1 KAREN CORRÊA DE OLIVEIRA SIALOLITÍASE: CONSIDERAÇÕES SOBRE ETIOLOGIA, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO Monografia apresentada à Unidade de Pós-graduação da Faculdade Ingá-UNINGÁ-Passo Fundo-RS como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial. Orientador: Prof. Ms. Marcos Antônio Pedro Knack PASSO FUNDO 2008 2 KAREN CORRÊA DE OLIVEIRA SIALOLITÍASE: CONSIDERAÇÕES SOBRE ETIOLOGIA, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO Monografia apresentada à comissão julgadora da Unidade de Pós-graduação da Faculdade Ingá-UNINGÁPasso Fundo-RS como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial. Orientador: Prof. Ms. Marcos Antônio Pedro Knack Apresentada em ___/___/____. BANCA EXAMINADORA: ______________________________________________ Prof. Ms. Marcos Antônio Pedro Knack ______________________________________________ Prof. Ms. Alexandre Basualdo ______________________________________________ Prof. Dr. Cezar Augusto Garbin 3 DEDICATÓRIA Aos meus pais, Ronaldo e Dirlei, sempre presentes em todos os momentos da minha vida, por me possibilitarem a realização deste sonho, pelo amor incondicional e por me ensinarem mais com seus exemplos do que com suas palavras; Ao meu marido, Marcelo, pelo amor, paciência, apoio e compreensão além do estímulo constante, combustível fundamental para esta conquista; Ao meu irmão, Cassius, pela amizade, carinho e incentivo. AMO VOCÊS!!! 4 AGRADECIMENTO Ao professor Ms. Marcos Knack, pela orientação deste trabalho, o meu reconhecimento e o meu muito obrigado!; Ao Professor Ms. Alexandre Basualdo, pelo incentivo, pelo auxílio constante, pela amizade e pelo exemplo de dedicação, inteligência e humildade. Te admiro muito!; Aos colegas de curso, pela troca de informação e vivências, pelas brincadeiras, risadas e pela saudade que cada um certamente vai deixar. 5 RESUMO A sialolitíase é uma das patologias mais freqüentes das glândulas salivares, sendo caracterizada pela formação de cálculos no parênquima glandular ou no interior do ducto da glândula. Os objetivos deste estudo de revisão de literatura foram avaliar os fatores etiológicos relacionados à formação dos sialolitos e investigar meios de diagnóstico e de tratamento desta patologia. Verificou-se que a exata etiologia do cálculo salivar ainda é desconhecida, havendo várias teorias que tentam explicar a sua formação. O diagnóstico de sialolítiase é feito com um exame clínico minucioso associado a exames por imagens, como o exame radiográfico convencional, a sialografia, a ultrasonografia, a tomografia computadorizada, a ressonância magnética e a sialoendoscopia. O tratamento é variável, podendo haver eliminação espontânea ou até requerendo tratamento cirúrgico para a sua excisão. Novos métodos diagnósticos e terapêuticos estão sendo desenvolvidos atualmente, como a litotripsia extra e intra-corporal, sialoendoscopia intervencional e a sialotomia com laser, mas sugerem-se maiores estudos sobre sua utilização, para que o tratamento se torne cada vez mais seguro, diminuindo assim os riscos e o desconforto para o paciente. Palavras-chave: Sialolitíase. Glândula salivar. Sialolito. 6 ABSTRACT Sialolithiasis is one of the most common diseases of the salivary glands and it is characterized by the stone formation within the duct or in parenchyma gland. The aim of this literature review was evaluate the etiologic factors responsible for calculi formation and investigate diagnostic and therapeutic options for this pathology. The present study demonstrated that the exact etiology of the salivary calculus is still unknown, and several hypothesis have been proposed to explain it. Diagnosis can be done by a m e t iculous clinical examination and by imaging techniques like conventional radiography, sialography, ultrasonography, computerized tomography, magnetic resonance and sialoendoscopy. Treatment is variable, occurring spontaneous calculi elimination or requesting surgical excision. New detection and therapeutic methods are being developed, l i k e l i t hotripsy, interventional sialoendoscopy and laser fragmentation, but more studies are suggested about its use, to become the treatment safer, without risks and discomfort for the patient. Key words: Sialolithiasis. Salivary gland. Sialolith. 7 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 e 2: Aspecto macroscópico dos sialolitos mostrando a diferença de coloração, tamanho e superfície Figura 3: Drenagem de secreção purulenta através da carúncula submandibular esquerda Figura 4: Aumento de volume na região do ducto submandibular esquerdo Figura 5: Hiperemia e aumento de volume no assoalho bucal do lado direito Figura 6 e 7: Radiografias oclusal lateralizada anterior esquerda e oclusal centralizada evidenciando cálculos no assoalho bucal Figura 8: Radiografia panorâmica apresentando sialolito submandibular do lado direito Figura 9: Radiografia lateral oblíqua esquerda evidenciando sialolito submandibular Figura 10: Ultrasonografia de glândula salivar submandibular esquerda Figura 11: Tomografia computadorizada apresentando sialolito submandibular anterior direito Figura 12: Sialografia de glândula submandibular direita mostrando obstrução do ducto Figura 13: Imagem por ressonância magnética mostrando sialolito do lado esquerdo Figura 14 e 15: Visualização de sialolito através da sialoendoscopia Figura 16: Introdução de um sialoendoscópio através do ducto submandibular direito Figura 17: Remoção cirúrgica por via intra-oral de um cálculo submandibular do lado direito Figura 18 e 19: Remoção cirúrgica por via intra-oral de um cálculo parotídeo do lado esquerdo Figura 20 e 21: Ressecção em bloco da glândula submandibular direita Figura 22, 23 e 24: Remoção de sialolito com cestos apreendedores Figura 25 e 26: Remoção de sialolito com fórceps Figura 27, 28 e 29: Remoção do sialolito com litotripsia intra-oral e cestos 8 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 9 2 REVISÃO DE LITERATURA ...................................................................................11 3 CONCLUSÃO.............................................................................................................30 