Efeito do Lisinopril na Isquemia Experimental em Ratos. Influência

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Arq Bras Cardiol
volume 73, (nº 4), 1999
Zornoff
e cols.
Artigo
Original
Lisinopril na isquemia experimental
Efeito do Lisinopril na Isquemia Experimental em Ratos.
Influência do Tamanho do Infarto
Leonardo A. M. Zornoff, Beatriz B. Matsubara, Luiz S. Matsubara, Sérgio A. R. Paiva,
Maria T. T. Tornero, Joel Spadaro
Botucatu, SP
Objetivo - Os inibidores da enzima conversora da angiotensina vêm ganhando destaque como estratégia para
prevenir ou atenuar o processo de remodelação ventricular,
após o infarto do miocárdio. A importância do tamanho do
infarto em relação à resposta aos inibidores da enzima
conversora da angiotensina, entretanto, é controversa. O
objetivo deste estudo foi analisar os efeitos do lisinopril na
mortalidade, função cardíaca, grau de hipertrofia e fibrose
ventricular, em ratos com diferentes tamanhos de infarto.
Métodos - Lisinopril (20mg/kg/dia), dissolvido em
água de beber, foi administrado imediatamente após a
oclusão coronariana. Após sacrifício, os animais infartados foram divididos em dois grupos: infartos pequenos
(<40% do ventrículo esquerdo) ou grandes (>40% do
ventrículo esquerdo).
Resultados - A mortalidade foi de 31,7% com tratamento e de 47% nos ratos não tratados. Não houve diferença estatística entre os grupos infartados com infartos pequenos ou grandes em relação à concentração de hidroxiprolina. O tratamento atenuou, em infartos pequenos, a
disfunção cardíaca caracterizada por menor desenvolvimento de pressão e menores valores tanto da primeira derivada de pressão quanto da derivada negativa de pressão. O grau de hipertrofia também foi atenuado em infartos
pequenos. Para infartos grandes, não foram observadas
diferenças entre os grupos.
Conclusão - O tratamento com inibidores da enzima
conversora da angiotensina não exerceu efeitos na mortalidade e na quantidade de fibrose; o efeito protetor do lisinopril na função cardíaca e no grau de hipertrofia é detectável apenas em infartos pequenos.
Palavras-chave:
infarto do miocárdio, rato, lisinopril
Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP
Correspondência: Leonardo A. M. Zornoff - Faculdade de Medicina de Botucatu –
UNESP - Depto de Clínica Médica - Rubião Jr. S/N - 18618-000 - Botucatu, SP
Recebido para publicação em 31/3/99
Aceito em 7/6/99
Após infarto agudo do miocárdio ocorrem, freqüentemente, alterações da arquitetura ventricular, envolvendo tanto a região infartada como a não infartada. Nos últimos anos,
estas adaptações passaram a ser estudadas com o nome de
remodelação ventricular pós-infarto agudo do miocárdio 1.
Na fase inicial do infarto agudo do miocárdio, podemos observar dilatação ventricular aguda, caracterizada por
adelgaçamento e distenção da região infartada. Esta alteração é denominada expansão do infarto e resulta do deslizamento de áreas musculares necróticas em conseqüência da
desintegração do colágeno interfibrilar. Na fase tardia, observam-se seqüencialmente diferentes graus de dilatação
cardíaca que dependem da intensidade da manifestação
ventricular ocorrida no período inicial. A dilatação cavitária
tardia é resultado do processo de hipertrofia que envolve
ambos os ventrículos e parece manifestar-se como adaptação às novas situações de carga 1.
O reconhecimento e entendimento deste processo é
crucial, pois a remodelação ventricular está associada a um
pior prognóstico, pós-infarto, desde que sua presença e intensidade estão relacionadas com maior incidência na formação de aneurismas, ruptura cardíaca, piora funcional,
arritmias e maior mortalidade 2.
Outro aspecto importante relacionado à remodelação
ventricular é o fato de que sua evolução pode ser modificada por meio de diversas intervenções terapêuticas. Como
estratégia para prevenir ou atenuar este processo, vem ganhando destaque, nos últimos anos, o uso de inibidores da
enzima conversora da angiotensina. Existem dúvidas, como
por exemplo: em quais situações, corações submetidos ao
infarto se beneficiariam com o tratamento?
Assim, o objetivo deste trabalho foi analisar os efeitos
da administração de inibidores da enzima conversora da angiotensina sobre possíveis efeitos deletérios da remodelação ventricular, em diferentes tamanhos de infarto.
