A HISTÓRIA DA ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM NO HOSPITAL AREOLINO DE ABREU NO PERÍODO DE 1968-1978 Arabelle Martins Monteiro Alves -Escola São Camilo Joseneide Pires de Araújo - PSF-Picos Juliana Macedo de Medeiros – PSF- Barras Benevina Maria Vilar Teixeira - NOVAFAPI, UFPI INTRODUÇÃO O início da assistência aos indivíduos com transtornos psiquiátricos no Estado do Piauí ocorreu por volta do ano de 1906. Os doentes mentais com melhores condições financeiras viviam com a família, enquanto os pobres, vadios, violentos que atentavam contra a moralidade pública, eram considerados incômodos e perigosos (GUIMARÃES, 1994). A primeira iniciativa de construção de um asilo no Piauí ocorreu entre 1904 e 1907, quando o médico Areolino de Abreu iniciou uma campanha arrecadando fundos para construção de um asilo destinado a doentes mentais. Esse fato foi consolidado em 1906 com a compra de uma chácara no Campo de Marte, local em que foi construído o prédio, inaugurado no dia 24 de janeiro de 1907, com o nome de “Asilo de Alienados Areolino de Abreu”. Dois anos depois esse local passou a ser um núcleo da Santa Casa de Misericórdia de Teresina. No início da década de 40 o antigo asilo recebeu a denominação Hospital Psiquiátrico Areolino de Abreu, passando a fazer parte do Estado. Na década de sessenta foi inaugurado um novo hospital denominado “Hospital Colônia de Psicopatas Areolino de Abreu”, cujo objetivo desse Hospital Colônia era reduzir gastos do Estado, pois os internos iriam produzir o auto-sustento do hospital por meio de trabalhos agrícolas como forma de tratamento. Em 1971, como não adquiriu as características de colônia que se esperava, o estabelecimento passou a ser chamado “Hospital Areolino de Abreu” (GUIMARÃES,1994; PASSAMANI, 2005). No período mencionado acima os cuidados de enfermagem estavam nas mãos das religiosas e leigas (atendentes psiquiátricos, ex-pacientes e serventes), a assistência era pouco terapêutica, pois estava exclusivamente a mercê do empirismo, dificultando o tratamento desses pacientes (OGATA; RODRIGUES, 1995). O interesse em pesquisar este tema: “A História da Assistência de Enfermagem no Hospital Areolino de Abreu no período de 1968 a 1978”, iniciou no decorrer dos estágios das disciplinas de Enfermagem em Saúde Mental e Assistência de Enfermagem em Psiquiatria, realizados em comunidades e visita ao hospital. A partir dessa experiência conhecemos a realidade da assistência de enfermagem prestada aos portadores de transtorno mental e observamos os pacientes submetidos à falta de identidade e de calor humano, o odor característico das enfermarias, a massificação, a ausência de noção do tempo e a ociosidade. Essa visão nos levou a refletir sobre as formas historicamente construídas da assistência de enfermagem aos portadores de transtorno mental. Ao realizarmos uma pesquisa nos bancos de dados científicos sobre publicações referentes ao tema verificamos que existia uma riqueza de estudos, todavia sobre a assistência de enfermagem referente a esta instituição percebemos uma lacuna na literatura. A partir de então, sentimos a necessidade de dar voz a esse silêncio, pois os estudos que encontramos sobre a assistência de enfermagem eram em sua maioria de profissionais de outras categorias, sendo importante à enfermagem, conhecer a sua história, para construir sua identidade profissional. Assim, definimos como objeto de estudo a assistência de enfermagem aos pacientes psiquiátricos do HAA, no período de 1968 a 1978. E objetivos: descrever a assistência de enfermagem no HAA no período de 1968-1978 e discutir a contribuição das primeiras enfermeiras para assistência de enfermagem no HAA de 1968-1978. METODOLOGIA Esse é um estudo histórico social que segundo Lakatos e Marconi, (2000) permite investigar e descrever acontecimentos do passado, com o intuito de procurar respostas para certas inquietações suscitadas no presente, identificando sua influencia na sociedade atual. Nesse tipo de pesquisa o historiador tenta reconstruir o passado das pessoas e dos fenômenos com seus motivos, temores, conflitos e lutas. O estudo está fundamentado na historia oral, que se vale de depoimentos, buscando informações e experiências vividas. A história oral consiste em uma