1 A influência da Revolução Francesa no debate sobre a

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A influência da Revolução Francesa no debate sobre a educação como política
pública estatal e a democratização do ensino no Brasil.
RESSINETI, Telma Renata. [email protected]
COSTA, Áurea de Carvalho. [email protected]
Eixo 4: Pesquisa, Políticas Públicas e Direito à Educação
MODALIDADE: Pôster.
Resumo: Pretende-se, neste artigo, discutir a influência da revolução francesa no
debate ao direito à educação pública, gratuita e laica no Brasil. O texto é composto por
duas partes: primeiramente discorremos sobre a história do período revolucionário
francês e em que momento a educação tornou-se estatuto de políticas de Estado,
para, posteriormente analisarmos a influência exercida no debate da democratização
da educação pública no Brasil. Os intelectuais franceses que pensaram a educação
nacional fomentaram importantes reflexões que até hoje tem contribuído para a
elaboração de um programa educacional para a classe trabalhadora. Temos como
hipótese que a classe hegemônica no poder cedeu/cede o direito à educação à classe
trabalhadora em conjunturas específicas, tais como: formação de força de trabalho,
propagação da ideologia da classe burguesa. Este artigo foi elaborado tendo como
opção metodológica a abordagem qualitativa e como procedimentos a análise
bibliográfica. Nosso referencial teórico-metodológico é o materialismo histórico e
dialético.
Palavras-Chave: Políticas de Estado, Direito à Educação Pública, Revolução
Francesa.
INTRODUÇÃO
O ideário da escola pública, universal, laica, obrigatória e gratuita, hoje propagado
como sustentáculo da democracia e requisito indispensável à consecução da cidadania,
incorporou em sua formulação a herança das consignas da Revolução Francesa:
liberdade, igualdade e fraternidade, embora saibamos que, para além do debate sobre
expansão do direito à educação elementar como direito humano, jamais esse ideário
deixou de justificar uma apropriação da educação escolar, pela sociedade capitalista,
como estratégia para responder às demandas do modo de produção capitalista, que se
relacionam à formação para o trabalho, o desenvolvimento da racionalidade e da
civilidade, nesse novo contexto:
Chegamos agora ao segundo ramo de ensino que distinguimos: o
ensino da natureza. Vimos como esse ensino adquiriu seu lugar em
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nosso sistema escolar: foi por razões de ordem utilitária e
profissional. A importância crescente da vida econômica é que fez
sentir, na metade do século XVIII, a necessidade de uma nova
cultura, que preparasse melhor os jovens para as profissões
industriais, da quais o humanismo só poderia desviá-los (DURKHEIM,
1995, p. 314).
A revolução francesa foi a expressão máxima do ascenso da classe burguesa,
sendo
reconhecida
amplamente
pelos
historiadores
como
marco
da
idade
contemporânea, tendo em vista a transformação nas forças produtivas de ordem
quantitativa e qualitativa, constituindo-se como momento de passagem da produção em
corporações de ofício para a industrial, demandando uma nova forma de qualificação
da força de trabalho na escola, que se converteu na forma histórica mais desenvolvida
do ensino naquele momento, por isso, se convertendo em objeto de políticas estatais:
Na segunda metade do Setecentos assiste-se ao desenvolvimento da
fábrica e, contextualmente, à supressão, de fato e de direito, das
corporações de arte e ofícios, e também da aprendizagem artesanal
como única forma popular de instrução. Este duplo processo, de
morte da antiga produção artesanal e de renascimento da nova
produção de fábrica, gera o espaço para o surgimento da moderna
instituição escolar pública. Fábrica e escola nascem juntas. As leis
que criam as escolas de Estado vem juntas com as leis que suprimem
a aprendizagem corporativa [...] (MANACORDA, 1992, p. 249).
