Portanto, é preciso cuidado ao tratar conceitos que são constantes referências nos currículos, nos livros didáticos e nas salas de aula e que, tantas vezes são retomados, historicizados e ressignificados em função das mudanças que marcam novos períodos e exigem outros entendimentos e interpretações dos espaços geográficos e de seus arranjos territoriais. Nesse sentido, ao abordarmos o tema Arranjos Territoriais consideramos uma análise a partir das leituras e notas de Callabi e Indovina (1973, p. 01) sobre as forças que atuam na configuração dos territórios atualmente: “As relações capitalistas de produção tendem a se ampliar e abranger toda a sociedade; são estas relações e o desenvolvimento das forças produtivas que dão a configuração específica ao território”. Para o desenvolvimento do tema foi imprescindível um estudo das relações capitalistas que marcaram e estabeleceram os arranjos territoriais no município a partir do seu povoamento, no contexto da ordem econômica e política agrícola mundial que delineava e destacava a importância da agricultura para economia brasileira na época, e que definiram a divisão territorial do trabalho com reflexos até os dias atuais. ”Território é um conceito ligado à idéia de relações de espaço e poder. É no território que ocorre a normalização das ações, tanto globais quanto locais.” (SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÂO, 2006, p. 28). O território é, portanto, resultado de condições e forças internas e externas, sendo parte de uma totalidade espacial. O conceito de território é fundamental para a análise e compreensão do espaço geográfico e pode auxiliar os alunos a entenderem a lógica da ordenação espacial dos fenômenos e das paisagens, as relações sócio-históricas e espaciais do modo capitalista de produção, bem como as questões políticas, econômicas e culturais materializadas no espaço geográfico. 14 Para o estudo dos arranjos territoriais do município, foi elaborada uma série de questões para serem trabalhadas com os alunos, com o objetivo de refletir sobre os vários aspectos relacionados ao tema, de modo que a abordagem seja parte da construção dos conhecimentos e permita a compreensão dos arranjos territoriais. Com este intuito, um conjunto de linguagens como mapas, gráficos, tabelas, croquis, fotos, imagens, etc. foram utilizados, isso porque, conforme, Katuta (2004, p. 2), “[...] apesar da riqueza da linguagem escrita, existem aspectos da geograficidade dos entes que somente podem ser capturados e apresentados por imagens.” O desenvolvimento do tema demandou o levantamento de informações sobre as características da agricultura no município e a sua importância na economia do país, assim como sua participação no equilíbrio da balança comercial. Destacamos os produtos agrícolas produzidos no local, seu destino, os indicadores de uso do solo tais como a área ocupada com lavouras permanentes, temporárias, pastagens, matas e reflorestamento. Com essa análise, introduzimos algumas considerações acerca da inserção do município no contexto da industrialização e da introdução de equipamentos modernos no campo, cujas conseqüências foram novas condições de produção e de trabalho para as famílias de trabalhadores rurais, as quais foram obrigadas a mudar seus hábitos e costumes e entrar no ritmo destas atividades chamadas modernas, o que implicou em redução das ocupações agrícolas familiares, bem como dos empregos temporários e permanentes no campo, entre outras mudanças. As considerações anteriores permitiram uma reflexão sobre as mudanças no padrão de distribuição da população rural e urbana no Paraná, caracterizada pela diminuição da população residente no campo, a perda populacional de parte dos municípios paranaenses, cuja base era essencialmente agrícola. No caso da região Norte do Paraná, esse fenômeno ficou mais evidente a partir da década de 1980, momento em que a cultura do café já havia entrado em declínio e a migração, tanto para as cidades maiores como para novas áreas agrícolas, foi a saída encontrada pelos camponeses. A esse intenso movimento migratório associamos os impactos ambientais, em particular no que diz respeito à degradação da flora, destruição da fauna, dos recursos hídricos, em 15 função das técnicas de cultivo baseadas em intensa mecanização e larga utilização de agrotóxicos nas monoculturas que se sucederam. Dessa maneira, por meio dos textos e questionamentos, propusemos uma reflexão sobre as transformações das relações entre cidade e campo, viabilizadas pela adoção de novas tecnologias de produção, somadas à geração de novas atividades não-agrícolas, dentre essas àquelas ligadas ao turismo rural que, têm transformado a área em espaço de lazer, criando no campo estruturas que antes eram típicas do meio urbano. Essas várias formas de organizar o espaço se integram no processo de produção capitalista industrial. MOREIRA (2005, p. 3) afirma que: Uma espécie de fim de divisão de trabalho, técnica e territorial, que recria as relações entre setores