REFERÊNCIAS.................................................................................................................31 9 1 INTRODUÇÃO A sialolitíase é uma desordem caracterizada pela obstrução de uma glândula salivar, devido à formação de estruturas calcificadas no interior do ducto ou no parênquima glandular, as quais recebem o nome de sialolitos ou cálculos salivares (GONZÁLES, 2006; BATZAKAKIS et al., 2006; PARK, MANDEL, 2007). Esta patologia é a segunda alteração mais comum das glândulas salivares, correspondendo a 30% das patologias salivares e acometendo aproximadamente 1,2% da população, sendo mais comum em adultos do gênero masculino (LANDGRAF et al., 2006; PONCE-BRAVO et al., 2006). A glândula submandibular é a mais freqüentemente acometida, seguida pelas glândulas parótida e sublingual, raramente afetando as glândulas salivares menores (LANDGRAF et al., 2006; PARK, MANDEL, 2007). A patogenia dos sialolitos tem sido amplamente discutida, havendo muitas teorias que tentam explicar o mecanismo de formação dos cálculos, mas ainda não se sabe com exatidão a verdadeira causa desta alteração (ZEDEBSKI, 2003). O quadro clínico do paciente com sialolitíase pode apresentar aumento volumétrico na região da glândula envolvida, com possível dor associada, principalmente no momento das refeições, devido à estimulação do fluxo salivar. Em alguns casos, a obstrução causada pelo sialolito pode causar processo infeccioso e também inflamatório, conhecido por sialoadenite (ALCURE et al., 2005). Ao exame radiográfico convencional, o sialolito apresenta-se como imagem radiopaca. Exames complementares como ultrasonografia e sialografia também podem auxiliar o diagnóstico, apontando o local correto da obstrução (SILVEIRA et al., 2005). N o c aso de cálculos radiotransparentes, pode-se empregar o uso da tomografia computadorizada ou da ressonância magnética, que são excelentes métodos para visualização das glândulas salivares e dos tecidos circundantes, porém esses exames são pouco utilizados em virtude de seu alto custo (MAGNABOSCO NETO, 2002; SILVEIRA et al., 2005). A sialoendoscopia é um novo método para visualização do lúmen dos ductos salivares e suas patologias, podendo ser utilizada tanto para o diagnóstico como 10 para o tratamento da sialolitíase, através da remoção do cálculo por via endoscópica (MARCHAL, 2002; NAHLIELI et al., 2006). O tratamento consiste na remoção do sialolito, seja por métodos conservadores ou por excisão cirúrgica do mesmo, realizada através de acesso intra-bucal. Porém, alguns casos requerem remoção cirúrgica do cálculo por acesso extra-oral, necessitando muitas vezes a ressecção da glândula envolvida, e podendo trazer complicações como lesão nervosa, redução do fluxo salivar, cicatrizes e defeitos cosméticos, além de fístula salivar (MAGNABOSCO NETO, 2002; OLIVEIRA et al., 2003; ROH, 2006; PARK, MANDEL, 2007). Atualmente há um crescente interesse por formas de tratamento que sejam minimamente invasivas. Tais métodos como a sialoendoscopia, a litotripsia extra e intra-corporal e a sialotomia com laser estão sendo desenvolvidas no intuito de diminuir os riscos e complicações, gerando, assim, uma menor morbidade para o paciente (LINDENBLATT et al., 2005). Considerando-se a importância do tema, torna-se necessária a realização de estudos que nos possibilitem um conhecimento mais aprofundado a respeito da sialolitíase e das possíveis causas desta alteração, bem como das formas de diagnóstico e tratamento existentes, para que se saiba qual a melhor forma de abordar esta patologia sem causar maiores danos ao paciente e evitando o desenvolvimento de complicações. Diante disso, o presente trabalho tem como objetivo apresentar, através de pesquisa bibliográfica e revisão de literatura, as características gerais da sialolitíase, investigando os fatores etiológicos, as formas de diagnóstico e de tratamento desta patologia. 11 2 REVISÃO DE LITERATURA A sialolitíase consiste em um fenômeno obstrutivo caracterizado pela formação de cálculos e conseqüente bloqueio do fluxo salivar, no ducto excretor de saliva ou no próprio corpo da glândula (SHAFER et al., 1985; PETERSON et al., 1996; MAGNABOSCO NETO, 2002; ZEDEBSKI, 2003; VOLKWEISS et al., 2004; SOARES et al., 2005; LINDENBLATT et al., 2005; LANDGRAF et al., 2006). Estes cálculos, denominados sialolitos, são estruturas mineralizadas formadas a partir da deposição de sais de cálcio ao redor de um acúmulo de restos orgânicos no lúmen do ducto ou no parênquima glandular (BRANCO et al., 2003; VOLKWEISS et al., 2004; SILVEIRA et al., 2005; MATSUMOTO et al., 2005; PONCE-BRAVO et al., 2006; TORRES-LAGARES et al., 2006). A litíase de glândulas salivares é a segunda alteração mais comum das glândulas salivares maiores, só perdendo para as parotidites epidêmicas da infância (BRANCO et al., 2003). Estima-se que de 1000 adultos da população, 12 são afetados por essa alteração (SIDDIQUI, 2002; TEYMOORTASH et al., 2003; KAWATA et al., 2006; LANDGRAF et al., 2006; NAHLIELI et al., 2006; PARK, MANDEL, 2007). Ela pode ocorrer em qualquer idade, porém é mais freqüente entre a terceira e a sexta década de vida, observando-se uma maior predileção pelo gênero masculino. (SHAFER et al., 1985; MAGNABOSCO NETO, 2002; ZEDEBSKI, 2003; BRANCO et al., 2003; KNIGHT, 2004; ANDRETTA et al., 2005; SILVEIRA et al., 2005; LANDGRAF et al., 2006; PONCE-BRAVO et al., 2006; TORRESLAGARES et al., 2006;). Este processo raramente ocorre na infância (BLASCO et al., 2003; LINDENBLATT et al., 2005; SILVEIRA et al., 2005; LANDGRAF et al., 2006; PONCE-BRAVO et al., 2006), pois nessa faixa etária não houve ainda um longo tempo de evolução e o fluxo salivar em crianças é mais rápido e a concentração de cálcio e fosfato são pequenas. (VOLKWEISS et al., 2004). Segundo Knight (2004), os cálculos salivares podem variar em tamanho de minúsculas partículas a muitos centímetros de comprimento. De acordo com Bodner (2002) a maioria dos sialolitos, cerca de 88%, apresentam-se menores que 1 cm, sendo considerados gigantes quando maiores que 15 mm. Geralmente são esféricos ou ovais quando formados no interior da glândula e alongados se formados intraductalmente, podendo sua superfície ser lisa ou 12 irregular e de coloração amarelada (SIDDIQUI, 