Na década de 1870, a França pré-revolucionária encontrava-se em situação
econômica de recessão, devido aos fatores naturais como tempestades, furações,
chuvas de granizo, que alteraram o ritmo da agricultura e aos elevados dispêndios que
comprometeram as finanças do reino com a Guerra dos Sete Anos (1756-1763) – que
resultou em derrota - e à participação no processo de independência dos Estados
Unidos (1776-1783). Como resultado das adversidades enfrentadas pelos franceses
houve a redução das rendas dos setores burgueses, trabalhadores urbanos (sansculottes), e camponeses, os quais eram os únicos a contribuir com as receitas públicas
por meio do pagamento de impostos. Na tentativa de reverter esse impasse os
ministros do rei Luis XVI propuseram a inclusão dos nobres na condição de
contribuintes, ao par daqueles setores que compunham o Terceiro Estado. Tal medida
agravou a crise política, decorrente do enfrentamento do Estado com o clero e a
nobreza que, apesar de ser base de apoio estatal se recusavam a sustentá-lo
financeiramente. Diante da conjuntura, o rei convocou Estados Gerais formados por
representantes das três ordens do reino, quais sejam: Primeiro Estado: clero, Segundo
Estado: nobreza e por fim, Terceiro Estado: burgueses, trabalhadores urbanos e
camponeses. Para a nomeação dos delegados aos Estados Gerais cada ordem
organizou assembleias de base e redigiram os cahiers; que constituíam em
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documentos sistematizadores das queixas de todos os setores, mas o documento do
Terceiro Estado contemplava prioritariamente as demandas burguesas, revelando uma
desigualdade na correlação de forças no interior do próprio setor, o que viria a gerar
tensões e cisões (SOBOUL, 1981). Havia um consenso entre os setores do Terceiro
Estado quanto às queixas contra o absolutismo, a favor de uma Constituição que
limitasse os poderes do rei, a reivindicação de uma reorganização da política fiscal, a
reforma da justiça e da legislação penal; no entanto, divergiam no que diz respeito à
igualdade de direitos, sendo a educação um dos pontos de polêmica (LOPES, 2008).
Na reunião dos Estados Gerais, o Terceiro Estado reivindicou o direito à votação
censitária e o aumento do número de deputados. Alguns deputados do baixo clero e da
nobreza liberal identificavam-se com as reivindicações do Terceiro Estado apoiando a
votação censitária e, depois de algumas semanas de embates as três ordens se uniram
numa só assembleia que logo se declararam “constituintes”. O rei Luis XVI cedeu, vindo
a dobrar o número de deputados do Terceiro Estado. Iniciou-se a Revolução no plano
jurídico. Luis XVI convocou o exército para dissolver a assembleia e iniciou-se nos
campos e nas cidades revoltas populares, conhecidas como o “grande medo”. Foi em
tal contexto que aconteceu a queda da Bastilha em 14 de julho de 1789 – evento
considerado o marco inaugural da própria revolução. A Assembleia Nacional, composta
por deputados das três ordens se autoproclamou Assembleia Constituinte (1789-1791)
e a educação pública foi ponto de discussão na Assembleia Constituinte. Talleyrand,
membro do comitê de constituição, apresentou o Rapport sobre a instrução pública,
com os principais fundamentos para a democratização da educação escolar, que se
constituem em base para toda a construção teórica em defesa da escola pública,
universal, laica, obrigatória e gratuita. No referido documento propunha-se a instrução
universal para ambos os sexos, no entanto, apenas a instrução primária seria gratuita;
os cidadãos nesse nível de ensino seriam ensinados a conhecer a constituição,
defendê-la e aperfeiçoá-la, o que consiste na chamada formação para a cidadania, na
conjuntura do nascimento de um novo modelo de Estado: o nacional. Tratava-se de
educar para pensar a sociedade, bem como de uma instrumentalização da escola para
a reprodução de ideologias e relações de sociabilidade que viriam a se configurar como
burguesas. Os outros níveis de escolarização destinar-se-iam a um determinado
número de pessoas, selecionados conforme seus talentos, e/ou que não precisassem
trabalhar. Por fim, o último grau de instrução seria o Instituto Nacional de Instrução,
com a finalidade de formar a elite governante. E os professores em todos os níveis de
ensino seriam nomeados pelo rei (LOPES, 2008). Salientamos dois aspectos
importantes para pensar a democratização do ensino até os dias atuais. O primeiro é
que, na medida em que a escola é compreendida como lócus de qualificação da força
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de trabalho para as demandas do mercado e como estrutura com potencial para a
