O CUIDADO DE ENFERMAGEM AMBULATORIAL: PERSPECTIVAS PARA PACIENTES COM ALTERAÇÃO DA IMAGEM FACIAL Brenda Ritielli Tossin 1; Sadja Cristina Tassinari de Souza Mostardeiro2; Marlene Gomes Terra 3; Valquíria Toledo Souto4 INTRODUÇÃO A imagem corporal é a figuração do nosso corpo formada em nossa mente, o modelo pelo qual o corpo apresenta-se para nós (CAVALCANTI, 1991). É algo que vai se construindo continuamente, desde a infância juntamente com o processo de maturação fisiológica do sistema nervoso e da progressiva interação psicossocial que o ser humano estabelece com o meio que o cerca. Já a imagem alterada diz respeito às relações intra e interpessoais, às emoções e aos sentimentos do indivíduo consigo próprio, com os outros e com o seu ambiente, com o uso de vestimentas e objetos de adorno, além de suas relações com seu próprio corpo na parte externa e interna do mesmo, superfície interior do corpo (SCHILDER, 2000). A estética do corpo, em especial a facial, é considerada relevante na construção da imagem que cada um tem de si e do outro, e tem papel importante nas avaliações de personalidade, habilidade e aceitação social. A todo o momento, mesmo que de forma inconsciente, fazemos julgamento estético sobre o que vemos, sejam objetos, lugares ou pessoas (CADENA; GUERRA, 2006). Considerando-se a sociedade atual, onde a imagem tem sido bastante valorizada e explorada pela mídia, acredita-se que a experiência de possuir uma alteração na imagem corporal é vivenciada com grandes dificuldades e requer o apoio de todos para enfrentar tal situação. No caso da alteração da imagem facial, esta compreende o processo de destruir uma imagem e reconstruir uma nova, que muitas vezes não é esperada ou aceita pela própria pessoa ou pelo senso comum. Ainda, possuir a imagem facial alterada imprime em quem a possui uma marca que, por mais que se tente não a notar ou disfarçar, está presente (MOSTARDEIRO, 2010). 1 Autora. Acadêmica do 5o semestre do curso de Graduação em Enfermagem. UFSM. Santa Maria, RS, Brasil.Email: 2 Orientador. Enfermeira. Docente do Departamento de Enfermagem. Pesquisadora do Grupo de pesquisa Cuidado a Saúde das Pessoas, Famílias e Sociedade. Coautor. UFSM. Santa Maria, RS, Brasil 3 Coautor. Enfermeira. Docente do Departamento de Enfermagem. Pesquisadora do Grupo de pesquisa Cuidado a Saúde das Pessoas, Famílias e Sociedade. UFSM. Santa Maria, RS, Brasil. 4 Coautor. Enfermeira. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSM. UFSM. Santa Maria, RS, Brasil. As inquietações sobre o cuidar de pacientes com alteração da imagem corporal, em especial a imagem facial, proporcionaram a reflexão acerca do processo de formação da cuidadora/enfermeira. Nesse sentido, desenvolveu-se a tese de doutorado intitulada “O cuidado em situações de alteração da imagem facial: implicações na formação da enfermeira”, a qual teve como objetivo analisar a percepção de pacientes, acadêmicos de enfermagem e de docentes, quanto ao cuidado a indivíduos com alteração da imagem facial e as implicações de situações impactantes no processo formativo da enfermeira (MOSTARDEIRO, 2010). Tal estudo, realizado em uma Unidade de Clínica Cirúrgica, revelou que o cuidado a pacientes com a imagem facial alterada é percebido como uma vivência complexa, difícil e impactante tanto para os pacientes, como para os acadêmicos e docentes. Sinaliza-se que essas vivências, sejam elas de qualquer natureza e, nesse estudo, representada pela alteração da imagem facial, constituem oportunidades ímpares para o desenvolvimento das habilidades e competências necessárias para a formação da enfermeira no decorrer da trajetória acadêmica. As percepções emergidas apontaram para a importância dessas vivências, ao desencadearem em todos os envolvidos no cuidado, alicerces para autoconhecimento, compreensão do outro, necessidade de