Importância clínica da terapia hormonal no sistema imunológico em mulheres na menopausa. Revista: Pesquisa Médica, 2011. Perguntas formuladas pela jornalista Silvia Campolin. 1- Os hormônios estrogênios interagem com vários mecanismos do sistema imune feminino e a sua ausência, na menopausa, afeta esse sistema, mostram os estudos. Desde quando os pesquisadores sabem disso e como vem evoluindo essa investigação? R: Tendo-se em conta a idade, gonadectomia e hipoestrogenismo a interação entre esteróides sexuais e sistema imune tem sido examinada nos últimos 60 - 70 anos. Estudos iniciais in vitro e in vivo em camundongos permitiram que estudos experimentais e clínicos fossem realizados em humanos. Nos últimos 30 anos o uso isolado de estradiol ou da combinação estrogênio/progestogênio após a menopausa tem sido examinada em pequenos estudos. 2- A forma como os esteróides sexuais interferem e/ou interagem com o sistema imune já está completamente mapeada? O que já é possível afirmar a respeito do impacto do hipoestrogenismo no sistema imunológico feminino? Existem estudos epidemiológicos sobre isso? R: A forma de interação entre esteróides sexuais e sistema imune tem ainda hiatos a serem preenchidos. Tem relevância científica o achado de receptores para estrogênios e androgênios em várias células do sistema imune e a modulação da atividade destas células por estes esteróides. Pode-se afirmar que o hipoestrogenismo está associado a menor a atividade das células de defesa (macrófagos, linfócitos T) aumentando a vulnerabilidade da mulher pósmenopausa às infecções virais e inibindo sua capacidade de atacar as células tumorais ou estimular o processo de cicatrização. Em adição, a menopausa está associada a níveis elevados de substâncias pró-inflamatórias envolvidas na gênese da aterosclerose e osteoporose. Estudos epidemiológicos são escassos e têm focado mais a imunidade humoral relacionada as atividades pró e antiinflamatórias. 3- O senhor escreveu no email enviado anteontem (05/11), que é sabido que mulheres têm maior prevalência de doenças autoimunes como lúpus, artrite reumatóide, tireoidite, etc, o que deixa claro o papel dos hormônios femininos na gênese destas condições. E acrescentou: vale lembrar que doenças autoimunes refletem hiperatividade e não declínio do sistema imunológico. Como os estrogênios participam dessa gênese, essas doenças deveriam acabar após a menopausa, mas não é isso que ocorre. Já é possível explicar o por quê? R: A maior ocorrência de doenças autoimunes na mulher tem mesmo relação com os esteróides sexuais. Este fato sugere então hiperatividade do sistema imune na mulher, quando comparada ao homem. Os mecanismos são complexos e não explicam porque com a menopausa a artrite reumatóide, o lúpus, a esclerose múltipla evoluem de modo distinto. Por exemplo, a artrite reumatóide tende a piorar porque o estrogênio suprime a proliferação dos leucócitos T, inibe a maturação dos linfócitos B na medula óssea e inibe a produção de células NK. Estas modificações parecem favoráveis à melhoria do lúpus, ainda que nesta condição o estradiol tenha ação dependente dos níveis circulantes. Apesar disso a reposição hormonal é segura no lúpus. A esclerose múltipla pode piorar com a menopausa e melhorar com a terapia hormonal. 4- O senhor disse que na artrite reumatóide, estudos animais mostram a exacerbação da doença quando os ovários dos “modelos” são extraídos, e ela melhora quando os animais são tratados com reposição de estrogênios. A reposição hormonal na pós-menopausa em mulheres com artrite também parece ter efeito benéfico. Tendo em conta os estudos feitos sobre o tema, já se sabe quais formulações são mais eficazes, ou que tipo de TH funciona melhor? R: Embora haja melhora da artrite reumatóide com a TH, não se pode dizer que determinada combinação seja melhor que outra. Tanto estradiol como estrogênios conjugados e medroxiprogesterona ou noretisterona têm sido usados com resultados parecidos. Os novos progestogênios hoje disponíveis tendem a ganhar espaço nos próximos estudos. Em nosso centro, estamos estudando a combinação estradiol com drospirenona. 5- Para avaliar e tratar as doenças autoimunes na mulher em cada fase -- da idade reprodutiva à perimenopausa e pós-menopausa – os médicos devem levar em conta o papel dos estrogênios? Como? R: Os protocolos disponíveis para controlar as doenças autoimunes na mulher em idade reprodutiva já consideram a modulação dos esteróides sexuais. Reumatologistas não têm orientação específica para os diferentes períodos de vida da mulher. Relevante é o conhecimento do papel destes esteróides no curso destas condições pelo ginecologista. As diretrizes recomendam hoje o uso da menor dose eficaz e de estrogênios naturais. 6- Seus estudos mostram que o equilíbrio do sistema imune é alterado por um conjunto de variáveis na menopausa. Poderia resumir em linhas gerais as principais alterações que elevam a suscetibilidade do organismo feminino às infecções e ataques virais? R: Mulheres tendem a ter níveis mais elevados de imunoglobulinas e maior resposta imune humoral do que os homens. Assim respondem melhor as infecções bacterianas e virais ou a antígenos não próprios. Esta diferença tende a diminuir após a menopausa. O hipoestrogenismo resulta em menor secreção de IL-10 (potente citocina anti-inflamatória) pelos monócitos, menor secreção de interferon gama e interleucina -2, responsáveis pela indução da imunidade celular, imunidade esta responsável pela defesa contra agentes estranhos. 7- É possível melhorar o sistema imune depois da menopausa, para além da TH? Como: com quais terapias ou esquemas do tipo vitaminas, prática de atividade física, etc? R: Há informações suficientes para afirmar que a resposta imune no período pós menopausa pode ser beneficiada também por atividade física associada à reposição hormonal. Atividade de moderada intensidade melhora a imunocompetência. Deve-se assegurar o fornecimento adequado de energia, proteínas, vitaminas e minerais. Dietas ricas em aminoácidos essenciais e antioxidantes melhoram a resposta imune. A ingestão de produtos derivados de soja podem atenuar a resposta imune ao diminuir a formação de anticorpos e leucócitos. No entanto, neste tópico os estudos são ainda inconsistentes. Atenciosamente, Prof. Dr. Sebastião Freitas de Medeiros Departamento de Ginecologia e Obstetrícia, FCM, Universidade Federal de Mato Grosso.