Antiagregantes Plaquetários e Testes de Função Plaquetária na Era

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Rev Bras Cardiol. 2012;25(4):340-349
julho/agosto
Artigo
de Revisão
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Villacorta et al.
Antiagregantes Plaquetários
Artigo de Revisão
Antiagregantes Plaquetários e Testes de Função Plaquetária
na Era dos Stents Coronarianos
Antiplatelet Therapy and Platelet Reactivity Tests in the Era of Coronary Stents
Aline Sterque Villacorta, Humberto Villacorta Jr
Resumo
Abstract
Em pacientes portadores de stents coronarianos é
obrigatória a utilização de dupla antiagregação
plaquetária com ácido acetilsalicílico e clopidogrel. Um
número considerável de pacientes portadores de stents
em uso de clopidogrel apresenta alta reatividade
plaquetária, caracterizando uma resposta deficiente a
esse fármaco. Esses pacientes apresentam risco mais
elevado não apenas de trombose de stents, mas também
de morte cardiovascular, infarto agudo do miocárdio e
reestenose intra-stent. Dobrar a dose de manutenção do
clopidogrel não se mostrou uma estratégia eficaz. A
utilização de drogas mais potentes, como prasugrel e
ticagrelor parece ser uma estratégia válida, principalmente
no contexto de síndrome coronariana aguda, mas não há
trabalhos confirmando os benefícios em pacientes
estáveis. Nos pacientes crônicos em uso de clopidogrel,
não há recomendações na literatura para realização de
rotina dos testes de função plaquetária, mas esses podem
ser realizados em casos selecionados.
Patients treated with coronary stents must follow dual
antiplatelet treatment with ASA and clopidogrel. A
considerable number of stented patients taking
clopidogrel present high platelet reactivity, indicating
inadequate responses to this drug. These patients are
at higher risk not only for stent thrombosis, but also
cardiovascular death, acute myocardial infarction and
intra-stent restenosis. Double-dose clopidogrel
treatment has not been an effective strategy. The use
of more powerful drugs such as prasugrel or ticagrelor
seems to be more valid, particularly in a context of
acute coronary syndrome, but there are no studies
confirming the benefits for stable patients. For chronic
patients taking clopidogrel, there are no
recommendations in the literature on routine platelet
function assessment tests, but they may be performed
in selected cases.
Palavras-chave: Stents farmacológicos/efeitos adversos;
Inibidores da agregação de plaquetas; Agregação
plaquetária; Testes de função plaquetária
Keywords: Drug-eluting stents/adverse effects; Platelet
aggregation inhibitors; platelet aggregation, Platelet
function tests
Introdução
miocárdica) e percutâneo. A intervenção coronariana
percutânea (ICP) foi realizada pela primeira vez em
humanos, segundo Popma et al. 2, por Andreas
Gruentzig em 1977. Em seguida, foram criados os
stents convencionais e posteriormente stents eluídos
em drogas, como sirolimus e paclitaxel, que reduziam
a proliferação neointimal, diminuindo
significativamente a taxa de reestenose. Esses stents
foram denominados stents farmacológicos.
As doenças cardiovasculares são a principal causa de
morte nos países ocidentais. No estado do Rio de
Janeiro alta letalidade foi observada por síndrome
coronariana aguda (SCA)1.
O tratamento da doença arterial coronariana (DAC)
pode ser: medicamentoso, cirúrgico (revascularização
Programa de Pós-graduação em Ciências Cardiovasculares - Universidade Federal Fluminense (UFF) - Niterói, RJ - Brasil
Correspondência: Humberto Villacorta Jr
E-mail: [email protected]
Rua Marquês do Paraná, 303 Cardiologia - Centro - 24033-900 - Niterói, RJ - Brasil
Recebido em: 06/03/2012 | Aceito em: 31/07/2012
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Se por um lado, os stents farmacológicos atenuaram o
problema da reestenose, uma nova complicação surgiu
em virtude dessa lenta reepitelização3. A trombose
intra-stent tornou-se um problema importante, já que
levava a quadros dramáticos de SCA e morte. Para
combatê-la fez-se necessária a utilização de drogas
antiagregantes plaquetárias, bloqueando-se o sistema
através de diferentes vias. As drogas classicamente
utilizadas para esse fim são o ácido acetilsalicílico
(AAS) e o clopidogrel, constituindo a chamada dupla
antiagregação plaquetária2.
ideais5. Esses pacientes passaram a ser conhecidos
como não respondedores ao clopidogrel, considerandose o critério laboratorial. Mais recentemente, tem-se
usado o termo alta reatividade plaquetária em uso de
clopidogrel.