reprodução de ideologias da classe hegemônica, tal democratização passa a ser
assumida como plataforma da burguesia – embora esta persiga o controle sobre o que
e o quanto deve ser ensinado à classe trabalhadora, de modo que o segundo aspecto
refere-se justamente à universalização do ensino somente no nível elementar. Em
tempo, no caso brasileiro, por exemplo, o ensino obrigatório, gratuito é direito público
subjetivo, isto é, que pode ser reivindicado em juízo pelos representantes legais da
criança garantido pela Lei de Diretrizes e bases vigente, somente para a faixa etária de
6 a 14 anos. No contexto da Revolução Francesa, os representantes dos três Estados
criticavam a ausência de políticas públicas estatais para a educação, que era oferecida
pelas congregações religiosas, predominantemente, e reivindicavam a educação
pública nacional, sem a interferência do Rei. Quando foi assinada a constituição por
Luis XVI, instalando a monarquia constitucional na França, a Assembleia Constituinte
foi dissolvida sem ter aprovado a proposta de Talleyrand. E uma vez empossada a
Assembleia Legislativa, nomeou-se um Comitê de Instrução Pública, sob presidência de
Marquês de Condorcet, com a finalidade de elaborar um projeto de organização do
ensino público nacional na França. O Rapport de Condorcet escrito pelo comitê de
Instrução Pública tinha convergências com o de Talleyrand na função social da
educação pública estatal de distribuição dos sujeitos na divisão social do trabalho,
servindo para colocar cada um no seu lugar embora o último relatório tivesse avanços
em relação ao anterior (DURKHEIM,1995). O importante a pontuar é que a educação
pública estatal é apresentada, desde o início, como instituição para adaptação dos
indivíduos à sociedade de classes, daí a justificativa de um processo de
democratização do ensino circunscrito aos interesses burgueses de controle e
exploração da classe trabalhadora. O Rapport de Condorcet foi apresentado na
Assembleia Legislativa no ano de 1792, mas não chegou a ser discutido devido à
situação de instabilidade da França. No século XIX, o mesmo plano foi abordado como
modelo em muitos países, dentre eles, o Brasil. Condorcet (2008) era defensor de uma
escola pública, gratuita em todos os níveis, laica, única - para ambos os sexos e
universal, de acordo com as possibilidades materiais da Nação. Para tanto, nas
condições daquele momento apenas o ensino primário seria efetivado e, nessa etapa
de instrução, deveriam ser ensinadas às crianças e aos jovens as habilidades de
leitura, escrita, aritmética, bem como os conhecimentos sobre a Nação, a descrição dos
produtos produzidos no país e entendimento sobre as leis promulgadas. A instrução
para além do nível primário seria para preparar os jovens para algumas profissões.
Nesse sentido, o ensino secundário seria para ajudá-los a suportar a monotonia do
trabalho fabril. O terceiro nível de instrução seria de responsabilidade dos Institutos e o
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saber científico seria ensinado de uma forma mais desenvolvida. Por fim, os alunos
mais talentosos poderiam concorrer aos níveis mais elevados de ensino, tais como os
liceus – destinados a produção e divulgação do conhecimento mais elaborado. Caso as
crianças e os jovens da classe trabalhadora tivessem seus talentos naturais
desenvolvidos, caberia ao Poder Público financiá-los. A rede escolar deveria ter
autonomia dos poderes do Estado para que não cedesse às pressões políticas e
econômicas. Para Condorcet (2008) caberia ao Estado a intervenção na criação de
escolas, a remuneração dos professores e a escolha dos livros didáticos nos três
primeiros graus de ensino; nos liceus os professores teriam o poder de decidir sobre
que material pedagógico utilizar em aula. Por fim, o trabalho de fiscalização e regulação
deveria ser feito pelo nível imediatamente superior. No topo da estruturação do ensino
haveria a Sociedade Nacional das Ciências e das Artes, formada por cientistas de
diversas áreas. Essa instância atuaria como elemento aglutinador dos diversos níveis
de ensino, e divulgaria didaticamente o conhecimento produzido academicamente. Na
gênese da escola pública na França, na conjuntura revolucionária, a escola deveria ser,
necessariamente, seletiva, pois a defesa não era por uma instrução universal nos
quatro graus de ensino, mas a inserção das crianças do Terceiro Estado na pirâmide
educacional mediante o mérito, pois, “O que essa pedagogia tem de mais
característico, aliás, é o sentido social que é sua mola. Trata-se, antes de tudo, de por a
criança em condição de exercer suas funções na sociedade (DURKHEIM, 1995, p.
