Artigo de Nelson Barbosa Uma proposta de ajuste de médio prazo da TJLP Muito se tem discutido sobre a necessidade ou não de novos aportes do governo nas Instituições Financeiras Oficiais (IFOs), especialmente no BNDES. Provavelmente, a ampliação dos investimentos de longo prazo no Brasil ainda dependerá do apoio do BNDES nos próximos anos, o que, por sua vez, implica novos empréstimos da União a tal instituição, ainda que decrescentes, como já está sendo feito pelo governo. Em contraste, pouco tem se discutido sobre a taxa de remuneração paga pelas IFOs à União. O custo de carregamento de uma operação financeira depende tanto do seu volume quanto da diferença entre as taxas de captação e aplicação dos recursos. Tão importante quanto discutir o volume de novos empréstimos da União ao BNDES é discutir a taxa de remuneração paga pelo BNDES à União. Para dar um exemplo numérico da questão, considere que hoje a União tem aproximadamente R$ 500 bilhões de crédito junto às IFOs. Em linhas gerais, a União recebe 5% ao ano sobre estas aplicações, mas se financia a uma taxa de juro bem superior no mercado interno ou externo. Tomando o custo médio de captação do Tesouro Nacional como referência, a União pagou uma taxa de juro de aproximadamente 11% ao ano nos últimos 12 meses (segundo o relatório mensal da dívida pública de junho de 2014, o custo financeiro da dívida pública mobiliária federal interna – DPMFi – foi de 11,17% nos 12 meses acumulados até tal mês). A atual diferença entre as taxas de juro de captação e aplicação dos recursos federais em IFOs representa um gasto financeiro de (11%-5%) x 500 = 30 bilhões por ano. Em outras palavras, o custo de carregamento dos aportes e empréstimos de recursos às IFOs já atinge aproximadamente 0,6% do PIB brasileiro. A manutenção da estabilidade fiscal nos próximos anos depende de ações no orçamento primário e no orçamento financeiro do setor público. Do lado do resultado primário, é necessário recuperar a capacidade de o governo produzir superávits recorrentes no nível necessário para reduzir gradualmente a dívida do setor público em % do PIB. Do lado financeiro, é necessário reduzir o custo de carregamento do crédito direcionado mediante a desaceleração dos aportes da União nas IFOs, sobretudo no BNDES, bem como a elevação gradual da TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo). Os dois assuntos estão obviamente relacionados, mas os detalhes da dinâmica da dívida pública brasileira estão além do escopo desta nota (para uma análise deste tópico,ver Barbosa-Filho, N.H. (2014),“Resultado Primário, Dívida Líquida e Dívida Bruta no Brasil: Um Modelo Contábil”, mimeo). Focando somente na TJLP, qual deve ser o valor dessa taxa nos próximos anos? Teoricamente, o custo de carregamento dos empréstimos da União às IFOs é zero se a TJLP for igual ao custo médio de captação do Tesouro Nacional, hoje em 11%. Porém, um dos objetivos da TJLP é justamente oferecer uma taxa de juro subsidiada para o financiamento de longo prazo no Brasil, especialmente para projetos com grande impacto positivo sobre o desenvolvimento econômico e social (o que os economistas chamam de “efeito derramamento” e “externalidades positivas”). Com base na visão acima, e no fato de que é preciso aumentar a taxa de investimento no Brasil, ainda vale a pena manter a TJLP abaixo do custo de captação do Tesouro Nacional, mas não na magnitude atual. Em outras palavras, diante da carência de investimentos em infraestrutura e inovação no Brasil, ainda é justificável conceder um subsídio financeiro a alguns projetos de investimento, mas não no montante atual. A forte restrição fiscal do governo recomenda a redução, mas não a eliminação dos subsídios financeiros ao investimento via BNDES. O atendimento das demandas sociais de serviços públicos universais de qualidade implica uma realocação de recursos públicos, com maior prioridade para o orçamento social nos próximos anos. Uma proposta para sair da situação atual é elevar a TJLP gradualmente para a taxa de crescimento esperada para o PIB nominal da economia nos próximos quatro anos. Quanto seria isso hoje? Com base nas expectativas de mercado apresentadas na tabela1, o crescimento nominal do PIB esperado para 2015-18 está em 8,3% aa. Uma elevação gradual da TJLP para tal nível diminuiria à metade o custo de carregamento dos empréstimos da União às IFOs e, ainda assim, consistiria um subsídio ao investimento, pois o custo de captação do Tesouro Nacional é normalmente superior a taxa de crescimento nominal da economia. Do ponto de vista de longo prazo, vale a pena utilizar a taxa de crescimento do PIB nominal como referência para a TJLP porque, com estabilidade da carga tributária, a taxa de crescimento da receita do governo é igual à taxa de crescimento da economia. Assim, fazendo a TJLP convergir para taxa de crescimento do PIB, o governo estaria financiando o investimento de longo prazo a uma taxa equivalente a taxa de crescimento de sua receita. A transição para a nova fórmula da TJLP deve ser gradual, para que o setor privado possa absorver a mudança sem grandes variações de preço. Do ponto de vista macroeconômico, a diminuição do subsídio financeiro será compensada pela aceleração também gradual do PIB e a desaceleração gradual da inflação, pois a elevação da TJLP é uma das medidas necessárias para diminuir a incerteza macroeconômica sobre os próximos anos. A decisão de investimento depende de uma avaliação do custo financeiro, do risco e da expectativa de demanda do projeto. De nada adianta oferecer um baixo custo financeiro se isso vem acompanhado de alto risco (incerteza macroeconômica) e baixa expectativa de demanda (lento crescimento). Nesse contexto, a elevação gradual da TJLP, juntamente com outras medidas de política macroeconômica e regulatória, pode rapidamente mudar o estados das expectativas de longo prazo no Brasil e resultar na aceleração do investimento privado. Por fim, hoje o valor da TJLP é definido pela 10.183/01, como a soma da meta de inflação com o prêmio de risco do País. A mudança da TJLP envolveria basicamente dois passos: 1. Definir que a nova fórmula da TJLP será igual à soma da taxa de crescimento do PIB real com a taxa de inflação esperadas pelo mercado para os próximos quatro anos. 2. Estabelecer uma transição para a nova fórmula, com prazo mínimo de dois anos (por exemplo: de dezembro de 2014 a dezembro de 2016), e ajustes a cada reunião trimestral do CMN, como apresentado na tabela 2). Com uma transição de dois anos, todas as empresas com empréstimos referenciados na TJLP terão tempo para ajustar suas decisões e contratos à nova fórmula, que, por sua vez, diminuirá a restrição fiscal do governo e contribuirá para a recuperação do crescimento da economia.”