Mais recentemente, uma nova geração de stents
farmacológicos surgiu. No estudo SPIRIT III4, o stent
Xience foi comparado ao stent Taxus em pacientes sob
uso de dupla antiagregação plaquetária por seis meses.
O stent Xience mostrou-se superior em reduzir a taxa
de eventos combinados aos nove meses (4,6% vs. 8,1%;
RR 0,56, IC95% 0,34-0,94; p=0,03) e um ano (6,0% vs.
10,3%; RR 0,58, IC95% 0,37-0,90; p=0,02)4.
Fármacos antiagregantes plaquetários
Os fármacos antiplaquetários usados no manuseio de
pacientes com DAC podem atuar por diversas vias da
cascata da coagulação. A Figura 1 mostra os principais
fármacos antiplaquetários e seus sítios de ação.
Após o implante de stent farmacológico de primeira
geração, é obrigatório o uso de AAS e clopidogrel por
um período mínimo de um ano2. A eficácia antiagregante
dessas drogas pode ser avaliada por testes de
agregação plaquetária. O AAS pode ser avaliado pela
medida de atividade do ácido aracdônico e o
clopidogrel por uma série de testes, sendo os mais
utilizados a agregometria óptica, que mede a atividade
da adenosina difosfato (ADP), e o teste point of care
Verify Now.
Com a utilização desses testes, observou-se que 4% a
40% dos pacientes em uso do clopidogrel não
apresentam antiagregação plaquetária em níveis
O objetivo deste artigo é revisar os antiplaquetários
tradicionais, discutir os novos medicamentos
antiplaquetários e realizar uma atualização sobre os
testes de agregação plaquetária, com enfoque em
pacientes submetidos a implante de stents coronarianos.
Após o evento de ruptura da placa de aterosclerose e
subsequente exposição do material lipídico, ocorre
ativação de todos os mecanismos responsáveis pela
formação local do trombo plaquetário. Assim sendo,
um dos objetivos no tratamento da SCA é impedir a
formação desses trombos, que podem ser oclusivos
ou não, causando ou prolongando a isquemia
miocárdica. O tratamento é feito através do bloqueio
da agregação plaquetária em diversos níveis, incluindo
AAS e tienopiridínicos6.
Ácido acetilsalicílico (AAS)
O AAS é representante da classe medicamentosa de
anti-inflamatórios não hormonais e atua através da
inibição permanente da enzima ciclooxigenase
(COX), o que gera bloqueio na síntese de tromboxane
A2 (TXA2) a partir do ácido aracdônico (AA) e ainda
Figura 1
Fármacos antiagregantes plaquetários e seus sítios de ação
AAS=ácido acetilsalicílico; ADP=adenosina difosfato; COX=ciclooxigenase; TXA2=tromboxane A2
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bloqueia a formação de prostaglandinas. A ação do
AAS é irreversível, e seus efeitos perduram durante
toda a meia-vida das plaquetas, em torno de 7-10
dias6.
Inúmeros trabalhos mostraram benefícios da
terapêutica antiagregante plaquetária com o AAS nas
SCA, tanto com supradesnivelamento quanto sem
supradesnivelamento de ST 7,8. A American Heart
Association e o American College of Cardiology (AHA/
ACC)9 recomendam o uso de AAS na dose inicial de
162mg a 325mg para todos os pacientes com
apresentação clínica de IAMCSST ou SCA sem
supradesnível do segmento ST, exceto se houver
contraindicação.
O AAS deve ser mantido indefinidamente como
profilaxia secundária naqueles pacientes que
sobreviveram a evento isquêmico miocárdico agudo.
A dose preconizada nesse contexto, segundo orientação
do AHA/ACC, é de 75mg a 162mg/dia9.
Alguns pacientes podem não respondedor ao AAS,
mas isso é pouco frequente e não há dados que
sugiram que uma estratégia de pesquisa ativa dessa
possível resistência seja uma medida efetiva.
Drogas tienopiridínicas
Houve surgimento de novas drogas antiagregantes
plaquetárias, o grupo dos tienopiridínicos,
inicialmente utilizadas na prática clínica como
alternativa ao uso do AAS, quando havia
contraindicação para tal droga.