2002; MAGNABOSCO NETO, 2002; ZEDEBSKI, 2003; BATZAKAKIS et al., 2006; PONCE-BRAVO et al., 2006). Segundo Zedebski (2003), podem ocorrer múltiplas lesões, porém o envolvimento bilateral é raro (SIDDIQUI, 2002; TEYMOORTASH et al., 2003). Figura 1 e 2: Aspecto macroscópico dos sialolitos mostrando a diferença de coloração, tamanho e superfície Fonte: GONZÁLES et al.,2006; MATSUMOTO et al., 2005. Estas formações de cálculo são mais comumente encontradas nas glândulas salivares maiores, especialmente na glândula submandibular (80% - 90%), seguida da glândula parótida (5% - 20%), sublingual (1% - 2%), raramente afetando as glândulas salivares menores (SIDDIQUI, 2002; BATZAKAKIS et al., 2006; GONZÁLEZ, 2006; LANDGRAF et al., 2006; PARK, MANDEL, 2007). De acordo com Soares et al. (2005), há duas razões para a maior incidência na glândula submandibular: a saliva submandibular é rica em mucina, o que favorece a aderência de partículas, sendo, portanto, mais viscosa que a saliva da parótida; além disso, o ducto submandibular ascende quando o corpo está na vertical, e se curva na extremidade posterior da boca, e seu curso é longo e sinuoso, dificultando a ação da gravidade e facilitando sua obstrução. Os sialolitos são constituídos de dois tipos de componentes: um grupo de origem orgânica e outro inorgânico (ZEDEBSKI, 2003; PONCE-BRAVO et al., 2006). Contudo, em alguns casos, os sialolitos podem ser compostos somente por matéria inorgânica (ALCURE et al., 2005). Segundo Knight (2004), cálculos submandibulares apresentam 82% de material inorgânico e 18% de material orgânico, enquanto que 13 os cálculos parotídeos são compostos de 49% de material inorgânico e 51% de material orgânico (SIDDIQUI, 2002). Peterson et al. (1996) afirmam que a patogênese dos sialolitos se inicia pela precipitação de sais de cálcio em volta de material orgânico. Entre os principais componentes orgânicos encontram-se produtos da saliva (glicoproteínas e mucopolissacarídeos), lipídios e detritos celulares (MARCHAL, DULGUEROV, 2003; PONCE-BRAVO et al., 2006). Células epiteliais descamadas, bactérias e corpos estranhos também podem estar presentes (SHAFER et al., 1985; BRANCO et al., 2003; SOARES et al., 2005; MATSUMOTO et al., 2005). Os componentes inorgânicos são principalmente compostos por diferentes fosfatos de cálcio (70%) (principalmente hidróxi-apatita e carbonato-apatita), carbonato de cálcio (10%) e ainda pequenas quantidades de outros componentes estão presentes. A composição inclui: cálcio, fósforo, oxigênio e pequenas quantidades de hidrogênio, magnésio, zinco, ferro, cobre e manganês, sódio, alumínio, silício, enxofre, cloro, potássio, e ainda, cromo (ZEDEBSKI, 2003; ANDRETTA et al., 2005). Um recente estudo de Teymoortash et al. (2002) encontrou DNA bacteriano, principalmente de comensais orais, pertencentes ao gênero Streptococcus em todos os sialolitos examinados. Para Kuzmanovski et al. (2004), a determinação da composição dos sialolitos é importante tanto para o desenvolvimento de novos tratamentos de sucesso como para a prevenção de futuras recorrências de sialolitíase. A exata etiologia do cálculo salivar ainda é desconhecida, havendo várias teorias a respeito. Segundo Andretta et al. (2005), os fatores etiológicos envolvidos na formação da sialolitíase podem ser classificados em dois diferentes grupos: de um lado, a retenção de saliva devido a fatores morfo-anatômicos (estenose do ducto salivar, desvios do ducto salivar, etc.), e de outro, os fatores de composição salivar (alta supersaturação, déficit inibidor de cristalização, etc.). Já para Landgraf et al. (2006) há uma mudança na secreção e na composição da saliva, o que representa um aumento da viscosidade salivar, o que pode resultar na obstrução dos ductos terminais dessa glândula, ocorrendo uma deposição de sal de cálcio ao redor de uma matriz orgânica. Branco et al. (2003) consideram que a etiologia dos cálculos consiste num distúrbio eletrolítico da secreção salivar. 14 Ponce-Bravo et al. (2006) afirmam que a formação dos cálculos pode ser devido à presença uma invaginação intraductal ou de soluções de continuidade no conduto, que possivelmente dificultam o fluxo salivar e provocam estancamento. Os mesmos autores apresentam ainda, a hipótese de a saliva estar hipersaturada de cálcio e fósforo, podendo ser esta a causa principal da formação do sialolito. Marchal e Dulguerov (2003) supõem a existência de microcálculos intracelulares que, quando excretados no canal, podem tornar-se um ninho para posterior calcificação. Teymoortash et al. (2003) relatam a possível presença de um sistema de esfíncter na porção anterior do ducto submandibular, onde esse mecanismo desempenharia um papel importante na formação dos cálculos pela facilitação da estagnação salivar e ascensão de bactérias da cavidade oral. Esse estreitamento do ducto, observado sob sialoendoscopia, poderia ser atribuído à estenose inflamatória. Segundo Zedebski (2003), quatro teorias destacam-se a fim de explicar a patogenia dos sialolitos: teoria bacteriana: primeiramente ocorre a infecção bacteriana retrógrada no ducto excretor da glândula. O núcleo formado por bactérias, células epiteliais descamadas, produtos da decomposição bacteriana e leucócitos gradativamente recebe aposição de sais de cálcio, formando o cálculo salivar; teoria da inflamação: a composição e as propriedades da saliva são alteradas como resultado de inflamação na glândula salivar ou ducto. Ocorre degeneração do epitélio glandular e os sais de cálcio, contidos na saliva estagnada, depositam-se ao redor do epitélio ductal descamado ou de leucócitos; teoria do corpo estranho: qualquer corpo estranho como osso de peixe, cabelo, cerda da escova dental, espinho, palha de trigo ou uma pequena pena, acidentalmente podem penetrar no ducto excretor salivar, funcionando como um núcleo de deposição de sais minerais; teoria do trauma local: alguns autores sugerem que as intervenções cirúrgicas na região da glândula submandibular poderiam induzir a formação de sialolitos; outros admitem que simples contusões locais poderiam desencadear o processo de formação dos cálculos salivares. Considerando todas essas teorias, alguns autores concluíram que os sialolitos são causados pela combinação de fatores predisponentes locais, mecânicos e bioquímicos. Estima-se que a taxa de crescimento anual dos cálculos salivares seja de 1 mm (GONZÁLEZ, 2006; MARCHAL, DULGUEROV, 2003). 