Métodos
Foram utilizados 293 ratos Wistar, machos, provenientes do Biotério do Câmpus de Botucatu, da UNESP, pesando entre 200-250 gramas.
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O infarto agudo do miocárdio foi produzido, de acordo
com método descrito previamente 3 e já padronizado em
nosso laboratório 4. Em resumo, após anestesia por inalação
de éter, era realizada toracotomia esquerda, entre o 4º e o 5º
espaços intercostais. O coração era exteriorizado por compressão lateral do tórax e a artéria coronária esquerda ligada,
cerca de 2mm de sua origem, com fio de polivinil (5-0,
Ethicon), entre a borda do átrio esquerdo e o sulco da artéria pulmonar. A seguir, o coração era rapidamente recolocado na cavidade torácica, o tórax fechado e os animais mantidos em gaiolas, para recuperação, alimentados com ração
comercial e livre acesso à água. Após 12h, que correspondem ao período por nós estipulado de recuperação cirúrgica, foram constituídos três grupos de animais: grupo NT
(n=51): formado pelos animais infartados que não receberam medicação; grupo LP (n=63): constituído de animais infartados que receberam, 12h após a cirurgia, lisinopril
(20mg/kg/dia) dissolvido em água de beber, por um período
de 3 meses. Esta dose acarreta efeitos antiproliferativos e
anti-hipertensivos 5; grupo C (n=10): composto pelos animais controle, submetidos ao mesmo procedimento cirúrgico, excetuando-se a ligadura da artéria coronária.
A partir da divisão dos grupos, os animais foram colocados em observação, registrando-se a mortalidade nos três
grupos estudados.
Após três meses, os animais sobreviventes receberam
pentobarbital sódico (50mg/kg) e heparina (1000UI) por via
intraperitoneal, sendo ventilados, com pressão positiva, com
oxigênio a 100%. A seguir, o tórax era aberto, as carótidas ligadas e a aorta cateterizada com cânula de metal nº 15, iniciandose a perfusão miocárdica retrógrada, com solução nutriente de
Krebs-Henseleit, usando-se a composição, em mM, 115 NaCl;
5,4 KCl; 1,2 MgSO4; 1,25 CaCl2; 1,15 NaH2SO4; 1,2 Na2SO4; 25
NaHCO3; 11 glicose, acrescida de insulina 10U/l e manitol, na
concentração de 8mM, para assegurar maior preservação
miocárdica 6.
Os corações eram então removidos da caixa torácica e
colocados em aparelho de estudo de coração isolado, tamanho 3-tipo 830 (Hugo Sachs Electronic - Grunstasse,
Germany), com pressão de perfusão constante de 75mmHg.
A solução nutriente era continuamente oxigenada com mistura gasosa de 95% de O2 e 5% de CO2, mantendo-se a pressão parcial de oxigênio entre 500 e 600mmHg, à temperatura
de 37ºC, com pH entre 7,3 e 7,4.
O átrio esquerdo era aberto e o ápice do ventrículo esquerdo puncionado com agulha, para drenar a cavidade
ventricular, evitando-se acúmulo de líquido no seu interior.
Um balão de borracha, tipo látex, atado a tubo rígido de duplo lúmen era colocado na cavidade ventricular. Uma das
comunicações do tubo rígido era conectada a transdutor de
pressão (STATHAN P23 X L) e a outra, a uma seringa de 1ml.
A musculatura atrial direita, compreendendo a região do
nódulo sinoatrial, era extirpada e eletrodo de marcapasso artificial colocado no miocárdio do ventrículo direito para se manter, artificialmente, a freqüência cardíaca entre 180 e 200bpm.
Por meio da preparação descrita, curvas de Starling
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eram obtidas com infusão de líquido no balão, que permitia
variar a pressão diastólica do ventrículo esquerdo de 0 a
30mmHg, através de incrementos graduais de 5mmHg, registrando-se a pressão sistólica correspondente a cada variação de volume. Em preparações assim concebidas, em
que o coração opera em contrações isovolumétricas, a pressão sistólica é considerada um bom indicador da capacidade
contrátil. Foram registradas também a primeira derivada de
pressão (+dp/dt) e a derivada negativa de pressão (-dp/dt).
Estes índices serviram, respectivamente, como parâmetros
de função sistólica e diastólica do ventrículo esquerdo.