O grupo medicamentoso dos tienopiridínicos tem
como representantes a ticlopidina, o clopidogrel e mais
recentemente o prasugrel. São fármacos que bloqueiam
a cascata de agregação plaquetária por atuarem como
antagonistas do ADP sobre os receptores da plaqueta
(principalmente o componente P2Y12). Portanto agem
em sítio diferente ao do AAS.
Esse bloqueio à agregação plaquetária atua ainda em
outras vias, como por exemplo, a mediada pelo fator
de von Willebrand, que reduz o nível de fibrinogênio
circulante e bloqueia parcialmente o receptor de
GPIIbIIIa, em menor intensidade6.
Clopidogrel e Ticlopidina
Assim como o bloqueio da COX pelo AAS, a ação
dessas drogas nos receptores de ADP também é
irreversível, durando aproximadamente a meiavida das plaquetas6. O início de ação dessa classe
medicamentosa é dependente da dose inicial e
tempo de duração de sua administração. A
ticlopidina tem um início de ação mais lento que o
clopidogrel.
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Quando doses elevadas de clopidogrel são
administradas – doses de ataque – é possível atingir
a inibição máxima das plaquetas em até duas horas,
caso seja administrada a dose de 600mg, atualmente
preconizada no momento do implante de stent em
paciente sem uso prévio da droga. A dose diária de
75mg necessita de 4-5 dias para atingir seu efeito
máximo, enquanto a dose de ataque de 300mg atinge
esse objetivo em 4-6 horas6.
A ticlopidina atualmente é pouco usada na prática
clínica, uma vez que possui muitos efeitos colaterais,
muitos deles graves, tais como: náuseas, vômitos,
neutropenia, trombocitopenia, anemia aplástica e
hipercolesterolemia. Esses efeitos colaterais tornam o
uso da droga restrito, sendo necessário monitorização
de hemograma a cada 15 dias6.
Seguiram-se vários ensaios clínicos randomizados que
provaram o benefício do uso de clopidogrel associado
a AAS nas síndromes isquêmicas agudas, seja no
espectro clínico das SCA com supradesnível do
segmento ST ou naquelas sem supradesnível do
segmento ST. No contexto do IAMCSST, dois grandes
ensai o s clí n ico s (C O M M IT e C LA RITY) 1 0 ,11
demonstraram que a associação do clopidogrel ao AAS
e à terapia de reperfusão trouxe benefício na redução
de desfechos clínicos.
A eficácia do uso do clopidogrel na SCA sem
supradesnível de ST foi estabelecida no estudo
Clopidogrel in Unstable Angina to Prevent Recurrent
Ischemic Events (CURE)12 no qual foram randomizados
12.562 pacientes nas 24 horas do início do quadro
clínico para o uso de AAS isoladamente (75mg a
325mg/dia) ou associado ao uso de clopidogrel
(300mg na dose de ataque seguido de 75mg na dose
diária). A análise em seguimento de nove meses
evidenciou redução no desfecho primário (morte, IAM
não fatal, necessidade de revascularização de urgência)
de 11,4% para 9,3% comparado ao uso isolado de AAS.
O benefício no grupo clopidogrel ocorreu precocemente,
já observado nos primeiros 30 dias (RR 0,79; IC95%
0,67-0,92).
Portanto a recomendação atual na SCA sem
supradesnível de ST em relação à antiagregação
plaquetária é a administração de AAS na dose de
162mg a 325mg (para obtenção dos efeitos da droga
em minutos) associado ao clopidogrel na dose de
ataque de 300mg seguido por 75mg/dia na ausência
de contraindicação13.
Nos pacientes tratados com implante de stent, a
antiagregação plaquetária deve ser dupla, ou seja,
deve ser administrado AAS associado a um
tienopiridínico, sendo o clopidogrel a droga mais
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utilizada até então 14 . Nos pacientes que serão
submetidos à angioplastia coronariana, seja eletiva e
sem tratamento prévio com antiagregantes
plaquetários, seja naqueles admitidos com SCA sem
supradesnível de ST que serão revascularizados via
percutânea no mesmo dia, a orientação é a
administração de 600mg de clopidogrel na dose de
ataque, uma vez que nessa dose há efeito máximo
antiagregante em duas a três horas14-16.
O tempo de duração do uso de clopidogrel após
realização de ICP ainda não está bem estabelecido. As
diretrizes atuais recomendam a manutenção da dupla
antiagregação plaquetária no caso de implante de stent
farmacológico por pelo menos um ano, caso não haja
risco de sangramento maior13,14. Com a nova geração
de stents farmacológicos, há evidências de que esse
tempo possa ser reduzido para seis meses4. A duração
do uso de clopidogrel em pacientes com implante de
stent convencional, por serem menos trombogênicos,
é de 30 dias (caso não tenha ocorrido evento isquêmico
agudo que resultou na ICP).
