UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ VANESSA SILVA PIRES INCIDÊNCIA DE IPTU SOBRE TERRENOS DE MARINHA Biguaçu 2010 VANESSA SILVA PIRES INCIDÊNCIA DE IPTU SOBRE TERRENOS DE MARINHA Monografia apresentada como requisito para a obtenção do título de bacharel em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Educação Biguaçu. Orientadora: Profª. MSc. Helena Nastassya Paschoal Pítsica Biguaçu 2010 VANESSA SILVA PIRES INCIDÊNCIA DE IPTU SOBRE TERRENOS DE MARINHA Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e aprovada pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas. Área de Concentração: Direito Tributário Biguaçu, 03 de novembro de 2010. Prof. MSc. Helena Nastassya Paschoal Pítsica UNIVALI – Campus de Biguaçu Orientador Prof. MSc. Renato Heusi de Almneida UNIVALI – Campus de Biguaçu Membro Prof. MSc. Antonio Chraim UNIVALI – Campus de Biguaçu Membro Dedico esse trabalho aos meus pais, como forma de retribuir todo o amor, carinho e dedicação que sempre tiveram. Por todo o esforço realizado no decorrer do curso e, principalmente, por abrir mão dos próprios sonhos para que eu realizasse os meus. AGRADECIMENTOS Agradeço o auxílio, empenho e atenção dedicados pela minha orientadora Professora Helena Nastassya Paschoal Pítsica e, ao Professor Celso Wiggers, pelo empréstimo gratuito de seu conhecimento, por toda atenção, sinceridade e respeito. Estendo meus agradecimentos a todos os amigos e colegas de faculdade pela companhia durante todo o curso, pelas conversas, desabafos e por momentos que para sempre serão lembrados. Por fim, agradeço a todos que, de alguma forma, contribuíram para a realização desse trabalho. “Não existe nada de completamente errado no mundo, mesmo um relógio parado, consegue estar certo duas vezes por dia.” Paulo Coelho TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Biguaçu, 03 novembro de 2010. Vanessa Silva Pires RESUMO A presente monografia foi elaborada com o objetivo de verificar a legalidade ou não da incidência do imposto predial e territorial urbano sobre os terrenos de marinha. Os terrenos são classificados como bens imóveis da União, recebendo a denominação de bens dominicais. São terrenos situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés, localizados a uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, da posição da linha de preamar-média. A União está autorizada a realizar contrato para uso desses imóveis por terceiros, como por exemplo, o contrato de aforamento, podendo ainda ser objeto de ocupação. O imposto predial e territorial urbano é imposto de competência dos Municípios e incidirá sobre a propriedade, posse e domínio útil de imóvel, localizado em zona urbana do Município. Para alcançar o objetivo da pesquisa aborda-se ainda a questão da posse para fins de IPTU, a imunidade tributária recíproca entre os entes federados e a constitucionalidade dos artigos 32 e 34 do Código Tributário Nacional. Palavras-chave: Terrenos de Marinha, Imposto Predial e Territorial Urbano, Posse, Propriedade, Imunidade Tributária Recíproca. ABSTRACT This monograph was developed with the objective to verify the legality of the incidence of urban taxes on the marine lands. These lands are classified as property of the Union, receiving the designation of “bens dominicais” (Union public good). These lands are located on the mainland, on the coast and along the rivers and lakes, even where be possible fell the influence of tides, located at a depth of 33 (thirty three) meters from the position of “preamar-média” (high tide-average). The Union is authorized to conduct contract for use of such property to third parties, like for example, the contract of tenure, may it still be subject of occupation. The property urban taxes are imposed by the jurisdiction of the municipalities and will focus on the ownership, tenure and useful control property, located in urban areas of the Municipality. To achieve the goal of this research, issues like the tenure to the end of IPTU (property urban tax) are approached, and other like the reciprocal tax immunity among the entities of the federation and the constitutionality of Articles 32 and 34 of the National Tax Code. Keywords: Marine lands; Property; Property urban tax; Reciprocal tax immunity; Tenure. ROL DE ABREVIATURAS OU SIGLAS ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias CC/2002 – Código Civil Brasileiro de 2002 CRFB/1988 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CTN – Código Tributário Nacional LPM/1831 – Linha de preamar-média de 1831 II – Imposto de Importação IE – Imposto de Exportação ICMS – Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação IPVA – Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano ITR – Imposto Territorial Rural SPU – Secretaria do Patrimônio da União STF – Supremo Tribunal Federal STJ – Superior Tribunal de Justiça TRF4ª – Tribunal Regional Federal da 4ª Região SUMÁRIO INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 12 1 TERRENOS DE MARINHA.................................................................................... 15 1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS E EVOLUÇÃO LEGISLATIVA .......................... 17 1.2 LINHA DE PREAMAR-MÉDIA DE 1831 (LPM/1831) ................................... 26 1.3 TERRENOS ACRESCIDOS DE MARINHA ................................................. 31 1.4 FORMAS DE UTILIZAÇÃO DOS TERRENOS DE MARINHA ..................... 34 1.4.1 Terrenos de Marinha – bens dominicais ........................................... 34 1.4.2 Aforamento (enfiteuse) ....................................................................... 36 1.4.3 Ocupação ............................................................................................. 41 2 IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO – IPTU ..................................... 44 2.1 COMPETÊNCIA ............................................................................................... 45 2.2 HIPÓTESES DE INCIDÊNCIA E FATO GERADOR ........................................ 48 2.3 ASPECTO MATERIAL DA INCIDÊNCIA DO IPTU .......................................... 51 2.3.1 Propriedade .............................................................................................. 51 2.3.2 Posse ........................................................................................................ 53 2.3.3 Domínio útil .............................................................................................. 55 2.3.4 Bem imóvel ............................................................................................... 56 2.4 ASPECTO TERRITORIAL – LUGAR DE OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR ............................................................................................................................... 57 2.4.1 Zona urbana ............................................................................................. 58 2.5 LANÇAMENTO ................................................................................................ 62 2.6 ASPECTO QUANTITATIVO ............................................................................ 67 2.6.1 Base de cálculo ........................................................................................ 68 2.6.2 Alíquota .................................................................................................... 70 2.7 ASPECTO PESSOAL - SUJEITO ATIVO E SUJEITO PASSIVO .................... 72 3 A INCIDÊNCIA DE IPTU SOBRE TERRENOS DE MARINHA ............................ 76 3.1 DOS EFEITOS DA OCUPAÇÃO EM TERRENOS DE MARINHA ................... 77 3.1.1 Da impossibilidade de usucapião dos Terrenos de Marinha ............... 79 3.1.2 Da posse para fins de incidência do IPTU ............................................. 80 3.2 DOS EFEITOS DO AFORAMENTO EM TERRENOS DE MARINHA .............. 84 3.3 DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA ENTRE OS ENTES DA FEDERAÇÃO ......................................................................................................... 88 3.3.1 Imunidade tributária ................................................................................ 88 3.3.2 Imunidade tributária recíproca ............................................................... 90 3.4 DA AMPLIAÇÃO DO ROL DO ARTIGOS 32 E 34, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL – CTN ................................................................................................. 96 3.5 DA POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE IPTU SOBRE TERRENOS DE MARINHA ............................................................................................................ 100 CONCLUSÃO ......................................................................................................... 107 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 112 12 INTRODUÇÃO A presente pesquisa tem como objeto a Incidência do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU sobre Terrenos de Marinha, tendo como base as definições contidas no Decreto-lei n. 9.760, de 05 de setembro de 1946, a Lei n. 9.636, de 15 de maio de 1.998, a Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, que instituiu o Código Tributário Nacional, e ainda os artigos 150 e 156, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. A escolha do tema deu-se em razão da abrangência social e política decorrente do grande número de imóveis localizados em terrenos de marinha, bens de propriedade da União, e que estão sujeitos a incidência de taxa de ocupação ou foro e pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano. A questão não é bem definida em lei, o que gera incertezas e, até mesmo, possíveis injustiças. Razão pela qual a presente tem como escopo a avaliação da incidência do Imposto Predial e Territorial Urbano em imóveis de marinha e a verificação da legalidade a partir dos conceitos de posse/domínio útil/propriedade, culminando com a questão da imunidade tributária recíproca entre os entes da federação. Para tanto, faz-se necessário examinar e repensar os conceitos de posse, propriedade, domínio útil, taxa de ocupação e foro, bem como encontrar seu respaldo jurídico, analisando seu real objetivo e benefícios ao contribuinte. No decorrer da pesquisa buscar-se-á respostas a algumas questões: a cobrança de Imposto Predial e Territorial Urbano sobre imóveis da União, mais especificadamente terrenos de marinha, está em consonância com o princípio da legalidade, considerando-se a imunidade tributária recíproca entre os entes da federação? Quem é o sujeito passivo da obrigação tributária? Até que ponto o ocupante e foreiro podem ser onerados com o imposto? Essa cobrança incide independentemente do tipo de posse que é exercida? A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 determina que o imposto seja instituído sobre a propriedade predial e territorial urbana. O Código Tributário Nacional, por sua vez, amplia essa determinação, considerando como fato gerador do imposto, além da propriedade, também o domínio útil e a posse, considerando, por consequência, 13 como sujeito passivo do Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU o proprietário, o titular do domínio ou o possuidor a qualquer título. Essa alteração instituída pelo Código Tributário Nacional recebe amparo constitucional? Como busca aos questionamentos apresentados, elaborou-se a presente pesquisa, que está dividida em três capítulos. O primeiro capítulo, voltado para as esferas cível e administrativa, tratará das questões relativas aos terrenos de marinha, considerados bens dominicais de propriedade da União. Serão apresentados conceito, aspectos históricos, forma de demarcação, características e as formas como podem ser utilizados por terceiros. Mais precisamente, as formas de utilização sob o regime de aforamento e ocupação. No segundo capítulo, direcionado para a área tributária. Examinar-se-á o Imposto Predial e Territorial Urbano. Para tanto, iniciar-se-á com conceitos e aspectos basilares, abordando também os sujeitos da obrigação tributária, com o fito de demonstrar a efetiva responsabilidade pelo pagamento do tributo. No terceiro e último capítulo apresentar-se-á os terrenos de marinha, como bens da União e a incidência do Imposto Predial e Territorial Urbano sob a ótica da responsabilidade pelo recolhimento do tributo. Para tanto serão tecidos comentários acerca dos efeitos da ocupação e do aforamento em terrenos de marinha, da impossibilidade de usucapião dos referidos imóveis e da posse para fins de incidência do Imposto Predial e Territorial Urbano. Neste capítulo abordar-se-á ainda, a questão da imunidade tributária recíproca entre os entes federados, bem como a da ampliação do rol dos artigos 32 e 34, do Código Tributário Nacional, visto ser necessário para busca na resolução da problemática apresentada. Por fim buscar-se-á demonstrar a possibilidade de incidência do Imposto Predial e Territorial Urbano sobre terrenos de marinha frente as discussões doutrinárias e divergências jurisprudenciais relativas ao tema. Somadas à existência de três Projetos de Lei que corroboram com o tema que se põe em questão. Destes, dois tramitam na Câmara dos Deputados – Projeto de Lei Complementar n. 222/2004 e Projeto de Lei Complementar n. 116/2007 - e prevêem a inclusão do parágrafo 3º ao artigo 32, do Código Tributário Nacional, determinando que em relação aos terrenos de marinha o fato gerador do Imposto Predial e Territorial Urbano não abranja os casos de posse (ocupação) e de domínio útil (aforamento). 14 O terceiro projeto tramita no Senado Federal sob o n. 676/2007, prevendo a alteração do Decreto-lei n. 9.760, de 05 de setembro de 1946, para isentar o foreiro e ocupante do pagamento de foro e taxa de ocupação, quando sobre o imóvel incidir a cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano. A área e linha de pesquisa escolhida é o Direito Tributário, mas precisamente os Tributos. O método utilizado foi o dedutivo. Com abordagem de assunto geral, trazendo conceitos de terreno de marinha e imposto predial e territorial urbano, partindo-se para a abordagem do tema específico. Foram utilizadas como técnicas de pesquisa a documentação indireta – pesquisa documental e bibliográfica, através de doutrinas e jurisprudências. O objetivo da pesquisa aqui apresentada, não é defender ou buscar uma justificativa que demonstre a ilegalidade da cobrança do IPTU, mas sim procurar entender até que ponto ela é correta. A monografia, a seguir apresentada, não tem o condão de encerrar a discussão sobre o tema, mas sim levantar a problemática e aguçar futuros estudos. 15 1 TERRENOS DE MARINHA São terrenos de marinha, conforme art. 2º do Decreto-lei n. 9.760, de 05 de setembro de 1946, os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés, bem como os que contornam as ilhas situadas em zona sob influência das marés, desde que situados a uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha de preamar–média. E ainda, conforme art. 1º do mesmo Decreto-lei são considerados bens imóveis da União “Incluem-se entre os bens imóveis da União: a) os terrenos de marinha e seus acrescidos”.1 Sobre o significado do instituto terrenos de marinha leciona Niebuhr: Terreno de marinha constitui-se numa faixa de 33 metros, a contar da linha da preamar-média de 1831, para dentro da terra, nas áreas banhadas por águas sujeitas as marés, conforme depreende do art. 2º do Decreto-Lei nº 9.760/46.2 O mesmo autor esclarece ainda que: [...] só existem nas áreas que sofrem a influência das marés [...] o parágrafo único do art. 2º do Decreto nº 9.760/46 esclarece que a influência das marés é caracterizada pela oscilação periódica de cinco centímetros pelo menos do nível das águas, que ocorra em qualquer época do ano. Isso significa que áreas na margem de rios e lagoas também podem constituir terreno de marinha, desde que os mesmos sofram a influência das marés.3 Ainda, sobre o conceito de terreno de marinha, segue a classificação das marinhas apresentada por Gasparini: [...] em razão da localização, em: continentais, costeiras e insulares. Continentais [...] no interior do continente; costeiras [...] na costa; e insulares [...] situadas nas ilhas costeiras e oceânicas [...] em relação às águas que as banham, em: marítimas, fluviais e lacustres. São marítimas as banhadas pela água do mar; fluviais [...] pelas águas dos rios; e lacustres [...] pelas águas dos lagos [...].4 (grifo no original) 1 BRASIL. Decreto-lei n. 9.760, de 5 de setembro de 1946. Dispõe sobre os bens imóveis da União e da outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto– Lei/Del9760.htm>. Acesso em: 01 jul. 2010. 2 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 747. 3 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 747. 4 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 938. 16 De acordo com o art. 3º do Decreto-lei n. 9.760/1946, também serão considerados de marinha, os terrenos acrescidos, que se formaram, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha. A CRFB/1988, em seu art. 20, VII, classifica os terrenos de marinha como bens públicos que pertencem à União, só existindo nas áreas que sofrem influência das marés.5 Porém, nem toda a área que sofre influência de maré será considerada terreno de marinha, cabendo mencionar a diferenciação entre praias e terrenos de marinha, apresentada por Niebuhr: Os terrenos de marinha não se confundem com as praias. Segundo o §3º do art. 10 da Lei nº 7.661/886 [...] “entende-se por praia a área coberta e descoberta periodicamente pelas águas, acrescida da faixa subseqüente de material detrítico7, tal como areias, cascalhos, seixos e pedregulhos, até o limite onde se inicie a vegetação natural, ou, em sua ausência, onde comece um outro ecossistema”. [...] praia é de dimensão variável [...]. Nesse sentido, os 33 metros a partir da linha da premar-média de 1831, que constituem os terrenos de marinha, podem ultrapassar a faixa da praia, bem como a faixa da praia pode ultrapassá-los, ou mesmo pode haver terreno de marinha em locais em que não haja praia. [...] a praia é bem de uso comum, ao contrário dos terrenos de marinha.8 (grifo no original) Os terrenos de marinha, como bens pertencentes à União, receberam inciso próprio no texto constitucional, sendo “separados” das praias marítimas, agregando aos terrenos de marinha, também os seus acrescidos.9 Art. 20. São bens da União: IV - as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço 5 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 10 jul. 2010. 6 BRASIL. Lei n. 7.661, de 16 de maio de 1988. Institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7661.htm>. Acesso em: 10 jul. 2010. 7 Detrítico. [De detrito + -ico]. Adj. Relativo a detritos; alotígeno. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 3. ed. rev. e atual. Curitiba: Positivo, 2004. p. 667. 8 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 748. 9 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 1992. v. 3. tomo I. p. 76. 17 público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II; VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos”.10 Sobre o conceito de terrenos de marinha esclarece ainda Ferreira Filho apud Martins e Bastos “Estes constituem uma faixa de terra banhada pelo mar ou por rios e lagos que sofram a influência das marés”.11 O esclarecimento sobre o instituto e seus aspectos jurídicos foi um dos objetivos buscados na elaboração do presente estudo. Portanto, na sequência serão tecidas considerações sobre aspectos históricos e jurídicos que alcançam os terrenos de marinha, definição da linha demarcatória (linha de preamar-média) e formas de utilização dos mesmos. 1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS E EVOLUÇÃO LEGISLATIVA O descobrimento do Brasil deu-se em 22 de abril de 1500, época das grandes navegações, quando Portugal e Espanha exploravam o oceano em busca de novas terras. Em razão da grande ambição e conquistas dos dois países e, com o intuito de evitar guerras pela luta de terras, Portugal e Espanha assinaram o Tratado de Tordesilhas no ano de 1.494. A assinatura do Tratado determinou que Portugal ficasse com as terras recém descobertas que estavam a leste da linha imaginária (200 milhas a oeste das ilhas de Cabo Verde), enquanto a Espanha ficou com as terras a oeste desta linha.12 Em 1530 os portugueses iniciaram a colonização das terras brasileiras e, conforme determinado no Tratado de Tordesilhas, incorporaram as terras ao seu patrimônio. E, durante o período do Brasil Colônia, através do movimento dos bandeirantes, ampliou o patrimônio de terras.13 10 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 10 jul. 2010. 11 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves apud BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 1992. v. 3. tomo I. p. 76. 12 História do Brasil.net. Textos e imagens da história do Brasil, fonte de pesquisas históricas. Disponível em: <http://www.historiadobrasil.net>. Acesso em: 05 jul. 2010. 13 História do Brasil.net. Textos e imagens da história do Brasil, fonte de pesquisas históricas. Disponível em: <http://www.historiadobrasil.net>. Acesso em: 05 jul. 2010. 18 Os terrenos de marinha também foram incluídos nesse patrimônio. Essas terras, porém, possuíam valor diferenciado por se tratarem de terras destinadas à proteção do território, em razão da sua localização estratégica.14 Essa característica especial fica evidenciada na Ordem Régia de 21 de outubro de 1710, escrita de Lisboa para o governador do Rio de Janeiro, considerado o primeiro documento chegado ao Brasil que trata de marinha.15 Segundo Schaefer, é um documento que demonstra claramente as ordens autoritárias e severas de Lisboa, referentes às marinhas. Segue trecho da Ordem Régia de 21 de outubro de 1710: O Provedor da Fazenda Real [...] Me deu conta [...] das muitas casas que se fabricavam na marinha dessa cidade, por cuja causa mandara notificar as pessoas que as começavam a levantar de novo para que as deitassem abaixo. [...] “que fizessem termo para que todas as vezes que aquela área fosse necessária para Meu serviço se lhe poderiam derribar as casas, sem que por elas pudessem pedir satisfação alguma[...]”.16 [sic] Ainda sobre a Ordem Régia menciona Menezes: Ordem Régia de 21-10-1710 [...] já vedava que as terras dadas em sesmarias17 compreendessem as marinhas, as quais deveriam estar "desimpedidas para qualquer serviço da Coroa e de defesa da terra". Enfim, é uma área nobre que se reservou ao domínio público.18 Com o passar do tempo os terrenos de marinha agregaram valor patrimonial ao Estado, deixando de ser vistos como bens exclusivos de defesa territorial, fazendo o interesse político buscar formas de exploração econômica desses bens. Em decorrência disso e, com o propósito de regulamentar a exploração e uso das terras e a arrecadação de valores, foram criados decretos e avisos acerca do assunto, como se verifica neste trecho da obra de Santos: 14 MENEZES, Roberto Santana de. Regime patrimonial dos terrenos de marinha. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 486, 5 nov. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5855>. Acesso em: 05 jul. 2010. 15 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 5. e SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, p. 5-18, abr. 2002. p. 6. 16 SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, p. 5-18, abr. 2002. p. 6. 17 Sesmaria: Pedaço de terra devoluta ou abandonada que, no Brasil Colônia, os governos das capitanias hereditárias doavam a quem se dispusesse a cultivá-las. ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro acquaviva. 11. ed. ampl., rev. e atual. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2000. p. 1163. 18 MENEZES, Roberto Santana de. Regime patrimonial dos terrenos de marinha. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 486, 5 nov. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5855>. Acesso em: 05 jul. 2010. 19 [...] o Decreto de 21 de janeiro de 1809 é o primeiro ato de Governo que manda aforar os terrenos de marinha das praias, e o Aviso de 18 de novembro de 1818 é o primeiro ato público que determina as 15 braças da linha d’água do mar. O Decreto de 13 de julho de 1820 [...] primeiro ato de Governo que atribui a uma repartição pública a obrigação de cuidar da administração das, ainda e pouco definidas, terras de marinha. Neste Decreto foi determinado que a Repartição da Marinha teria competência para conceder, em todos os portos, qualquer porção de praia.19(grifo no original) Com a Independência do Brasil, em 07 de setembro de 1822, o Reino de Portugal foi desmembrado, e o patrimônio de terras foi transferido para Casa Imperial chefiada por D. Pedro I, ou seja, mesmo independente as terras brasileiras permaneceram na posse da Coroa portuguesa.20 Na intenção de regular o uso das terras, foi criada, em 15 de novembro de 1831, a primeira lei orçamentária sobre terrenos de marinha. Essa lei demonstra e reafirma o interesse econômico e patrimonial do Estado nessas terras, permitindo que as Câmaras Municipais aforassem e estipulassem o foro sobre os terrenos de marinha.21 A referida lei orçamentária em seu art. 51, n. 14 traz em seu bojo o seguinte texto: Art. 51. O Governo fica autorizado a arrecadar no ano financeiro do 1º de julho de 1832 ao último de junho de 1833, as rendas, que foram decretadas para o ano de 1831-1832, com as seguintes alterações: 14. Serão postos à disposição das Câmaras Municipais, os terrenos de Marinha, que estas reclamarem do Ministro da Fazenda, ou dos Presidentes das Províncias, para logradouros públicos, e o mesmo Ministro na Corte, e nas Províncias os Presidentes, em Conselho, poderão aforar a particulares aqueles de tais terrenos, que julgarem conveniente, e segundo o maior interesse da Fazenda, estipulando, também, segundo for justo, o foro daqueles dos mesmos terrenos, onde já se tenha edificado sem concessão, ou que, tendo já sido concedidos condicionalmente, são obrigados a eles desde a época da concessão, no que se procederá a arrecadação. O Ministro da Fazenda, no seu relatório da sessão de 1832, mencionará tudo o que ocorrer sobre este objeto.22 (grifo no original) 19 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 11. PUGLIESE, Roberto J. O patrimônio imobiliário da União Federal e o ordenamento jurídico. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 52, nov. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/pecas/texto.asp?id=437>. Acesso em: 05 jul. 2010. 21 MENEZES, Roberto Santana de. Regime patrimonial dos terrenos de marinha. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 486, 5 nov. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5855>. Acesso em: 05 jul. 2010. 22 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 12 20 20 Essa lei não especifica o que são terrenos de marinha, ela trata apenas de regulamentar a administração das mesmas no que diz respeito ao aforamento. Em razão desse silêncio na legislação foi criado, em 14 de novembro de 1832, a Instrução n. 348, que traz em seu art. 4º, a definição de terrenos de marinha23: Hão de considerar-se terrenos de marinha todos os que, banhados pelas aguas do mar ou dos rios navegaveis, vão até a distancia de 15 braças craveiras para a parte da terra, contadas estas desde os pontos a que chega o preamar médio.24 [sic] (grifo no original) Da leitura desse artigo verifica-se que ele define não só o que são terrenos de marinha mas, inclusive, a forma de delimitação e demarcação dos mesmos, qual a seja a linha da preamar-média. Em relação à delimitação dos terrenos de marinha, não se pode deixar de citar o Aviso de 18 de novembro de 1818, considerado o primeiro ato oficial em que se determinou a extensão das terras de marinha “[...]15 braças da linha d’água do mar, e pela sua borda são reservados para servidão pública; e que tudo que toca a água do mar e acresce sobre ela é da nação”.25 As explanações que seguem acerca da evolução legislativa dos terrenos de marinha, tomam por base os ensinamentos de Rosita de Souza Santos, com o fito de tornar o contexto mais compreensível e objetivo. Em 1834, com a criação da Lei Orçamentária n. 38, foi concedido à Câmara Municipal da cidade do Rio de Janeiro o direito de receber o valor recebido a título de foro dos terrenos de marinha. Essa permissão foi derrubada pelo Decreto-lei n. 710 de 1938.26 Em 1868, o Decreto n. 4.105, pela primeira vez definiu terrenos de marinha e regulamentou sua concessão, bem como dos reservados nas margens dos rios e dos acrescidos natural ou artificialmente.27 Conforme segue: Art. 1º A Concessão directa ou em hasta publica dos terrenos de marinha, dos reservados para a servidão publica nas margens dos rios navegaveis e de que se fazem os navegaveis, e dos accrescidos natural ou artificiamente aos ditos terrenos, regular-se-ha pelas disposições do presente Decreto. § 1º São terrenos de marinha todos 23 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 13 e MENEZES, Roberto Santana de. Regime patrimonial dos terrenos de marinha. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 486, 5 nov. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5855>. Acesso em: 05 jul. 2010. 24 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 13 25 SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, p. 5-18, abr. 2002. p. 7. 26 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 14 27 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 17. 