Voto de pesar 2/131 – Mário Ruivo “É preciso desencapsular as ideias”- Mário Ruivo A morte de Mário Ruivo, cientista, ambientalista e cidadão exemplar, deixa-nos a todos mais pobres. Grande defensor dos oceanos, Mário Ruivo teve um percurso ímpar como investigador, como político e como incansável construtor de consensos em torno de causas globais e nacionais. Nascido em Campo Maior, em 1927, orgulhava-se da sua ascendência alentejana. Vestia sempre roupa da mesma cor, um verde seco a que se mantinha fiel em todas as estações do ano. Era único na forma como a sua vivacidade e inquietação permanente coabitavam com um elevado sentido pedagógico e uma capacidade de estimular a criatividade à sua volta. Pioneiro na defesa dos oceanos, projectou Portugal no mundo nos mais diversos cargos que desempenhou. Devemos-lhe, entre muitas outras conquistas, a notável participação portuguesa, cuja delegação chefiou, nas negociações para a Convenção das Nações Unidas para o Direito do Mar, assinada em 1982. Mais tarde, com o apoio da COI – Comissão Oceanográfica Internacional, da UNESCO, organizou em Lisboa, em 1994, a segunda Conferência Internacional de Oceanografia, que juntou pessoas de todo o mundo e foi presidida por Mário Soares, então Presidente da República e amigo de longa data de Mário Ruivo. Foi aliás no funeral de Mário Soares que Mário Ruivo fez a sua última aparição pública, já muito fragilizado. Era um optimista e transmitia entusiasmo a quem com ele trabalhava. Deixou uma marca indelével no Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável, a que presidia, com o seu talento para abrir novos caminhos e “desencapsular ideias”, como gostava de dizer. Licenciado em Biologia em 1950 pela Faculdade de Ciências de Lisboa, especializou-se em oceanografia e gestão de recursos vivos, pela Sorbonne, em Paris. Mas mais do que a investigação, o que o movia era a necessidade de acção, o que o levou desde cedo a participar em organismos nacionais e internacionais ligados ao mar, com uma visão estratégica invulgar. Homem de esquerda, exilou-se em Roma a partir de 1961 e teve um destacado papel no apoio a muitos antifascistas. Foi membro de vários governos provisórios após o 25 de abril, como Secretário de Estado das Pescas, em 1974 e 1975 e Ministro dos Negócios Estrangeiros, em 1975. Em 1998, Ano Internacional dos Oceanos, foi conselheiro científico da EXPO-98 e, com Mário Soares na Presidência da Comissão Mundial Independente para os Oceanos, coordenou o relatório “O Oceano: Nosso Futuro” e dirigiu o programa dinamizador das Ciências e Tecnologias do Mar, nomeado pelo então Ministro da Ciência e Tecnologia, Mariano Gago. Fundou em 2000 o EurOcean, um centro europeu dedicado à informação em ciência e tecnologias do mar, cuja sede trouxe para Lisboa, tendo conseguido também ver coroada de êxito a candidatura de Lisboa a sede da Agência Europeia ara a Segurança Marítima, em 2002. Actualmente, presidia ao comité português da COI, de que foi secretário-geral na década de oitenta, bem como ao Fórum Permanente para os Assuntos do Mar. Mário Ruivo deixa-nos um fabuloso legado de pensamento e acção sobre o Mar, um dos fundamentos da nossa própria identidade enquanto Nação. Mas soube renovar, ampliar e universalizar essa causa, de forma visionária e transversal, antecipando um futuro por que ansiava para Portugal e para o mundo. A Assembleia Municipal de Lisboa, reunida em 31 de janeiro de 2017, presta homenagem ao grande cidadão, ao cientista e ao militante de nobres causas que foi Mário Ruivo, envia condolências à sua família e recomenda à Câmara Municipal que preserve a sua memória na memória colectiva de Lisboa, atribuindo o seu nome a um espaço condigno e ligado ao Mar na nossa cidade. Lisboa, 31 de janeiro de 2017 A Presidente da Assembleia Municipal Helena Roseta