Resistência ao clopidogrel: importância dos testes
de função plaquetária
A incidência de pacientes com alta reatividade
plaquetária em uso de clopidogrel é variável, de
acordo com o método ou corte utilizado e tem sido
relatada entre 4% a 40% 5,17,18. Essa porcentagem
apresenta grande variação entre os estudos devido à
heterogeneidade dos valores considerados ideais para
critérios de respondedores à droga. Soma-se a isso o
fato de se ter uma série de exames disponíveis para a
medida da agregação plaquetária, sem se estabelecer
ainda um consenso de qual seria o método padrãoouro para tal finalidade.
O nível de inibição plaquetária pelo uso de clopidogrel
varia ainda de paciente para paciente, sendo a resposta
individualizada. Essa variabilidade na resposta à
antiagregação pode estar relacionada a fatores
intrínsecos e extrínsecos, conforme demonstrado no
Quadro 1. Entre os fatores responsáveis pela má
resposta ao uso de antiagregantes plaquetários estão
os de origem genética, tais como polimorfismos do
CYP3A4, CYP2C19 ou P2YI2, todos receptores
presentes nas plaquetas. Uma vez que o clopidogrel
é uma pró-droga, que necessita da ativação pelo
citocromo P450 antes de exercer sua inibição na
agregação plaquetária, as variações individuais na
atividade do citocromo P450 também podem estar
relacionadas a não responsividade.
Estudo-piloto19 na avaliação da agregação plaquetária
demonstrou a importância clínica do conhecimento
da resistência ao clopidogrel. Esse trabalho avaliou
60 pacientes com IAMCSST submetidos à ICP
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Quadro 1
Fatores capazes de influenciar a agregação plaquetária
e a resposta à ação de fármacos antiagregantes
plaquetários
Fatores genéticos•Polimorfismos do CYP
•Polimorfismos do GP Ia
•Polimorfismos do P2Y12
•Polimorfismos do GP IIIa
Fatores celulares •Turnover acelerado das plaquetas
•Atividade metabólica reduzida do
CYP3A
•Exposição aumentada do ADP
•Hiper-regulação da via do P2Y12
•Hiper-regulação da via do P2Y1
•Hiper-regulação de vias
independentes do P2Y (colágeno,
epinefrina, tromboxane A2,
trombina)
Fatores clínicos •Não prescrição de dupla antiagregação plaquetária
•Má adesão ao tratamento
•Subdose de medicamentos
•Baixa absorção
•Interações medicamentosas
envolvendo o CYP3A4
•Síndrome coronariana aguda
•Diabetes mellitus
•Índice de massa corporal elevado
primária, agrupados em quartis baseados na variação
da agregação em relação ao basal no teste de função
plaquetária, tendo como referência a dosagem de
ADP (103%, 69%, 58%, 33%, respectivamente). Seis
pacientes do grupo de 15 que evidenciaram maior
resistência ao clopidogrel tiveram eventos
cardiovasculares adversos em seguimento de seis
meses, comparado com um evento no grupo restante
de 45 pacientes.
Estudos iniciais como o de Geisler et al.20 avaliaram
379 pacientes submetidos a ICP com implante de stent
realizando a medida da agregação plaquetária
através do método de agregometria óptica no período
de pelo menos seis horas após a realização da dose
de ataque do clopidogrel. Nesse trabalho foi
considerado não respondedor aqueles que possuíam
dosagem de ADP>70%. Observou-se que após três
meses de seguimento os desfechos ocorreram com
maior frequência no grupo dos não respondedores
do que naqueles com ADP<70%, considerados
respondedores (22,7% vs. 5,6%). Na análise
multivariada, a presença da não responsividade ao
clopidogrel foi identificada como preditor
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independente da ocorrência dos eventos
cardiovasculares maiores nos três meses após ICP.
Buonamici et al.5 publicaram um estudo demonstrando
que pacientes considerados não respondedores ao
clopidogrel (ADP>70%), após a dose de ataque de
600mg, apresentaram uma taxa maior de trombose de
stent farmacológico quando comparados a pacientes
respondedores ao clopidogrel, em seguimento de seis
meses (2,3% vs. 8,6%), sendo o critério de não
responsividade ao clopidogrel preditor independente
de trombose do stent farmacológico (HR 3,08
IC95% 1,32-7,16).