21 os que banhados pelas aguas do mar ou dos rios navegaveis vão até a distancia de 15 braças craveiras (33 metros) para a parte de terra, contadas desde o ponto a que chega o preamar médio. Este ponto refere-se ao estado do lugar no rio tempo da execução da lei de 15 de. Novembro de 1831, art. 51 §14 (Instrucções de 14 de Novembro de 1832 art. 4º). § 2º São terrenos reservados para a servidão publica nas margens dos rios navegaveis e de que se fazem os navegaveis, todos os que banhados pelas aguas dos ditos rios, fóra do alcance das marés, vão até a distancia de 7 braças craveiras (15,4 metros) para a parte de terra, contadas desde o ponto médio das enchentes ordinarias (Lei nº 1507 de 26 de Setembro de 1867, art. 39). § 3º São terrenos accrescidos todos os que natural ou artificialmente se tiverem formado ou formarem além do ponto determinado nos §§ 1º e 2º para a parte do mar ou das aguas dos rios (Res. de Cons. de 31 de Janeiro de 1852 e Lei nº 1114 de Setembro de 1860, art. 11 § 7º) 28 [sic] Os terrenos de marinha sempre se regularam por leis orçamentárias, em razão do resultado financeiro que eles proporcionavam ao Estado. E, através de uma nova lei orçamentária, o benefício concedido à Câmara do Rio de Janeiro, em 1834 (Lei Orçamentária n. 38), foi estendido a todas as Câmaras Municipais, através de Lei n. 3.348, de 20 de outubro de 1887.29 Verifica-se o art. 8º, item 3º da referida lei: É o Governo autorisado: 3º A transferir á Illma. Camara Municipal do Rio de Janeiro o direito de aforar os terrenos accrescidos aos de marinhas existentes no Municipio Neutro, e ás Camaras Municipaes das Provincias os de marinhas e accrescidos nos respectivos municipios, passando a pertencer á receita das mesmas corporações a renda que dahi provier, e correndo por sua conta as despezas necessarias para medição, demarcação e avaliação dos mesmos terrenos, observadas as disposições do Decreto n. 4105 de 22 de Fevereiro de 186830. [sic] Com a criação da lei orçamentária de 15 de novembro de 1831, assim com as posteriores, os terrenos de marinha ganharam espaço e passaram a ser controlados pelo Ministério da Fazenda, e a renda proveniente dos foros foi incluída na sua renda pública.31 28 BRASIL. Decreto n. 4.105, de 22 de fevereiro de 1868. Regula a concessão dos terrenos de marinha, dos reservados nas margens dos rios e dos accrescidos natural ou artificialmente. Disponível em: < http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=74305>. Acesso em: 10 jul. 2010. 29 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 19. 30 BRASIL. Lei n. 3.348, de 20 de outubro de 1887. Orça a Receita Geral do Império para o exercício de 1888 e dá outras providencias. Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=67926>. Acesso em: 10 jul. 2010. 31 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 12 22 É importante salientar que os terrenos foram colocados à disposição das Câmaras Municipais, através da Lei n. 3.348/1887, mas a propriedade e titularidade sobre eles permaneceu com a União. E, para evitar qualquer tipo de desordem, foi criada a Circular n. 120 no ano de 1887, concedendo aos municípios o poder de conceder o aforamento e receber a renda proveniente dessa concessão, sendo que a titularidade do imóvel permaneceria em poder da União.32 Mesmo com a publicação da Circular, muitas Câmaras Municipais e presidentes de províncias passaram a considerar como seus os terrenos de marinha. Como resultado, em 28 de dezembro de 1889, o então Ministro da Fazenda e Presidente do Tribunal do Tesouro Nacional, Rui Barbosa, determinou a observação das seguintes instruções:33 Art. 1º - Quando tratar-se de terrenos de marinha, propriamente ditos [...] §1º Na Capital Federal, quanto aos de marinha e acrescidos....− Dependem: a primeira concessão de aforamento, em ambos os casos, de approvação do Ministerio da Fazenda, como representante do senhorio directo de taes terrenos, que é a Republica; e as transmissões de uns para outros foreiros, de licença do Conselho de Intendência Municipal, quando se tratar de terrenos de mangue e de marinha, propriamente ditos, e daquelle ministerio se os terrenos forem acrescidos; observadas nos processos respectivos as Instruções de 14 de novembro de 1832, e as disposições do Decreto n. 4.105 acima citado no que forem applicaveis.34 [sic] (grifo no original) Em dezembro de 1891, nova lei orçamentária é aprovada, Lei n. 25, determinando a inclusão de valores provenientes de foros e laudêmios de terras de marinha, na receita geral da República.35 Assim estabelecendo em seu art. 1°: A receita geral da Republica dos Estados Unidos do Brazil é orçada na quantia de 207.992:120$ e será realizada com o producto do que for arrecadado dentro do exercicio da presente lei, sob os titulos abaixo assignados: Renda dos proprios nacionaes. Fóros de terrenos e de marinhas, excepto os do Districto Federal, e producto da renda de posses ou dominios uteis dos terrenos de marinhas, nos termos da legislação em vigor. Laudemios, não comprehendidos os provenientes das vendas de terrenos de marinhas no Districto Federal.36[sic] 32 ANTUNES, José Carlos. Terrenos de marinha: formas de utilização. 2003. 46 f. Monografia (apresentada ao final do curso de Gestão Imobiliária) – Universidade do Vale do Itajaí, São José. p. 17. 33 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 19. 34 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 19-20. 35 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 20. 36 BRASIL. Lei n. 25, de 30 de dezembro de 1891. Orça a receita geral da Republica dos Estados Unidos do Brasil para o exercício de 1892, e dá outras providencias. Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=64579> . Acesso em: 10 jul. 2010. 23 Em Circular de 25 de julho de 1892, determinou-se que os valores obtidos através dos terrenos de marinha deveriam pertencer aos cofres federais.37 Essa nova determinação causou grandes discussões entre os Estados, Municípios e a União, no que se refere ao domínio das terras de marinha, levantado a questão se seriam ou não terras devolutas.38 Um exemplo claro é o que ocorreu no Estado de São Paulo, o Ministro da Fazenda solicitou, através do Aviso de n. 132, que o governo desse Estado determinasse que o Município de Santos suspendesse as concessões de foro dos terrenos de marinha. Determinação essa não acatada.39 Essa resistência se estendia por todo o país e, em 15 de novembro de 1899, o Ministério da Fazenda proibiu qualquer tipo de concessão de aforamento dos terrenos de marinha. Essa ordem foi suspensa apenas em 1900, com a promulgação da Lei n. 741.40 Após a promulgação da lei, o governo demarcou os terrenos de marinha, obedecendo ao disposto no Decreto n. 4.105/1868.41 Diante do impasse que girava em torno do domínio e propriedade sobre os terrenos de marinha, os Estados do Espírito Santo e da Bahia, levaram a discussão ao STF, através da Ação Originária n. 8.42 Do trecho da obra de Santos extrai-se comentário sobre referida ação: Toda a questão girou em torno de dois eixos: um, expressamente declarado, o outro, subjetivamente alimentado pelo sentimento de repúdio à detenção do domínio direto das terras de marinha pela União. [...] Definir a marinha como terra devoluta era, tão-somente, o invólucro da ação. O que, de fato, importava, era definir a propriedade, era definir o domínio pleno em favor dos Estados.43 (grifo no original) Esses Estados alegavam que, com base no art. 64 da Constituição de 1891, vigente à época, as terras de marinha pertenciam aos Estados, o que permitia sua exploração. Eles desejavam com a proposta apresentada ao Supremo, incluir as terras de marinha como terras devolutas, passando-as ao domínio dos Estados. 37 PASSOS, Stalin. Terras de marinha. 1999. 61 f. Monografia (apresentada ao final do curso de especialização em direito imobiliário) – Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí. p. 10. 38 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 23 39 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 21-22. 40 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 22. 41 PASSOS, Stalin. Terras de marinha. 1999. 61 f. Monografia (apresentada ao final do curso de especialização em direito imobiliário) – Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí. p. 12. 42 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 24-25. 43 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 25. 24 Ocorre que o texto constitucional apenas apresentava as terras que não pertenciam à União, nada tratando de terras de marinha.44 O STF já havia se manifestado sobre o assunto, e vinha mantendo, reiteradamente, o mesmo posicionamento, entendendo que o domínio e propriedade plena das terras de marinha eram da União Federal.45 Epitácio Pessoa, então deputado no Congresso Constituinte46, defendia o entendimento adotado pelo STF: [...] a Fazenda Nacional tem pleno domínio das terras de marinha não aforadas e o directo das aforadas, cuja posse não perder com a cessão do util. [...] Na expressão terras devolutas do art. 64 da Constituição47 não se comprehendem os terrenos de marinha, que são, material e juridicamente, coisa diversa. Nem podia estar nas vistas do legislador constituinte transferir aos Estados esses terrenos, que são necessarios à União para o desempenho dos arduos deveres que a própria Constituição lhe impoz e para o exercício dos direitos de soberania que lhe pertencem.[...] Os terrenos de marinha não abrangem “as margens de todos os rios navegaveis de daquelles de que se fazem navegaveis” e mais as dos rios “que correm só dentro do territorio do Estado”: os terrenos de marinha as margens de taes rios sómente até ao ponto onde chegam as marés.[...] apezar do disposto nos arts. 64 e 65, nº 248, da Constituição, os terrenos de marinha são de propriedade federal.49 [sic] (grifo no original) Em 31 de janeiro de 1905, o Supremo proferiu decisão no sentido de que terras de marinha não são terras devolutas e, ainda, que terras de marinha são bens da União, sobre as quais exerce direito pleno de soberania e jurisdição territorial.50 44 PASSOS, Stalin. Terras de marinha. 1999. 61 f. Monografia (apresentada ao final do curso de especialização em direito imobiliário) – Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí. p. 11-12. 45 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 25 e 30. 46 Portal São Francisco. Governo Epitácio Pessoa. Disponível em: <http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/governo-epitacio-pessoa/governo-epitacio-pessoa-2.php>. Acesso em: 11 jul. 2010. 47 Art 64 - Pertencem aos Estados as minas e terras devolutas situadas nos seus respectivos territórios, cabendo à União somente a porção do território que for indispensável para a defesa das fronteiras, fortificações, construções militares e estradas de ferro federais. BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891. Rio de Janeiro, RJ: Congresso Nacional Constituinte, 1891. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao91.htm>. Acesso em: 10 jul. 2010. 48 Art 65 - É facultado aos Estados: 2º) em geral, todo e qualquer poder ou direito, que lhes não for negado por cláusula expressa ou implicitamente contida nas cláusulas expressas da Constituição. BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891. Rio de Janeiro, RJ: Congresso Nacional Constituinte, 1891. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao91.htm>. Acesso em: 10 jul. 2010. 49 PESSOA, Epitácio apud SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p.31. 50 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 32. 25 Após esse evento, muitos foram os atos emanados do Poder Executivo mencionando terras de marinha, como por exemplo, Lei n. 741 de 1900, Decreto n. 791 de 1900, Lei n. 813 de 1901, Lei n. 957 de 1902 e Lei n. 1.145 de 1903. O que não encerrou as discussões referentes aos terrenos de marinha.51 As Constituições de 1934 e 1937 também não trouxeram grandes modificações em relação aos terrenos de marinha e, apenas no ano de 1946, com a promulgação do Decreto-lei n. 9.760 é que se volta a legislar sobre a matéria. Dito Decreto é conhecido também como lei do patrimônio ou lei da SPU.52 Após esse Decreto, pouco se legislou em matéria de terrenos de marinha. E, o que se criou não alterou conceitos, forma de demarcação, metragem ou utilização. Segue algumas leis posteriores ao Decreto que tratam de terrenos de marinha: Lei n. 2.185 de 1954 (modifica a data para apresentação de documentos referente à regularização das terras de marinha), Decreto n. 37.681 de 1955 (permite que cidadãos portugueses adquiram o domínio útil das terras da União), Decreto-lei n. 1.561 de 1977 (determina a forma de ocupação dos imóveis de marinha), Decreto-lei n. 1.850 de 1981 e 1.876 de 1981 (dispõe sobre a isenção de laudêmio e foros), Lei n. 6.969 de 1981 e Decreto n. 87.620 de 1982 (estabelece usucapião especial para terras devolutas).53 Outra referência importante na evolução legislativa dos terrenos de marinha é a que ocorreu no ano de 1916, ano em que foi promulgada a Lei n. 3.071, de 1º de janeiro de 1916, que institui o Código Civil, legislando em seus arts. 65 a 68 sobre bens públicos sem, contudo, mencionar explicitamente os terrenos de marinha.54 O reconhecimento dos terrenos de marinha como bens públicos, confirmouse através da CRFB/1988, através de seu art. 20, VII.55 Já embasada pela atual Constituição, destaca-se a Lei n. 9.636, de 15 de maio de 1998, que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União, o Decreto n. 3.725, de 10 de 51 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 33. ANTUNES, José Carlos. Terrenos de marinha: formas de utilização. 2003. 46 f. Monografia (apresentada ao final do curso de Gestão Imobiliária) – Universidade do Vale do Itajaí, São José. p. 18-19 e SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 50. 53 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 50-51. 54 PASSOS, Stalin. Terras de marinha. 1999. 61 f. Monografia (apresentada ao final do curso de especialização em direito imobiliário) – Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí. p. 15. e FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona costeira e meio ambiente: aspectos jurídicos. Curitiba: Juruá, 2006. p. 169. 55 Art. 20. São bens da União: VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos. 52 26 janeiro de 2001, que regulamenta a Lei n. 9.636 de 1998, a Instrução Normativa n. 2/2001 da SPU e a Lei n. 11.481 de 2007, que prevê medidas voltadas à regularização fundiária de interesse social em imóveis da União. Com o estudo realizado constatou-se que, a partir do Decreto-lei n. 9.760/1946 as diretrizes sobre terrenos de marinha foram traçadas, não havendo grandes transformações após a promulgação desse diploma. Após toda a evolução legislativa, iniciando com a Ordem Régia de 1710 e alcançando o Decreto-lei n. 9.760/1946 e Lei n. 9.636/1998, os terrenos de marinha podem ser considerados, bens nacionais, bens públicos dominicais e bens da União, que devem ser resguardados pela Administração Pública.56 Após explanação conceitual, legislativa e histórica, passa-se ao estudo da linha de preamar-média de 1831, considerada o ponto demarcatório dos terrenos de marinha. 1.2 LINHA DE PREAMAR-MÉDIA DE 1831 (LPM/1831) O Decreto-lei n. 9.760/1946 em seu art. 2º estabelece que serão terrenos de marinha os localizados em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar-média de 1831, considerada o ponto demarcatório para delimitar e localizar os terrenos de marinha. Por preamar entende-se ser o ponto mais alto que sobe a maré, podendo ser considerada a maré cheia.57 Preamar-média é considerada a média de preamares ocorridas durante uma ou várias lunações58, de forma a atender não só a ação conjunta do sol e da lua, mas também outras causas anormais ou 56 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 50 e 52. Humberto Haydt de Souza Mello apud NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba : Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 747. 58 Lunação. [Do latim tard. Lunatione.]. S. f. 1. Astr. Intervalo de tempo que separa duas luas novas consecutivas cuja duração é de aproximadamente 29 dias e meio. 2. P. ext. A sucessão das fases lunares nesse intervalo. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 3. ed. rev. e atual. Curitiba: Positivo, 2004. p. 1.235. 57 27 perturbadoras que possam influenciar nas marés. Dessa forma, partindo-se da média, ter-se-á o mínimo de influência possível dessas causas.59 A criação de uma linha demarcatória foi prevista muito antes da elaboração e entrada em vigor do Decreto-lei n. 9.760/1946. Ela foi mencionada pela primeira vez no Aviso de 18 de novembro de 1818 “[...]15 braças da linha d’água do mar, e pela sua borda são reservados para servidão pública; e que tudo que toca a água do mar e acresce sobre ela é da nação.”60 Em novembro de 1832, através do art. 4º da Instrução n. 348, determinou-se que a contagem das 15 (quinze) braças partiria da linha da preamar-média. Essa ordenação prevaleceu até a criação do Decreto n. 4.105/1868 que fixou a linha demarcatória como sendo a linha de preamar-média registrada no ano de 1831, tomando por base a Lei de 15 de novembro de 1831, e determinou essa linha como ponto inicial de contagem dos 33 (trinta e três) metros ou 15 (quinze) braças.61 Sobre a evolução da linha de premar-média leciona Menezes: A marcação de 15 braças, equivalente hoje a 33 metros, vigorou até 1942 quando o Decreto-lei n. 4.120 alterou a linha de marcação inicial para a linha da preamar máxima de 1942 [...]. Em 1946 o Decreto-lei n. 9.760 de 5 de setembro de 1946, ainda vigente, retomou a medição de 1831 [...]62 Colhe-se da doutrina outras explicações sobre a linha de preamar-média: [...] se depreende que tenha sido marcada em toda a costa do Brasil a linha do preamar médio no tempo de execução da Lei de 15 de novembro de 1831 e que essa linha sirva sempre de testada de terreno de marinha.63 A linha de preamar médio [sic], fixada pela influência das marés, em determinados períodos, sob o efeitos das lunações, serviu de ponto de referência constante para a delimitação da faixa dos terrenos de marinha, como se pode observar pela análise de nossa vasta legislação sobre o assunto, desde os primeiro alvarás, avisos, leis, decretos, até nossas disposições mais recentes.64 (grifo no original) 59 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 747 60 SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, p. 5-18, abr. 2002. p. 7. 61 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 939. 62 MENEZES, Roberto Santana de. Regime patrimonial dos terrenos de marinha. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 486, 5 nov. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5855>. Acesso em: 13 jul. 2010. 63 MADRUGA, Manoel apud SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, p. 5-18, abr. 2002. p. 5. 64 CRETELLA JUNIOR, J. apud FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona costeira e meio ambiente: aspectos jurídicos. Curitiba: Juruá, 2006. p. 174. 28 A evolução da linha demarcatória dos terrenos de marinha iniciou em 1818, com o Aviso de 18 de novembro, passando pela Instrução n. 348/1832, chegando ao Decreto-lei n. 9.760/1946, atual diploma que determina a linha de premar-média como marco inicial para demarcação dos terrenos de marinha. Atualmente a delimitação de linha de preamar-média é causa de controvérsias, ante a dificuldade da verificação exata do ponto de partida para contagem dos 33 (trinta e três) metros onde então se constituem os terrenos de marinha. A controvérsia gira em torno do tempo transcorrido, pois a LPM/1831, como já mencionado, é a média das marés apuradas no ano de 1831.65 O procedimento para demarcação é apresentado por Lisboa apud Antunes: [...] o processo científico mais prático para determinar o nível de preamar-média, com a necessária exatidão, consiste em observar as preamares consecutivas durante uma lunação, pelo menos todas as vezes que o mar estiver em condições normais. No caso de praias inclinadas, esta observação deve ser feita por meio de estacas, grudadas fincadas em fileiras, no sentido normal à linha do litoral, tendo o cuidado de referi-las previamente a um ponto fixo na terra e, se além disso, a costa é extensa e de sensível irregularidade, devese fincar ao longo do litoral, em diversos pontos, outras tantas estacas em sentido normal a linha do litoral, de forma a ter-se em cada observação a preamar no próprio lugar em que se necessita determiná-lo. [...] no caso de costa abrupta, determina-se ainda a preamar, por meio de estacas, ou por meio de marégrafo registrador em local abrigado [...]. A linha que a água deixa gravada nas praias e rochedos constituem um critério de maior importância para verificar a linha determinada pelas observações, principalmente quando se tem linha marcada nas pedras.66 A demarcação não alcança a totalidade do território brasileiro, isso acarreta problemas, conforme relata Silva apud Niebuhr: [...] em pouquíssimos pontos do litoral brasileiro este marco inicial – linha de preamar-média de 1831 – foi fixado. Como saber, então, onde começam e terminam os terrenos de marinhas e seus acrescidos. Isto acarreta sérios problemas às municipalidades quando da aprovação de plantas para construções e loteamentos e da prática de outros atos de administração.67 65 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 747. 66 LISBOA, Alfredo apud ANTUNES, José Carlos. Terrenos de marinha: formas de utilização. 2003. 46 f. Monografia (apresentada ao final do curso de Gestão Imobiliária) – Universidade do Vale do Itajaí, São José. p. 20. 67 SILVA, João Alfredo Raymundo apud NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba : Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 747. 29 De acordo com o art. 9º do Decreto-lei n. 9.760/1946 é de competência da SPU a delimitação da LPM/1831 e, para realizar tal medição, deverá observar o art. 10 do Decreto-lei n. 9.760/1946 “[...] documentos e plantas de autenticidade irrecusável, relativos àquele ano, ou, quando não obtidos, a época que do mesmo se aproxime.”68. Sobre o procedimento de demarcação, verifica-se o seguinte trecho do estudo elaborado pelo Engenheiro Cartógrafo Obéde Pereira de Lima: [...] dentro da orientação dos artigos 10º ao 14º do Decreto–Lei no 9.760/46, a SPU finaliza o processo de demarcação dos terrenos de marinha com a homologação da “LPM/1831” e a publicação deste ato administrativo em Diário Oficial da União. O entendimento daquele órgão do governo federal é que, tendo seguido os procedimentos dos artigos acima citados, a sua “LPM/1831” deixa de ser “presumida” e passa a ser “verdadeira” [...] com o respaldo dos Artigos 9º ao 14º inclusive, a SPU consagrou a sua prática através de Instruções Normativas.69 Para atender determinada competência, a SPU expediu a Instrução Normativa n. 02/200170, que dispõe sobre a demarcação dos terrenos de marinha, dos terrenos marginais e das terras interiores. E, também, a Orientação Normativa GEADE-002/200171 que orienta e disciplina a demarcação de terrenos de marinha e seus acrescidos.72 Para Niebuhr os diplomas citados são imprecisos e sem aplicabilidade: [...] os diplomas normativos [...] reconhecem que a determinação de linha da preamar-média de 1831 é pressuposto para a demarcação dos terrenos de marinha. No entanto, o procedimento previsto em ambos os diplomas legislativos presta-se, quanto mais, apurar a linha da preamar-média de 1831 de modo presumido, sem exatidão e precisão científicas. Tal procedimento não prevê metodologia para 68 Art. 9º É da competência do Serviço do Patrimônio da União (S.P.U.) a determinação da posição das linhas do preamar médio do ano de 1831 e da média das enchentes ordinárias. Art. 10º. A determinação será feita à vista de documentos e plantas de autenticidade irrecusável, relativos àquele ano, ou, quando não obtidos, a época que do mesmo se aproxime. 69 LIMA, Obéde Pereira de. Terrenos de marinha e seus acrescidos: localização e demarcação destes bens da União pelo método científico versus critérios praticados pela SPU. 2009. 76 f. Monografia (elaborada para exposição na Câmara dos Deputados, em audiência pública no dia 13/05/2009). Brasília/DF. p. 43. Disponível em: <http://sosterrenosdemarinha.org.br/downloads>. Acesso em: 13 jul. 2010. 70 Secretária do Patrimônio da União. Instrução Normativa n. 2, de 12 de março de 2001. Demarcação LPM e LMEO. Disponível em: <http://www.mp.gov.br/noticia.asp?p=not&cod=559&cat=136&sec=9>. Acesso em: 09 jul. 2010. 71 Secretária do Patrimônio da União. Orientação Normativa GEADE-002/2001,de 12 de março de 2001. Disciplina a demarcação de terrenos de marinha e seus acrescidos. Disponível em: <http://www.mp.gov.br/noticia.asp?p=not&cod=2647&cat=136&sec=9>. Acesso em: 09 jul. 2010. 72 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba : Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 749. 30 realizar o cálculo da preamar-média de 1831, apenas do atual ou de período próximo [...] para a legislação brasileira os terrenos de marinha partem da linha da preamar-média de 1831 e não da linha da preamar-média de qualquer outra época.73 Segundo o mesmo doutrinador o procedimento previsto em ambos além de imprecisos, não são observados, sequer, pela SPU. O órgão vem utilizando uma linha provisória, considerando-se a grande dificuldade para fixação da linha de preamar-média.74 Essa linha provisória é denominada Linha do Jundu75. O marco utilizado não possui amparo legislativo, é uma criação doutrinária e jurisprudencial, que tem sido aceita pelo judiciário, particulares e órgãos públicos. É caracterizada pelo início de vegetação rasteira, denominada jundu, existente além das praias e para o interior das terras com que ela limitam.76 (sem grifo no original) Gasparini corrobora com o mesmo entendimento, considerando ilegal a utilização da Linha do Jundu: O critério [...] embora resolva na prática os problemas decorrentes da falta de demarcação oficial da faixa dos trinta e três metros, ressentese de legalidade. A aceitação, pelo Judiciário e pela SPU, não o torna legal. Por ele, não se atende ao prescrito no art. 2º do DecretoLei n. 9.760/46, que exige sejam os trinta e três metros contados da linha da premar média de 1831.77 O autor esclarece ainda que, é de competência da SPU a demarcação dos terrenos de marinha, devendo adotar o procedimento prescrito na legislação pertinente (Decreto-lei n. 9.760/1946), não podendo adotar outro, sob pena de ilegalidade.78 Devido ao grande lapso temporal decorrido e à elevação global do nível médio dos oceanos, não se encontram mais elementos que permitam definir qual era a LPM/1831. O procedimento atual utilizado pela SPU é ilegal. Portanto o processo 73 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 749 74 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 749. 75 Linha do Jundu. Dir. Adm. Linha natural que, ao longo da faixa litorânea, separa os terrenos de marinha das terras particulares, ou seja, onde começa a vegetação adjacente às praias, denominada “jundu”. SIDOU, J. M. Othon (Coord.). Dicionário jurídico: academia brasileira de letras jurídicas. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 526. 76 SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, p. 5-18, abr. 2002. p. 8-9. 77 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 940. 78 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 941. 31 mais correto para buscar uma correta demarcação dos terrenos de marinha, na opinião de Óbede Pereira de Lima, seria a reforma do art. 3º do Decreto-lei n. 9.760/1946.79 O Engenheiro Cartógrafo apresenta como proposta a seguinte redação: São terrenos de marinha, os que se tiverem formado, natural ou artificialmente, para o lado do mar, a partir da margem marítima limitada pela linha de costa; e para o lado das águas das baías, enseadas, lagunas e rios situados em zonas até onde se façam sentir a influência das marés, a partir das suas respectivas margens. Também, seguindo o mesmo critério, os que se formarem no entorno das ilhas costeiras e oceânicas, e nas situadas em baías, enseadas, lagunas e rios, até onde se façam sentir a influência das marés.80 A correta delimitação da linha de preamar-média é de extrema importância pois é através dela que os bens da União e de particulares serão demarcados de forma justa e precisa. 1.3 TERRENOS ACRESCIDOS DE MARINHA Apesar da imprecisão na demarcação dos terrenos de marinha, essa não gera nenhuma controvérsia em relação aos terrenos acrescidos de marinha. De acordo com o art. 20, VII da CRFB/1988 e o art. 1º, “a” do Decreto-lei n. 9.760/1946 são bens da União, não só os terrenos de marinha, mas também seus acrescidos. A definição de terrenos acrescidos de marinha é apresentada pelo art. 3º do Decreto-lei n. 9.760/1946, de onde se extrai que “são terrenos acrescidos de marinha os que se tiverem formado, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha”. 79 LIMA, Obéde Pereira de. Terrenos de marinha e seus acrescidos: localização e demarcação destes bens da União pelo método científico versus critérios praticados pela SPU. 2009. 76 f. Monografia (elaborada para exposição na Câmara dos Deputados, em audiência pública no dia 13/05/2009). Brasília/DF. p. 60. Disponível em: <http://sosterrenosdemarinha.org.br/downloads>. Acesso em: 13 jul. 2010. 80 LIMA, Obéde Pereira de. Terrenos de marinha e seus acrescidos: localização e demarcação destes bens da União pelo método científico versus critérios praticados pela SPU. 2009. 76 f. Monografia (elaborada para exposição na Câmara dos Deputados, em audiência pública no dia 13/05/2009). Brasília/DF. p. 60. Disponível em: <http://sosterrenosdemarinha.org.br/downloads>. Acesso em: 13 jul. 2010. 32 O Aviso de 18 de novembro de 1818 já mencionava os terrenos acrescidos, declarando que “[...] 15 braças da linha d’água do mar, e pela sua borda são reservados para servidão pública; e que tudo que toca a água do mar e acresce sobre ela é da nação.”, bem como o Decreto n. 4.105/1868: São terrenos accrescidos todos os que natural ou artificialmente se tiverem formado ou formarem além do ponto determinado nos §§ 1º e 2º para a parte do mar ou das aguas dos rios [...].81[sic] É importante esclarecer que terrenos acrescidos e terrenos de marinha são bens da União e que o regime jurídico aplicado aos terrenos de marinha deverá ser aplicado aos terrenos acrescidos, porém terrenos acrescidos não são terrenos de marinha.82 (sem grifo no original) Sobre terrenos acrescidos leciona Gasparini: Os terrenos de marinha não se confundem com os acrescidos [...] salvo pela unicidade do domínio, pois todos pertencem à União. Terrenos acrescidos são os definidos, pelo art. 3º do Decreto-lei n. 9.760/1946, como os que se formaram, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagos, em seguimento aos terrenos de marinha.83 No mesmo sentido Mello apud Niebuh: [...] são terrenos que se formam por acréscimo, natural ou artificialmente, para os lados do mar, para as margens dos rios ou para a orla dos lagos, tornando mais ampla a área de terreno a que se somam. São os terrenos de aluvião84 [...] terrenos aluviais.85 Para Freitas, os terrenos acrescidos são considerados extensões dos terrenos de marinha e que não os alteram, ou modificam a linha demarcatória LPM/1831.86 (sem grifo no original) Esse mesmo entendimento é confirmado por Di Pietro, com base no Decreto-lei n. 9.760/1946 “Os terrenos acrescidos [...] tanto se formam para o lado 81 BRASIL. Decreto n. 4.105, de 22 de fevereiro de 1868. Regula a concessão dos terrenos de marinha, dos reservados nas margens dos rios e dos accrescidos natural ou artificialmente. Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=74305>. Acesso em: 10 jul. 2010. 82 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 748. 83 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 941. 84 Aluvião. S. m. (Lat. alluvio). Dir. Civ. Acréscimo do imóvel por depósito de aterros naturais ou pelo desvio das águas de um rio. Uma das modalidades de acessão. SIDOU, J. M. Othon (Coord.). Dicionário jurídico: academia brasileira de letras jurídicas. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 50. 85 MELLO, Humberto Haydt de Souza apud NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 748. 86 FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona costeira e meio ambiente: aspectos jurídicos. Curitiba: Juruá, 2006. p. 177. 33 do mar, em acréscimo aos terrenos de marinha, como para o lado do rio, em acréscimos aos terrenos reservados. Os primeiros pertencem à União [...]”.87 E também por Mello apud Freitas “[...] são os que, por aluvião ou avulsão, se incorporaram aos terrenos de marinha [...] aquém do ponto a que chega a preamarmédia [...].”88 O conceito de aluvião pode ser verificado no art. 1.250 do CC/2002: “Os acréscimos formados, sucessiva e imperceptivelmente, por depósitos e aterros naturais ao longo das margens das correntes, ou pelo desvio das águas destas, pertencem aos donos dos terrenos marginais, sem indenização.”89 O Código das Águas, instituído pelo Decreto n. 24.643, de 10 de julho de 1934, também afirma, serem públicos os terrenos acrescidos formados por aluvião, conforme se verifica em seu texto no art. 16, § 1º: Constituem "aluvião" os acréscimos que sucessiva e imperceptivelmente se formarem para a parte do mar e das correntes, aquém do ponto a que chega o preamar médio, ou do ponto médio das enchentes ordinárias, bem como a parte do álveo que se descobrir pelo afastamento das águas. § 1º Os acréscimos que por aluvião, ou artificialmente, se produzirem nas águas públicas ou dominicais, são públicos dominicais, se não estiverem destinados ao uso comum, ou se por algum título legítimo não forem do domínio 90 particular. Esse acréscimo de terras que caracteriza os terrenos acrescidos pode ocorrer de forma natural, através da deposição de terras pela própria natureza (por aluvião ou avulsão) e também de forma artificial (por aterros artificiais).91 O aspecto relevante abordado nesse tópico é esclarecer que os terrenos acrescidos de marinha são constitucionalmente considerados bens públicos da União. 87 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. .678. MELLO, Bandeira de. apud FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona costeira e meio ambiente: aspectos jurídicos. Curitiba: Juruá, 2006. p. 177. 89 BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm>. Acesso em: 13 jul. 2010. 90 BRASIL. Decreto n. 24.643, de 10 de julho de 1934. Decreta o Código de Águas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D24643.htm>. Acesso em: 13 jul. 2010. 91 MENEZES, Roberto Santana de. Regime patrimonial dos terrenos de marinha. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 486, 5 nov. 2004. Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5855>. Acesso em: 13 jul. 2010. 88 34 1.4 FORMAS DE UTILIZAÇÃO DOS TERRENOS DE MARINHA 1.4.1 Terrenos de Marinha – bens dominicais De acordo com o disposto no art. 20, VII da CRFB/1988, os terrenos de marinha são bens da União, considerados bens de domínio privado da União, e em decorrência dessa característica são denominados bens dominicais ou dominiais. A caracterização dos terrenos de marinha como bens dominicais está expressa também no art. 11, § 1º, do Código das Águas:92 “São públicos dominicais, se não estiverem destinados ao uso comum, ou por algum título legítimo não pertencerem ao domínio particular. 1º. os terrenos de marinha”.93 Os bens dominicais são os bens de domínio privado do Estado, fazendo parte de seu patrimônio disponível. Sua definição legal está prevista no art. 99, III do CC/2002 “São bens públicos: III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades”.94 Meirelles apresenta a seguinte definição de bens dominicais: [...] são aquele que, embora integrando o domínio público como os demais, deles diferem pela possibilidade [...] de serem utilizados em qualquer fim ou, mesmo, alienados pela Administração, se assim o desejar. Daí por que recebem também a denominação de bens patrimoniais disponíveis ou de bens do patrimônio fiscal. Tais bens integram o patrimônio do Estado como objeto de direito pessoal ou real [...].95 (grifo no original) Niebuhr ao caracterizar terrenos de marinha como bens dominicais, ensina que estes “[...] podem ser utilizados privativamente pela União, quer de modo direto, 92 FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona costeira e meio ambiente: aspectos jurídicos. Curitiba: Juruá, 2006. p. 177-178. 93 BRASIL. Decreto n. 24.643, de 10 de julho de 1934. Decreta o Código de Águas. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D24643.htm>. Acesso em: 13 jul. 2010. 94 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. .642. 95 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33.ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 522 -523. 35 quer por meio da celebração de contratos com terceiros [...]. Inclusive é permitido à União alienar os terrenos de marinha, com amparo no art. 101 do Código Civil”.96 As principais características dos bens dominicais, nos quais se incluem os terrenos de marinha podem ser colhidas dos ensinamentos de Di Pietro: comportam função patrimonial ou financeira, porque se destinam a assegurar rendas ao Estado [...]; submetem-se a um regime jurídico de direito privado, pois a Administração Pública age, em relação a eles, como um proprietário privado.”97 (grifo nosso) O art. 64 do Decreto-lei n. 9.760/1946 explicita que os bens imóveis da União poderão ser utilizados por particulares através de contratos de locação, aforamento ou cessão de uso, desde que não estejam sendo utilizados pelo serviço público. Os terrenos de marinha, por serem bens públicos, também estão sujeitos a esses tipos de concessões, podendo, inclusive, serem objetos de ocupação, conforme arts. 127 e seguintes do Decreto-lei n. 9.760/1946.98 A Lei n. 9.636/1998 permite a celebração de contratos para utilização dos bens imóveis da União, quais sejam, ocupação (arts. 8º e seguintes), aforamento (arts. 12 e seguintes), cessão (arts. 18 e seguintes), permissão de uso (arts. 22 e seguintes), concessão de uso especial para fins de moradia (arts. 22-A e seguintes) e alienação (arts. 23 e seguintes).99 O ordenamento jurídico pátrio prevê em legislações diversas as mais variadas formas de utilização dos terrenos de marinha, em especial a Lei n. 9.636/1998 e o Decreto-lei n. 9.760/1946. Tendo em vista o objeto central do presente estudo, optou-se por explicitar exclusivamente àquelas que dizem respeito à possibilidade e/ou impossibilidade de incidência do imposto predial e territorial urbano. Para tanto, serão apresentadas duas formas de utilização dos terrenos de marinha, são elas: aforamento (enfiteuse) e ocupação. 96 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 748. 97 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. .642. 98 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 752 e GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 942-943. 99 BRASIL. Lei n. 9.636, de 15 de maio de 1998. Dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União, altera dispositivos dos Decretos-lei nos 9.760, de 5 de setembro de 1946, e 2.398, de 21 de dezembro de 1987, regulamenta o § 2º do art. 49 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9636.htm>. Acesso em: 31 jul. 2010. 36 1.4.2 Aforamento (enfiteuse) A doutrina e a legislação utilizam ora o termo enfiteuse, ora o termo aforamento. Por vezes utilizam os dois termos, visto que essas expressões são consideradas sinônimas.100 Para melhor esclarecimento dos termos, segue o significado dos mesmos: Aforamento. Contrato pelo qual o proprietário do imóvel transfere o domínio útil e perpétuo deste, mediante pagamento de foro anual, certo e invariável. [...] aforamento é conhecido também por enfiutese Enfiteuse. Do grego emphyteusis, plantar, melhorar o solo, e do latim tardio emphyteuse, arrendamento. Contrato também denominado aforamento, a enfiteuse é um contrato bilateral e oneroso, no qual, por ato inter vivos ou por disposição de última vontade, o proprietário do imóvel confere, perpetuamente, a outrem o domínio útil deste, mediante pagamento de uma pensão anual, invariável, denominada foro [...] o proprietário do imóvel reserva para si o domínio direto, atribuindo-se ao enfiuteta ou foreiro o domínio útil. 101(grifo no original) Freitas esclarece sobre os conceitos e suas diferenciações: O regime dos terrenos de marinha pauta-se pelas normas da enfiteuse, que, na verdade, tem significado semelhante a “aforamento”, com a diferença de que esse último [aforamento] é instituto de direito administrativo (quando trata dos bens públicos) e aquele [enfiteuse], de direito civil (tratando mais especificadamente de bens privados). [...] enfiteuse é instituto de direito privado porém também utilizado no direito público, conforme previsto no art. 64 do Dec.-lei 9.760, de 05.09.1946. Dessa forma, quando o aforamento ou enfiteuse diz respeito a terras da União, rege-se pelas normas do Dec.-lei 9.760, de 05.09.1946.102 (sem grifo no original) Traçada a diferença entre os termos, passa-se a apresentar o conceito de aforamento. Os conceitos foram colhidos na seara do direito civil e do direito administrativo. Segundo o civilista Orlando Gomes, em obra escrita com base no Código Civil de 1916, enfiteuse (aforamento) é direito real limitado, onde alguém confere a outrem os poderes inerentes ao domínio. Esse direito é transferido em caráter perpétuo, mediante uma contraprestação financeira anual. Essa contraprestação é 100 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 944. ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro acquaviva. 11. ed. ampl., rev. e atual. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2000. p. 126 e 563. 102 FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona costeira e meio ambiente: aspectos jurídicos. Curitiba: Juruá, 2006. p. 180. 101 37 denominada foro. O adquirente do domínio é o foreiro ou enfiteuta, e o transmissor é chamado de senhorio direto. Recebe essa denominação, pois transmite apenas o domínio útil, permanecendo sobre sua titularidade a propriedade e o domínio direto do bem. Esse instituto é considerado direito real imobiliário, pois recai exclusivamente sobre terrenos.103 (sem grifo no original) Extrai-se dos ensinamentos de Meirelles o seguinte conceito de aforamento: Enfiteuse ou aforamento é o instituto civil que permite ao proprietário atribuir a outrem o domínio útil do imóvel, pagando a pessoa que o adquire (enfiuteta) ao senhorio direto uma pensão ou foro, anual, certo e invariável (CC de 1916, art. 678). Consiste, pois, na transferência do domínio útil de imóvel público a posse, uso e gozo perpétuos da pessoa que irá utilizá-lo daí por diante.104 (grifo no original) No aforamento ocorre a divisão do domínio pleno em domínio útil e domínio direto. O primeiro é transmitido ao foreiro, e o segundo permanece com o proprietário do imóvel, que perde o direito ao uso e gozo do bem, sendo esses repassados ao detentor do domínio útil. O foreiro permanece com esse direito perpetuamente, podendo transferi-lo de modo gratuito, ou oneroso.105 O titular do domínio útil adquire dois atributos da propriedade, o uso e o gozo. Pode retirar do imóvel todas as vantagens, recebendo inclusive, frutos e rendimentos. Tem direito de usufruir o imóvel de modo mais completo possível, podendo, transmitir e alienar o domínio útil. Essa alienação está sujeita à aprovação pelo senhorio direto que, nos casos dos terrenos de marinha, é a União.106 (sem grifo no original) Já o titular do domínio direto permanece com o direito sobre a propriedade. Tem direito ao recebimento de valores a título de pensões ou foros anuais e do laudêmio. Esse último é exigido nos casos de alienação em que o senhorio direto não exerça seu direito de preferência.107 (sem grifo no original) 103 GOMES, Orlando. Direitos reais. 18. ed. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 263. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33.ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 533. 105 PASSOS, Stalin. Terras de marinha. 1999. 61 f. Monografia (apresentada ao final do curso de especialização em direito imobiliário).Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí. p. 34-35 e NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 752. 106 DINIZ, Maria Helena. Direito das coisas. 19. ed. rev., aum. e atual. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 4. p. 352 e 359. e SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, p. 5-18, abr. 2002. p. 11. 107 DINIZ, Maria Helena. Direito das coisas. 19. ed. rev., aum. e atual. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 4. p. 352 e 363-364. 104 38 A pessoa ou ente que é titular concomitantemente dos dois domínios, possui o denominado domínio pleno. Caracterizado pelo exercício de todos os direitos inerentes à propriedade. Nos terrenos de marinha a União possui o domínio pleno quando os terrenos ainda não foram objeto de aforamento.108 (sem grifo no original) O aforamento/enfiteuse encontra disciplinamento legal no Código Civil de 1916, que nos arts. 678 e seguintes, disciplinou esse instituto como forma de aquisição de direito real sobre coisa alheia.109 O atual Código Civil proíbe a realização de enfiteuse, determinando que as já existentes, observem o Código anterior (1916)110, isso porque, esse instituto foi abolido pela CRFB/1988, através do art. 49, do ADCT. Essa proibição, no entanto, não alcançou os terrenos de marinha. Para esses tipos de imóveis, a constituição de enfiteuse permanece prevista, desde que observada lei especial (Decreto-lei n. 9.760/1946). Essa autorização se encontra expressa no art. 49, § 3º da ADCT: A lei disporá sobre o instituto da enfiteuse em imóveis urbanos, sendo facultada aos foreiros, no caso de sua extinção, a remição dos aforamentos mediante aquisição do domínio direto, na conformidade do que dispuserem os respectivos contratos. § 3º - A Enfiteuse continuará sendo aplicada aos terrenos de marinha e seus acrescidos, situados na faixa de segurança, a partir da orla marítima.111 (sem grifo no original) A forma de instituição do aforamento/enfiteuse dos terrenos de marinha está prevista nos arts. 99 a 123 do Decreto-lei n. 9.760/1946, e ainda nos arts. 12 a 16 da Lei n. 9.636/1998. O aforamento dos terrenos de marinha se caracteriza quando a União (senhorio direto) transmite a terceiro (foreiro) o domínio útil do imóvel mediante pagamento de valor anual (foro). Para que essa transmissão ocorra, é preciso atender a alguns requisitos que serão verificados pela SPU, órgão responsável pela 108 PASSOS, Stalin. Terras de marinha. 1999. 61 f. Monografia (apresentada ao final do curso de especialização em direito imobiliário) – Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí. p. 35. 109 BRASIL. Lei n. 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L3071.htm>. Acesso: 31 jul. 2010. 110 Art. 2.038. Fica proibida a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, subordinando-se as existentes, até sua extinção, às disposições do Código Civil anterior, Lei nº. 3.071, de 1º, de janeiro de 1916, e leis posteriores. BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm>. Acesso em: 13 jul. 2010. 111 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm#adct>. Acesso em: 14 jul. 2010. 39 concessão de aforamento dos bens públicos, conforme arts. 99 e seguintes do Decreto-lei n. 9.760/1946. A concessão depende de prévia autorização do Presidente da República e, dependendo do caso, de prévia audiência dos Ministérios da Guerra, da Marinha, da Aeronáutica, Ministério da Agricultura, do Ministério da Viação e Obras Públicas e das Prefeituras Municipais.112 Sobre aforamento dos terrenos de marinha esclarece Santos: Para o foreiro [...] passou a ser permitido o uso e o gozo de um bem nacional que continua pertencendo ao Estado [...]. E, embora se deva reconhecer que ao foreiro tenha sido concedido o privilégio pagará ele à Nação uma quantia que se denomina foro. Nos aforamentos da terra da marinha ele pagará para sempre. Se vender seu direito de domínio útil, o comprador comprará também a obrigação de pagar para sempre. E [...] se deixar o mesmo direito como herança, ou legado, os herdeiros, ou legatários receberão a obrigação de pagar para sempre.113 (grifo no original) Uma das características do aforamento é o pagamento anual, do foro. Qualificado por uma contribuição anual, fixa e de caráter perpétuo, que o titular do domínio útil deverá pagar ao titular do domínio direto. Com esse pagamento, o foreiro adquire o direito ao domínio útil sobre o imóvel.114 O pagamento do foro nos terrenos de marinha encontra previsão no art. 101 do Decreto-lei n. 9.760/1946 “Os terrenos aforados pela União ficam sujeitos ao foro de 0,6% (seis décimos por cento) do valor do respectivo domínio pleno, que será anualmente atualizado”. (sem grifo no original) Quando dá alienação dos terrenos aforados incide ainda a cobrança do laudêmio, que deverá ser pago ao senhorio direto, quando este não exercer seu direito de preferência na aquisição do domínio útil, conforme leciona Meirelles: [...] importância que o foreiro [...] paga ao senhorio direto quando ele, senhorio, renuncia seu direito de reaver esse domínio útil, nas mesmas condições que o terceiro adquire. Sempre que houver pretendente à aquisição do domínio útil, o foreiro é obrigado a comunicar a existência desse pretendente e as condições da alienação, para que o senhorio direto [...] exerça seu direito de opção [...] ou renuncie a ele, concordando com a transferência a outrem, caso em que terá direito ao laudêmio (CC de 1916, art. 683) [...] (CC de 1916, art. 686).115 (grifo no original) 112 SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, p. 5-18, abr. 2002. p. 12. 113 SANTOS, Rosita de Souza. Terras de marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985. p. 79. 114 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33.ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 533. 115 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33.ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 534. 40 Tratando-se de terrenos de marinha, a União tem direito a essa preferência na aquisição do domínio útil do imóvel e, caso não a exerça, o foreiro deverá pagar à União a quantia de 5% (cinco por cento) sobre o valor do domínio pleno e benfeitorias, a título de laudêmio.116 De acordo com o art. 201, do Decreto-lei n. 9.760/1946117, tanto o foro quanto o laudêmio são considerados créditos fiscais e, o não pagamento poderá acarretar o ajuizamento de ação de execução fiscal, objetivando a cobrança desses valores.118 Embora o aforamento tenha caráter perpétuo, poderá ser extinto no caso de não-pagamento do foro durante três anos consecutivos, ou quatro anos intercalados (art. 101, parágrafo único do Decreto-lei n. 9.760/1946)119; por inadimplemento de cláusula contratual, por acordo entre as partes, pela remissão do foro, nas zonas onde não mais subsistam os motivos determinantes da aplicação do regime enfitêutico, pelo abandono do imóvel, caracterizado pela ocupação, por mais de 5 (cinco) anos, sem contestação, de assentamentos informais de baixa renda, retornando o domínio útil à União ou por interesse público, mediante prévia indenização (arts. 103 e incisos, do Decreto-lei 9.760/1946)120. Da análise desse instituto pode-se constatar que, não havendo interesse da União no uso do imóvel, aliena-se o domínio útil do mesmo, mantendo-se a União, como proprietária e titular de domínio direto.121 116 FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona costeira e meio ambiente: aspectos jurídicos. Curitiba: Juruá, 2006. p. 183. 117 Art. 201. São consideradas divida ativa da União, para efeito de cobrança executiva, as provenientes de aluguéis, taxas, foros, laudêmios e outras contribuições concernentes de utilização de bens imóveis da União. 118 FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona costeira e meio ambiente: aspectos jurídicos. Curitiba: Juruá, 2006. p. 183. 119 Art. 101. Os terrenos aforados pela União ficam sujeitos ao foro de 0,6% (seis décimos por cento) do valor do respectivo domínio pleno, que será anualmente atualizado. Parágrafo único. O nãopagamento do foro durante três anos consecutivos, ou quatro anos intercalados, importará a caducidade do aforamento. 120 Art. 103. O aforamento extinguir-se-á: I - por inadimplemento de cláusula contratual; II - por acordo entre as partes; III - pela remissão do foro, nas zonas onde não mais subsistam os motivos determinantes da aplicação do regime enfitêutico; IV - pelo abandono do imóvel, caracterizado pela ocupação, por mais de 5 (cinco) anos, sem contestação, de assentamentos informais de baixa renda, retornando o domínio útil à União; ou V - por interesse público, mediante prévia indenização. 121 MENEZES, Roberto Santana de. Regime patrimonial dos terrenos de marinha . Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 486, 5 nov. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5855>. Acesso em: 05 jul. 2010. 41 1.4.3 Ocupação A outra forma de utilização dos terrenos de marinha destacada na pesquisa é a ocupação. O art. 1º do Decreto-lei n. 1.561, de 13 de julho de 1977, proíbe qualquer tipo de ocupação gratuita dos terrenos da União, salvo os casos autorizados em lei. Determinando, em seu art. 2º, que a SPU efetue o levantamento dos terrenos ocupados e realize a inscrição e cobrança de taxa de ocupação dos mesmos, de acordo com o disposto no Título II, Capítulo VI, do Decreto-lei n. 9.760/1946.122 A ocupação é considerada simples tolerância por parte da União, permitindo que particulares ocupem e utilizem seus imóveis. A autorização para que terceiros utilizem terrenos de sua propriedade se dá mediante certificados de ocupação, propiciando aos ocupantes que continuem utilizando os mesmos enquanto não há interesse nos imóveis. Essa forma de ocupação se estende também aos terrenos de marinha.123 (sem grifo no original) No regime de ocupação, diferentemente do aforamento, não ocorre a divisão de domínios. O senhorio direto (União) permanece com o domínio pleno sobre o bem. Esse tipo de permissão é considerada ato administrativo unilateral e precário.124 (sem grifo no original) A característica de precariedade fica evidenciada no art. 7º, da Lei n. 9.636/1998: A inscrição de ocupação, a cargo da Secretaria do Patrimônio da União, é ato administrativo precário, resolúvel a qualquer tempo, que pressupõe o efetivo aproveitamento do terreno pelo ocupante, nos termos do regulamento, outorgada pela administração depois de analisada a conveniência e oportunidade, e gera obrigação de pagamento anual da taxa de ocupação. (sem grifo no original) 122 BRASIL. Decreto-lei n. 1.561, de 13 de julho de 1977. Dispõe sobre a ocupação de terrenos da União e dá outras previdências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/DecretoLei/1965-1988/Del1561.htm>. Acesso em: 14 jul. 2010. 123 PASSOS, Stalin. Terras de marinha. 1999. 61 f. Monografia (apresentada ao final do curso de especialização em direito imobiliário) – Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí. p. 32. e NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 753. 124 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 754. 42 De acordo com o art. 131, do Decreto-lei n. 9.760/1946 a inscrição da ocupação e pagamento da respectiva taxa, não importam reconhecimento, por parte da União, de qualquer direito de propriedade do ocupante sobre o terreno ou ao seu aforamento. A única exceção a essa regra se faz aos ocupantes inscritos até o ano de 1940. Para esses, existe a preferência pelo aforamento, desde que estejam em dia com o pagamento das taxas de ocupação.125 Cabe mencionar ainda, que a União pode, a qualquer momento, tomar para si o imóvel, de acordo com o previsto no arts. 132 e seus parágrafos do Decreto-lei n. 9.760/1946.126 Sobre o assunto menciona Schaefer: [...] o ocupante não goza das mesmas garantias do foreiro ou enfiuteta, podendo, caso a União necessite de imóvel, ser sumariamente desapossado do imóvel, recebendo, a título de indenização, apenas o valor das benfeitorias arbitrado pelo SPU.”127 O regime de ocupação de terras da União já vem de longa data. Encontra-se previsão desse tipo de concessão no Decreto n. 14.595/1921, que estabelece cobrança da taxa de ocupação para os terrenos de marinha não aforados. Atualmente encontra respaldo no Decreto-lei n. 9.760/1946 (arts. 127 a 132), que disciplina o regime de ocupação, Decreto-lei n. 1.561/1977, que dispõe sobre a ocupação de terrenos da União, Decreto-lei n. 2.398/1987, que dispõe sobre foros, laudêmios e taxas de ocupação relativas a imóveis de propriedade da União e ainda na Lei n. 9.636/1998 (arts. 7º a 10), que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União.128 Como relatado, os ocupantes desses imóveis ficam obrigados ao pagamento anual de taxa de ocupação, que será calculada sobre o valor do domínio pleno do terreno, sendo anualmente atualizada pela SPU. Essa taxa será de 2% (dois por 125 Art. 105. Tem preferência ao aforamento: 4º. os ocupantes inscritos até o ano de 1940, e que estejam quites com o pagamento das devidas taxas, quanto aos terrenos de marinha e seus acrescidos. 126 Art. 132. A União poderá, em qualquer tempo que necessitar do terreno, imitir-se na posse do mesmo, promovendo sumariamente a sua desocupação, observados os prazos fixados no § 3º, do art. 89. § 1º As benfeitorias existentes no terreno somente serão indenizadas, pela importância arbitrada pelo S.P.U., se por êste fôr julgada de boa fé a ocupação. § 2º Do julgamento proferido na forma do parágrafo anterior, cabe recurso para o C.T.U., no prazo de 30 (trinta) dias da ciência dada ao ocupante. § 3º O preço das benfeitorias será depositado em Juizo pelo S.P.U., desde que a parte interessada não se proponha a recebê-lo. 127 SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, p. 5-18, abr. 2002. p. 13. 128 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 943. 43 cento) para as ocupações inscritas até 30 de setembro de 1988, e de 5% (cinco por cento) para as ocupações requeridas a partir de 1° de outubro de 1988, conforme art. 1º do Decreto-lei n. 2.398/1987.129 (sem grifo no original) A taxa de ocupação não tem natureza tributária, trata-se de taxa que se converte em receita patrimonial em virtude da utilização do bem, conforme art. 39, § 2° da Lei n. 4.320/1964. 130 Segundo Silva apud Niebuhr o regime de ocupação, é opção mais vantajosa à União, visto que as taxas de ocupação são bens mais rentáveis que os foros.131 De acordo com a explanação pode-se verificar que a ocupação, apesar de propiciar a utilização dos imóveis da União e arrecadação ao Estado, não oferece a mesma segurança jurídica do aforamento. Porém estabelece um vínculo legal entre a União e terceiros que ocupam seus terrenos. 129 BRASIL. Decreto-lei n. 2.398, de 21 de dezembro de 1987. Dispõe sobre foros, laudêmios e taxas de ocupação relativas a imóveis de propriedade da União, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/1965-1988/Del2398.htm>. Acesso em: 15 jul. 2010. 130 MICHELOTI, Marcelo Adriano. Taxa de ocupação de terrenos de marinha. Revista Cej Conselho da Justiça Federal, Brasília, v.14, n. 48, p. 71-76, jan./mar.2010. p. 72. 131 SILVA, João Alfredo Raymundo e apud NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 754. 44 2 IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO – IPTU O art. 3º do Código Tributário Nacional, Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, define tributo como “[...] toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”.132 O referido diploma legal, em seu art. 16, determina que imposto é uma espécie de tributo, cuja obrigação tem como fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica. Isso significa que o pagamento do imposto não está vinculado a uma contraprestação do Estado em relação ao contribuinte. O fato que gera a obrigação de pagar o imposto tem relação com o patrimônio do contribuinte.133 Sobre o conceito de imposto discorre Amaro: [...] além de atenderem aos requisitos genéricos integrantes do conceito de tributo, apresentam as seguintes características: a) são instituídos mediante a previsão legal de fatos típicos [...] que, uma vez ocorridos, dão nascimento à obrigação tributária; b) não se relacionam a nenhuma atuação estatal divisível e referível ao sujeito passivo; c) não se afetam a determinado aparelhamento estatal ou paraestatal, nem entidades privadas que persigam fins reputados de interesse público.134 O IPTU, imposto objeto do presente estudo, foi criado no Brasil no ano de 1808, através do Alvará de 27 de junho de 1808, recebendo a denominação de “imposto da décima dos prédios urbanos”135. Teve sua regulação estabelecida pelo Alvará de 13 de maio de 1809. Nessa época a competência para a cobrança era do governo central. Após alguns anos essa competência foi repassada às províncias, através da Lei imperial n. 58, de 08 de outubro de 1833.136 132 BRASIL. Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm>. Acesso em: 15 jul. 2010. 133 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 318-319. 134 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 81. 135 BRASIL. Alvará de 27 de Junho de 1808. Cria o imposto da décima dos prédios urbanos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_32/alvara_imposto.htm>. Acesso em: 17 jul. 2010. 136 BRASIL. Lei n. 58, de 8 de outubro de 1833. Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=83241>. Acesso em: 17 jul. 2010. 45 Atualmente encontra previsão nos arts. 32 e seguintes do CTN.137 Segundo o comando legislativo, esse imposto é de competência dos Municípios e incidirá sobre a propriedade predial e territorial urbana, tendo como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel, desde que, localizado na zona urbana do Município. Sobre os aspectos desse imposto leciona Martins: [...] sua característica é atingir a patrimonialidade. É um imposto que incide, de forma redutora sobre o patrimônio. [...] o IPTU, estatisticamente, incide sobre um bem [...]