270). Condorcet reconheceu a igualdade de direitos sociais e oportunidades, no
entanto, entendia que a desigualdade entre os homens seria decorrente da Natureza,
assim, os indivíduos utilizam suas aptidões de maneiras diferenciadas, segundo sua
capacidade; nesse sentido, a desigualdade deriva da natureza e não da propriedade
privada que gera a desigualdade na apropriação dos direitos políticos e sociais. Essa
expressão da naturalização da desigualdade contribuiu e ainda contribui na
contemporaneidade para tornar a escola um lócus de distribuição dos indivíduos na
divisão social do trabalho, em que apenas os alunos mais aptos, segundo os critérios
valorizados pelo sistema educacional estatal destinam-se a frequentar os níveis mais
elevados de ensino. O rei Luis XVI formou um Ministério Girondino, os direitos políticos
foram reservados aos proprietários e foi aprovada a Lei Chapelier que proibia o direito
de greve. Somou-se a essa conjuntura o fato de a França ter perdido as primeiras
batalhas contra as potências estrangeiras que queriam restabelecer o antigo regime e a
monarquia foi responsabilizada pelos súditos por pactuar com o inimigo. A população
de Paris ocupou o palácio Real de Tueileries, destituindo e aprisionando Luis XVI,
assim foi derrubada a monarquia na França e o Ministério Girondino foi investido de
seus poderes. Esse período é caracterizado por lutas entre os Girondinos e os
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Jacobinos com vistas ao poder do aparelho de Estado. Os Jacobinos defendiam a
participação dos trabalhadores no processo revolucionário como um meio de ganhar a
luta política. A cisão exacerbou-se durante o processo de Luis XVI; os Girondinos eram
contrários a sua morte, e, em oposição os Jacobinos se proferiam a favor da pena
capital. No entanto, em todos os momentos optou-se pela continuidade do Comitê de
Instrução Pública e os planos elaborados tiveram como base o plano de ensino de
Condorcet. Lanthenas, deputado da Convenção Nacional Girondina e membro do
Comitê de Instrução Pública, elaborou um documento com foco na gratuidade e
universalidade do nível primário em que o objetivo maior das instituições deveria ser
ensinar a todos os cidadãos a língua francesa para promover a unidade nacional. O
documento foi rejeitado pela Convenção Nacional devido ao fato de demandar o
dispêndio de grandes montantes de verbas estatais pelo governo republicano para
promover a universalização do acesso ao nível primário. Após a morte de Luis XVI
inicia-se a convenção Jacobina, em que tentou governar tanto para a burguesia quanto
para os trabalhadores do campo e da cidade. Na área social foram promulgadas leis
atendendo às reivindicações dos camponeses, referentes à forma de venda dos bens
dos emigrados, a supressão sem indenização dos tributos feudais, dentre outros. A
democratização da educação pública, gratuita, laica e obrigatória foi uma plataforma
política utilizada pela burguesia jacobina para conseguir o apoio dos trabalhadores, já
que era uma reivindicação desde o regime monárquico e uma via privilegiada para a
classe burguesa legitimar o seu poder, produzindo consensos sobre temas que lhe
interessavam, mas também fazendo raras concessões. A Convenção sancionou a
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1793, afirmando em seu artigo 22,
o direito à instrução. No mesmo ano foi votada a Constituição de 1793 fixando as
características de um regime democrático representativo mediante o voto universal. O
direito à instrução constou no artigo 122. Dentre os vários projetos debatidos na
Convenção ao longo do período Jacobino, destaca-se o “Plano de Educação Comum”
de Louis-Michel Lepeletier de Saint-Fargeau, apresentado por Robespierre em julho de
1793. Segundo o projeto, as crianças e jovens frequentariam a escola primária,
controlada pelo Estado, obrigatória para todos, e em regime de internato. Os conteúdos