A estratégia de dobrar a dose de manutenção do
clopidogrel em pacientes resistentes foi avaliada no
estudo GRAVITAS21. Foram avaliados 5429 pacientes
submetidos ao teste de agregação plaquetária com o
VerifyNow P2Y12. Os pacientes foram separados em
dois grupos: um com valor PRU >230 (41% da
população, considerados não respondedores) e um
grupo com valor <230 (considerados respondedores).
O grupo dos não respondedores foi randomizado
para a terapêutica com dose usual de clopidogrel
de 75mg/dia (sem dose de ataque) e o outro grupo
com dose elevada de 150mg/dia, após uma dose de
ataque de 600mg, sendo acompanhados por seis
meses. Não houve ao final do seguimento diferença
na ocorrência dos desfechos primários – morte por
causa cardíaca, IAM não fatal e trombose de stent –
entre os dois grupos.
Subanálise do estudo GRAVITAS mostrou que
pacientes com PRU >208 no momento do implante do
stent ou em 30 dias pós-implante apresentaram maior
taxa de eventos que aqueles com valores abaixo desse
corte, independentemente da estratégia terapêutica
utilizada22.
Meta-análise recentemente publicada confirmou o
valor dos testes de função plaquetária em pacientes
em uso de clopidogrel, na identificação dos pacientes
com risco de eventos cardiovasculares 23. Foram
analisados seis estudos, com 3.059 pacientes,
submetidos a ICP com implante de stents convencionais
ou eluídos em droga, avaliados pelo teste VerifyNow
P2Y12. Os pacientes foram estratificados em quartis
de acordo com os valores de PRU. A taxa de eventos
nos quartis de 1 a 4 foi, respectivamente, 5,8%, 6,9%,
10,9% e 15,8%. De acordo com essa meta-análise, um
corte de PRU de 230 foi o mais acurado para identificar
os pacientes sob risco de eventos.
Conclui-se que a determinação dos pacientes não
respondedores ao clopidogrel é de grande importância
clínica, considerado fator adicional na estratégia
terapêutica. Dobrar a dose de manutenção parece não
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ter benefícios, sendo, talvez, a migração para uma das
novas drogas uma estratégia melhor, embora ainda
haja controvérsias nessa área. Apesar das evidências
de benefícios com essas novas drogas no contexto das
síndromes coronarianas agudas, não existem
evidências em pacientes estáveis, ambulatoriais. Nos
pacientes que migraram do clopidogrel para prasugrel
ou ticagrelor, embora não haja recomendações
específicas na literatura, parece razoável repetir a
avaliação da função plaquetária em uso do novo
fármaco.
Prasugrel
Fármaco também pertencente ao grupo dos
tienopiridínicos, é considerada droga de terceira
geração. Assim como o clopidogrel, é uma pró-droga,
necessitando da conversão a metabólico ativo antes
de agir bloqueando o receptor do ADP na superfície
da plaqueta. Esse fármaco difere do clopidogrel,
sobretudo por apresentar menor efeito de primeira
passagem pelo fígado, com formação de metabólito
ativo em maior quantidade. Sua ação farmacológica
não parece ser prejudicada pelo uso de inibidores de
bomba de prótons ou inibidores do citocromo P.
Estudos que compararam esse fármaco ao clopidogrel
demostraram que a inibição plaquetária com o uso de
prasugrel foi mais intensa e rápida do que aquela
atingida com o clopidogrel, mesmo quando em doses
elevadas dessa última24.
A eficácia do prasugrel foi definitivamente estabelecida
em grande ensaio clínico randomizado composto de
13.608 pacientes submetidos a ICP (TRITON TIMI
38)25. A ocorrência de desfechos primários foi de 9,9%
no grupo em uso de prasugrel vs. 12,1% no grupo
usando clopidogrel. Em relação à avaliação da
segurança da droga, houve maior taxa de sangramento
no grupo tratado com prasugrel, o que na avaliação
de subgrupos mostrou ser maior nos pacientes >75
anos, peso corporal <60kg e história prévia de acidente
vascular encefálico.
Por ser um fármaco em uso recente, ainda há várias
questões a serem pesquisadas e observadas. Estudo
conduzido por Bonello et al.26 avaliou 301 pacientes
que receberam dose de ataque de prasugrel após
implante de stent, após evento coronariano agudo,
tendo como desfechos a ocorrência de morte cardíaca,
IAM e trombose de stent em um mês (subaguda).
