Formacao de professores...escola organizada em ciclos

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FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA O TRABALHO PEDAGÓGICO NA
ESCOLA ORGANIZADA EM CICLOS: UMA TRANSFORMAÇÃO
NECESSÁRIA
Josiane Gonçalves Santos
RESUMO
O presente texto resulta de uma pesquisa de Mestrado, realizada no Programa de PósGraduação, Mestrado em Educação, da Universidade Tuiuti do Paraná, entre 20032005, que discutiu, particularmente, a responsabilidade social da escola pública
municipal de Curitiba a partir da implantação, em 1999, do ensino organizado em
ciclos, compreendendo os ciclos como uma organização do trabalho pedagógico, dos
tempos e espaços escolares, além de caracterizar-se como uma forma mais justa e
respeitosa de se trabalhar com as temporalidades do desenvolvimento humano. No
entanto, é preciso considerar que toda proposta pedagógica, especialmente aquela
resultante de uma nova política educacional, para ter êxito, deve levar em consideração
a formação do profissional da educação, especialmente dos professores. Para tanto, é
necessário possibilitar à todos o domínio teórico sobre o conhecimento das várias áreas
do saber, sobre técnicas e procedimentos metodológicos, além de compreender-se como
ser social, consciente de si mesmo e de compromissos e responsabilidades sociais. São
fatores determinantes no desenvolvimento de um trabalho pedagógico de qualidade, que
requer da escola aprender a lidar com a diversidade, com a heterogeneidade, como as
singularidades de cada sujeito integrante do processo ensino-aprendizagem.
PALAVRAS-CHAVES: ciclos, formação, professores, política educacional.
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FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA O TRABALHO PEDAGÓGICO NA
ESCOLA ORGANIZADA EM CICLOS: UMA TRANSFORMAÇÃO
NECESSÁRIA
REFLEXÕES INICIAIS
O presente texto resulta das reflexões decorrentes da pesquisa de Mestrado
realizada entre 2003-2005 no Programa de Pós-Graduação, Mestrado em Educação, da
Universidade Tuiuti do Paraná, que discutiu, particularmente, a responsabilidade social
da escola pública municipal de Curitiba a partir da implantação, em 1999, do ensino
organizado em ciclos.
Naquele momento histórico, para adentrar ao objeto de investigação,
compreendê-lo e explicitá-lo, elegeu-se a “formação” como uma das categorias de
análise.
Formação compreendida como um processo que envolve o desenvolvimento
contínuo dos indivíduos em todas as suas dimensões. Essa compreensão é oriunda da
concepção de omnilateralidade1, e considera a necessidade de se formar um ser humano
mais justo, ético, democrático e solidário, comprometido com seu próximo e com os
diferentes temas que interferem na qualidade de vida de todos.
É com essa compreensão que se desenvolve este texto, pois, na sociedade
contemporânea, com suas demandas e inovações, mais do que nunca, destaca-se a
importância de se formar professores reflexivos, competentes em sua prática,
responsáveis pelo seu próprio desenvolvimento profissional e capazes de atuar como
protagonistas na implementação de políticas públicas para a educação.
A REALIDADE VIVENCIADA
A sociedade globalizada, e suas características, impõem a necessidade do
ser humano reeducar-se continuamente. São determinações resultantes da ordem
econômica operante, o capitalismo, que influenciam de modo determinante a vida
1
Manacorda (1975) define omnilateralidade a partir de Marx, como “o chegar histórico do homem a
uma totalidade de capacidade e, ao mesmo tempo, a uma totalidade de capacidades de consumo e gozo,
em que deve considerar sobretudo o usufruir dos bens espirituais além dos materiais de que o trabalhador
tem estado excluído em conseqüência da divisão do trabalho.”
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dos indivíduos e suas relações. Nessa realidade, a educação torna-se instrumento
fundamental.
A “formação” não pode estar descontextualizada de uma contínua reflexão,
pois a importância e a qualidade da educação, especialmente a pública, decorrem
diretamente da ação docente dos professores.
Assim, para a efetivação de educação de qualidade, necessário se ter um
educador de qualidade e qualidade exige qualificação. Daí a necessidade do professor
possuir uma excelente formação teórica e uma considerável visão do mundo
globalizado que o cerca, com todas as suas contradições e diversidades culturais.