pedagógicos seriam os já propostos por Condorcet, a obrigatoriedade seria limitada a
faixa etária de seis a doze anos para os meninos e de cinco a onze anos para as
meninas. A gratuidade das instituições educativas dar-se-ia mediante uma contribuição
paga pelos pais ricos, pelo rendimento do trabalho das crianças internas, e por uma
complementação provida pelo Estado. O ensino deveria ser laico. Após sucessivos
debates foi aprovada a proposta de Lepeletier. No entanto, outros planos educacionais
surgiram, sendo alguns contrários às ideias do primeiro, ao incentivarem a livre
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iniciativa e a concorrência entre as escolas. A Convenção Jacobina, numa tentativa de
conciliação de classes, aprovou projetos conflitantes, porém, nenhum foi posto em
prática. A política agregadora da Convenção Jacobina não logrou êxito tanto
internamente, - enfrentou uma oposição - quanto externamente, não conseguindo
impedir a extensão da guerra civil. Houve insurreições federalistas feitas por girondinos
e monarquistas: os trabalhadores do campo e da cidade reivindicavam o abastecimento
dos produtos de primeira necessidade. A França enfrentava a guerra externa contra a
coligação Inglaterra, Áustria, Prússia, Holanda e Espanha e, diante dessa conjuntura,
os Jacobinos tiveram que aceitar a proposta popular de economia dirigida reivindicada
principalmente pelos sans-culottes. Nesse momento, todo o poder da Convenção
Nacional foi centralizado no Comitê de Salvação Pública, cuja Convenção elegera
Robespierre como líder. A Constituição, os direitos políticos e sociais foram suprimidos.
Foi instituído o Tribunal Revolucionário para julgar os opositores da Revolução. Iniciouse o “Período do Terror”. Ao final de 1793 diminuiu-se o tabelamento dos preços dos
gêneros de primeira necessidade. Progressivamente, os Jacobinos assumiram aos
princípios econômicos do liberalismo. Por fim, os Girondinos retomaram o poder
mediante um golpe de Estado. A “Convenção Termidoriana” modificou e reorganizou
todo o aparelho administrativo. Foi aprovada uma nova Constituição (1795); o sufrágio
universal foi abolido e apenas os proprietários passaram a ter direito ao voto para
eleger os ocupantes do aparelho de Estado. No setor da educação, a Constituição
consagrou seis artigos, marcados pela não-obrigatoriedade do poder público em prover
educação e a coexistência de escolas públicas e particulares, aprofundando assim, a
desigualdade de instrução entre as diferentes classes sociais. Desde então, apenas os
meninos teriam direito à instrução primária, mediante um pagamento - já que o salário
do professor fora suprimido. O acesso universal à escola primária, laica, se
institucionalizou na III República, após 1870, momento em que eclodiu a guerra francoprussiana, a criação da nação alemã e a comuna de Paris (março a maio de 1871).
Nessa conjuntura, o Estado francês promulgou leis com vistas a instituir um ensino
primário, obrigatório, gratuito e laico para as crianças de seis a doze anos e investiu na
construção de estabelecimentos de ensino. Essa obra estava inserida em um projeto
maior: enfrentar a crise de hegemonia do Estado burguês fazendo algumas concessões
à instrução da classe trabalhadora e propagar a ideologia da classe hegemônica e, para
tanto, o Estado francês centralizou a elaboração do material didático e o distribuiu a
todas as regiões. A revolução política burguesa da França no período entre 1789 a
1874 trouxe consequências decisivas para o desenvolvimento econômico e social do
país. A revolução francesa influenciou os acontecimentos mundiais naquele período
histórico e contribuiu no decurso dos movimentos nacionais e revolucionários do século
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XIX nas colônias localizadas na América Latina, com destaque para o Brasil, assim
como na discussão acerca do direito à educação.