. O contribuinte paga tributo, não sobre o que ganhou ou adquiriu, mas sobre um bem que já possui.138 O IPTU encontra respaldo também na CRFB/1988, que em seu art. 156, I, definindo-o como imposto de competência dos Municípios que incidirá sobre a propriedade predial e territorial urbana. No decorrer desse capítulo serão tecidos comentários e explanações acerca das características basilares desse imposto. 2.1 COMPETÊNCIA Competência é a capacidade atribuída às pessoas políticas, também chamadas pessoas jurídicas de Direito Público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios)139 de criar normas jurídicas. É a chamada competência legislativa.140 Como originária dessa competência tem-se a competência tributária, considerada a capacidade atribuída às pessoas jurídicas de Direito Público, de criar normas jurídicas relativas a tributos.141 Ou ainda, a capacidade de criar tributos.142 e BARRETO, Aires F. IPTU. In: MARTINS. Ives Gandra da Silva. Comentários ao código tributário nacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. p. 224-225. 137 Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município 138 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 1990. v. 6. tomo I. p. 527. 139 Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos. 140 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 235. 46 A competência tributária atribuída às pessoas jurídicas de Direito Público encontra previsão nos art. 145143 e 153144 a 156145, da CRFB/1988, conferindo capacidade tributária a todos os entes federados.146 De acordo com o art. 6º, do CTN, a competência tributária, atribuída pela CRFB/1988, compreende a competência legislativa plena. Porém encontra algumas limitações contidas no próprio texto constitucional, nas Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios.147 Três são as modalidades de competência (I) privativa: competência exclusiva atribuída a determinado ente; (II) residual: atribuída à União para instituir tributos sobre situações não previstas como competência de outros entes e (III) comum: competência atribuída a todos os entes políticos.148 (sem grifo no original) A respeito da limitação de competência ensina Machado: Vigora em nosso sistema tributário o regime das competências privativas. Tanto para os impostos como para os demais tributos. [...] A atribuição de competência para instituir impostos constitui uma forma de limitação do poder de tributar, na medida em que, ao determinar quais são os impostos que podem ser criados pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, a Constituição delimita o campo fático que pode servir de suporte a esses impostos. Define o que denominamos a âmbito constitucional de cada imposto.149 A CRFB/1988, em seu arts. 153 a 156, define as competências da seguinte forma: a) cabe a União instituir impostos sobre: (I) importação de produtos estrangeiros; (II) exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados; (III) renda e proventos de qualquer natureza; (IV) produtos 141 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 233. 142 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 93. 143 Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos. 144 Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre. 145 Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre. Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre. 146 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 66. 147 Art. 6º. A atribuição constitucional de competência tributária compreende a competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, e observado o disposto nesta Lei. 148 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 95. 149 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 313. 47 industrializados; (V) operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; (VI) propriedade territorial rural; (VII) grandes fortunas; (VIII) mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados na CRFB/1988; (IX) na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária; (X) empréstimos compulsórios, contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas. b) cabe aos Estados e Distrito Federal instituir impostos sobre: (I) transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; (II) operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação; (III) propriedade de veículos automotores. c) cabe aos Municípios instituir impostos sobre: (I) propriedade predial e territorial urbana; (II) transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; (III) serviços de qualquer natureza, não compreendidos os de competência dos Estados, definidos em lei complementar. Aos Municípios também é atribuída competência de instituir impostos e, de acordo com o art. 156, I da CRFB/1988, a esses entes é atribuída a possibilidade de instituir imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana.150 Essa determinação de competência encontra respaldo também no art. 32, do CTN “O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana [...]”. A competência para instituir esse imposto, nem sempre pertenceu aos Municípios. A Constituição de 1891 definia, em seu art. 9º, item 2º, que era de competência exclusiva dos Estados fixarem impostos sobre imóveis rurais e urbanos. Já a Constituição de 1934, através do art. 13, § 2º, II, transferiu essa competência aos Municípios, e considerava esse imposto como dois impostos diferentes – imposto predial e imposto territorial urbano. A Constituição de 1937 150 Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana. 48 manteve essa competência em seu art. 24, II, e atribuiu aos Estados a competência de instituir impostos sobre propriedade territorial, exceto a urbana (art. 23, I, “a”) e, ainda manteve a separação entre impostos, como na anterior. Com a Constituição de 1946, a competência dos Municípios foi mantida, de acordo com o art. 29, I, ocorrendo uma espécie de unificação desses impostos – imposto predial e territorial urbano.151 Essa competência foi mantida no texto Constitucional de 1967, em seu art. 152 25, I e se aplica atualmente, de acordo com a atual Constituição, conforme art. 156, I. Partindo-se da competência atribuída aos Municípios, passa-se a detalhar acerca dos aspectos que envolvem esse imposto, quais sejam, hipótese de incidência, fato gerador, base de cálculo, entre outros. 2.2 HIPÓTESES DE INCIDÊNCIA E FATO GERADOR Os termos hipótese de incidência e fato gerador ou “fato imponível”, apesar de serem utilizados como sinônimos por muitos doutrinadores, apresentam conceitos e características específicas. O primeiro caracteriza-se pela descrição legal de um fato, a hipótese em que um tributo é devido. Enquanto o segundo é fato consumado. O tributo só passa a ser devido quando ocorre o fato gerador, concretizando-se a hipótese de incidência.153 A diferença existente entre essas figuras jurídicas fica evidente nos ensinamentos de Sabbag: A hipótese de incidência tributária representa o momento abstrato, previsto em lei, hábil a deflagrar a relação jurídico-tributária. Caracteriza-se pela abstração, que se opõe à concretude fática, definindo-se pela escolha, feita pelo legislador, de fatos quaisquer, no mundo fenomênico, propensos à ensejar o nascimento do episódio jurídico-tributário. 151 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 407. 152 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao67.htm>. Acesso em: 17 jul. 2010. 153 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 156 -158. 49 O fato gerador ou “fato imponível”, nas palavras de Geraldo Ataliba é a materialização da hipótese de incidência, representando o momento concreto de realização da hipótese, que se opõe à abstração do paradigma legal que o antecede. Caracteriza-se pela concretização da hipótese que, na prática, traduz-se no conceito de “fato”. Dessa forma, com a realização da hipótese de incidência, teremos o fato gerador ou fato jurígeno.154(grifo no original) Para melhor elucidação do assunto segue conceitos de hipótese de incidência e fato gerador, extraídos dos ensinamentos de Paulsen: Hipótese de incidência e fato gerador. Com rigor técnico, pode-se diferenciar a hipótese de incidência, de um lado, do fato gerador, de outro. Aquela, a hipótese de incidência, corresponde à previsão em lei, abstrata, da situação que implica a incidência da norma tributária; este, o fato gerador, é a própria concretização da hipótese de incidência no plano fático. A situação fática, quando correspondente à hipótese de incidência prevista na norma tributária, chama-se fato gerador, pois, ao sofrer a incidência da norma, gera obrigação tributária. A hipótese de incidência constitui o antecedente ou pressuposto da norma tributária impositiva.155 (sem grifo no original) O CTN classifica o fato gerador em duas esferas: fato gerador da obrigação principal, definida como a situação prevista em lei como necessária e suficiente a sua ocorrência (art. 114, do CTN); e fato gerador da obrigação acessória, sendo qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal (art. 115, CTN).156 O fato gerador da obrigação principal compreende o fato gerador do pagamento do tributo (em decorrência da previsão legal) ou de penalidade pecuniária (situação que, se realizada repercute em uma penalidade imposta por lei). E ainda, deveres legais que tenham por objeto pagamento de tributo, e pagamento de penalidades pecuniárias. Já o fato gerador da obrigação acessória caracteriza-se pelas obrigações instrumentais, que tem por objeto a realização de prestações que visem o interesse da arrecadação ou fiscalização de tributos. Elas 154 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 166. 155 PAULSEN, Leandro. Direito tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e jurisprudência. 9. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria dos Advogados: ESMAFE, 2007. p. 881. 156 Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. e Art. 115. Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal. 50 abrangem os demais deveres relativos às normas tributárias, não representando pagamento de multas ou tributos.157 O IPTU tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física localizado na zona urbana do Município, nos ditamos do art. 32, do CTN. Por tratar-se de imposto de competência dos Municípios, o fato gerador desse tributo é mencionado também nos Códigos Tributários Municipais. A título de exemplo, segue recorte dos Códigos Tributários dos Municípios de Florianópolis/SC e Balneário Camboriú/SC: Art. 224 - O imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.158 Art. 80 - O Imposto Predial e Territorial Urbano tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel, por natureza ou por acessão física localizado na zona urbana do Município.159 O IPTU é considerado imposto real, que incide sobre a existência de direitos sobre a propriedade de um imóvel. Para tanto desconsidera questões de cunho pessoal relativas ao contribuinte. Incide sobre o direito real da pessoa e não da coisa.160 Sobre essa característica, leciona Paulsen: “[...] o IPTU é imposto real [...]. Isso porque tem como critério a simples propriedade do imóvel urbano, sem qualquer consideração relativamente à situação pessoal do proprietário”.161 A seguir serão apresentados aspectos referentes à hipótese de incidência e ao fato gerador do IPTU. Como, o aspecto material (núcleo da hipótese de 157 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 256 e PAES, P. R. Tavares. Comentários ao código tributário nacional. 5. ed. rev., atual. e aum. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996. p. 292. 158 FLORIANÓPOLIS. Lei n. 5054/97 e Lei Complementar n. 007/97, de 27 de junho de 2003. Consolidação das leis tributárias do Município de Florianópolis. Disponível em: <http://www.leismunicipais.com.br/cgi-local/form_vig.pl>. Acesso em: 19 jul. 2010. 159 BALNEÁRIO CAMBORIÍU. Lei Ordinária de Balneário Camboriú/SC, n. 223 de 27/08/1973. Institui o novo código tributário de Balneário Camboriú, e revoga a Lei n. 145/70. Disponível em: < http://www.leismunicipais.com.br/cgi-local/form_vig.pl>. Acesso em: 02 nov. 2010. 160 ASSUMPÇÃO, Mário Zelli. Implicações jurídicas do imposto sobre a propriedade territorial urbana: IPTU. São Paulo: Vale do Mogi, 2001. p. 54. 161 PAULSEN, Leandro. Direito tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e jurisprudência. 9. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria dos Advogados: ESMAFE, 2007. p. 389. 51 incidência), temporal (momento da ocorrência do fato gerador), territorial (lugar da ocorrência do fato gerador), pessoal (sujeito passivo e ativo da obrigação tributária) e quantitativo (base de cálculo e alíquota).162 2.3 ASPECTO MATERIAL DA INCIDÊNCIA DO IPTU A norma Constitucional vigente, em seu art. 156, I, define como aspecto material de incidência do IPTU, a propriedade de bem imóvel urbano.163 O CTN, com base no art. 146, III, “a”, da CRFB/1988164, amplia essa incidência, considerando como fato gerador, não só a propriedade, mas também o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.165 O aspecto material do IPTU é ponto que merece destaque pelo fato de apresentar todos os elementos objetivos que configuram a possibilidade de cobrança do referido imposto. E, em virtude dessa complexidade, torna-se necessário verificar cada um de seus elementos – propriedade, posse, domínio útil e bem imóvel.166 2.3.1 Propriedade O CC/2002, em seu art. 1.228, define como proprietário quem tem o direito de usar, gozar e dispor da coisa, e de reavê-la do poder de quem quer que 162 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 167. 163 Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana. 164 Art. 146. Cabe à lei complementar: III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes. 165 ALVES, Anna Emilia Cordelli. Do impostos sobre a propriedade predial e territorial urbana. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães; LACOMBE, Rodrigo Santos Masset. (Coords.). Comentários ao código tributário nacional. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: MP, 2008. p. 286. 166 FORNEROLLI, Luiz Antônio Zanini. IPTU: um estudo sobre sua estrutura jurídica. Jurisprudência Catarinense, Florianópolis, v.32, n.113, p.23-81, out.2006/jan.2007. p. 42. 52 injustamente a possua ou detenha.167 Da análise do conceito de proprietário concluise que propriedade é o direito, atribuído a determinada pessoa de, usar, gozar e dispôs de um bem, e ainda reavê-lo do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.168 Sobre o conceito de propriedade leciona Fulgêncio apud Pereira: “Chama-se de propriedade o direito que tem uma pessoa de tirar diretamente de uma coisa toda a sua utilidade jurídica.”169 Acerca de propriedade nos ensina Martins: O vocábulo “propriedade”, em sentido jurídico, é significativo de poderes inerentes ao domínio. Conforme dispões o art. 1.228 do Código Civil, o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. Assim, o conceito de propriedade só pode ser extraído em razão dos direitos ou poderes que a integram, isto é, os emergentes das faculdades de uso, gozo, disposição das coisas, até os confins fixados para a coexistência do direito de propriedade dos demais indivíduos e das limitações da lei. O imposto predial e territorial urbano grava a propriedade, ou seja, recai sobre o gozo jurídico de uso, fruição e disposição de bem imóvel.170 A propriedade é uma das hipóteses de incidência do IPTU, e sobre essa característica ensina Furlan apud Fornerolli: [...] o Código Civil não traz a definição de propriedade, mas o faz apenas do direito de propriedade. Pois bem, a Constituição Federal determina que o aspecto material da hipótese de incidência do IPTU é a propriedade e, juridicamente, tem-se a definição legal de propriedade como sendo o direito de usar, gozar, dispor e reivindicar de quem injustamente a detenha, isso permite que se conclua que quem detiver alguns desses direitos, acompanhados do animus de ser proprietário, poderá figurar no pólo passivo da obrigação de pagar o aludido imposto.171 A propriedade abrange o domínio útil e a posse do imóvel. O IPTU segue o mesmo entendimento, bastando que o contribuinte detenha a propriedade ou um 167 BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm>. Acesso em: 17 jul. 2010. 168 BADR, Fernanda Matos. IPTU como instrumento da política de desenvolvimento urbano. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Dialética, n.175, p. 75-87, abr.2010. p. 78. 169 FULGÊNCIO apud PEREIRA,Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil – direitos reais: posse, propriedade, direitos reais de fruição, garantia e aquisição. 19. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2006. v. IV. p. 92. 170 BARRETO, Aires F. Imposto predial e territorial urbano – IPTU. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de direito tributário. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 880-881. 171 FURLAN apud FORNEROLLI, Luiz Antônio Zanini. IPTU: um estudo sobre sua estrutura jurídica. Jurisprudência Catarinense, Florianópolis, v.32, n.113, p.23-81, out.2006/jan.2007. p. 45-46. 53 dos direitos inerentes dela para estar sujeito ao pagamento do tributo. Ser proprietário, posseiro ou exercer domínio útil de imóvel urbano acarreta a obrigação tributária.172 O IPTU recai sobre a propriedade em seu aspecto mais característico, o uso e fruição do bem, por esse motivo é que o exercício de um dos direitos provenientes da propriedade é o elemento principal para que o IPTU possa ser exigido.173 2.3.2 Posse De acordo com o art. 1.196, do CC/2002, considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade, quais sejam, uso, gozo ou disposição da coisa.174 A posse evidencia-se através de uma relação de fato entre a pessoa e o bem, tendo essa o exercício pleno ou não da coisa. Caracteriza-se pela utilização econômica do bem, usufruindo como se dono fosse. O possuidor comporta-se como proprietário.175 Loureiro apresenta os elementos que compõe a posse: [...] objetivo, denominado corpus, e o subjetivo, denominado animus. O corpus é o elemento exterior da posse, é o comportamento ostensivo do possuidor imitando o proprietário. É o aspecto visível da posse, que se traduz não só pelo contato material com a coisa, como também pela conduta de dar a ela a sua destinação econômica e social. O animus é o elemento subjetivo da posse. Nada mais é do que manter a conduta exterior semelhante à do proprietário (corpus) de modo proposital, intencional. [...] Os dois elementos são cumulativos e indissociáveis.176 172 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 308. BARRETO, Aires Fernandino; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Manual do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985. p. 71. 174 Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade. 175 FORNEROLLI, Luiz Antônio Zanini. IPTU: um estudo sobre sua estrutura jurídica. Jurisprudência Catarinense, Florianópolis, v.32, n.113, p.23-81, out.2006/jan.2007. p. 27. 176 PELUSO, Cezar (Coord.). Código civil comentado: doutrina e jurisprudência. 3. ed. rev. e atual. Barueri: Manole, 2009. p. 1101. 173 54 O art. 32, do CTN, define a posse como uma das hipóteses de incidência do IPTU. Somando-se ao direito de uso e gozo de bem imóvel, o dever de pagamento do tributo.177 De acordo com entendimento majoritário da doutrina, para que a posse seja considerada tributável é necessário que ela seja exercida com animus domini, de forma a gerar usucapião, ou seja, que o possuidor manifeste o interesse de ser proprietário.178 Caso não preencha esse requisito, o possuidor não é considerado sujeito passivo da obrigação tributária. Esse entendimento é aplicado, aos locatários, comodatários, arrendatários entre outros, não sendo esses considerados contribuintes do IPTU.179 Sobre esse entendimento segue trecho da obra de Ichihara: [...] o possuidor nos termos da lei civil não é a qualquer título, mas aquele que detém a posse com o ânimo de ser proprietário. Estão excluídos, assim, o possuidor do imóvel decorrente de contrato de locação, de comodato, por requisição, etc.180 No mesmo sentido leciona Coelho: [...] não é qualquer posse que deve ser tributada. A posse descrita no CTN como tributável é a de pessoa que se considera proprietária da coisa. Só quando a posse exterioriza a propriedade é possível tomála como núcleo do fato jurígeno criador da obrigação tributária do IPTU.181 Analisado o instituto da posse, passa-se a análise do domínio útil. Considerada outro aspecto material de hipótese de incidência do IPTU. 177 BARRETO, Aires Fernandino; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Manual do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985. p. 228. 178 FURLAN, Valéria C. P. IPTU: Imposto predial e territorial urbano. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 66. 179 BARRETO, Aires Fernandino; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Manual do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985. p. 228. 180 ICHIHARA, Yoshiaki. Iptu - imunidade tributária de imóvel: propriedade do município e cedida em comodato ou por contrato de concessão de uso a entidade privada. Revista Tributária e de Finanças Públicas. São Paulo, RT. v.38, p. 50-58, maio 2001. p. 52. 181 COELHO, Sacha Calmon Navarro apud FORNEROLLI, Luiz Antônio Zanini. IPTU: um estudo sobre sua estrutura jurídica. Jurisprudência Catarinense, Florianópolis, v.32, n.113, p.23-81, out.2006/jan.2007. p. 27. 55 2.3.3 Domínio útil Domínio útil, assim como a propriedade e a posse, é considerado fato gerador do IPTU182 e, conforme conceito apresentado no capítulo anterior, o titular do domínio útil adquire dois atributos da propriedade, o uso e o gozo, podendo retirar do imóvel todas as vantagens, recebendo inclusive, frutos e rendimentos. Tem direito de usufruir o imóvel de modo mais completo possível, podendo, inclusive transmitir e alienar o domínio útil.183 Esse direito é decorrente do contrato de aforamento/enfiteuse que, embora proibido pelo CC/2002, permanece previsto para os terrenos de marinha, desde que observada lei especial (Decreto-lei n. 9.760/1946).184 Sobre o conceito de enfiteuse/aforamento leciona Gomes: A enfiteuse é o direito real limitado que confere a alguém, perpetuamente, os poderes inerentes ao domínio, com a obrigação de pagar ao dono da coisa uma renda anual [...] o senhorio é o titular do domínio iminente ou direto e o foreiro do domínio útil [...].185 Nesse sentido, Pereira esclarece que “[...] o aforamento atribui ao beneficiário situação jurídica análoga à propriedade e em detrimento do dono do imóvel.”186 Em decorrência do aforamento, o foreiro adquire todos dos direitos inerentes ao domínio. O seu direito abrange a possibilidade de transmitir e alienar o seu direito ao domínio útil. É considerado proprietário atípico, e por este motivo, para os fins tributários, está obrigado ao pagamento do IPTU.187 182 Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município. 183 DINIZ, Maria Helena. Direito das coisas. 19. ed. rev., aum. e atual. São Paulo: Saraiva, 2004. v. 4. p. 352 e 359.e SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, p. 5-18, abr. 2002. p. 11. 184 Art. 2.038. Fica proibida a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, subordinando-se as existentes, até sua extinção, às disposições do Código Civil anterior, Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916, e leis posteriores. § 2° A enfiteuse dos terr enos de marinha e acrescidos regula-se por lei especial. 185 GOMES, Orlando. Direitos reais. 18. ed. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 263. 186 PEREIRA, Cáio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direitos reais, posse, propriedade, direitos reais de fruição, garantia e aquisição. 19. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2006. v. IV. p. 258. 187 ALVES, Anna Emilia Cordelli. Do impostos sobre a propriedade predial e territorial urbana. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães; LACOMBE, Rodrigo Santos Masset. (Coords.). Comentários ao código tributário nacional. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: MP, 2008. p. 288. 56 Dessa forma tanto a propriedade, a posse ou o domínio útil são passíveis de tributação do IPTU, desde que, exercidos sobre bens imóveis localizados em zona urbana do Município. A seguir serão apresentadas as características dos outros elementos que configuram o fato gerador do imposto – bem imóvel e zona urbana. 2.3.4 Bem imóvel O CTN determina, em seu art. 32, que o IPTU incidirá sobre a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil. Conforme determina o CC/2002 em seu art. 79188, são bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente. Por natural entende-se o solo e seus agregados (vegetação, árvores, etc.), e por acessão física, tudo o que adere ao imóvel por acessão (por formação de ilhas, por aluvião, por avulsão, por abandono de álveo e por plantações ou construções).189 Os imóveis classificam-se em: por natureza, por acessão física, por acessão intelectual e por disposição em lei. Para fins de incidência de IPTU consideram-se apenas os imóveis por natureza e por acessão física. 190 O IPTU é considerado imposto incidente sobre a propriedade imóvel. Que, por sua vez, abrange o terreno e edificações possivelmente existente sobre ele. Nesse sentido conclui-se que, o IPTU incide sobre a propriedade territorial urbana, haja ou não, construção sobre ela.191 Nesse sentido pode-se concluir que o IPTU é calculado considerando-se o terreno em si e eventuais construções/edificações existentes sobre ele. 188 Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente. SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 312. 190 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 308. 191 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 408. 189 57 2.4 ASPECTO TERRITORIAL – LUGAR DE OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR A legislação tributária, de acordo com o art. 101, do CTN192, terá vigência, no espaço e no tempo, regida pelas disposições legais aplicáveis às normas jurídicas em geral. Segundo o art. 102, do CTN193, a aplicação de uma norma jurídica tributária deverá obedecer aos limites geográficos da pessoa política que a editou, assim a legislação tributária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios vigora, no País, fora dos respectivos territórios, nos limites em que lhe reconheçam extraterritorialidade os convênios de que participem, ou do que disponham esta ou outras leis de normas gerais expedidas pela União. É o chamado princípio da territorialidade da tributação. 194 Sobre esse princípio leciona Carvalho: O poder vinculante de uma lei ensejará os efeitos jurídicos de estilo até os limites geográficos da pessoa política que a editou. [...] A observância eficaz do princípio da territorialidade da tributação é condição determinante do bom funcionamento e da harmonia que o ordenamento planificou.195 A definição do aspecto territorial da hipótese de incidência de uma norma está diretamente ligada ao fato gerador. Qualquer alteração no aspecto territorial ensejará a mudança do mesmo, pois é onde se considera consumado o fato.196 O aspecto territorial da hipótese de incidência de uma norma tributária pode referir-se a um lugar específico, e não apenas em todo um território. É que acontece com o IPTU, que incidirá apenas na zona urbana dos Municípios, apesar de a lei municipal ter validade em todo o âmbito municipal.197 (sem grifo no original) 192 Art. 101. A vigência, no espaço e no tempo, da legislação tributária rege-se pelas disposições legais aplicáveis às normas jurídicas em geral, ressalvado o previsto neste Capítulo. 193 Art. 102. A legislação tributária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios vigora, no País, fora dos respectivos territórios, nos limites em que lhe reconheçam extraterritorialidade os convênios de que participem, ou do que disponham esta ou outras leis de normas gerais expedidas pela União. 194 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 120. 195 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 184-185. 196 DERZI, Misabel de Abreu Machado; COELHO, Sacha Calmon Navarro. Do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. São Paulo: Saraiva, 1982. p. 150. 197 FURLAN, Valéria C. P. IPTU: Imposto predial e territorial urbano. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 46. 58 A questão territorial do IPTU tem sua característica bem definida no art. 32, do CTN onde estabelece que o imposto, de competência dos Municípios, incidirá sobre a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel localizado na zona urbana do Município. O limite territorial do Município e a característica de zona urbana definem o âmbito territorial de alcance do IPTU.198 Sobre o aspecto territorial da hipótese de incidência do IPTU esclarece Barreto: Em se tratando de tributo que grava o conteúdo econômico do direito de propriedade sobre imóveis, e mercê de uma clara delimitação jurisdicional dos Municípios, poder-se-ia afirmar, em princípio, que esse imposto não apresenta problemas no que respeita ao aspecto espacial da hipótese de incidência (territorialidade). [...] essa apuração, no caso do IPTU, é singelíssima, porquanto se trata de tributo que recai sobre coisa (que não muda de local), qual seja, a propriedade imobiliária na zona urbana do território municipal.199 Após esclarecida que a zona urbana municipal é limite territorial da incidência do IPTU, necessária se torna a definição do que vem a ser zona urbana. 2.4.1 Zona urbana O IPTU incidirá sobre imóveis localizados na zona urbana dos Municípios, podendo ainda, através de lei municipal, considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, e sobre elas instituir a cobrança do tributo.200 O Estatuto da Terra, criado pela Lei n. 4.504, de 30 de novembro de 1964, apresenta como critério para a classificação de um imóvel em rural ou urbano, a sua destinação. Conceitua como imóvel rural, todo prédio rústico, de área contínua qualquer que seja a sua localização, o que se destina à exploração extrativa 198 DERZI, Misabel de Abreu Machado; COELHO, Sacha Calmon Navarro. Do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. São Paulo: Saraiva, 1982. p. 151. 199 BARRETO, Aires F. IPTU. In: MARTINS. Ives Gandra da Silva. Comentários ao código tributário nacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. p. 239. 