Observou-se que a curva de sobrevida livre de eventos
foi melhor no grupo com medida de agregação
plaquetária – nesse trabalho avaliado pelo método
VASP – em níveis considerados adequados, surgindo
a hipótese de que no grupo de pacientes malantiagregados esse fármaco também teria menor
eficácia. Esse estudo sugere, portanto, que alguns
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pacientes também sejam resistentes ao prasugrel e
que a avaliação da agregação plaquetária também
deva ser feita em pacientes em uso de prasugrel, mas
não há recomendações quanto a isso nas diretrizes.
A dose preconizada desse fármaco é de 60mg como
dose de ataque e 10mg/dia na dose de manutenção,
sendo contraindicado em pacientes com idade >75
anos, peso corporal menor que 60kg e história prévia
de AVE, pelo maior risco de sangramento. Os
pacientes portadores de diabetes mellitus parecem
ter especial benefício com o prasugrel quando
comparado ao clopidogrel25.
Recentemente as diretrizes europeias de tratamento
das SCA sem supradesnível de segmento ST foram
atualizadas, com modificações quanto ao esquema
antiagregante plaquetário. A recomendação da
diretriz para o uso desse fármaco é no grupo de
pacientes que não estava em uso de tienopiridínicos,
sobretudo diabéticos, naqueles em que a anatomia
coronariana é conhecida e que haja programação de
intervenção coronariana percutânea (classe de
recomendação I nível de evidência B)27.
Ticagrelor
Recentemente aprovado pelo FDA, é uma droga oral
que pertence à classe medicamentosa das
ciclopentiltriazolopirimidinas. Atua como antagonista
seletivo do receptor do ADP na plaqueta, com ação
sobre o receptor ADP P2Y12, o que inibe a ativação
e agregação plaquetárias mediadas pelo ADP. Seu
início de ação é extremamente rápido, relacionado à
dose inicialmente administrada, e com pico de
inibição da agregação plaquetária aproximadamente
em torno de duas horas28.
Esse fármaco possui ação reversível, com queda da
sua concentração plasmática em torno de 12 horas,
o que o torna extremamente atraente, uma vez que
esses pacientes podem ser submetidos à cirurgia
cardíaca sem aumento no risco de sangramento.
Seu potente efeito antiagregante parece estar
relacionado ao bloqueio direto do receptor ADP
P2Y12 – impedindo a transdução do sinal da cascata
de ativação plaquetária – e não só isoladamente no
sítio de ligação do ADP, além de não sofrer interferências
importantes de hidrolases e enzimas hepáticas. O
ticagrelor, diferentemente do clopidogrel e prasugrel,
já possui seu metabólico ativo, não necessita da ação
da enzima CYP450.
O ensaio clínico PLATO28 avaliou 18.624 pacientes com
S C A , c o m o u s e m s u p r a d e s n í v e l d e S T,
independentemente da estratégia terapêutica utilizada
(conservadora ou invasiva). Nesse estudo, houve
maior redução de eventos no grupo em uso de
ticagrelor comparado ao grupo usando clopidogrel.
Conforme a atual diretriz europeia, a dose de ticagrelor
preconizada é de 180mg de ataque e 90mg administrada
duas vezes ao dia como manutenção. De acordo com
essa diretriz, seu uso nas SCA é recomendado para os
pacientes de moderado a alto risco (especialmente os
pacientes com troponina positiva), independentemente
se a estratégia inicial foi conservadora ou invasiva
e se o paciente estava ou não em uso prévio de
clopidogrel (recomendação classe I, nível de
evidência B)27.
O uso do clopidogrel em pacientes com SCA nessa
diretriz fica restrito àqueles que não podem usar as
outras drogas antiagregantes plaquetárias mais
potentes – prasugrel e ticagrelor – com recomendação
classe I, nível de evidência A. Não há recomendações
sobre a melhor conduta em pacientes com DAC
crônica estáveis, mas há estudos em andamento.
O Quadro 2 mostra as características farmacocinéticas
das principais drogas antiplaquetárias.