1) O legado de Condorcet e sua influência no debate da democratização da
educação pública no Brasil
As ideias iluministas, as quais serviram de aporte para a revolução burguesa,
eram aprendidos pelos filhos da elite brasileira que estudavam em universidades
francesas, inglesas e portuguesas; e os livros chegavam ao Brasil por meio de navios
com mercadorias contrabandeadas. Somou-se a isso, o fato de a colônia estar em uma
conjuntura de crise econômica com aumento de impostos na maioria das capitanias,
contribuindo para a reverberação de movimentos políticos: Inconfidência Mineira
(1789), Conjuração Baiana (1798) e Revolução Pernambucana (1817). No período
imperial, a discussão sobre o direito social à educação pública, gratuita e laica foi
realizada pelo Comitê de Instrução Pública eleito pela Assembleia Constituinte e
Legislativa de 1823 e tiveram como base o plano integral de ensino francês
apresentado por Condorcet à assembleia legislativa no ano de 1792. Martim Francisco
Ribeiro de Andrada elaborou um plano de educação aos moldes franceses para a
Província de São Paulo em 1816, no entanto, modificou as ideias de acordo com o
contexto brasileiro, não incluindo a palavra „igualdade‟, sequer no plano jurídico.
Apresentou o documento à Assembleia Constituinte, mas não foi discutido. Já, o projeto
intitulado “Projeto de Reforma Januário da Cunha Barbosa” foi elaborado com vistas à
organização e criação de um sistema nacional de ensino, também realizado sob o
modelo de Condorcet (XAVIER, 1992). Na constituinte de 1823, uma comissão de
instrução pública sugeriu que se estimulasse a elaboração de um tratado completo de
educação, por intelectuais brasileiros. Mediante as pressões para que a Comissão
apresentasse um plano, Gomide, um de seus participantes apresentou um parecer
elogioso do documento “Memória sobre a reforma dos Estudos Menores da Província
de São Paulo”, de autoria de Martin Francisco Andrada e recomendou a sua impressão,
que jamais se concretizou, por motivos de divergências políticas, não voltando a ser
debatido (CHIZZOTI, 1995). Tal qual na França, para a concretização do direito à
educação pública de acordo com o plano integral de ensino seria necessário um
dispêndio de investimento público a curto, médio e longo prazos. Então, a classe
hegemônica no aparelho de Estado decidiu não votar um plano de educação. A mesma
Comissão de Instrução Pública ofereceu à Câmara dos Deputados um novo tratado de
educação, mas, destinado especificamente à educação primária. Após várias emendas
o projeto foi lido e aprovado, consistindo na lei 1º outubro de 1827, a primeira lei sobre
a instrução pública do império do Brasil. No entanto, os objetivos proclamados na letra
da lei não corresponderam aos esforços empreendidos pelo governo para a realização
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do direito à educação. A constituição de 1824 estabeleceu a gratuidade da educação
sem qualquer outra regulamentação da matéria. O Ato Adicional de 1834,
regulamentado pela lei n. 16, de 12 de agosto, “[...] veio apenas para legalizar uma
situação de fato – a omissão do poder central em relação à educação popular” (Xavier,
1992, p. 63), pois descentralizou o poder político para as províncias, as quais teriam
autonomia para legislar sobre economia, a justiça e a educação, com a atribuição da
criação das instituições escolares. Durante o período imperial, houve a discussão sobre
a gratuidade, porém, não havia uma política pública que sistematizasse o ensino no
território nacional, de modo que a gratuidade era apenas formal, limitada a quatro anos
de instrução para crianças em cidades mais populosas. Aquelas que viviam mais
distantes da estrutura oferecida pelo Estado podiam ser atendidas nas paróquias. Na
Primeira República, houve retrocessos no que tange a gratuidade e obrigatoriedade, e
não houve avanço na universalização da instrução, mas esboçou-se uma primeira
organização de um sistema público de ensino nos níveis primário e secundário,
permanecendo a convivência de instituições públicas e privadas de ensino. Não estava
prevista a obrigatoriedade nem para o Estado nem para a família. Na conjuntura do
Estado Novo, os “Pioneiros da Educação Nova” reivindicaram laicidade, gratuidade,
obrigatoriedade e coeducação, progressiva extensão do ensino obrigatório até 18 anos
- os mesmos princípios educacionais da Revolução Francesa. A educação foi assumida
na letra da lei como dever do estado na Constituição de 1946, mas na medida de suas
possibilidades. Os níveis ulteriores ao primário seriam ofertados gratuitamente somente
aos extratos mais pauperizados da população, na faixa etária de 7 a 12 anos. Contudo,
houve avanço na sistematização da educação sob a forma das “Leis Orgânicas do
Ensino”. A primeira “Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional”, Lei 4024/61
buscou legislar sobre todos os níveis de ensino, ratificou a convivência de sistemas
público e privado de ensino, as escolas confessionais, o Estado impôs o ensino
primário como obrigação da família, suspensa em casos de pobreza, doença, falta
vagas. Assim, no século XX a luta pelo direito à educação foi apropriada tanto sob a
justificativa de ser estratégica para consolidar a cidadania, como direito, quanto como
questão estratégica de qualificação massiva da mão de obra (HORTA, 1998).