O fator de calibração da derivada do ventrículo esquerdo
era obtido segundo a técnica utilizada por Moura Campos 7.
Após o estudo funcional, os corações eram retirados
do aparelho de perfusão, secos com papel filtro e o ventrículo direito, a seguir, dissecado. Os ventrículos direito e esquerdo (incluindo o septo ventricular) eram pesados e preparados para análise morfométrica.
Para a estimativa do grau de hipertrofia ventricular, foi
usado o peso do ventrículo direito, ajustado para o peso
corporal do rato (PVD/PC).
Após manutenção por 24h em solução de formol a
10%, o ventrículo esquerdo era preparado para a determinação do tamanho do infarto, sendo colocado em solução
contendo álcool a 70%, onde permanecia por mais 24h. A
seguir, era realizado, em cada coração, corte transversal entre 5 e 6mm do ápice para a base, pelo fato de este corte refletir a média dos resultados de cortes de todo ventrículo 8,9. O
tecido miocárdico obtido era corado em lâmina, com solução
de hematoxilina-eosina e utilizado para análise morfométrica, realizada por meio da medida dos comprimentos epicárdicos endocárdicos dos segmentos infartados e não infartados, calculando-se, assim, a porcentagem de comprimento
infartado em relação ao comprimento total do ventrículo esquerdo. Os infartos que corresponderam a mais de 40% do
ventrículo esquerdo considerados infartos grandes, e os
que corresponderam a menos de 40% do ventrículo esquerdo foram considerados infartos pequenos. Conseqüentemente, os animais dos grupos NT e LP foram subdivididos
em função destes diferentes tamanhos de infarto.
As dosagens de hidroxiprolina no ventrículo direito e
na região medial do septo do ventrículo esquerdo foram
realizadas de acordo com a técnica descrita por Switzer 10.
Em relação à metodologia estatística, utilizamos a análise de sobrevivência (curva de Kaplan Meier), para a mortalidade; as diferenças entre as curvas foram analisadas pelo
teste Log-Rank. Para a estimativa de hipertrofia cardíaca foram plotados os dados individuais, as médias e o erros padrão de cada grupo. As diferenças observadas foram analisadas pelo teste de análise de variância (ANOVA). A estimativa de fibrose cardíaca foi feita por meio do teste de
Kruskal-Wallis. Para testar a homocedasticidade, em cada
tempo, dos resultados obtidos no estudo funcional, utilizamos o teste de Bartlett e, após este estudo, para comparação entre os grupos, foi utilizada análise de variância
(ANOVA). O nível de significância utilizado foi de 5%.
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A tabela I mostra o número de ratos sobreviventes que
apresentavam infarto grande e pequeno após o período de
90 dias, em cada grupo.
Na figura 1 estão apresentados os resultados do estudo funcional realizado em corações com infartos pequenos.
Podemos verificar que, para todos os níveis de pressão
diastólica, as pressões sistólicas são maiores no grupo C
em relação aos grupos LP e NT (p<0,05). Por sua vez, as
pressões sistólicas do grupo LP foram estatisticamente
maiores que as do grupo NT (A). Em relação à +dp/dt (B),
podemos verificar que, para todos os níveis de pressão
diastólica, os valores da +dp/dt são maiores no grupo C. Em
adição, podemos observar que para níveis de pressão diastólica de 0 até 20mmHg, os valores da derivada foram maioTabela I - Grupos de animais utilizados nos estudos morfofuncionais, após 90 dias do infarto.
Grupos
C
NT
LP
IAM P (<40% do VE)
IAM G (>40% do VE)
10
13
18
10
11
15
+ dp/dt (mmHg/s)
Pressão Sistólica (mmHg)
IAM P- infarto pequeno; IAM G- infarto grande; VE- ventrículo esquerdo; C- controle; NT- não tratado; LP- lisinopril. * os números representam o montante de ratos em cada grupo.
res no grupo LP em relação ao grupo NT (p<0,05). Para valores de pressão diastólica de 25 e 30mmHg, entretanto, os valores da derivada não mostraram diferenças significantes
entre os grupos. Resultados semelhantes foram obtidos em
relação à -dp/dt (C). Para grandes infartos, a análise dos resultados mostra que o grupo C apresenta resultados maiores estatisticamente em relação aos grupos LP e NT, para
qualquer variável. Por sua vez, a pressão sistólica do grupo
LP foi maior em comparação ao grupo NT apenas para pressão diastólica de 0mmHg e 5mmHg. Para valores de pressão
diastólica acima de 10mmHg não houve diferenças significantes entre os grupos (fig. 2-A). Em relação à +dp/dt (B) e à
-dp/dt (C), os resultados não mostraram diferenças significantes entre os grupos LP e NT.