Formação esta que exige investimento por parte do poder público, das agências
financiadoras e das instituições escolares.
Todavia, existem outros aspectos a serem considerados. Segundo Imbernón
(2005, p. 41),
O tipo de formação inicial que os professores costumam receber não oferece
preparo suficiente para aplicar uma nova metodologia, nem para aplicar
métodos desenvolvidos teoricamente na prática de sala de aula. Além disso,
não se tem a menor informação sobre como desenvolver, implantar e avaliar
processos de mudança.
A implantação de uma nova política pública, de uma proposta de trabalho ou
de um projeto educativo na escola, se efetiva em sala de aula, e podem resultar em
questionamentos e dúvidas. É na sala de aula e por intermédio da competência docente
que se realiza a aprendizagem e desenvolvimento de conhecimentos, atitudes e
habilidades.
Portanto, além das condições físicas e materiais, é preciso garantir espaço
necessário para o estudo e a reflexão compartilhada entre os profissionais, favorecendo
o domínio sólido sobre as diferentes áreas do saber, conhecimento de técnicas e
procedimentos metodológicos, e, fundamentalmente, a compreensão do compromisso
social de sua função.
O professor, enquanto profissional responsável pela mediação entre os
educandos e os conteúdos trabalhados, necessita desenvolver sua capacidade de
autodesenvolvimento, pois a formação não se dá antes da mudança, mas durante.
Esta perspectiva de mudança dá um novo sentido às práticas de formação, pois
a transformação da prática exige o real comprometimento e participação dos
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professores, da mesma forma que para o êxito desse processo torna-se necessária a
transformação da escola em que atuam. São desafios e dificuldades enfrentados pela
instituição e por seus profissionais no cotidiano escolar que desafiam as determinações
de muitas das políticas educacionais vigentes.
Daí a relevância de se conscientizar os profissionais da educação de seu
comprometimento com a formação integral dos seus alunos, desenvolvendo um ensino
que viabilize a emancipação social e o desenvolvimento da cidadania.
Cidadania compreendida como uma dimensão que vincula os direitos
legalmente reconhecidos à possibilidade real de sua concretização. Cidadania
constituída como a consolidação dos direitos, deveres e obrigações dos cidadãos,
capacitando-os prioritariamente para a participação política consciente. Cidadania
responsável construída através da educação capaz de desenvolver o ser humano social e
ético. Ferreira (2003, p. 27) compreende cidadania como
o próprio direito à vida no sentido pleno. Direito que necessita ser construído
coletivamente, não só em termos de atendimentos às necessidades básicas,
mas de acesso a todos os níveis da existência, dos bens culturais materiais
(que se consubstanciam em objetos para a qualidade da vida humana) e dos
bens culturais não materiais (idéias, conceitos, teorias, valores, símbolos,
hábitos, atitudes, habilidades, poesia, música, teatro, pintura, etc), incluindo
o mais abrangente – o papel dos seres humanos no universo.
A formação continuada é uma estratégia para esse fim. Por meio dela, é
possível valorizar e destacar a profissão docente, afinal, segundo Freire (1991, p. 58),
“ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a
gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão da prática".
Todavia, mesmo atingindo um grande número de profissionais da educação,
essa modalidade de formação acaba, na maioria das vezes, atuando apenas como
disseminador de propostas e idéias, priorizando o domínio de competências pontuais e,
consequentemente, conduzindo a formação dos professores por meio da re-qualificação.
É um entendimento ingênuo que considera que a realização de cursos de
aperfeiçoamento bastariam para qualificar o professor, desconsiderando o fato de que o
aprimoramento profissional exige, além da formação acadêmica, estudos e pesquisas
sobre sua prática. Assim, o desenvolvimento de um trabalho pedagógico de qualidade
requer primeiramente que a escola desenvolva práticas pedagógicas direcionadas ao
saber lidar com a diversidade, com a heterogeneidade, como as singularidades de cada
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sujeito integrante do processo ensino-aprendizagem. Essa é a compreensão de Imbernón
(2005, p. 15), ao afirmar,
Nesse contexto, a formação assume um papel que transcende o ensino que
pretende uma mera atualização científica, pedagógica e didática e se
transforma na possibilidade de criar espaços de participação, reflexão e
formação para que as pessoas aprendam e se adaptem para poder conviver
com a mudança e a incerteza.
