Perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevados na indústria Noise induced hearing loss in industry Beatriz Lisboa Ribeiro – Fonoaudióloga. Especialização em Audiologia pelo CEFAC, Fonoaudióloga da Audiocare. Amanda Adolpho Machado – Fonoaudióloga. Especialização em Audiologia pelo CEFAC, Fonoaudióloga do Centro Auditivo Phonak. Daniela Cristina Back – Fonoaudióloga. Especialização em Audiologia pelo CEFAC, Fonoaudióloga do CERENEPE – Centro de Reabilitação de Pelotas. Edson I. Mitre – Médico Otorrinolaringologista. Doutor em Medicina. Médico 2° assistente da Santa Casa de São Paulo. Área: Audiologia Tipo de pesquisa: artigo original PAINPSE na indústria Resumo Introdução: A perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevados é uma doença insidiosa, cumulativa, que cresce ao longo dos anos de exposição ao ruído associado ao ambiente de trabalho. Acomete as células sensoriais do órgão de Corti e geralmente é bilateral e irreversível. Objetivo: verificar a ocorrência de perda auditiva em trabalhadores expostos a ruído industrial por cinco anos. Forma de estudo: Retrospectivo clínico. Métodos: Pesquisa avaliada de Fevereiro a Abril de 2009, através do exame audiométrico de 50 trabalhadores de uma indústria metalúrgica de Porto Alegre, feito por Fonoaudióloga. Resultados: A partir das 50 audiometrias avaliadas, 36 (72%) apresentaram limiares auditivos normais; 8 (16%) sugestivas de perda auditiva induzida pelo ruído e 6 (12%) outras doenças otológicas. Conclusão: O estudo permitiu concluir que 72% dos trabalhadores apresentaram limiares auditivos normais; 16% apresentaram perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevados e 12% sugestivos de outras doenças. Palavras chave: perda auditiva, ruído, indústria Summary Abstract: Hearing loss induced by high sound pressure levels is an insidious, cumulative and increasing disease due to exposure to noise at workplace. It affects the sensory cells of Corti organ and it is usually bilateral and irreversible. Objective: To assess the occurrence of hearing loss in workers who have been exposed to industrial noise for five years. Study approach: clinical retrospective. Methods: Research assessment from February to April 2009, by audiometric exams of 50 workers at a metallurgical factory in Porto Alegre, performed by Audiologist. Results: 36 (72%) out of 50 evaluated audiometry, had normal hearing thresholds, 8 (16%) suggestive of hearing loss induced by noise and 6 (12%) other ear diseases. Conclusion: The study showed that 72% of workers had normal hearing thresholds, 16% had hearing loss induced by high sound pressure levels and 12% suggestive of other diseases. Key words: hearing loss, noise, industry Introdução A perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevados é uma doença insidiosa, cumulativa, que cresce ao longo dos anos de exposição ao ruído associado ao ambiente de trabalho. A perda auditiva decorre de lesão das células sensoriais do órgão de Corti, na orelha interna; é, em geral, bilateral, com perdas progressivas e irreversíveis e sintomas como hipoacusia, zumbidos, plenitude auricular, otalgia, tontura, dor de cabeça, distúrbios gástricos, alterações transitórias na pressão arterial, estresse, distúrbios da visão, atenção, da memória, do sono e do humor, diretamente relacionadas com o tempo de exposição, com os níveis de pressão sonora (NPS) e com a suscetibilidade individual. É causada por qualquer exposição que exerça uma média de 85dB, oito horas por dia, regularmente, por um período de vários anos. As células ciliadas externas do órgão de Corti são sensíveis a altas e prolongadas pressões sonoras, portanto, com a morte celular, o espaço é preenchido por formações cicatriciais, o que resulta