econômicos até então estrutural e territorialmente separados, e uma certa homogeneização de valores que expressam um mundo e um modo de vida até então tidos como próprios e privilégio da cidade toma em comum cidade e campo, tornando-os, de novo, um mundo único, desta vez configurado na cultura urbana, que se propaga pelos campos, aí eliminando o que era ainda remanescente da cultura rural do passado. As diferenças entre cidade e campo, dada a diversidade de usos e apropriações são enfocadas nos mapas e imagens referentes ao uso desses espaços, no zoneamento urbano e nos textos que levam à reflexão sobre os fatores determinantes na configuração e organização desses espaços tais como o poder aquisitivo da população, a articulação entre poder de regulamentação e a força dos grupos privados e a especulação imobiliária, fatores que explicam a dinâmica interna das cidades, assim como a lógica dos vazios urbanos. Dentro dessa proposta, buscou-se também compreender a participação de cada setor econômico do município e os fatores que interferem na distribuição espacial das atividades econômicas. Entendemos essas questões como pontos essenciais para o aluno reconhecer a cidade como expressão e produto concreto da realidade social e econômica do sistema capitalista. Para Callabi e Indovina (1973, p. 4 ) “[...] a cidade, deste ponto de vista, é um produto total. Ela tem valor de uso e tal valor depende de necessidades historicamente determinadas, diante de tal valor de uso ela é produto para a troca, ou seja, ela própria é mercadoria.” Os dados levantados a respeito dos serviços urbanos, educação, saúde, lazer, segurança, fornecimento de energia, água, esgoto, meios e vias de 16 transporte, coleta de lixo, creches, pontos turísticos, centros de convivência, etc. foram introduzidos no material didático como elementos para a análise da estrutura espacial e reflexão sobre o acesso a esses serviços, portanto, à cidadania e à qualidade vida, e também como suporte para compreender as diversas esferas de ações e responsabilidades que a elas estão relacionadas, considerando a vivência e prática cotidiana dos estudantes. Dinâmica Populacional A dinâmica populacional é um dos fatores fundamentais para a compreensão do nosso objeto de estudo, ou seja, a distribuição territorial dos fenômenos e seus significados na organização e formação dos espaços geográficos. O intuito é entender como a dinâmica populacional interfere na formação espacial da sociedade e reportar essa compreensão para o contexto da cidade, do município. Assim, fizemos um diagnóstico das características do povoamento, das migrações e da estrutura populacional que imprimiram marcas no município, produzindo novas territorialidades relacionadas com as mudanças políticas e econômicas ocorridas em escala nacional e mundial. As formas espaciais concretas presentes em diferentes territórios são o resultado da relação Homem-Natureza, que se realiza por meio do trabalho, relação regulada e controlada pelos mecanismos do capitalismo e historicamente determinadas por ele. A dinâmica da população no espaço, no contexto das sociedades atuais, deve ser compreendida como uma exigência de adaptação às necessidades de reprodução e acumulação do capital. Assim, os grupos se deslocam motivados por diversos fatores, mas são principalmente, aqueles ligados ao desenvolvimento econômico dos lugares os que, em grande parte, desenham as trajetórias de deslocamento da população no espaço da sociedade moderna. A dinâmica populacional, em suas expressões espaciais, contribui para a compreensão da formação de diferentes geograficidades, sendo um dos aspectos da mesma. Qualquer que seja o ponto de entrada ou de saída dos grupos humanos, estes obedecerão a lógica sobre a qual se apóia o raciocínio geográfico “[...] de que todo fenômeno obedece ao princípio de organizar-se no espaço” ( Moreira, 2006, p.174, apud KATUTA, 2005, p. 3). 17 Materializam-se no espaço as transformações dos lugares, as diferentes formas de viver e se organizar decorrentes do modelo econômico atual, do desenvolvimento das forças produtivas e do avanço tecnológico. “A geograficidade é, assim, o ser-estar espacial do ente. É o estado do ser no tempoespaço. Um princípio válido e atribuível a qualquer ente – pode ser o homem, um objeto natural ou o próprio espaço [...]” (MOREIRA, 2004, p. 34). O diagnóstico da dinâmica populacional do município, das suas características do seu povoamento, das migrações e da sua estrutura populacional, as mesmas que imprimiram marcas no município produzindo novas territorialidas, permite a elaboração de uma leitura das espacialidades, das formas em que os grupos sociais se organizam no espaço-tempo, dadas suas relações com as mudanças políticas e econômicas ocorridas em escala nacional e mundial, e pressupõe o entendimento das geograficidades engendradas pela dinâmica populacional em escala local. Esse conhecimento sobre a dinâmica populacional e a formação das diferentes geograficidades contribui, em