O ENSINO ORGANIZADO EM CICLOS
Na tentativa de propagar uma educação de qualidade à todos os cidadãos, a
LDB 9394/96 preconizou às escolas brasileiras autonomia na organização de seus
processos pedagógicos e administrativos.
Para Barroso (1996, p.17) o conceito de autonomia está relacionado à
idéia de autogoverno, onde os sujeitos se regulam por regras próprias, porém
destaca que isso não é sinônimo de indivíduos independentes:
A autonomia é um conceito relacional (somos sempre autônomos de alguém
ou de alguma coisa) pelo que a sua ação se exerce sempre num contexto de
interdependência e num sistema de relações. A autonomia é também um
conceito que exprime um certo grau de relatividade: somos mais, ou menos,
autônomos; podemos ser autônomos em relação a umas coisas e não o ser em
relação a outras. A autonomia é, por isso, uma maneira de gerir, orientar, as
diversas dependências em que os indivíduos e os grupos se encontram no seu
meio biológico ou social, de acordo com as suas próprias leis.
Nas instituições escolares, o exercício da autonomia se dá pela construção de
um ambiente propício à participação da comunidade escolar nas decisões locais,
buscando soluções responsáveis e criativas, por meio de um processo de negociação
rumo à efetivação dos objetivos educacionais. Isso significa que autonomia e
participação, pressupõem decisões coletivas que manifestam diferentes lógicas e
interesses – políticos, profissionais, pessoais e pedagógicos.
A escola organizada em ciclos é uma das possibilidades que a legislação
propicia na autonomia da organização do tempo pedagógico. Todavia, é importante
destacar que, mesmo após doze anos de vigência da lei maior da educação brasileira,
ensino organizado em ciclos ainda perturba. Perturba a auto-imagem pessoal e
profissional do professor, perturba teóricos da educação, perturba o imaginário da
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sociedade que considera que com a não reprovação dos alunos, a escola acaba por
perder sua eficácia, seu poder, sua autoridade.
No município de Curitiba também não foi diferente, pois é preciso considerar
que até o ano da implantação dos “Ciclos de Aprendizagem”, em 1999, os profissionais
da Rede Municipal de Ensino da cidade trabalhavam com o ensino organizado em
séries, modelo que acabava sendo reforçado em conseqüência da história de vida de
professores e pais. Portanto, não se pode esperar dos professores uma transformação
radical e repentina em seu modo de conduzir a prática pedagógica.
A falta de formação do professor para trabalhar com uma nova concepção de
ensino pode trazer conseqüências ao processo educacional. No caso dos ciclos, o
desconhecimento do professor pode resultar num descomprometimento total, fazendo
com que uma proposta pedagógica com forte ideal democrático acabe por resultar em
um trabalho educativo desinteressado, seletivo, alienante e excludente.
Mesmo que de forma inconsciente, os profissionais das escolas podem
desenvolver ações contraditórias, que poderão resultar na adesão ou resistência às
políticas e diretrizes do sistema escolar, ou então comungar com elas e formular,
coletivamente, práticas formativas e inovadoras objetivando a formação integral do
educando.
Necessário, portanto, que os profissionais da educação, especialmente o
professor, tenham um novo olhar ao processo educativo, ao desenvolvimento humano e
suas temporalidades.
Além da reformulação da relação pedagógica entre professor e aluno,
valorizando a formação e desenvolvimento global do indivíduo, rompendo com os
modelos vigentes e tradicionais internalizados até então, o profissional que atua com os
ciclos necessita conhecer os pressupostos teóricos e políticos que envolvem essa
organização do ensino.
Assim, é preciso estudar e compreender os processos que envolvem o
desenvolvimento humano, avançando para além de uma prática pedagógica centrada
numa lógica temporal que separa, equivocadamente, os processos de aprendizagem dos
processos de socialização, e que, consequentemente, resultam em frustrações e baixo
aprendizado.
Na escola organizada em anos/séries, os períodos letivos são divididos com
base no pressuposto de que todos os alunos são capazes de aprender no mesmo período
de tempo conteúdos pré-determinados e ordenados numa concepção de linearidade, de
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seqüenciação, de presivibilidade. A aprovação, ou progressão, para o próximo ano/série
fica condicionada ao aproveitamento escolar.