numa deficiência permanente da capacidade auditiva. A suscetibilidade individual está relacionada com o gênero, idade e doenças do ouvido. O gênero masculino apresenta preponderância na incidência e no grau de perda auditiva. A idade é importante, pois os mais jovens e os mais idosos apresentam maior suscetibilidade. Doenças do ouvido com perda neurossensorial de qualquer etiologia podem significar maior prejuízo ao paciente submetido ao ruído. Dentre os problemas ocupacionais que o trabalhador enfrenta, existe uma série de outras limitações que podem se manifestar no seu relacionamento pessoal com familiares, amigos, colegas de trabalho, e que podem acarretar mudanças drásticas de comportamento em nível psíquico e social1. Esta perda acomete primeira e predominantemente as freqüências de 6000, 4000 e 3000Hz e estende-se, com o agravamento da lesão, às freqüências de 8000, 2000, 1000, 500 e 250Hz. Em poucos casos o ruído é capaz de causar uma perda auditiva profunda, pois normalmente não ultrapassa os 75dB nas freqüências altas e 40dB nas freqüências baixas2-5. A perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevados pode agravar através da exposição do trabalhador a ruídos fortes e outros agentes, como produtos químicos e vibrações. Da mesma forma, o trabalhador que ingere drogas ototóxicas ou é portador de alguma doença pode ter maior suscetibilidade ao ruído6. O ruído já faz parte do nosso dia a dia, sendo um tipo de som que provoca efeitos nocivos no ser humano, mais prevalente nos ambientes de trabalho, o que causa uma sensação auditiva desagradável, que interfere na percepção do som desejado. Na vida moderna o ruído ocupacional é considerado a doença que mais atinge o sistema auditivo e quem sem dúvida alguma é um dos mais graves problemas sociais que acomete o trabalhador brasileiro7. A natureza do ruído está relacionada à distribuição da energia sonora durante o tempo, podendo ser contínua, flutuante ou intermitente. A exposição ocupacional ao ruído intenso está associada a várias manifestações sistêmicas, tais como elevação do nível geral de vigilância, aceleração da frequência cardíaca e respiratória, alteração da pressão arterial e da função intestinal, dilatação das pupilas, aumento do tônus muscular, aumento da produção de hormônios tireoidianos e estresse8,9. Essa exposição torna-se um risco ainda maior quando além de perturbar seu trabalho, perturba seu descanso, seu sono e sua comunicação com os seres humanos10. Diante do exposto, temos como objetivo verificar a ocorrência de perda auditiva em trabalhadores expostos a ruído industrial por cinco anos. Métodos Foram avaliados 50 (cinquenta) trabalhadores da indústria metalúrgica, gênero masculino, com idades entre 20 e 38 anos, que trabalham há 5 anos em ambiente ruidoso, na região metropolitana de Porto Alegre/RS, a partir de dados audiométricos, retrospectivos, no período de Fevereiro a Abril de 2009. Todos os trabalhadores avaliados foram submetidos a exame audiométrico (NR-7 da portaria nº 3214/78), realizado por Fonoaudióloga, em serviços contratados, após repouso auditivo de mais de quatorze horas, precedidos de inspeção do meato acústico externo. A partir de informações fornecidas pela empresa, utilizou-se de um audiômetro “Interacoustics”, modelo AD 229B, com certificado de calibração a cada ano, para avaliação tonal, a qual foram testadas as freqüências de 500, 1000, 2000, 3000, 4000, 6000 e 8000Hz, em ambas as orelhas. As perdas auditivas foram classificadas de acordo com os critérios estabelecidos por Davis e Silvermann11. As audiometrias ocupacionais foram classificadas em três grupos: audiometria sugestiva de perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevados, audiometria normal e audiometria