técnica de coleta de dados baseado no depoimento oral, gravado, obtido, por meio da interação entre o pesquisador e o entrevistador, sendo este último testemunha de fatos relevantes para a compreensão da realidade em estudo, inclusive, para obtenção de relatos sobre fatos negligenciados pela documentação escrita (MEIHY,1996). Os dados serão produzidos a partir de entrevistas com os sujeitos, que serão profissionais que vivenciaram aquele momento histórico e também serão buscados documentos ainda existentes no Hospital que se reportem aquele momento histórico. A análise dos dados ocorreu após ordenamento, categorização dos dados de desvendando o conteúdo subjacente do que estava manifestado nas transcrições até obtermos os indicadores qualitativos. RESULTADOS Por meio dos relatos fornecidos pelos sujeitos apreendemos os significados das falas e realizamos a descrição da assistência de enfermagem em duas categorias: assistência de enfermagem realizada pelas religiosas e assistência de Enfermagem profissional, que indubitavelmente responderam aos objetivos e ao objeto de estudo. ASSISTÊNCIA DAS RELIGIOSAS. Assistência de enfermagem no HAA, a partir da inauguração do hospital, foi coordenada pelas Irmãs de Caridade da Ordem das Filhas de Maria, que desenvolviam trabalho de cunho religioso, com tempo integral ao HAA, pois tinham uma casa anexada a instituição, de forma que estavam sempre prontas a assistirem os doentes mentais. Assim, a organização hospitalar foi assumida pelas religiosas que coordenavam as enfermarias, supervisionavam e executavam a assistência aos pacientes, que consistia em administrar medicações, realizar o banho e estar ao lado dos doentes nos momentos em que eles necessitavam. Além desses serviços, ainda auxiliavam os médicos. Esse grupo de atividades fazia parte da assistência desenvolvida pelas religiosas que assumiram a missão de cuidar dos doentes com espírito vocacional e não de um desejo de construir uma profissão (PADILHA, MANCIA, 2005). Tendo em vista discordâncias relacionadas ao controle da administração do hospital, as religiosas diminuíram o trabalho de assistência aos clientes psiquiátricos e suas atividades ficaram restritas as questões da capela do HAA. Neste período (1975) ainda não havia enfermeiras formadas no Estado, então, se contratou uma enfermeira que resida em outro Estado, para começar a assistir os doentes mentais. Com a saída das Irmãs de Caridade, um auxiliar de enfermagem foi escolhido para gerenciar a equipe que realizava o trabalho da enfermagem. É importante salientar que o trabalho das religiosas contribuiu como precursor da organização do serviço de enfermagem profissional no HAA, além de ter servido como base para o desenvolvimento da assistência de enfermagem ao paciente psiquiátrico no Estado do Piauí. ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM PROFISSIONAL De acordo com os dados cadastrais encontrados no HHA, em 1971 foi admitida a primeira enfermeira, Joselita Borges Leal, a qual passou um ano e três meses prestando assistência aos pacientes portadores de transtorno mental. Essa enfermeira cuidava dos clientes no turno da manhã, e era responsável por todo hospital, nos demais turnos, as irmãs da ordem das filhas de Maria ainda ficavam no Hospital. A partir de 1973 até final de 1976 os internados permanecem sob responsabilidade das religiosas, que ao deixarem o hospital a gerencia do serviço de enfermagem passou para um auxiliar de enfermagem, pessoa naquele momento mais qualificada para assumir tal função. Nessa época a fiscalização do Conselho Regional de Enfermagem estava se estruturando no Piauí. Nesse mesmo ano as alunas da primeira turma de enfermagem da Universidade Federal do Piauí (UFPI) estagiaram no HAA, por meio da disciplina enfermagem psiquiátrica. Este estágio era intensivo e coordenado por uma professora do Curso de Graduação em Enfermagem da UFPI. Essas acadêmicas logo elaboraram um planejamento e um roteiro a ser desenvolvido no decorrer do estágio. A chegada das estudantes representou uma ajuda significativa para assistir os clientes psiquiátricos, conforme relata a depoente: Com a presença das primeiras turmas de enfermagem supervisionada pela professora Célia, é que foi dado início ao trabalho de grupo