200 Art. 32. § 2º A lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior. 59 agrícola, pecuária ou agro-industrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada (art. 4º, I).201 (sem grifo no original) Segundo esse comando legislativo, para definir se um imóvel é rural ou urbano, basta definir qual sua destinação, desinteressando a sua localização física.202 O CTN adotou como critério de diferenciação a localização do imóvel e sua situação. De acordo com o art. 29, serão considerados rurais, e portando sujeitos a cobrança do ITR, os imóveis localizados fora da zona urbana do Município. E, de acordo com o art. 32, do mesmo código, serão considerados urbanos e, portanto objetos de cobrança do IPTU, os imóveis localizados na zona urbana do Município, definindo ainda os critérios para considerá-lo urbano (art. 32, § 1º e incisos, do CTN).203 A caracterização da zona urbana pelo CTN torna-se compatível com a Lei n. 9.393, de 19 de dezembro de 1996, que dispõe sobre o ITR. Em seu art. 1°, § 2º, determina que será classificado como imóvel rural a área contínua, formada de uma ou mais parcelas de terras, localizada na zona rural do Município.204 O Decreto-lei n. 57 de 18 de novembro de 1966, em seu art. 15, esclarece ainda que o IPTU não alcançará imóvel que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, incidindo assim, sobre o mesmo, o ITR.205 O CTN, em seu art. 32, § 1º determina que a zona urbana deverá ser definida em lei municipal, e deve atender a pelo menos 2 (dois) dos seguintes requisitos: (I) meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; (II) 201 Art. 4º Para os efeitos desta Lei, definem-se: I - "Imóvel Rural", o prédio rústico, de área contínua qualquer que seja a sua localização que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada. BRASIL. Lei n. 4.504, de 30 de novembro de 1964. Dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L4504.htm>. Acesso em: 19 jul. 2010. 202 FURLAN, Valéria C. P. IPTU: Imposto predial e territorial urbano. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 46. 203 FURLAN, Valéria C. P. IPTU: Imposto predial e territorial urbano. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 48. 204 BRASIL. Lei n. 9.393, de 19 de dezembro de 1996. Dispõe sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR, sobre pagamento da dívida representada por Títulos da Dívida Agrária e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9393.htm>. Acesso em: 31 jul. 2010. 205 BRASIL. Decreto-lei n. 57, de 18 de novembro de 1966. Altera dispositivos sobre lançamento e cobrança do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, institui normas sobre arrecadação da Dívida Ativa correspondente, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/Decreto-Lei/Del0057.htm>. Acesso em: 19 jul. 2010. 60 abastecimento de água; (III) sistema de esgotos sanitários; (IV) rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar; (V) escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado. Exigem-se no mínimo dois equipamentos, dos cinco apresentados, para que a área seja considerada urbana, nada impedindo que os Municípios acrescentem mais.206 O Estatuto da Cidade, instituído pela Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001, define como objetos para propiciar a política urbana e permitir o desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, entre outros a oferta de equipamentos urbanos e comunitários (art. 2º, V).207 Barreto, em consonância com as determinações do CTN e o Estatuto da Cidade, assim define zona urbana: [...] são urbanas as áreas dotadas de equipamentos que ensejam ao homem condições de habitação, trabalho, educação, segurança, assistência, circulação, recreação [...]. A separação das áreas não está fundada na situação do imóvel, nem na destinação. Não há zona urbana por situação, nem zona urbana por destinação. Há, isto sim, áreas urbanas e áreas rurais. Nestas, estão ausentes os equipamentos; naquelas, há obras ou serviços, construídos ou mantidos pelo Poder Público. Eis aí o traço distintivo inserto no Código Tributário Nacional [...].208 O mesmo entendimento é confirmado por Fornerolli: [...] o que estabelece a caracterização da zona urbana ou rural é a localização, em face do atendimento de dois dos cinco melhoramentos tecidos pelos incisos do §1º do referido artigo [art. 32, §1º do CTN]. A destinação da área e a sua ocupação não são elementos que demonstram utilidade para a caracterização do imóvel.209 206 BARRETO, Aires F. IPTU. In: MARTINS. Ives Gandra da Silva. Comentários ao código tributário nacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. p. 241. 207 BRASIL. Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/LEIS_2001/L10257.htm>. Acesso em: 19 jul. 2010. 208 BARRETO, Aires F. IPTU. In: MARTINS. Ives Gandra da Silva. Comentários ao código tributário nacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. p. 240-241. 209 FORNEROLLI, Luiz Antônio Zanini. IPTU: um estudo sobre sua estrutura jurídica. Jurisprudência Catarinense, Florianópolis, v.32, n.113, p.23-81, out.2006/jan.2007. p. 29. 61 A definição da zona urbana está sujeita ao atendimento de, no mínimo, dois dos cinco requisitos elencados do art. 32, § 1º do CTN, bem como ao enquadramento do imóvel como urbano, através de lei municipal.210 O CTN, em seu art. 32, § 2º, permite ainda que os Municípios considerem como urbanas as áreas urbanizáveis, in verbis: [...] as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior. Essa possibilidade é uma faculdade atribuída ao Município e não uma obrigatoriedade e, para considerar uma área urbanizável ou de expansão urbana, deverá estar prevista na legislação municipal e inserida em loteamentos aprovados pelos órgãos competentes e que se destine à moradia, indústria ou comércio211, ainda que fora do perímetro urbano.212 Confirmando esse entendimento acrescenta Barreto: [...] trata-se de faculdade “a lei municipal pode” – e não de obrigatoriedade, porque é aos Municípios que compete disciplinas os aspectos urbanísticos da cidade e tudo o mais que se traduza num crescimento ordenado. A estética, o embelezamento da cidade, a disciplina das construções, o zoneamento são matérias de seu peculiar interesse.213 A competência para fixação da área urbana é do ente responsável pela instituição do imposto, logo tal competência é concedida aos Municípios214 que, com o intuito de criar espaços urbanizáveis e loteamentos futuros destinados ao comércio, indústria e habitação, poderão considerar urbanas, áreas fora do perímetro urbano e que não estejam cobertas com os requisitos previstos nos art. 32, § 1º do CTN.215 Sobre essa possibilidade de abrangência de áreas urbanas leciona Paulsen: 210 VERGUEIRO, Guilherme Von Müller Lessa. Do impostos sobre a propriedade territorial rural. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães. LACOMBE, Rodrigo Santos Masset. (Coords.). Comentários ao código tributário nacional. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: MP, 2008. p. 257. 211 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 313. 212 DERZI, Misabel de Abreu Machado; COELHO, Sacha Calmon Navarro. Do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. São Paulo: Saraiva, 1982. p. 152. 213 BARRETO, Aires F. IPTU. In: MARTINS. Ives Gandra da Silva. Comentários ao código tributário nacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. p. 248. 214 DERZI, Misabel de Abreu Machado; COELHO, Sacha Calmon Navarro. Do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. São Paulo: Saraiva, 1982. p. 152. 215 FORNEROLLI, Luiz Antônio Zanini. IPTU: um estudo sobre sua estrutura jurídica. Jurisprudência Catarinense, Florianópolis, v.32, n.113, p.23-81, out.2006/jan.2007. p. 30. 62 [...] podem enquadrar-se (a) as áreas pertencentes a parcelamentos de solo regularizados pela Administração Municipal, mesmo que executados irregularmente; (b) as áreas pertencentes a loteamentos aprovados de conformidade com a legislação; (c) as áreas de conjuntos habitacionais, aprovados e executados nos termos da legislação pertinente; e (d) as áreas com uso ou edificação aprovada de acordo com a legislação urbanística de parcelamento, uso e ocupação do solo e de edificações.216 Fabretti faz uma crítica a essa permissão concedida aos Municípios, alegando que essa concessão permite que, na prática, o poder municipal aumente a sua quota de cobrança do IPTU, sem observar o mínimo de melhoramento possível dessas áreas/loteamentos, bastando que os mesmos sejam aprovados pelos órgãos públicos.217 Dá análise desse aspecto, verifica-se a importância para o Município da delimitação de seu perímetro urbano, não só para definição de sua competência tributária mas, principalmente, para evitar conflitos com a União, visto que as zonas rurais são objeto de competência tributária da mesma.218 2.5 LANÇAMENTO A definição de lançamento está contida no art. 142, do CTN219, e a sua ocorrência faz nascer o crédito tributário, que por sua vez, representa a exigibilidade da obrigação tributária.220 Por obrigação tributária entende-se ser a relação jurídica existente entre o Fisco (sujeito ativo) e o contribuinte (sujeito passivo). O contribuinte pratica um fato 216 MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos: federais, estaduais e municipais. 3. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 262. 217 FABRETTI, Láudio Camargo. Código tributário nacional comentado. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2009. p. 63. 218 PAULSEN, Leandro. Direito tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e jurisprudência. 9. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria dos Advogados: ESMAFE, 2007. p. 694. 219 Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. 220 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 313. 63 (gerador) que faz nascer a obrigação para com o Fisco. O resultado dessa obrigação é o pagamento do tributo.221 A obrigação tributária pode ser classificada como principal e acessória, de acordo com o art. 113, do CTN, in verbis: Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória. § 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente. § 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. § 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária. O crédito tributário decorre dessa obrigação222, porém só de concretiza com o lançamento. A lei define uma situação como hipótese de incidência de um tributo. Com a ocorrência do fato gerador a hipótese de incidência se concretiza, surgindo então a relação jurídica, ou seja, a obrigação tributária. O ente, apenas com a obrigação tributária existente, não pode exigir o pagamento do tributo, devendo determinar o lançamento dessa obrigação, constituindo assim crédito tributário a seu benefício.223 O conceito de crédito tributário é apresentado por Carvalho: “Definimos crédito tributário como o direito subjetivo de que é portador o sujeito ativo de uma obrigação tributária e que lhe permite exigir o objeto prestacional, representado por uma importância em dinheiro”. 224 Machado assim caracteriza crédito tributário: [...] vínculo jurídico, de natureza obrigacional, por força do qual o Estado (sujeito ativo) pode exigir do particular, o contribuinte ou responsável (sujeito passivo), o pagamento do tributo ou da penalidade pecuniária (objeto da relação obrigacional).225 221 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 136. 222 Art. 139. O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta. 223 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 198-199. 224 CARVALHO, Paulo de Barros apud PAULSEN, Leandro. Direito tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e jurisprudência. 9. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria dos Advogados: ESMAFE, 2007. p. 935. 225 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 199. 64 Conforme determina o art. 142, do CTN, a constituição do crédito tributário é de competência da autoridade administrativa, e será realizada através do lançamento.226 O lançamento torna exigível a obrigação tributária, através da constituição do crédito.227 É um procedimento administrativo onde serão identificados o fato gerador da obrigação tributária, o sujeito passivo, a matéria tributável, o cálculo do montante devido (crédito tributário) e a penalidade cabível, quando for o caso.228 (sem grifo no original) O lançamento permite que o sujeito ativo possa efetuar a cobrança do crédito a que tem direito. Primeiramente pela via administrativa e, caso não surta o efeito desejado, poderá realizar a cobrança judicial, através da inscrição do crédito em dívida ativa.229 Cabe frisar que o lançamento é ato declaratório e procedimento administrativo que constitui o crédito tributário, porém apenas declaratório da obrigação.230 Sobre a natureza declaratória do lançamento esclarece Sabbag: É ato documental de cobrança, por meio do qual se declara a obrigação tributária nascida do fato gerador. Deste conceito deflui a natureza declaratória do lançamento, que opera efeitos ex tunc, em abono ao Princípio da Irretroatividade, segundo o qual a lei deve anteceder os fatos gerados aos quais ela se refere.231 A autoridade administrativa deverá, no momento do lançamento, observar a data da ocorrência do fato gerador, bem como a legislação vigente à época do fato, isso porque, de acordo com o art. 143, do CTN232, quando o valor tributário esteja 226 Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. 227 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 213. 228 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 200. 229 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 256 e PAES, P. R. Tavares. Comentários ao código tributário nacional. 5. ed. rev., atual. e aum. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996. p. 342. 230 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 201. 231 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 213. 232 Art. 143. Salvo disposição de lei em contrário, quando o valor tributário esteja expresso em moeda estrangeira, no lançamento far-se-á sua conversão em moeda nacional ao câmbio do dia da ocorrência do fato gerador da obrigação 65 expresso em moeda estrangeira, no lançamento far-se-á sua conversão em moeda nacional ao câmbio do dia da ocorrência do fato gerador da obrigação. E ainda, de acordo com o art. 144233, do mesmo diploma legal, o lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada. No que diz respeito às penalidades aplica-se o mesmo princípio aplicado ao Direito Penal, a retroatividade da lei mais benéfica, de acordo com o art. 106, do CTN.234 Outra característica do lançamento é a notificação, sem ela o lançamento não tem eficácia. Como se confirma neste julgado do STJ: Não se conhece do recurso especial se ausente a demonstração de violação a dispositivo de lei federal, bem como se nenhum paradigma jurisprudencial foi trazido à colação para comprovação do dissídio pretoriano. A multa decorrente de infração fiscal é exigível da empresa em regime de concordata, não se lhe aplicando a regra contida no artigo 23, parágrafo único, inciso III, da Lei de Falências. Orientação jurisprudencial firmada pela Egrégia Primeira Seção do STJ (EREsp nº 111.926-PR, julgado em 24⁄08⁄2.000). A constituição definitiva do crédito tributário ocorre com o lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo. Em se tratando de débito declarado pelo próprio contribuinte e não pago, não tem lugar a homologação formal, sendo o mesmo exigível independentemente de notificação prévia ou instauração de procedimento administrativo. A exigência cumulativa de juros de mora com a multa é prevista pelo artigo 161, caput, do CTN.235 (sem grifo no original) De acordo com o CTN, arts. 147 e seguintes, o lançamento pode ser realizado de três diferentes formas: (a) lançamento misto ou por declaração (art. 147, do CTN)236: esse tipo de lançamento é realizado de forma conjunta entre o Fisco e o contribuinte. É efetuado com base nas declarações prestadas pelo sujeito passivo, que presta as 233 Art. 144. O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada. 234 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 201. 235 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº. 297.885 (2000⁄0144648-7), Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça. Recorrente: Profiplast Industrial S/A. Recorrido: Fazenda Nacional. Relator: Min. Garcia Vieira. Brasília, 03 de abril de 2001. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200001446487&dt_publicacao=11/6/2001>. Acesso em: 19 jul. 2010. 236 Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação. 66 informações necessárias a autoridade administrativa237. Tem-se como exemplo o ITR, o IE e o II.238 (b) lançamento por homologação (art. 150, do CTN)239: nesses casos há uma participação mais ostensiva do contribuinte, que deve antecipar o pagamento do tributo, com posterior homologação pelo Fisco, ou seja, o sujeito ativo conferirá se a arrecadação foi realizada de forma correta. São exemplos: o IR e ICMS.240(c) lançamento de ofício (art. 149, do CTN)241: é realizado pela própria autoridade administrativa de acordo com os dados que possui em seus registros. Por exemplo: o IPTU, o IPVA, taxas e contribuições de melhoria.242 (sem grifo no original) O IPTU tem o lançamento realizado de ofício pelo Fisco e de forma anual, com a notificação do respectivo contribuinte. A administração municipal o realiza com base no cadastro de imóveis que possui.243 A respeito da anualidade do lançamento discorre Barreto: O IPTU exige lançamento anual, por considerar, a lei tributária, que, a cada exercício, ocorre um novo “fato gerador”, dando origem ao surgimento da respectiva obrigação tributária. Em outras palavras, instaurando-se – por força da incidência da lei tributária municipal –, a cada ano, uma outra obrigação tributária, o crédito que lhe corresponde há que ser devidamente formalizado, pelo, lançamento respectivo [...].244 237 JANCZESKI, Célio Armando. Direito processual tributário. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2005. p. 24. 238 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 215. 239 Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa. 240 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 215. e CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 180-181. 241 Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa [...]. 242 JANCZESKI, Célio Armando. Direito processual tributário. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2005. p. 22 e SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 215. 243 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 414. 244 BARRETO, Aires F. IPTU. In: MARTINS. Ives Gandra da Silva. Comentários ao código tributário nacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. p. 260. 67 Sabbag complementa o entendimento esclarecendo que, o elemento temporal do fato gerador do IPTU, é anual, ocorrendo no dia 1º de janeiro de cada ano.245 Após a constatação do fato gerador, qual seja, a propriedade, posse ou domínio útil sobre imóvel localizado na zona urbana do Município. Deverá a administração mensurar, dimensionar e quantificar a matéria tributária, que no caso do IPTU é o valor venal do imóvel246, de acordo com o art. 33, do CTN247. Por valor venal entende-se ser o valor de venda de um bem pelo preço de mercado. Trata-se de um referencial aplicado para cobrança de tributos para bens imóveis.248 2.6 ASPECTO QUANTITATIVO Em relação ao aspecto quantitativo, os impostos classificam-se em fixos e graduados. Os fixos têm valor estabelecido por lei. Os graduados classificam-se em proporcionais, progressivos e regressivos.249 Conforme art. 156, § 1°, I da CRFB/1988 250, o IPTU será progressivo em razão do valor venal do imóvel, sem prejuízo da progressividade no tempo, prevista no art. 182, § 4°, III do texto Constitucional. 251 O aspecto quantitativo é composto por dois elementos, quais sejam, base de cálculo e alíquota. 245 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 313. 246 BARRETO, Aires F. IPTU. In: MARTINS. Ives Gandra da Silva. Comentários ao código tributário nacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. p. 261. 247 Art. 33. A base do cálculo do imposto é o valor venal do imóvel. 248 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro acquaviva. 11. ed. ampl., rev. e atual. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2000. p. 1301. 249 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 407. 250 Art, 156. § 1º Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, o imposto previsto no inciso I poderá: I - ser progressivo em razão do valor do imóvel. 251 MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos: federais, estaduais e municipais. 3. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 271. 68 2.6.1 Base de cálculo O conteúdo econômico do fato gerador de um tributo será atribuído pela sua base de cálculo. Essa precisa estar prevista na legislação que institui o tributo e que define qual é a sua hipótese de incidência. É através da base de cálculo que identificamos a espécie de tributo e imposto. Portanto, podemos considerar que a base de cálculo é elemento essencial para a definição de um tributo, pois é através dela que visualizamos o valor atribuído ao mesmo.252 O art. 33, do CTN, define como base de cálculo do IPTU o valor venal do imóvel, não devendo considerar para tanto o valor dos móveis mantidos em caráter permanente ou temporário, no imóvel, para efeito de sua utilização, exploração, aformoseamento ou comodidade. Dos ensinamentos de Machado retira-se o conceito de valor venal: “[...] é aquele que o bem alcançaria se fosse posto à venda, em condições normais. É o preço pelo qual provavelmente o bem poderá ser vendido.253 O órgão administrativo competente, Prefeitura Municipal, deverá levantar o valor venal do imóvel com o intuito de calcular o imposto. Para tanto deverá considerar as características da área urbana em que o imóvel está localizado, preços correntes e as ofertas do mercado imobiliário, valor de locação, idade do imóvel, entre outros.254 Com o objetivo de facilitar a análise de todos os imóveis, a administração pública vem adotando a chamada “planta de valores”. Documento que estabelece técnicas para avaliação dos imóveis.255 Sobre a utilização desse procedimento comenta Barreto: Ato administrativo infralegal, a planta de valores não afeta a base imponível (legalmente fixada) [...] apenas serve de pressuposto para a incidência de normas jurídicas. Nem, por si só, é a base calculada; 252 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 164. 253 MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional. São Paulo: Atlas, 2003. p. 377. 254 MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos: federais, estaduais e municipais. 3. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 269-270 255 MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional. São Paulo: Atlas, 2003. p. 379. 69 ou seja, não é o resultado concreto da apuração do valor venal, mas um dos elementos necessários à sua avaliação [...].256 De acordo com o art. 97, IV do CTN257, em atendimento ao princípio da legalidade tributária, somente a lei pode estabelecer a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo. Isso não significa que a lei deve expressar o valor venal de cada imóvel, mas apenas que a definição da base de cálculo deverá obedecer a legislação.258 Evidente que o valor venal dos imóveis sofre alterações com o passar dos anos, o que torna necessário a atualização monetária da base de cálculo. Essa atualização de valores não significa a majoração do tributo (art. 97, § 2º do CTN)259, e poderá ser realizada através de Decreto.260 Esse entendimento está pacificado pelo STJ com a edição da Súmula n°. 160, in verbis: “É defeso, ao Município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária”.261 Se, mesmo com a atualização monetária, não for possível atingir o valor venal do imóvel, a majoração só poderá ser realizada através de lei, conforme art. 97, § 1º do CTN.262 Segundo o art. 150, § 1º da CRFB/1988, a alteração da base de cálculo do IPTU é exceção a anterioridade nonagesimal, sendo permitido que se proceda a atualização do valor venal de imóveis até o último dia do ano e tal modificação seja aplicada já no 1º dia de exercício do ano seguinte.263 256 BARRETO, Aires F. IPTU. In: MARTINS. Ives Gandra da Silva. Comentários ao código tributário nacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. p. 253. 257 Art. 97. Somente a lei pode estabelecer: IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65. 258 MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional. São Paulo: Atlas, 2003. p. 378. 259 Art. 97. § 2º Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo. 260 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 314. 261 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula n. 160. É defeso, ao Município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/sumulas/doc.jsp?livre=%40docn&&b=SUMU&p=true&t=&l=10&i=293>. Acesso em: 20 jul. 2010. 262 CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais, análise dos impostos, incentivos à exportação, doutrina, prática e jurisprudência. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 310. 263 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 315. 70 Para concluir a explanação acerca da base de cálculo segue as funções atribuídas à mesma, de acordo com a doutrina de Furlan: [...] dimensionar a materialidade da hipótese de incidência tributária [...] apurar, consequentemente, o montante devido [...] constatar a observância dos princípios da capacidade contributiva e da reserva de competência impositivas [...] confirmar, afirmar ou infirmar a espécie tributária.264 No item que segue, serão apresentadas características da alíquota que, juntamente com a base de cálculo, constitui o aspecto quantitativo do tributo. 2.6.2 Alíquota A alíquota, juntamente com a base de cálculo, é componente da estrutura quantitativa da incidência tributária. Somada à base de cálculo, resulta no valor numérico que deverá ser exigido do sujeito passivo, por conta do nascimento da obrigação tributária. Representa a quantificação, em números, da obrigação, atribuindo a mesma, valor pecuniário.265 De forma percentual, é aplicada sobre a base de cálculo resultando no valor do tributo.266 Machado apresenta o conceito de alíquota: [...] alíquota é a relação existente entre a expressão quantitativa [...] do fato gerador e o valor do tributo correspondente. Entretanto, como na generalidade [...] a expressão quantitativa do tributo é [...] monetária e a relação entre ela e o valor do tributo é indicada em percentagem, costuma-se dizer que a alíquota é o percentual que, aplicado sobre a base de cálculo, nos indica o valor do imposto devido.267 264 FURLAN, Valéria C. P. IPTU: Imposto predial e territorial urbano. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 92. 265 CARVALHO, Paulo de Barros apud PAULSEN, Leandro. Direito tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e jurisprudência. 9. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria dos Advogados: ESMAFE, 2007. p. 371. 266 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 164. 267 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 164. 71 Em relação ao IPTU, a alíquota representa uma fração do valor venal do imóvel. Da multiplicação dessa fração pela base de cálculo resulta o valor devido pelo contribuinte a título de imposto.268 É o chamado quantum debeatur.269 As alíquotas do IPTU devem ser determinadas através de leis municipais, sem que a CRFB/1988 aplique qualquer limitação, devendo ser observado o princípio da capacidade econômica, evitando o confisco do imóvel.270 A CRFB/1988, através das alterações trazidas pela Emenda Constitucional n. 29 de 2000 admite alíquotas progressivas ao IPTU, de acordo com o art. 182, § 4º, II e art. 156, § 1º, I e II, desde que a lei municipal anteveja essa progressividade.271 Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. § 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo. Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: § 1º Sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, o imposto previsto no inciso I poderá I- ser progressivo em razão do valor do imóvel; e II - ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel. Da análise desses artigos constata-se que a progressividade pode estar fundamentada na função social da propriedade, dependendo de indicação do Município, através do Plano Diretor, dos modos de utilização dos imóveis, bem como em uma tentativa de tornar a arrecadação proporcional, fazendo com que os contribuintes com maior capacidade econômica paguem mais pelo imposto.272 268 FORNEROLLI, Luiz Antônio Zanini. IPTU: um estudo sobre sua estrutura jurídica. Jurisprudência Catarinense, Florianópolis, v.32, n.113, p.23-81, out.2006/jan.2007. p. 73. 269 BARRETO, Aires F. IPTU. In: MARTINS. Ives Gandra da Silva. Comentários ao código tributário nacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. p. 257. 270 MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos: federais, estaduais e municipais. 3. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 270. 271 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 315. 272 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 315 -316. 72 Apesar de ambos os artigos apresentarem a função social da propriedade como justificativa para progressividade do IPTU, necessário mencionar que possuem particularidades. A progressividade prevista no art. 182, § 4º, possui limitação temporal, incidindo até que o proprietário promova a utilização adequada do solo urbano. Essa limitação, no entanto não é prevista no art. 156, § 1º, I e II que, por sua vez, possui características definidas.273 Para Sabbag o IPTU possui, em razão da progressividade, função extrafiscal (objetivando estimular o bom uso do solo urbano), bem como função fiscal (arrecadação de recursos financeiros aos Municípios).274 Sobre a capacidade contributiva e função social da propriedade em decorrência da progressividade do IPTU leciona Assumpção: O tributo é progressivo, onde sua onerosidade relativa, ou seja, o peso do valor devido, cresce na medida em que a capacidade contributiva do contribuinte aumenta, implicando que os mais ricos, proporcionalmente, pagam mais que os pobres [...]