15 Há controvérsias sobre a relação entre a sialolitíase e as doenças metabólicas ou sistêmicas. Alguns autores como Neville et al. (1998), Magnabosco Neto (2002), Siddiqui (2002), Zedebski (2003) e Silveira et al. (2005), afirmam que o desenvolvimento dos sialolitos não está associado a nenhuma doença sistêmica ou desordem no metabolismo de cálcio e fósforo. Já Peterson et al. (1996) afirmam que a patogênese dos sialolitos se inicia por uma anormalidade no metabolismo do cálcio, com a precipitação deste sal em volta de material orgânico. De acordo com Silveira et al. (2005), a Gôta é a única doença sistêmica capaz de, conhecidamente, causar cálculos salivares, embora na Gôta os cálculos são compostos predominantemente por ácido úrico (SIDDIQUI, 2002; KNIGHT, 2004). Segundo Siddiqui (2002), estudos têm sugerido uma relação entre sialolitíase e nefrolitíase, relatando essa associação em 10% dos pacientes. Konstantinidis et al. (2007) relatam que a hipercalcemia tem sido sugerida como um fator causal de formação de cálculos em modelos animais. Há um atual interesse nos efeitos do tabaco na saliva. O fumo tem demonstrado um aumento na atividade citotóxica da saliva, diminuição da capacidade fagocitária celular e diminuição de proteínas salivares protetoras, como a peroxidase. Supõe-se que essas alterações poderiam favorecer o desenvolvimento de sialolitos. (MARCHAL, DULGUEROV, 2003). A sialolitíase tem sido relatada no hiperparatireoidismo secundário à insuficiência renal crônica, mas não no hiperparatireoidismo primário (GONZÁLES, 2006). Porém, estudos sobre paratormônio e eletrólitos em pacientes com sialolitíase não mostraram anormalidades no metabolismo do cálcio (SIDDIQUI, 2002). Segundo Teymoortash et al. (2003), o conhecimento detalhado da patogênese da sialolitíase é necessário para definir novos procedimentos terapêuticos. A sintomatologia da sialolitíase é variada, dependendo do tamanho do cálculo e de sua localização (BRANCO et al., 2003; ALCURE et al., 2005). Segundo Magnabosco Neto (2002), a severidade da sintomatologia está diretamente ligada ao grau de obstrução do ducto. Os sinais e sintomas podem estar ausentes quando os cálculos são pequenos e a saliva flui entre o cálculo e a parede do ducto; porém quando há obstrução completa, devido a cálculos maiores, pode-se observar aumento repentino da 16 glândula, principalmente durante as refeições, período em que ocorre maior secreção salivar (SHAFER et al., 1985; PETERSON et al., 1996; BRANCO et al., 2003; VOLKWEISS et al., 2004; MATSUMOTO et al., 2005; LINDENBLATT et al., 2005; SILVEIRA et al., 2005; ALCURE et al., 2005; LANDGRAF et al., 2006; PONCE-BRAVO et al., 2006;). Essa tumefação da glândula pode estar acompanhada de dor devido à pressão intraductal, hiperemia na região das carúnculas e diminuição ou estagnação do fluxo salivar, o que permite a disseminação retrógrada de bactérias através do sistema ductal. (PETERSON et al., 1996; NEVILLE et al., 1998; ZEDEBSKI, 2003; BRANCO et al., 2003; VOLKWEISS et al., 2004; KNIGHT, 2004; LINDENBLATT et al., 2005; ALCURE et al., 2005; KAWATA et al., 2006). Essas infecções são manifestadas pela drenagem de pus pelos ductos excretores (ZEDEBSKI, 2003; ALCURE et al., 2005). Os pacientes podem apresentar febre e linfadenopatia, otodinia, trismo e xerostomia (BRANCO et al., 2003). Figura 3: Drenagem de secreção purulenta através da carúncula submandibular esquerda Fonte: KAWATA et al., 2006. Segundo Knight (2004) e Batzakakis et al. (2006), a sialolitíase é assintomática na maioria dos casos. Sumi et al. (1999) afirmam que uma obstrução do ducto salivar pode causar sialoadenite. Uma obstrução incompleta por um sialolito pode estar associada à infecção secundária da glândula e, quando se dá a completa obstrução, a atrofia 17 glandular pode ocorrer. Para Alcure et al. (2005) as alterações mais comuns nas glândulas são inflamação, atrofia e fibrose do parênquima. É fundamental realizar uma inspeção cuidadosa, verificando a assimetria para estabelecer a presença de um aumento de volume, quantidade de fluxo salivar e realizar palpação cuidadosa da glândula e da zona ductal, buscando áreas nodulares, duras ou de consistência firme (PONCE-BRAVO et al., 2006). Knight (2004) afirma que a palpação bimanual do assoalho da boca, numa direção de posterior para anterior revela cálculos palpáveis em um grande número de casos de cálculo submandibular. Palpação manual da própria glândula pode ser útil, pois uma glândula uniformemente firme e dura sugere uma glândula hipofuncional ou nãofuncional. Para cálculos na parótida, palpação cuidadosa intraoral na região do ducto parotídeo pode revelar um cálculo. Figura 4: Aumento de volume na região do ducto submandibular esquerdo Fonte: KAWATA et al., 2006. Figura 5: Hiperemia e aumento de volume no assoalho bucal do lado direito Fonte: LINDENBLATT et al., 2005. 18 Magnabosco Neto (2002) salienta que o sinal mais característico de um aumento de volume de glândula parótida é a separação, para fora, da inserção do lóbulo da orelha e por uma comparação de simetria. Os sialolitos podem ser observados radiograficamente, sendo a grande maioria visível de forma radiopaca, e uma simples radiografia oclusal podem identificar o cálculo, quando localizado no assoalho bucal. Já as radiografias panorâmicas, laterais oblíquas de mandíbula, póstero-anteriores de crânio, além das tangenciais para exames dos tecidos moles da bochecha são indicadas para a pesquisa de calcificações nas glândulas parótidas (MAGNABOSCO NETO, 2002; SILVEIRA et al., 2005; POZZA et al., 2005). A mandíbula, por sua vez, pode exigir a utilização do método de dissociação de imagens, de maneira a deslocar as estruturas superpostas (SILVEIRA et al., 2005). Figura 6 e 7: Radiografias oclusal lateralizada anterior esquerda e oclusal centralizada evidenciando cálculos no assoalho bucal Fonte: KAWATA et al., 2006; LINDENBLATT et al., 2005. Figura 8: Radiografia panorâmica apresentando sialolito submandibular do lado direito Fonte: RAMOS-JORGE et al., 2006. 