É uma concepção de ensino, herança de uma escola tradicional,
homogeneizadora, em que se considera que deve-se reprovar caso o mesmo não
apresente domínio de um percentual mínimo dos conteúdos. Acredita-se que essa ação
resultará num amadurecimento e, consequentemente, no aprendizado.
Os ciclos, ao contrário, trabalham com uma concepção de educação que
entende que os indivíduos como um todo, não aprendem de modo igual e ao mesmo
tempo. É uma concepção de educação que percebe que a aprendizagem e o
desenvolvimento humano não seguem um padrão linear, considerando que cada tempo
de vida do indivíduo constitui a formação e desenvolvimento cognitivo, afetivo, social,
cultural, ético, corpóreo. Assim, é necessário respeitar e entender os tempos da vida
humana, considerando, entre outros, os ciclos de socialização, de aprendizado, de
formação humana.
Com seu desenvolvimento, o ser humano transforma-se, não apenas
fisicamente, mas transforma suas relações e concepções do mundo, pois cada fase
vivida acarretará em uma nova situação observada ou vivenciada, resultando numa
nova organização mental e sistematização de informações e conhecimentos.
Nesse contexto, a idéia de pré-requisito deixa de ter significado e,
consequentemente, não se justifica a reprovação do aluno. Portanto, o ensino
organizado em ciclos concretiza uma nova concepção de educação onde a
aprendizagem é entendida como um direito da cidadania.
Formar o cidadão, desenvolver suas potencialidades, realizar um trabalho
pedagógico que desenvolva a criticidade do aluno, habilitando-o a ser atuante no
meio em que vive, independe do ensino ser ou não organizado em ciclos.
Esse reconhecimento traz a necessidade de uma reconceituação do espaço
escolar como espaço formador e de construção da aprendizagem, provocando
mudanças que englobam todo o processo ensino-aprendizagem, entre elas na ação
docente.
O professor tem que estar sensível às diferenças que se manifestam no
desenvolvimento do ser humano em decorrência de vários fatores, destacando-se a
maturação biológica, idade, ambiente familiar, realidade sócioeconômica. Trata-se de
uma nova postura docente resultante da compreensão do educando na totalidade de sua
condição humana.
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A
NECESSÁRIA
FORMAÇÃO
DOS
PROFESSORES
PARA
A
COMPREENSÃO E EFICÁCIA DA ESCOLA ORGANIZADA EM CICLOS
A implantação dos ciclos pressupõe uma reorganização de toda a escola, afinal
desencadeiam-se mudanças que interferem e modificam, o tempo2 e o espaço escolar, o
processo ensino-aprendizagem, a gestão escolar, a avaliação e principalmente a prática
pedagógica do professor.
O processo ensino-aprendizagem nos ciclos exige a compreensão de que a
aprendizagem de cada indivíduo ocorre em ritmos que diferem daqueles estabelecidos
no calendário escolar. Portanto, é necessário flexibilizar a estrutura escolar, de modo a
satisfazer as especificidades de cada educando. É preciso acreditar que a escola existe
para ensinar verdadeiramente à todos, independente de cor, raça, sexo, classe social, ou
outros aspectos que caracterizam-se como fatores de exclusão.
Ciclos, portanto, não pode ser sinônimo de um amontoado de anos/séries.
Também não pode ser facilitador para o fluxo escolar da escola, nem a seqüência dos
ritmos de aprendizagem dos alunos.
Ciclos exige uma nova organização do trabalho pedagógico, dos tempos e
espaços escolares. É uma forma, mais justa e respeitosa, de se trabalhar com as
temporalidades do desenvolvimento humano.
Organizar a escola em ciclos pressupõe um repensar da concepção de
educação, do papel, das responsabilidades e compromissos sociais do profissional da
educação, afinal é um profissional que “descobre-se” profissional do pleno
desenvolvimento humano.
Educar exige ser sensível aos tempos humanos, isto é, tempos que carregam
diferentes trajetórias de vida. Trajetórias de vida marcadas por desencantos, por
sofrimentos. Trajetórias de vida que muitas vezes impõe a responsabilidade da
sobrevivência, “roubando” a infância e seus encantos. Trajetórias de vida que interferem
na construção do saber, pois as trajetórias escolares e de aprendizagem são inseparáveis
das trajetórias humanas de todos os indivíduos.