. [...] o IPTU é de fundamental importância como instrumento de concretização da política urbana do país, devendo ser utilizado para estimular os proprietários, enfiteutas e demais possuidores de imóveis urbanos, a cumprir o estabelecido no plano diretor do Município, fazendo com que se atenda ao princípio da função social da propriedade.275 A questão da progressividade do IPTU é tema de discussão doutrinária e jurisprudencial. Nesse tópico buscou-se esclarecer o que vem a ser base de cálculo e alíquota, evitando ingressar em tema tão complexo, visto não ser este o objetivo da pesquisa. 2.7 ASPECTO PESSOAL - SUJEITO ATIVO E SUJEITO PASSIVO O aspecto pessoal da hipótese de incidência indica quem é o sujeito ativo e o sujeito passivo da obrigação tributária. De acordo com o art. 119, do CTN sujeito 273 BARRETO, Aires F. Imposto predial e territorial urbano – IPTU. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de direito tributário. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 870. 274 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 315- 316. e MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional. São Paulo: Atlas, 2003. p. 357. 275 ASSUMPÇÃO, Mário Zelli. Implicações jurídicas do imposto sobre a propriedade territorial urbana: IPTU. São Paulo: Vale do Mogi, 2001. p. 56 e 60. 73 ativo da obrigação tributária é a pessoa jurídica de direito público, titular da competência para exigir o seu cumprimento. Os sujeitos ativos podem ser divididos em: (a) diretos: entes públicos com competência tributária e (b) indiretos: entes parafiscais responsáveis pela arrecadação e fiscalização.276 (sem grifo no original) Por sujeito passivo da obrigação tributária, entende-se ser a pessoa (física ou jurídica) responsável pelo cumprimento da obrigação, ou seja, pagamento do tributo. Classifica-se em: (a) diretos: é o contribuinte, que tem relação pessoal e direta com o fato gerador (art. 121, parágrafo único, I do CTN), e (b) indireto: é o responsável, terceiro escolhido por lei para cumprir com a obrigação (art. 121, parágrafo único, II do CTN).277 (sem grifo no original) O sujeito passivo recebe ainda uma segunda classificação: sujeito passivo da obrigação principal (art. 121, do CTN), e sujeito passivo da obrigação acessória (art. 122, do CTN). O primeiro está obrigado ao pagamento do tributo ou penalidade pecuniária. Enquanto o segundo está obrigado às prestações que constituam o objeto da obrigação. Se o objeto dessa obrigação caracteriza-se por um fazer ou deixar de fazer, e não por obrigação em dinheiro, o responsável pelo cumprimento dessa obrigação é o sujeito passivo da obrigação acessória.278 (sem grifo no original) O sujeito ativo no IPTU é o Município, em razão da competência atribuída pela a CRFB/1988, em seu art. 156, I, ainda que o texto constitucional apresente exceções, como as descritas no art. 147, da CRFB/1988, in verbis: Competem à União, em Território Federal, os impostos estaduais e, se o Território não for dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais; ao Distrito Federal cabem os impostos municipais.279 O sujeito passivo do referido imposto, nos ditames do art. 34, do CTN, é todo aquele que detém a propriedade de imóvel, seja titular do seu domínio útil, ou possuidor a qualquer título.280(sem grifo no original) 276 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 168. 277 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 169. 278 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 297-298. 279 BARRETO, Aires F. Imposto predial e territorial urbano – IPTU. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de direito tributário. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 894. 280 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 413. 74 Cabe ressaltar que apesar de todas essas possibilidades, nem toda posse caracteriza a tributação do IPTU, conforme ensinamento de Barreto: “A posse prevista no Código Tributário Nacional como tributável é a de pessoa que já é ou pode ser proprietária da coisa”.281 Partindo-se dessa distinção, pode-se considerar sujeito passivo do IPTU (a) o proprietário: pleno, de domínio exclusivo ou na condição de co-proprietário; (b) o titular do domínio útil: enfiteuta/foreiro; (c) o possuidor: desde que detenha posse com a possibilidade do domínio ou aquisição por usucapião;282 (d) o superficiário: pode figurar como contribuinte, pois, de acordo com o art. 1.371, do CC/2002, responde pelos encargos e tributos que incidem sobre o imóvel; (e) o usufrutuário: pois tem direito a posse e uso do imóvel283.284 (sem grifo no original) Não é considerado sujeito passivo: (a) o usuário e o titular do direito de habitação (arts. 1.412 a 1.416 do CC/2002); (b) o locatário, o arrendatário e o comodatário, pois apenas possuem a posse direta do bem, não podendo transferila. O art. 123, do CTN determina que as convenções particulares, contrato de locação, por exemplo, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes. Logo se o locatário não paga o tributo, o Fisco cobrará do proprietário do imóvel;285 e (c) o cessionário do direito de uso, por ser possuidor por relação de direito pessoal. O promitente comprador do imóvel só será considerado contribuinte quando se tratar de promessa irretratável de venda, se as parcelas estiverem quitadas e se encontrar habilitado a lavras à escritura. 286 (sem grifo no original) Constata-se então, que o art. 34, do CTN, que traz a definição de quem pode ser considerado contribuinte do IPTU, abarca algumas exceções. 281 BARRETO, Aires F. Imposto predial e territorial urbano – IPTU. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de direito tributário. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 896. 282 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 311. 283 Art. 1.394. O usufrutuário tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos. 284 MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos: federais, estaduais e municipais. 3. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 264. 285 FABRETTI, Láudio Camargo. Código tributário nacional comentado. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2009. p. 64. 286 MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos: federais, estaduais e municipais. 3. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 264-266. 75 De acordo com o assunto abordado no primeiro e segundo capítulos, dessa pesquisa, passa-se então a apresentação do tema da presente monografia “A incidência de IPTU sobre terrenos de marinha”. 76 3 A INCIDÊNCIA DE IPTU SOBRE TERRENOS DE MARINHA O presente capítulo tem por objetivo verificar a possibilidade ou não da incidência de IPTU sobre os terrenos de marinha, como base nas explanações apresentadas no primeiro e segundo capítulos da pesquisa. Analisar-se-á a possibilidade de incidência do imposto considerando-se as características dos terrenos de marinha, formas de utilização dos mesmos, bem como as implicações a que estão sujeitos terceiros que ocupam ou aforam esses terrenos. Nesse capítulo busca-se verificar se os terrenos de marinha, como bens da União, podem ou não sofrer a incidência do IPTU e, se sim, quem é o responsável pelo recolhimento do imposto. Para tanto, será abordada também, a questão da imunidade tributária recíproca entre os entes federados. Conforme mencionado no primeiro capítulo, os terrenos de marinha são classificados como bens da União287 e, como bens de domínio privado da União são considerados bens dominicais288. Por essa razão fazem parte de seu patrimônio disponível, como determina o art. 99, III do CC/2002.289 A União, como proprietária desses bens, está autorizada a permitir sua utilização por particulares, de acordo com o previsto no art. 64 do Decreto-lei n. 9.760/1946, através de contratos de locação, aforamento ou cessão de uso. Desde que, não estejam sendo utilizados pelo serviço público. Os terrenos de marinha, por serem bens dominicais, também estão sujeitos a esses tipos de concessões. Podendo, inclusive, ser objeto de ocupação, conforme arts. 127 e seguintes do Decreto-lei n. 9.760/1946.290 A Lei n. 9.636/1998 também menciona a possibilidade de celebração de contratos para utilização dos bens imóveis da União, quais sejam, ocupação, aforamento, cessão, permissão de uso, concessão de uso especial para fins de moradia e alienação. 287 Art. 20. São bens da União. VII – os terrenos de marinha e seus acrescidos. FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona costeira e meio ambiente: aspectos jurídicos. Curitiba: Juruá, 2006. p. 177-178. 289 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. .642. 290 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 752. e GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 942 -943. 288 77 As formas de utilização possuem características particulares e provocam efeitos diversos, tanto ao proprietário (União) quanto ao terceiro que utiliza o bem. Optou-se por explanar sobre duas formas de utilização dos terrenos de marinha: aforamento e ocupação, em razão do objeto central do presente estudo. 3.1 DOS EFEITOS DA OCUPAÇÃO EM TERRENOS DE MARINHA A ocupação é uma das formas de utilização dos terrenos de marinha, encontrando previsão legal no Decreto-lei n. 9.760/1946 (arts. 127 a 132), que disciplina o regime de ocupação, Decreto-lei n. 1.561/1977, que dispõe sobre a ocupação de terrenos da União, Decreto-lei n. 2.398/1987, que dispõe sobre foros, laudêmios e taxas de ocupação relativas a imóveis de propriedade da União e ainda na Lei n. 9.636/1998 (arts. 7º a 10), que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União.291 Essa forma de utilização constitui-se em mera tolerância por parte da União, ao permitir que particulares ocupem e utilizem seus imóveis. A utilização é permitida mediante certificados de ocupação, o que propicia aos ocupantes desses imóveis, a utilização dos mesmos enquanto não há interesse por parte da União.292 Os ocupantes, como forma de contraprestação pela utilização do terreno, ficam obrigados ao pagamento anual de taxa de ocupação, que será calculada sobre o valor total do domínio pleno do terreno, sendo anualmente atualizada pela SPU. Essa taxa será de 2% (dois por cento) para as ocupações inscritas até 30 de setembro de 1988, e de 5% (cinco por cento) para as ocupações requeridas a partir de 1° de outubro de 1988. 293 (sem grifo no original) 291 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 943. PASSOS, Stalin. Terras de marinha. 1999. 61 f. Monografia (apresentada ao final do curso de especialização em direito imobiliário) – Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí. p. 32. E NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 753. 293 BRASIL. Decreto-lei n. 2.398, de 21 de dezembro de 1987. Dispõe sobre foros, laudêmios e taxas de ocupação relativas a imóveis de propriedade da União, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/1965-1988/Del2398.htm>, Acesso em: 15 jul. 2010. 292 78 Na ocupação o proprietário permanece com o domínio pleno sobre o bem. Esse tipo de permissão é considerado ato administrativo unilateral e precário.294 (sem grifo no original) A precariedade provém de uma liberalidade da Administração, podendo ser o ato revogado a qualquer tempo, quando sobrevier o interesse público.295 Conforme dispõe o art. 7º, da Lei n. 9.636/1998.296 Sobre a precariedade atribuída à ocupação leciona Silva: A ocupação de imóvel não aforado, em faixa de marinha, não gera direito real [...]. Trata-se de direito equiparável à posse. É que o terreno sob o regime de ocupação está sujeito a um liame jurídico precário, entre o ocupante e a União, sem que esta reconheça direito de propriedade ou qualquer pretensão de domínio pleno [...] ou mesmo domínio útil. Há mero reconhecimento e tolerância, embora haja cobrança de taxa [...].297 O ocupante não atrai para si o direito de propriedade, como prevê o art. 131, do Decreto-lei n. 9.760/1946, in verbis: “A inscrição e o pagamento da taxa de ocupação, não importam, em absoluto, no reconhecimento, pela União, de qualquer direito de propriedade do ocupante sobre o terreno ou ao seu aforamento [...]”. Os imóveis ocupados por particulares podem, a qualquer momento, ser tomados pela União, cabendo aos ocupantes apenas o direito ao recebimento de indenização pelas benfeitorias, de acordo com o previsto no art. 132 e seus parágrafos do Decreto-lei n. 9.760/1946. O valor dessa indenização será arbitrado pelo SPU.298 294 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 754. 295 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33.ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 188. 296 Art. 7°. A inscrição de ocupação, a cargo da Secre taria do Patrimônio da União, é ato administrativo precário, resolúvel a qualquer tempo, que pressupõe o efetivo aproveitamento do terreno pelo ocupante, nos termos do regulamento, outorgada pela administração depois de analisada a conveniência e oportunidade, e gera obrigação de pagamento anual da taxa de ocupação. 297 SILVA, Franciny Beatriz A. de F. Prática de registro de imóveis. 2. ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2010. p. 150. 298 SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis, v. 98, abr. 2002. p. 13. 79 A ocupação é considerada ato administrativo precário e pressupõe efetivo aproveitamento – posse – do terreno de marinha, sem, contudo, transferir ao ocupante qualquer direito inerente à propriedade.299 (sem grifo no original) 3.1.1 Da impossibilidade de usucapião dos Terrenos de Marinha O CC/2002, em seu art. 1.238 elenca, como forma de aquisição de propriedade imóvel, a usucapião, in verbis: Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis. (sem grifo no original) A usucapião prevista no CC/2002 não se aplica aos bens da União. Essa impossibilidade está prevista na CRFB/1988 em seus arts. 183, § 3⁰ e 191, parágrafo único.300 A impossibilidade de usucapião se estende aos terrenos de marinha, independente da natureza de sua utilização, por serem bens dominicais da União, de acordo com o art. 200, do Decreto-lei n. 9.760/1946: “Os bens imóveis da União, seja qual fôr a sua natureza, não são sujeitos a usucapião.” O entendimento está pacificado pelo STF com a edição da Súmula n. 340, in verbis “Desde a vigência do código civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião.”301 Sobre impossibilidade de usucapião dos terrenos de marinha leciona Menezes: Outro efeito jurídico da posse é a usucapião. Esse direito, entretanto, não é aplicável aos terrenos de marinha, por serem 299 MICHELOTI, Marcelo Adriano. Taxa de ocupação de terrenos de marinha. Revista Cej Conselho da Justiça Federal, Brasília, v.14, n.48, p. 71-76, jan./mar.2010. p. 8. 300 Art. 183. § 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. e Art. 191. Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. 301 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula n. 340. Desde a vigência do código civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=340.NUME. NÃO S.FLSV.&base=baseSumulas >. Acesso em: 25 set. 2010. 80 bens públicos e como tal imprescritíveis, por disposição constitucional, embora o titular de uso privativo possa propor ação possessória contra terceiros.302 (sem grifo no original) A jurisprudência confirma o entendimento, conforme ementas extraídas dos julgados do TRF4ª: ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA. TERRENO DE MARINHA. O imóvel, comprovadamente inserido em área denominada como terreno de marinha, nos termos do art. 2° do D ecreto-Lei n° 9.760/46, de domínio da União Federal, conforme preceitua o artigo 20, inciso IV da Constituição Federal, não é passível de ser usucapido (Súmula nº 340 do Supremo Tribunal Federal). Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir. Apelação improvida.303 (sem grifo no original) USUCAPIÃO. IMÓVEL INSERIDO EM ÁREA DE TERRENO DE MARINHA. IMPOSSIBILIDADE. O imóvel, comprovadamente inserido em área denominada como terreno de marinha, nos termos do art. 2° do D ecreto-Lei n° 9.760/46, de domínio da União Federal, conforme preceitua o artigo 20, inciso IV da Constituição Federal, não é passível de ser usucapido.304 (sem grifo no original) Dessa forma, entende-se que os terrenos de marinha, por serem bens públicos não estão sujeitos à aquisição por usucapião. 3.1.2 Da posse para fins de incidência do IPTU A incidência de IPTU sobre a posse levanta uma questão relevante, visto que, para que a posse seja considerada tributável é necessário que ela seja 302 MENEZES, Roberto Santana de. Regime patrimonial dos terrenos de marinha. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 486, 5 nov. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5855>. Acesso em: 25 set. 2010 303 BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região). Apelação Cível n⁰ 2005.72.07.006179-1/SC. Apelante: Jose Walter Burigo e outro. Apelada: União Federal. Relator: Juiz Nicolau Konkel Junior. Porto Alegre, RS, 26 de novembro de 2009. Disponível em: <http://gedpro.trf4.gov.br/visualizarDocumentosInternet.asp?codigoDocumento=3115521>. Acesso em: 25 set. 2010. 304 BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região). Apelação Cível n⁰ 0000692-59.2006.404.7204/SC. Apelante: Antonio Scheffer Silveira. Apelada: União Federal. Relator: Desembargadora Federal Maria Lúcia Luz Leiria. Porto Alegre, RS, 07 de abril de 2010. Disponível em: <http://gedpro.trf4.gov.br/visualizarDocumentosInternet.asp?codigoDocumento=3357185&termosPes quisados=usucapiao|terreno|marinha>. Acesso em: 11 out. 2010. 81 exercida de forma a gerar usucapião, devendo ser exercida com animus domini.305 Na falta desse requisito, o possuidor não é considerado sujeito passivo da obrigação tributária.306 Barreto reafirma o entendimento: “A posse prevista no Código Tributário Nacional como tributável é a de pessoa que já é ou pode ser proprietária da coisa”.307 Partindo-se dessa premissa, pode-se considerar sujeito passivo do IPTU o possuidor que exerça posse com a possibilidade do domínio ou aquisição da propriedade por usucapião.308 A posse somente será passível de tributação quando não originária de precariedade e quando o proprietário for desconhecido ou, quando conhecido, estiver em local incerto e não sabido. Caracterizando assim posse ad usucapionem, e conduzindo ao domínio. Na falta desses requisitos o possuidor não será considerado contribuinte do IPTU. 309 Sobre esse requisito, leciona Sabbag: A sujeição passiva abrange aquele que detém qualquer direito de gozo, relativamente ao bem imóvel, seja pleno ou limitado. Os titulares desse direitos, como sujeitos passivos do IPTU, são [...] possuidor (ad usucapionem) – somente a posse com animus domini, isto é, aquela com a possibilidade de aquisição do domínio ou propriedade pelo usucapião.310 O entendimento de que a posse tributável é aquela passível de usucapião, encontra respaldo tanto na doutrina quanto na jurisprudência majoritárias. [...] o possuidor nos termos a lei civil não é a qualquer título, mas aquele que detém a posse com o ânimo de ser proprietário. Estão excluídos, assim, o possuidor do imóvel decorrente de contrato de locação, de comodato, por requisição, etc.311 305 FURLAN, Valéria C. P. IPTU: Imposto predial e territorial urbano. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 66. 306 BARRETO, Aires Fernandino; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Manual do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985. p. 228. 307 BARRETO, Aires F. Imposto predial e territorial urbano – IPTU. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Curso de direito tributário. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 896. 308 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 311. 309 FORNEROLLI, Luiz Antônio Zanini. IPTU: um estudo sobre sua estrutura jurídica. Jurisprudência Catarinense, Florianópolis, v.32, n.113, p.23-81, out.2006/jan.2007. p. 52. 310 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 311. 311 ICHIHARA, Yoshiaki. Iptu - imunidade tributária de imóvel: propriedade do município e cedida em comodato ou por contrato de concessão de uso a entidade privada. Revista Tributária e de Finanças Públicas. São Paulo, RT. v.38, p. 50-58, maio 2001. p. 52. 82 No mesmo sentido leciona Coelho: [...] não é qualquer posse que deve ser tributada. A posse descrita no CTN como tributável é a de pessoa que se considera proprietária da coisa. Só quando a posse exterioriza a propriedade é possível tomála como núcleo do fato jurígeno criador da obrigação tributária do IPTU.312 A jurisprudência adere ao entendimento doutrinário, como de constata dos julgados abaixo, proferidos pela Ministra Denise Arruda e pelo Ministro Herman Benjamin, respectivamente: RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. IPTU. CONCESSÃO DE USO DE BEM DA UNIÃO FEDERAL. IMPOSTO COBRADO DO CONCESSIONÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que o contribuinte do IPTU é o proprietário do imóvel, o titular do domínio útil ou o possuidor por direito real (art. 34 do CTN). Tratando-se de posse fundada em relação de direito pessoal, exercida, portanto, sem 'animus domini', mostra-se descabida a cobrança do imposto. 2. Recurso especial interposto por MEDISE MEDICINA DIAGNÓSTICOS E SERVIÇOS LTDA provido e recurso especial do MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO a que se nega seguimento.313 (sem grifo no original) TRIBUTÁRIO. IPTU. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. CONCESSIONÁRIA DE TERMINAL AEROPORTUÁRIO. POSSUIDOR POR RELAÇÃO DE DIREITO MATERIAL. ART. 34 DO CTN. INVIABILIDADE. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que o cessionário de serviço público aeroportuário, por ser possuidor do bem em virtude de relação de direito pessoal, não é contribuinte do IPTU, porquanto exerce a posse sem animus domini. 2. É inviável atribuir a responsabilidade tributária pelo recolhimento do IPTU à concessionária de terminal aeroportuário pertencente à União, tendo em vista que a concessão delegada pelo Ente Público não lhe transfere os poderes inerentes à propriedade. Precedentes do STJ. 3. Agravo Regimental não provido.314 (sem grifo no original) 312 COELHO, Sacha Calmon Navarro apud FORNEROLLI, Luiz Antônio Zanini. IPTU: um estudo sobre sua estrutura jurídica. Jurisprudência Catarinense, Florianópolis, v.32, n.113, p.23-81, out.2006/jan.2007. p. 27. 313 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n⁰ 1.089.827/ RJ. Recorrente: Medise Medicina Diagnósticos e Serviços Ltda. Recorrida: Município de Rio de Janeiro. Relatora: Ministra Denise Arruda. Brasília, DF, 09 de dezembro de 2009. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/MON?seq=6023310&formato=PDF>. Acesso em: 09 out. 2010. 314 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n⁰ 1.159.449/RJ. Agravante: Município de Rio de Janeiro. Agravada: Jato Aviação Rio Ltda. Relator: Ministro Herman Benjamin. Brasília, DF, 01 de outubro de 2009. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=917343&sReg=200900346811&s Data=20091009&formato=PDF>. Acesso em: 09 out. 2010. 83 Esse entendimento, entretanto, não é absoluto, existindo posicionamento doutrinário contrário ao tema, interpretando de forma diversa o dispositivo no art. 34, do CTN, admitindo que qualquer tipo de posse poderá ser objeto de incidência do IPTU. O posicionamento contrário é defendido por Martins: É de realçar que o CTN não faz qualquer distinção quanto ao título do detentor da posse. Qualquer que seja o título, qualquer que seja a ‘forma legal’ que lhe permita usufruir da posse, torna o detentor, se a lei assim determinar, contribuinte do IPTU.315 Os ocupantes de terrenos de marinha, sujeitos ao regime de ocupação, exercem a posse dos referidos imóveis sem animus domini e de forma precária. A jurisprudência do TRF4ª confirma em seus julgados, a característica de precariedade: AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. TERRENO DE MARINHA E ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. PRECARIEDADE DA POSSE. 1. É cabível reintegração de posse entre possuidor indireto e direto, sendo possível que a demanda fundamente-se na propriedade. 2. Sendo o autor cessionário de título de ocupação, de natureza precária, diante da caracterização do imóvel – terreno de marinha em área de preservação permanente – sujeita-se à requisição do bem, a qualquer tempo, pela União, e ao desfazimento das construções levantadas no local, que, segundo constou da licença, deveriam ser de pequeno porte e de fácil remoção. 3. Não havendo prova das perdas e danos indicadas à inicial, inviável a condenação. A liquidação de sentença não se presta à verificação da ocorrência do prejuízo, mas à sua quantificação. 4. Apelação parcialmente provida.316 (grifo nosso) ADMINISTRATIVO. TERRENO DE MARINHA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL. OCUPAÇÃO. REVOGAÇÃO. LEGITIMIDADE. A ocupação por particular de terreno de marinha é sempre autorizada em caráter precário, por ato sujeito a revogação sempre que o exija o interesse público, aí incluída a necessidade de preservação ambiental. A revogação por interesse público, não tendo caráter sancionatório, não exige processo administrativo contraditório e não viola o princípio 315 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Incidência do iptu sobre bens da união em posse de entidades não imunes. Revista do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, v.19. p. 171-190, jan.2004. p. 179. 316 BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região). Apelação cível nº 2000.04.01.103825-1/SC. Apelante: Gustavo Adolfo Bofill Ambrosio e Outro. Apelada: União Federal. Relatora: Juíza Taís Schilling Ferraz. Porto Alegre, RS, 5 de novembro de 2002. Disponível em: <http://iteor.trf4.gov.br/trf4/volumes2/VOL0044/20030205/ST3/82003/200004011038251A.0798.PDF. Acesso em: 25 set. 2010. 84 do devido processo legal, pois é condição expressa no próprio ato que defere ou admite a ocupação. Precedentes desta Corte. Apelação improvida.317 (grifo nosso) Somadas às características de precariedade e impossibilidade de usucapião, os ocupantes de terrenos de marinha não se classificariam como sujeitos passivos do IPTU, visto que, a forma como utilizam o bem não lhes permite exercer a posse com animus domini. Em razão da discussão doutrinária e jurisprudencial, não resta claro se os ocupantes devem ou não ser considerados sujeitos passivos do IPTU, embora estejam atualmente, obrigados os recolhimento do imposto, bem como ao pagamento da taxa de ocupação. 3.2 DOS EFEITOS DO AFORAMENTO EM TERRENOS DE MARINHA O CTN em seu art. 34, elenca como sujeito passivo do IPTU o titular do domínio útil decorrente do contrato de aforamento. O instituto do aforamento ou enfiteuse foi excluído do ordenamento jurídico pela CRFB/1988, através do art. 49, da ADCT. Tal proibição está expressa no CC/2002, que veda a realização de enfiteuse, determinando que as já existentes, observem a o Código anterior (1916).318 Essa proibição, no entanto, não alcançou os terrenos de marinha. Para esses imóveis, a constituição de aforamento permanece prevista, desde que observado o Decreto-lei n. 9.760/1946, conforme art. 49, § 3º da ADCT.319 De acordo com o art. 678, do Código Civil de 1916, ocorre aforamento quando por ato entre vivos, o proprietário atribui a outrem o domínio útil do imóvel, mediante pagamento de pensão ou foro anual, certo e invariável. Essa 317 BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região). Apelação cível n⁰ 2002.04.01.018602-2/RS. Apelante: Miguel Florentino. Apelada: União Federal. Relator: Juiz Federal Fernando Quadros da Silva. Porto Alegre, RS, 5 de outubro de 2006. Disponível em: <http://gedpro.trf4.gov.br/visualizarDocumentosInternet.asp?numeroProcesso=200204010186022&da taPublicacao=01/11/2006>. Acesso em: 25 set. 2010. 318 Art. 2.038. Fica proibida a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, subordinando-se as existentes, até sua extinção, às disposições do Código Civil anterior, Lei nº. 3.071, de 1º, de janeiro de 1916, e leis posteriores. 319 Art. 49. §3°. A enfiteuse continuará sendo aplicad a aos terrenos de marinha e seus acrescidos, situados na faixa de segurança, a partir da orla marítima. 85 contraprestação é paga, ao proprietário (senhorio direto), pela pessoa que adquire o domínio útil (foreiro/enfiteuta). No aforamento o domínio pleno é dividido em domínio útil e direto.320 O domínio útil do imóvel é transferido ao foreiro, que passa a usá-lo e desfrutá-lo de modo amplo, o que caracteriza o aforamento como o mais amplo dos direitos reais, cabendo ao proprietário apenas alguns direitos inerentes do domínio direto.321 O foreiro exerce poderes muito próximos ao domínio pleno, podendo locar, emprestar ou ceder seu direito sobre o imóvel. Recebe esse direito em caráter perpétuo. E o senhorio direto restringe-se apenas a alguns resquícios da propriedade.322 Sobre essa característica lecionam Geller e Borghezan: [...] enfiteuta [foreiro] é titular do domínio útil, isto é, da parte visível da propriedade, enquanto que o senhorio é titular do domínio de fundo [...] titular da nua-propriedade.323 O Decreto-lei n. 9.760/1946, arts. 99 e seguintes e a Lei n. 9.636/1998, arts. 12 e seguintes, prevêem e regulamentam o aforamento de terras da União, e por consequência dos terrenos de marinha. O aforamento dos terrenos de marinha possibilita o uso da terra por particulares mantendo a propriedade em nome do Poder Público. Nesse tipo de utilização, assim como na enfiteuse particular, ocorre a divisão do domínio em, direto e útil. Sendo o segundo concedido ao particular e o primeiro permanecendo em poder da União.324 E, assim como na enfiteuse prevista no Código Civil de 1916, o aforamento dos terrenos de marinha, também concede ao foreiro o poder de uso, gozo e fruição 320 MENEZES, Roberto Santana de. Regime patrimonial dos terrenos de marinha. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 486, 5 nov. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5855>. Acesso em: 05 jul. 2010. 321 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro: direito das coisas. São Paulo: Saraiva, 2006. v. V. p. 609. e GOMES, Orlando. Direitos reais. 18. ed. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 263. 322 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. v. 5. p. 413. 323 GELLER, Rodolfo Hans; BORGHEZAN, Miguel. Resgate da enfiteuse (aforamento). Jurisprudência Catarinense, Florianópolis, v.83/84. jul. 1998. p. 23-37. p. 27. 324 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. Os aforamentos em terras públicas e a alienação fiduciária em garantia de coisa imóvel: a necessidade de alteração da Lei 9.514/97. Revista de Direito Imobiliário. São Paulo, RT. v.49. jul. 2000. p. 111-123. p. 119. 