busca constante de aperfeiçoamento científico e principalmente o resgate da dimensão humana e ética da pessoa (MOSTARDEIRO, 2010). Considerando-se tais questões, sentiu-se a necessidade de buscar a percepção de profissionais de enfermagem, que realizam o cuidado em um cenário onde os pacientes com imagem facial alterada continuam buscando assistência. Acredita-se que a enfermagem, neste contexto, pode intervir junto ao indivíduo buscando realizar um cuidado mais próximo de suas necessidades, visando proporcionar uma melhor adaptação a essa nova condição. OBJETIVO Este estudo teve como objetivo analisar a percepção dos profissionais de enfermagem quanto ao cuidado ambulatorial a indivíduos com alteração da imagem facial. METODOLOGIA Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa exploratória realizada em um ambulatório de cabeça e pescoço no sul do país entre os meses de setembro a novembro de 2012. Os sujeitos do estudo foram cinco integrantes da equipe de enfermagem, que realizam cuidado direto aos pacientes. Foram incluídos os cuidadores do turno da manhã, lotados no referido serviço que, após a orientação sobre os objetivos e métodos do estudo, aceitaram participar da pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Utilizou-se como método de coleta dos dados a entrevista semiestruturada. Os dados que emergiram foram analisados pela técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 2011). Respeitaram-se os aspectos éticos tendo a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal de Santa Maria sob o parecer de número 0396.0.243.000-11. Seguindo a resolução 196/96 no que tange os aspectos éticos para pesquisa com seres humanos garantiu-se o anonimato dos participantes e suas falas foram identificadas com a letra “E” seguida do respectivo número da entrevista (BRASIL, 1996). RESULTADOS E DISCUSSÃO Os participantes do estudo foram quatro mulheres e um homem, com idades entre 49 e 60 anos. Quanto ao tempo de exercício profissional de cada um dos participantes no Ambulatório variou entre 15 a 32 anos. Após a análise das entrevistas evidenciamos duas categorias: preocupação com a estética e sentimentos ambíguos. As mesmas identificam como os profissionais de enfermagem acreditam ser para os pacientes serem cuidados tendo suas imagens faciais alteradas. A categoria intitulada preocupação com a estética emergiu de temas como valorização da aparência e alteração facial. Nessa corrida em busca do belo, onde mais importante do que ser é parecer, os sujeitos marcados especialmente por alguma patologia que provocou a alteração estética em sua face, procuram reconstruir suas autoimagens. Na percepção dos profissionais de enfermagem, ainda que apresentem consciência da impossibilidade de que suas imagens voltem a ser exatamente como antes, os pacientes demonstram preocupação com sua aparência diante da desfiguração Ao mensurar a forma como o indivíduo percebe seu corpo e as expectativas em relação à sua imagem corporal, pretende-se ultrapassar as limitações dos padrões normativos e do julgamento exclusivo por parte do profissional, passando a considerar também as necessidades subjetivas ou percebidas (CADENA; GUERRA, 2006). O profissional de enfermagem quando leva em consideração aspectos como autoimagem, autoestima e expectativas do paciente, além de estar indo ao encontro dos novos conceitos de saúde relacionados à qualidade de vida, pode significar um importante diferencial em relação à abordagem e direção do tratamento. A segunda categoria intitulada sentimentos ambíguos foi estruturada a partir dos temas resignação e esperança, que permearam as falas dos profissionais de enfermagem, revelando a percepção frente ao cuidar de um paciente com imagem facial alterada. A resignação em pacientes com a imagem do corpo alterada é manifestada devido ao fato de que, à medida que