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O tempo caracteriza-se como um dos elementos do trabalho pedagógico. O calendário e o horário
escolar ordenam o tempo, determinando dias letivos, feriados, datas de avaliação e reuniões, disciplinas
da grade curricular, entre outros. No entanto, em prol de uma efetiva qualidade no ensino, acreditamos na
necessidade da reformulação do tempo escolar, propiciando a constante reflexão dos professores e o
avanço dos alunos para um conhecimento além da sala de aula.
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Assim, toda a inovação pedagógica, exige uma dupla aprendizagem. A
aprendizagem da instituição, da mantenedora frente aos novos papéis institucionais a
serem desenvolvidos e a aprendizagem dos professores que verdadeiramente efetivam
as políticas e práticas educacionais.
No contexto escolar, toda a transformação impõe a quebra de concepções e
modelos internalizados e normatizados. Para Martins (2002, p. 1064),
Quando as inovações nas escolas são apreendidas por seus atores como um
laboratório de experimentações onde eles atuam como os principais
pesquisadores, os testes ali realizados são os únicos capazes de provocar
fissuras na cultura institucional sacralizada, pois permite a construção da
possibilidade de (re) invenção do exercício da profissão docente em novas
bases.
Há de se considerar que a internalização de novos modelos, práticas, leis,
processos, não ocorrem de modo imediato.
A falta de clareza frente a concepção do ensino em ciclos pode prejudicar o
processo ensino-aprendizagem. No caso do município de Curitiba, mesmo após dez
anos de implantação, muitos profissionais ainda demonstram dúvidas que se justificam
na forma como foi conduzido o processo, mas que também são decorrentes da rejeição
frente ao novo, ao desconhecido, frente à mudança.
Os professores são seres humanos que manifestam em sua prática os
conhecimentos, as habilidades e atitudes que decorrem não apenas de sua formação
acadêmica, mas também de suas histórias de vida.
A implantação de uma nova proposta pedagógica que altera um modelo
educacional socialmente cristalizado, exige ir além das reflexões sobre os processos de
desenvolvimento e de aprendizagem, sobre a própria prática docente, os compromissos
e responsabilidades da escola. É um processo contínuo de convencimento, em que, por
meio de um trabalho pedagógico compromissado, com resultados efetivos, o professor
perceba a validade da nova proposta e, consequentemente, supere pré-conceitos e
modelos rígidos e cristalizados que fazem com que muitos profissionais da educação
desconsiderem que cada política pública é conseqüência do momento histórico vivido.
A prática docente traduz uma intencionalidade que necessita estar relacionada à
política educacional vigente, expressando um objetivo comum. Nenhuma nova proposta
educativa se concretizará sem o efetivo empenho dos professores. Considerar sua
motivação, expectativa de realização pessoal e profissional, entre outros, são aspectos
determinantes para o êxito do processo de aprendizagem. Assim, a descrença do
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professor frente a proposta educacional é fator que impede o processo formativo
contínuo, num movimento em que todos – alunos, professores e familiares – se formam
e se transformam. Ferreira (2002, p.1249), sabiamente afirma
A profissão do professor é a única profissão que forma seres humanos para o
mundo. Forma não só para o trabalho, mas para a vida porque forma desde as
primeiras letras, e sempre, o caráter, a personalidade, o “pensar, sentir e agir”
de outro ser humano. E, nesta relação dialética, na medida em que acrescenta
ou lesa (porque não acrescentou) o educando , acrescenta ou lesa a si mesmo.
O trabalho do professor não é alienado de sua vida pessoal, ou “descolado de
sua existência. Seu trabalho inscreve-se na experiência vivida da ação que
exerce, como “condutor de mentes”, nas palavras de Gramsci, e como ser que
pensa, sente e age, portanto sofre as conseqüências que sua profissão humana
lhe ocasiona. Seu trabalho inscreve-se nesta experiência vivida, além de ser
uma aventura interior, pois como processo transformador de outrem age
reflexamente e provoca uma transformação íntima. (GRIFOS DA AUTORA)
PARA FINALIZAR...