operativo, este trabalho era realizado em cada pavilhão, reunindo e ouvindo as reivindicações dos pacientes, estas eram encaminhadas para a diretoria, visando a democratizar o atendimento (Auxiliar de Enfermagem). Em 1977, de acordo com os documentos e entrevistas, a enfermeira Maria do Amparo Oliveira começou a prestar serviço no HHA com carga horária de 30 horas semanais. Após sua chegada, Eloísa permaneceu apenas dois meses, deixando o hospital para ir trabalhar em outro Estado.A enfermeira Maria do Amparo Oliveira juntamente com as acadêmicas de enfermagem decidiu fazer algum tipo de terapia com os pacientes. As estagiárias de enfermagem começaram a realizar cuidados básicos ao paciente, como, por exemplo, acompanhavam nos momentos da admissão realizando a triagem, nas medicações, na higiene corporal e até numa simples conversa. Pois, embora a enfermeira antecessora tenha almejado por algumas mudanças, praticamente nada acontecia, pelo fato de não haver uma assistência sistematizada. Nesse contexto de adversidades a enfermagem profissional que naquele momento já estava instalada no hospital deu início à organização dos serviços de enfermagem, implantando escalas diárias de trabalho para distribuir os funcionários por atividades, organizou uma sala de eletroconvulsoterapia (antes esse procedimento era realizado nas enfermarias) com vista a humanizar o atendimento ao paciente, proporcionando uma maior privacidade e segurança, com um funcionário no momento e após o procedimento. Assim, a enfermagem profissional inicia a consolidação da sua assistência com a valiosa contribuição das acadêmicas de enfermagem da UFPI que foi de suma importância nesse período. CONSIDERAÇÕES FINAIS O estudo mostrou a assistência de enfermagem no Hospital Areolino de Abreu a partir de duas visões: uma prestada por leigos e religiosas e outra prestada pelas enfermeiras, estudantes e auxiliares de enfermagem. Inicialmente, as pessoas responsáveis não só pelo paciente, como também, pela parte organizacional do HAA eram as religiosas, essas irmãs de caridade com sua força de vontade conseguiam prestar um cuidado de forma caritativa, porém vigilante. O estudo mostra que essas irmãs permaneceram no hospital por quase todo o período em estudo, vindo a sair da instituição somente no final da década de setenta. Com a saída das religiosas a assistência de enfermagem foi realizada por leigos e auxiliares de enfermagem, pois eram as pessoas disponíveis para prestar este serviço. Amarrar e acorrentar ainda era a forma de acalmar os pacientes nos momentos de agitação. Embora, neste período, duas enfermeiras tenham trabalhado, porém com permanência mínima na instituição. No entanto, com relação à entrada das primeiras enfermeiras no HAA, pudemos ter uma visão do que viria a ser o início de uma mudança na assistência ao paciente desta instituição. Mudanças essas promovidas por uma equipe de enfermagem que em número foi reduzida, mas em força de vontade era grande para mudar o atendimento. O estudo também mostrou como resultado a consolidação da enfermagem psiquiátrica de cunho profissional que implementou o gerenciamento do serviço e da assistência de enfermagem. Esse processo contou com a colaboração das alunas das primeiras turmas do curso de enfermagem da Universidade Federal do Piauí-UFPI. REFERÊNCIAS GUIMARÃES, H. Para uma Psiquiatria Piauiense. Piauí: COMEPI, 1994. HAGETTE in BAPTISTA, S.S. O avesso da convivência: O estudante de Enfermagem no ciclo básico. Dissertação de livre-docência. Faculdade de Enfermagem, UERJ, Rio de Janeiro, 1988. MEIHY, J.C.S.B. Manual de História Oral. São Paulo: Loyola, 1996. PADILHA, M .I. C. S; MANCIA. Jr. Florence Nightingale e as irmãs de Caridade: Revisando a História. Revista Brasileira de Enfermagem. V.58, n 6, nov-dez, 2005. PASSAMI, M.C. Reforma da assistência psiquiátrica do Piauí: Representações Sociais construídas pelos gestores e trabalhadores de Saúde Mental.Dissertação (Mestrado) Universidade Federal do Piauí, 2005. * Professora da Escola São Camilo [email protected] **Enfermeira do PSF de Picos [email protected] *** Enfermeira do PSF de Barras [email protected] **** Professora Doutora da Faculdade NOVAFAPI, Departamento de Enfermagem da UFPI, Coordenadora do Curso de Enfermagem da NOVAFAPI