86 do bem, e a União permanece com o restante da parcela de disposição sobre o mesmo.325 Sobre o aforamento de terrenos de marinha leciona Freitas: [...] a enfiteuse é direito real sobre coisa imóvel alheia e é perpétua. No caso dos terrenos de marinha, por serem bens públicos, no regime de aforamento, o direito real sobre a coisa alheia é constitutivo. Assim, depende de prévia inscrição no Registro de Imóveis.326 A União, como proprietária (senhorio direto) do imóvel aforado, detém o direito de cobrança de taxa anual denominada foro, que corresponde a 0,6% (seis décimos por cento) do valor do respectivo domínio pleno, conforme prevê o art. 101 do Decreto-lei n. 9.760/1946.327 Bem como o direito de preferência quando da alienação do domínio útil, previsto no art. 686, do Código Civil de 1916.328 (sem grifo no original) Nos terrenos de marinha o aforamento se realiza quando a União (senhorio direto) transmite a terceiro (foreiro) o domínio útil do imóvel mediante pagamento de valor anual (foro). Para que essa transmissão ocorra, é preciso atender a alguns requisitos exigidos pela SPU, órgão responsável pela concessão de aforamento dos bens públicos, conforme arts. 99 e seguintes do Decreto-lei n. 9.760/1946.329 No que diz respeito ao IPTU, o entendimento de que o titular do domínio útil (foreiro) é o sujeito passivo da obrigação tributária, é unânime na doutrina e jurisprudência. Conforme se verifica na doutrina de Melo: “O titular do domínio útil (no regime da enfiteuse) ficará obrigado a satisfazer os impostos e os ônus reais que gravam o imóvel [...].”330 (grifo no original) Dos ensinamentos de Barreto retira-se a mesma interpretação: 325 LIMA, Frederico Henrique Viegas de. Os aforamentos em terras públicas e a alienação fiduciária em garantia de coisa imóvel: a necessidade de alteração da Lei 9.514/97. Revista de Direito Imobiliário. São Paulo, RT. v.49. jul. 2000. p. 111-123. p. 119. 326 FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona costeira e meio ambiente: aspectos jurídicos. Curitiba: Juruá, 2006. p. 182. 327 Art. 101 - Os terrenos aforados pela União ficam sujeitos ao foro de 0,6% (seis décimos por cento) do valor do respectivo domínio pleno, que será anualmente atualizado. 328 Art. 686. Sempre que se realizar a transferência do domínio útil, por venda ou dação em pagamento, o senhorio direto, que não usar da opção, terá direito de receber do alienante o laudêmio, que será de 2,5% (dois e meio por cento) sobre o preço da alienação, se outro não se tiver fixado no título de aforamento. 329 SCHAEFER, João José Ramos. A posse em terras de marinha. Jurisprudência Catarinense. Florianópolis v. 98, abr. 2002, p. 12. 330 MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos: federais, estaduais e municipais. 3. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 264. 87 Celebrado o contrato de enfiteuse, embora se trate, dentre os direitos reais, do mais amplo, o enfiteuta não chega a receber todos os poderes de proprietário. Falta-lhe o domínio eminente. Como titular do domínio útil, retira, no entanto, todas as vantagens, bem assim as titularidades que lhe são próprias, tais como o uso, gozo e disposição. Por força desse proveito se o elege contribuinte do imposto.331 (sem grifo no original) O STJ, em decisão proferida pelo Ministro Mauro Campbell Marques, confirma o entendimento doutrinário: TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO POSSUIDOR (PROMITENTE COMPRADOR) E DO PROPRIETÁRIO (PROMITENTE VENDEDOR). 1. Segundo o art. 34 do CTN, consideram-se contribuintes do IPTU o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título. [...] 3. "Ao legislador municipal cabe eleger o sujeito passivo do tributo, contemplando qualquer das situações previstas no CTN. Definindo a lei como contribuinte o proprietário, o titular do domínio útil, ou o possuidor a qualquer título, pode a autoridade administrativa optar por um ou por outro visando a facilitar o procedimento de arrecadação”. [...]332 Conclui-se, portanto que, distante de maiores discussões, o foreiro é considerado sujeito passivo da obrigação tributária e, portanto, contribuinte do IPTU Apresentadas as formas de utilização dos terrenos de marinha e as consequências originárias do aforamento e ocupação. Passa-se a análise a da imunidade tributária recíproca entre os entes federados. 331 BARRETO, Aires F. IPTU. In: MARTINS. Ives Gandra da Silva. Comentários ao código tributário nacional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1. p. 228. 332 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n⁰ 1.111.202/SP. Recorrente: Município de São José dos Campos. Recorrido: Ximango Incorporações Imobiliárias Ltda. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Brasília, DF, 10 de junho de 2009. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=892440&sReg=200900091426&s Data=20090618&formato=PDF>. Acesso em: 10 out. 2010. 88 3.3 DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA ENTRE OS ENTES DA FEDERAÇÃO 3.3.1 Imunidade tributária A CRFB/1988 atribui a cada ente federado – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – competência tributária. Considerada como a capacidade de criar normas jurídicas relativas a tributos.333 Ou ainda a capacidade de criar tributos.334 A competência tributária, atribuída pela atual Constituição a cada um dos entes da federação, confere aos mesmos o poder de instituir tributos que se tornarão exigíveis com a ocorrência de determinado fato e das pessoas vinculadas a tal situação.335 O texto constitucional, no entanto, define situações em que os entes federados estão impossibilitados de cobrar tributos, é a chamada imunidade tributária. O que caracteriza uma limitação da competência tributária, uma dispensa de pagamento de tributo ou ainda a impossibilidade de cobrança do mesmo.336 Assim Machado define imunidade tributária: “O que é imune não pode ser tributado. A imunidade impede que a lei defina como hipótese de incidência tributária aquilo que é imune. É limitação da competência tributária.”337 Sobre o mesmo conceito discorre Amaro: A imunidade tributária é, assim, a qualidade da situação que não pode ser atingida pelo tributo, em razão de norma constitucional, que, à vista de alguma especificidade pessoal ou material dessa situação, deixou-a fora do campo sobre que é autorizada a instituição do tributo.338 333 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 233. 334 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 93. 335 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 150. 336 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 47. 337 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 304. 338 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 151. 89 A questão imunidade tributária encontra respaldo jurídico não só na CRFB/1988, como também no CTN, em seu art. 9°, IV. 339 A imunidades classificamse da seguinte forma: a) imunidade recíproca ou intergovernamental (art. 150, VI, ‘a’ da CRFB/1988 e art. 9°, IV, ‘a’ do CTN): impossibilita que os entes federados instituam impostos sobre patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros, em razão do Princípio do Federalismo340, previsto no art. 60, § 4⁰, I da CRFB/1988.341 b) imunidade dos templos de qualquer culto (art. 150, VI, ‘b’ da CRFB/1988 e art. 9°, IV, ‘b’ do CTN): impede a inst ituição de impostos sobre os templos e cultos. Aplica-se a imunidade não só aos templos, como também a casas paroquiais, casa do Pastor, etc.342 É uma forma de aplicação do Princípio da Liberdade de Crença e Prática Religiosa, previsto no art. 5°, VI, ‘a’ da CRFB/1988. 343 c) imunidade dos partidos políticos, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social (art. 150, VI, ‘c’ da CRFB/1988 e art. 9°, IV, ‘c’ do CTN): im pede a tributação de impostos sobre o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos. d) imunidade dos livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão (art. 150, VI, ‘d’ da CRFB/1988 e art. 9°, IV, ‘d’ do CTN): a imunidade é aplicada desconsiderando a pessoa.344 Esse tipo de imunidade tem, por objetivo, difundir a cultura e facilitar o acesso à informação.345 339 Art. 9º É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: IV - cobrar imposto sobre: a) o patrimônio, a renda ou os serviços uns dos outros; b) templos de qualquer culto; c) o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, observados os requisitos fixados na Seção II deste Capítulo; d) papel destinado exclusivamente à impressão de jornais, periódicos e livros. 340 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 50. 341 Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado. 342 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 52. 343 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 208. 344 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 310. 345 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 57. 90 As imunidades tributárias são normas de preceito constitucional que restringem a competência tributária diante de determinadas situações, pessoas ou bens. A aplicação da imunidade tem por objetivo preservar valores e Princípios constitucionais consagrados, como o Federalismo, Liberdade Religiosa, Liberdade de Expressão e Acesso à Cultura.346 Em que pese haver diversos tipos de imunidades tributárias, optou-se por enfatizar a imunidade tributária recíproca, prevista nos arts. 150, VI, ‘a’ da CRFB/1988 e 9°, IV, ‘a’ do CTN, tendo em vista o ob jeto central do presente estudo e a possibilidade do ente municipal instituir imposto, que é de sua competência, nesse caso o IPTU, sobre um patrimônio de outro ente federado. 3.3.2 Imunidade tributária recíproca Os arts. 150, VI, ‘a’ da CRFB/1988 e 9°, IV, ‘a’ do CTN, vedam a instituição de impostos por partes dos entes federados sobre patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros. É a chamada imunidade tributária recíproca.347 Essa impossibilidade de tributação elencada na atual Constituição foi prevista também em Constituições anteriores. A Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 18 de setembro de 1946, em seu art. 31, V, ‘b’, já proibia que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, lançassem impostos sobre bens, rendas e serviços uns dos outros.348 Posteriormente, a Emenda Constitucional n. 18, de 02 de dezembro de 1965 estabeleceu a mesma imunidade tributária recíproca em seu art. 2°, VI, ‘a’, proibindo a cobrança de imposto sobre bens, rendas e serviços entre os entes da federação.349 Vedação essa repetida pelo CTN, em seu art. 9°, IV , ‘a’. A imunidade 346 FREITAS, Vladimir Passos de (Coord.). Código tributário nacional comentado: doutrina e jurisprudência, artigo por artigo. 2.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 41. 347 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros. 348 BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 18 de setembro de 1946. Brasília, DF: Senado Federal, 1946. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao46.htm>. Acesso em: 02 out. 2010. 349 BRASIL. Constituição (1946). Emenda Constitucional n. 18, de 01 de dezembro de 1965. Brasília, DF: Senado Federal, 1965. Disponível em: 91 foi mantida pela Constituição de 1967, em seu art. 20, III, ‘a’, estendendo-se á atual Constituição. Da doutrina colhem-se os seguintes conceitos de imunidade tributária recíproca: As entidades políticas integrantes da Federação não podem fazer incidir impostos umas sobre as outras. Estão protegidos pela imunidade o patrimônio, a renda e os serviços dessas entidades, e de suas autarquias.350 [...] imunidade recíproca, que exclui a possibilidade de tributação do patrimônio, renda e serviços de cada pessoa política (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) por qualquer uma das demais pessoas políticas (art. 150, VI, a). Cada uma delas não pode exigir tributo que grave o patrimônio, a renda ou os serviços das demais, daí derivando a designação de imunidade recíproca.351 (grifo no original) Para fins de imunidade, serão considerados patrimônio, todos os bens ou coisas atreladas à propriedade pública e integrante do serviço público, sejam móveis ou imóveis, corpóreas ou não. A imunidade abrange todos os bens que integram o patrimônio.352 A imunidade tributária recíproca é decorrente dos Princípios da Isonomia dos entes, do Federalismo do Estado Brasileiro e da Autonomia dos Municípios.353 Por conta disso é também denominada, imunidade ontológica, em razão da inexistência do poder de império entre os entes da federação, impossibilitando a exigência de impostos entre eles.354 (sem grifo no original) Sobre essa característica leciona Costa: A imunidade recíproca é considerada ontológica, posto que, ainda que não estivesse contemplada em norma expressa, defluiria logicamente da aplicação dos princípios federativo e da autonomia municipal, bem como da ausência de capacidade contributiva desses http://www2.camara.gov.br/legin/fed/emecon/1960- 969/emendaconstitucional-18-1-dezembro-1965363966-publicacao-1-pl.html>. Acesso em: 02 out. 2010. 350 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 305. 351 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 153. 352 BALEEIRO, Aliomar apud LENZ, Carlos Eduardo Thompson Flores. A imunidade tributária recíproca. Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Porto Alegre, v.5, p. 147-156, ago.2004. p. 152. 353 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 208. 354 MARTON, Ronaldo Lindimar José. A “imunidade tributária recíproca” e a competência municipal para a instituição do IPTU – a utilização de imóveis da União por particulares. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 69, 01/10/2009 [Internet]. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6617>. Acesso em: 02 out. 2010. 92 entes (art. 145, §1⁰, CF), cujos recursos financeiros destinam-se, exclusivamente, à consecução dos serviços públicos que lhes incumbem prestar.355 Em virtude de ser, a imunidade tributária recíproca, uma forma de atendimento ao Princípio do Federalismo, a regra desse tipo de imunidade está amparada e protegida por cláusula pétrea, vedando-se alterações, inclusive através de emendas constitucionais, conforme determina o art. 60, § 4⁰, I da CRFB/1988.356 Assumpção trata sobre a imunidade recíproca em observância ao federalismo: [...] Imunidade Recíproca [...] veda que cada Órgão Tributante cobre impostos uns dos outros, pois caso isso acontecesse não teríamos um tributo e sim uma troca de recursos pois todos os impostos arrecadados são passados aos próprios Órgãos Tributantes. Temos que nosso sistema Federativo procura sempre manter um equilíbrio entre os entes Federados [...]357 O entendimento de que a imunidade tributária recíproca é decorrente da manutenção do Princípio do Federalismo é pacífico tanto na doutrina como na jurisprudência majoritária. Tornando-se fundamental para a harmonia entre os entes federados e como forma de resguardar a autonomia, e impossibilitar que uma estabeleça ônus tributário a outra. Dessa forma, além de impedir a oneração entre os entes da federação, impede que se transformem em contribuintes uns dos outros.358 Sobre o tema acrescenta Saraiva Filho: “Não há mesmo sentido de um ente da Federação exigir imposto do outro, isto desfalcaria as condições de cada um prestar serviços para a população, de acordo com a sua competência.”359 Do julgado proferido pelo Ministro do STF, Celso de Mello, confirma-se o entendimento: 355 FREITAS, Vladimir Passos de (Coord.). Código tributário nacional comentado: doutrina e jurisprudência, artigo por artigo. 2.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 41. 356 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 307. 357 ASSUMPÇÃO, Mário Zelli. Implicações jurídicas do imposto sobre a propriedade territorial urbana: IPTU. São Paulo: Vale do Mogi, 2001. p. 34. 358 LENZ, Carlos Eduardo Thompson Flores. A imunidade tributária recíproca. Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Porto Alegre, v.5, p. 147-156, ago.2004. p.150. 359 SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. Imunidade tributária recíproca e a ECT. Revista Fórum de Direito Tributário – Rfdt, Belo Horizonte, v.5, n.26, p. 19-54, mar./abr.2007.p. 22. 93 [...] O ALTO SIGNIFICADO POLÍTICO-JURÍDICO DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA, QUE REPRESENTA VERDADEIRA GARANTIA INSTITUCIONAL DE PRESERVAÇÃO DO SISTEMA FEDERATIVO. DOUTRINA. PRECEDENTES DO STF. INAPLICABILIDADE, À INFRAERO, DA REGRA INSCRITA NO ART. 150, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO [...]. Sabemos que a Constituição do Brasil, ao institucionalizar o modelo federal de Estado, perfilhou, a partir das múltiplas tendências já positivadas na experiência constitucional comparada, o sistema do federalismo do equilíbrio, cujas bases repousam na necessária igualdade político-jurídica entre as unidades que compõem o Estado Federal. Desse vínculo isonômico, que parifica as pessoas estatais dotas de capacidade política, deriva, como uma de suas consequências mais expressivas, a vedação – dirigida a cada um dos entes federados – de instituição de impostos sobre o patrimônio, a renda e os serviços uns dos outros, bem assim de suas instrumentalidades administrativas, como esta Suprema Corte vem decidindo a respeito de semelhante questão. A imunidade tributária recíproca – consagrada pelas sucessivas Constituições republicanas brasileiras – representa um fator indispensável à preservação institucional das próprias unidades integrantes do Estado Federal, constituindo, ainda, importante instrumento de manutenção do equilíbrio e da harmonia que devem prevalecer, como valores essenciais que são, no plano das relações político-jurídicas fundadas no pacto da federação.360 (grifo nosso) No mesmo sentido é o julgado do TRF4ª: EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. IMUNIDADE RECÍPROCA. ART. 150, VI, 'A', DA CF/88. INTERPRETAÇÃO AMPLA. GARANTIA DA FEDERAÇÃO. RESPONSABILIDADE DA UNIÃO PELO PAGAMENTO DE ISS POR SERVIÇO PRESTADO POR TERCEIRO. INADMISSIBILIDADE. 1. A imunidade constitui-se em caso de não-incidência constitucionalmente qualificada, ou seja, o legislador constituinte coloca fora de órbita de atuação do legislador ordinário a possibilidade de tributação sobre a área em que se encontra o contribuinte desonerado. Razão pela qual o instituto da imunidade, ao contrário das demais formas desonerativas, reclama interpretação ampla, suficiente a lhe dar eficácia condizente com seu atributo de seara infensa ao rigor fiscal. Ensinamentos da doutrina. 2. A imunidade tributária recíproca consagrada pelas sucessivas Constituições republicanas brasileiras representa um fator indispensável à preservação institucional das próprias unidades integrantes da Federação (Celso de Mello, ADIn 939). 360 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n⁰ 363412/BA. Agravante: Município de Salvador. Agravada: Empresa Brasileira de Infra-Estrutura AeroportuáriaInfraero. Relator: Min. Celso de Mello. Brasília, DF, 07 de agosto de 2007. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(RE$.SCLA. E 363412.NUME.) OU (RE.ACMS. ADJ2 363412.ACMS.)&base=baseAcordaos>. Acesso em: 02 out. 2010. 94 3. Inviável o intuito do Município de, por via transversa, transpor a União para a condição de sujeito passivo de tributo que o Legislador Constituinte determinou expressamente não fosse a mesma sujeita. É defeso aos entes políticos (União, Estados e Municípios), dissimuladamente, criar forma de imposição tributária, ainda que por meio de lei, de forma a colocar no pólo passivo da relação obrigacional tributária entes, que, por disposição constitucional imunizante, estão fora do âmbito da competência impositiva. Precedentes desta Corte.361 (grifo nosso) Na opinião de Machado, apesar da CRFB/1988 mencionar apenas a impossibilidade de cobrança de impostos, em razão do Princípio Federativo, a imunidade tributária recíproca se estende também aos demais tributos. E, qualquer possibilidade de cobrança de tributos entre os entes federados, no que diz respeito ao patrimônio, renda ou serviços é inconstitucional.362 Em sentido contrário leciona Sabbag, para ele a imunidade está adstrita apenas aos impostos. Não havendo a possibilidade de ampliar essa imunidade às taxas ou as contribuições. Defende sua opinião no fato de os impostos atribuírem poder de sujeição de quem tributa sobre quem é tributado, possibilidade essa impossível de ser aplicada em um sistema federativo nacional.363 A imunidade tributária recíproca sobre patrimônio, a renda e os serviços dos entes federados, no entanto, não é absoluta, encontrando exceção na própria CRFB/1988. De acordo com o art. 150, § 3°, as imunidades previ stas no inciso VI, "a", do referido artigo, não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar impostos relativamente ao bem imóvel. 361 BRASIL. Tribunal Regional Federal (4. Região). Apelação Cível n⁰ 2004.71.00.042550-1/RS. Apelante: Município de Porto Alegre. Apelada: União Federal (Fazenda Nacional). Relator: Juiz Marcos Roberto Araujo dos Santos. Porto Alegre, RS, 04 de fevereiro de 2010. Disponível em: <http://gedpro.trf4.gov.br/visualizarDocumentosInternet.asp?codigoDocumento=3276524>. Acesso em: 02 out. 2010. 362 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 307. 363 SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito tributário: elementos do direito. 8. ed. São Paulo: Premier Máxima, 2005. p. 49. 95 Nesse caso, atuando o ente público como particular desvinculado das prerrogativas de direito público, desempenhando atividade econômica monopolizada ou em regime de competição, não há que se falar em imunidade tributária.364 No mesmo sentido, não poderá ser concedida a imunidade quando houver cobrança de tarifa ou preço público, na prestação de serviços mediante concessão ou permissão365, de acordo com o art. 173, da CRFB/1988, in verbis: Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. Em consonância com o art. 173, § 3º da CRFB/1988, leciona Machado: É plenamente justificável a exclusão da imunidade quando o patrimônio, a renda e o serviço estejam ligados a atividade econômica regulada pelas normas aplicadas ás empresas privadas. A imunidade implicaria tratamento privilegiado [...]. Ocorre que também não há imunidade quando haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário. Isto quer dizer que um serviço, mesmo não considerado atividade econômica, não será imune se houver cobrança de contraprestação, ou de preço, ou de tarifa.366 Ainda em relação às exceções trazidas pelo art. 150, § 3° da CRFB/1988 a imunidade tributária recíproca também não se aplica ao promitente comprador, com o intuito de exonerá-lo do pagamento dos tributos relativos ao bem imóvel. A imunidade é atributo pessoal do promitente vendedor, não podendo estendê-la ao promitente comprador.367 Do julgado do STJ colhe-se ensinamento que demonstra o objetivo da imunidade tributária recíproca, e a impossibilidade de aplicá-la nos casos em que haja exploração de atividade econômica: [...] a imunidade tributária recíproca opera como mecanismo de ponderação e calibração do pacto federativo, destinado a assegurar que entes desprovidos de capacidade contributiva vejam diminuída a eficiência na consecução de seus objetivos definidos pelo sistema jurídico. 364 MELO, José Eduardo Soares de; PAULSEN, Leandro. Impostos: federais, estaduais e municipais. 3. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 317. e SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. Imunidade tributária recíproca e a ECT. Revista Fórum de Direito Tributário – Rfdt, Belo Horizonte, v.5, n.26, p. 19-54, mar./abr.2007.p. 29. 365 SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. Imunidade tributária recíproca e a ECT. Revista Fórum de Direito Tributário – Rfdt, Belo Horizonte, v.5, n.26, p. 19-54, mar./abr.2007.p. 29. 366 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 305. 367 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 154. 96 Por outro lado, a imunidade recíproca também é uma clara salvaguarda contra o risco de utilização de tributos como instrumento de pressão econômica entre os membros do pacto federativo. Assim, a imunidade recíproca é uma garantia ou prerrogativa imediata de entidades políticas federativas, e não de particulares que executem, com inequívoco intuito lucrativo, serviços públicos mediante concessão ou delegação, devidamente remunerados. [...] quando a imunidade é invocada pelo particular ela tende a operar em seu próprio benefício, às expensas do poder tributante e sem o benefício correspondente para o ente governamental em cujo nome a imunidade é invocada.368 (grifo nosso) Em decorrência da imunidade tributária recíproca entre os entes federados, a cobrança de IPTU pelos Municípios sobre bens da União, sofre algumas consequências, conforme será demonstrado posteriormente. 3.4 DA AMPLIAÇÃO DO ROL DO ARTIGOS 32 E 34, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL – CTN A CRFB/1988, em seu art. 156, I, atribui aos Municípios a competência de instituir imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. O referido imposto deverá incidir sobre a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física localizado na zona urbana do Município, conforme art. 32, do CTN. Conforme já mencionado o IPTU é considerado imposto real, que incide sobre a existência de direitos sobre a propriedade de um imóvel, para tanto desconsidera questões de cunho pessoal relativas ao contribuinte, incidindo sobre o direito real da pessoa e não da coisa.369 368 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Embargos Declaratórios no Recurso Especial n⁰ 964789/ PR. Embargante: Andréa Bordin Jacob Santos e Outros. Embargado: Município de Curitiba. Relator: Ministro Luiz Fux. Brasília, DF, 09 de março de 2010. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=951123&sReg=200701482379&s Data=20100323&formato=PDF>. Acesso em: 09 out. 2010. 369 ASSUMPÇÃO, Mário Zelli. Implicações jurídicas do imposto sobre a propriedade territorial urbana: IPTU. São Paulo: Vale do Mogi, 2001. p. 54. 97 O texto constitucional define como aspecto material de incidência do imposto predial e territorial urbano a propriedade de bem imóvel urbano.370 O CTN, amplia essa incidência, considerando como fato gerador, não só a propriedade, mas também o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.371 (sem grifo no original) O sujeito passivo do mencionado imposto, nos ditames do art. 34, do CTN, é todo aquele que detém a propriedade de imóvel, titular do seu domínio útil, bem como o possuidor a qualquer título.372 (sem grifo no original) Pela aplicação direta do CTN conclui-se que, para ser considerado sujeito passivo do IPTU, basta que o contribuinte detenha a propriedade ou um dos direitos inerentes dela para estar sujeito ao pagamento do tributo. Ser proprietário, posseiro ou deter o domínio útil de imóvel urbano acarreta a obrigação tributária.373 Ocorre que, a competência para instituir o IPTU atribuída ao Município, por força do art. 156, I da CRFB/1988, limita-se à propriedade predial e territorial urbana. O imposto incidirá sobre a propriedade. Referida determinação já foi aplicada em Constituições anteriores. A Constituição de 1891 atribuía a competência aos Estados (art. 9°, item 2°), com a Constituição de 1934 (art. 13, § 2º, II) tal competência foi transferida aos Municípios. A Constituição de 1937 manteve essa competência (art. 28, II) e atribuiu aos Estados a competência de instituir impostos sobre propriedade territorial, exceto a urbana (art. 23, I, “a”), e ainda manteve a separação entre impostos, como na anterior. Com a Constituição de 1946, a competência dos Municípios foi mantida (art. 29, I), ocorrendo uma espécie de unificação desses impostos – imposto predial e territorial urbano.374 Com a promulgação da Constituição de 1967 (art. 25, I), a redação foi alterada, fazendo constar “Compete aos Municípios decretar impostos sobre: I - 370 Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana. 371 ALVES, Anna Emilia Cordelli. Do impostos sobre a propriedade predial e territorial urbana. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães; LACOMBE, Rodrigo Santos Masset. (Coords.). Comentários ao código tributário nacional. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: MP, 2008. p. 286. 372 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 413. 373 MARTINS, Sérgio Pinto. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 308. 374 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 407. 98 propriedade predial e territorial urbana”. Esse texto foi mantido pela atual Constituição (art. 156, I). Logo o elemento propriedade deve ser observado para a imposição do imposto.375 (sem grifo no original) O CTN, em seus arts. 32 e 34, determina que o IPTU incida sobre a propriedade predial e territorial e tenha como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física. E que serão contribuintes do imposto, o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o possuidor a qualquer título. (sem grifo no original) Embora tenha sido promulgado na vigência da Emenda Constitucional n. 18, de 1965, que estabelecia em seu art. 10 “Compete aos Municípios o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana”. O CTN ampliou o rol previsto nos arts. 25, I da Constituição de 1967 e 156, I da CRFB/1988,”.376 (sem grifo no original) A constitucionalidade ou inconstitucionalidade dos arts. 32 e 34 é questionada em razão da ampliação que se faz da competência tributária atribuída ao Município. Apesar de a CRFB/1988 determinar, em seu art. 146, III que cabe a lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre definição de tributos e de suas espécies, bem como, dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes, questiona-se a recepção desses artigos pela atual Constituição, visto que a mesma nada menciona sobre domínio útil ou posse.377 A atual Constituição permite que lei complementar defina os fatos geradores dos tributos, porém o art. 110, do CTN impede que a lei tributária altere definição, conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela CRFB/1988.378 375 MARTON, Ronaldo Lindimar José. A “imunidade tributária recíproca” e a competência municipal para a instituição do IPTU – a utilização de imóveis da União por particulares. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 69, 01/10/2009 [Internet]. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6617>. Acesso em: 09 out. 2010. 