Testes de Função Plaquetária
A mensuração da função plaquetária em resposta às
drogas antiagregantes é um instrumento para
Quadro 2
Características das drogas antiagregantes plaquetárias
ClopidogrelPrasugrel
Ticagrelor
Classe
TienopiridínicoTienopiridínico
Triazolopirimidínico
Ativação
Pró-droga, limitada
Pró-droga, não limitada
Droga ativa
por metabolização
por metabolização
ReversibilidadeIrreversível Irreversível
Reversível
Início de ação
2h a 4h
30min
30min
Duração do efeito
3 dias a 10 dias
5 dias a 10 dias
3 dias a 4 dias
Suspensão antes de 5 dias
7 dias
5 dias
cirurgias de grande porte
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identificar pacientes não respondedores ao clopidogrel,
permitindo ajuste da terapêutica instituída. Além
disso, poderia ser útil na monitorização da eficácia
terapêutica, o que possibilitaria administração de
doses eficazes sem aumento no risco de efeitos
colaterais temíveis com esse grupo de fármacos, como
o sangramento. Os testes mais conhecidos e estudados
com essa finalidade são a agregometria óptica e o teste
VerifyNow P2Y12 (VN).
Agregometria óptica
É realizada em aparelho conhecido como agregômetro
óptico, que consiste em um espectrofotômetro com
comprimento de onda fixo. Uma amostra de sangue
centrifugada é utilizada para análise, que servirá para
separar o plasma rico em plaquetas (PRP), que
caracteristicamente é turvo. A luz transmitida através
da amostra turva é medida em comparação com a
referência (branco). O agonista (ADP em concentrações
distintas) é adicionado ao PRP e resulta na formação
de crescentes agregados de plaquetas, o que leva ao
clareamento do PRP e permite que mais luz passe pela
amostra. Esse aumento na transmissão da luz é
diretamente proporcional à quantidade de agregação
e é amplificada e gravada como um sinal em um
registrador de papel ou digitalizado em computador
usando software específico.
O ADP, o ácido aracdônico, o colágeno, a epinefrina e
a ristocetina podem ser utilizados como agonistas.
Cada um desses agonistas fará a avaliação de um
componente da cascata de ativação plaquetária,
entretanto apenas o ADP é de interesse para avaliação
da atividade do clopidogrel ou prasugrel. O exame é
identificado como ADP5 (concentração de 5µmol/L),
ADP10 (10µmol/L) ou ADP20 (20µmol/L) de acordo
com a concentração do agonista.
Teste do VerifyNow P2Y12
É atualmente o mais estudado devido a sua facilidade
de realização, consistindo em um método point of care.
Os dispositivos de teste do VN contêm câmaras de
detecção com microesferas revestidas de fibrinogênio
humano e do agonista específico. Quando as plaquetas
são expostas a essas substâncias, ocorre a agregação
plaquetária de acordo com o número de receptores
disponíveis, ou seja, a ação da droga está sob teste. O
instrumento mede essa agregação através da
transmitância de luz, que estará aumentada no caso
de uma função plaquetária normal e diminuída
quando a inibição das plaquetas estiver ocorrendo. O
resultado é expresso em unidades PRU (P2Y12 Reaction
Unit).
A grande vantagem do VN comparado à agregometria
óptica é sua fácil realização, com resultado em
aproximadamente 5min, sendo, portanto, de fácil
346
Villacorta et al.
Antiagregantes Plaquetários
Artigo de Revisão
reprodutibilidade. A agregometria óptica é um exame
de maior duração, extremamente dependente de um
operador em várias etapas do exame. Outra vantagem
do VN sobre a agregometria óptica consiste no fato de
que o VN é realizado em amostra de sangue total e
não necessita de centrifugação. A vantagem do teste
de agregometria óptica é a longa experiência
acumulada com ele.
Outros testes de medida de agregação plaquetária
menos estudados e menos utilizados na prática clínica
são: Plateletworks, Impact-R (espontâneo e estimulado
pelo ADP), PFA-100, Innovance PFA P2Y e VASP.
Somente no ano de 2010 surgiu um estudo que
comparou diretamente o desempenho dos diversos
testes de medida da agregação plaquetária na
identificação de eventos após implante de stent. O
estudo POPULAR29 (Comparison of Platelet Function
Tests in Predicting Clinical Outcome in Patients Undergoing
Coronary Stent Implantation) incluiu 1069 pacientes
submetidos a ICP em caráter eletivo, com implante de
stents convencionais e farmacológicos. Esse trabalho
avaliou o desempenho de vários testes para predizer
a ocorrência de óbito de causa cardíaca, IAM e AVE
não fatais e trombose de stent no período de um ano
após implante do stent.