19 Figura 9: Radiografia lateral oblíqua esquerda evidenciando sialolito submandibular Fonte: KAWATA et al., 2006. A radiografia é bastante útil nos casos em que recursos mais complexos não estão disponíveis, já que nem sempre é possível a visualização do cálculo através de radiografia convencional (RAMOS-JORGE et al., 2006). Estima-se que 40% dos cálculos parotídeos e 20% dos submandibulares não são radiopacos (SIDDIQUI, 2002; MARCHAL, DULGUEROV, 2003; POZZA et al., 2005). Isto pode ser justificado pelo grau de calcificação do sialolito, além do fato de que cálculos pequenos e/ou intraglandulares podem não ser detectados no exame radiográfico convencional (MARCHAL, DULGUEROV, 2003; BRANCO et al., 2003; LINDENBLATT et al., 2005). Todavia, este é, geralmente, o primeiro exame complementar utilizado, devido à facilidade técnica, ao baixo custo e à aparelhagem disponível (POZZA et al., 2005) Nos casos em que se necessita um exame por imagem mais apurado, é possível utilizar a ultra-sonografia, devido a sua sensibilidade e precisão na identificação do cálculo e diagnóstico da condição mórbida que compromete a glândula envolvida, além de as glândulas parótida e submandibular serem de fácil acesso para o exame de ultra-som (POZZA et al., 2005; BRANCO et al., 2003). Para autores como Marchal e Dulguerov (2003); Mandel e Hatzis (2000); Pozza et al., (2005), a ultrasonografia é um método não invasivo de diagnóstico, mas que apresenta limitações na detecção da sialolitíase, principalmente em cálculos semi-calcificados ou menores que 3 mm. Quando comparada à sialografia e à endoscopia, a ultrasonografia apresenta uma sensibilidade de 81% e uma especificidade de 94%. (ZENK et al., 2001; MARCHAL, DULGUEROV, 2003; 20 GONZÁLES, 2006). Mas quando comparada com a ressonância magnética, sua especificidade e sensibilidade é de 80% (JÄGER et al., 2000). Figura 10: Ultrasonografia de glândula salivar submandibular esquerda Fonte: KAWATA et al., 2006. Outro método não invasivo para o diagnóstico de sialolitíase é a tomografia computadorizada, que tem como vantagem a sensibilidade em detectar depósitos calcificados, mesmo que estes estejam em quantidades mínimas, mas tal método é adequado somente quando o cálculo for grande ou se os cortes tomográficos forem realizados em intervalos de 1-2 mm, pois com um espaço maior que esse, é possível que um cálculo pequeno fique entre os cortes e não seja percebido (MANDEL, HATZIS, 2000; MARCHAL, DULGUEROV, 2003). Entre as suas desvantagens estão a falta de localização precisa do cálculo, a ausência de visualização dos ductos e suas anomalias, as altas doses de radiação e o custo elevado (MARCHAL, DULGUEROV, 2003). Figura 11: Tomografia computadorizada apresentando sialolito submandibular anterior direito Fonte: GONZÁLES, 2006. 21 A sialografia fornece uma imagem clara não somente dos cálculos, mas também da estrutura morfológica do sistema ductal. A sialografia consiste na opacificação dos ductos salivares por uma injeção retrógrada intra-canular de contraste radiopaco hidrossolúvel e posterior exposição à radiação. Dentre as suas desvantagens incluem-se as doses de radiação, dor associada ao procedimento, possibilidade de perfuração da parede do ducto e complicações como infecção e efeitos colaterais relacionados ao material de contraste. (JÄGER et al., 2000; KALINOWSKI et al., 2002; MARCHAL, DULGUEROV, 2003; POZZA et al., 2005). Além disso, a injeção de contraste pode deslocar o cálculo para regiões mais profundas, dificultando sua remoção, podendo ainda, exacerbar a inflamação da glândula (SUMI et al, 1999; POZZA et al., 2005; RAMOS-JORGE et al., 2006). A sialografia é contra-indicada em pacientes com infecção, sialoadenites ou alergia ao material de contraste (JÄGER et al., 2000; SIDDIQUI, 2002). Figura 12: Sialografia de glândula submandibular direita mostrando obstrução do ducto Fonte: JÄGER et al., 2000. Para Kalinowski et al. (2002), a sialografia continua sendo a técnica padrão para imagem do sistema ductal intra e extra-glandular. Se sialoadenite aguda estiver presente ou a inserção da cânula não for possível, a ressonância magnética fornece uma alternativa excelente e não invasiva. O exame de imagem por ressonância magnética é um excelente método de diagnóstico, com resultados promissores. As vantagens incluem uma técnica rápida e não invasiva, sem injeção de contraste, sem radiação e indolor. As desvantagens 22 desta técnica são o tempo necessário de 45 minutos para a reconstrução (embora o tempo do exame seja de apenas 10 minutos), o custo elevado deste procedimento e as limitações por causa de artefatos na imagem causados por coroas metálicas, restaurações de amálgama e próteses removíveis (KALINOWSKI et al., 2002; POZZA et al., 2005; MARCHAL, DULGUEROV, 2003). Figura 13: Imagem por ressonância magnética mostrando sialolito do lado esquerdo Fonte: SUMI et al., 1999. Segundo Batzakakis et al. (2006), a imagem gerada pela ressonância magnética é menos sensível que a imagem radiográfica convencional e a imagem por tomografia computadorizada na detecção de sialolitíase. Todavia, a ressonância magnética pode delinear claramente vários tipos de tecidos moles com resolução de alto contraste, podendo ainda, refletir a natureza crônica ou aguda da obstrução (SUMI et al., 1999). A sialoendoscopia é um novo método para visualização do lúmen dos ductos salivares e suas patologias, podendo ser utilizado tanto para o diagnóstico como para o tratamento da sialolitíase (MARCHAL, 2002). Tem como vantagens a visualização direta do cálculo, reduzindo a necessidade de investigações radiológicas, além da possibilidade de remoção do sialolito no mesmo momento do diagnóstico, através de equipamentos acoplados ao endoscópio (MARCHAL, 2002; NAHLIELI et al., 2006). 