A proposta da SME/CTBA que implantou os Ciclos de Aprendizagem é
positiva no sentido de caracterizar-se como possibilidade de transformação no fazer
pedagógico.
Destaca-se que, apesar dos esforços e tentativas da mantenedora, a escola
organizada em ciclos ainda enfrenta o desafio de desenvolver em sua plenitude um
ensino que contemple a diversidade cultural existente no contexto escolar. Todavia para
se atingir aos objetivos desejados não podem ocorrer precipitações na deflagração e
desenvolvimento do processo de implantação, bastante complexo e contraditório em sua
essência. É necessário que todo o processo seja permeado de amplas discussões
centradas em fundamentação teórica sólida, além de uma documentação oficial explicita
em suas intencionalidades, favorecendo ao posicionamento consciente de todos os
envolvidos, evitando ações e informações conflitantes e contraditórias. Para tal fim, o
caminho mais seguro, mesmo que mais lento, é a mobilização interna da instituição
escolar, propiciando a análise local das condições ofertadas e dos resultados obtidos.
Vale lembrar que para o êxito de uma proposta educativa, com real ideal
democrático, não pode apenas ser implementada verticalmente, através de decreto. É
preciso possibilitar continuamente a discussão e a reflexão com a comunidade escolar,
especialmente com os professores. Afinal esses profissionais carregam consigo uma
história de vida que interfere em sua prática pedagógica. Logo é essencial “reconhecer
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no trabalho um processo humano, cultural, social, produtor de valores, saberes,
concepções e identidades” (ARROYO, p. 398).
Desconsiderar a história de cada um, seus saberes e experiências pode
ocasionar queixas e equívocos. Muitos professores ainda consideram-se despreparados
para esse novo fazer pedagógico, pois de uma escola anteriormente centrada nos
conteúdos, agora se deparam com uma escola que centra-se no educando enquanto
sujeito. Sujeito que necessita de uma sólida formação humana, capaz de conspirar a
favor de um mundo melhor e mais justo para todos. Concorda-se com Arroyo (ibdem, p.
404) que afirma, “é impossível olhar para os educandos, suas trajetórias e tempos sem
olhar para as trajetórias e tempos dos seus mestres”.
Portanto, não há como transformar a lógica do trabalho docente se não houver
participação e parceria dos professores. Seria um ataque à sua prática e sentindo-se
ameaçados não há como convencê-los.
No entanto, as dificuldades em se viabilizar um ensino de qualidade não
resultam fundamentalmente do processo de implantação, mas é conseqüência direta da
ação docente. Daí a importância da implantação de políticas públicas que articulem os
tempos da escola com os tempos de vida, desenvolvendo ações que verdadeiramente
alterem as estruturas e lógicas temporais vigentes as instituições escolares, pois se “os
educandos são outros, seus mestres são outros, logo as políticas públicas, sociais e
educativas não podem ser as mesmas” (ibdem, p.405). Por isso a necessidade de
reconstruir, sempre, esse caminho no sentido do seu aperfeiçoamento.
REFERÊNCIAS
ARROYO, M. G. Prefácio. In.: MOLL, J. (Org.). Ciclos na escola, tempos na vida:
criando possibilidades. Porto Alegre: Artmed, 2004.
BARROSO, J. O reforço da autonomia das escolas e a flexibilização da gestão escolar
em Portugal. In.: FERREIRA, N. S. C. (Org.). Gestão democrática da educação:
atuais tendências, novos desafios. São Paulo: Cortez, 2001.
F E R R E IR A , N . S . C . Formação continuada e gestão da educação no contexto da
“cultura globalizada”. In.: FERREIRA, N. S. C. (Org.). Formação continuada e gestão
da educação. São Paulo: Cortez, 2003.
FREIRE, P. A Educação na Cidade. São Paulo: Cortez, 1991.
12
IMBERNÓN, F. Formação docente e profissional: formar-se para a mudança e a
incerteza. 5 ed. São Paulo: Ed. Cortez, 2005 (Coleção Questões da nossa época)
MANACORDA, M. A. Marx e a pedagogia. São Paulo: Cortez/Autores Associados,
1975.
MARTINS, A. M. O exercício da profissão docente em processo de mudança: a
formação em debate. In.: A formação de professores à luz da investigação. XII
Colóquio da AFIRSE – Seção Portuguesa. Vol. II, 2002.
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