Considerações Finais
Os intelectuais burgueses que pensaram a educação do povo na conjuntura da
Revolução Francesa, dos quais destacamos Condorcet pela sua influência nos
primeiros debates, no Brasil, fomentaram importantes reflexões, que até hoje têm
contribuído para a elaboração de um programa educacional para a classe trabalhadora
a partir de alguns questionamentos. No que tange à gratuidade e à universalidade, as
disputas ideológicas se dão em torno de determinadas questões como, por exemplo,
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qual é a população alvo da educação: somente as crianças ou também os jovens e
adultos? Os nativos ou também os estrangeiros, as minorias étnicas, os povos de
regiões distantes e isoladas ou somente os moradores de locais alcançados mais
facilmente pelo aparelho estatal? Qual é o critério de distribuição do direito ao ensino
gratuito: a faixa etária, a condição socioeconomia ou o estatuto de cidadania, que é
universal? Qual é a concepção de gratuidade: apenas a garantia de vagas gratuitas em
instituições de ensino públicas ou privadas ou garantia também de condições de
acesso, frequência, permanência e conclusão dos estudos e em que nível de
terminalidade? No que tange à obrigatoriedade da educação, a quem compete tal
responsabilidade: ao Estado, ou deve ser compartilhada com a família, a comunidade?
O seu financiamento deve ser exclusivo da iniciativa privada, ou do Estado ou, ainda,
compartilhado? Quais os instrumentos legais disponíveis para a garantia do
cumprimento da obrigatoriedade? No que tange à laicidade, hoje o debate se dirige a,
pelo menos três dimensões: uma escola alheia à discussão religiosa, ecumênica ou
aquela que oportunize uma discussão sobre a transcendência do ser humano? Todas
essas questões são objeto de disputa entre as classes e estão sujeitas às correlações
de força entre a burguesia que detém a hegemonia, o controle sobre o Estado e,
consequentemente, as políticas públicas e a classe trabalhadora, que tem como
instrumento de luta as urnas e os movimentos sociais.
Referências Bibliográficas:
CONDORCET, M. de. M. J. A. N. C. Cinco Memórias sobre a instrução pública. São
Paulo: UNESP, 2008.
CHIZZOTTI, A. A constituinte de 1823 e a educação. In: FAVERO, O. (Org.) A
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Associados, 2005.
DURKHEIM, E. A evolução pedagógica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
HORTA, S. B. Direito à educação e obrigatoriedade escolar. Cadernos de Pesquisa,
nº104, p. 5-34, jul, 1998.
LOPES, E, M. S. T. As origens da educação pública: a instrução na revolução
burguesa do século XVIII. Belo Horizonte, MG: Argvmentvm, 2008.
MANACORDA, M. A. História da Educação: da antiguidade aos nossos dias. 3.ed.
São Paulo Cortez/Autores associados, 1992.
SOBOUL, A. História da Revolução Francesa. Rio de Janeiro: Zahar editores, 1981.
XAVIER, M. E. S. P. Poder político e educação de elite. 3ed. São Paulo: Cortez
Editora: Autores Associados, 1992.
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