23 Figura 14 e 15: Visualização de sialolito através da sialoendoscopia Fonte: NAHLIELI et al., 2006. Este procedimento é realizado sob anestesia local, onde um microendoscópio desenvolvido especialmente para este fim é introduzido no ducto através de seu orifício natural até o sialolito ser encontrado. Então, o diâmetro do sialolito é estimado usando o calibre do endoscópio como referência (NAHLIELI et al., 2006). Figura 16: Introdução de um sialoendoscópio através do ducto submandibular direito Fonte: NAHLIELI et al., 2006 Histologicamente os sialolitos apresentam uma estrutura laminar concêntrica, de camadas alternadas de substâncias orgânicas e inorgânicas, de várias espessuras e de diferentes tons e densidades; onde as linhas claras indicam porções bem mineralizadas e as escuras, porções pouco mineralizadas (ZEDEBSKI, 2003; SOARES et al., 2005; LINDENBLATT et al., 2005; ALCURE et al., 2005; PONCE-BRAVO et al., 2006). 24 Ao microscópio eletrônico, a superfície dos sialolitos é irregular, nodosa ou granular. Na camada mais externa, observam-se estruturas globulares uniformemente organizadas, conferindo aspecto regular à superfície. Estes glóbulos também são observados na camada imediatamente inferior à externa, demonstrando pequenas proeminências, sugerindo que o crescimento do sialolito se faz a expensas da fusão dessas estruturas, como múltiplos centros de mineralização (ZEDEBSKI, 2003). Na superfície de muitos cálculos observam-se, ainda, fibras de colágeno e células epiteliais metaplásicas (ALCURE et al., 2005; LINDENBLATT et al., 2005; NEVILLE et al., 1998; PONCE-BRAVO et al., 2006). Estas estruturas possibilitam o processo de crescimento e mineralização ativa (PONCE-BRAVO et al., 2006). Nas superfícies de corte, observa-se substância homogênea central, desestruturada, como um núcleo, rodeada de camadas relativamente concêntricas (ALCURE et al., 2005). Esta arquitetura lamelar, também identificada em cortes ao microscópio óptico, representa a expressão morfológica de deposição rítmica de material. A periferia dos sialolitos mostra-se como zona condensada com alta densidade eletrônica, mostrando uma matriz granular ou fibrosa (ZEDEBSKI, 2003). Bactérias foram vistas, em variados graus de mineralização, na periferia de cálculos salivares enquanto nas porções centrais não foram observadas estruturas bacterianas (ZEDEBSKI, 2003). O diagnóstico diferencial da sialolitíase submandibular se faz com flebólitos, adenopatias crônicas submandibulares e neoplasias; no caso da parótida, com angiolitos; e nas glândulas sublinguais ou menores se deve diferenciar com sialoadenite aguda (PONCE-BRAVO et al., 2006). Quando a ocorrência é em glândulas salivares acessórias, pode assemelhar-se, clinicamente, a mucocele, tornando-se essencial a biópsia da lesão (ZEDEBSKI, 2003). O tratamento deste fenômeno obstrutivo está intimamente relacionado com o tamanho e a localização do cálculo (OLIVEIRA et al., 2003; MATSUMOTO et al., 2005; LINDENBLATT et al., 2005; PARK, MANDEL, 2007). Para sialolitos menores localizados no ducto excretor, pode-se tentar um tratamento conservador, através de estímulo salivar, massagens leves da glândula, tentando, desta forma, a ordenha da pedra para a saída do ducto (BRANCO et al., 2003; VOLKWEISS et al., 2004; ALCURE et al., 2005). A indicação de sialogogos, calor úmido e ingerir fluidos mais freqüentemente podem auxiliar na eliminação do cálculo (SIDDIQUI, 2002; 25 VOLKWEISS et al., 2004). Contudo, esta pressão exercida pela saliva pode apenas deslocá-lo, dando vazão à glândula. Neste caso há diminuição das estruturas adjacentes e da dor, porém, como o cálculo continua no ducto, ocorre um quadro cíclico, voltando assim a obstrução, o inchaço e a dor, até provocar o aparecimento de patologia infecciosa (MAGNABOSCO NETO, 2002). Não havendo a eliminação espontânea do cálculo salivar, recorre-s e à excisão cirúrgica do cálculo, quando este se encontra no interior do ducto salivar, podendo-se realizar a extirpação da glândula quando da presença de um cálculo no interior da mesma (OLIVEIRA et al., 2003; LANDGRAF et al., 2006). Quando há infecção associada, esta deve ser primeiramente controlada com antibióticos (PONCE-BRAVO et al., 2006). Figura 17: Remoção cirúrgica por via intra-oral de um cálculo submandibular do lado direito Fonte: KAWATA et al., 2006. Figura 18 e 19: Remoção cirúrgica por via intra-oral de um cálculo parotídeo do lado esquerdo Fonte: TORRES-LAGARES et al., 2006. 26 Autores como Peterson et al. (1996), Mandel e Hatzis (2000) e Zenk et al. (2001) afirmam que a remoção cirúrgica por via intra-oral, através de incisão realizada no assoalho bucal, deveria ser o tratamento de escolha em pacientes com cálculos submandibulares que podem ser palpados bimanualmente. Entretanto, aqueles situados mais próximos da glândula devem ser excluídos por acesso extraoral, porque tais cálculos não podem ser palpados durante o exame físico, dificultando sua visualização por via intra-oral (OLIVEIRA et al., 2003). Estes autores também indicam o acesso externo para a remoção cirúrgica de múltiplos sialolitos. A excisão cirúrgica da glândula é recomendada em casos de localização proximal extrema do sialolito, devido a circunstâncias anatômicas e a suposição de que a glândula submandibular portadora de sialolitíase não esteja funcional por um longo tempo, não tendo tendência a se recuperar após anos de obstrução e inflamações recorrentes (ZENK et al., 2001; MARCHAL, DULGUEROV, 2003). Marchal e Duguerov (2003) afirmam que episódios recorrentes necessitam de tratamento por cirurgia aberta, e que a sialolitíase ainda representa a razão mais freqüente para a ressecção da glândula submandibular. Já a ressecção da glândula parótida é menos freqüente, provavelmente por causa da alta incidência de complicações pós-operatórias como paralisia facial. Figura 20 e 21: Ressecção em bloco da glândula submandibular direita Fonte: VIEIRA et al., 2001. Segundo Magnabosco Neto (2002), a abordagem cirúrgica diretamente na glândula salivar poderá trazer como complicações, entre outras, uma fístula salivar, de difícil resolução e prognóstico desfavorável. Complicações neurológicas após cirurgia de excisão de glândula submandibular têm sido relatadas nos seguintes 27 nervos: marginal mandibular (7,7%), hipoglosso (2,9%) e lingual (1,4%), bem como problemas de cicatrização e redução salivar (ROH, 2006). Porém, várias tentativas intra-orais de remover o cálculo cirurgicamente causam fibrose na área do ducto, como também, a formação de rânula. As complicações cirúrgicas associadas à remoção de cálculos parotídeos incluem lesão do