devido a outras doenças auditivas. As audiometrias sugestivas de perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevados foram aquelas que apresentaram laudo de Disacusia neurossensorial leve, representando um entalhe em 4000 e 6000Hz e Disacusia neurossensorial simétrica, bilateral, variando de nível leve e moderado com alguma freqüência em nível severo. Foram consideradas normais todas as audiometrias que apresentarem limiares, no máximo, até o nível de 25dB. Resultados audiométricos devido a outras doenças foram aqueles que apresentaram outra alteração não relacionada à perda auditiva induzida por nível de pressão sonora elevado. Foi feita uma análise percentual simples dos resultados obtidos. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do CEFAC sob número 008/09. Resultados A partir das 50 audiometrias analisadas, 36 (72%) apresentaram limiares auditivos normais; 8 (16%) apresentaram audiometrias sugestivas de perda auditiva induzida por nível de pressão sonora elevado, com entalhe em 4kHz ou 4 e 6 kHz e 6 (12%) apresentaram exame de audiometria com configuração sugestiva de outras doenças otológicas. Discussão A perda auditiva induzida por nível de pressão sonora elevado é uma doença passível de prevenção, podendo produzir alterações significativas na vida do trabalhador, interferindo em sua qualidade de vida, trazendo desvantagens e incapacidade auditiva. Sabe-se que os trabalhadores expostos a este risco queixamse de perda auditiva e zumbido, e de vários outros sintomas como cefaléia, nervosismo e problemas de estômago15. O diagnóstico de PAINPSE é realizado pela história de exposição em ambiente ruidoso, com ênfase na inspeção do meato acústico externo e o exame audiométrico. A perda auditiva ocupacional, normalmente, se desenvolve, gradualmente, num período de, geralmente, 6 a 10 anos de exposição contínua a níveis elevados de ruído no trabalho2. Os indivíduos avaliados desenvolveram suas atividades de trabalho, na sua grande maioria nos últimos dez anos. Época essa que as leis e a fiscalização quanto ao ambiente de trabalho já estão mais eficientes se comparadas as décadas passadas. Atualmente temos um redação da NR 9(13) e importantes atualizações na NR 7, que tratam da saúde do trabalhodor14. Evidenciando a relevância da legislação, para minimizar os prejuízos causados pelo ruído no ambiente de trabalho. A perda auditiva ocupacional é diferente do trauma acústico, pois na ocupacional ocorre uma diminuição gradual da acuidade auditiva, decorrente da exposição continuada a níveis elevados de ruído. Estudados os mecanismos que atuam na lesão da cóclea e produzem a PAINPSE, foi explicado, fisiopatologicamente, que a frequencia mais afetada é 4kHz4, dados que também foram encontrados nas audiometrias ocupacionais dessa pesquisa. O ruído foi referido pelos trabalhadores como um agente poluente na atividade industrial como relatado por Seligman6, 2001, sendo também encontrados sintomas auditivos como perda auditiva, zumbidos e dificuldades na compreensão da fala. Outro ponto importante é a necessidade do repouso auditivo de 14 horas antes do exame de Audiometria ocupacional para evitar a detecção de uma perda auditiva temporária. Não deverá haver progressão da PAINPSE uma vez cessada a exposição ao ruído intenso e contínuo7,11. Os efeitos auditivos dependem da intensidade e duração da exposição ao ruído, assim como a ocorrência de alterações físicas e psíquicas causadas pelo ruído. Sendo assim, confirma-se o resultado encontrado, onde o tempo, no caso desta pesquisa, 5 anos, não são relevantes para apresentar uma perda auditiva induzida por nível de pressão sonora elevado12,13. O ruído em excesso tem o poder de lesar considerável extensão das vias auditivas, desde a membrana