o tempo passa, o paciente necessita conviver e adaptar-se a sua nova condição e imagem de corpo, sendo esta uma estratégia conveniente (PEDROLO E ZAGO, 2000). Podemos perceber que para alguns desses pacientes, as dificuldades sobre a aceitação em relação às mudanças evidentes e significativas nos seus rostos, foram sendo postergadas, talvez na tentativa de que houvesse uma melhora do quadro e o dano revertesse, o que é compreensível quando se trata da condição humana (MOSTARDEIRO; PEDRO, 2011). Em suas falas, os profissionais de enfermagem identificaram nos pacientes a expectativa criada em torno da possibilidade da recuperação de sua imagem facial anterior. Para alguns pacientes, as dificuldades de aceitação em relação às mudanças significativas nos seus rostos se devem a esperança de que haja uma melhora do quadro e o dano seja revertido (MOSTARDEIRO, 2010). A esperança é movimentada por uma força que dá sentido à vida da pessoa, que pode estar relacionada aos filhos, à família, ao trabalho ou outra dimensão importante para ela. A manutenção da esperança parece favorecer decisões, iniciativas e esforços para a superação, denotando uma crença facilitadora da capacidade dos indivíduos em superar seus problemas (NARESSI et al, 2013). CONCLUSÕES Cuidar de pacientes com imagem facial alterada é algo muito difícil frente a gama de sentimentos envolvidos. Conforme os participantes da pesquisa ao cuidarem seus pacientes os mesmos conseguem observar na aparência deles várias informações significativas, da mesma forma, diversas emoções e sentimentos podem ser constatados ou projetados nesta imagem: simpatia as mais belas ou rejeição aos que apresentam algum tipo de alteração. Acreditam que a esperança na recuperação é o que estimula os pacientes na continuidade do tratamento. Acredita-se que o desenvolvimento desse estudo permitirá a ampliação do debate sobre a questão do cuidado a pacientes com alteração da imagem facial no que se refere a atuação do cuidador ambulatorial. Com isso, espera-se que a discussão permita a construção de novos significados para o cuidado, especialmente no que tange ao cotidiano do trabalho da enfermagem. REFERÊNCIAS BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa, Portugal; Edições 70, LDA, 2011, 223p. BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde, Comitê Nacional de Ética em Pesquisa em Seres Humanos. Resolução 196, de 10 de outubro de 1996: diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos. Brasília (DF); 1996. CADENA, S.M.D; GUERRA, C.M.F. Aparência facial e a imagem ideal.R Dental Press Estét - v. 3, n. 1, p. 27-38, jan./fev./mar. 2006. Disponível em: http://www.dentalpress.com.br/cms/wp-content/uploads/2009/04/v3n1_2.pdf CAVALCANTI, M.C.T. Conversando com a pessoa a ser amputada: uma contribuição à psicologia médica. [Tese] Campinas (SP) Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, 1991. Acesso em 04 jun 2013. Disponível em: http://cutter.unicamp.br/document/?code=000030252 PEDROLO, T.F; ZAGO, M.M.F. A imagem corporal alterada do laringectomizado: resignação com a condição. Rev Bras Cancerol. 2000;46(6):407-15. Acesso em 04 jun 2013. Disponível em: http://www.inca.gov.br/rbc/n_46/v04/artigo6.html MOSTARDEIRO, S.C.T.S. O cuidado em situações de alteração da imagem facial: implicações na formação da enfermeira [tese]. Porto Alegre: Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2010. MOSTARDEIRO, S.C.T.S; PEDRO, E.N.R. O cuidado de enfermagem em situações de alteração da imagem facial. Rev Gaúcha Enferm., Porto Alegre (RS) 2011 jun;32(2):294-301 NARESSI, D.A; GIRARDON-PERLINI, N.M.O; SAND, I.C.P et al. Crenças e resiliência em pacientes sobreviventes de leucemia. Rev enferm UFPE on line. Recife, 7(1):67-75, jan., 2013 SCHILDER, P. A imagem do corpo: as energias construtivas da psique. São Paulo: Martins Fontes; 2000.