nervo facial, hemorragia, cicatrizes, defeitos cosméticos e Síndrome de Frey (PARK, MANDEL, 2007). Para Zenk et al. (2001), a preservação da função glandular em conjunto com o baixo risco e desconforto para o paciente deveria ser o objetivo principal no tratamento da sialolitíase. Para isso, métodos menos invasivos estão sendo preconizados no intuito de se preservar as glândulas acometidas, bem como estruturas nobres adjacentes. Um desses métodos é a litotripsia externa, ou extra-corporal, que tem se tornado popular, mas requer muitas sessões em intervalos de poucas semanas. Uma vez fragmentados, espera-se que os cálculos sejam eliminados espontaneamente. Os debris de cálculos remanescentes podem ser vistos como ninhos ideais para posterior calcificação e recorrência de sialolitíase (MARCHAL, DULGUEROV, 2003). Outras técnicas para fragmentação dos sialolitos tem sido descritas, como o uso de dispositivos eletrohidráulicos, mas têm-se percebido que este dispositivo tem pouca eficácia em baixas voltagens. Embora a destruição dos sialolitos seja possível em voltagens mais altas, injúrias na parede ductal foram descritas e a técnica criticada (MARCHAL, DULGUEROV, 2003). Métodos alternativos de tratamento têm surgido, como o uso de litotripsia endoscópica intra-corporal (SIDDIQUI, 2002). A sialoendoscopia intervencional tem sido descrita como um novo método minimamente invasivo para tratamento de doenças obstrutivas das glândulas salivares, como a sialolitíase. Este procedimento visa a remoção dos cálculos salivares após a sua fragmentação (NAHLIELI et al., 2006). Nesta técnica, realizada sob anestesia local, um microendoscópio é introduzido no ducto através de seu orifício natural até o sialolito ser encontrado. Os resultados da sialoendoscopia intervencional estão diretamente relacionados com o tamanho dos cálculos (MARCHAL, DULGUEROV, 2003). Cálculos pequenos, de até 5 mm de diâmetro podem ser removidos inteiramente com o uso de mini fórceps ou 28 cestos apreendedores acoplados ao endoscópio. Porém, em casos de cálculos maiores, a fragmentação prévia é necessária, usando a litotripsia externa ou, de preferência, um delicado sistema de fragmentação a laser (MARCHAL, DULGUEROV, 2003). Figura 22, 23 e 24: remoção de sialolito com cestos apreendedores Fonte: MARCHAL, 2002. Figura 25 e 26: remoção de sialolito com fórceps Fonte: NAHLIELI et al., 2006. Na opinião de Marchal e Dulguerov (2003), o melhor sistema é a fragmentação de sialolitos utilizando um laser de fibra-óptica introduzido no sialoendoscópio. Dessa forma, a litotripsia é realizada sob controle visual direto e a remoção dos fragmentos é feita com cestos de arame apreendedores (MARCHAL, DULGUEROV, 2003). 29 Figura 27, 28 e 29: remoção do sialolito com litotripsia intra-oral e cestos Fonte: MARCHAL, 2002. As taxas de sucesso desta técnica são de 86 a 89%. As complicações incluem parestesia temporária do nervo lingual, infecção pós-operatória, sangramento pós-operatório, desenvolvimento de rânula traumática e constricção do ducto, mas com menor incidência quando comparada à outras técnicas (NAHLIELI et al., 2006). A aderência às paredes dos ductos e trajetos tortuosos são dificuldades que podem geram impedimentos para sua utilização (MATSUMOTO et al., 2005). Para Chu et al. (2003), a sialoendoscopia é um tratamento seguro e eficaz para a remoção de cálculos submandibulares, reduzindo a incidência de complicações. Brown et al. (2002) afirma que tal técnica tem baixa morbidade e uma alta aceitação pelos pacientes quando a indicação é correta. Segundo Magnabosco Neto (2002) e Oliveira et al. (2003), o prognóstico é favorável e normalmente não ocorrem recidivas. Já Silveira et al. (2005) relatam que a sialolitíase pode recorrer, necessitando, então, nova abordagem terapêutica. Volkweiss et al. (2004) afirmam que mesmo com um adequado tratamento a taxa estimada de reincidência é de 8,9%. 30 3 CONCLUSÃO Com base na revisão da literatura, podemos concluir que a sialolitíase é uma patologia bastante comum, podendo causar dor, tumefação da glândula, diminuição ou estagnação do fluxo salivar, infecção e sialoadenite, chegando até a causar a atrofia e fibrose do parênquima glandular. O diagnóstico precoce da sialolitíase é fundamental para evitar o desconforto de técnicas mais invasivas para o paciente e pode ser realizado através de inspeção visual, palpação cuidadosa da glândula e da zona ductal associado a exames radiográficos. Outros exames complementares como ultrasonografia, sialografia, sialoendoscopia, tomografia computadorizada e ressonância magnética podem ser utilizados para estabelecer o diagnóstico, porém estes exames ainda são pouco utilizados em virtude de seu alto custo. O tratamento consiste na remoção do sialolito, existindo atualmente vários métodos preconizados para sua remoção. O método escolhido vai depender da glândula afetada, tamanho e localização do cálculo. A excisão cirúrgica intra-oral ainda é a forma de tratamento mais utilizada, porém novas opções de tratamento estão sendo desenvolvidas no intuito de diminuir o desconforto e a morbidade dos pacientes e preservar as glândulas acometidas. A sialoendoscopia intervencional, a litotripsia extra-corporal e a litotripsia endoscópica intra-corporal surgem como métodos menos invasivos de tratamento, porém ainda há alguns impedimentos para a utilização mais freqüente destas técnicas, como o alto custo dos equipamentos e a necessidade de treinamento profissional para a correta utilização dos mesmos. A etiolologia da sialolitíase permanece desconhecida, havendo várias teorias que tentam explicar a origem e o mecanismo de formação dos cálculos, entre elas a teoria bacteriana, a teoria inflamatória, a teoria do corpo estranho e a teoria do trauma local. Fatores morfo-anatômicos e alterações na composição salivar também encontram-se entre os possíveis fatores etiológicos dos cálculos salivares. Os conhecimentos da evolução clínica deste processo patológico e sua etiopatogenia são fatores preponderantes para a aplicação da terapia adequada. Resta, portanto, detectar a causa primária da formação dos sialolitos a fim de desenvolver-se terapia preventiva e não apenas curativa. 