Quanto à estimativa de hipertrofia cardíaca, em infartos pequenos verificou-se menor relação PVD/PC nos corações dos animais controle em relação aos dos animais tratados com lisinopril e os dos animais não tratados. Por sua
vez, o grupo LP apresentou menor relação PVD/PC quando
comparado com o grupo NT (p<0,05) (fig. 3-A). Para grandes
infartos, as relações PVD/PC dos grupos NT e LP não apresentaram diferenças significantes entre si. Por sua vez, o
grupo C apresentou menor PVD/PC em relação aos grupos
com infarto (B).
Na tabela II estão apresentados os resultados das
concentrações de hidroxiprolina. Para infartos pequenos,
podemos observar que o grupo C apresentou menor con-
- dp/dt (mmHg/s)
Resultados
Fig. 1 -Representação gráfica, na forma de curvas médias ± erro padrão, do estudo funcional em infartos pequenos. A- pressão sistólica; B- dP/dt; C- -dP/dt; NT- não tratado; LPlisinopril; C- controle. *p<0,05 vs C e NT.
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-dp/dt (mmHg/s)
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+ dp/dt (mmHg/s)
Pressão Sistólica (mmHg)
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Fig. 2 - Representação gráfica, na forma de curvas médias ± erro padrão, do estudo funcional em infartos grandes. A- pressão sistólica; B- dP/dt; C- -dP/dt; NT- não tratado; LPlisinopril; C- controle. *p<0,05 vs LP.
centração de hidroxiprolina que os grupos infartados. Por
sua vez, os grupos NT e LP não apresentaram diferenças
estatisticamente significantes. Resultados semelhantes foram obtidos em relação aos infartos grandes.
Em relação à análise de sobrevida, verificou-se que
após o período de recuperação de 12h, a mortalidade observada no grupo C foi zero; 31,7% para o grupo LP e 47% para
o grupo NT. A diferença entre os grupos LP e NT não atingiu significância estatística (fig. 4).
Discussão
Com a presente investigação, evidenciamos o efeito
benéfico da administração de lisinopril, em variáveis evolutivas das adaptações miocárdicas, que ocorrem após o infarto agudo do miocárdio. Saliente-se que a análise crítica de
nossos resultados permite a afirmação de que a capacidade
de atuação do lisinopril variou tanto em função do tamanho
do infarto como do parâmetro analisado.
Em relação ao método de estudo funcional, em nossa
preparação utilizavam-se contrações cardíacas isovolumétricas; nessas condições, a pressão sistólica desenvolvida durante as contrações, bem como a +dP/dt, são aceitas como
parâmetros de função sistólica 11-13. Da mesma maneira, a -dP/
dt é utilizada como parâmetro de função diastólica 14.
Quanto aos nossos resultados, podemos observar que
para infartos pequenos, o tratamento com lisinopril resultou
362
em melhora no desempenho cardíaco. Esta melhora pode ser
verificada tanto pelos parâmetros de função sistólica (PS e
+dP/dt) quanto pelo parâmetro de função diastólica (-dP/
dt). É interessante notar que, para a +dP/dt e -dP/dt, o grupo
LP apresentou diferenças significantes nos seus valores,
em comparação ao grupo NT, apenas até a pressão diastólica de 20mmHg.
Para infartos grandes, não verificamos diferenças entre os dois grupos infartados, quando os parâmetros funcionais analisados foram a +dP/dt e a -dP/dt. Em relação à pressão sistólica, podemos observar que o grupo LP apresentou maior capacidade de gerar força. Este achado, entretanto, foi observado apenas com pressão diastólica de 0 e
5mmHg; acima destes níveis de pressão diastólica, não houve diferença entre os grupos infartados. Outros autores verificaram que corações infartados de ratos apresentaram
melhora no desempenho funcional, em relação a animais
controle, quando submetidos ao aumento progressivo da
pressão diastólica 15,16. Considerando-se que o estiramento
da fibra miocárdica aumenta o grau de ativação contrátil, poderíamos supor que, no nosso modelo, corações mais preservados em conseqüência do insulto isquêmico seriam
menos dependentes da pré-carga para desenvolver força.