timpânica até regiões do sistema nervoso central. O período de cinco anos exposto ao ruído, sem ter antecedentes de trabalho em ambientes ruidosos, não é significativo para o trabalhador apresentar uma perda sugestiva de PAINPSE, salientando que a falta do uso de protetor auricular, o elevado nível de ruído no setor de trabalho e a carga horária trabalhada podem contribuir para o início e/ou aumento de uma perda auditiva precoce, podendo isso ser corrigido através de palestras de esclarecimentos sobre os cuidados de prevenção. Constatou-se que a prevalência dos casos sugestivos de PAINPSE se eleva a partir de seis anos de atividade à empresa, em comparação com trabalhadores com menos tempo de trabalho19. Conclusão O estudo permitiu concluir que 72% dos trabalhadores apresentaram limiares auditivos normais; 16% apresentaram perda auditiva induzida por nível de pressão sonora elevado e 12% sugestivos de outras doenças. Referências 1. Ferreira Junior M. Perda Auditiva Induzida por ruído. Bom senso e consenso. São Paulo: Ed VK;1998.p 125 – 5. 2. Araujo, A. S. Perda Auditiva em Trabalhadores de Metalúrgica. Rev Bras Otorrinolaringol. 2002;68(3):362-6. 3. Caldart AU, Adriano CF, Terrvel I, Martins RF, Mocellin M. Prevalência de Perda Auditiva Induzida por Ruído em Trabalhadores da Industria Têxtil. Rev Bras Otorrinolaringol. 2006;10(1):192-6. 4. Miranda CR, Dias CR, Pena PGL, Nobre LCC, Aquino R. Perda Auditiva Induzida por Ruído em Trabalhadores Industriais na Região Metropolitana de Salvador.Infor Epidemiológico do SUS.1998;7(1);87-94. 5. Nudelmann AA, Costa EA, Seligman J, Ibáñez RN. Perda auditiva induzida pelo ruído. Rio de Janeiro: Revinter; 200.p 95 -7. 6. Seligman, J. Perda auditiva induzida pelo ruído relacionada ao trabalho. ACTA AWHO,1994;13(1):126-7. 7. Azevedo A, Figueredo R. Atualização em zumbido. Rev Bras Otorinolaringol. 2004,70: 56-69. 8. Cohen A. Extra-auditory effects of occupacional noise – Part II: effects on work performance, Natl Saf News 1973; 109:68-76. 9. Costa EA, Kitamura S. Órgãos dos sentidos: Audição. In: Mendes R, organizador. Patologia do trabalho. Rio de Janeiro: Atheneu; 1995. p. 365-87. 10. Almeida SI, Albernaz PI, Zaia PA, Xavier OG, Karazawa EH. História natural da perda auditiva ocupacional provocada por ruído. Rev Assoc Med Brás 2000;46(2):143-58. 11. Davis H, Silvermann SR. Hearing and Deafness. Renenhardt e Winston 1997. p. 89-93. 12. Seligman, J.; Ibáñez, RN. Considerações a respeito da perda auditiva induzida pelo ruído. ACTA AWHO, 1993;75:9-12. 13. Costa, VHC. O ruído e suas interferências na saúde do trabalhador. Rev da Sobrac, 1994;912:13-26. 14. Guida HL. Efeitos Psicossociais da perda auditiva induzida pelo ruído em exfuncionários da indústria. Rev Bras Otorrinolaringol. 2005;(25):78-83. 15. Fernandes M, Morata TC. Estudo dos efeitos auditivos e extra-auditivos da exposição ocupacional a ruído e vibração. Rev Bras Otorrinolaringol. 2002;(5):70513. 16. Marques FP, Costa EA. Exposição ao ruído ocupacional: alterações no exame de emissões otoacústicas. Rev Bras Otorrinolaringol. 2006;(72):362-6. 17. Silva LF, Mendes R. Exposição combinada entre ruído e vibração e seus efeitos sobre a audição de trabalhadores. Rev Saúde Pública. 2005;(39);9-17. 18. Cordeiro R, Clemente APG, Diniz CS, Dias A. Exposição ao ruído ocupacional como fator de risco para acidentes de trabalho. Rev Saúde Pública. 2005(39);461-6. 19. Guerra MR, Lourenço PMC, Teixeira MTB, Alves MJM. Prevalência de perda auditiva induzida por ruído em empresa metalúrgica. Rev Saúde Pública.2005(39);238-44. Endereço para correspondência Nome: Beatriz Lisboa Ribeiro Endereço: Rua Dona Malvina, 168/05 B. Santa Tereza CEP: 90840-050 - Porto Alegre/RS Tel.: (51) 3223.5277 E-mail: [email protected]