larga medida, para o entendimento dos problemas, tais como: déficit de moradia, carência de infra-estrutura e equipamentos urbanos em determinados locais da cidade, ocupações irregulares (assentamentos e favelas), crescimento do setor informal, entre outros. Estes problemas são aqueles com os quais nos defrontamos atualmente e que requerem políticas públicas voltadas para as necessidades de rearrumação dos arranjos geográficos do município. A geografia, utilizando e interpretando diversas linguagens, mapas, gráficos, tabelas e imagens conduz a uma leitura da paisagem e representação das geograficidades. “Isso ocorre quando a paisagem se revela em sua essência ao corpo que a experiência como espaço-tempo-mundo, o espaço aparecendo como a forma de existência do homem-no-mundo.” (MOREIRA, 2004, p. 194). Para a apresentação dos conteúdos que se referem à dinâmica populacional, em escala local, procuramos organizar informações e dados relevantes do município que permitissem a compreensão dos movimentos e deslocamentos populacionais nessa escala, principalmente, aqueles cujos resultados foram fundamentais na organização do espaço e na geograficidade do município. 18 O material didático produzido a partir deste tema, teve por finalidade apresentar e permitir a análise da evolução demográfica da população em diversas escalas (municipal, estadual, regional, nacional). Disponibilizando dados principalmente do período de 1970 a 2000, que enfocam as transformações capitalistas no campo (modernização, mecanização e mudança de culturas), intensificadas a partir desse período que, aliadas à atração ideológica exercida pelas cidades, provocaram um grande fluxo migratório em direção aos centros urbanos. Apresentamos também orientações pedagógicas para a discussão dos fatores e conseqüências desencadeadas pelos referidos processos na organização da paisagem e dos arranjos territoriais do município. Para desenvolver o tema foi necessário coletarmos dados que permitissem a verificação dos diversos aspectos relacionados à dinâmica populacional, entre eles, o povoamento, a migração, a evolução da população urbana, a questão da segurança pública, a qualidade de vida, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em diversas escalas geográficas e a composição etária da população dos municípios. Ao tratarmos das questões sobre o povoamento, as migrações e a evolução da população urbana, reconhecemos a complexidade das mesmas que explicam a dinâmica da população. A humanidade dispõe da possibilidade de deslocamento nos diferentes territórios da superfície da Terra e vários motivos impulsionaram os homens a migrarem, como a escassez de alimentos, a busca de alternativas de sobrevivência, a conquista de novos territórios, crises econômicas, fugas políticas e religiosas e outros. As migrações acontecem desde a pré-história e continuam ocorrendo até nossos dias, permitindo o povoamento do mundo, a expansão, disseminação ou mesmo a redução e fusão das línguas, das etnias, assim como do próprio conjunto de conhecimento produzido pelos distintos grupos humanos. Os movimentos migratórios têm se realizado de forma contínua, entretanto, em cada período histórico, diferentes motivos direcionaram seus fluxos e contingentes populacionais. A partir deles, nos propusemos a investigar e apresentar os processos da formação sócio-histórica-territorial do município e seus fluxos migratórios desde os primeiros moradores até a atualidade. No que se refere à apresentação dos processos de ocupação e organização do espaço urbano do município, evidenciou-se a segregação sócio- 19 espacial e os mecanismos e conseqüências desse processo que se espacializam na paisagem e nos arranjos espaciais. No material didático destacou-se um dado interessante para análises e comparações em sala de aula, a existência de municípios que tiveram uma diminuição da sua população, enquanto outros registraram aumento expressivo, sendo este último o caso de Londrina. Portanto, o ritmo de crescimento populacional se comportou de maneira distinta nos municípios do Paraná, dependendo das oportunidades de emprego e de geração de riquezas e de equipamentos urbanos que cada localidade ofereceu. Londrina atraiu e atrai pessoas de outros municípios e até de outros estados, enquanto Sertanópolis, apenas para citar um exemplo, a partir da década de 1970 teve sua população bastante reduzida. Essa informação fez com que os alunos expusessem suas opiniões e participassem das aulas com novos dados de outros municípios vizinhos que conheciam, indagando e acrescentando informações sobre situações vivenciadas por eles próprios ou parentes e amigos que vivem em outras localidades próximas ou distantes. É necessário frisar que os fluxos migratórios estão relacionados às transformações econômicas, políticas, técnicas, culturais e geográficas que se territorializam, ou seja, materializaram-se na organização de novas formas paisagísticas no espaço-tempo. A partir da apresentação de fatores ligados às condições