376 BRASIL. Constituição (1946). Emenda Constitucional n. 18, de 01 de dezembro de 1965. Brasília, DF: Senado Federal, 1965. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/legin/fed/emecon/1960-1969/emendaconstitucional-18-1-dezembro1965-363966-publicacao-1-pl.html>. Acesso em: 09 out. 2010. 377 MARTON, Ronaldo Lindimar José. A “imunidade tributária recíproca” e a competência municipal para a instituição do IPTU – a utilização de imóveis da União por particulares. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 69, 01/10/2009 [Internet]. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6617>. Acesso em: 09 out. 2010. 378 Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição 99 Sobre essa ampliação menciona Alves: [...] ao estabelecer a matriz constitucional do IPTU, a Constituição Federal refere-se, única e exclusivamente ao conceito de propriedade que [...] difere-se do conceito estabelecido de domínio útil e posse. [...] poder-se-ia afirmar que, ao ampliar o aspecto material da hipótese de incidência do IPTU, teria perpetrado uma inconstitucionalidade, por ampliar a matriz do imposto posta constitucionalmente e uma ilegalidade, em face do art. 110 do Código.379 Defendendo a inconstitucionalidade do art. 32, do CTN discorre Paulsen: Entendemos que o art. 32 do CTN, no que desborda do conceito de propriedade, é incompatível com o texto constitucional. De fato, notese que é a riqueza revelada pela propriedade que é dada à tributação. Assim, não se pode tributar senão a propriedade e senão quem revele tal riqueza. A titularidade de qualquer outro direito real revela menor riqueza e, o que importa, não foram os demais direitos reais previstos constitucionalmente como ensejadores da instituição de impostos.380 Por sua vez, e em defesa da constitucionalidade dos artigos leciona Machado: [...] a palavra propriedade está empregada na Constituição em sentido rigorosamente jurídico, e mesmo assim não vejo invalidade alguma no dispositivo do Código Tributário Nacional que se refere ao domínio útil e à posse ao descrever o âmbito constitucional do imposto em questão. [...] a propriedade, em sentido jurídico “é direito que a pessoa natural ou jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha”.381 A posse, portanto, é um direito inerente ao de propriedade.382 (grifo no original) O STJ já se manifestou no sentido da constitucionalidade dos arts. 32 e 34 do CTN, conforme decisão do Ministro Luiz Fux: TRIBUTÁRIO. IPTU. PROPRIEDADE. CONCEITO PRESSUPOSTO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. AMPLIAÇÃO DO Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. 379 ALVES, Anna Emilia Cordelli. Do impostos sobre a propriedade predial e territorial urbana. In: PEIXOTO, Marcelo Magalhães; LACOMBE, Rodrigo Santos Masset. (Coords.). Comentários ao código tributário nacional. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: MP, 2008. p. 287. 380 PAULSEN, Leandro. Direito tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e jurisprudência. 9. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria dos Advogados: ESMAFE, 2007. p. 694. 381 DINIZ, Maria Helena apud MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional. São Paulo: Atlas, 2003. p. 359. 382 MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional. São Paulo: Atlas, 2003. p. 359. 100 CONCEITO QUE EXTRAVASA O ÂMBITO DA VIOLAÇÃO DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL PARA INFIRMAR A PRÓPRIA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA CONSTITUCIONAL. ACÓRDÃO CALCADO EM FUNDAMENTO SUBSTANCIALMENTE CONSTITUCIONAL. INCOMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1. O IPTU, na sua configuração constitucional, incide sobre a propriedade predial e territorial urbana, cujo conceito pressuposto pela Carta Magna envolve a faculdade de usar, de gozar e de dispor, sendo a propriedade a revelação de riqueza capaz de ensejar a sujeição do seu titular a esse imposto de competência municipal. 2. Sob esse enfoque, é impositiva a regra do artigo 156, I, da Constituição Federal de 1988, verbis: "Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana;" 3. Outrossim, a Constituição utiliza os conceitos de direito no seu sentido próprio, com que implícita a norma do artigo 110, do CTN, que interdita a alteração da categorização dos institutos. 4. Consectariamente, o conceito pressuposto pela Constituição Federal de propriedade corresponde àquele emprestado pela teoria geral do direito, que não qualifica como propriedade outros direitos reais e pessoais que não ostentam todas as suas faculdades, sob pena de violação ao correlato preceito constitucional. [...] 6. É que a conclusão do acórdão alicerça-se em fundamento constitucional, qual seja, a constitucionalidade da Lei Municipal 3.750/71 e dos arts. 32 e 34, do CTN, bem assim o afastamento da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, "a" da Carta Maior.383 3.5 DA POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE IPTU SOBRE TERRENOS DE MARINHA Diante de tais discussões e da possibilidade de decomposição da propriedade, em seus elementos constitutivos, questiona-se a se é correta a incidência de IPTU sobre imóveis públicos, mais precisamente sobre os terrenos de marinha ocupados, onde o ocupante detém a posse, e aforados, onde o foreiro é detentor do domínio útil. Sem deixar de mencionar a possibilidade de imunidade 383 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n⁰ 772.443/ SP. Recorrente: Rhamo Indústria Comércio e Serviços Ltda. Recorrido: Município de Santos. Relator: Ministro Luiz Fux. Brasília, DF, 21 de agosto de 2007. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=713141&sReg=200501319827&s Data=20070920&formato=PDF> . Acesso em: 11 out. 2010. 101 tributária, ante a aplicação do instituto da imunidade tributária recíproca entre os entes federados.384 Em relação à imunidade tributária recíproca aplicada aos bens imóveis da União, que estão em posse de terceiros, seja como titulares de domínio útil ou ocupantes – possuidores a qualquer título - existem divergências nos egrégios tribunais sobre o assunto. O STF entende que os imóveis de propriedade da União não estão sujeitos ao IPTU, mesmo quando utilizados por terceiros de forma comercial. Como se verifica nas ementas abaixo transcritas: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IPTU. IMÓVEL DE PROPRIEDADE DA UNIÃO. CONTRATO DE CONCESSÃO DE USO. POSSE PRECÁRIA. PÓLO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA. IMUNIDADE RECÍPROCA. ART. 150, VI, "A", DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. IMPOSSIBILIDADE DA TRIBUTAÇÃO. 1. O Supremo Tribunal Federal, em caso análogo ao presente, o RE n. 451.152, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJ de 27.4.07, fixou entendimento no sentido da impossibilidade do detentor da posse precária e desdobrada, decorrente de contrato de concessão de uso, figurar no pólo passivo da obrigação tributária. Precedentes. 2. Impossibilidade de tributação, pela Municipalidade, dos terrenos de propriedade da União, em face da imunidade prevista no art. 150, VI, "a", da Constituição. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.385 (grifo nosso) No mesmo sentido: TRIBUTÁRIO. IPTU. IMÓVEIS QUE COMPÕEM O ACERVO PATRIMONIAL DO PORTO DE SANTOS, INTEGRANTES DO DOMÍNIO DA UNIÃO. Impossibilidade de tributação pela Municipalidade, independentemente de encontrarem-se tais bens ocupados pela empresa delegatária dos serviços portuários, em face da imunidade prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal. Dispositivo, todavia, restrito aos impostos, 384 MARTON, Ronaldo Lindimar José. A “imunidade tributária recíproca” e a competência municipal para a instituição do IPTU – a utilização de imóveis da União por particulares. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 69, 01/10/2009 [Internet]. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6617>. Acesso em: 09 out. 2010. 385 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental em Recurso Extraordinário n⁰ 599417/ RJ. Agravante: Município do Rio de Janeiro. Agravado: Lider Signature S.A. Relator: Ministro Eros Grau. Brasília, DF, 29 de setembro de 2009. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=604736> . Acesso em: 09 out. 2010. 102 não se estendendo às taxas. Recurso parcialmente provido.386(sem grifo no original) Já o STJ entendeu, em alguns casos, que, tratando-se de aforamento a imunidade tributária atribuída à União, não se estende ao terceiro. Mas nos casos em que o seja possuidor sem animus domini, o sujeito passivo do IPTU é o ente público proprietário do imóvel, aplicando-se assim a imunidade tributária recíproca.387 PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. IPTU. ART. 34 DO CTN. CONTRATO DE CONCESSÃO DE USO PARA SOCIEDADE EMPRESÁRIA. IMÓVEL PERTENCENTE À UNIÃO. IMUNIDADE. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 7º DO DECRETO-LEI Nº 271/67. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282 DO STF. 1. O recorrente demonstra mero inconformismo em seu agravo regimental, que não se mostra capaz de alterar os fundamentos da decisão agravada. 2. Não há como, apreciar o mérito da controvérsia com base em dita malversação ao artigo 7º do Decreto-Lei nº 271/67, pois não houve o devido prequestionamento. Incide, no ponto, o óbice da Súmula n. 282 do Supremo Tribunal Federal, por analogia. 3. O concessionário do imóvel público, que detém a posse mediante relação pessoal, sem animus domini não se confunde com o contribuinte do IPTU, qual seja, o proprietário do imóvel, o titular do domínio útil ou o possuidor por direito real (art 34 do CTN). 4. Cabendo à União, cedente-proprietária do bem imóvel, o pagamento do imposto, e tendo ela a imunidade tributária prevista no art. 150, VI, "a", da Constituição Federal, não há a incidência do IPTU sobre o imóvel em questão.388(sem grifo no original) 386 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n⁰ 253394/SP. Recorrente: Companhia Docas do Estado de São Paulo - CODESP. Recorrido: Município de Santos. Relator: Ministro Ilmar Galvão. Brasília, DF, 26 de novembro de 2002. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=258274> . Acesso em: 09 out. 2010. 387 MARTON, Ronaldo Lindimar José. A “imunidade tributária recíproca” e a competência municipal para a instituição do IPTU – a utilização de imóveis da União por particulares. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 69, 01/10/2009 [Internet]. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6617>. Acesso em: 09 out. 2010. 388 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial n⁰ 885.353/ RJ. Agravante: Município do Rio de Janeiro. Agravado: DISBARRA - Distribuidora Barra de Veículos Ltda. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Brasília, DF, 23 de junho de 2009. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=896449&sReg=200600373362&s Data=20090806&formato=PDF>. Acesso em: 09 out. 2010. 103 No mesmo sentido: TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. IPTU. ART. 34 DO CTN. PERMISSÃO DE USO DE IMÓVEL PERTENCENTE AO ESTADO. IMUNIDADE. 1. O permissionário do imóvel público, que detém a posse mediante relação pessoal, sem animus domini não se confunde com o contribuinte do IPTU, qual seja, o proprietário do imóvel, o titular do domínio útil ou o possuidor por direito real (art 34 do CTN). Assim, cabendo ao Estado, proprietário do bem, o pagamento do imposto, e tendo ele a imunidade tributária, não há a incidência do IPTU. Precedentes. 2. Agravo regimental não provido.389(sem grifo no original) TRIBUTÁRIO - IPTU - CONTRIBUINTE: ART. 34 DO CTN – IMÓVEL ENFITÊUTICO. 1. Por força do disposto no art. 34 do CTN, cabe ao detentor do domínio útil, o enfiteuta, o pagamento do IPTU. 2. A imunidade que possa ter o senhorio, detentor do domínio indireto, não se transmite ao enfiteuta. 3. Bem enfitêutico dado pela UNIÃO em aforamento. 4. Recurso especial conhecido e provido.390(sem grifo no original) Os terrenos de marinha, como bens da União, são amparados pela imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI, “a” da CRFB/1988, o que ensejaria, em regra, a impossibilidade de incidência de IPTU sobre os mesmos. Referidos terrenos são utilizados por particulares através de contratos de aforamento, conforme art. 64 do Decreto-lei n. 9.760/1946 e arts. 12 e seguintes da Lei n. 9.636/1998 e, poderão ainda, ser objeto de ocupação, conforme arts. 127 e seguintes do Decreto-lei n. 9.760/1946 e arts. 8º e seguintes da Lei n. 9.636/1998.391 O foreiro de terreno de marinha detém o domínio útil do terreno, o que o classifica como sujeito passivo do IPTU, de acordo com o art. 34, do CTN. Porém, ante a manifestação doutrinária pela inconstitucionalidade do referido artigo o foreiro 389 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial n⁰ 721.095/RJ. Agravante: Município do Rio de Janeiro. Agravado: Petrobrás Distribuidora S/A. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Brasília, DF, 08 de setembro de 2009. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sSeq=910567&sReg=200500150695&s Data=20090924&formato=PDF >. Acesso em: 09 out. 2010. 390 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n⁰ 267.099/BA. Recorrente: Município de Salvador. Recorrido: Companhia das Docas do Estado da Bahia - CODEBA. Relator: Ministra Eliana Calmon. Brasília, DF, 16 de abril de 2002. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/IMG?seq=12691&nreg=200000703001&dt=20020 527&formato=PDF>. Acesso em: 09 de out. 2010. 391 NIEBUHR, Joel de Menezes. Terrenos de marinha: aspectos destacados. Revista Zênite, Curitiba: Zênite. v. 44, p. 747-759, mar.2005. p. 752 e GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 942 – 943. 104 pode ser desconsiderado contribuinte do IPTU, transferindo-se tal obrigação ao proprietário do imóvel, nesse caso a União. O ocupante de terrenos de marinha detém a posse do imóvel, mas sem animus domini, visto ser posse decorrente de ato administrativo precário. Além do mais não poderá adquirir a propriedade por meio de usucapião, pois, como mencionado, os bens da União não são passíveis de aquisição através desse instituto. Portanto, assim como o foreiro, o ocupante pode ser desconsiderado contribuinte do IPTU, sendo a sujeição passiva do proprietário do imóvel, nesse caso a União. De acordo com a explanação acerca da imunidade tributária recíproca aplicada ao patrimônio dos entes da federação, o IPTU não incide sobre o patrimônio público e, como a União é a proprietária dos terrenos de marinha, tem-se por inconstitucional a incidência do IPTU sobre esses imóveis. Apesar de toda discussão doutrinária e jurisprudencial apresentada contatase que, a incidência de IPTU sobre os terrenos de marinha é uma realidade, e a cobrança do imposto é direcionada ao ocupante ou foreiro, dependendo do caso. Como resultado de todas essas divergências, tramitam na Câmara dos Deputados projetos de lei complementar objetivando impossibilitar o Município da instituição de IPTU sobre terrenos de marinha. O Projeto de Lei Complementar n. 116/2007, elaborado pela Deputada Elcione Barbalho tem como objetivo a alteração do CTN, acrescentando o seguinte parágrafo ao art. 32, da referida lei complementar: “§ 3º Excluem-se da incidência deste imposto os imóveis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, ainda que ocupados ou possuídos por particulares”.392 Há ainda o Projeto de Lei Complementar n. 222/2004, de autoria do Deputado Ney Lopes que, assim como o Projeto n. 116/2007, tem por objetivo a alteração do CTN, acrescentando parágrafo ao art. 32, com a seguinte redação: “§ 3º No que se refere aos terrenos de marinha, o fato gerador do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) não abrange os casos de posse e de domínio útil.”393 392 BRASIL. Projeto de Lei Complementar n. 116, de 25 de setembro de 2007. Acrescenta dispositivo à Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, que "Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/507462.pdf>. Acesso em: 10 out. 2010. 105 O Projeto de Lei Complementar n. 116/2007, ainda está em trâmite na Câmara dos Deputados, porém, em 09 de junho de 2010, recebeu parecer contrário do relator da Comissão de Finanças e Tributação, Deputado Pedro Eugênio. O Deputado fundamenta sua rejeição alegando que os ocupantes de terrenos de marinha recebem do Município infra-estrutura de serviços e obras, e não seria plausível que não arquem com o tributo municipal, e acaso o projeto vier a ser aprovado, muitos Municípios perderiam arrecadação, o que resultaria em grandes dificuldades financeiras.394 Além dos dois projetos de lei complementar citados, há ainda o Projeto de Lei n. 676/2007, de autoria do Senador Gerson Camata, que tramita no Senado Federal, objetivando a isenção ao foreiro e ocupante do pagamento de foro e taxa de ocupação. O referido projeto deseja alterar os arts. 101 e 127, do Decreto-lei n. 9.760/1946, fazendo constar a seguinte redação:395 Art. 101. Os terrenos aforados pela União, quando sobre eles não incidir o imposto predial e territorial urbano, ficam sujeitos ao foro de seis décimos por cento do valor do respectivo domínio pleno, que será anualmente atualizado. Art. 127. Os atuais ocupantes de terrenos da União, sem título outorgado por esta, ficam obrigados ao pagamento anual da taxa de ocupação, que será dispensada quando, sobre o imóvel ocupado, incidir o imposto predial e territorial urbano. Esse projeto de lei está em trâmite no Senado Federal e, em 25 de junho de 2009, recebeu parecer favorável à aprovação do relator da Comissão de Assuntos Econômicos, Senador Jefferson Praia. O Senador fundamenta sua aprovação alegando que os foreiros e ocupantes de terrenos de marinha são onerados com o pagamento de foro/taxa de ocupação somado ao pagamento do IPTU, significando elevação nas despesas dessas famílias. Concorda, entretanto que a isenção da taxa de ocupação/foro significa 393 BRASIL. Projeto de Lei Complementar n. 222, de 30 de novembro de 2004. Estabelece norma geral de matéria tributária relativa ao IPTU. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/254814.pdf>. Acesso em: 10 out. 2010. 394 BRASIL. Projeto de Lei Complementar n. 116, de 25 de setembro de 2007. Acrescenta dispositivo à Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, que "Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/779553.pdf>. Acesso em: 11 out. 2010. 395 BRASIL. Projeto de Lei n. 676, de 28 de novembro de 2007. Altera o Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, que dispõe sobre bens imóveis da União e dá outras providências, para isentar o foreiro e ocupante do pagamento de foro e taxa de ocupação no caso que especifica. Disponível em: <http://legis.senado.gov.br/mate-pdf/11902.pdf>. Acesso em: 11 out. 2010. 106 redução na receita da União, porém comparado com o total de receitas desse ente esse valor seria extremamente baixo. Sem contar que as pessoas sujeitas a essa cobrança dúplice são consideradas efetivas proprietárias dos imóveis para a exigência do IPTU, e como meros inquilinos para a exigência dos foros e taxas de ocupação. E, em atenção ao Princípio da Justiça, defende a aprovação do projeto de lei.396 De fato, o número de imóveis localizados em terrenos de marinha é bastante alto, principalmente em cidades de grande extensão litorânea, como é o caso de Florianópolis/SC e Balneário Camboriú/SC. A possibilidade de os ocupantes e foreiros dos terrenos de marinha serem desonerados pelo pagamento de IPTU abarca questões políticas e tributárias, se de um lado há respaldo jurídico para que a cobrança seja considerada ilegal, de outro não é viável para o Município a aprovação de lei que resulte na perda de grande volume de arrecadação, considerando ainda, que as áreas em que esses terrenos estão localizados recebem benfeitorias por parte do ente municipal. 396 BRASIL. Projeto de Lei n. 676, de 28 de novembro de 2007. Altera o Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, que dispõe sobre bens imóveis da União e dá outras providências, para isentar o foreiro e ocupante do pagamento de foro e taxa de ocupação no caso que especifica. Disponível em: < http://legis.senado.gov.br/mate-pdf/60803.pdf>. Acesso em: 11 out. 2010. 107 CONCLUSÃO Terrenos de marinha e acrescidos são aqueles localizados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir a influência das marés, bem como os que contornam as ilhas situadas em zona sob influência das marés, desde que situados a uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha de preamar– média. O ponto demarcatório para determinar e localizar os terrenos de marinha é a chamada linha de preamar-média de 1831. Em virtude da grande dificuldade para fixação dessa linha, a SPU, órgão responsável pela demarcação dos terrenos, vem utilizando uma linha provisória, denominada Linha do Jundu que, diga-se, não possui amparo legislativo. É criação doutrinária e jurisprudencial, que tem sido aceita pelo judiciário, particulares e órgãos públicos. Os terrenos de marinha são considerados bens de domínio privado da União, denominados bens dominicais. O Código Civil de 2002 classifica os bens dominicais como bens de domínio privado do Estado que fazem parte de seu patrimônio disponível. Por essa razão poderão ser utilizados por particulares através de contratos de locação, aforamento ou cessão de uso, desde que, não estejam sendo utilizados pelo serviço público. Podendo, ainda, ser objeto de ocupação. Dentre as formas de utilização permitidas optou-se por explicitar, exclusivamente, àquelas que dizem respeito diretamente à possibilidade e/ou impossibilidade de incidência do IPTU. São elas: aforamento (enfiteuse) e ocupação. O IPTU é imposto de competência dos Municípios e incidirá sobre a propriedade predial e territorial urbana, tendo como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel, desde que, localizado na zona urbana do Município. O sujeito passivo do dito imposto é todo aquele que detém a propriedade de imóvel, titular do seu domínio útil, ou possuidor a qualquer título. De acordo com a pesquisa constatou-se que, para a maioria da doutrina e jurisprudência, são considerados sujeitos passivos do IPTU o proprietário (pleno, de domínio exclusivo ou na condição de co-proprietário); o titular do domínio útil 108 (enfiteuta/foreiro) e o possuidor (desde que detenha posse com a possibilidade do domínio ou aquisição por usucapião). A ocupação, como forma de utilização dos terrenos de marinha, é considerada mera tolerância da União, ao permitir que particulares ocupem e utilizem seus imóveis. No regime de ocupação, não ocorre a divisão de domínios, sendo considerado ato administrativo unilateral e precário, e pressupõe efetivo aproveitamento (posse) do terreno de marinha, sem, contudo, transferir ao ocupante qualquer direito inerente à propriedade. Os bens da União não estão sujeitos à usucapião prevista no Código Civil de 2002. Essa característica se estende aos terrenos de marinha, independente da natureza de sua utilização. A posse somente será passível de tributação pelo IPTU quando não originária de precariedade e quando o proprietário for desconhecido ou, quando conhecido, estiver em local incerto e não sabido, caracterizando posse ad usucapionem, e conduzindo ao domínio. Na falta desses requisitos o possuidor não será caracterizado sujeito passivo do referido imposto. Somadas as características de precariedade, impossibilidade de usucapião dos terrenos de marinha e a necessidade de exercício de posse ad usucapionem para ser considerada tributável, conclui-se que os ocupantes de terrenos de marinha não se classificam como sujeitos passivos do IPTU, embora estejam, atualmente, obrigados os recolhimento do imposto, bem como ao pagamento da taxa de ocupação. O CTN elenca ainda, como sujeito passivo do IPTU, o titular do domínio útil, decorrente do contrato de aforamento, previsto para os terrenos de marinha. Pelos estudos realizados concluiu-se que o titular do domínio útil é o sujeito passivo da obrigação tributária, sendo esse entendimento unânime na doutrina e jurisprudência. Em relação à imunidade tributária recíproca, contatou-se que ela proíbe a instituição de impostos por partes dos entes federados sobre patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros, sendo decorrente do Princípio do Federalismo. Tornandose fundamental para a harmonia entre os entes federados e como forma de resguardar a autonomia, e impossibilitar que um estabeleça ônus tributário a outro. A jurisprudência diverge nesse ponto. O STF entende que os imóveis de propriedade da União não estão sujeitos à incidência do IPTU, mesmo quando 109 utilizados por terceiros. Já o STJ entendeu, em alguns casos, que, tratando-se de aforamento, a imunidade tributária atribuída à União, não se estende ao terceiro. Mas nos casos em que seja possuidor sem animus domini, o sujeito passivo do IPTU é o ente público proprietário do imóvel, e não o particular, aplicando-se assim a imunidade tributária recíproca. Outro ponto que mereceu destaque na pesquisa é a questão da constitucionalidade ou não dos arts. 32 e 34, do CTN. O CTN elenca como fato gerador do IPTU a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel e, que serão contribuintes do imposto, o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título. Ao escolher a propriedade, o domínio útil ou a posse como fato gerador do tributo, o CTN ampliou o aspecto material de hipótese de incidência do IPTU. A Constituição permite que lei complementar defina os fatos geradores dos tributos, porém o art. 110, do CTN impede que a lei tributária altere a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela CRFB/1988. Em relação a constitucionalidade ou não do CTN, não foi possível obter resposta exata ao questionamento, visto que a doutrina diverge no seu entendimento e a jurisprudência do STJ, aqui analisada, é pela constitucionalidade do artigo. Entendemos que, pelo fato do CTN ter sido promulgado na vigência da Emenda Constitucional n. 18, de 1965, que estabelecia competência aos Municípios de instituir imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, ampliou o rol previsto nos art. 25, I da Constituição de 1967, proclamada posteriormente, e no art. 156, I da CRFB/1988, não tendo o amparo constitucional necessário à sua aplicação. Diante de toda explanação as seguintes conclusões são apresentadas. O foreiro de terreno de marinha detém o domínio útil do imóvel o que o classifica como sujeito passivo do IPTU, de acordo com o art. 34, do CTN. Porém, ante a manifestação doutrinária pela inconstitucionalidade do referido artigo, o foreiro não pode ser considerado contribuinte para fins de IPTU, transferindo-se tal obrigação ao proprietário do imóvel, nesse caso a União. O ocupante de terrenos de marinha exerce posse sem animus domini. A posse para ser tributada precisa, necessariamente, ser posse passível de usucapião 110 e que o mesmo manifeste a vontade de ser dono. Diante desse entendimento, o ocupante não pode ser considerado contribuinte para fins de IPTU. Além do que jamais poderá adquirir a propriedade por meio de usucapião, visto que, os bens da União não são atingidos por esse instituto. Portanto, assim como o foreiro, o ocupante não pode ser considerado contribuinte para fins de IPTU, sendo a sujeição passiva do proprietário do imóvel, nesse caso a União. No que diz respeito a imunidade tributária recíproca aplicada ao patrimônio dos entes federados, o IPTU não incide sobre o patrimônio público e, como a União é a proprietária dos terrenos de marinha, entende-se ser inconstitucional a incidência do imposto sobre referidos imóveis. Apesar de toda discussão doutrinária a jurisprudencial os ocupantes e foreiros de terrenos de marinha são anualmente onerados pelos Municípios com a cobrança do imposto. Como resultado de todas essas divergências, tramita na Câmara dos Deputados e Senado Federal projetos de lei objetivando a impossibilidade de o ente municipal instituir IPTU sobre os terrenos de marinha ou de desonerar os contribuintes das taxas de ocupação e foro, quando sobre os imóveis incidir a cobrança do imposto. A possibilidade de os terrenos de marinha serem desonerados pelo pagamento de IPTU abarca questões políticas e tributárias, se de um lado há respaldo jurídico para que a cobrança seja considerada ilegal, de outro não é viável para o Município aprovação de lei que resulte na perde de grande volume de arrecadação, sem deixar de lembrar que as áreas em que esses terrenos estão localizados recebem benfeitorias por parte do ente municipal. O número de imóveis localizados em terrenos de marinha é bastante alto, principalmente em cidades de grande extensão litorânea, como é o caso de Florianópolis/SC e Balneário Camboriú/SC. Não é interessante para o Município e nem para a União aprovação de lei que desonere o contribuinte do pagamento do IPTU, pois nos terrenos de marinha além da arrecadação do IPTU há também o recolhimento da taxa de ocupação ou foro, o que significa recolhimento a benefício dos dois entes. Entendemos que, como forma de aplicação da justiça e sem causar perda de arrecadação para os entes, o IPTU deve ser calculado, para os casos específicos 111 de ocupação e aforamento, não sobre o valor venal do imóvel, mas apenas sobre a área edificada. E, por sua vez, a taxa de ocupação e foro devem ser calculadas, sobre o domínio útil apenas, e não sobre o domínio pleno do imóvel, visto que, nem ocupante e nem foreiro tem direito ao referido domínio pleno. Da forma como são calculados atualmente representam injustiça para com terceiros que utilizam os terrenos de marinha, visto estarem obrigados ao pagamento de taxas e imposto sobre um domínio pleno que, na verdade, não possuem. 112 REFERÊNCIAS ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro acquaviva. 11. ed. ampl., rev. e atual. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2000. ALVES, Anna Emilia Cordelli. Do impostos sobre a propriedade predial e territorial urbana. PEIXOTO, Marcelo Magalhães; LACOMBE, Rodrigo Santos Masset. (Coords.). Comentários ao código tributário nacional. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: MP, 2008. AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. ANTUNES, José Carlos. Terrenos de marinha: formas de utilização. 2003. 46 f. Monografia (apresentada ao final do curso de Gestão Imobiliária) – Universidade do Vale do Itajaí, São José. ASSUMPÇÃO, Mário Zelli. Implicações jurídicas do imposto sobre a propriedade territorial urbana: IPTU. 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