Foram avaliados os seguintes testes: agregometria
óptica (ADP5 e ADP20), VerifyNow P2Y12, Plateletworks,
Impact-R (espontâneo e estimulado pelo ADP), PFA-100,
Innovance PFA P2Y. Apenas quatro testes foram
capazes de predizer eventos, que foram: agregometria
óptica (ADP5 e ADP20), VerifyNow P2Y12 e Plateletworks.
Importante destacar que no estudo POPULAR29 o
valor considerado como não respondedor ao
clopidogrel foi de 42,9% quando avaliado o ADP5,
com valor da área sob a curva (AUC) de 0,63 (IC95%
0,58-0,68) e 64,5% quando avaliado o ADP20, com AUC
de 0,62 (IC95% 0,56-0,67).
Na análise pelo ADP5 a taxa de ocorrência de
desfechos primários foi de 6% vs. 11,7% para os
pacientes com ADP5<42,9% e >42,9%, respectivamente.
Na avaliação do ADP20, os desfechos primários
ocorreram em 6,2% vs. 12% quando avaliados os
pacientes com ADP20 <64,5% e >64,5%.
O teste VN P2Y12 também foi capaz de predizer tais
eventos, com AUC de 0,62 (IC95% 0,57-0,67), para um
corte de 236 PRU. As taxas de eventos foram 5,7% e
13,3% para pacientes abaixo e acima desse valor (OR
2,53; IC95% 1,63-3,91; p=0,001).
A Figura 2 mostra uma curva de agregação pelo
método de agregometria óptica de paciente com
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Antiagregantes Plaquetários
Artigo de Revisão
Rev Bras Cardiol. 2012;25(4):340-349
julho/agosto
Recente estudo mostrou que 70% dos pacientes
considerados não respondedores ao clopidogrel,
quando avaliados no momento do implante de stent
passam a ser respondedores quando o teste é repetido
após 30 dias da intervenção, melhorando bastante a
acurácia do teste30. A área sob a curva do teste no
momento da admissão foi de 0,69 subindo para 0,87
na avaliação em 30 dias.
Os dados desse estudo mostram que existe uma
variação da função plaquetária ao longo do tempo,
justificando uma nova medida em 30 dias. Não há
dados sobre o valor de novas medidas após esse
período.
A diretriz europeia não recomenda a avaliação de
função plaquetária de forma rotineira, mas reconhece
que ela pode ser feita em casos selecionados27. Ela é
particularmente útil em pacientes em uso de
clopidogrel, devido à alta taxa de resistência descrita,
mas também pode ser feita em pacientes em uso de
prasugrel ou ticagrelor.
Figura 2
Curva da atividade do ADP pelo método de agregometria
óptica de paciente que apresentou trombose aguda de stent.
A curva azul refere-se à epinefrina, a vermelha à ADP5 (75%) e a
preta à ADP10 (81%).
antiagregação inadequada, apesar do uso de duas
drogas antiagregantes, que apresentou trombose de
stent. As curvas que correspondem à atividade das
plaquetas frente à adição do agonista ADP são as de
cor preta e vermelha. A curva preta representa a
medida da agregação plaquetária (em percentuais) ao
se adicionar ADP na concentração de 10µmol/L; e a
curva vermelha corresponde à atividade das plaquetas
após a adição de 5µmol/L de ADP, ambas representando
o quanto do feixe de luz inicialmente projetado sobre
a amostra, ao final de alguns minutos, foi capaz de
ultrapassar os agregados plaquetários formados com
o estímulo da adição do ADP. Ao final de 6min
observa-se que a curva do ADP5 (vermelha) chegou
a 75%, quando os estudos apontam que, em geral, esse
valor deveria estar abaixo de 40%.
Qual o melhor momento para avaliar a agregação
plaquetária?
A maioria dos estudos avaliou a agregação plaquetária
no momento do implante do stent, entre 12h e 24h após
o procedimento. Embora esses estudos tenham
demonstrado que esses testes identificam o paciente
sob risco de eventos, a acurácia avaliada pela curva
ROC tem sido modesta, com área sob a curva variando
de 0,61 a 0,823,29.
Potencial Conflito de Interesses
Dr. Humberto Villacorta Jr. é palestrante pela AstraZeneca.
Dra. Aline Sterque Villacorta ministrou palestra em 2011
pelo Laboratório Richet.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
Vinculação Acadêmica
Este artigo é parte da dissertação de Mestrado de Aline
Sterque Villacorta em Ciências Cardiovasculares da
Universidade Federal Fluminense (UFF).
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