Para corações com maior grau de comprometimento, entretanto, seriam necessárias maiores pressões de enchimento
para atingir-se grau máximo de ativação contrátil.
A relação peso ventricular/peso corpóreo, apesar de
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Tabela II - Mediana dos valores das concentrações de hidroxiprolina
(mg/g de tecido seco).
Grupo
Ventrículo direito/peso do corpo (mg/g)
NT
LP
C
Fig. 3 - Representação da estimativa de hipertrofia cardíaca, com os dados individuais e as médias ± erro padrão. A- infarto pequeno; B- infarto grande; NT- não ratado;
LP- lisinopril; C- controle. *p<0,05 vs NT.
ser um índice indireto de hipertrofia cardíaca, é utilizada em
diversos modelos experimentais para aquilatar crescimento
celular. A complexa seqüência de eventos, alguns contrapostos, como reabsorção de tecido miocárdico necrótico,
qualidade da cicatriz e grau de hipertrofia, pode interferir no
peso do ventrículo infartado de modo a não refletir real crescimento celular 17. Assim, optamos por não considerar este
parâmetro em nosso experimento.
Por outro lado, em função do comprometimento do
ventrículo esquerdo infartado ocorrem alterações hemodinâmicas (hipertensão arterial pulmonar) e neuro-humorais
(aumento da concentração de angiotensina II e catecolaminas, entre outras). Estes eventos levam a aumento da massa
do ventrículo direito, caracterizado por crescimento do miócito, edema e acúmulo de colágeno, que estão em relação direta com o tamanho da área infartada. Como se depreende do
exposto acima, embora o aumento da massa ventricular direita não espelhe exclusivamente o processo hipertrófico, a
relação PVD/PC é aceita na literatura como parâmetro de
crescimento celular neste modelo 11,17,18. Estes achados foram reafirmados em trabalho anterior, de nosso laboratório,
onde se verificou que em ratos submetidos à oclusão da
IAM P
IAM G
VD
VE
VD
VE
3,95
5,78
3,03*
4,34
4,36
2,93*
6,73
5,33
3,03*
5,44
4,81
2,93*
IAM P- infarto pequeno; IAM G- infarto grande; VD- ventrículo direito; VE- ventrículo esquerdo; NT- não tratado; LP- lisinopril precoce;
C- controle; *p < 0,05 vs NT e LP.
artéria coronária esquerda, tanto a relação PVD/PC quanto o
diâmetro transverso dos miócitos do ventrículo direito eram
significantemente maiores do que nos animais controle, 21
dias após o infarto 19.
Em nosso trabalho, os resultados variaram em função
do tamanho do infarto. Nos grandes infartos, a administração de inibidores da enzima conversora da angiotensina
não alterou o grau de hipertrofia. No caso de pequenos infartos, entretanto, o lisinopril atenuou a hipertrofia adaptativa pós-infarto agudo do miocárdio.
A quantidade de colágeno no ventrículo direito e no
tecido remanescente do ventrículo esquerdo foi analisada,
em nosso trabalho, por meio da concentração de hidroxiprolina. Apesar de ser um método quantitativo indireto, verificou-se estreita correlação entre o método bioquímico e a
quantidade de colágeno analisada por morfometria 20,21. Esta
constatação permite que a concentração de hidroxiprolina
seja aceita como parâmetro de quantidade de colágeno,
neste modelo 22,23.
Apesar das evidências de que a atividade dos fibroblastos possa ser regulada pela AII e pela aldosterona 24, a
capacidade de interferência dos inibidores da enzima conversora da angiotensina no processo de fibrose é ainda,
controversa. Alguns autores verificaram que os inibidores
Fig. 4 - Mortalidade, na forma de curva de Kaplan-Meyer, entre os grupos. NT- não
tratado; LP- lisinopril; C- controle; p>0,05 entre NT e LP.
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da enzima conversora da angiotensina diminuíram o montante tecidual de colágeno 23,25, enquanto outros não evidenciaram interferência do tratamento na intensidade da fibrose
após o infarto 17,22.
Em nosso estudo, podemos observar que o infarto se
acompanha de aumento da concentração de colágeno. Por
sua vez, não observamos diferenças na concentração de hidroxiprolina entre os dois grupos infartados. Deste modo, nossos
dados sugerem que o lisinopril não interfere com a quantidade
de colágeno, independentemente do tamanho do infarto.