naturais, aos arranjos espaciais e à dinâmica populacional, estabelecemos correlações que interferiram no processo de ocupação dos municípios. Assim como foi possível identificar a influência das políticas públicas na entrada e saída da população do município, as investigações possibilitam a análise das tendências atuais dos deslocamentos populacionais correlacionadas com os arranjos espaciais. A segurança pública foi outro aspecto inserido no material didático, a partir dos estudos sobre a dinâmica populacional, objetivando a compreensão sobre as mudanças que ocorreram nos hábitos da população das cidades, independentemente de seu porte, provocadas por situações de violência, ou por manifestações cada vez mais agressivas da insatisfação e exclusão de grupos sociais, que são amplamente disseminadas pela mídia, geralmente de forma sensacionalista e indiscriminada. Em parte, isso se explica porque a base do processo capitalista está na concentração do capital em poucas mãos, caracterizada pela exploração do 20 trabalho, extração de mais valia, divisão de classes, e é nas cidades, espaço comum de pobres e ricos, onde as desigualdades tornam-se mais evidentes. Principalmente, aquelas cidades que, graças a sua posição econômica e geográfica, tornaram-se pólos de atração de milhares de pessoas, incluindo pobres, expulsos do campo e de outras cidades pela modernização da agricultura e dos serviços. Partindo dessas considerações, procurou-se apresentar dados sobre a espacialidade da violência, assim como possibilitar a discussão dos fatores por ela responsáveis. Utilizamos também, para efeito de análise e comparação, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) que é um parâmetro que permite avaliar o nível de desenvolvimento de um país, região ou cidade e a qualidade de vida da população com base em indicadores socioeconômicos como: escolaridade, renda per capita e longevidade. Este índice é estabelecido e utilizado pela Organização das Nações Unidas (ONU) desde 1990. No trabalho didático produzido foram utilizados dados referentes ao melhor e ao pior IDH para as diversas escalas do território brasileiro, possibilitando a comparação entre eles. O objetivo da utilização dos dados e mapas disponibilizados, principalmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social, foi relacionar o IDH do Paraná com outros estados, enfatizando os motivos dessa geograficidade e fazer uma análise comparativa da territorialidade desse índice nas diferentes regiões do estado, tendo como parâmetro o IDH municipal. Para entender o item “renda per capita”, foram sugeridas algumas questões com o intuito de chamar a atenção, tanto dos professores como dos alunos, para a análise do seu cotidiano sócio-espacial, principalmente no que tange à realidade socioeconômica do município. O mesmo procedimento foi utilizado para a exploração dos dados e dos conteúdos sobre a expectativa de vida, fecundidade e mortalidade infantil. A partir de questões direcionadas aos alunos, buscou-se atingir um nível de entendimento sobre indicadores que representam características importantes sobre o comportamento da população do município com a finalidade de compará-las e relacioná-las com outras escalas de análise. E ainda pretendendo despertar a compreensão da importância da escola, da educação como elemento fundamental para o desenvolvimento da nação, 21 para as realizações que pretendem mudanças na qualidade de vida e por justiça social, foram propostas várias questões com o objetivo de proporcionar um repensar sobre o papel social da escola e sobre as políticas educacionais no âmbito das escolas públicas. Para a análise da composição etária e da evolução do crescimento da população foram utilizados gráficos conhecidos como pirâmides etárias ou pirâmides de idades. A partir da apresentação das pirâmides etárias do Brasil, do Paraná e do município, pretendeu-se destacar os números da natalidade, da mortalidade infantil e da expectativa de vida dessas populações e, então, possibilitar a comparação da evolução da pirâmide etária em diversas escalas temporais e espaciais, bem como o estabelecimento das hipóteses que explicam as respectivas diferenças. Os conteúdos introduzidos com o tema sobre a dinâmica populacional devem induzir nossos alunos a refletirem e concluírem que o futuro de um país ou região depende de um bom planejamento e de políticas demográficas bem estruturadas para poder sobreviver e conseguir se desenvolver economicamente. A abordagem e o estudo do tema é fundamental para que possamos entender e desvendar as complexidades que produzem a ordenação espacial da sociedade atual. O ir e vir da população em busca de sobrevivência e de um mundo melhor é o que impulsiona esse dinamismo populacional e expressa a sociedade onde estamos inseridos. Acreditamos que relacionar os conhecimentos dos estudantes no âmbito da escola e da sala de aula e também aqueles que cotidianamente são adquiridos através dos meios de comunicação é de extrema importância