31 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALCURE, M. L. et al. Clinical and histopathological findings of sialoliths. Braz J Oral Sci. v.4, n.15, p.899-903, 2005. ANDRETTA, M. et al. Current opinions in sialolithiasis diagnosis and treatment. Acta Otorhinolaryngol Ital. v.25, n.3, p.145-149, 2005. BATZAKAKIS, D. et al. A case report of coexistence of a sialolith and adenoid cystic carcinoma in the submandibular gland. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. v.11, p.286288, 2006. BLASCO, J. L. et al. Expulsión espontânea de um cálculo salival submandibular. An Pediatr (Barc). v.59, n.4, p.393-395, 2003. BODNER, L. Giant salivary gland calculi: Diagnostic imaging and surgical management. Oral Surg Oral Med Oral Pathol. v. 94, n. 2, p. 320-323, 2002. BRANCO, B. L. C. et al. Sialolitíase: relato de um caso. Rev Cir Traumatol BucoMax-Fac. v.3, n.3, p.9-14, 2003. BROWN, J. E. et al. Minimally invasive radiologically guided intervention for the treatment of salivary calculi. Cardiovascular and Interventional Radiology. v.25, n.5, p.352-355, 2002. CHU, D. W. et al. Endoscopic management of submandibular sialolithiasis. Surgical Endoscopy. v.17, n.6, p.876-879, 2003. GONZÁLEZ, A. A. Cálculo Gigante de La glândula submandibular de 20 años de evolución: reporte de caso. An Orl Mex. v.51, n.3, 2006. JÄGER, L. et al. Sialolithiasis: MR sialography of the submandibular duct – na alternative to conventional sialography and US? Radiology. v.216, n.3, p.665-671, 2000. KALINOWSKI, M. et al. Comparative study of MR sialography and digital subtraction sialography for benign salivary gland disorders. Am J Neuroradiol. v.23, p.14851492, 2002. KAWATA, L. T. et al. Sialolitíase em ducto de glândula submandibular: relato de dois casos clínicos. Revista Odontológica de Araçatuba. v.27, n.1, p.14-18, 2006. KNIGHT, J. Diagnosis and treatment of sialolithiasis. Ir Med J. v.97, n.10, p.314-315, 2004. KONSTANTINIDIS, I. et al. Bilateral multiple sialolithiasis of the parotid gland in a patient with Sjögren’s syndrome. Acta Otorhinolaryngol Ital. v.27, p.41-44, 2007. 32 KUZMANOVSKI, I. et al. Determination of the composition of sialoliths composed of carbonate apatite and albumin using artificial neural networks. Talanta. v.62, p.813817, 2004. LANDGRAF, H. et al. Extenso sialolito no ducto da glândula submandibular: relato de caso. Rev Cir Traumatol Buco-Max-Fac. v.6, n.2, p.29-34, 2006. LINDENBLATT, R. et al. Importância do tratamento da sialolitíase para o restabelecimento funcional do paciente. Revista Brasileira de Patologia Oral. v.4, n.2, p.103-106, 2005. MAGNABOSCO NETO, A. E. Sialólito na região de glândula parótida - relato de caso clínico. BCI, Curitiba, v.9, n.35, p.210-214, 2002. MANDEL, L.; HATZIS, G. The role of computerized tomography in the diagnosis and therapy of parotid stones: a case report. JADA. v. 131, p.479-482, 2000. MARCHAL, F.; DULGUEROV, P. Sialolithiasis management: the state of the art. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. v.129, p.951-956, 2003. MARCHAL, F. Sialendoscopy. Ent News. v.11, n.2, p.49-52, 2002. MATSUMOTO, M. A. et a l . Sialolito gigante em ducto submandibular. Revista Brasileira de Patologia Oral. v.4, n.3, p.182-184, 2005. NAHLIELI, O. et al. Sialoendoscopy: a new approach to salivary gland obstructive pathology. JADA. v.137, p.1394-1400, 2006. NEVILLE, B.W. et al. Patologia Oral e Maxilofacial. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,1998, 720 p. OLIVEIRA, C. M. B. et al. Cálculo salivar “gigante” (25mm X 15mm): Relato de caso. Revista Ciências Odontológicas. v.6, n.6, 2003. PARK, M. J. Y.; MANDEL, L. Parotid Stone removal: a case report. NYSDJ. p. 54-56, 2007. PETERSON, L. J. et al. Cirurgia Oral e Maxilofacial Contemporânea. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1996. PONCE-BRAVO, S. et al. Sialolitiasis de glândula sublingual. Presentación de um caso clínico e revisión de la literatura. Revista ADM. v.63, n.1, 2006. POZZA, D. H. et al. Exames complementares por imagens no diagnostic e no planejamento cirúrgico de patologias em glândulas salivares. Revista Brasileira de Patologia Oral. v.4, n.3, p.156-161, 2005. RAMOS-JORGE, J. et al. Sialolitíase em glândula submandibular: relato de caso clínico. Arquivos em Odontologia. v.42, n.2, p.84-94, 2006. 33 ROH, J. Removal of the submandibular gland by a retroauricular approach. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. v.132, p.783-787, 2006. SHAFER, W. G. et al. Tratado de patologia bucal. 4. ed. Rio de Janeiro: Interamericana, 1985. p.516. SIDDIQUI, S. J. Sialolithiasis: an unusually large submandibular salivary stone. British Dental Journal. v.193, n.2, p.89-91, 2002. SILVEIRA, R. L. et al. Múltiplos sialolitos em glândula submandibular direita: relato de caso. Rev Fac Odontol Lins. Piracicaba, v.17, n.1, p.39-42, 2005 SOARES, L. P. et al. Submandibular gland sialolith in a renal transplant recipient: a case report. J Contemp Dent Pract. v.6, n.3, p.1-6, 2005. SUMI, M. et al. The MR imaging assessment of submandibular gland sialoadenitis secondary to sialolithiasis: correlation with CT and histopathologic findings. Am J Neuroradiol. v.20, p.1737-1743, 1999. TEYMOORTASH, A. et al. Bacteria and pathogenesis of human salivary calculus. Acta Otolaryngol. v.122, p.210-214, 2002. TEYMOORTASH, A. et al. Is there evidence of a sphincter system in Wharton’s duct? Etiological factors related to sialolith formation. Journal of Oral Science. v.45, n.4, p.233-235, 2003. TORRES-LAGARES, D. et al. Parotid sialolithiasis in Stensen’s duct. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. v.11, p.E80-E84, 2006. VIEIRA, M. B. M. et al., Ressecção subcapsular da glândula submandibular. Ver Bras Otorrinilaringol. v.67, n.6, p.825-828, 2001. VOLKWEISS, D. et al. Sialodenite secundária à sialolitíase. Revista da Saúde. Bagé, v.8, n.1, 2004 ZEDEBSKI, R. A. M. Análise morfológica e estudo dos sialólitos por meio das microscopias óptica e de polarização. Bauru: USP, 2003. Dissertação (Mestrado). Faculdade de odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Bauru, 2003. ZENK, J. et al. Transoral removal of submandibular stones. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. v.127, p.432-436, 2001.