Outro aspecto relevante observado na presente investigação refere-se à sobrevida, já que a mortalidade entre os grupos não atingiu significância estatística. Desta forma, nossos
resultados são discordantes dos dados obtidos em outros
modelos experimentais, nos quais se verificou diminuição da
mortalidade com o uso de inibidores da enzima conversora da
angiotensina pós-infarto agudo do miocárdio 26,27. A explicação
para os resultados divergentes poderia se basear na duração
das pesquisas, pois enquanto aqueles autores observaram os
animais por um período de um ano, nosso tempo de seguimento foi de três meses.
Portanto, os dados disponíveis até o momento admitem a
suposição de que parâmetros morfo-funcionais possam ser
avaliados precocemente pós-infarto agudo do miocárdio. Para
análises relativas à mortalidade, entretanto, seria prudente utilizar um período maior de observação, no qual diferenças de
comportamento poderiam tornar-se mais evidentes.
Outra hipótese a ser aventada para explicar os resultados divergentes em nossa pesquisa poderia estar fundamentada no fato de que, nos animais dos dois grupos infartados, aproximadamente a metade (45%) dos óbitos ocorreu
na primeira semana após o infarto. Assim, esta alta mortalidade precoce poderia ter diminuído a sensibilidade da análise estatística, determinando uma igualdade matemática.
Para testar esse possível vício estatístico, optamos como
estratégia, por não considerar os animais que morreram na
primeira semana após a oclusão coronariana. A análise de
sobrevida nesta nova situação, durante período de 11 semanas, permitiu a verificação de que a mortalidade apresentada
pelos animais do grupo tratado com lisinopril (LP) foi estatisticamente menor do que a dos animais não tratados. Desta forma, como resultado da já citada alta mortalidade nos
primeiros dias após o infarto, este modelo experimental poderia induzir a uma impropriedade estatística.
Assim, nossos resultados sugerem que em modelos
experimentais semelhantes ao nosso, estudos de mortalidade deveriam compreender período mais longo de observa-
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ção, ou maior tempo de recuperação cirúrgica. Esta tática ampliaria a aplicabilidade deste modelo em relação ao efeito
protetor de drogas sobre a mortalidade pós-infarto agudo
do miocárdio.
Portanto, tanto em relação ao estudo funcional como
à estimativa de hipertrofia cardíaca, houve atenuação dos
efeitos deletérios inerentes à remodelação ventricular, apenas, nos infartos comprometendo menos do que 40% do
ventrículo esquerdo.
Nossos dados estão em concordância com os resultados de outros autores. Assim, Pfeffer e cols. 26 demonstraram, em ratos, que a administração de captopril reduziu a
mortalidade, em período de observação de um ano após a
oclusão coronariana, apenas nos animais com infarto comprometendo entre 20 e 40% do ventrículo esquerdo (infarto
moderado). Animais com infartos pequenos (<20% do ventrículo esquerdo) e grandes (>40% do ventrículo esquerdo)
não se beneficiaram com o tratamento, em relação à sobrevida. No mesmo modelo experimental, Vollert e cols. 27 verificaram benefícios do tratamento para animais com infartos
pequenos e moderados. O uso de lisinopril, porém, não interferiu com a mortalidade, nos casos de grandes infartos.
Assim, os resultados disponíveis, até o momento,
permitem a suposição de que pequenos infartos ofereceriam menor substrato fisiopatológico para a remodelação
ventricular e, portanto, o efeito do tratamento não teria a
mesma relevância em comparação aos efeitos obtidos em
infartos moderados. Da mesma forma, grandes infartos resultariam em alterações morfo-funcionais tão exuberantes,
que este fenômeno atenuaria o poder de interferência de
inibidores da enzima conversora da angiotensina na evolução do processo isquêmico, após o infarto agudo do
miocárdio.
Diante do exposto, o conjunto dos nossos resultados
permite as seguintes conclusões: o uso do lisinopril, pós-infarto agudo do miocárdio, acompanha-se de atenuação da
remodelação ventricular, promovendo melhora nos parâmetros funcionais e grau de hipertrofia. O tratamento não modificou a mortalidade e a quantidade de colágeno. A capacidade de interferência do lisinopril depende do tamanho do
infarto, adquirindo relevância apenas em infartos que comprometem menos do que 40% do ventrículo esquerdo.
Agradecimentos
À Sra. Valéria Maria Ricarelli de Oliveira e ao Sr. Mario
Augusto Dallaqua pela colaboração prestada.
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Referências
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