sobretudo no que se refere à construção de conceitos geográficos, o que permite o entendimento da realidade que, por sua vez, pode auxiliar na atuação dos professores e alunos na produção de um espaço menos excludente. . As experiências da implementação do material didático em sala de aula Em sala de aula, no decorrer do ano letivo de 2008, tivemos oportunidades de colocar em prática a proposta deste material didático. As idéias que fundamentaram a construção deste material, assim como, o engajamento na 22 reflexão contínua sobre nossa própria prática pedagógica nos auxiliaram a repensar nosso planejamento, a elaboração dos planos de aulas, principalmente, no que se refere à seleção e ao tratamento dado aos conteúdos da disciplina de geografia. É importante lembrar que, a metodologia de ensino proposta neste material didático tem como objetivo permitir que os alunos compreendam o processo de transformação do espaço a partir das transformações ocorridas na realidade em escala local. A contextualização dos conteúdos geográficos devem fornecer os conhecimentos necessários para “[...] situá-lo historicamente e nas relações políticas, sociais, econômicas e culturais, em manifestações espaciais concretas, nas diversas escalas geográficas” (SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, 2008, p. 32). Ao apresentarmos aos alunos diversos dados, mapas, figuras ou outros recursos disponíveis sobre o município, após uma série de indagações e questionamentos que os levaram a refletir sobre o seu cotidiano e seus espaços de vivência, percebemos que estes passam a ficar intrigados, críticos e reflexivos, atitudes estas que, para nós professores, foram extremamente novas, uma vez que o desinteresse pelos conteúdos escolares é fato tantas vezes mencionado nas reuniões pedagógicas e objeto de estudo de diversos teóricos que escrevem sobre a educação. Obviamente que não motivamos e atingimos todo o grupo com tal interesse, mais foi notória a participação e o envolvimento de uma significativa parcela da turma. A relevância da proposta também fica exemplificada pelo melhor desempenho dos alunos quando se dá a avaliação dos conteúdos que foram estudados e relacionados com a realidade do espaço local, isso porque estes permitem uma apropriação dos conhecimentos com maior facilidade e clareza. Considerando as experiências ao utilizarmos o material didático e que norteou nossas atividades e práticas em sala de aula e, dependendo das séries com quais trabalhamos e dos conteúdos a serem desenvolvidos, o professor poderá dar o enfoque e o tratamento que considerar necessário para que a compreensão dos conteúdos geográficos e a construção dos conceitos básicos da disciplina possam ser mais facilmente apreendidos. Sob essa perspectiva, o professor poderá enfatizar a abordagem dos fatos e fenômenos na escala local ou utilizá-los como material complementar aos conteúdos apresentados no livro didático nas escalas 23 regionais, nacionais e mundiais. Segunda Callai, autora citado nas Diretrizes Curriculares de Geografia do Paraná: [...] As explicações para entender a realidade estudada exigem um vaivém constante entre os diversos níveis [escalas] de análise, em que se cruzam as interpretações que decorrem do local ou do regional, considerados em sua totalidade, e os níveis nacional e internacional. (CALLAI, 2003, p. 61 apud SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, 2008, p. 34). À medida que incentivarmos os alunos à constantes reflexões sobre os diversos aspectos e elementos da organização dos diferentes espaços mundiais, não podemos esquecer o que nos diz Santos (1996, p. 252) “Cada lugar é, à sua maneira, o mundo” Assim, sempre que necessário, retomamos aspectos e elementos do espaço local (local/global/local) e os conduzimos a uma análise mais ampla do espaço geográfico, do processo de globalização e, consequentemente, damos um maior significado aos conteúdos do ensino de geografia. CONSIDERAÇÕES FINAIS A produção do material didático em foco nos permitiu ampliar conhecimentos sobre a geografia do município, desde o início de sua ocupação e inserção no modelo capitalista econômico brasileiro e mundial, até a sua consolidação como pólo regional no norte do Paraná e os arranjos espaciais locais que se estabeleceram para manutenção e desenvolvimento da sua economia, configurando características sociais, políticas e culturais específicas e distintas. Esses conhecimentos, ao serem disseminados nos levam a resultados que incentivam à constante pesquisa e atualização, facilitam o trabalho e a prática pedagógica e a compreensão do espaço geográfico, dos conceitos e das relações sócio/espaciais nas diversas escalas geográficas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERTANINI, Tonino. O “espaço do corpo” e os territórios da vida cotidiana. Seleção de textos, São Paulo, n. 10, p. 111-141, jun. 1985. 24 CALABI, Donatella; INDOVINA, Francesco. Sobre o uso capitalista do território. 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